Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | DIOGO RAVARA | ||
Descritores: | VEÍCULO AUTOMÓVEL COMPRA E VENDA PROCESSO DE MATRÍCULA OBRIGAÇÃO DO VENDEDOR ACIDENTE DE VIAÇÃO DANO MORAL DO COMPRADOR | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/24/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÕES | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTES | ||
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Sumário: | I - A realização das diligências conducentes à matrícula definitiva de um veículo automóvel junto do Instituto da Mobilidade Terrestre e subsequente inscrição no registo automóvel constituem responsabilidade da empresa vendedora. II- Se a empresa vendedora entrega o veículo ao cliente sem que se mostre concluído o processo de matrícula do mesmo e não conclui tal processo, e se em consequência de acidente de viação o veículo fica fortemente danificado, sendo considerado perda total, não podendo o “salvado” ser alienado, por não estar devidamente matriculado, a empresa vendedora é responsável pelo dano correspondente à diferença entre a indemnização que o adquirente do veículo recebeu, e aquela que teria recebido se tivesse podido alienar o “salvado” – art.ºs 13º a 15º do DL nº 44/2005, de 23-11, e 562º a 564º do Código Civil. III- A enorme angústia sofrida pelo autor, decorrente da impossibilidade de regularizar a situação jurídica do veículo constitui dano não patrimonial indemnizável – art.º 496º, nº 1 do CC. IV- Uma vez que para financiamento da aquisição do automóvel foi celebrado um contrato de mútuo sujeito ao regime do financiamento de aquisições a crédito, estabelece-se entre os dois contratos um vínculo que é de qualificar como união de contratos, e que o cumprimento defeituoso se deve a um desentendimento entre a empresa vendedora e a empresa financiadora, esta é também responsável pelo ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais acima referidos - art.º 12º da Lei de Defesa do Consumidor, e 18º do DL nº 133/2009, de 02-06. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: 1. Relatório A e B, intentaram a presente ação declarativa de condenação com processo comum contra Entreposto Lisboa – Comércio de Viaturas, S.A. e BVA Instituição Financeira de Crédito, S.A. pedindo que os réus sejam condenados a: a) proceder à legalização do veículo matrícula …-JE-… em nome da 1ª autora; b) pagar à 1.ª autora, a título de danos patrimoniais, a quantia de 5.500,00€ (cinco mil e quinhentos euros) acrescida de juros legais desde a citação até efetivo e integral pagamento; c) pagar ao 2.º autor, a título de de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia de 5.000€. Para tanto invocaram o incumprimento contratual e de deveres acessórios de conduta por ambos os réus, no âmbito de contratos de compra e venda e financiamento coligados, alegando, nomeadamente, que: - Em 28-05-2010, o 1.º réu vendeu e entregou o veículo de matrícula …-JE-…, mediante o pagamento do preço de €20.000; - A aquisição da referida viatura foi objeto de financiamento, pelo 2.º réu, figurando no contrato, como mutuário, o 2.º autor, tendo sido financiado o montante de €17.000, o qual deveria ser reembolsado mediante o pagamento de 84 prestações mensais; - A aquisição ocorreu com isenção do pagamento de Imposto sobre veículos e de IVA, ao abrigo da Lei n.º 22-A/2007, de 29-06 e 15º, n.º 8 do CIVA, muito embora a 1.ª autora fosse, à data, menor (art.º 54.º da Lei n.º 22-A/2007); - Em março de 2014, o veículo sofreu um sinistro, que determinou que fosse considerado perda total; -Em 09-04-2014, a seguradora informou o 2.º autor, na qualidade de tomador do seguro, que após peritagem efetuada à viatura, a mesma foi considerada perda total, por o valor da sua reparação ser superior a 70% do seu valor venal à data do acidente, em face do que propôs efetuar o pagamento de uma indemnização a qual tinha por base os seguintes elementos: - Valor seguro: €16.470,00; - Valor do veículo acidentado: €5.500; - Valor da franquia: €823,50; - Os pais da 1.ª autora optaram por receber indemnização, no montante de €10.146,50 e ficar com o “salvado”, em virtude de a seguradora ter exigido o certificado de matrícula, documento de que não dispunham; - Por essa razão, a 1.ª autora viu lesado o seu património no valor de €5.500 e a indemnização só veio a ser paga em 2018; - O 2.ºautor sofreu incómodos e angústias vários. Regularmente citados os réus contestaram. O 1.º réu impugnando a factualidade alegada, tendo invocado que entre 09-02-2015 e 4 de julho de 2018 forneceu viaturas de substituição ao 1º autor, mais tendo invocado que este poderia ter entregue o salvado, assim recuperando o valor de €5.500, peticionado nos autos. Por fim, impugnou juridicamente a qualificação dos factos e os efeitos jurídicos da mesma pretendidos. Terminou pugnando pela improcedência da ação e pela condenação dos autores a título de litigância de má-fé. O 2.º réu excecionando ser terceiro relativamente ao imputado incumprimento de deveres contratuais, pelo 1.º réu. Terminou pugnando pela improcedência da ação. Os autores apresentaram articulados exercendo o direito ao contraditório no tocante à invocada litigância de má-fé e à exceção deduzida. Seguidamente foi proferido despacho saneador, no qual foi julgada improcedente a exceção de ilegitimidade invocada pelo 2.º réu e julgado, desde logo, improcedente o pedido de condenação das rés a procederem à legalização do veículo dos autos. Realizada a audiência final, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, condeno os RR a pagarem: a) à 1.ª A uma indemnização no valor de 5.500€ (cinco mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa civil, desde a citação e até integral pagamento; b) ao 2.º A, uma indemnização no valor de 4.000€ (quatro mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa civil, desde a presente data e até integral pagamento. Atentando ao caráter não essencial da alegação da existência de veículos de cortesia, bem como ao desfecho da acção, não vislumbro sinais de má fé, nos moldes alegados pelo 1.º R. Valor da causa: o fixado em Saneador. Custas na proporção do decaimento.” Inconformada, a ré BBVA interpôs recurso de apelação, cuja motivação resumiu nas seguintes conclusões: 1. Recorre-se da Sentença proferida nos autos que julgou a acção parcialmente procedente, condenando solidariamente os réus nos pedidos. 2. Entende a Recorrente que houve uma incorreta apreciação da prova e, consequentemente, de aplicação do direito, tendo a decisão proferida incorrido em erro de julgamento, na interpretação das normas jurídicas aplicáveis. 3. Pois a Ré BBVA – Instituição Financeira de Crédito S.A. deve ser absolvida, assim se realizando a justiça. Vejamos 4. Subsistiram ao saneamento os seguintes pedidos: que os Réus fossem a proceder ao pagamento à 1.ª Autora, a título de danos patrimoniais, da quantia de 5.500,00€ acrescida de juros legais desde a citação até efectivo e integral pagamento e que os Réus fossem condenados a procederem ao pagamento ao 2.º Autor de indemnização por danos não patrimoniais, no valor de 5.000€. 5. A origem dos danos (e da indemnização) seria o não averbamento do registo de propriedade em nome da Autora, após a aquisição da viatura e, por via de sinistro com perda total, ter ficado lesada no montante que deixou de poder receber da seguradora pelo salvado e ainda os danos não patrimoniais resultantes da demora no pagamento da indemnização e os contratempos e mal-estar daí advenientes. 6. A Recorrente vem por em causa a interpretação feita pelo Tribunal recorrido do 12.º do Decreto-Lei 359/91, de 21 de Setembro (quanto à responsabilidade da Ré BBVA – Instituição Financeira de Crédito, S.A.) que decorreria da “coligação contratual”, não concordando com a interpretação que foi feita do mesmo. 7. E também com a interpretação feita do regime da Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho (e do art.º 48º Código do Imposto sobre Veículos (ISV) publicado no anexo I à lei), quanto à impossibilidade de os Autores recorrerem a um novo financiamento ao abrigo do regime de isenção de impostos. 8. E finalmente não concorda com o valor da indemnização arbitrada a título de danos não patrimoniais. 9. A recorrente é condenada solidariamente com recurso ao regime do art.º 12º do Decreto-Lei 359/91, de 21 de Setembro e das obrigações que emergem da coligação contratual. Contudo 10. Não se verificou nenhum incumprimento ou cumprimento defeituoso quer do contrato de compra e venda, quer do contrato de financiamento (coligados). 11. Os Autores adquiriram uma viatura, que usaram e de que usufruíram até 04/2014, data em que ocorreu um sinistro que determinou a impossibilidade de reparação do veículo. 12. A viatura foi comprada e entregue aos proprietários, o financiamento foi concedido e pontualmente liquidado, mensalmente, à recorrente. 13. Verifica-se a perfeição do contrato de compra e venda. 14. Foi pago o preço ao vendedor (com o financiamento da Recorrente) e foi entregue a coisa ao comprador. 15. Não houve incumprimento ou cumprimento defeituoso de qualquer dos contratos coligados. 16. A responsabilidade imputada aos Réus na presente acção resulta da omissão da elaboração/promoção do registo em nome da Autora. 17. O registo automóvel é, no sistema jurídico português, meramente declarativo e não constitutivo. Ou seja, a propriedade não se transmite por via do registo, mas por via da entrega da coisa e pelo pagamento do preço. 18. “O registo de veículos tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos a motor e respectivos reboques, tendo em vista a segurança do comércio jurídico” (art.º 1º do DL n.º 54/75, de 12 de Fevereiro, na actual versão do DL n.º 111/2019, de 16/08). 19. A propriedade do veículo não depende do registo, ficando perfeito o contrato de compra e venda com a entrega do bem (veículo) e o pagamento do preço – factos ambos provados. 20. Não há nem houve incumprimento ou cumprimento defeituoso quer do contrato de compra e venda, quer do contrato de financiamento. 21. Pelo que não haveria de ser chamado o regime da coligação contratual ou de defesa dos direitos do consumidor para estender à Recorrente a condenação nos presentes autos. 22. Que é de todo injusta e juridicamente infundada, apelando-se por isso a Vossas Excelências que, alterando a Sentença recorrida, absolvendo a Recorrente, façam justiça. SEM CONCEDER, e caso assim não se entenda, 23. A Recorrente não pode ser responsabilizada pelos factos que originam o dever de indemnizar que resultam da inercia quer da 1ª Ré, quer dos próprios proprietários da viatura. 24. Reitera-se que os registos em causa nada têm a ver com a compra e venda e o financiamento, contratos, ambos, cumpridos na sua integralidade. 25. À Recorrente não pode, por isso ser assacada qualquer responsabilidade quanto ao montante da indemnização e opção que os autores fizeram perante a situação do salvado. 26. Devendo ser absolvida desse pedido (danos patrimoniais) descrito em b) na Sentença recorrida. 27. Da mesma forma nenhuma responsabilidade tem no tempo de pagamento da indemnização e nos alegados sentimentos de angústia e mal-estar relatados na Sentença, vividos mais de 4 anos depois da compra da viatura, pelo que deve ser absolvida do peticionado em c). 28. Que, a merecerem a tutela do direito, nunca o merecerão no montante em que as rés foram condenadas. 29. Pois o Entreposto sempre disponibilizou de forma graciosa veículos aos Autores. 30. E os Autores poderiam, logo passados 5 anos (2015), recorrer a novo benefício fiscal na aquisição de uma nova viatura nos termos da Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho e do art.º 48º Código do Imposto sobre Veículos (ISV) publicado no anexo I à lei. 31. Assim, a indemnização concedida para o pedido (danos não patrimoniais) c) da Sentença é excessiva – considerando até os montantes referidos na Sentença para situações mais graves – de privação de uso em que se somam aos incómodos a impossibilidade de utilização de uma viatura – que no caso nunca sucederam. 32. Devendo, por isso, ser substancialmente diminuída. Rematou as suas conclusões sustentando que “deve ser a Recorrente BBVA – Instituição Financeira de Crédito S.A. absolvida dos pedidos”, e que “Caso assim não se entenda, deve o valor da condenação do pedido formulado em C) ser substancialmente reduzido, por nunca ter sequer havido privação de uso de veículo por força da disponibilização graciosa que a 1ª Ré fez aos Autores.” Também a ré Entreposto interpôs recurso de apelação, cuja motivação sintetizou nas seguintes conclusões: A. A Recorrente não se conforma com a decisão prolatada pelo tribunal a quo e, nessa medida, interpõe o presente recurso de apelação, o qual tem também por objeto a reapreciação da prova gravada. B. No entendimento da Recorrente, as consequências na errónea interpretação e apreciação da prova e respetiva subsunção dos factos ao direito são tão evidentes e flagrantes que o tribunal a quo condenou as Recorrentes a pagar aos Autores, aqui Recorridos, uma indemnização por danos patrimoniais que advieram da própria conduta destes e para os quais os mesmos contribuíram, por um lado, e a pagar uma indemnização por danos não patrimoniais que estes nem tão-pouco sofreram, por outro. Quanto ao pedido formulado sob a alínea b) da Petição Inicial (correspondente à alínea a) da parte “III – Decisão” da sentença recorrida) C. A M.ma Juiz a quo enveredou por uma leitura e interpretação excessivamente literais e textuais dos conceitos de «veículo» e «salvado» [cfr. págs. 31 e 32 da douta sentença de fls.], nos termos e para os efeitos do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23 de fevereiro, e negou a natureza das coisas, em particular, do veículo automóvel …-JE-… por o mesmo se encontrar indocumentado, conferindo grande relevo e primazia aos conceitos e à forma em detrimento da substância. D. Aliás, isso mesmo fica cabalmente demonstrado pelo simples facto de o tribunal a quo ter olvidado que, na situação sub judice, se encontram preenchidos todos os pressupostos do artigo 570º do Código Civil e que, apesar disso, o tribunal a quo nem tão-pouco conjeturou a hipótese de se estar perante uma situação de conculpabilidade na conduta dos Recorridos para a produção dos danos e para o agravamento dos seus efeitos. E. Ora, segundo ressalta da matéria de facto dada como provada, os supostos danos que os Recorridos sofreram e, por conseguinte, a responsabilização das Rés, aqui Recorrentes, no pagamento de uma indemnização, a título de danos patrimoniais, e outra, a título de danos não patrimoniais, assenta no facto de estas não terem submetido, junto do IMT - Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P., um pedido de atribuição de matrícula e, dessa feita, obtido o respetivo certificado de matrícula. F. Sucede, porém, que conquanto as Recorrentes não tenham apresentado junto do IMT, I.P. o sobredito pedido de atribuição de matrícula, em face das vicissitudes que dificultaram e inviabilizaram a conclusão do processo de legalização da viatura, enunciadas sob o artigo 15º da contestação da 1.ª Ré, o certo é que os Recorridos também não o fizeram, pese embora tivessem legitimidade e interesse para o efeito. G. Os Recorridos nada fizeram para evitar a produção dos danos que alegam ter sofrido, ao invés, a sua conduta só viria a conduzir ao agravamento desses mesmos danos. H. O artigo 570º, n.º 1 do Código Civil, com a epígrafe “culpa do lesado” postula o seguinte: «Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída». I. Salvo melhor opinião, a conduta dos Recorridos integra este conceito e a decisão proferida pelo tribunal a quo deve ser substituída por uma outra que contemple o instituto ou a figura da “culpa do lesado” e, nessa medida, reduza o quantum indemnizatório ou exclua, por completo, a indemnização concedida. J. A prova testemunhal produzida nos autos, em particular os depoimentos das testemunhas LA, jurista e técnico superior no IMT [depoimento gravado através do sistema Habilus Media Studio entre os 08:13 mins. e os 10:30 mins., mais adiante entre os 17:38 mins. e os 18:33 mins. e, por fim, entre os 20:05 mins. e 22:25 mins. - cfr. ficheiro 20230105100255_19975656_2871105] e PS, engenheiro mecânico ao serviço do IMT [depoimento gravado através do sistema Habilus Media Studio entre os 17:30 mins. e os 19:45 mins. – cfr. ficheiro 20230105105135_19975656_2871105] – transcritos supra – na sessão da audiência de discussão e julgamento de 05/01/2023, afirmam, categórica e perentoriamente, que os Recorridos podiam ter despoletado, junto do IMT, I.P., o processo de atribuição de matrícula para, dessa forma, obterem o certificado de matrícula. K. Ora, se os Recorridos tivessem apresentado o pedido de atribuição de matrícula e obtido o certificado de matrícula, poderiam ter recebido a indemnização decorrente da perda total do veículo …-JE-…, por parte da companhia de seguros, no montante de €15.646,50, entregando o «salvado», ao invés de terem recebido a indemnização de montante inferior, id est, a indemnização no montante de €10.146,50, mantendo-se na posse do «salvado». L. Deste modo, se os Recorridos tivessem adotado as diligências necessárias à obtenção do certificado de matrícula, não tinham sofrido os danos patrimoniais que alegam, que ascendem a €5.500,00 (cinco mil e quinhentos euros), e que correspondem, grosso modo, à diferença entre a indemnização que receberam da companhia de seguros (i.e., €10.146,50) e a que poderiam ter recebido, caso se encontrassem munidos daquele documento (ou seja, €15.646,50). M. Uma correta subsunção dos factos ao direito imporia, portanto, uma decisão diversa da que foi prolatada pelo tribunal de 1.ª instância, posto que a inércia, inação ou omissão dos Recorridos, que nada fizeram para apresentar o pedido de atribuição da matrícula, concorreu para os danos que os mesmos alegam ter sofrido. N. Os Recorridos não adotaram a conduta exigível com que poderiam ter evitado a produção dos danos ou o agravamento dos seus efeitos, tendo-se antes demitido do seu interesse direto em requerer, junto do IMT, a atribuição da matrícula ao veículo de que viriam a ser proprietários. O. Perante as circunstâncias do caso em apreço nestes autos, forçoso será concluir que se os Recorridos estavam em iguais condições às das Recorrentes, para procederem à apresentação do pedido de atribuição de matrícula da viatura, e não o fizeram, então não adotaram a conduta exigível com que poderiam ter evitado a produção dos danos ou o agravamento dos seus efeitos – vide, a título exemplificativo, o Acórdão da Relação do Porto, de 22/04/2013: CJ, 2013, 2.º - 193; P. A contribuição dos Recorridos para os danos que alegam ter sofrido devia ter sido ponderada no montante da indemnização fixado pelo tribunal a quo, o que não foi o caso, apesar de não subsistirem quaisquer dúvidas quanto à culpa co-responsabilizante dos lesados, uma vez que os factos reveladores de conculpabilidade são graves e justificam, no caso em apreço, um juízo de censura. Q. Sendo censurável a conduta dos Autores, ora Recorridos, que igualmente contribuíram para o dano, a aqui Recorrente entende que só seria ajustada uma repartição de culpas em metade, sendo as Recorrentes solidariamente responsáveis pelo pagamento de uma indemnização de montante nunca superior a €2.750,00 (dois mil setecentos e cinquenta euros e, desta feita, a indemnização atribuída à 1.ª Autora, aqui Recorrida, sob a alínea a) do excerto decisório da douta sentença de fls., caso não seja excluída, deve ser reduzida em metade, atenta a culpa dos lesados na produção e agravamento dos danos, nos termos e para os efeitos do artigo 570º, n.º 1 do Código Civil. R. Acresce que, nos termos e para os efeitos do artigo 572º do Código Civil, nos presentes autos, esta figura da culpa do lesado foi suscitada: (i) nos articulados; (ii) no decurso das sessões da audiência de discussão e julgamento, as testemunhas cujos depoimentos aqui se transcreveram, confirmaram os factos donde se torna forçoso concluir que a conduta dos Autores contribuiu, de igual forma e em igual medida, para a produção e agravamento dos danos; e (iii) nas alegações orais dos mandatários das Rés, aqui Recorrentes Quanto ao pedido formulado sob a alínea c) da Petição Inicial (correspondente à alínea b) da parte “III – Decisão” da sentença recorrida) S. Na situação sub judice os danos patrimoniais e não patrimoniais encontram-se umbilicalmente ligados, de maneira que não se conceberia tão-pouco a existência destes sem a daqueles. T. A inação e a inércia dos Recorridos foram não só causa dos danos patrimoniais, mas também dos danos não patrimoniais, pelo que se dirá que se os Recorridos contribuíram, com a sua conduta, para os danos patrimoniais que alegam ter sofrido, então também contribuíram, ainda que indireta ou reflexamente, para a produção dos danos não patrimoniais e para o agravamento dos seus efeitos. U. A indemnização conferida aos Recorridos, sob a alínea b) do excerto decisório da sentença recorrida, a título de danos não patrimoniais, deve ser excluída ou, caso assim não se entenda, o que só por mera hipótese de raciocínio se concebe, deve a mesma ser reduzida, nos termos do artigo 570º, n.º 1 do Código Civil, atenta a culpa do lesado. V. Independentemente da figura da culpa do lesado, consagrada no artigo 570º, n.º 1 do CC, o certo é que não deveria ter sido reconhecido o direito dos Recorridos a uma qualquer indemnização, a título de danos não patrimoniais, porquanto a Recorrente atribuiu, a título gracioso, «durante a maior parte do tempo de privação do uso» (cfr. sentença de fls.), sucessivas viaturas de cortesia ou de substituição – cfr. item 36 da matéria de facto dada como provada; W. Com a atribuição das referidas viaturas de substituição, com vista a garantir e a salvaguardar as necessidades de deslocação dos Autores por aquele período de tempo, a Recorrente suportou despesas que correspondem, no mínimo, a cerca de €12.230,00 – cfr. artigo 25º da contestação de fls. – sem que tal lhe fosse legal ou contratualmente exigido. X. A douta sentença recorrida e a fundamentação em que a mesma assenta, faz tábua-rasa do facto de a Recorrente ter disponibilizado as sobreditas viaturas de substituição, por todo aquele período de tempo em que os Recorridos se viram privados do uso da viatura …-JE-…, em virtude e como consequência do sinistro, suportando os inerentes (e avultados) custos com a atribuição dessas viaturas de cortesia. Y. Deste modo, tendo a Recorrente adotado uma conduta com vista a mitigar ou a evitar quaisquer danos resultantes da privação do uso da viatura …-JE-…, atribuindo aos Recorridos sucessivas viaturas de substituição, então os danos não patrimoniais resultantes da privação do uso, também seriam necessariamente de menor gravidade, e talvez nem tão-pouco merecessem a tutela do Direito, nos termos do artigo 496º, n.º 1 do Código Civil. Z. Ou, ainda que mereçam a tutela do direito, nunca o merecerão no montante em que as Rés foram condenadas, posto que a aqui Recorrente disponibilizou, a título gracioso, veículos de substituição aos Autores. AA. Salvo melhor opinião, não se compreende qual o iter cognoscitivo percorrido pela M.ma Juiz a quo na determinação e fixação do quantum indemnizatório, a título de danos não patrimoniais. BB. E, por isso, deve a indemnização atribuída sob a alínea b) do excerto decisório da sentença de fls. ser absolutamente excluída uma vez que, tendo esta indemnização como escopo ressarcir os Recorridos pela angústia decorrente da privação do uso da viatura, e tendo a Recorrente suprido essa privação dos Recorridos ao conceder-lhes viaturas de substituição, suportando todos os custos inerentes, o certo é que aqueles não sofreram tais danos; ou substancialmente reduzida, atendendo a que a conduta dos Recorridos contribuiu e foi concausa dos danos supostamente sofridos (cfr. artigo 570º do Código Civil), pois caso tivessem apresentado o sobredito pedido de atribuição de matrícula junto do IMT, teriam recebido a indemnização pela perda total desta viatura num mais curto espaço de tempo e talvez tivessem podido adquirir uma nova viatura, diminuindo significativamente o período de privação do uso da viatura e, por conseguinte, os danos não patrimoniais daí emergentes. Rematou as suas conclusões nos seguintes termos: “(…) deve ser dado provimento ao presente recurso de apelação e, em consequência, ser a Recorrente Entreposto Lisboa – Comércio de Viaturas, S.A. absolvida dos pedidos, com as legas consequências (…)” Os autores apresentaram contra-alegações, pugnando pela improcedência das presentes apelações. 2. Objeto do recurso Conforme resulta das disposições conjugadas dos art.ºs 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do CPC, é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso, seja quanto à pretensão dos recorrentes, seja quanto às questões de facto e de Direito que colocam[1]. Esta limitação dos poderes de cognição do Tribunal da Relação não se verifica em sede de qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. art.º 5º n.º 3 do CPC). Não obstante, excetuadas as questões de conhecimento oficioso, não pode este Tribunal conhecer de questões que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas. A este propósito cumpre sublinhar que não descortinamos que a exceção de culpa do lesado, que a apelante Entreposto menciona no seu recurso tenha sido invocada na sua contestação. Porém, resulta do disposto no art.º 572º, 2ª parte, do CC que a exceção de culpa do lesado é de conhecimento oficioso, razão pela qual pode ser invocada apenas nas alegações de recurso. Assim, as questões a apreciar e decidir são as seguintes: - A impugnação da decisão sobre matéria de facto – Conclusões A. e J. do recurso da ré Entreposto; - A responsabilidade da ré Entreposto, a corresponsabilidade dos autores e a exceção de culpa dos lesados[2] – Conclusões D. a I., e M. a R. do recurso da ré Entreposto; - A responsabilidade da ré BBVA – Conclusões 1 a 7, e 9 do recurso desta ré; - Os danos e a correspondente indemnização – Conclusões 31 e 32 do recurso da ré BBVA e S a BB do recurso da ré Entreposto 3. Fundamentação 3.1. Os factos 3.1.1. Factos provados O Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos:[3] 1. A 1.ªA nasceu em 07-04-2006 e é enteada do 2.º A; 2. A 1.ª A padece de incapacidade motora, não se conseguindo deslocar, exceto em cadeira de rodas; 3. O 2.º A, que é casado com a mãe da 1.ª A, necessitando de adquirir um veículo para a família, dirigiu-se com aquela às instalações do 1.º R, tendo manifestado interesse na aquisição de um veículo automóvel de marca Seat, modelo EXEO 2.0 TDI pelo preço de 20.000€, mediante recurso a financiamento; 4. Dada a incapacidade motora da 1.ª A, o veículo deveria ser adquirido com isenção de imposto (ao abrigo do regime previsto no art.º 15.º n.º 8 da Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho); 5. O 1.º R indicou ao 2.º A e à mãe da 1.ª A que o 2.º R poderia financiar, em parte, a aquisição do veículo; 6. O 1.º A acordou com o vendedor do 1.º R, em que a 1.ª A adquiriria o veículo com a marca e modelo referidos em 3, mediante o recurso ao financiamento do 2.º R; 7. Assim, o 1.º R declarou vender à 1.ª A um veículo de matrícula …-JE-…, mediante o pagamento do preço de 20.000€; 8. A aquisição foi objeto de financiamento, pelo 2.º R, que celebrou contrato de mútuo com o 2.º A, mediante o qual a primeira se comprometeu a entregar ao 1.º R a quantia de 17.000€, a título de capital, para pagamento da viatura de matrícula …-JE-…, o que fez; 9. O 2.º A, por seu turno, comprometeu-se a - como contrapartida do mútuo – pagar ao 2.º R, 84 prestações mensais, iguais e sucessivas, no valor individual de 256,76€, o que fez, tendo procedido ao cumprimento do contrato; 10. O mútuo foi assinado, em 05.06.2010, pelo 2.º Autor na qualidade de mutuário e pela progenitora da Autora na qualidade de avalista, nas instalações do Réu Entreposto Lisboa – Comércio de Viaturas, S.A. (vendedor) o qual foi depois enviado pelo Réu Entreposto Lisboa – Comércio de Viaturas, S.A. ao Réu BBVA Instituição Financeira de Crédito, S.A. 11. Em 28-05-2010, o 1.º R e entregou ao 2.ºA um equipamento, ao qual foi atribuído a DAV com o número de matrícula provisória …-JE-…, mediante o pagamento do preço de 20.000€, bem como uma autorização de circulação; 12. O referido equipamento nunca chegou a ter matrícula atribuída, encontrando-se omisso na Conservatória do Registo Automóvel; 13. 1A aquisição do equipamento ocorreu com isenção do pagamento de Imposto sobre veículos e de IVA, ao abrigo da Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho e n.º 8 do CIVA. (muito embora a 1.ª A fosse, à data, menor (cfr. artigo 54.º da Lei n.º 22-A/2007), conforme informação constante da Autoridade Tributária; 14. Não obstante o referido em 11, foi celebrado contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel com a Mapfre; 15. O 1.º R nunca chegou a finalizar o processo de atribuição de matrícula para o equipamento referido em 5 e nunca chegou a entregar aos AA o respetivo Documento Único Automóvel/livrete; 16. O 1.º Réu, sempre que questionado pelos documentos, dizia que estava a tratar da obtenção dos mesmos, no que o 2.º Autor sempre confiou, na medida em que nunca lhe foram informados os verdadeiros motivos pelos quais não era entregue o certificado de matrícula do veículo; 17. Em 28 de Março de 2014, o equipamento sofreu um sinistro; 18. Ao ser confrontado com a circunstância de o equipamento com que circulava não se encontrar documentado e registado, o 2.º A dirigiu-se ao 1.º R, no sentido de procurar resolver a situação; 19. Em 09-04-2014, a seguradora informou o 2.ºA, na qualidade de tomador do seguro, que após peritagem efetuada ao equipamento, o mesmo foi considerado perda total, por o valor da sua reparação ser superior a 70% do seu valor venal à data do acidente, em face do que propôs efetuar o pagamento de uma indemnização a qual tinha por base os seguintes elementos: - Valor seguro: 16.470,00€; - Valor do veículo acidentado: 5.500€; - Valor da franquia:823.50€; - Tendo em conta os valores apurados a MAPRFE propôs-se ao pagamento de indemnização nos seguintes termos: a) Optando por ficar com o veículo acidentado em seu poder o valor de 10.146,00€; b) Optando por não ficar na posse do veículo acidentado o valor de 15.646,50€. 20. O 2.º A, que era o condutor habitual do veículo, optou por receber indemnização, no montante de 10.146,50€ e ficar com o “salvado”, em virtude de não ter o certificado de matrícula, que não lhe havia sido entregue pelo 1.ºR; 21. A indemnização só veio a ser paga em 2018, por causa de indefinição da situação jurídica do equipamento; 22. O 2.ºA sofreu incómodos vários, tanto mais que a 1.ª A integra o agregado, tendo, entretanto, crescido, o que acarretou maiores necessidades de deslocação; 23. O equipamento entregue pelo 1.º R e ao qual tinha sido atribuída a matrícula provisória …-JE-… não se encontra registado, por outro, também resulta do exame dos documentos juntos com a Petição como docs. 7 e 9, que aquele veículo foi considerado perda total, não podendo ser obtido certificado de matrícula sem que o mesmo viesse a ser reparado e sujeito a nova inspeção; 24. Nos termos do contrato de mútuo, deveria ser celebrada uma hipoteca sobre o veículo, como forma de garantia do pagamento, o que nunca se chegou a verificar; 25. Só depois do sinistro foi o 2.º A informado de que a razão para não ter sido dado seguimento ao procedimento de obtenção de matrícula se ficou a dever ao impasse decorrente do que foi entendido, pelo 2.º R, como a impossibilidade jurídica de constituição de hipoteca; 26. Os RR nunca solucionaram tal impasse, tendo feito recair sobre os AA o risco de o equipamento ter circulado indocumentado até à data do acidente referido em 17; 27. Uma vez que pelos motivos supra explanados, o equipamento com a matrícula provisória …-JE-… à data do acidente, não detinha o competente certificado de matrícula, a Polícia bloqueou informaticamente junto do IMT a emissão desse mesmo documento; 28. O IMT, para proceder à emissão do certificado de matrícula, exigia que o veículo sinistrado fosse concertado e aprovado em inspeção técnica, o que era economicamente inviável; 29. Conforme informação do IMT: “(…) Na sequência da exposição infra da Senhora Advogada e com base na consulta dos documentos em anexo, após análise da situação em concreto, é previamente de referir que parece ser de entender que a matéria em discussão não é dirimível no âmbito das atribuições e competências do IMT, I.P., a saber: De facto, a matrícula n.º …-JE-… não se encontra legalmente atribuída. A referida matrícula foi reservada (logo, não atribuída) após o requerente ter obtido o comprovativo da regularização da situação do veículo junto dos Serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira. Sendo que, após este ato, os Serviços de Alfândega reservam desde logo a matrícula para o veículo. (vd. art.º 5º n.º 1 do DL n.º 152-A/2017, de 11 de dezembro). No seguimento, compete aos Serviços do IMT, I.P. assegurar a gestão do registo dos veículos e respetivos componentes, incluindo a sua identificação através da matrícula (vd. DL n.º 236/2012, de 31 de outubro, alterado pelos DL n.º 44/2014 de 20 de março, 77/2014, de 14 de maio, 83/2015, de 21 de maio e 79/2016, de 23 de novembro). Depois de cumprida a fase anterior, da competência dos Serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira, o interessado de acordo com o legalmente determinado para o efeito deve requerer a matrícula junto dos Serviços do IMT, I.P. (cfr. art.º 4.º n.º 1 do DL n.º 152-A/2017, de 11 de dezembro). - Acontece que, atento o histórico do veículo, nunca foi concluído (com despacho favorável) qualquer processo de atribuição de matrícula no IMT, I.P. Mais se informa que a matrícula de um veículo só se considera efetuada após a emissão do respetivo documento de identificação. Seja, só se considera que um veículo está matriculado após correr termos o processo de atribuição de matrícula no IMT, I.P., e o processo de registo da respetiva propriedade junto dos Serviços do IRN/Conservatória do Registo de Automóveis (vd. art.º 2.º al. b) e al. f), e art.º 5.º n.º 4 e n.º 5 ambos do DL n.º 152-A/2017, de 11 de dezembro, e art.º 4.º n.º 1 do DL n.º 178-A/2005, de 28 de outubro com as legais atualizações). Nestes termos, não estando a matrícula em causa atribuída ao referido veículo, nunca poderia ter sido emitido o respetivo DUA (Documento Único Automóvel). Na sequência, e pelos mesmos motivos, é também de esclarecer não ser possível ao IMT, I.P. proceder ao cancelamento de uma matrícula inexistente. (…)”; 30. Segundo a informação do IMT: “(…) Quanto ao assunto parece ser de entender, salvo melhor opinião, que em face do acidente sofrido e pelo facto de não existir matrícula nem DUA, se o veículo em consequência desse acidente chegou ao fim da sua vida útil, passando assim a constituir um resíduo a situação operacional para instrução do respetivo processo administrativo (procedimentos/documentos) de desmantelamento e destruição deverá ser articulada, porventura, entre o Operador de Desmantelamento e a A.P.A (Agência Portuguesa do Ambiente). A reserva da matrícula resultou de procedimento decorrente na Autoridade Tributária e Aduaneira, pelo que o IMT a esta data não tem nenhuma situação de pendência conhecida a esclarecer junto daquela entidade. (…)” – cfr. informação de 20-01-2022. 31. Em face de não dispor de certificado de matrícula em seu nome, também a indemnização só veio a ser paga pela MAPFRE SEGURSO em 2018, ou seja, volvidos 4 anos após a ocorrência do sinistro. 32. Em face do exposto, durante 4 anos, a Autora encontrou-se desprovida do valor indemnizatório e consequentemente de poder económico para proceder à aquisição de outro veículo; 33. A Autora encontra-se até à presente data privada da possibilidade de proceder à aquisição de um veículo novo ao abrigo do regime previsto no art.º 15.º n.º 8 da Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho, na medida em que não dispondo dos documentos do veículo se encontra impossibilitada de proceder à realização de qualquer ato em relação ao veículo …-JE-…, o qual se encontra imobilizado desde a data do sinistro; 34. A impossibilidade de regularizar a situação jurídica do veículo, em nome da Autora, bem como, as consequências que lhe estão associadas, provocaram no Autor (mutuário) uma enorme angústia, que se prolonga desde a data do acidente em que o Autor teve conhecimento dos motivos que conduziram à não entrega dos documentos do veículo à Autora; 35. O sucedido prejudicou a saúde e o bem-estar do Autor, o qual, com sacrifício e por recurso ao crédito (contrato de mútuo) comprou um veículo para as deslocações da menor e que pagou na íntegra; 36. Entre 09-02-2015 e 4 de julho de 2018 forneceu viaturas de substituição ao 1.ºA. 3.1.2. Factos não provados O Tribunal a quo consignou o que segue: Em face da prova produzida não resultaram provados quaisquer outros factos com relevância para a boa decisão da causa, não tendo resultado provado que O demais alegado, não expressamente enumerado supra, constitui matéria conclusiva, repetitiva ou de direito, que não admite decisão nesta sede. 3.2. Os factos e o direito 3.2.1. Da impugnação da decisão sobre matéria de facto 3.2.1.1. Considerações gerais Dispõe o art.º 662º n.º 1 do CPC2013 que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos por assentes, a prova produzida ou documento/s superveniente/s, impuserem decisão diversa. Nos termos do art.º 640º n.º 1 do mesmo código, quando seja impugnada a matéria de facto deve o recorrente especificar, sob pena de rejeição, os concretos factos que considera incorretamente julgados; os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. O n.º 2 do mesmo preceito concretiza que, quanto aos meios probatórios invocados incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o recurso. Para o efeito poderá transcrever os excertos relevantes. A lei impõe assim ao apelante específicos ónus de impugnação da decisão de facto, sendo o primeiro o ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida, o qual implica a análise crítica da valoração da prova feita em primeira instância, tendo como ponto de partida a totalidade da prova produzida. Mais concretamente, no que respeita à indicação dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art.º 640.º, n.º 1, al. a) do CPC), cremos que tal indicação deve ser clara, inequívoca, e individualizada, de forma a não deixar quaisquer dúvidas quanto à identificação dos referidos pontos. Assim, sendo habitual que as decisões judiciais atribuam números aos diversos pontos da decisão de facto, a forma expectável de o fazer será mediante a indicação dos números correspondentes aos pontos da decisão de facto que o recorrente pretende ver reapreciados. Como esclarece ABRANTES GERALDES[4], “o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação nas alegações do recurso e síntese nas conclusões”. E – acrescenta o Ilustre Conselheiro - “a indicação dos pontos de facto cuja modificação é pretendida pelo recorrente não poderá deixar de ser enunciada nas conclusões”.[5] Importa ainda clarificar a extensão e alcance do ónus de indicar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que no entender do recorrente imponham decisão diversa da proferida pelo Tribunal recorrido, aflorado no art.º 640º, nº 1, 1l. b) do CPC, e concretizado na al. a) do nº 2 do mesmo preceito. Trata-se, no fundo, de interpretar a expressão “identificar com exatidão as concretas passagens da gravação em que se funda o (…) recurso”, constante do último preceito invocado. Assim, em primeira linha, no tocante a depoimentos gravados, a observância desse ónus implica a indicação do início e fim das passagens dos depoimentos tidas por relevantes, podendo o recorrente, se assim o entender, proceder à transcrição dessas passagens. Tal indicação não tem necessariamente que constar das conclusões, mas deve constar das alegações de recurso. No sentido exposto cfr., entre muitos outros, os acs. RC 25-10-2016 (Jorge Loureiro), p. 12/14.7TBLRA.C1; RC de 17-12-2017 (Isaías Pádua), p. 320/15.0T8MGR.C1; STJ 02-06-2016 (Lopes do Rego), p. 725/12.8TBCHV.G1.S1; STJ 06-12-2016 (Garcia Calejo), p. 437/11.0TBBGC.G1.S1; e STJ 23-05-2018 (Ribeiro Cardoso), p. 27/14.5T8CSC.L1.S1. Não obstante, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem sublinhado que na falta de indicação das horas, minutos e segundos em que se iniciam e terminam os excertos dos depoimentos que o apelante entende relevantes, o ónus de indicação precisa das mesmas passagens da gravação poderá considerar-se satisfeito se o apelante transcrever essas passagens, mas já não quando se limitar a resumir o sentido geral que atribuiu aos mesmos excertos – vd. acs. STJ 19-01-2016 (Sebastião Póvoas), p. 3316/10.4TBLRA.C1.S1; STJ 23-05-2018 (Ribeiro Cardoso), p. 27/14.5T8CSC.L1.S1; STJ 21-03-2019 (Rosa Tching), p. 3683/16.6T8CBR.C1.S2 e STJ 18-06-2019 (José Raínho), p. 152/18.3T8GRD.C1.S1. Depois, há que sublinhar igualmente que este ónus de identificação precisa das passagens dos depoimentos invocados se aplica quer nas situações em que a impugnação da decisão sobre matéria de facto se funda exclusivamente no teor desses depoimentos, quer quando esses depoimentos constituem um dos meios de prova que sustentam entendimento diverso do expresso pelo Tribunal recorrido, a conjugar com outros meios de prova igualmente invocados pelo recorrente, nomeadamente documentais ou periciais. Nas palavras de ABRANTES GERALDES, tal ónus aplica-se “relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas” [6] (sublinhado nosso). Finalmente, e no que respeita ao ónus de especificar a decisão que, no entender do recorrente, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, cumpre sublinhar que o mesmo pressupõe a enunciação, de forma clara, das proposições de facto que devem substituir as proposições impugnadas. Neste particular, há que enfatizar que a circunstância de o recorrente impugnar um determinado ponto do elenco de factos provados não legitima a inferência de que pretende necessariamente que tal ponto de facto seja considerado não provado. Com efeito, e em abstrato, admitem-se outras possibilidades, nomeadamente: - Considerar provada apenas uma parte do ponto de facto impugnado, e não provada a restante; - Aditar uma proposição fáctica que constitua uma ressalva, ou de qualquer modo restrinja o alcance da proposição de facto impugnada. Estas considerações valem por inteiro[7] para a impugnação de factos não provados. Assim, a impugnação de qualquer ponto de facto, desacompanhada da enunciação clara da proposição fáctica que deve substituir o ponto de facto impugnado não satisfaz este ónus. Concluindo, diremos que não satisfaz o ónus em apreço o recorrente que se limita a manifestar discordância no tocante a determinado ponto de facto, sem enunciar, de forma clara qual ou quais as proposições de facto que devem substituir a proposição impugnada.[8] Sumariando todos os ónus impostos pelo citado preceito, ensina ABRANTES GERALDES[9]: “(…) podemos sintetizar da seguinte forma o sistema que agora vigora sempre que o recurso de apelação envolva a impugnação da decisão sobre a matéria de facto: a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso, e síntese nas conclusões; b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos; c) Relativamente aos pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos; d) (…) e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente; f) (…).” Nos termos do disposto no art.º 640.º, n.º 2, al. b) do CPC, a inobservância deste ónus tem como consequência “a imediata rejeição do recurso na respetiva parte”. Esta respetiva parte será a parte do recurso referente à impugnação da matéria de facto afetada pela inobservância daquele(s) ónus. Assim, se o recorrente impugna a decisão sobre matéria de facto relativamente a cinco factos provados, e em todos eles funda a sua discordância em depoimentos gravados, não observando aquele ónus, fácil é concluir que a consequência de tal inobservância será a rejeição da impugnação da decisão relativa à matéria de facto, no seu todo. Se o mesmo recorrente impugna a decisão sobre matéria de facto relativamente aos mesmos cinco factos provados, mas só quanto a um deles funda a sua discordância no teor da mesma prova testemunhal, motivando o seu entendimento relativamente aos demais na força probatória de documentos juntos ao processo, admitimos que a consequência da inobservância do mesmo ónus já não será a rejeição da impugnação da matéria de facto no seu todo, mas apenas quanto ao facto relativamente ao qual foi invocada a prova testemunhal. Neste caso, a rejeição do recurso cingir-se-ia a uma parte da impugnação da decisão sobre matéria de facto. Finalmente, descortina-se ainda outra possibilidade, que consiste na circunstância de o recorrente impugnar a decisão sobre matéria de facto, invocando em abono do juízo probatório que sustenta relativamente a todos os pontos de facto impugnados quer o teor de prova gravada que não identifica com precisão, quer outros meios de prova, nomeadamente prova documental e/ou pericial. Em casos como estes coloca-se, pois, a questão de saber se a consequência da inobservância daquele ónus será a rejeição do recurso no que tange à impugnação da decisão sobre matéria de facto no seu todo, ou apenas na parte relativa à prova testemunhal, caso em que o Tribunal da Relação teria que reapreciar a decisão sobre matéria de facto apenas em função dos meios de prova invocados pelo recorrente que não se reconduzam a depoimentos gravados. Cremos que numa tal situação, e sem prejuízo dos poderes de averiguação oficiosa de que a Relação dispõe, a solução correta será a rejeição do recurso quanto à impugnação da decisão sobre matéria de facto no seu todo, e não a mera desconsideração da prova gravada. Com efeito, resulta do disposto no art.º 662.º do CPC que na reapreciação da decisão sobre matéria de facto, a Relação deverá decidir com base no mesmo acervo probatório em que se fundou a decisão recorrida. Donde, não faria sentido interpretar a cominação processual em análise como suscetível de, relativamente a um mesmo facto, conduzir à rejeição do recurso apenas quanto a um de entre vários meios de prova. 3.2.1.2. O caso dos autos No caso em apreço a apelante Entreposto, nas conclusões de recurso sustentou que «não se conforma com a decisão prolatada pelo tribunal a quo e, nessa medida, interpõe o presente recurso de apelação, o qual tem também por objeto a reapreciação da prova gravada»[10]. Porém, em nenhuma das alíneas que integram as conclusões de recurso a mencionada apelante indicou os concretos pontos de facto que pretendia impugnar. Na verdade, a jurisprudência dos Tribunais superiores tem enfatizado, de modo unânime, a inadmissibilidade de impugnações de facto meramente genéricas – vd, entre outros, os já citados acs. STJ 07-09-2020 (Henrique Araújo), p. 2180/16.4T8CBR.C1.S1, e STJ 19-01-2023 (Nuno Pinto de Oliveira), p. 3160/16.5T8LRS-A.L1-A.S1. Ora, como já tivemos oportunidade de referir supra[11], é pelas conclusões que se delimita o objeto de recurso. Assim, se nas conclusões o apelante não individualiza os concretos pontos de facto que pretende impugnar, o recurso sobre matéria de facto fica vazio de objeto. Daí que a omissão deste primeiro ónus impugnatório conduza inexoravelmente à rejeição do recurso sobre matéria de facto - art.º 640º, nº 1 (corpo), in fine. Acresce que a apelante também não indicou, seja na motivação do recurso, seja nas conclusões, quais as concretas proposições de facto que entendia deverem passar a constar do elenco de factos provados e não provados, em substituição das que ali constam e/ou em aditamento às mesmas. Daí que, também por esta razão, fosse de rejeitar a impugnação da decisão sobre matéria de facto. Concluindo, diremos que a apelante não observou os ónus consagrados no art.º 640º, nº 1, als. a), e c) do CPC, razão pela qual se decide rejeitar a impugnação da decisão sobre matéria de facto. 3.2.2. Da responsabilidade das rés Nos presentes autos vieram os autores deduzir contra as rés pretensões indemnizatórias fundadas no instituto da responsabilidade civil, podendo questionar-se se estamos perante responsabilidade contratual, prevista no art.º 798º do CC (cumprimento defeituoso das obrigações emergentes para a 1ª ré, decorrentes do contrato de compra-e-venda de automóvel cuja reparação obrigaria também a 2ª ré por força da outorga de contrato de financiamento de aquisição a crédito) ou antes perante responsabilidade extracontratual, por facto ilícito e culposo, nos termos previstos no art.ºs 483 e segs. do CC, ou ainda se se verifica uma situação de concurso de responsabilidade contratual e extracontratual. Como bem aponta CARNEIRO DA FRADA[12] “a responsabilidade civil é um instituto jurídico que comunga da tarefa primordial do Direito que consiste na ordenação e distribuição dos riscos e contingências que afectam a vida dos sujeitos e a sua coexistência social”. Por seu turno, acrescenta JOSÉ ALBERTO GONZÁLEZ[13] que a “responsabilidade civil cumpre uma função: obrigar terceiro a proceder à reparação de danos provocados na esfera jurídica do lesado (credor para esse efeito)”. Qualquer que seja o ponto vista sobre o qual se encare, o direito a ser ressarcido nos quadros da responsabildiade civil depende da verificação dos pressupostos desta. Interpretando o disposto no art.º 483º do CC, a doutrina dominante[14] tem entendido, de modo convergente, que a responsabilidade civil delitual depende da verificação dos seguintes pressupostos: a) Um facto - comportamento voluntário do lesante; b) A ilicitude e a culpa; c) A imputação do facto ao lesante; d) O dano; e e) O nexo de causalidade e adequação entre o facto e o dano. Por facto deverá entender-se todo o comportamento voluntário ou forma de conduta humana. A ilicitude poderá resultar, da violação de direito(s) de outrem (máxime direitos absolutos), ou de uma disposição legal destinada a proteger interesses alheios. Mas, para uma conduta ser ilícita, a lesão desse direito de tutela erga omnes deve resultar de factos voluntários contrários ao direito. Quanto à culpa, dispõe o art.º 487º do CC que na falta de outro critério legal, a mesma deve ser aferida pela diligência de um bom pai de família, isto é, pela diligência de uma pessoa sem especiais qualidades, qualificações, ou perícia. O dano consiste na ofensa de bens ou interesses alheios tutelados pela ordem jurídica. O nexo de causalidade e adequação exprime uma relação de causa e efeito entre a conduta do lesante e o dano sofrido pelo lesado, apreciada não apenas de um ponto de vista naturalístico, mas numa perspetiva jurídica – vd. art.ºs 562º, 563º, e 566º do CC[15]. Estes pressupostos são transponíveis, mutatis mutandis, para o domínio da responsabilidade contratual. Com efeito, no caso da responsabilidade contratual, o facto consiste na mora, incumprimento definitivo, cumprimento defeituoso ou impossibilidade culposa de uma obrigação, residindo a sua ilicitude desde logo na antinomia entre aqueles e esta – vd. art.ºs 799º e 801º do CC. Assim, a responsabilidade civil geradora da obrigação de indemnizar será contratual quando resulte de uma relação jurídica de natureza creditícia e decorra da violação de deveres originados nesse vínculo obrigacional originário; e será extracontratual quando resulte da violação de direitos absolutos ou da prática de factos (atos ou omissões) lícitos ou ilícitos que provoquem danos a outrem. Os pressupostos da responsabilidade civil são pois bastante semelhantes, quer numa, quer noutra modalidades, divergindo, quanto aos seguintes aspetos: - ónus da prova da culpa (art.ºs 799.º, n.º 1 e 487.º, n.º 1, do CC); - prazos de prescrição (art.ºs 309.º e 498.º do CC); - responsabilidade por facto de outrem (art.ºs 800.º, n.º 1 e 500.º do CC); e - limitação equitativa da indemnização em caso de mera culpa (art.ºs 494.º do CC).[16]. Atenta a semelhança de regimes, a doutrina e a jurisprudência têm admitido a sua conjugação, v.g. nas situações em que os danos ocorram no âmbito da execução de um contrato, mas se consubstanciem na lesão de direitos absolutos do lesado, como são os direitos de personalidade, maxime o direito à integridade pessoal (nas suas vertentes física e psíquica), consagrado nos art.ºs 25º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa, e no art.º 70º, nº 1 do CC – Neste sentido se pronunciaram, entre outros, MENEZES CORDEIRO[17] e MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA[18]. No caso em apreço, resultou provado que a 1ª ré vendeu à 1ª autora um automóvel indocumentado, tendo essa venda sido financiada pela 2ª ré mediante um contrato de financiamento de aquisições a crédito outorgado com o 2º autor, imputando os autores a ambas as rés o cumprimento defeituoso do contrato de venda do automóvel, decorrente da falta de matrícula deste. Por outro lado, os autores invocaram a aplicabilidade da Lei de Defesa do Consumidor, estabelecendo o 12º, nº 1 deste diploma que “O consumidor tem direito à indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos”, e rematando o nº 2 do mesmo diploma que “O produtor é responsável, independentemente de culpa, pelos danos causados por defeitos de produtos que coloque no mercado, nos termos da lei”. Como é sabido, só pode invocar este diploma o lesado que tenha a qualidade de “consumidor”, definido no art.º 2º, nº 1 da LDC como “aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional” impondo-se ainda que quem tenha fornecido tais bens ou serviços “exerça com carácter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios”. Ora, dispõe o art.º 4º da LDC que “Os bens e serviços destinados ao consumo devem ser aptos a satisfazer os fins a que se destinam e a produzir os efeitos que se lhes atribuem, segundo as normas legalmente estabelecidas, ou, na falta delas, de modo adequado às legítimas expectativas do consumidor.” No caso vertente, o defeito imputado ao automóvel vendido pela 1ª ré diz respeito à falta de legalização do mesmo, consubstanciada na sua matrícula definitiva. Com efeito, estabelece o art.º 117º, nº 1 do Código da Estrada, na redação vigente à data dos factos em discussão na presente causa[19], que “Os veículos a motor e os seus reboques só são admitidos em circulação desde que matriculados (…)”[20], acrescentando o nº 1 do art.º 118º do mesmo código que “por cada veículo matriculado deve ser emitido um documento destinado a certificar a respetiva matrícula, donde constem as características que o permitam identificar.” Por seu turno, estabelece o art.º 9º do DL nº 54/75, de 12-02[21] que “a cada veículo corresponde um certificado de matrícula” (nº 1), e que tal certificado “deve acompanhar sempre o veículo, sob pena de o infrator incorrer nas sanções previstas no Código da Estrada” (nº 2). Ora, afigura-se inequívoco, que a obrigação de proceder à matrícula do automóvel impendia sobre a 1ª Ré, na sua qualidade de vendedora. E resultou demonstrado que o automóvel que a 1ª ré vendeu à 1ª autora nunca chegou a ter matrícula atribuída, encontrando-se omisso na Conservatória do registo Automóvel, não tendo a 1ª ré finalizado o respetivo processo de atribuição de matrícula.[22] É por isso inegável que a 1ª ré não observou tal dever contratual, o que configura uma forma de cumprimento defeituoso do contrato de compra-e-venda que outorgou com a 1ª autora. Importa, porém, determinar se as consequências jurídicas de tal cumprimento defeituoso podem também ser imputadas à 2ª ré. Como resulta da factualidade provada, a 2ª ré financiou a aquisição do automóvel, pela 1ª autora, mediante a celebração de um contrato de mútuo que foi outorgado pelo 2º autor, na qualidade de mutuário.[23] Note-se que a indicação da 2ª ré como instituição financeira apta a financiar a venda do automóvel foi feita pela 1ª ré, e que o contrato de mútuo foi assinado nas instalações da 1ª ré, que enviou o mesmo para a 2ª ré.[24] Releva, por isso, o art.º 18º do DL nº 133/2009, de 02-06, que tem o seguinte teor: Artigo 18.º Contrato de crédito coligado 1- A invalidade ou a ineficácia do contrato de crédito coligado repercute-se, na mesma medida, no contrato de compra e venda. 2- A invalidade ou a revogação do contrato de compra e venda repercute-se, na mesma medida, no contrato de crédito coligado. 3- No caso de incumprimento ou de desconformidade no cumprimento de contrato de compra e venda ou de prestação de serviços coligado com contrato de crédito, o consumidor que, após interpelação do vendedor, não tenha obtido deste a satisfação do seu direito ao exato cumprimento do contrato, pode interpelar o credor para exercer qualquer uma das seguintes pretensões: a) A exceção de não cumprimento do contrato; b) A redução do montante do crédito em montante igual ao da redução do preço; c) A resolução do contrato de crédito. 4- Nos casos previstos nas alíneas b) ou c) do número anterior, o consumidor não está obrigado a pagar ao credor o montante correspondente àquele que foi recebido pelo vendedor. 5- Se o credor ou um terceiro prestarem um serviço acessório conexo com o contrato de crédito, o consumidor deixa de estar vinculado ao contrato acessório se revogar o contrato de crédito nos termos do artigo 17.º ou se este se extinguir com outro fundamento. 6- O disposto nos números anteriores é aplicável, com as necessárias adaptações, aos créditos concedidos para financiar o preço de um serviço prestado por terceiro. A propósito do conceito de união ou coligação de contratos, e da distinção entre esta figura e a figura do contrato misto, dizia ANTUNES VARELA[25]: “O contrato misto distingue-se, por sua natureza, quer da simples junção, quer da união ou coligação de contratos. Umas vezes (junção de contratos), o vínculo que prende os contratos é puramente exterior ou acidental, como quando provém do simples facto de terem sido celebrados ao mesmo tempo (entre as mesmas pessoas) ou de constarem do mesmo título. (...) Outras vezes, porém, sucede que os contratos, mantendo embora a sua individualidade, estão ligados entre si, segundo a intenção dos contraentes, por um nexo funcional que influi na respetiva disciplina. Já não se trata de um nexo exterior ou acidental, mas de um vínculo substancial que pode alterar o regime normal de um dos contratos ou de ambos eles, por virtude da relação de interdependência que eventualmente se crie entre eles”. Por seu turno sublinhava VAZ SERRA[26] que na união de contratos a relação de dependência pode decorrer diretamente das estipulações ou da relação económica entre os negócios e que tal relação de dependência pode ser recíproca ou unilateral. Acrescentava ainda GALVÃO TELES[27] que “Para que a união de contratos exista não é absolutamente necessário que as partes a tenham visado - a união não deixará de ser própria ainda que falte o animus das partes. (...) cremos bem que bastará a consciência dos contraentes aliada ao facto de ser especial a estrutura e organização de um dos contratos”. Mas observava este autor[28] que “Havendo esta dependência, os dois contratos (ou o dependente, se a dependência for unilateral) dependem um do outro, de modo que, se um for nulo, o é também o outro, e, se um for revogado, se entende revogado também o outro, salvo se da interpretação da vontade das partes outra coisa se concluir; independentemente disto, cada um dos contratos rege-se, como é natural, pelas suas próprias regras”. E, noutra obra[29], acrescentava ainda: “O vínculo da dependência significa que a validade e vigência de um contrato depende da validade e vigência do outro ou outros. Um contrato só será válido se os demais o forem; e, desaparecidos estes, aquele desaparece também”. No caso vertente, é manifesta a ligação funcional entre o contrato de compra-e-venda de veículo outorgado entre a 1ª autora e a 1ª ré, e o contrato de mútuo celebrado entre o 2ª autor e a 2ª ré, dado que a quantia mutuada se destinou a financiar a compra do automóvel dos autos, tanto mais que, nos termos do contrato de mútuo, a quantia mutuada foi entregue pela 2ª ré diretamente à 1ª ré para pagamento do preço da mesma viatura.[30] Donde é inegável a aplicabilidade do referido art.º 18º do DL 133/2009, de 02-06. Mas aqui chegados, cumpre delimitar a amplitude do mecanismo de coresponsabilização do financiador consagrado neste preceito. Com efeito, o nº 3 deste normativo suscita a questão de saber se o mesmo contém uma enumeração taxativa das pretensões que o consumidor pode exercer perante o financiador em caso de incumprimento ou cumprimento defeituoso do contrato financiado. A este propósito, GRAVATO MORAIS defende que a responsabilidade civil contratual do financiador pelo incumprimento do negócio financiado compreende pretensões indemnizatórias. Porém, este autor cinge tal responsabilidade à indemnização por danos diretos. Já quanto aos danos indiretos (patrimoniais ou não patrimoniais), refere o mesmo autor: “Quanto aos danos causados na pessoa ou no património do consumidor – danos decorrentes ainda do cumprimento inexato – o financiador não deve por eles responder”.[31] Como quer que se entenda, cremos que as reticências manifestadas pelo Insigne Mestre não se justificam sempre que se demonstre que o incumprimento ou cumprimento defeituoso do contrato de compra-e-venda foi causado por atos ou omissões da entidade financiadora. Ora, no caso dos autos, resultou provado que o facto de não se ter completado o processo de matrícula do automóvel vendido se deveu a um desentendimento entre as rés quanto ao registo de uma hipoteca sobre o mesmo automóvel, não tendo as rés logrado resolver tal impasse, o que fez com que, posteriormente, a Polícia tivesse bloqueado informaticamente junto do IMT a emissão do certificado de registo de matrícula.[32] Daqui resulta que o cumprimento defeituoso se deve a atos e omissões de ambas as rés. Nestas circunstâncias, a responsabilidade da 2ª ré não emerge apenas da sua qualidade de financiadora, e não configura uma pura extensão da responsabilidade da 1ª ré (vendedora), antes decorre do seu comportamento, que diretamente resultou no cumprimento defeituoso do contrato de compra-e-venda. Nesta conformidade, concluímos que a ré e ora apelante BBVA responde por todos os danos decorrentes do incumprimento do contrato de compra-e-venda celebrado entre a autora e a ré apelante Entreposto. Não tem por isso, qualquer razão esta apelante quando sustenta que nenhuma responsabilidade lhe pode ser assacada em consequência do cumprimento defeituoso do contrato de compra e venda do automóvel dos autos. 3.2.3. Da exceção de culpa do lesado Argumenta, ainda a apelante Entreposto (1ª ré) que os autores são corresponsáveis pelos danos que invocaram, na medida em que poderiam ter promovido junto do Instituto da Mobilidade e Transportes Terrestres a atribuição da matrícula do automóvel dos autos. Vejamos então. Dispõe o art.º 570º, nº 1 do Código Civil que “quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída”. Como resulta do referido preceito, a redução ou exclusão da obrigação de indemnizar consagrada neste preceito pressupõe a demonstração de que o próprio lesado praticou facto culposo que contribua para a produção ou agravamento dos danos. No caso vertente, sustentou a apelante Entreposto que o ato culposo dos apelados consiste no facto de não terem promovido a obtenção da matrícula do automóvel diretamente junto da entidade pública competente. Trata-se, portanto, de um comportamento omissivo. Contudo, lendo e relendo o elenco de factos provados, a única conclusão que podemos retirar é que tal omissão pura e simplesmente não resultou demonstrada. Uma tal demonstração pressuporia que se tivesse provado que nenhum dos autores promoveu qualquer diligência junto da autoridade competente (IMT), no sentido da obtenção da matrícula definitiva do veículo. Note-se e sublinhe-se que o facto de não constar da factualidade provada qualquer elemento que permita concluir que os autores desenvolveram qualquer diligência junto daquela entidade não legitima a conclusão inversa, mas apenas o vazio probatório: não se demonstrou que o fizeram, tal como não se provou que não o fizeram. Assentando a invocação de culpa dos lesados numa omissão que não se acha provada, forçosa é a improcedência desta exceção. Ainda assim, sempre se diria que mesmo que a invocada omissão dos autores resultasse demonstrada, forçoso seria concluir que a mesma não poderia ser considerada culposa, porquanto os autores não tinham qualquer obrigação de promover junto do IMT as diligências com vista à matrícula do automóvel, tanto mais que para além de tal responsabilidade caber à 1ª ré, também se provou que sempre que era questionada pelos documentos da viatura, esta informava que estava a tratar da obtenção dos mesmos, no que o autor confiou, tanto mais que aquela ré não lhe explicava quais os verdadeiros motivos pelos quais não lhe era entregue o certificado de matrícula do veículo.[33] Termos em que, sem necessidade de outras considerações, se conclui pela total improcedência desta exceção. 3.2.4. Dos danos, do nexo de imputação, e do montante da indemnização Aqui chegados, importa aquilatar do direito às quantias peticionadas a título de indemnização por danos patrimoniais e por danos não patrimoniais. 3.2.4.1. Da indemnização por danos patrimoniais No tocante aos danos patrimoniais, resultou demonstrado que tendo o automóvel dos autos sofrido um acidente de que resultam danos que, pela sua extensão, determinaram que a seguradora o considerasse em perda total, a mesma seguradora propôs pagar, a título de indemnização pela perda do veículo, a quantia de €15.646,50 mediante a entrega do “salvado”, ou a quantia de €10.146,00, ficando a 1ª autora com o “salvado”[34]; e que perante tal proposta o 2º autor optou por receber a quantia mais baixa, dado que não tinha o certificado de matrícula[35], o que o impossibilitava de alienar o automóvel acidentado, mesmo nessa qualidade de “mero” salvado. Nos termos do disposto no art.º 41º, do Regime do Sistema de Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel[36]: “1 - Entende-se que um veículo interveniente num acidente se considera em situação de perda total, na qual a obrigação de indemnização é cumprida em dinheiro e não através da reparação do veículo, quando se verifique uma das seguintes hipóteses: a) Tenha ocorrido o seu desaparecimento ou a sua destruição total; b) Se constate que a reparação é materialmente impossível ou tecnicamente não aconselhável, por terem sido gravemente afetadas as suas condições de segurança; c) Se constate que o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado do valor do salvado, ultrapassa 100 % ou 120 % do valor venal do veículo consoante se trate respetivamente de um veículo com menos ou mais de dois anos. 2 - O valor venal do veículo antes do sinistro corresponde ao seu valor de substituição no momento anterior ao acidente. 3 - O valor da indemnização por perda total corresponde ao valor venal do veículo antes do sinistro calculado nos termos do número anterior, deduzido do valor do respetivo salvado caso este permaneça na posse do seu proprietário, de forma a reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à indemnização. 4 - Ao propor o pagamento de uma indemnização com base no conceito de perda total, a empresa de seguros está obrigada a prestar, cumulativamente, as seguintes informações ao lesado: a) A identificação da entidade que efetuou a quantificação do valor estimado da reparação e a apreciação da sua exequibilidade; b) O valor venal do veículo no momento anterior ao acidente; c) A estimativa do valor do respetivo salvado e a identificação de quem se compromete a adquiri-lo com base nessa avaliação. 5 - Nos casos de perda total do veículo a matrícula é cancelada nos termos do artigo 119.º do Código da Estrada.” Por seu turno, o conceito de “salvado” consta do art.º 13º do DL nº 44/2005, de 23/11, que o define como “o veículo a motor que, em consequência de acidente, entre na esfera patrimonial de uma empresa de seguros por força de contrato de seguro automóvel e: a) Tenha sofrido danos que afetem gravemente as suas condições de segurança; b) Cujo valor de reparação seja superior a 70% do valor venal do veículo à data do sinistro.” As condições de que depende a comercialização de salvados encontram-se reguladas nos art.ºs 14º e 15º do mesmo diploma, que estabelecem o que segue: Artigo 14.º Venda de salvados 1 - As companhias de seguros devem comunicar à Conservatória do Registo Automóvel e à Direcção-Geral de Viação todas as vendas de salvados de veículos a motor. 2 - A comunicação é efetuada por carta registada, a remeter no prazo de 10 dias a contar da data da transação, e deve identificar o adquirente através do nome, residência ou sede e número fiscal de contribuinte, bem como o veículo através da matrícula, marca, modelo e número do quadro, indicando ainda o valor da venda. 3 - Com a comunicação referida no número anterior devem as companhias de seguros remeter à Conservatória do Registo Automóvel e à Direcção-Geral de Viação, respetivamente, o título de registo de propriedade e o documento de identificação do veículo. 4 - A infração ao disposto no n.º 1 constitui contraordenação sancionada com coima de (euro) 2.500 a (euro) 25.000. 5 - A competência para instrução dos processos de contraordenação e para aplicação das coimas pertence às entidades referidas no n.º 1, de acordo com as respectivas atribuições. Artigo 15.º Comunicações obrigatórias das companhias de seguros 1 - As companhias de seguros devem comunicar também à Conservatória do Registo Automóvel e à Direcção-Geral de Viação a identificação dos veículos e dos respetivos proprietários, com os elementos e nos termos referidos no n.º 2 do artigo anterior, sempre que esses veículos: a) Se encontrem em qualquer das condições referidas nas alíneas a) e b) do artigo 13.º; b) Sendo satisfeita a indemnização por companhia de seguros, aquela não se destine à efetiva reparação do veículo. 2 - A comunicação referida no número anterior deve ser feita igualmente por todos os proprietários de veículos nas condições previstas nas alíneas a) e b) do mesmo número que procedam à sua venda a outrem que não seja a respetiva empresa de seguros. 3 - Com a comunicação referida no número anterior, devem os proprietários dos veículos remeter à Conservatória do Registo Automóvel e à Direcção-Geral de Viação, respetivamente, o título de registo de propriedade e o documento de identificação do veículo. 4 - Quem infringir o disposto no n.º 1 é sancionado com coima de (euro) 1.200 a (euro) 12.000. 5 - Quem infringir o disposto nos n.ºs 2 e 3 é sancionado com coima de (euro) 300 a (euro) 3.000.” No caso vertente referiu a sentença apelada que “estando indocumentado, isto é, fora do comércio jurídico, enquanto veículo automóvel, é apodítico afirmar que o equipamento (…) não integra o conceito de salvado”. Cremos, contudo, que a conclusão a retirar não é, propriamente, a de que o automóvel acidentado não integra o conceito de “salvado”, mas antes a de que este “salvado” não é comerciável, por carecer de matrícula.[37] Com efeito, resulta claramente dos art.ºs 14º e 15º supracitados que só os documentos devidamente matriculados e registados podem ser transacionados enquanto salvados. Não podendo o salvado ser transacionado, inviabilizada estava a aceitação proposta de indemnização mais elevada apresentada pela seguradora. A 1ª autora, na qualidade de proprietária do automóvel acidentado, sofreu, por isso, um dano correspondente à diferença entre os montantes das duas propostas de indemnização que lhe foram apresentadas pela seguradora, ou seja, € 5.500,00 (vd. art.ºs 562º a 564º do CC). Note-se que se é verdade que aquela autora ficou com o “salvado”, não menos verdade é que daí não pode retirar qualquer vantagem, por não o poder transacionar. Tal dano constitui consequência direta do cumprimento contratual defeituoso imputado às rés, pelo que estas se constituem na obrigação de indemnizar. Nesta conformidade conclui-se que a sentença apelada, na parte em que condenou as rés a pagar à autora a quantia de €5.500 e respetivos juros de mora desde a citação até integral pagamento não merece qualquer censura, 3.2.4.2. Da indemnização por danos não patrimoniais Como já referimos, nos termos previstos no art.º 12º da Lei de Defesa do Consumidor, o consumidor tem direito à indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens defeituosos. Esta disposição admite, pois, de forma expressa a ressarcibilidade de danos não patrimoniais sofridos no contexto de responsabilidade contratual. Não obstante, é justo referir que mesmo na ausência de disposição legal expressa, a jurisprudência dominante já admitia sem rebuço a ressarcibilidade de danos não patrimoniais sofridos no contexto da responsabilidade contratual – Vd. entre outros os acs. STJ 11-05-1998 (Ribeiro Coelho), p. 98A1262; STJ 28-02-2002 (Araújo Barros), p. 02B182; e STJ 24-01-2012 (Martins de Sousa), p. 540/2001.P1.S1. Estabelece o art.º 496º, nº 1 do CC que “Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”. Interpretando este preceito, diziam PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA[38] que “os simples incómodos ou contrariedades não justificam a indemnização por danos não patrimoniais”. Por seu turno ensina ALMEIDA COSTA[39] que “serão irrelevantes, designadamente, os pequenos incómodos ou contrariedades, assim como os sofrimentos ou desgostos que resultam de uma sensibilidade anómala”. A delimitação do limiar da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais constitui, assim, uma questão relevante. Como assinalou o ac. STJ 24-05-2007 (Alves Velho), p. 07A1187, “Os danos não patrimoniais podem consistir em sofrimento ou dor, física ou moral, provocados por ofensas à integridade física ou moral duma pessoa, podendo concretizar-se, por exemplo, em dores físicas, desgostos por perda de capacidades físicas ou intelectuais, vexames, sentimentos de vergonha ou desgosto decorrentes de má imagem perante outrem, estados de angústia, etc.. A avaliação da sua gravidade tem de aferir-se segundo um padrão objectivo, e não á luz de factores subjectivos (A. VARELA, “Obrigações em Geral”, I, 9ª ed., 628), sendo, nessa linha, orientação consolidada na jurisprudência, “com algum apoio na lei”, que as simples contrariedades ou incómodos apresentam “um nível de gravidade objectiva insuficiente para os efeitos do n.º 1 do art.º 496º” (ac. STJ, 11/5/98, Proc. 98A1262 ITIJ). Assim sendo, o passo seguinte consistirá em proceder á valoração dos factos provados, como consequências da conduta do lesante, servindo como linha de fronteira a separação entre aquelas que se situam ao nível das contrariedades e incómodos irrelevantes para efeitos indemnizatórios e as que se apresentam num patamar de gravidade superior e suficiente para reclamar compensação. Depois, como se tem entendido, dano grave não terá que ser considerado apenas aquele que é “exorbitante ou excepcional”, mas também aquele que “sai da mediania, que ultrapassa as fronteiras da banalidade. Um dano considerável que, no seu mínimo espelha a intensidade duma dor, duma angústia, dum desgosto, dum sofrimento moral que, segundo as regras da experiência e do bom senso, se torna inexigível em termos de resignação” – ac. de 5/6/79, CJ IV-3-892.”. Por outro lado, refere CAPELO DE SOUSA[40], que “dado que a personalidade humana do lesado não integra propriamente o seu património, acontece que da violação da sua personalidade emergem directa e principalmente danos não patrimoniais ou morais, isto é, prejuízos de interesses de ordem biológica, espiritual, ideal ou moral, não patrimonial, que sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, apenas podem ser compensados, que não exactamente indemnizados, com a obrigação pecuniária imposta ao agente”. Por seu turno observa PINTO MONTEIRO[41]: “evidentemente que a dor não tem preço (...) nem o dinheiro tem a virtualidade de a apagar; mas pode essa dor ser contrabalançada, mediante uma soma capaz de proporcionar prazeres ou satisfações à vítima, que de algum modo atenuem ou, em todo o caso, compensem esse dano”. Haverá ainda que ponderar que, conforme resulta do nº 3 do art.º 496º do CC, o critério que norteia a determinação do montante da indemnização por danos não patrimoniais é a equidade, ou justiça do caso concreto, atendendo-se às circunstâncias a que alude o art.º 494º do mesmo diploma, a saber: - o grau de culpa do agente, - a situação económica do agente, - e a situação económica do lesado, - outras circunstâncias do caso. Paralelamente, e muito embora a doutrina e a jurisprudência tendam a manifestar reservas quanto a uma eventual função punitiva da indemnização por danos em sede de responsabilidade civil, o certo é que outros autores, como PAULA MEIRA LOURENÇO[42], interpretam a referência à culpa do agente no enquanto consagração daquela função punitiva (e não meramente compensatória), da responsabilidade civil em sede de indemnização de danos não patrimoniais. Seja como for, é inequívoco que no caso vertente, e no tocante aos danos não patrimoniais, o cálculo da indemnização em apreço se deve fazer de acordo com critérios de equidade – art.ºs 496º, nº 4, 1ª parte, e 566º, nº 3, do CC. Neste conspecto, há que sublinhar que no que respeita à quantificação da indemnização por danos não patrimoniais, a jurisprudência tem enfatizado a importância da análise comparativa de decisões de casos análogos, em obediência ao disposto no art.º 8º, nº 3 do Código Civil, que estabelece que “nas decisões a proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniforme do direito”, preceito este que no fundo constitui uma concretização do princípio constitucional da igualdade, consagrado no art.º 13º da Constituição da República. Como lapidarmente enunciou o STJ, no ac. 31-01-2012 (Nuno Cameira), p. 875/05.7TBILH.C1.S1, “os tribunais não podem nem devem contribuir de nenhuma forma para alimentar a ideia de que neste campo as coisas são mais ou menos aleatórias, vogando ao sabor do acaso ou do arbítrio judicial. Se a justiça, como cremos, tem implícita a ideia de proporção, de medida, de adequação, de relativa previsibilidade, é no âmbito do direito privado e, mais precisamente, na área da responsabilidade civil que a afirmação desses vectores se torna mais premente e necessária, já que eles conduzem em linha recta à efectiva concretização do princípio da igualdade consagrado no art.º 13º da Constituição”. Haverá ainda que considerar que assentando o processo decisório na equidade, a sua concretização envolve uma certa margem de discricionariedade técnica, pelo que a reapreciação da decisão pelo Tribunal de recurso visa essencialmente apurar se os montantes fixados pelo Tribunal recorrido se mostram assentes em critérios de razoabilidade, e proporcionalidade, e não divergem injustificadamente dos padrões evidenciados pela análise de situações análogas. Na síntese feliz do ac. STJ 21-01-2016 (Lopes do Rego), p. 1021/11.3TBABT.E1.S1, “a quantificação de tal tipo de danos implica o apelo decisivo a critérios ou juízos de equidade. Ora – como temos entendido reiteradamente (..) – não poderá deixar de ter-se em consideração que tal «juízo de equidade» das instâncias, alicerçado, não na aplicação de um estrito critério normativo, mas na ponderação das particularidades e especificidades do caso concreto, não integra, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», pelo que tal juízo prudencial e casuístico das instâncias deverá, em princípio, ser mantido, salvo se o julgador se não tiver contido dentro da margem de discricionariedade consentida pela norma que legitima o recurso à equidade – muito em particular, se o critério adoptado se afastar, de modo substancial e injustificado, dos critérios ou padrões que generalizadamente se entende deverem ser adoptados, numa jurisprudência evolutiva e actualística, abalando, em consequência, a segurança na aplicação do direito, decorrente da necessidade adopção de critérios jurisprudenciais minimamente uniformizados, e , em última análise, o princípio da igualdade.” – No mesmo sentido cfr. acs. STJ 17-05-2018 (Távora Victor), p. 952/12.8TVPRT.P1.S1, STJ 24-01-2019 (Rosa Ribeiro Coelho), p. 948/14.5TVLSB.L1.S1, e STJ 24-11-2019 (Oliveira Abreu), p. 1585/12.4TBGDM.P1.S1. Aqui chegados, afigura-se relevante enunciar os factos e circunstâncias do caso dos autos que maior relevo assumirão na ponderação dos danos a ressarcir, a fim de num segundo momento, buscar na jurisprudência dos tribunais superiores casos com caraterísticas tão semelhantes quanto possível. No caso em apreço, da factualidade provada não resultam elementos que permitam aquilatar das situações económicas quer dos autores, quer das rés. No tocante ao grau de culpa das rés, cremos que o seu comportamento é de qualificar como negligente, e que tal negligência atingiu um nível considerável, na medida em que o automóvel foi vendido em 2010 e circulou cerca de quatro anos, sem que as rés tenham procedido à regularização da sua matrícula[43]. Finalmente, relevam ainda as seguintes circunstâncias do caso[44]: - A Autora encontra-se até à presente data[45] privada da possibilidade de proceder à aquisição de um veículo novo ao abrigo do regime previsto no art.º 15.º n.º 8 da Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho, na medida em que não dispondo dos documentos do veículo se encontra impossibilitada de proceder à realização de qualquer ato em relação ao veículo …-JE-…, o qual se encontra imobilizado desde a data do sinistro; - A impossibilidade de regularizar a situação jurídica do veículo, em nome da Autora, bem como, as consequências que lhe estão associadas, provocaram no Autor (mutuário) uma enorme angústia, que se prolonga desde a data do acidente em que o Autor teve conhecimento dos motivos que conduziram à não entrega dos documentos do veículo à Autora; - O sucedido prejudicou a saúde e o bem-estar do Autor, o qual, com sacrifício e por recurso ao crédito (contrato de mútuo) comprou um veículo para as deslocações da menor e que pagou na íntegra. Procedendo agora a uma análise comparativa da jurisprudência publicada em matéria de indemnização por danos não patrimoniais resultante da privação do uso de veículo automóvel, consideram-se relevantes os seguintes arestos: - RG 15-06-2021 (Lígia Venade), p. 2125/18.7T8VNF.G2 – Indemnização arbitrada: €700,00. Provou-se que o veículo ficou imobilizado cerca de 4 anos, e que o autor ficou “triste, desapontado, angustiado e desgostoso”. - RC 07-09-2021 (Fonte Ramos), p. 1022/20.0T8LRA.C1 – Indemnização arbitrada: €750,00. Provou-se que poder usar veículo acidentado, o autor sofreu “atrasos e faltas a eventos sociais, limitação da liberdade de locomoção” e que “tinha muito gosto no veículo (…), o qual mantinha bem cuidado, valorizando o facto de se tratar de um veículo edição especial”. - STJ 05-07-2018 (Abrantes Geraldes), p. 176/13.7T2AVR.P1.S1 – Indemnização arbitrada: €1.000,00. Provou-se que a privação do uso do veículo provocou ao autor “forte perturbação do sono”, bem como “perturbação no gozo de férias do lesado e sua família”. No caso vertente, considerando os termos algo vagos em que os padecimentos psicológicos sofridos pelo 2º autor foram apurados (“enorme angústia”), bem como a circunstância igualmente apurada, de que entre 09-02-2015 e 04-07-2018 os autores dispuseram de um veículo de substituição, são de molde a concluir que apesar de aqueles padecimentos ultrapassarem claramente o limiar da ressarcibilidade, o montante indemnizatório atribuído se revela exagerado. Em consequência, tendo por referência o padrão desenhado nos acórdãos suprarreferidos, temos por ajustado o quantitativo indemnizatório em €1.000, acrescendo de juros de mora, nos termos determinados na sentença apelada. 3.2.5. Das custas Nos termos do disposto no art.º 527º, nº 1 do CPC, “A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito.” A interpretação desta disposição legal, no contexto dos recursos, deve atender ao elemento sistemático da interpretação. Com efeito, o conceito de custas comporta um sentido amplo e um sentido restrito. No sentido amplo, tal conceito inclui a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte (cf. art.ºs 529º, nº1, do CPC e 3º, nº1, do RCP). Já em sentido restrito, as custas são sinónimo de taxa de justiça, sendo esta devida pelo impulso do processo, seja em que instância for (art.ºs 529º, nº 2 e 642º, do CPC e 1º, nº 1, e 6º, nºs 2, 5 e 6 do RCP). O pagamento da taxa de justiça não se correlaciona com o decaimento da parte, mas sim com o impulso do processo (vd. art.ºs 529º, nº 2, e 530º, nº 1, do CPC). Por isso é devido quer na 1ª instância, quer na Relação, quer no STJ. Assim sendo, a condenação em custas a que se reportam os art.ºs 527º, 607º, nº 6, e 663º, nº 2, do CPC, só respeita aos encargos, quando devidos (art.ºs 532º do CPC e 16º, 20º e 24º, nº 2, do RCP), e às custas de parte (art.ºs 533º do CPC e 25º e 26º do RCP). Tecidas estas considerações, resta aplicar o preceito supracitado. E fazendo-o diremos que no caso em apreço, face à parcial procedência da presente apelação, as custas deverão ser suportadas por apelantes e apelados, na proporção dos respetivos decaimentos[46]. 4. Decisão Pelo exposto, acordam os juízes nesta 7ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar as presentes apelações parcialmente procedentes, alterando a sentença apelada, reduzindo o montante indemnizatório arbitrado na al. b) do dispositivo para € 1.000,00, acrescido de juros, nos termos fixados pelo Tribunal a quo. Custas de cada uma das apelações pela respetiva apelante e apeladas, na proporção dos respetivos decaimentos. Lisboa, 24 de outubro de 2023 Diogo Ravara Paulo Ramos de Faria Micaela Sousa _______________________________________________________ [1] Neste sentido cfr. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Ed., Almedina, 2018, pp. 114-117 [2]. [3] Expurgámos do elenco dos factos provados os parêntesis constantes dos pontos 3., 4., 7., 8., 9., 11., 12., 14., 15., 23. 27., 30., e 36., os quais veiculam meras referências a meios de prova, visto que estas apenas relevam enquanto elementos motivadores da convicção do Tribunal a quo. O lugar adequado a tais referências é, pois, a motivação da decisão sobre a matéria de facto, e não o elenco de factos provados. [4] Ob. cit., p. 165, e nota de rodapé n.º 267. [5] Acentuado e sublinhado da nossa responsabilidade. [6] ob. cit., p. 165. [7] Se bem que na inversa. [8] Note-se que mesmo quando se entenda que determinado facto provado deve ser considerado integralmente não provado, ou vice-versa, há sempre uma proposição de facto alternativa: neste caso, não está apenas em causa a supressão de um ponto do elenco de factos provados, mas também o aditamento de um ponto, de teor idêntico ao impugnado, ao elenco de factos não provados. [9] “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Edição, Almedina, 2018, pp. 165-166. [10] Conclusão A. [11] Vd. ponto 2. [12] “Uma «terceira via» no Direito da Responsabilidade Civil?”, Almedina, 1997, página 15. [13] “Responsabilidade Civil”, 2ª edição, Quid Juris, 2009, pp. 14-15. [14] Vd., por todos, ANTUNES Varela, “Das obrigações em geral”, Almedina, vol. I, 9ª ed., 1998, pp. 543 ss.; e ALMEIDA COSTA, “Direito das obrigações”, 12ª ed., 8ª reimpressão, Almedina, 2020, pp. 557 ss.. [15] Cfr., ALMEIDA COSTA, ob. cit., pp. 760 ss. [16] Cfr. NUNO MANUEL PINTO OLIVEIRA, “Tópicos sobre a distinção entre a responsabilidade contratual e a responsabilidade extracontratual”, in Estudos em comemoração dos vinte anos da Escola de Direito da Universidade do Minho, Coimbra Editora, 2014, pp. 513-526; e FILIPE ALBUQUERQUE MATOS, “Traços distintivos e sinais e contacto entre os regimes da responsabilidade civil contratual e extracontratual. O caso particular da responsabilidade civil médica [II]”, in Lex Medicina e, Revista portuguesa de direito da saúde, ano 12.º, 2015, pp. 25-54). [17] “Da Responsabilidade Civil dos Administradores das Sociedades Comerciais”, LEX, 1999, pp 491-492. [18] “Concurso de Títulos de Aquisição da Prestação – Estudos Sobre a Dogmática da Pretensão e do Concurso de Pretensões”, Almedina, 1988, pp. 136 ss., e 313 ss.). [19] Aprovado pelo DL nº 114/94, de 03-05, e sucessivamente alterado. A versão mais recente é a decorrente do DL nº 46/2022, de 12-07. À data dos factos em discussão na presente causa vigorava a redação resultante da Lei nº 72/2013, de 03-09. A redação do preceito citado foi-lhe conferida pelo DL 178-A/2005. [20] As exceções a esta regra, consagradas na parte final do preceito citado não se aplicam ao caso vertente, dado que se reportam a veículos que se desloquem sobre carris, reboques com peso não superior a 300 kg, máquinas agrícolas, industriais, motocultivadores e tratocarros. [21] Sucessivamente alterado pelo DL n.º 180/2014, de 22-06; DL 461/82, de 26-11; DL 217/83, de 25-05; DL 54/85, de 04-03; DL 403/88, de 09-01; DL 182/2002, de 20-08; Retif. 31-B/2002, de 31-10; DL 178-A/2005, de 28-10; DL 85/2006, de 23-05; DL nº 20/2008, de 31-01; DL 39/2008, de 11-08; L 30/2017, de 30-05, e DL 111/2019, de 16-08. [22] Pontos 12 e 15 dos factos provados. [23] Pontos 8 e 9 dos factos provados. [24] Pontos 5 e 10 dos factos provados. [25] “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, 9ª ed., Almedina, 1998, pp. 276-277. [26] “União de Contratos / Contratos Mistos”, BMJ, n° 91, 1959, p. 13. [27] “União de Contratos e Contratos Para-Sociais”, ROA, ano 11, 1951, pp. 37 ss. [28] Idem. [29] “Manual dos Contratos em Geral”, 4ª Ed., Almedina, p. 396. [30] Ponto 8 dos factos provados. [31] “União de Contratos de crédito e de venda para o consumo”, Almedina, 2004, p. 244. [32] Pontos 25 a 29 dos factos provados. [33] Ponto 16 dos factos provados. [34] Pontos 17 e 19 dos factos provados. [35] Ponto 20 dos factos provados. [36] Aprovado pelo DL nº 291/97, de 21-08, retificado pela Decl. Retif. nº 96/2007, de 19-10; pelo DL nº 153/2008, de 06-08; e pela Lei nº 32/2023, de 10-07. A redação do preceito citado remonta à versão originária do diploma. [37] Cfr. tb. ponto 33 dos factos provados. [38] “Código Civil Anotado”, I vol. Coimbra Editora, 1987, p. 499. [39] “Direito das Obrigações”, 12ª ed., 8ª reimpressão, 2020, p. 601. [40] “O Direito Geral de Personalidade”, Coimbra Editora, 1995, p. 458. [41] “Sobre a Reparação de Danos Morais”, Revista Portuguesa do Dano Corporal, ano I, nº 1, set 1992, p. 20 [42] “A Função Punitiva da Responsabilidade Civil”, Coimbra, 2006, pp. 285-287. [43] Pontos 10, 11, e 17 dos factos provados. [44] Pontos 33 a 35 dos factos provados. [45] Considerando a data de 15-03-2020, data em que a presente ação foi proposta [46] Em sentido diverso, considerando inexistir fundamento para condenação em custas da parte que beneficia de apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais custas, vd. cfr. SALVADOR DA COSTA “Condenação das partes no pagamento de custas sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficiam”, disponível em: https://drive.google.com/file/d/1CiQm3I6JPXJrGXv6PxJAyJ7dtBIfMgat/view. |