Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
152/18.3T8GRD.C1.S1
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: JOSÉ RAINHO
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
PROVA TESTEMUNHAL
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
TRANSCRIÇÃO
Data do Acordão: 06/18/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / ÓNUS A CARGO DO RECORRENTE QUE IMPUGNE A DECISÃO RELATIVA À MATÉRIA DE FACO.
Doutrina:
- Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil, Anotado, 3.ª ed., 2015, p. 820;
- Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2.ª ed., p. 134;
- António Júlio Cunha, Direito Processual Civil Declarativo, 2.ª ed., p. 89;
- Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, II, p. 462.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 640.º, N.ºS 1, ALÍNEA B) E 2, ALÍNEA A).
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

- DE 29-05-2012, PROCESSO N.º 4146/07.6TVLSB.L1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 09-07-2015, PROCESSO N.º 284040/11.0YIPRT.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 29-10-2015, PROCESSO N.º 233/09.4TBVNC.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 10-12-2015, PROCESSO N.º 724/09.7TBAMT.P1.S1, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 03-05-2016, PROCESSO N.º 145/11.1TNLSB.L1.S1, IN SASTJ, WWW.STJ.PT;
- DE 07-07-2016, PROCESSO N.º 220/13.8TTBCL.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 14-07-2016, PROCESSO N.º 111/12.0TBAVV.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 27-10-2016, PROCESSO N.º 3176/11.8TBBCL.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 26-01-2017, PROCESSO N.º 599/15.7T8CLD.C1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 06-11-2018, PROCESSO N.º 36998/13.5YIPRT.E1.S2, IN SASTJ, WWW.STJ.PT.


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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA:

- DE 10-02-2015, PROCESSO N.º 2466/11.4TBFIG.C1, IN WWW.DGSI.PT.


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ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES:

- DE 30-01-2014, PROCESSO Nº 273733/11.1YIPRT.G1,
- DE 10-11-2014, PROCESSO N.º 1258/11.5TBPTL-A.G1;
- DE 17-12-2014, PROCESSO N.º 447/08.4TBAVV.G1, TODOS IN WWW.DGSI.PT .
Sumário :

I - Tendo o recurso de revista por fundamento a acusação de que a Relação agiu de forma indevida ao ter rejeitado o recurso em matéria de facto, a censura dirige-se a uma ilegalidade cometida ex novo na própria Relação. Nesta hipótese nunca se pode formar, por natureza, uma situação de dupla conformidade decisória das instâncias.

II - Não cumpre os ónus da alínea b) do n.º 1 e da alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC o recorrente que mais não faz do que mencionar, sem qualquer outra particularização ou esclarecimento, o início e o termo das horas em que se processaram os depoimentos das pessoas em que se apoia, tudo como constante (com ligeiríssima diferença) do que consta da ata da audiência.

III - A alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do Código de Processo Civil deve ser interpretada no sentido de que a impugnação da matéria de facto com base em prova gravada tanto se pode fazer mediante a indicação dos concretos segmentos da gravação como mediante a transcrição deles.

IV - Todavia, transcrever os depoimentos é reproduzir objetivamente, sem fazer intervir qualquer subjetividade, filtro ou juízo apreciativo, aquilo que as pessoas ouvidas declararam (verbalizaram).

V - Não vale como transcrição uma “resenha” (sic) ou aquilo que “em suma” (sic) terão referido as pessoas de cujos depoimentos o recorrente se quer fazer valer.

VI - Neste caso não se está senão perante a interpretação dada pelo recorrente aos depoimentos em causa, e não, como é devido, perante uma transcrição objetiva do teor desses depoimentos.

VII - Tendo a Relação rejeitado, nessas circunstâncias, o recurso quanto à matéria de facto, não violou nem fez errada aplicação da lei de processo.

VIII - A lei não admite o convite ao aperfeiçoamento das conclusões em sede de cumprimento do ónus estabelecidos no art. 640.º do CPC.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção):

I - RELATÓRIO

AA demandou, pelo Tribunal Judicial da Guarda e em autos de ação declarativa com processo na forma comum, BB, CC, DD, EE e HERANÇA ABERTA POR ÓBITO DE FF, pedindo que:

a) Seja reconhecido que os Réus são solidariamente devedores ao Autor da quantia de € 82 987,58;

b) Sejam os Réus condenados no pagamento de tal quantia, acrescida de juros de mora vincendos desde a citação até integral pagamento.

Alegou para tanto, em síntese, que, nos termos e para os efeitos que descreve, facultou à 1ª Ré e seu falecido marido quantias que totalizaram €69.150,00. Quantias essas que eram para ser devolvidas ao Autor, mas que não foram devolvidas. Tem assim direito a que a 1ª Ré e os demais Réus, para quem se transmitiu a dívida do falecido, lhe restituam a dita quantia, acrescida de juros.

                                                           +

Contestou a 1ª Ré, concluindo pela improcedência da ação.

                                                           +

A final foi proferida sentença que julgou improcedente a ação.

                                                           +

Inconformado, apelou o Autor.

Impugnou o julgamento de parte dos factos e sustentou que, modificados os factos, a decisão de direito deveria ser outra.

A Relação de Coimbra rejeitou o recurso em matéria de facto, com fundamento em não ter sido dado cumprimento ao disposto na alínea b) do n.º 1 e na alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do CPCivil.

No mais foi a apelação julgada improcedente e confirmada a sentença.

                                                           +

Insatisfeito com a rejeição do recurso em matéria de facto, recorre o Autor de revista.

                                                           +

Da respetiva alegação extrai as seguintes conclusões:

A) A competência para apurar a matéria de facto relevante para a solução do litígio radica nas instâncias, cabendo ao Supremo Tribunal de Justiça, salvo situações de exceção legalmente previstas, conhecer apenas da matéria de direito (cfr. artigo 46.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário - Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto - e artigos 662º, n.º 4, 674º, n.ºs 1 a 3, e 682º, n.ºs 1 e 2, do C. P. Civil). É, neste âmbito que, inequivocamente, se insere, como decorre do artigo 674.º, n.º 1, alínea b), do Cód. de Proc. Civil, a alegada violação e errada aplicação da lei de processo, pelo acórdão recorrido, mais propriamente o disposto no artigo 640.º, n.º 1 do C. P. Civil, que fixa o ónus do recorrente no caso de impugnação da decisão relativa à matéria de facto.

B) A simples leitura das Alegações de Recurso permite concluir que foram integralmente cumpridos os ónus referidos no artigo 640.º, n.º 1 e 2 do C. P. Civil. Com efeito:

- O Autor, quer no corpo do Recurso, quer nas Conclusões, identifica concretamente os pontos de facto tidos por mal julgados, indicou os meios de prova que, na sua opinião, impunham decisão diversa sobre os pontos de facto impugnados e mencionou também o sentido da decisão que deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (cfr. pontos 16 a 42 das alegações do recurso de apelação e alíneas B) a K) das Conclusões).

- O Autor enunciou, como tendo sido mal julgados os pontos 1 a 21 dos factos não provados e os pontos 29 e 32 dos factos provados, pontos esses que elencou quer no corpo das Alegações, quer nas conclusões.

- O Autor indicou também os depoimentos que, na sua perspectiva, justificavam a pretendida alteração dos pontos de facto impugnados, ao identificar os depoimentos de GG, HH e II, indicando as passagens concretas da gravação e transcrevendo até as passagens da gravação tidas por relevantes. Verifica-se, mesmo, que as referidas transcrições estão localizadas, por referência às passagens da gravação. Em todos os depoimentos transcritos no texto do recurso de apelação foi indicado o início e o fim das gravações, este relativamente às partes que interessava analisar e conferir).

- O Autor indicou, ainda, como fundamento da sua impugnação, diversos documentos existentes nos autos, identificando-os (Documento nº 1 junto com a         Petição Inicial e Documento nº 1 a 6 juntos com a Contestação).

- O Autor especificou a decisão que, em seu entender, deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo para o efeito referido, explicando as razões, que a sentença recorrida deveria considerar provados os factos alegados na Petição Inicial e que o elenco dos factos não provados entre os pontos 1º a 21º deveriam ser considerados provados.

C) Decorre, também, de forma evidente das conclusões do recurso de apelação que o Autor pretendia que a Relação alterasse a decisão proferida sobre a matéria de facto, ali tendo concretizado os pontos da matéria de facto a alterar e dado por reproduzidos os fundamentos indicados no corpo das alegações e, no tocante às testemunhas, remeteu para as passagens das gravações referidas no corpo das alegações de recurso.

D) O Autor delimitou nas suas conclusões o âmbito da sua impugnação da decisão relativa à matéria de facto, mais concretamente sob as alíneas B) a K). Já a matéria de motivação foi enunciada no corpo das alegações, conforme era devido.

E) Tendo o recorrente identificado, no corpo das alegações e nas conclusões, o ponto da matéria de facto que considera incorretamente julgado, identificando e transcrevendo o depoimento testemunhal que, no seu entender, impõe decisão diversa e retirando-se da leitura das alegações, ainda que de forma menos clara, qual a decisão que deve ser proferida a esse propósito, mostra-se cumprido, à luz da orientação referida em III, o ónus de impugnação previsto no artigo 640.º do C. P. Civil, impondo-se que o Tribunal da Relação cumprisse os poderes que lhe estavam atribuídos pelo artigo 662.º do C.P.Civil.

F) Acresce dizer que a jurisprudência dos tribunais superiores e designadamente a do Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a rejeitar uma visão de pendor excessivamente formalista que eleja apenas a forma em detrimento da substância       nos recursos em que seja pedida a reapreciação da matéria de facto.

G) Por mera cautela e sem prejuízo do supra referido, acresce dizer que, ainda que assim não se entendesse, a rejeição do recurso só pode ser determinada após prévio convite inconclusivo quanto ao aperfeiçoamento das Alegações de Recurso, no tocante ao cumprimento dos ónus de impugnação.

H) O Acórdão recorrido viola as normas constantes dos artigos 639º, 640º e 662º do C.P.Civil.

                                                           +

A 1ª Ré contra-alegou, concluindo pela improcedência do recurso.

Mais disse que o recurso deveria ser julgado inadmissível, por estar formada uma dupla conforme.

                                                           +

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

                                                           +

Da questão prévia da inadmissibilidade do recurso

Como resulta das conclusões supra transcritas, o Autor visa no presente recurso contestar o acórdão recorrido na parte em que, considerando incumprido o ónus da alínea b) do n.º 1 e da alínea a) do n.º 2 do CPCivil, rejeitou a impugnação da matéria de facto suscitada na apelação.

Como já houve oportunidade de se deixar dito no acórdão deste Supremo de 27 de Outubro de 2016 (processo nº 3176/11.8TBBCL.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt), em caso de rejeição do recurso em matéria de facto estamos perante uma decisão criada ex novo no próprio tribunal da Relação, sem qualquer paralelo, afinidade ou contiguidade com a decisão produzida na 1ª instância, pelo que nunca se poderá formar, por natureza, uma dupla conformidade decisória. Nestas circunstâncias não está defeso ao Supremo verificar em sede de revista ordinária se a Relação exerceu de forma conveniente os seus poderes processuais (v. a propósito a alínea b) do nº 1 do art. 674º do CPCivil). Como nos diz Abrantes Geraldes (Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª ed., p. 255), citando a propósito jurisprudência vária, “(…) o Supremo reiteradamente vem assumindo o entendimento de que, embora não possa censurar o uso feito pela Relação dos poderes conferidos pelo art. 662º, nºs 1 e 2, já pode verificar se a Relação, ao usar tais poderes, agiu dentro dos limites traçados pela lei para os exercer”. É o caso.

No mesmo sentido, e entre muitos outros[1], cite-se o acórdão ainda deste Supremo de 14 de Julho de 2016 (processo nº 111/12.0TBAVV.G1.S1, também disponível em www.dgsi.pt).

In casu, não ocorrendo pois uma situação inserível ao pressuposto da dupla conformidade decisória das instâncias, e verificados que estão os requisitos legais gerais de admissibilidade dos recursos (valor, sucumbência, legitimidade, tempestividade), segue-se que é à partida admissível a revista ordinária.

Termos em que se julga improcedente a questão prévia da inadmissibilidade do recurso.

                                                           +

II - ÂMBITO DO RECURSO

Importa ter presentes as seguintes coordenadas:

- O teor das conclusões define o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, sem prejuízo para as questões de oficioso conhecimento, posto que ainda não decididas;

- Há que conhecer de questões, e não das razões ou argumentos que às questões subjazam;

- Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido.

                                                           +

É questão a conhecer:

- Violação ou errada aplicação da lei de processo por parte do acórdão recorrido ao ter rejeitado, por incumprimento do ónus das alíneas b) do n.º 1 e a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC, o recurso em matéria de facto.

                                                           +

III - FUNDAMENTAÇÃO

Como acima relatado, o ora Recorrente pretendeu na sua apelação impugnar o julgamento da matéria de facto. Estavam em causa os factos dos pontos 1º a 21º dos factos considerados não provados pela 1ª instância (em boa verdade, embora o Apelante se tenha reportado formalmente, sem restrições, aos pontos 1º a 21º, haverá que deles excecionar os factos dos pontos 11º e 12º, na medida em que expressamente afirmou a dado passo da sua alegação que não pretendia impugnar o julgamento sobre o empréstimo adicional de mil contos, e é precisamente disto que tratam esses pontos 11º e 12º).

Percorrendo a alegação que o Autor ofereceu na apelação e respetivas conclusões, vemos que a discordância do Autor tinha a ver unicamente com a valoração que a 1ª instância fizera da prova pessoal produzida. Embora o Apelante tenha trazido à colação certos documentos, fê-lo com vista a significar que a sentença da 1ª instância errara em sede de distribuição do ónus da prova quanto aos factos dos pontos 29º e 32º, assunto (pura matéria de direito) que, em si mesmo, nada tinha a ver com o julgamento da matéria de facto[2].

De outro lado, conquanto o Recorrente aluda ao bom cumprimento de outros demais ónus processuais estabelecidos no art. 640.º do CPCivil, é de observar que a impugnação da matéria de facto foi rejeitada com fundamento exclusivamente no não cumprimento do ónus da alínea b) do n.º 1 e da alínea a) do n.º 2 desse art. 640.º do CPCivil. Isso decorre claro do que se mostra escrito no acórdão recorrido, como resulta da seguinte passagem:

«O A./recorrente sustenta ter ocorrido incorreta valoração da prova produzida, que levou ao incorreto julgamento de factos como “não provados”, a saber, os factos constantes sob os pontos 1º a 21º desse elenco, os quais devem ser considerados “provados”

Preliminarmente cumpre referir que quanto a este particular – da impugnação da decisão sobre a matéria de facto – é efetivamente de dar acolhimento ao que foi sustentado pelos RR./recorridos nas suas contra-alegações, no sentido de que devia “ser o recurso rejeitado”, na medida em que, tendo a prova sido gravada, não foi dado cumprimento pelo A./recorrente ao que impõe o art. 640, nº1, al. b) e nº2, al. a) do n.C.P.Civil, mais concretamente, quanto aos depoimentos das testemunhas, relativamente aos quais o A./recorrente se limita a apresentar uma “súmula, subjectiva e interpretativa, das provas gravadas”, não indicando “quais as passagens em que funda o recurso e quais os meios de prova que imporiam decisão diversa sobre a matéria de facto”.

E, na verdade, o art. 640º, nº 1 deste normativo impõe um ónus a cargo do Recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, estabelecendo que:

1 — Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Acrescentando o nº2 deste artigo que

2 — No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.

Verifica-se, contudo, que o A./recorrente nas suas alegações de recurso, quanto às testemunhas que invoca, a saber, GG, HH e II, não deu mínimo cumprimento ao disposto no art. 640º, nº 1, al. b) e nº 2 do n.C.P.Civil, o que constitui um obstáculo à reapreciação da matéria de facto que foi objeto de impugnação enquanto suportada e tendo por referência os depoimentos das ditas testemunhas.

Note-se que ao referir-se a “concretos meios probatórios” a lei está a colocar a exigência de que se alegue o porquê da discordância, que se apontem as passagens precisas dos depoimentos que fundamentam a concreta divergência, que se explique em que é que os depoimentos contrariam, ou são insuficientes, para a conclusão factual do tribunal recorrido.

Exigência esta também imposta pelo princípio do contraditório, pela necessidade que a parte contrária tem de conhecer os argumentos concretos e devidamente delimitados do impugnante, para os poder contrariar …

O que implica, nos termos da norma mencionada, a imediata rejeição do mesmo, no que à impugnação da matéria de facto em causa se refere.

Na verdade, a sanção para o incumprimento dos citados ónus encontra-se muito clara e expressamente referida no nº 1 do normativo em questão – o art. 640º do n.C.P.Civil! – a saber, sob pena de imediata rejeição do recurso.

Assim, porque não se mostra efetuado pelo A./recorrente a indicação/especificação legalmente estabelecida, é desde logo de rejeitar e não proceder ao escrutínio da decisão de facto, não havendo assim lugar a qualquer reapreciação/alteração à matéria de facto fixada pelo tribunal a quo!

Mas vejamos ainda e para finalizar o que vem suscitado pelo A. na parte final do arrazoado constante das suas alegações atinentes a esta questão recursiva, a saber, o A. invoca aí a (sub-questão da) valoração indevida das declarações de parte da 1ª Ré, BB (designadamente por falta de corroboração em outros meios de prova).

Como é bom de ver, trata-se de questão com repercussão e reporte direto à decisão sobre a matéria de facto, pelo que, tendo sido a apreciação correspondente rejeitada liminarmente pelas razões vindas de expor, fica naturalmente prejudicada a apreciação à luz desta concreta linha de argumentação.

Sendo certo que, também quanto a este particular, o A./recorrente se limita a invocar o que teria sido dito pela mesma, sem identificar o ponto da gravação, ou sequer transcrever qualquer excerto das respetivas declarações, donde, naturalmente ser de invocar para este efeito a violação das já apontadas alíneas do art. 640º do n.C.P.Civil…

Em face do exposto, conclui-se que o A./recorrente não deu cumprimento ao disposto na al. b) do nº 1, e al. a) do nº2 do art. 640º do n.C.P.Civil, o que determina a rejeição do recurso no que à impugnação da matéria de facto respeita, de acordo com o que dispõe essa mesma norma, o que se determina

Sustenta o Recorrente que cumpriu em boa ordem o ónus em causa.

Mas não tem razão.

Justificando:

O art. 640.º, n.º 1, alínea b) do CPCivil estabelece que quando impugne a decisão sobre a matéria de facto o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

E a alínea a) do n.º 2 do mesmo artigo é muito clara ao exigir que o recorrente indique com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.

Compreende-se que assim seja.

Como já houve oportunidade de se escrever no acórdão deste Supremo de 10.12.2015 (processo n.º 724/09.7TBAMT.P1.S1, cujo sumário pode ser acedido em www.stj/jurisprudência/sumários[3]), “a lei, cooptando o recorrente para a colaboração com o tribunal e para a autorresponsabilização, visa agilizar a intervenção da Relação na reapreciação (que é pontual, no sentido de circunscrita a certos factos e a certas provas) da matéria de facto, dispensando-a da compulsão de ter de ir à procura da concreta informação que o recorrente julga ser interessante. Deste modo, a Relação passa à avaliação da informação tida por relevante sem ter de dissipar tempo a localizá-la em todo um acervo desinteressante no mais e, por vezes, extensíssimo. A indicação com exatidão das passagens tem o seguinte significado: indicação do segmento da gravação onde está contida a informação que o recorrente entende apoiar o seu ponto de vista. Donde, a simples indicação do momento do início e do fim da gravação de um certo depoimento não cumpre só por si a exigência legal”.

Neste sentido se tem pronunciado a jurisprudência das Relações (v. entre outros, os acórdãos da Relação de Coimbra de 10.2.2015, processo nº 2466/11.4TBFIG.C1; da Relação de Guimarães de 17.12.2014, processo 447/08.4TBAVV.G1; da Relação de Guimarães de 10.11.2014, processo nº 1258/11.5TBPTL-A.G1; da Relação de Guimarães de 30.1.2014, processo nº 273733/11.1YIPRT.G1, todos disponíveis em www.dgsi.pt) e deste Supremo (entre outros, v. o acórdão de 26.1.2017, processo n.º 599/15.7T8CLD.C1.S1, relator Ribeiro Cardoso, disponível em www.dgsi.pt).

Observa-se neste último acórdão que “o que o preceito determina, é que o recorrente indique o início e o fim das passagens da gravação ou seja, as passagens do depoimento e não o início e o fim do depoimento. Se bastasse esta indicação do início e do fim do depoimento, a exigência legal careceria totalmente de fundamento, pois que a localização do início e do fim do depoimento não apresenta quaisquer dificuldades, ela consta da ata e é fornecida pelo próprio sistema de gravação. A indicação precisa do início e termo das concretas (…) passagens da gravação destina-se a simplificar a tarefa da Relação na reapreciação da prova gravada, não só chamando a atenção para aquela parte do depoimento, como tornando mais fácil e célere a respetiva localização na gravação, sabido como é que, em regra, cada testemunha depõe sobre mais do que um facto. De outra forma bastaria que o recorrente impugnasse a decisão sobre a matéria de facto cumprindo todos os ónus estabelecidos no art. 640º do CPC, com exceção do determinado na al. a) do nº 2, e requeresse a audição e reapreciação integral de todos ou de alguns os depoimentos o que significaria a repetição do julgamento, desiderato que não foi visado pelo legislador”.

Temática conexa com o que vem de ser dito é a de saber se a indicação com exatidão das passagens da gravação pode ser colmatada ou substituída pela transcrição dos excertos que o recorrente entenda serem relevantes[4]. Sobre tal matéria já se pronunciou este Supremo, em termos que, no essencial, não podem deixar de ser subscritos. Assim, no acórdão de 10.12.2015[5] (processo n.º 724/09.7TBAMT.P1.S1, cujo sumário pode ser acedido em www.stj/jurisprudência/sumários) já houve oportunidade de se deixar dito que a alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do Código de Processo Civil deve ser interpretada no sentido de que a impugnação da matéria de facto com base em prova gravada tanto se pode fazer mediante a indicação dos concretos segmentos da gravação como mediante a transcrição deles; no acórdão de 9 de julho de 2015 (processo n º 284040/11.0YIPRT.G1.S1, relatora Maria dos Prazeres Beleza, disponível em www.dgsi.pt) decidiu-se que se o recorrente indicou o depoimento das testemunhas que entendeu mal valorados, se forneceu a indicação da sessão na qual foram prestados e do início e termo dos mesmos e se apresentou a sua transcrição, tanto bastava para que a Relação tivesse procedido à reapreciação da matéria de facto, ao invés de a rejeitar; no acórdão de 29 de outubro de 2015 (processo n º 233/09.4TBVNC.G1.S1, relator Lopes do Rego, disponível em www.dgsi.pt) afirma-se que “o ónus de indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não sendo justificada a imediata e liminar rejeição do recurso quando – apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exacta e precisa - não exista dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento, como ocorre nos casos em que, para além de o apelante referenciar, em função do conteúdo da acta, os momentos temporais em que foi prestado o depoimento complemente tal indicação com uma extensa transcrição, em escrito dactilografado, dos depoimentos relevantes para o julgamento do objecto do recurso”.

Veja-se agora a forma como, em concreto, o Recorrente se moveu na impugnação a que procedeu na sua apelação, e passa-se a reproduzir:

“33. Fazendo uma resenha do depoimento das testemunhas ouvidas em sede de audiência de julgamento, importa atentar nos seguintes aspectos:

33.1. GG (cujas declarações se encontram documentadas através de gravação digital, no sistema habilus media studio, entre as 10:40:01 horas e as 10:55:28 horas), o qual referiu, em suma, o seguinte:

- A primeira Ré é prima direita do seu pai;

- Foi o Autor que redigiu o contrato promessa de compra e venda (junto com a Petição Inicial sob o Documento nº l), estando presentes o próprio Autor, a sua esposa, a testemunha, a primeira Ré e o seu falecido marido, FF;

- Como o imóvel tinha ónus, não foi entregue qualquer quantia a título de sinal;

- A escritura do imóvel só teria lugar após o falecido FF comprovar o levantamento de todos os ónus e encargos que incidiam sobre o imóvel;

- No dia da outorga e assinatura do contrato promessa de compra e venda, o Autor entregou ao falecido FF a quantia de cinco mil contos para que este pudesse pagar todas as responsabilidades e cancelar os ónus existentes sobre o imóvel para que, depois, pudesse fazer a escritura;

- Ficou assente que a entrega dos cinco mil contos, pelo Sr. AA ao falecido FF, seria para proceder ao cancelamento dos ónus;

- Os cinco mil contos foram entregues, no dia da outorga e assinatura do contrato promessa de compra e venda, pelo Autor ao falecido FF, em notas (numerário);

- Pensa que o FF terá procedido ao pagamento da hipoteca e das penhoras, mas que, dado que, entretanto, "caíram" outras penhoras sobre o imóvel, a escritura não foi feita;

- O Autor não emprestou qualquer quantia monetária à testemunha (ou ao seu pai)

33.2. HH (cujas declarações se encontram documentadas através de gravação digital, no sistema habilus media studio, entre as 10:04:35 horas e as 10:37:56 horas), o qual referiu, em suma, o seguinte:

- É bancário (gerente do Banco JJ, agência de …, mas durante 20 anos foi gerente, do mesmo Banco, na agência da …);

- Tem uma relação de amizade com o Autor, tal como tinha com o falecido FF e, actualmente, com a sua esposa;

- Sabe que o Autor emprestava, com regularidade, dinheiro ao falecido FF;

- Um dia, sem precisar quando, o Autor e o falecido FF referiram-lhe que este iria ficar sem a Quinta e que aquele lhe tinha emprestado dinheiro para evitar essa situação;

Importa, a este propósito, deixar a seguinte nota: quando o Autor e o falecido FF apareceram aflitos porque precisavam dinheiro para que este não perdesse a Quinta, claramente que a testemunha só poderia referir-se à venda a que a Quinta foi sujeita devido aos créditos da empresa fornecedora das urnas e em relação á qual o filho, CC, exerceu o direito de remição.

33.3. II (cujas declarações se encontram documentadas através de gravação digital, no sistema habilus media studio, entre as 10:58:30 horas e as 11:08:12 horas), a qual referiu, em suma, o seguinte:

- Refere que o falecido FF era bom rapaz mas que parecia que “hipnotizava” o marido e depois este emprestava-lhe dinheiro;

- Os cinco mil contos foram entregues, em numerário, pelo Autor ao FF, no dia da assinatura do contrato promessa, que teve lugar na sua casa, tendo estado presente; Referiu que passado algum tempo o Autor emprestou ao falecido mais mil contos (€5.000,00)

- Depois, o Autor emprestou-lhe mais dinheiro para pagar ao Coronel Salgueiro, tendo os cheques sido entregues ao seu Advogado, Dr. KK (conforme documentos juntos com a Petição inicial);

- O falecido FF comprometeu-se a devolver as quantias emprestadas pelo Autor. Nunca devolveu os referidos montantes;

- As quantias que têm vindo a ser pagas pela primeira Ré em nada têm a ver com as quantias pedidas e que estão em dívida. A primeira Ré está a pagar, de forma prestacional, montantes emprestados pelo Autor e que se reportam à casa de habitação daquela e do seu falecido marido, FF, bem como referente ao direito emprestado para que o filho CC pudesse exercer o direito de remição (artigos 50º e 51º da Petição Inicial)”.

Como se vê, o ora Recorrente não indicou com exatidão as passagens da gravação em que fundava a sua impugnação da matéria de facto. O que fez (pontos 33.1, 33.2 e 33.3 do corpo da sua alegação) foi simplesmente mencionar, sem qualquer outra particularização ou esclarecimento, o início e o termo das horas em que se processaram os depoimentos das testemunhas (trata-se das testemunhas GG, HH e II) que convoca a favor do seu ponto de vista. Tudo como constante (com ligeiríssimas diferenças) da ata da audiência (fls. 77 e 78). Ou seja, limitou-se a reproduzir o que se lê da ata da audiência, o que em si mesmo era um ato inútil e que nada esclarecia o tribunal de recurso quanto aos momentos das concretas passagens que o Recorrente entendia justificarem uma decisão diferente. Não vemos que ao agir desta forma se esteja minimamente a indicar com exatidão as passagens da gravação, senão simplesmente a proceder a uma indicação mais ou menos genérica ou abstrata, que teria o efeito legalmente indesejado de forçar o tribunal de recurso a incidir sobre toda a extensão dos depoimentos das testemunhas em causa.

De outro lado, e contrariamente ao que quer fazer supor no presente recurso, o ora Recorrente também não procedeu a quaisquer transcrições dos depoimentos testemunhais em que se visava suportar. Convém ter presente que transcrever é reproduzir objetivamente - sem a mínima possibilidade de fazer intervir qualquer subjetividade, resumo conclusivo ou juízo apreciativo - aquilo que as pessoas ouvidas declararam (verbalizaram). O que o ora Recorrente se propôs fazer (e fez) foi simplesmente apresentar “uma resenha” (tal como menciona no ponto 33 da alegação) ou apresentar o que “em suma” (tal como menciona nos pontos 33.1, 33.2 e 33.3 da alegação), terão referido as ditas testemunhas. Está-se aqui, pois, perante a apresentação da interpretação dada pelo Recorrente aos depoimentos em causa, e não perante qualquer transcrição objetiva (isto é, subjetivamente descomprometida) do teor desses depoimentos. Está-se perante afirmações conclusivas acerca daquilo que, no modo de ver do Recorrente, deveria inferir-se ou retirar-se dos depoimentos em questão. Ocorre, porém, que nesta matéria o que conta é a avaliação do tribunal em face dos próprios depoimentos tal como foram produzidos - depoimentos esses a que tem mandatoriamente de aceder na sua objetividade - e não as resenhas ou súmulas que, a seu critério, apresenta a parte recorrente.

Deste modo, cremos que o acórdão recorrido não violou a lei processual ao ter rejeitado o recurso por falta de cumprimento dos ónus estabelecidos na alínea b) do n.º 1 e na alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do CPCivil. É necessário compreender que da mesma forma que as partes têm o direito de esperar do tribunal de apelação uma reapreciação rigorosa e séria dos factos, também as partes têm o dever de cumprir de forma rigorosa e autoresponsável os ónus fixados na lei para que tal reapreciação seja legalmente possível.

Improcede assim, no que vai contra o que fica dito, o que consta das conclusões B) a F).

Na conclusão G) o Recorrente pretende que a rejeição do recurso em matéria de facto só poderia ter lugar após um prévio convite não acatado ao aperfeiçoamento.

Mas também aqui lhe falta razão.

Como resulta claro do n.º 1 do art. 640.º do CPCivil, a omissão de cumprimento dos ónus processuais aí referidos implica a rejeição da impugnação da matéria de facto. O que denega, de todo em todo, a ideia da possibilidade de prolação de um despacho de aperfeiçoamento. Manifestamente que a lei não quis impasses e tergiversações em matéria de impugnação do julgamento dos factos, impondo neste domínio rigor e autoresponsabilidade à parte recorrente.

No sentido de que não cabe legalmente convite ao aperfeiçoamento das conclusões em sede de recurso da matéria de facto se têm pronunciado a doutrina (v.g. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª ed., p. 134; Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, II, p. 462; Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil, Anotado, 3ª ed., 2015, p. 820) e a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça (assim, entre vários outros, o acórdão de 6 de novembro de 2018, processo n.º 36998/13.5YIPRT.E1.S2, sumariado em www.stj/jurisprudência/sumários[6], o acórdão de 14 de julho de 2016, processo nº 111/12.0TBAVV.G1.S1, o acórdão de 7 de julho de 2016, processo nº 220/13.8TTBCL.G1.S1 e o acórdão de 27 de Outubro de 2016, processo nº 3176/11.8TBBCL.G1.S1, estes disponíveis em www.dgsi.pt).

E sendo assim, não haverá que argumentar, como estará porventura implicitamente subjacente ao pensamento do Recorrente, com os princípios da cooperação, inquisitório e adequação formal. Pois que estes princípios só poderiam ser atuados se acaso a lei não rejeitasse a sua atuação num caso como o vertente. Acontece que, como acaba de ser dito, é manifesto que a lei abduziu do recurso da matéria de facto a possibilidade de convite ao aperfeiçoamento ou intervenção tutelar do tribunal, e daqui que não há que fazer intervir tais princípios. Pelo contrário, vale nesta matéria o princípio da autoresponsabilização das partes. Como nos diz António Júlio Cunha (Direito Processual Civil Declarativo, 2ª ed., p. 89) “Atento o princípio da autorresponsabilização das partes, aos sujeitos processuais são imputadas as consequências negativas da sua conduta. O direito processual civil impõe às partes mais do que um conjunto de deveres uma série de ónus. Ou seja, coloca com muita frequência as partes numa situação jurídica que implica a necessidade de as mesmas adotarem uma conduta para que assim possam alcançar um certo resultado, que se pode traduzir no afastar de uma desvantagem ou no alcançar uma utilidade. As partes, em regra, não se encontram obrigadas a adotar certos comportamentos, mas se o não fizerem não obterão determinadas vantagens ou daí poderá decorrer um prejuízo. Mas se assim é (…) são as mesmas que respondem pelos resultados negativos (para os seus próprios interesses) da sua conduta”. É o caso.

Do que fica dito retira-se que o acórdão recorrido, ao ter rejeitado a impugnação da matéria de facto e ao não ter convidado ao aperfeiçoamento das conclusões, não incorreu em qualquer desvalor processual.

Não se mostram, deste modo, violadas as normas legais que o Recorrente cita da conclusão H).

IV - DECISÃO

Pelo exposto acordam os juízes neste Supremo Tribunal de Justiça em negar a revista.

Regime de custas:

O Recorrente é condenado nas custas do recurso.

                                                           +

Sumário (art.s 663º, nº 7 e 679º do CPCivil)

                                                           ++

Lisboa, 18 de junho de 2019

José Rainho (Relator)

Graça Amaral

Henrique Araújo

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[1] Por exemplo os acórdãos (da formação de juízes a que alude o n.º 3 do art. 672º do CPCivil) de 19 de Março de 2015, de 12 de Março de 2015, de 14 de Maio de 2015, de 2 de Julho de 2015, de 8 de Outubro de 2015 e de 22 de Outubro de 2015, todos sumariados em www.stj/jurisprudência/sumários (da formação).
[2] Ver a propósito o acórdão do STJ de 29 de maio de 2012 (processo n.º 4146/07.6TVLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi) assim sumariado:
«I - As regras do ónus da prova (art. 342.º e segs. do CC) não têm a ver com o julgamento de facto pois neste, independentemente da sua natureza constitutiva, impeditiva, modificativa ou extintiva, cumpre ao juiz apreciar e valorar os factos de harmonia com as provas produzidas à luz do princípio da liberdade de julgamento (art. 655.º do CPC); tais regras têm a ver, sim, com questão de direito de saber em que sentido deve o tribunal decidir no caso de não se provarem determinados factos.
II - Quando o art. 516.º do CPC prescreve que “a dúvida sobre a realidade de um facto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita”, a dúvida que aqui se considera não é a dúvida do juiz no julgamento sobre a ocorrência de um facto atenta a prova produzida, pois, em caso de dúvida, impõe-se-lhe decidir no sentido de o facto não se considerar provado. A dúvida aqui equivale ao estado de incerteza sobre a existência do facto que não foi julgado provado a impor a repartição do ónus da prova contra a parte a quem o facto aproveita.»
[3] Este acórdão foi relatado pelo relator do presente acórdão. É aqui mencionado apenas por uma questão de reforço e coerência.
[4] Outra questão é ainda a de saber se a indicação e a transcrição devem ser levadas às conclusões, ou se é suficiente indicação e transcrição que constem do corpo da alegação. Trata-se de questão sobre que inexistem dúvidas na jurisprudência deste Supremo, de que é exemplo o acórdão de 3 de maio de 2016, Processo nº 145/11.1TNLSB.L1.S1, www.stj/jurisprudência/sumários), de cujo sumário se pode ler que:
I - Sendo função das conclusões do recurso indicar, embora de forma sintética, os fundamentos por que se pede a alteração (seja de facto seja de direito) da decisão, nelas tem o recorrente que impugna a matéria de facto que especificar os concretos factos que entende estarem mal julgados.
II - A aferição deste mau julgamento é a questão colocada à decisão do tribunal de 2ª instância e, como tal, tem de constar das conclusões ou estará então fora do objeto do recurso.
III - Já a especificação dos concretos meios de prova que impunham decisão diversa e o cumprimento da exigência indicada na alínea a) do nº 2 do art. 640º têm a sua sede própria no corpo da alegação, por isso que não se resolvem numa questão, são apenas o instrumento ou o meio que dá suporte à questão decidenda.
[5] Este acórdão foi relatado pelo relator do presente acórdão. É aqui mencionado apenas por uma questão de reforço e de coerência.
[6] Este acórdão foi relatado pelo relator do presente acórdão. É aqui mencionado apenas por uma questão de reforço e coerência.