Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
115187/17.9YIPRT.L1-7
Relator: DIOGO RAVARA
Descritores: TRANSPORTE MARÍTIMO
OBRIGAÇÕES DO EXPEDIDOR
DANOS NA MERCADORIA
LIBERTAÇÃO DAS MERCADORIAS
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/23/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I- No âmbito de um contrato de transporte de mercadorias por mar, sendo a mercadoria transportada em contentores, fica o expedidor obrigado a assegurar a libertação dos contentores logo que o destinatário receba ou rejeite a mercadoria no porto de destino.
II- Ainda que o destinatário rejeite a mercadoria ou parte dela, invocando a ocorrência de danos na mesma, e ainda que o transportador - e/ou, no caso da contratação de seguro de carga, a seguradora – seja(m) responsável(is) pelos danos sofridos na carga durante as operações inerentes ao transporte marítimo, descarga e movimentação das mercadorias no porto de destino, não deixa o expedidor de ter a obrigação de promover as diligências necessárias à libertação dos contentores em que se encontre a carga recusada.
III- Não o fazendo, sem prejuízo do eventual direito a ser ressarcido pelos danos na carga que possa assistir ao expedidor ou ao destinatário, fica o expedidor responsável pelos custos de estacionamento (quay) e sobrestadia (demurrage) inerentes à permanência dos contentores com a mercadoria rejeitada no porto de destino, aplicando-se neste domínio as regras dos contratos de aluguer e de depósito (arts. 1022º e segs., e 1185º e segs., do Código Civil).
IV- O art. 3º, nº 6 da Convenção Internacional Para a Unificação de Certas Regras em Matéria de Conhecimento de Carga, assinada em Bruxelas em 25-08-1924 não pode ser interpretado no sentido de impor ao transportador a obrigação de, em caso de ocorrência de danos na mercadoria transportada relativamente à qual foi outorgado contrato de seguro de carga, fornecer ao expedidor informação detalhada sobre o estado da mercadoria ou as causas dos danos.
V- O meio próprio para a obtenção dos elementos mencionados em IV é o inquérito ou perícia (survey), com vista ao acionamento do seguro de carga.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Relatório
A [ ... Trânsitos, Unipessoal, Lda] , pessoa coletiva nº 503... intentou procedimento de injunção contra B [ ...Agência Marítima, Lda], pessoa coletiva nº 5033..., invocando ser credora da requerida pela quantia de € 17.224,75, acrescida de juros de mora vencidos, no valor de € 3.098,29, bem como dos vincendos, à taxa legal, e ainda de € 40,00 a título de “indemnização pelos custos com a cobrança do presente valor em dívida”.
Para tanto alegou, em síntese, que na sequência de acordo celebrado com a requerida procedeu ao transporte de contentores desta, tendo emitido duas faturas, no valor global de € 17.224,75 acima referido, cujo pagamento a requerida recusou, alegando danos num dos contentores transportados.
Notificada a requerida, a mesma deduziu oposição, invocando a exceção de incompetência do Tribunal, por considerar competente para a causa o Tribunal Marítimo de Lisboa, e alegando que contratou com a requerente o transporte de três contentores, tendo pago o correspondente frete, e sustentando que um desses contentores sofreu danos, o que determinou a sua paralisação, situação que considera imputável à requerente, pelo que as faturas peticionadas não são devidas, nem podem ser-lhe imputadas.
Convidada a pronunciar-se acerca da exceção de incompetência, a autora pugnou pela sua improcedência.
Na sequência, foi proferido despacho com o seguinte dispositivo:
“(…) julgo procedente a exceção dilatória de incompetência absoluta deste tribunal invocada pela Ré por ser competente o tribunal de competência especializada marítimo, e em consequência declara-se o presente tribunal incompetente em razão da matéria para tramitar e decidir os presentes autos pelo que se absolve a Ré da presente instância.”
Notificadas as partes de tal decisão, veio a autora requerer a remessa do processo ao Tribunal Marítimo, nos termos do disposto no art. 99º, nº 2 do CPC.
Remetidos os autos ao Tribunal Marítimo, foi proferido despacho convidando a autora a pronunciar-se acerca da matéria de exceção invocada pela ré.
A autora correspondeu a tal convite, sustentando que as faturas invocadas no requerimento de injunção se reportam a custos de estacionamento e armazenagem relativos ao contentor cuja receção foi recusada, e que os riscos da ocorrência de danos na carga transportada são cobertos por seguro, e não são imputáveis à autora.
Seguidamente foi proferido despacho de gestão processual, no qual, nomeadamente, o Tribunal a quo identificou o objeto do litígio e enunciou os temas da prova nos seguintes termos:
“Identificação do Objeto do Litígio
Atento os contornos da factualidade alegada pelas partes e o pedido deduzido, o cerne do objeto do litígio centra-se em aferir as circunstâncias que ditaram a paralisação do contentor no seu destino final e subsequente estacionamento e armazenamento, a fim de apurar o responsável pelos respetivos custos adicionais gerados.
Temas de Prova
Para tanto, atenta a matéria controvertida nos autos e o objeto supra delimitado, os temas de prova reconduzem-se ao apuramento:
1º - do período de paralisação do contentor TCLU482416/7 no destino final;
2º - dos custos da paralisação do contentor faturados pela Autora à Ré;
3º - da causa da paralisação do contentor;
4º - da ausência de informação da Autora à Ré acerca dos motivos da recusa do contentor pelo destinatário e dos custos com a retirada da carga e paralisação do contentor;
5º - do pedido de instruções solicitado pela Autora à Ré acerca do destino a dar à carga danificada e do aconselhamento a acionar o respetivo seguro;
6º - da informação veiculada pela Autora à Ré acerca da existência de despesas com o estacionamento e armazenamento do contentor a cobrar.”
Realizou-se então audiência final, após o que foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
“Em face do exposto, julgo procedente a presente ação e, consequentemente, condeno a Ré B a pagar à Autora A a quantia de € 8.063,22 (oito mil e sessenta e três euros e vinte e dois cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendo à taxa legal desde 18.04.2015 até integral e efetivo pagamento, e a quantia de € 9.161,53 (nove mil cento e sessenta e um euros e cinquenta e três cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendo à taxa legal desde 23.05.2015 até integral e efetivo pagamento.”
Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação, na sequência do qual foi proferido acórdão com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, acordam os juízes nesta 7ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em:
i. Julgar improcedentes as invocadas nulidades da sentença recorrida;
ii. Anular a sentença recorrida e determinar a ampliação, esclarecimento e reformulação da decisão sobre matéria de facto, e da sua motivação, nos exatos termos e para os efeitos que acima se deixaram definidos, devendo, para o efeito, o processo baixar à 1.ª instância (art. 662º, nº 2, als. c) e d) do CPC);
iii. Considerar prejudicada a apreciação da impugnação da decisão sobre matéria de facto e do mérito da causa (art. 608º, nº 2, do CPC).
(…)”.
Devolvidos os autos ao Tribunal recorrido, veio a ser proferida nova sentença, com o seguinte dispositivo:
“Em face do exposto, julgo procedente a presente ação e, consequentemente, condeno a Ré B a pagar à Autora A a quantia de € 8.063,22 (oito mil e sessenta e três euros e vinte e dois cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendo à taxa legal desde 18.04.2015 até integral e efetivo pagamento, e a quantia de € 9.161,53 (nove mil cento e sessenta e um euros e cinquenta e três cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendo à taxa legal desde 23.05.2015 até integral e efetivo pagamento.
(…)”
Novamente inconformada, veio a ré interpor recurso de apelação, apresentando alegações cuja motivação culminou com as seguintes conclusões[1][2]:
1. Proferido Acórdão por esse Tribunal [Proc. n.º 115187/17.9YIPRT.L1] nos termos do qual foi demarcado ao Tribunal de 1ª Instância - Tribunal Marítimo de Lisboa - que, face à deficiente e obscura decisão tomada sobre a matéria de facto, efetuasse uma nova descrição dos factos dados como provados, numa reformulação substancial senão integral da decisão sobre a matéria de facto, efetuasse a devida motivação da decisão bem como a respetiva descrição dos meios de prova juntos aos autos e produzidos em audiência de julgamento, realizando uma análise discriminada dessa prova relativamente a cada facto ou conjunto de factos.
2. Sucede, contudo, que, não obstante a obrigação a que estava adstrito, o Tribunal a quo não procedeu conforme o determinado pelo Tribunal da Relação de Lisboa, mantendo uma decisão viciada, não procedendo à devida ampliação da decisão sobre a matéria de facto, nos termos prescritos, deixando matéria e questões abordadas pelas partes e pertinentes para uma boa decisão da causa por tratar, procedendo erradamente quer quanto aos factos que considerou não provados quer quanto à invocada motivação para a tomada dos mesmos, fazendo, em diversas partes da sentença proferida, uma análise crítica da prova deficiente, incorreta ou contraditória.
3. Face a esta situação, entende a recorrente que a douta sentença recorrida não deve manter-se uma vez que consubstancia uma solução que não consagra a devida, rigorosa e justa interpretação dos factos e uma aplicação ao caso sub iudice das normas e princípios jurídicos competentes.
4. Como se alcança do teor da ata da audiência de discussão e julgamento procedeu-se à gravação da audiência de discussão e julgamento que se destina a permitir a reapreciação e eventual alteração da matéria de facto em sede de recurso – vide o artigo 662.º do CPC. A ora recorrente requereu em tempo a reprodução da gravação da audiência de julgamento, pois o presente recurso tem também por objeto a reapreciação da prova gravada.
5. O Tribunal a quo não entendeu ou não quis entender o problema em causa nos presentes autos, já que desconsiderou a questão fulcral do sinistro ocorrido aquando da execução do contrato de transporte de mercadorias combinado celebrado entre recorrente e a recorrida – pese embora, agora já tenha dado como facto provado a existência do acidente [facto provado n.º 12 “Ocorreu um embate no exterior de um dos contentores, no decurso do transporte ou no destino final, que provocou estragos visíveis no contentor e, consequentemente, danos na mercadoria interiormente acondicionada.”], continuando, todavia, a não se debruçar sobre a verdadeira causa da paralisação do contentor danificado, cingindo-se à questão do acionamento tardio, em sua perspetiva, do seguro da mercadoria por parte da recorrente, descurando a razão pela qual tal seguro só pode ser, efetivamente, acionado decorrido cerca de um mês da data do evento, ou seja, do momento da recusa da mercadoria pelo destinatário.
6. Em face da sentença ora recorrida, não pode a recorrente deixar de manifestar a sua total discordância com o entendimento sufragado pelo Tribunal a quo, pelo que se propõe demonstrar a este Venerando Tribunal a real problemática, a qual não foi entendida por aquele Tribunal e cuja “confusão” e “deturpação” quer na questão em si quer no desenrolar da lide foi de tal forma que culminou com uma sentença desfasada da realidade factual e jurídica.
7. Importa assim demonstrar que o Tribunal a quo não quis apurar, relativamente ao período de paralisação do contentor sinistrado, a causa da sua ocorrência, qual o facto ou factos que determinaram que a mercadoria transportada no contentor acidentado lá permanecesse bem como não se interessou em avaliar os custos dessa paralisação e que foram faturados pela recorrida à recorrente, da sua legitimidade ou até da conformidade da sua emissão, como tão pouco procurou analisar a causa nem os efeitos da paralisação do contentor.
8. Dos seis temas de prova definidos, o Tribunal a quo manteve-se absorvido pelos dois últimos [do pedido de instruções solicitado pela Autora à Ré acerca do destino a dar à carga danificada e do aconselhamento a acionar o respetivo seguro (5º tema de prova) e da informação veiculada pela Autora à Ré acerca da existência de despesas com o estacionamento e armazenamento do contentor a cobrar (6º tema de prova)], cingindo o seu pensamento basicamente a essas questões, desconsiderando as restantes.
9. Em franco atropelo aos delimitados temas de prova, o Tribunal a quo focou-se única e exclusivamente na seguinte questão: “aquele contentor não foi libertado em tempo para fazer outros serviços, estando a ocupar espaço. Só isso. A razão não é a avaria no contentor nem quem provocou a avaria no contentor” ((20190909141259_16294_64673, minuto 17:19 a 17:40). Esta frase centraliza a exclusiva preocupação do Tribunal a quo não só no decurso da produção de prova em audiência de julgamento como na sentença proferida.
10. Para um melhor entendimento da questão sub judice, a factualidade resume-se da seguinte forma: A recorrente solicitou à recorrida a prestação de serviços de transportes de mercadorias, a saber: prestação de um serviço de transporte combinado (parte terrestre + parte marítima) desde o porto de Setúbal até ao destino final em CHURCHSTOKE – MONTGOMERY - SY156AR POWYS – Reino Unido.
11. O serviço era composto pelo transporte até ao destino final de três contentores tipo 45 HPW.
12. Pelo transporte de cada contentor, a recorrida cobraria o valor de 1875 EUR, valor que veio a ser debitado à recorrente e por esta devidamente pago a 01/04/2015.
13. A recorrente procedeu à reserva, no dia 15/01/2015, de três contentores tipo 45 HPW, tendo os mesmos sidos entregues no porto de Setúbal a 20/01/2015.
14. Os contentores atribuídos à recorrente apresentavam as seguintes identificações: CRXU050386/8, TCLU480073/5 e TCLU482416/7.
15. Os referidos contentores foram entregues no porto de Setúbal sem qualquer tipo de indicação de anomalia, conforme BL (Bill of Lading).
16. A recorrida procedeu ao transporte dos aludidos contentores até ao destino final procedendo à entrega no destino final Churchstoke Montgomery, Reino Unido, a 03/02/2015.
17. A 03/02/2015, a recorrente foi informada pelo transportador, ora recorrida, que o destinatário havia recusado o contentor TCLU482416/7 uma vez que este apresentava danos visíveis que afetariam a totalidade ou, pelo menos, parte da mercadoria que se encontrava no seu interior.
18. Face à recusa de recebimento da mercadoria por parte do importador, a recorrente solicitou à recorrida informação sobre o sucedido, uma vez que não sabia de qua parte de mercadoria estava a mesma a falar. Seria de uma palete, cinco, dez?
19. Entre 06/02/2015 a 24/02/2015, ou seja, por dezoito dias seguidos, a recorrida não prestou qualquer informação ou esclarecimento à recorrente, inexistindo qualquer troca de correspondência entre as mesmas.
20. No dia do evento – da entrega da mercadoria no destino final – a recorrente fica a saber da recusa do recebimento por se presumirem danos atenta a considerável amolgadela lateral que o contentor apresentava, conforme fotografias remetidas e juntas aos autos.
21. Até 26/02/2015 a recorrente apenas sabia que parte da carga tinha sido recusada, continuando a não receber informação concreta, por parte da recorrida, relativamente à quantidade danificada. Desconhecendo, assim, a recorrente de que quantidade se tratava.
22. Só a 26/02/2015 quando recebe o documento comprovativo de entrega ao cliente (POD) é que a recorrente toma conhecimento efetivo da quantidade de mercadoria danificada.
23. A recusa não se deu por qualquer motivo comercial. A recusa pretendeu-se com o facto de parte da mercadoria estar danificada por força do sinistro ocorrido contra o contentor TCLU482416/7 que continha aquela mercadoria (garrafas de vidro) aquando do transporte efetuado pela recorrida.
24. As imagens do contentor danificado, cujas fotografias foram juntas aos autos com a oposição à injunção sob os documentos n.ºs 5 e seguintes, são elucidativas do abalroamento sofrido no contentor, concretamente na parte lateral, deixando-o severamente danificado.
25. A 26/02/2015, ou seja, passados 23 dias desde a recusa, a recorrente recebe por fim a informação solicitada à recorrida e que aguardava para poder dar andamento ao processo, tendo sido de seguida acionado o seguro da carga.
26. A 11/03/2015, a recorrente solicitou à recorrida informações sobre localização da carga.
27. Entre 25/03/2015 e 08/04/2015 a recorrente não obteve qualquer informação por parte da recorrida, inexistindo troca de correspondência entre as partes.
28. A 08/04/2015, face à falta de informação, a recorrente solicitou informações à recorrida, reiterando a 13/04/2015, data em que a recorrida, em resposta às solicitações da recorrente, informou-a de que a peritagem havia tido lugar a 08/04/2015.
29. A 22/04/2015 a recorrente informou a recorrida de que o contentor tinha que ser descarregado conforme instruções do perito.
30. A 23/04/2015 a recorrida remeteu à recorrente cópia de duas faturas com débitos no valor de cerca de € 17.000,00, faturas essas que a recorrente de imediato reclamou e que foram impugnadas na presente ação.
31. ASSIM SENDO, importa constatar que a paralisação do contentor resultou única e exclusivamente de um ACIDENTE ocorrido aquando da execução do transporte das mercadorias por parte da recorrida – acidente esse que, como de seguida se demonstrará, provocou manifestos estragos no próprio contentor e, por consequência, danos em parte da mercadoria interiormente acondicionada.
32. Face ao ocorrido sinistro – ocorrência de uma situação externa / ato do transportador ou seu subcontratado – deveria a recorrida ter diligenciado por uma peritagem, como aconteceu já em outras situações semelhantes à dos autos.
33. Tal paralisação do contentor vem igualmente a agravar-se por força da reiterada falta de informação da recorrida, ao longo de um considerável período de tempo (concretamente entre 06/02/2015 a 24/02/2015 e entre 25/03/2015 e 08/04/2015), fazendo com que, com esse comportamento omissivo e relapso da sua parte, venha a atrasar todo o processo, inviabilizando o acionamento do seguro e a consequente peritagem em momento anterior.
34. Durante grande parte do tempo, a recorrida não respondeu aos pedidos de informação que lhe foram dirigidos pela recorrente.
35. O cliente da recorrente, o importador da mercadoria, só pode acionar o seguro de transporte de mercadorias passado vinte e três dias depois do ocorrido, tendo-se procedido então, à peritagem. A recorrida nunca foi capaz de informar onde ocorreu o acidente com o contentor, assumindo que o mesmo tenha tido lugar aquando da sua prestação de serviços. Mas não obstante tal facto, adotou ao longo do processo (designadamente nos supra aludidos decursos de tempo) uma atitude totalmente passiva.
36. POSTO ISTO, a recorrente entende que a sentença proferida pelo Tribunal a quo mantem vícios relativamente à matéria de facto dada como provada e dada como não provada, continuando, também, a não efetuar uma cabal e imprescindível motivação da decisão sobre a matéria de facto, procedendo, por consequência, a um errado enquadramento jurídico.
ASSIM VEJAMOS,
QUANTO AO RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO:
37. Atenta a nova reformulação quanto à matéria de facto dado como provada e como não provada pelo Tribunal a quo, é de realçar, antes de mais, o seguinte:
38. NO QUE CONCERNE À MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA, o Tribunal a quo transcreveu, ipsis verbis, nos pontos 15 a 52 e 54 a 57, ou seja, em 42 dos factos dados como provados, o exato teor dos emails trocados pelas partes desde 03/02/2015 a 22/04/2015, sendo que, inclusivamente, alguns desses emails se encontram redigidos em inglês.
39. Ora, julga a recorrente que os factos dados como provados deveriam consistir não na dita transcrição, mas antes na conclusão a que o Tribunal a quo deveria ter chegado após análise dessa documentação (emails) conjuntamente com a demais prova, designadamente os depoimentos testemunhais e as declarações de parte prestadas em sede de audiência de julgamento.
40. Salvo melhor opinião, os emails são documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa, consubstanciando assim a prova documental bem como testemunhal ou as declarações de parte os chamados meios de prova.
41. Na parte da motivação, o Tribunal a quo afirmou que: A convicção sobre a verificação dos factos julgados provados sob os pontos 15. a 52. e 54. a 57. resultou da apreciação, crítica e conjunta, das declarações prestadas por Diogo...e José .... e ainda dos depoimentos prestados por Nicole .....e João ..... (todos confirmando a troca de comunicações eletrónicas juntas aos autos, nos termos já referidos) e dos documentos juntos a fls. 15v/20v, 74v/76 e 78/87 (comunicações eletrónicas em causa, que confirmam os factos em apreço).
42. Considera antes a recorrente que o Tribunal a quo deveria ter inserido a factualidade que entendia dar como provada nos aludidos pontos 15 a 52 e 54 a 57 e depois, sim, demonstrar que a sua convicção advinha do email x ou y e/ou dos depoimentos da testemunha A ou B. Mas jamais transcrever todos os emails, dando-os como factos provados, baseando a sua convicção nesses mesmos emails.
43. Acresce que a extensão da factualidade dada como provada e vertida nos pontos 15 a 52 e 54 a 57, em que o Tribunal a quo dá como provados 42 factos, não permite, também, que na exposição da convicção sobre a verificação dos factos julgados como provados se faça uma remissão global, geral a indiferenciada para as declarações de parte e/ou depoimentos prestados pelas testemunhas, antes se impondo uma referência concreta, circunstanciada e individualizada em relação aos factos ou conjunto de factos dados como provados atenta a prova produzida.
44. Para além disso, os pontos dos factos dados como provados nos quais o Tribunal a quo transcreveu o teor integral dos emails trocados pelas partes vão ter o efeito de abarcar dentro de um mesmo ponto dado como provado imensa e distinta factualidade.
45. No facto 12 dado como provado pelo Tribunal a quo, o Tribunal referiu que: “Ocorreu um embate no exterior de um dos contentores, no decurso do transporte ou no destino final, que provocou estragos visíveis no contentor e, consequentemente, danos na mercadoria interiormente acondicionada”.
46. Ora, em nossa opinião, o Tribunal deveria ter identificado concretamente qual o contentor danificado já que é inequívoca a prova existente quanto a esse facto. O email inicial da recorrida, de 03/02/2015, refere desde logo qual o contentor danificado – tratava-se do contentor TCLU482416/7.
47. As testemunhas quer da recorrente quer da recorrida identificam também o contentor danificado nos seus depoimentos, referindo a testemunha Nicole ....que: “O BL tinha 4 ou 5 contentores e que o contentor em concreto quando foi entregue o recebedor da mercadoria rejeitou a entrega” (20190909143305_16294_64673, minuto 03:00 a 03:20). No mesmo sentido, a testemunha João .....indicou que no dia da entrega “O cliente estava a recusar a mercadoria daquele contentor” 20190909151216_16294_64673, minuto 02:18 a 02:38).
48. Essa prova testemunhal certificada pela documental, designadamente os emails trocados pelas partes e em concreto o aludido email do dia 03/02/2015 impunham que a enunciação do facto 12 dos factos dados como provados fosse redigida em termos mais precisos.
49. O facto 12 dos dados como provados deverá passar a ter seguinte formulação: Ocorreu um embate no exterior contentor TCLU482416/7, no decurso do transporte ou no destino final, que provocou estragos visíveis nesse contentor e, consequentemente, danos na mercadoria interiormente acondicionada.
50. No facto 13 dado como provado pelo Tribunal a quo, estabeleceu este que: “O destinatário da mercadoria danificada recusou o seu recebimento”.
51. Ora, também aqui o Tribunal a quo pecou pela falta de concretização.
Se num primeiro momento houve dúvidas quanto à recusa ser total ou parcial, ao longo do processo foi-se desvendando, pela produção e confronto da prova, quer documental quer testemunhal, que a recusa da mercadoria foi parcial, conforme documento remetido em anexo ao email enviado pela recorrida à recorrente em 26/02/2015.
52. Portanto, apreciada devidamente a prova, era forçoso concluir-se que, se inicialmente havia dúvidas quanto à recusa total ou parcial da mercadoria acondicionada no contentor acidentado, essas dúvidas viriam a ser esclarecidas com o envio do documento [POD (Proof[3] of delivery)] em 26/02/2015, confirmando-se que apenas parte da mercadoria havia sido recusada por força dos danos ocorridos no contentor onde fora transportada.
53. A prova testemunhal foi também elucidativa quanto a este ponto. O gerente da recorrente, Diogo ..., referiu que: “O contentor quando chegou ao destino final apresentava danos. Não foi retirada a mercadoria de dentro do contentor ou foi uma parte.” (20190909141259_16294_64673, minuto 01:53 a 02:15)
54. Referindo também que: “Só passados 25/26 dias é que percebemos que uma parte da mercadoria estava em condições e foi descarregada no cliente e outra parte que estava dentro do contentor e não estava em condições de ser descarregada.” (20190909141259_16294_64673, minuto 03:00 a 03:27). Pelo que houve uma parte que foi recebida e outra que não.
55. A testemunha João ... certificou também que apenas parte da mercadoria não foi recebida, quando mencionou, em instâncias do seu depoimento que: “O cliente recusou descarregar o contentor a partir do local do embate, do dano no contentor. Presumia danos” (20190909151216_16294_64673, minuto 06:30 a 06:45).
56. As fotografias juntas aos autos com a oposição à injunção (Docs. 5 a 8) são elucidativas do forte embate sofrido na parte lateral do contentor.
57. De modo que o facto 13 dado como provado deverá passar a ter a seguinte redação: O destinatário da mercadoria danificada recusou o recebimento de parte da mercadoria inserida no contentor acidentado TCLU482416/7 atentos os danos apresentados no contentor.
58. No facto 59 dos dados como provados, considerou o Tribunal a quo que: “A Requerente emitiu as seguintes faturas referentes a despesas de estacionamento e armazenamento do contentor: Fatura n.º AELIS/2261208 emitida em 19/03/2015 e com vencimento a 19/04/2015, no valor de € 8 063,22, cuja cópia foi junta a fls. 88; Fatura n.º AELIS/2261913 emitida em 23/04/2015 e com vencimento a 23/05/2015, cuja cópia foi junta a fls. 88v.”
59. Ora, salvo o devido respeito pela opinião contrária, a recorrente entende que este facto não podia ter sido julgado como provado nos termos em que foi. Vejamos:
60. Quanto à análise destas duas faturas – cerne da questão dos autos – verifica-se que houve uma total incúria na sua apreciação pelo Tribunal a quo, sendo certo tais faturas revestem uma importância crucial já que nelas se sustentou o pedido formulado pela recorrida. É na emissão destas faturas que está a origem da questão sub judice e onde radica a divergência das partes.
61. Conforme prova documental existente nos autos (documento n.º 4, fls. 1 e 2, junto com a oposição à injunção) a recorrida enviou email à recorrente a 03/06/2015, com a indicação dos fretes que se encontravam vencidos para liquidação. A esse email, a recorrente respondeu a 04/06/2015, cfr. fl. 1 do referido documento.
62. Bom, em primeiro lugar, verifica-se deste documento que a recorrida englobou, na listagem, o alegado frete correspondente à fatura 2261208, de € 8.063,22, não tendo englobado a fatura 2261931, de 23/04/2015, de € 9.161,53, fatura esta que já estaria nessa data vencida.
63. Em segundo lugar, a própria recorrida assume que se tratava de fretes e não de quaisquer despesas de estacionamento e armazenamento como veio depois alegar em sede contenciosa.
64. Por fim, a recorrente informou a recorrida que a indicada fatura (fatura 2261208, no valor de € 8.063,22) não se encontrava contabilizada dada sua não aceitação.
65. O Tribunal não avaliou tal documentação, como era sua obrigação, nem teceu qualquer consideração, como deveria ter feito, quanto à sua correspondência ou não em relação aos serviços alegadamente prestados pela autora à ré, e por aquela judicialmente peticionados.
ACRESCE QUE,
66. O Tribunal não se debruçou sobre a questão basilar de a recorrida ter a peticionado à recorrente o pagamento de uma quantia alegando corresponder a CUSTOS de ESTACIONAMENTO e de ARMAZENAMENTO, quando na descrição dos serviços indicados nas faturas colocou “frete e despesas”, nada aludindo quanto a tais custos.
67. Ora, o frete foi pago pela recorrente, tal como ficou provado (facto provado 7), pelo que não se entende nem é possível descortinar a que corresponderia o valor indicado em cada uma das faturas (fatura n.º 2261208 no valor de € 8.063,22 e fatura n.º 2261913 no valor de € 9.161,53) … E, quanto, a despesas … Mas que despesas? Quais? Que valor em concreto indicou a autora como despesas tidas? Qual o período contabilizado?
68. A recorrida não concretizou, nas ditas faturas, que serviços pretendia efetivamente cobrar.
69. Certo é que a recorrida peticionou erradamente, nas duas faturas em questão, o pagamento de “frete” quando já havia emitido fatura para cobrança desse serviço e já havia recebido o valor.
70. Certo é, também, que a autora, ora recorrida, erradamente peticionou o pagamento de “despesas” nas referidas faturas, quando já havia emitido fatura anterior com a cobrança desse serviço e já tinha também recebido o valor.
71. Repare-se que a fatura n.º 2260137, no valor de € 5.625,00 junta aos autos sob o documento n.º 1 com a oposição à injunção, foi liquidada pela ré (facto provado 7) e corresponde precisamente ao frete e despesas do transporte de mercadorias dos três contentores.
72. Não obstante o referido, acresce ainda que, em relação às aludidas faturas:
Para que pudesse cobrar os alegados custos de estacionamento e armazenagem, a recorrida teria de ter descrito nas faturas, em relação a cada contentor, o período inicial e final do estacionamento, o período grátis, e que, no caso dos presentes autos, ficou demonstrado corresponder a uma semana [conforme depoimento prestado pela testemunha da autora, Nicole ..., (2019090914335_16294_64673 minuto 11:38 a 12:55)], a unidade (n.º de contentores em causa), a taxa, o preço respetivo e a final, então, o valor global.
73. Na parte da descrição das faturas constata-se apenas a indicação de “frete e despesas” e o valor, € 8.063,22 na fatura n.º 2261208 e € 9.161,53 na fatura n.º 2261913.
74. DE FACTO, das faturas não consta sequer qualquer menção individual aos contentores (repare-se que os três contentores tiveram seguimentos distintos após a chegada ao destino final).
75. Repare-se que os alegados custos de paralisação respeitariam apenas a um contentor – o contentor danificado TCLU482416/7 – mas as faturas nada dizem em relação a isso...
76. Inexistem os elementos essenciais para que a recorrida pudesse peticionar um pagamento referente a um período de estacionamento e armazenamento de contentor que não invoca ou justifica de forma alguma, período esse, sublinhe-se, que a recorrida não indicou.
77. As faturas são omissas quanto aos alegados custos de imobilização e armazenamento,
78. A estas ilações deveria ter chegado o Tribunal a quo. Tendo dado essa documentação (as faturas) por reproduzida, não se manifestou quanto a ela, concretamente no que concerne ao seu teor, alcance e efeitos.
79. O Tribunal a quo não valorizou ainda, no tocante aos custos de paralisação do contentor, o documento n.º 4 junto com a oposição à injunção (email de 04/05/2015 de Diogo ..., da recorrente, para José ..., gerente da recorrida) nos termos do qual a recorrente questiona precisamente a recorrida quanto ao fundamento para lhe debitar tais custos quando, na situação em causa, o contentor chegou claramente ao destino por motivos alheios quer à recorrente quer ao seu cliente, cfr. imagens das fotografias existentes do contentor danificado (documento n.º 5 a 8 juntos com a oposição à injunção). Nesta situação – em que patentemente os danos sofridos na carga resultam do dano sofrido no contentor enquanto estava entregue ao transportador – a recorrida deveria ter retornado a um armazém e descarregado a mercadoria por forma a evitar tais custos.
80. A prova produzida em sede de audiência e discussão de julgamento confirmou que este é o procedimento normal a ser adotado pela recorrida em situação de sinistro.
81. Assim vejamos: A testemunha apresentada pela recorrida, Nicole ......, tendo iniciado o seu depoimento respondendo afirmativamente à pergunta colocada pela mandatária da recorrida sobre se incumbe ao cliente, independentemente da causa do dano, pedir o seguro (2019090914335_16294_64673 minuto 05:20 a 05:39), vem no decurso do seu depoimento a contradizer o dito inicialmente explicando que não é bem assim, que depende das situações e das circunstâncias.
82. E assim, em sede de resposta à pergunta formulada pelo Meritíssimo Juiz refere que acontecem situações destas com alguma frequência. Esclarecendo que as mercadorias ficam em média uma semana (2019090914335_16294_64673 minuto 11:40 a 12:55). Explicando que em caso de tomate (mercadorias perecíveis) devolvem o contentor cobrando pela viagem um preço mais reduzido.
83. Elucidou ainda que “nestas situações em que a carga é devolvida é porque sei lá o tambor tombou ou qualquer coisa, portanto nada tem a ver connosco, A”. “Nós, A, nada temos a ver se a carga oscilou ou não. Não somos responsáveis pela estiva do contentor”. (2019090914335_16294_64673 minuto 12:58 a 13:40)
84. Referiu ainda que às vezes não cobram o período que o contentor está no parque a aguardar. “às vezes pode haver uma situação em que alguém diga para não se debitar as demoras. (2019090914335_16294_64673 minuto 12:30 a 13:00).
85. Informando, também, o tribunal que: “às vezes pedimos o sorve” (2019090914335_16294_64673 minuto 14:50 a 15:08). Dando como exemplo uma situação em que o contentor sofre um embate,  um sinistro, durante a navegação e tal é detetado logo aquando do desembarque no porto, referiu que: pode ser feito o survey logo no cais se der conta que o contentor está danificado.
86. Ora, toda esta informação prestada pela testemunha Nicole .... não foi tida em linha de conta no raciocínio tido pelo Tribunal. Senão vejamos:
A testemunha referiu claramente que uma situação é a de transporte de mercadorias perecíveis, como por exemplo o tomate (que se podem estragar durante o trajeto) ou o transporte de mercadorias com má estiva (deficiente ou mau acondicionamento da mercadoria no contentor). Situações essas que, conforme expressão sua, nada têm a ver com a A.
87. Outro caso, totalmente diferente, acontece quando se está perante um fator externo – acidente ou embate no contentor – enquanto o mesmo se encontra entregue ao transportador.
88. Nesta situação, o dano não foi provocado pela própria mercadoria ou pelo seu mau acondicionamento, o dano foi provocado por um ato do transportador ou seu subcontratado.
89. Razão pela qual, em situações desse tipo, o transportador pede logo um survey a ser realizado no próprio cais. Tendo a testemunha concluído que: “em situações de sinistro a Malandres pede survey“(2019090914335_16294_64673 minuto 19:58 a 20:40).
90. Fica, assim, também demonstrado que a peritagem não foi pedida pela recorrida para se realizar no próprio cais de Liverpool, porque no caso em apreço não se verificou se o contentor estaria já danificado aquando do desembarque. Tal verificação só vem a ser efetuada aquando da entrega da mercadoria nas instalações do importador/cliente.
91. Não obstante tratar-se de um fato externo provocado contra o contentor, causando-lhe sérios danos, cujas imagens não deixam qualquer dúvida, afetando inevitavelmente parte da mercadoria, a recorrida não quis tratar da situação, eximindo-se de qualquer responsabilidade, assumindo uma postura passiva, descuidada e negligente.
92. O próprio gerente da recorrida veio a dizer, em sede de declarações de parte prestadas, em resposta à pergunta se pedem survey em situações de acidente que: “sim, sim, há diversas situações pelas quais se pode pedir um survey” (20190909145802_16294_64673 minuto 07:40 a 08:34).
93. Acrescentando que: “A A não vai pedir nenhum survey porque não tem interesse em fazê-lo evidentemente. Não vai pedir nenhum survey só porque sim.”
(20190909145802_16294_64673 minuto 09:23 a 09:30). 
94. Assumindo ainda que: “Nós não sabemos o que aconteceu.” (20190909145802_16294_64673 minuto 09:45 a 09:50). E que: “De facto foi pedido um survey mas não foi por nós.” (20190909145802_16294_64673 minuto 10:15 a 10:20).
95. Do depoimento do gerente da recorrida atesta a posição da companhia, enquanto transportadora, no sentido de ter optado desde o início por nada fazer, nenhuma diligência requerer, para a resolução da situação, pese embora soubesse que se tratava de um sinistro ocorrido no contentor enquanto estava à sua guarda. E neste pressuposto nadou todo o processo, considerando que nenhuma medida tinha de tomar não obstante aquele gerente ter dito que há várias situações em que a companhia pede uma peritagem e da testemunha da recorrida, Nicole ..., referir que em situações de sinistro a companhia pede a peritagem.
96. No caso sub judice, a recorrida resolveu adotar um procedimento distinto do habitual, não pedindo qualquer “survey”, entendendo que nada tinha de fazer senão aguardar instruções. Nem sequer promoveu um “survey” conjunto, como vem a referir e que se faz nesse tipo de situações (20190909145802_16294_64673 minuto 11:45 a 12:55).
97. Declarando ainda o gerente da recorrida que nem sabia qual o destino dado ao dito contentor, se havia sido reparado, se estava parado ou se havia voltado ao circuito de navegação. (20190909145802_16294_64673 minuto 13:00 a 13:28).
98. CONCLUI-SE, ASSIM, QUE: a recorrida vem, inclusive, pedir custos do aluguer de um contentor, que ficou severamente danificado por força do acidente sofrido, e em relação ao qual desconhece se veio a ser reparado ou se ficou inutilizado. Sendo absolutamente infundada a sua pretensão de imputar custos pela não reutilização do contentor quando nem sequer sabe se estava em situação de poder ser reutilizado, face aos danos sofridos, danos esses sofridos na execução do contrato de transporte.
99. É o comportamento omisso da recorrida, e não da recorrente, que vai determinar a dilação no tempo, a não realização da peritagem em momento anterior e a consequente não libertação da mercadoria danificada.
100. Tanto assim é que ficou demonstrado que logo ab initio a recorrida nem soube, nem cuidou de saber, para onde tinha ido o contentor danificado depois de ter sido recusado o recebimento da mercadoria.
101. A testemunha Nicole ... referiu claramente que não sabia se o contentor foi para o parque do camionista ou não. O contentor saiu logo de casa do cliente porque é assim que se passam as coisas (2019090914335_16294_64673 minuto 19:27 a 19:50). “Foi levado pelo camionista não sei se para as instalações deles ou não”.
102. Tal informação encontra plena concordância com os restantes depoimentos prestados e ainda com a prova documental, designadamente os emails trocados entre as partes.
103. Na verdade, a recorrida não sabia qual a localização do contentor, ou seja, desconhecia para onde o camionista o havia levado, conforme email, de 04/01/2017 de Diogo ... para José ..., constante do documento n.º 9 junto aos autos com o requerimento da ré com a refeª: 29638869). A 08/04/2015, questionada pela recorrente, a recorrida diz que anda a ver onde se encontrava o contentor…
104. Da prova produzida resulta que ficou claramente demonstrada a falta de fundamento para que a recorrida imputasse à recorrente os alegados custos de paralisação e armazenamento do contentor.
105. Caso o tribunal a quo tivesse apreciado e valorado a prova produzida (quer documental quer testemunhal) a sentença proferida, ao invés de imputar a responsabilidade à recorrente pelos custos de imobilização do contentor danificado e não libertação da carga, teria assacado as devidas responsabilidades a quem de direito, ou seja, à recorrida, a qual que não adotou o procedimento normal neste tipo de avaria sucedida no contentor e que, ademais, assumiu um comportamento relapso ao longo da situação, não fornecendo à recorrente os elementos e informações necessárias para a viabilização da peritagem, com isso atrasando todo o processo.
106. Os dois primeiros temas da prova traçados pelo Tribunal “a quo” eram, precisamente, o período de paralisação do contentor TCLU482416/7 no destino final e os custos de paralisação do contentor faturados pela autora à ré, temas estes não apurados e em relação aos quais a autora não fez a competente prova, conforme supra demonstrado.
107. De modo que as duas faturas emitidas pela recorrida não podem ter-se como referentes a despesas de estacionamento e armazenamento do contentor por todos os motivos e factos supra descritos.
108. E, assim, o facto 59 dos dados como provados deverá ser redigido nos seguintes termos: A Requerente emitiu as seguintes faturas: Fatura n.º AELIS/2261208 emitida em 19/03/2015 e com vencimento a 19/04/2015, no valor de € 8 063,22, cuja cópia foi junta a fls. 88; Fatura n.º AELIS/2261913 emitida em 23/04/2015 e com vencimento a 23/05/2015, cuja cópia foi junta a fls. 88v.
109. Quanto ao facto 60 dos factos dados como provados pelo Tribunal a quo: “As referidas faturas foram lançadas no extrato da conta-corrente aberto em nome da Ré, que não realizou o seu pagamento”.
Inexiste suporte – documental ou testemunhal para a afirmação de que as faturas foram lançadas no extrato da conta-corrente aberto em nome da Ré, já que esta não juntou aos autos documento comprovativo, como por exemplo a conta-corrente, bem como nem a testemunha a recorrida nem o gerente referiram ou corroboraram tal afirmação.
110. Pelo que, o facto 60 dos dados como provados deverá passar a ter a seguinte redação: As referidas faturas não foram pagas pela Ré.
111. Além destas retificações que se impõem aos mencionados Factos 12, 13, 59 e 60 dos factos dados como provados, constata-se ainda que o Tribunal a quo deu como não provados, entre outros, os seguintes factos:
c)Desde 06.02.2015 a 24.02.2015, a Autora não prestou qualquer informação ou esclarecimento à Ré.
h)Em 08.04.2015, face à falta de informação, a B solicitou informações à A.
i)Em 08.04.2015, a B obtém informação da A de que andavam a tentar localizar o contentor.
j) A paralisação do contentor resultou de um abalroamento exterior ocorrido contra o contentor, provocado pela Autora, no decurso do transporte ou no destino final.
112. Em relação à alínea c) dos factos da dos como não provados:
Tal como deu como provado no Ponto 51 que: “Entre os dias 25.03.2015 e 08.04.205 não existiram comunicações entre a Autora e a B”, deveria o Tribunal a quo ter dado como provado que entre os dias 06.02.2015 e 24.02.2015 não existiram comunicações entre a Autora e a B.
113. Vejamos: tendo dado como provado o facto 51 (Entre os dias 25.03.2015 e o 08.04.2015 não existiram comunicações entre a Autora e a B) baseando-se, para tal, na prova documental dos autos, concretamente nos emails trocados entre as partes, deveria o Tribunal a quo ter tido o mesmo procedimento quanto ao facto dado como não provado de que entre 06.02.2015 e 24.02.2015 a Autora não prestou qualquer informação ou esclarecimento à Ré, dando-o como provado já que os mesmos emails juntos aos autos isso refletem.
114. Além disso, o próprio elenco cronológico levado a cabo pelo Tribunal a quo na redação dos factos que veio a considerar como provados demonstra que entre o dia 06.02.2015 (Facto 24) e o dia 24.02.2015 (facto 25) inexiste comunicação entre as partes.
115. De facto, entre 06/02/2015 e 24/02/2015, por um período de dezoito dias seguidos, a recorrente não conseguiu obter qualquer informação por parte da recorrida, conforme págs. 18 e 19 do documento n.º 4 juntos aos autos pela autora no seu requerimento de refª 29638869.
116. De acordo com as declarações de parte prestadas pelo gerente da recorrente, Diogo ..., ficou claramente demonstrado que: Nós até ao dia 26/27 de fevereiro não sabíamos absolutamente nada (20190909141259_16294_64673, minuto 05:20 a 06:20). 
117. Não se descortina por que razão o Tribunal a quo, para o mesmo tipo de análise de factos, usou diferente metodologia, vindo a dar, erradamente, como não provado o aludido período temporal quando a documentação existente nos autos atesta precisamente o contrário e o próprio Tribunal assim procedeu no seguimento que veio a dar à exposição dos factos dados como provados, tendo tecido, de resto, esse raciocínio para o facto 51 dos dados como provados.
118. Em relação às alíneas h) e i) dos factos dados como não provados:
E igualmente quanto aos factos dados como não provados de que a 08.04.2015, a B solicitou informações à A e de que a 08.04.2015 a B obtém informação da A de que andavam a tentar localizar o contentor, o Tribunal não atendeu à prova produzida e não usou da metodologia adotada designadamente quanto ao facto provado 51.
119. É foi a própria recorrida no documento n.º 9 (Email de 04.01.2017 – fl. 7 e 8) por si junto aos autos com o requerimento de refª 29638869 quem mencionou e aceitou essa factualidade de que a recorrente lhe havia solicitado informações a 08/04/2015 e de que informou que andavam a ver onde se localizava o contentor.
120. Razão pela qual não se compreende o motivo pelo qual o Tribunal a quo procedeu a um tratamento diferenciado em relação ao mesmo tipo de questão, vindo a dar um facto como provado (facto 51) e os restantes como não provados, quando todos são firmados pela documentação junta aos autos.
121. O gerente da recorrida informou que o survey não pôde ser pedido antes porque eles (recorrida) não sabiam onde estava o contentor. “Nós não sabíamos onde estava a mercadoria (…) A mercadoria foi ao destinatário, descarregou-se 14 paletes e depois a partir daí nós não temos informação nenhuma onde estava a mercadoria” (20190909141259_16294_64673, minuto 14:20 a 14:47).
122. Em relação à alínea j) dos factos dados como não provados (A paralisação do contentor resultou de um abalroamento exterior ocorrido contra o contentor, provocado pela Autora, no decurso do transporte ou no destino final) não se concebe como tal facto foi considerado como não provado ao invés de ter sido dado como assente  pelo Tribunal a quo.
123. Vejamos: Assente que está que nos autos foi celebrado pelas partes um contrato de transporte combinado (parte marítimo e parte terrestre), provado que os três contentores foram entregues no porto de Setúbal sem qualquer tipo de indicação de anomalia (facto provado 10) e que no dia 03.02.2015, através da colaboradora da Autora, Marina ...., foi remetido email ao Sr. João ..., colaborador da Ré, a informar que um dos contentores havia sido recusado no recebedor, em virtude de danos na carga (factos 12 e 13) conjugados estes factos com a inexistência de qualquer reserva aquando da chegada dos contentores ao porto de Liverpool (cfr. depoimento testemunhal, designadamente de Nicole ...) e de nada constar no POD (proof of delivery ou comprovativo de entrega), documento esse remetido pela autora à ré no email de 26/03/2015 (cfr. documento n.º 4 junto com o requerimento refª 29638869) e descrito pelas testemunhas Nicole ... e João ...., quanto a, eventuais, anomalias ou reservas aos contentores, há que concluir que o sinistro terá ocorrido no decurso do transporte terrestre da mercadoria do porto de Liverpool para o destino final, ou seja, em plena execução do contrato.
124. Conforme email de 03/03/2015, às 15:13, remetido pela recorrida, na pessoa de Joe .... a João ..... e Diogo ...., com conhecimento, entre outros, de Nicole ...e José ...., testemunha e gerente da recorrida “I don´t dispute it may be the case that the damage occurred whilst in our care” [realce nosso].
125. Face a toda essa factualidade, outra conclusão não poderia retirar-se que não a de que a paralisação do contentor resultou de um abalroamento exterior provocado pela autora no decurso do contrato de transporte.
126. De modo que, o facto dado como não provado pelo Tribunal a quo na alínea j) deverá passar a constar dos factos provados.
127. E, PORTANTO: Em relação às referidas alíneas c), h), i) e j) dos factos dados como não provados, tais factos deverão passar a constar do elenco dos dados como provados atenta a prova existente quanto aos mesmos, procedendo-se ao devido alargamento da matéria de facto.
ACRESCE AINDA QUE,
128. Do elenco da matéria dada como provada não constam ainda factos – que se encontram provados quer por documento quer por depoimento testemunhal e declarações de parte prestadas em sede de audiência e discussão de julgamento – que, face à sua prova, à sua importância e aos efeitos que acarretam consoante a sua admissibilidade ou não, deveriam ter sido, inequivocamente, inseridos na matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo
129. Impondo-se, também aqui, a AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA, matéria esta que, para além de passar a abranger os citados factos dados como não provados pelo Tribunal a quo, conforme supra exposto, deverá englobar igualmente os factos que pela sua importância e prova produzida não poderão deixar de fazer parte da mesma, sob pena de omissão de factualidade essencial para a boa decisão da causa.
130. Há, por conseguinte, que englobar na matéria de facto dada como provada:
131. O EMAIL DA RÉ DE 15.04.2015
Apesar da exaustiva e aparentemente completa transcrição dos emails trocados pelas partes levada a cabo pelo Tribunal a quo, emails esses introduzidos nos Pontos 15 a 50, 52, 54 a 57, isto é, em 41 dos 61 factos dados como provados, verifica-se a omissão de transcrição de um email da recorrida que se encontrava no seguimento do aludido rol mas que o Tribunal a quo não veio a referir ou a dar como provado, como fez em relação aos demais.
132. Trata-se do E-MAIL DA RÉ DE 15.04.2015 e que consta do documento n.º 7 da peça processual da Autora (Requerimento com Refª: 29638869). Não se trata de um email qualquer ou de menor importância que o Tribunal a quo possa ter considerado não relevante ao ponto de o levar à matéria de facto dada como provada.
Estamos, pelo contrário, perante um email de suma importância, redigido pelo colaborador da recorrente, João ....., o qual prestou depoimento testemunhal nos autos, em que é abordado o recebimento da fatura de demurrage, sublinhado o facto de a recorrente ter estado a aguardar por 23 dias entre o ocorrido e a obtenção de informação quanto aos estragos na mercadoria (POD), salientado, uma vez mais, que sem aquele documento o remetente/expedidor não conseguiria iniciar os procedimentos para o acionamento do seguro pois para tal é necessário o documento oficial que ateste qual a mercadoria que efetivamente havia sido recusada. 
133. O referido colaborador alertou a recorrida que ninguém consegue trabalhar com frases como uma parte da carga foi recusada. Sendo que somente a 26.02.2015 – data do recebimento do POD – é que o remetente/expedidor pôde, então, enviar esse documento à companhia de seguros.
134. A recorrente sublinhou também que certamente uma grande parte do valor inserido na fatura de demurrage, 8063 EUR, corresponderá a esses 23 dias de espera da recorrida pela documentação necessária e solicitada para efeitos de acionamento do seguro.
135. O teor deste email foi sobejamente corroborado pelo referido colaborador em sede do seu depoimento bem como nas declarações de parte prestadas pelo gerente da recorrente.
136. A testemunha João .....esclareceu que: O cliente recusou a mercadoria mas sem mais pormenores. Presumia-se danos. Não tivemos mais informação(20190909151216_16294_64673, minuto 02:18 a 02:45). Acrescentando em seguida que, em relação às fotografias do contentor acidentado juntas aos autos sob os documentos n.ºs 5 a 8 da Oposição: Não dá para perceber se as paletes estão danificadas ou não (20190909151216_16294_64673, minuto 03:00 a 03:20). Explicando que: Só passados 23 dias depois é que enviaram o documento POD (20190909151216_16294_64673, minuto 03:21 a 03:38).
137. Corroborando o acima referido, o gerente da recorrente, Diogo ..., disse que: Nós até ao dia 26/27 de fevereiro não sabíamos absolutamente nada (20190909141259_16294_64673, minuto 05:20 a 06:20). E mais adiante, no decurso das suas declarações de parte, salientou que: Não podíamos pedir o survey porque nós não sabíamos onde estava a mercadoria (20190909141259_16294_64673, minuto 14:20 a 14:42).
138. Ora, este email foi pura e simplesmente “esquecido” pelo Tribunal a quo.
139. Tal email deveria ter sido inserido – de acordo com a ordem cronológica e o critério seguidos no elenco dos factos dados como provados pelo Tribunal a quo – entre o facto 55 (respeitante a um email de 13.04.2015) e o facto 56 (referente a um email de 22.04.2015), o que se requer a V. Exas.
140. DA INCLUSÃO DO SEGUINTE FACTO: EM 11.03.2015, a B informou a Autora de que o perito andava à procura da carga
141. É que tendo o Tribunal a quo dado como não provado de que: “Em 25.03.2015, a B informou a Autora de que o perito andava à procura da carga”, não deu, por seu lado, como provado de que em 11.03.2015, a B informou a Autora de que o perito andava à procura da carga.
142. O email remetido pela recorrente à recorrida em 11.03.2015 atesta que a mesma pede informação quanto à localização da mercadoria/contentor, para efeitos da peritagem, demonstrando assim que desde a data do evento (03.02.2015) até 11.03.2015 a recorrente não sabia onde andava a mercadoria. Nem a própria recorrida, como veio a demonstrar em sede de audiência de julgamento, sabia da localização do contentor.
143. Ficou demonstrado em sede de audiência e discussão de julgamento que logo desde o início a recorrida nem sabia, nem cuidou de saber, para onde tinha ido o contentor sinistrado depois de ter sido recusado o recebimento da mercadoria aí transportada.
144. A testemunha Nicole .... referiu claramente que não sabia se o contentor tinha ido para o parque do camionista ou não. “O contentor saiu logo de casa do cliente porque é assim que se passam as coisas” (2019090914335_16294_64673 minuto 19:27 a 19:50). “Foi levado pelo camionista não sei se para as instalações deles ou não”.
145. Tal informação encontra plena concordância com os restantes depoimentos prestados e ainda com a prova documental, designadamente os emails trocados pelas partes, concretamente o email de 11.03.2015.
146. Na verdade, a recorrida não sabia qual a localização do contentor, ou seja, desconhecia para onde o camionista o havia levado, conforme ainda email de 04/01/2017 de Diogo .... para José ....., constante do doc. n.º 9 junto aos autos com o requerimento da ré com a refª: 29638869.
147. De modo que, o Tribunal a quo deveria ter formulado um facto, dando-o como provado, estabelecendo que: Em 11.03.2015, a B informou a Autora que o perito andava à procura da carga.
148. DA INCLUSÃO DO SEGUINTE FACTO: Por responsabilidade da Autora, a mercadoria ficou dentro do contentor até 08.04.2015.
149. Na esteira do exposto no ponto anterior e que se considera aqui reproduzido para efeitos de economia processual, é de concluir que até 11.03.2015 a recorrente não informação sobre a mercadoria por não conseguir obter da recorrida informação sobre a localização do contentor, pese embora as várias solicitações lhe dirigiu nesse sentido.
150. É assim patente que de 03.02.2015 até 11.03.2015 a carga ficou no contentor por culpa da recorrida que não sabia do contentor nem prestava informações à recorrente. Somente a 11.03.2015 – não por sua iniciativa, mas em resposta ao email que a recorrente lhe havia remetido, é que a recorrida vem finalmente dizer que o contentor se encontrava no porto de Liverpool., sugerindo que o perito entrasse em contacto com Pauline .......
151. De modo que só a partir de 11/03/2015 é que a recorrente pode finalmente requerer ao perito a prestação dos seus serviços, fornecendo-lhe a indicação do local (porto de Liverpool) onde se encontrava a mercadoria danificada a fim de este se poder aí deslocar e realizar por fim a peritagem.
152. Existem uns emails trocados pelas partes no dia 25/03/2015 respeitantes à operacionalidade quanto à verificação da mercadoria, constantes dos factos dados como assentes sob os pontos 46 a 50, mas depois de 25/03/2015 até 08/04/2015 não houve qualquer outro contacto entre as partes, conforme facto 51 dado como assente, sendo que a peritagem ocorreu a 08/04/2015.
153. De toda essa factualidade, facilmente se constata que se a mercadoria permaneceu dentro do contentor pelo referido período de tempo, não por culpa ou responsabilidade da recorrente, mas sim da recorrida.
154. DA INCLUSÃO DO SEGUINTE FACTO: Os procedimentos a adotar pela Autora, em caso de acidente ocorrido durante o contrato de transporte, variam consoante o tipo de dano em causa.
155. A testemunha da recorrida, Nicole ..., no decurso do seu depoimento, explicou que depende das situações e das circunstâncias.
156. E assim, em sede de resposta à pergunta formulada pelo Juiz refere que acontecem situações destas com alguma frequência. Esclarecendo que as mercadorias ficam em média uma semana (2019090914335_16294_64673 minuto 11:40 a 12:55). Referindo que em caso de tomate (mercadorias perecíveis) devolvem o contentor cobrando pela viagem um preço mais reduzido.
157. Elucidou ainda que “nestas situações em que a carga é devolvida é porque sei lá o tambor tombou ou qualquer coisa, portanto nada tem a ver connosco, A”. “Nós, A, nada temos a ver se a carga oscilou ou não. Não somos responsáveis pela estiva do contentor”. (2019090914335_16294_64673 minuto 12:58 a 13:40)
158. Disse ainda que às vezes não cobram o período que o contentor está no parque a aguardar. “às vezes pode haver uma situação em que alguém diga para não se debitar as demoras. (2019090914335_16294_64673 minuto 12:30 a 13:00).
159. Informando, por  fim,  o tribunal que: “às vezes pedimos o survey” (2019090914335_16294_64673 minuto 14:50 a 15:08). Dando como exemplo uma situação em que o contentor sofre um embate, um sinistro, durante a navegação e tal é detetado logo aquando do desembarque no porto, referiu que: pode ser feito o survey logo no cais se der conta que o contentor está danificado.
160. Ora, toda esta informação prestada pela testemunha Nicole ..... não foi tida em linha de conta no raciocínio tido pelo Tribunal. Senão vejamos:
161. A testemunha referiu claramente que uma situação é a de transporte de mercadorias perecíveis, como por exemplo o tomate (que se podem estragar durante o trajeto) ou o transporte de mercadorias com má estiva (deficiente ou mau acondicionamento da mercadoria no contentor). Situações essas que, conforme expressão sua, nada têm a ver com a A.
162. Outro caso, totalmente diferente, acontece quando se está perante um fator externo – acidente ou embate no contentor – enquanto o mesmo se encontra entregue ao transportador. Nesta situação, o dano não foi provocado pela própria mercadoria ou pelo seu mau acondicionamento, O DANO FOI PROVOCADO POR UM ATO DO TRANSPORTADOR OU SEU SUBCONTRATADO.
163. Razão pela qual, em situações desse tipo, o transportador pede logo um survey a ser realizado no próprio cais. Aquela testemunha concluiu que: “em situações de sinistro a A pede survey“ (2019090914335_16294_64673 minuto 19:58 a 20:40).
164. Tal contraria o entendimento sufragado na douta sentença proferida de que a peritagem teria de ter sido pedida pela ré, de que a ré é que não quis resolver a situação porque considerava que a responsabilidade era da autora e com isso atrasou todo o processo dando origem aos custos de paralisação do contentor, razão pela qual deve ser responsabilizada pelo seu pagamento.
165. Pelo contrário, fica demonstrado que a peritagem não foi pedida pela recorrida porque depois da mercadoria ter sido recusada pelo recebedor, atento os danos, não sabia para onde tinha ido o contentor, se para o parque do camionista se para o porto. Vindo somente a 11.03.2015 prestar essa informação à recorrente.
166. Não obstante tratar-se de um fato externo provocado contra o contentor, causando-lhe sérios danos, cujas imagens não deixam qualquer dúvida, afetando inevitavelmente parte da mercadoria, a recorrida não quis tratar da situação, eximindo-se logo de qualquer responsabilidade, assumindo uma postura passiva, descuidada e negligente em todo o processo.
167. O próprio gerente da recorrida veio a dizer, em sede de declarações de parte prestadas, em resposta à pergunta se pedem survey em situações de acidente que: “sim, sim, há diversas situações pelas quais se pode pedir um survey” (20190909145802_16294_64673 minuto 07:40 a 08:34).
Acrescentando que: “A A não vai pedir nenhum survey porque não tem interesse em fazê-lo evidentemente. Não vai pedir nenhum survey só porque sim.” (20190909145802_16294_64673 minuto 09:23 a 09:30). E assumindo que: “Nós não sabemos o que aconteceu.” (20190909145802_16294_64673 minuto 09:45 a 09:50). E ainda que: “De facto foi pedido um survey mas não foi por nós.” (20190909145802_16294_64673 minuto 10:15 a 10:20).
168. O depoimento do gerente da recorrida assevera a posição da companhia, enquanto transportadora, de nenhuma diligencia requerer, no sentido do tratamento da questão, pese embora soubesse que se tratava de um sinistro ocorrido no contentor enquanto estava à sua guarda. 
169. E neste pressuposto andou todo o processo, considerando que nada tinha de fazer a anão ser aguardar por instruções, não obstante o próprio gerente da recorrida ter afirmado que há várias situações em que a companhia pede uma peritagem e da testemunha da recorrida, Nicole ....., declarar que em situações de sinistro pedem a peritagem.
170. Certo é que a recorrida, no caso dos autos, decidiu adotar procedimento distinto do habitual e não pediu o survey, nem sequer promoveu um survey conjunto (20190909145802_16294_64673 minuto 11:45 a 12:55).
171. Tendo inclusive o gerente da recorrida reconhecido que desconhecia qual o destino dado ao dito contentor, se havia sido reparado, se estava parado ou se havia voltado ao circuito de navegação. (20190909145802_16294_64673 minuto 13:00 a 13:28).
172. A recorrida vem pedir custos do aluguer de um contentor, que ficou severamente danificado por força do acidente sofrido, e em relação ao qual desconhece se veio a ser reparado ou se ficou inutilizado … sendo absolutamente infundada a sua pretensão de imputar custos pela não reutilização do contentor quando nem sequer sabe se estava em situação de poder ser reutilizado, face aos danos sofridos.
173. É este comportamento omisso da recorrida que vai determinar a dilação no tempo, a não realização da peritagem em momento anterior e a consequente não libertação da mercadoria danificada.
174. QUANTO À INSUFICIENTE MOTIVAÇÃO DA SENTENÇA:
175. Para fundamentar os factos dados como provados, o Tribunal a quo em praticamente todos eles referiu, em termos gerais que, a convicção sobre a verificação dos factos julgados provados sob os pontos (…) resultou da apreciação, crítica e conjunta, das declarações prestadas por Diogo ....e José .... e ainda dos depoimentos prestados por Nicole ...e João .... (…), e dos documentos juntos a fls. (…).
176. Entende a recorrente que tal justificação se mostra deficiente, incompleta e não convincente.
177. Na verdade, a fundamentação de facto da decisão judicial deve incluir, não só a indicação dos elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do juiz, como a sua apreciação crítica, sendo caso disso, de forma a ser possível conhecer as razões por que se decidiu no sentido em que o foi e não noutro. 
178. Assim, a fundamentação de facto não deve limitar-se à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre todos os pontos da matéria de facto, tudo dependendo do meio probatório em causa. 
179. Nos casos em que os elementos probatórios tenham um valor objetivo (como sucede, na maior parte dos casos, com a prova documental) a revelação das razões por que se decidiu dar como provados determinados factos poderá ser atingida com a mera indicação dos respetivos meios de prova, sem prejuízo da necessidade de fazer uma apreciação crítica, quando for questionável o valor probatório de algum ou alguns documentos ou existirem documentos que apontam em sentidos contraditórios. 
180. Já quando se tratar de meios de prova suscetíveis de avaliação subjetiva (como sucede com a prova testemunhal) será fundamental que seja efetuada uma apreciação crítica da prova, traduzida na indicação das razões por que se deu ou não valor probatório a determinados elementos de prova ou se deu preferência probatória a determinados elementos em prejuízo de outros, relativamente a cada um dos factos face aos quais essa apreciação seja necessária.
181. A fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. De modo que é crucial que os fundamentos da decisão sejam concordantes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação apresentada. 
182. Para fundamentar os factos dados como não provados, o Tribunal a quo referiu que assim foram considerados em virtude de não terem sido suficientemente sustentados pela prova produzida sendo até, em alguns casos, contrariados por esta nos seguintes termos:  
183. O facto referido na alínea c)  [Desde 06.02.2015 a 24.02.2015, a Autora não prestou qualquer informação ou esclarecimento à Ré] foi contrariado pelos elementos probatórios que sustentaram a convicção formada sobre a verificação dos factos dados como assentes nos pontos 24. a 27.
184. Ora, este raciocínio elaborado pelo Tribunal a quo está absolutamente errado, sendo contrariado pela prova produzida, quer pela prova documental quer testemunhal.
185. Entre 06/02/2015 e 24/02/2015, ou seja, por um período de dezoito dias seguidos, a ré, ora recorrida, não conseguiu obter qualquer informação por parte da autora, conforme é patente nas págs. 18 e 19 do documento n.º 4 juntos aos autos pela autora no seu requerimento de refª 29638869.
186. De acordo com as declarações de parte prestadas pelo gerente da recorrida, Diogo ...., ficou claramente demonstrado que: Nós até ao dia 26/27 de fevereiro não sabíamos absolutamente nada (20190909141259_16294_64673, minuto 05:20 a 06:20).
187. De resto, do elenco dos emails trocados entre as partes é notório que entre o período compreendido entre 06.02.2015 e 24.02.2015 inexistiu qualquer troca de comunicações: logo, a Autora não prestou qualquer informação ou esclarecimento à Ré.
188. Aliás, o próprio Tribunal a quo, na sequência cronológica que seguiu na transcrição dos emails trocados entre as partes, vem precisamente atestar que entre 06.02.2015 e 24.02.2015 não houve qualquer comunicação quer da Autora quer da Ré. 
189. Os pontos 24 e 25 dos factos dados como provados consistem respetivamente nos emails de 06.02.2015 e de 24.02.2015, demonstrando não haver qualquer email no intermeio.
190. É errado o raciocínio tecido pelo Tribunal a quo quando refere que o facto referido na alínea c) foi contrariado pelos elementos probatórios que sustentaram a convicção formada sobre a verificação dos factos dados como assentes nos pontos 24 a 27 (que contrariam a circunstância de ter sido a Ré a quem aguardava informação da Autora sobre a rejeição da mercadoria danificada pelo destinatário, já que, por um lado já tinha sido informado, e, por outro lado, quem aguardava instruções sobre o que fazer à mercadoria danificada era a Autora).
191. Ora, há prova cabal de que a Ré aguardava desde o dia da ocorrência por informações precisas sobre a mercadoria rejeitada, já que a Autora havia apenas comunicado que tinha havido uma recusa de mercadoria transportada num dos contentores, sendo que inicialmente nem sabia se era toda ou parte da mercadoria e, sendo parte, de que parte efetivamente se estaria a falar. Uma, duas, dez paletes …?
192. A Ré insistiu junto da Autora durante 23 dias por informações concretas, só vindo a Autora a remeter à Ré o documento comprovativo da quantidade recusada (POD) a 26.02.2015.
193. Pelo que a motivação do Tribunal a quo quanto a este facto dado como não provado é inexata, por não ter devidamente avaliado a factualidade ocorrida quanto a essa questão, ou seja, o hiato de tempo decorrido entre 06.02.2015 e 26.02.2015, razão pela qual este facto deverá passar a constar do elenco dos factos dados como provados, conforme já exposto e solicitado no Ponto II das presentes alegações de recurso.
194. Referiu ainda o Tribunal a quo na motivação dos factos dados como não provados que:
Os factos referidos nas alíneas d) a f) foram contrariados pelos elementos probatórios que sustentaram a convicção formada sobre a verificação dos factos dados como assentes nos pontos 29. a 35., comunicações que, a par das que anteriormente já se mencionaram, não deixam dúvidas sobre o conhecimento por parte da Ré sobre a recusa da mercadoria danificada, a sua quantificação e os motivos da recusa, estes – referentes à danificação da mercadoria – logo informados no dia da rejeição dos motivos da rejeição e com “reportagem fotográfica”.
195. Uma vez mais andou mal o Tribunal a quo nas considerações que teceu, já que a Ré não veio a tomar conhecimento, no momento da recusa da mercadoria, da quantidade recusada e dos motivos da recusa.
196. Nas palavras da testemunha João ...., colaborador da recorrente: “O cliente recusou mas sem mais pormenores. Presumia-se danos. Não tivemos mais informação” (20190909151216_16294_64673, minuto 01:57 a 02:45). Esclarecendo ainda a testemunha que: “Nesse dia enviaram fotografias tiradas pelo recebedor da carga”. Verificando-se amolgadela no contentor. “Mas não dá para perceber se as paletes estão danificadas ou não” (20190909151216_16294_64673, minuto 03:00 a 03:20). “Para além das fotografias nada mais foi enviado até 23 dias depois.” (20190909151216_16294_64673, minuto 03:21 a 02:38).
197. Também o gerente da recorrida, Diogo ..., foi explícito, quanto a esta questão, afirmando que: “quando a mercadoria foi recusada nós não sabíamos se foi a carga toda se foi parcial”. “Só passado 25/26 dias é que percebemos que uma parte da mercadoria estava em condições e foi descarregada no cliente e outra parte não estava em condições”. (20190909141259_16294_64673, minuto 03:00 a 03:53). 
198. Pelo que igualmente aqui o Tribunal a quo não procedeu à correta e devida avaliação da prova, vindo, por um lado, a considerar factos erradamente, não dando, por outro lado, como provado factos sobre os quais houve prova clara e inequívoca quanto à sua verificação e conformidade.
199. Referenciou, por fim, o Tribunal a quo na motivação dos factos dados como não provados que:
O facto referido na alínea j) não foi apoiado por qualquer dos meios de prova produzidos, nada permitindo concluir por uma ação da Autora na produção do dano verificado no contento.
200. Ora, tal argumentação é absolutamente desfasada, incorreta e incongruente, estando em oposição com a própria sentença e estando contrariada pela prova produzida em sede de audiência e discussão de julgamento.
201. Vejamos: Na convicção apresentada para a verificação dos factos julgados provados sob os pontos 12 e 13, o Tribunal a quo afirmou que: “todos eles concordaram que o dano apresentado pelo contentor na chegada ao destino final terá sido produzido no decurso do seu transporte, o que nos parece uma conclusão correta, considerando que nenhuma menção foi feita quanto à existência de tal dano aquando da partida de Portugal e que os danos verificados na mercadoria acondicionada no contentor demostravam conexão com o dano verificado neste, essencialmente porque a mercadoria danificada se encontrava próxima do local em que a parede do contentor abaulou com o impacto) e dos documentos juntos a fls. 16/19 e 74v/77 (comunicações eletrónicas trocadas entre as partes, não deixando dúvidas sobre a verificação dos factos em apreço, mormente sobre a recusa de recebimento da mercadoria danificada pelo destinatário) e 24v/27v (fotografias do contentor danificado e da descarga parcial do mesmo, que se comprova, mediante a troca de comunicações anteriormente aludida, terem sido tiradas pelo destinatário da mercadoria). Note-se que nem os representantes das partes e nem as testemunhas souberam esclarecer o concreto circunstancialismo em que ocorreu o embate que abaulou o contentor danificado, não decorrendo igualmente do teor dos documentos juntos aos autos qualquer indício sobre tal matéria.” (Realce nosso)
202. O representante da recorrida, José ... assumiu que: “Nós não sabemos o que aconteceu.” (20190909145802_16294_64673 minuto 09:45 a 09:50).
203. Tendo a Autora assumido documentalmente que não punha em causa que os danos tivessem ocorrido aquando da execução do contrato de transporte. Temos o exemplo do email de 03.03.2015 dirigido ao colaborador da recorrente, João ....., em que a autora, ora recorrida, afirma que: “I don´t dispute it may be the case that the damage occurred whilst in our care (…)”, email este vertido para o ponto 42 dos factos dados como provados pelo Tribunal a quo.
204. Tudo isto conjuntamente com o facto 10 dado como provado de que os contentores “foram entregues no porto de Setúbal sem qualquer tipo de indicação de anomalia” tem necessariamente como conclusão obvia de que o acidente ocorreu aquando do transporte, tenha sido aquando da navegação, no descarregamento em cais ou já no transporte terrestre com destino final ao cliente. Certo é que o sinistro ocorreu por força da atuação da autora ou de um seu subcontratado.
205. Pelo que a motivação da decisão de não levar a alínea j) aos factos dados como provados está errada, estando contrariada pelos factos demostrados nos autos (quer documental quer testemunhalmente quer ainda pelas declarações de parte prestadas).
206. QUANTO AO ENQUADRAMENTO JURÍDICO
207. Atento os factos apurados e a prova realizada, constata-se que as partes celebraram entre si um contrato de transporte combinado (marítimo e terrestre) de mercadorias, com origem no porto de Setúbal e destino final em Churchstoke, Montgomery, no Reino Unido.
208. O regime legal do contrato de transporte marítimo de mercadorias é disciplinado pelas regras gerais do Código Comercial, nos artigos 366 a 393 (disposições gerais do contrato de transporte). Particularmente, pelo Decreto-Lei 352/86 (disposições específicas do contrato de transporte marítimo de mercadorias) e pelo artigo 1º a 8º, da Convenção de Bruxelas, por força do disposto no Decreto-Lei 37.748/50.
209. O contrato de transporte marítimo é aquele mediante o qual uma das partes (transportador) se compromete/obriga perante outrem (passageiro ou carregador/expedidor) a fazer deslocar fisicamente, de um porto para o outro, de forma organizada e mediante o controle da atividade, (por si ou recorrendo aos serviços de outrem, por cuja atuação responderá) determinada mercadoria, mediante retribuição pecuniária denominada de ‘frete’” (artigo 1º do Decreto Lei 352/86, de 21 de outubro).
210. O transportador compromete-se, portanto, a colocar a pessoa ou a mercadoria em determinado local previamente ajustado entre as partes.
211. O objeto essencial do negócio, a sua finalidade principal, digamos, é a colocação da pessoa ou da coisa, de forma íntegra, no local do destino.
212. Exige-se, para o cumprimento da obrigação, a produção de um resultado, que é o núcleo central da prestação assumida: a entrega incólume, no presente caso da mercadoria, no local de destino, sob pena de responsabilidade civil.
213. É obrigação do transportador deslocar, com segurança e exatidão, no caso as mercadorias que lhe foram confiadas.
214. Para que haja o cumprimento da prestação do transportador de providenciar o deslocamento das mercadorias de um lugar de partida para outro de chegada, no limite do tempo necessário e vinculado entre as partes, surge a necessidade de que toda a operação de transporte seja realizada pelo transportador de forma organizada e sistemática, com uma engenharia pré-definida para o seu cumprimento.
215. O transporte é resultado de uma atividade exercida com autonomia, já que o transportador deve exercer o controlo da atividade de modo a não permitir qualquer interferência operativa pelos demais intervenientes, ou seja, deve ter a exclusiva gestão comercial e técnica da execução material da operação de deslocamento da pessoa ou da coisa.
216. No contrato de transporte marítimo de mercadorias, o transportador assume a posição de protagonista da relação jurídica material estabelecida, incumbindo-lhe o encargo de entregar a mercadoria depositada em favor do destinatário, nas mesmas condições existentes à época do carregamento do navio.
217. Ora, de toda a prova produzida, conclui-se que o expedidor, neste caso a recorrente, cumpriu com as suas obrigações contratuais uma vez que procedeu à reserva de 3 contentores tipo 45 HPW (CRXU050386/8, TCLU480073/5 e TCLU482416/7), tendo os mesmos sidos entregues no porto de Setúbal em perfeitas condições, ou seja, sem qualquer tipo de indicação ou referência a anomalia ou reserva.
218. Já quanto aos deveres do transportador, sublinhe-se que:
§ recebeu a remuneração pela prestação do serviço de transporte (artigo 1º do DL 352/86). 
§ recebeu a mercadoria objeto do contrato de transporte (artigo 3º, nº 3, da Convenção de Bruxelas).
§ não apresentou reserva no conhecimento de carga sobre o estado da mercadoria recebida (artigo 376º do Código Comercial e artigo 3º, nº 6, da Convenção de Bruxelas), como poderia fazer em caso de existência de alguma anomalia.
§ Escolheu como em regra pode fazer o trajeto de deslocamento mais conveniente para si.
219. Consistindo uma das obrigações principais do transportador providenciar o deslocamento das mercadorias objeto do contrato de transporte de um lugar para outro, de forma incólume, no local e no tempo convencionado (artigos 383 a 385 do Código Comercial; artigo 4º, nº 1, da Convenção de Bruxelas), certo é que, no presente caso, o transportador/ recorrida, não cumpriu com essa obrigação uma vez que não entregou a mercadoria ao destinatário conforme estipulado.
220. Para além do incumprimento dessa obrigação (de entrega da mercadoria ao destinatário), o transportador incumpriu ainda com o dever de informação que impende sobre os transportadores, que em geral resulta da boa-fé na execução dos contratos (artigo 762º, 2 do Código Civil). 
221. Estando em causa a ocorrência de um acidente aquando do transporte da mercadoria, deveria a recorrida ter avisado de imediato o expedidor, isto é, a recorrente fornecendo-lhe a informação necessária (designadamente a quantidade de mercadoria danificada por força do sofrido acidente) por forma a que a mesma pudesse tomar as diligências necessárias quanto ao acionamento do seguro do cliente e peritagem. 
222. Sendo, por consequência, da sua responsabilidade a assunção de perdas e avarias ocorridas nas mercadorias bem como os atrasos sucedidos no cumprimento do contrato de transporte (artigos 377º, 383º e 384º do Código Comercial e artigos 3º e 5º da Convenção de Bruxelas).
223. De modo que, apenas com a entrega da mercadoria - que ocorre no momento em que o destinatário aceita a mercadoria transportada e entrega a declaração de receção ao transportador - é que o transportador fica liberado de qualquer risco sobre o objeto transportado.
224. Refira-se que é no conhecimento de carga (Bill of Lading) – documento escrito e emitido pelo transportador – que se encontra plasmado o recebimento da mercadoria, objeto do contrato, nos termos do artigo 3º, nº 3, da Convenção de Bruxelas, documento esse que serve ainda para discriminar as marcas principais necessárias para a identificação das mercadorias recebidas, o número de volume ou de objetos, quantidade ou peso, consoante o objeto transportado, tais como indicados pelo carregador, bem como o estado e o acondicionamento aparente da mercadoria. 
225. Essa descrição assume particular relevância uma vez que o conhecimento de carga tem o efeito de presumir a receção das mercadorias pelo transportador nos exatos termos em que foram descritas no documento, de modo que é responsabilidade do transportador a entrega dessas mercadorias no local de destino nas mesmas e exatas condições.
226. Daí que a perda da mercadoria transportada ou o seu recebimento com avaria ou anomalia tem como consequência a presunção de que o dano ocorreu durante o trajeto de deslocamento da mercadoria, fazendo surgir uma responsabilidade do transportador pelo prejuízo decorrente, só afastada caso existisse – o que na presente situação não existiu – alguma situação de exoneração da sua responsabilidade (cfr. art.º4, 2 da Convenção de Bruxelas).
227. A cláusula 20 da Bill of Lading do contrato de transporte em causa nos presentes autos versa sobre a responsabilidade pelo atraso na libertação (desocupação) dos contentores cedidos pelo transportador para a deslocação das mercadorias.
228. Ora, em primeiro lugar há que referir que se trata de um contrato de adesão, formulado exclusivamente por uma das partes, o transportador, e cuja aceitação pela outra não passa por qualquer negociação ou análise do mesmo mas unicamente pela sua adesão ou não.
229. Em segundo lugar, tal contrato não poderá desvirtuar o regime jurídico criado para o contrato de transporte derrogando o seu núcleo essencial que respeita precisamente à responsabilidade do transportador e ao facto de se tratar de um contrato de resultado.
230. Em terceiro, tal cláusula encontra-se prevista para os casos em que a não desocupação não tenha motivo atendível, como rejeição da mercadoria por motivos comerciais, mas não para situações de sinistro ocorrido na mercadoria aquando da execução do contrato de transporte, ou seja, por atuação do transportador ou seu subcontratado. Tal seria configuraria um venire contra factum proprium.
231. Dos quatro momentos essenciais no contrato de transporte, temos que a receção corresponde ao ato de passagem das mercadorias do domínio do carregador para o do transportador. As mercadorias ficam sob inteira responsabilidade do transportador (ou o seu agente) a aguardar embarque (contrato de depósito), sendo emitido um B/L com a anotação “recebido para embarque”. Depois ocorre o carregamento (loading), momento em que a mercadoria é efetivamente carregada a bordo do navio. Tem como contrapartida a entrega do B/L ao carregador, iniciando-se a partir daqui o transporte marítimo propriamente dito. A operação de carregamento é sempre da inteira responsabilidade do transportador, ainda que seja executada por operadores portuários. A deslocação compreende o trajeto desenvolvido pelo navio desde o porto de origem até ao porto de destino final da mercadoria. Por fim, o descarregamento é o momento em que a mercadoria é descarregada do navio. É também o ato de passagem das mercadorias do domínio do transportador para o destinatário/recebedor destas, mediante a entrega por este do B/L original ao transportador para em troca receber a mercadoria. Termina aqui o transporte propriamente dito. A operação de descarregamento é da inteira responsabilidade do transportador, ainda que seja executada por operadores portuários e mesmo que seja suportada pelo recetor.
232. Após o início do transporte marítimo o transportador deverá emitir ao carregador um conhecimento de carga (também chamado de B/L).
233. A intervenção de operador portuário ou de outro agente em qualquer operação relativa à mercadoria não afasta a responsabilidade do transportador (artigo 27º nº 1)
234. Em caso de perda ou danos certos ou presumidos, o transportador e o destinatário concederão reciprocamente todas as facilidades razoáveis para a inspeção da mercadoria e verificação do número de volumes. (último parágrafo do nº 6 do artigo 3º). Situação que, conforme provado, não ocorreu nos presentes autos.
235. Será nula, não produzindo qualquer efeito, a cláusula, convenção ou acordo no contrato de transporte que exonere o armador/transportador da responsabilidade por perdas e danos relativas a mercadorias decorrentes de negligencia, culpa ou omissão dos deveres e obrigações constantes no artigo 3º ou que atenue essa responsabilidade por modo diverso do preceituado na Convenção. (artigo 3º nº 8).
236. As exonerações da responsabilidade do armador/transportador e do navio por perdas e danos são as constantes do artigo 4º nº 2.
237. O encargo da prova incumbirá à pessoa que invoca o benefício desta isenção, que terá de provar que nem a culpa pessoal, nem o facto do armador/transportador, nem a culpa ou facto dos agentes ou empregados do armador contribuíram para a perda ou dano.
238. Uma vez mais se constata que, no caso, o transportador nada invocou a este respeito. Assumiu que o acidente tenha ocorrido enquanto a mercadoria estava ao seu cuidado, mas contrapôs à recorrente o estabelecido na cláusula 20 do BL, escudando-se de qualquer responsabilidade, não querendo saber do acidente nem dos danos sofridos quer na mercadoria quer no seu próprio contentor. Não tendo sequer facilitado à recorrente o acesso à informação, demorando imenso tempo a prestar informação quanto à quantidade de mercadoria efetivamente danificada bem como demorando a indicar a localização do contentor danificado, por desconhecimento onde o mesmo se encontrava, a fim de poder ser realizada a peritagem e consequentemente libertado o contentor.
239. Face a tal comportamento da recorrida, inexiste legitimidade e fundamento para a emissão das faturas cujo pagamento está em causa.
240. Tais faturas não respeitam os requisitos necessários para que pudessem pretender cobrar custos de armazenagem e estacionamento pois nada referem a esse respeito, em relação a cada contentor, o período inicial e final do estacionamento, o período grátis que comumente existe neste tipo de relação comercial, a unidade (n.º de contentores em causa), a taxa bem como o preço respetivo. Todos esses elementos se encontram em falta.
241. Para além da inobservância dos requisitos formais, às faturas falta ainda fundamento para a sua emissão.
242. Foi o comportamento assumidamente relapso da recorrida ao longo de todo o processo que ditou a dilação no tempo de toda esta situação. De facto, a sua inércia originou a que a recorrente não pudesse diligenciar pela peritagem por não obter a informação necessária para o efeito. A própria recorrida, que em situações semelhantes à dos autos, costuma diligenciar pela realização da peritagem, muitas vezes promovendo um survey conjunto, como referido em sede de audiência de julgamento, optou neste caso por nenhuma medida adotar, numa atitude de absoluta passividade.
243. A sua inação provocou ainda que durante muito tempo não se soubesse do contentor acidentado que detinha a mercadoria danificada. A recorrida, como veio a assumir em julgamento, não sabia para onde tinha ido o contentor após recusa da mercadoria face aos danos no destino final.
244. E durante um largo período de tempo não soube dar indicação da localização do contentor à recorrente para que o perito pudesse deslocar-se e realizar a peritagem.
245. A manutenção da mercadoria no contentor danificado resulta de toda esta omissão da recorrida, que jamais procurou desbloquear a situação e resolver o assunto.
246. A recorrida procurou ainda cobrar-se de custos de estacionamento quando afirmou, em sede de audiência de julgamento, desconhecer por completo que destino veio a ter o contentor acidentado. Sendo que face aos estragos sofridos, patentes nas imagens fotográficas juntas aos autos, o mais provável é ter ficado inutilizado e fora do circuito normal de navegação.
247. Pelo que, a emissão e tentativa de imputação dos alegados custos de estacionamento e armazenagem do contentor é absolutamente inadmissível e infundada.
FACE A TODO O EXPOSTO,
248. Torna-se evidente que o Tribunal a quo não apreciou criteriosamente a prova produzida, maxime a prova testemunhal e as declarações de parte prestadas quer pela recorrente quer pela recorrida.
249. Assim, deverão ser retificados os factos dados como provados nos pontos 12, 13, 59 e 60, eliminando-se as partes incorretas nos precisos termos formulados, deverão ser considerados como provados os factos contidos nas alíneas c), h), i) e j) dos factos não provados, nos termos indicados, passando a constar dos factos provados.
250. E bem assim proceder-se à ampliação da matéria de facto dada como provada com a inserção dos factos indicados no Ponto II destas alegações de recurso.
251. E alterada a resposta a tais factos, como se pretende, resulta claramente não estarem verificados os pressupostos da imputabilidade à recorrente da responsabilidade pela paralisação e armazenamento do contentor danificado, não sendo, por conseguinte, responsável pelos custos que a recorrida lhe peticionou e pretendeu cobrar com a emissão das faturas – Fatura n.º AELIS/2261208 emitida em 19/03/2015, com vencimento a 19/04/2015, de 8 063,22 € e Fatura n.º AELIS/2261913 emitida em 23/04/2015, com vencimento a 23/05/2015, de 9 161,53 € – as quais carecem não só dos elementos basilares para que pudessem sustentar o pedido da autora, ora recorrida, como carecem de total fundamento para a sua emissão.
252. Deste modo, deverá a sentença proferida pelo Tribunal a quo ser julgada improcedente, por não provada, e, em consequência, ser a ré absolvida do pedido contra si formulado.
253.
Termina nos seguintes termos:
“NESTES TERMOS, E NOS MAIS DE DIREITO APLICÁVEIS, DEVE SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA:
A. Alterar-se a matéria de facto dada como provada, nos precisos termos formulados;
B. Alterar-se a matéria de facto dada como não provada e que deverá passar a constar dos factos dados como provados, conforme supra exposto;
C. Ampliar-se a matéria de facto dada como provada passando esta a englobar ainda os factos supra descritos.
D. Proceder-se a uma completa e cabal motivação da decisão sobre a matéria de facto quer quanto à motivação subjacente à factualidade dada como provada quer quanto à factualidade dada como não provada;
E. Julgando-se, em consequência, improcedente a presente ação, por não provada, absolvendo-se a ré, recorrente, do pedido.”
A autora apresentou contra-alegações, cuja motivação culminou com as seguintes conclusões:
A. Antes de mais, salvo melhor opinião, e nos termos do disposto no n.º 3, do artigo 639.º, do CPC, deve ser proferido despacho a convidar a Recorrente a corrigir/sintetizar as prolixas, obscuras e complexas conclusões de recurso que apresentou, uma vez que o texto apresentado está formatado em longuíssimos e confusos 252 parágrafos, foi vertido em 38 páginas (sendo que o corpo da alegação ocupa 40 páginas, portanto, apenas duas a menos) e, em conclusões que receberam de forma caótica preceitos jurídicos, factos, comentários, transcrições e expressões ininteligíveis, e representam, grosso modo, uma cópia do corpo da alegação;
B. Não obstante, à cautela, e na medida do que foi possível à Recorrida retirar das conclusões do recurso apresentado pela Recorrente, a mesma suscita as seguintes questões: a) do pedido de alteração da decisão referente à matéria de facto dada como provada; b) do pedido de alteração da decisão referente à matéria de facto dada como não provada; c) do pedido de ampliação da decisão proferida sobre a matéria de facto; d) da insuficiência da fundamentação da decisão proferida sobre a matéria de facto; e, e) do erro de julgamento quanto à aplicação/interpretação do direito;
DO PEDIDO DE ALTERAÇÃO DA DECISÃO REFERETE À MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA
C. Pretende a Recorrente que o Tribunal ad quem altere a decisão proferida quanto à matéria de facto dada por provada, em concreto no que respeita aos factos dados por provados sob os n.ºs 12, 13, 59 e 60, cuja redação, no entender da Recorrente, deve ser “retificada”;
D. Quanto ao facto dado por provado sob o n.º 12, entende a Recorrente que ao invés de ser dado por provado que “12. Ocorreu um embate no exterior de um dos contentores, no decurso do transporte ou no destino final, que provocou estragos visíveis no contentor e, consequentemente, danos na mercadoria interiormente acondicionada.” deveria ter sido dado por provado que “Ocorreu um embate no exterior contentor TCLU482416/7, no decurso do transporte ou no destino final, que provocou estragos visíveis nesse contentor e, consequentemente, danos na mercadoria interiormente acondicionada.”;
E. Ainda que não se vislumbre existir alguma pertinência para a apreciação da causa na concreta identificação do contentor, a Recorrida reconhece que o contentor em questão é efetivamente TCLU482416/7;
F. Não obstante, quanto àquele facto, entende a Recorrida que do mesmo deve ser expurgada a parte final em que se refere “e, consequentemente, danos na mercadoria interiormente acondicionada”, pois que se trata de uma afirmação conclusiva e que contém, ademais, expressões de cariz jurídico (“danos”);
G. Entende, por conseguinte, a Recorrida que a redação daquele facto deve ser alterada, passando a constar que “12. Ocorreu um embate no exterior de um dos contentores, no decurso do transporte ou no destino final, que provocou estragos visíveis no contentor.”
H. Quanto ao facto dado por provado sob o n.º 13, entende a Recorrente que ao invés de ser dado por provado que “13. O destinatário da mercadoria danificada recusou o seu recebimento.” deveria ter sido dado por provado que “O destinatário da mercadoria danificada recusou o recebimento de parte da mercadoria inserida no contentor acidentado TCLU482416/7 atentos os danos apresentados no contentor.”;
I. Quanto a este ponto, pese embora, uma vez mais, se entenda que não se trata de matéria relevante para a apreciação da causa, e, portanto, que o Tribunal ad quem não tem que a apreciar, concorda-se com a Recorrente no sentido de que apenas foi recusado o recebimento, pelo destinatário, de parte da mercadoria transportada no contentor TCLU482416/7, sendo que, não obstante não se provou que houvesse efetivamente mercadoria danificada (tão-pouco alegou a Recorrente em que é que se consubstanciariam tais alegados danos);
J. Nesse sentido, salvo melhor opinião, apenas se poderia dar por provado que “O destinatário da mercadoria transportada no contentor em questão recusou parcialmente o seu recebimento.”, devendo, por conseguinte, o Tribunal ad quem alterar a redação daquele ponto da matéria de facto dada por provada no sentido ora referido;
K. Quanto ao facto dado por provado sob o n.º 59, entende a Recorrente que ao invés de ser dado por provado que “59. A Requerente emitiu as seguintes faturas referentes a despesas de estacionamento e armazenamento do contentor: Fatura n.º AELIS/2261208 emitida em 19/03/2015 e com vencimento a 19/04/2015, no valor de € 8 063,22, cuja cópia foi junta a fls. 88; Fatura n.º AELIS/2261913 emitida em 23/04/2015 e com vencimento a 23/05/2015, cuja cópia foi junta a fls. 88v.” deveria ter sido dado por provado que “A Requerente emitiu as seguintes faturas: Fatura n.º AELIS/2261208 emitida em 19/03/2015 e com vencimento a 19/04/2015, no valor de € 8 063,22, cuja cópia foi junta a fls. 88; Fatura n.º AELIS/2261913 emitida em 23/04/2015 e com vencimento a 23/05/2015, cuja cópia foi junta a fls. 88v.”;
L. Quanto a este ponto, entende, assim, a Recorrente que não se deveria dar como provado que as faturas identificadas são “referentes a despesas de estacionamento e armazenamento do contentor”;
M. Contudo, seja dos meios de prova indicados pelo Tribunal a quo para dar como provado aquele facto nos seus exatos termos (declarações prestadas pelos representantes legais da Recorrente e da Recorrida, depoimento prestado pela testemunha João ..... e documentos juntos aos autos, nomeadamente, a fls. 88/88v, 22/24 e 84/89), seja, também, do teor dos documentos n.º 7, 8 e 9 juntos pela Recorrente com o requerimento de 05.07.2018, resulta inequívoco que aquelas faturas eram referente a despesas de estacionamento e armazenamento do contentor e que disso tinha/tem pleno conhecimento a Recorrente, pelo que aquele ponto n.º 59 da matéria de facto dada por provada deve ser mantido;
N. Quanto ao facto dado por provado sob o n.º 60, entende a Recorrente que ao invés de ser dado por provado que “60. As referidas faturas foram lançadas no extrato da conta-corrente aberto em nome da Ré, que não realizou o seu pagamento.” deveria ter sido dado apenas por provado que “As referidas faturas não foram pagas pela Ré.”;
O. Pese embora, uma vez mais, se entenda que tal não se trata de matéria relevante para a apreciação da causa, e, portanto, que o Tribunal ad quem não tem que a reapreciar, considera-se que se as faturas foram emitidas e não foram anuladas (tanto mais que a Recorrida veio peticionar o seu pagamento) é mister concluir que foram lançadas e continuam a constar “no extrato da conta-corrente aberto em nome da Ré”, tal decorrendo naturalmente das regras da experiência, pelo que deve ser mantida a decisão proferida quanto àquele concreto facto nos seus exatos termos;
DO PEDIDO DE ALTERAÇÃO DA DECISÃO REFERETE À MATÉRIA DE FACTO DADA COMO NÃO PROVADA
P. Mais pretende a Recorrente que o Tribunal ad quem altere a decisão proferida quanto à matéria de facto dada por não provada, em concreto no que respeita aos factos dados por não provados sob as alíneas c), h), i) e j), que, no seu entendimento, deverão ser dados por provados;
Q. Entende a Recorrente que o Tribunal a quo deveria ter dado por provado que “c) Desde 06.02.2015 a 24.02.2015, a Autora não prestou qualquer informação ou esclarecimento à Ré.” pois que não existem quaisquer comunicações escritas juntas aos autos referentes a esse período;
R. Salvo melhor opinião, aquela alegação da Recorrente nem deveria constar da decisão referente à matéria de facto, uma vez que comporta expressões genéricas não concretizando a que tipo de informação ou esclarecimentos se reporta ou sobre o quê;
S. A acrescer, o único meio de prova indicado pela Recorrente em defesa de que tal alegação deveria ter sido dada por provada (declarações de parte do seu representante legal) (“Nós até ao dia 26/27 de fevereiro não sabíamos absolutamente nada”) é infirmado pelo teor do Documento n.º 3 junto pela Recorrida com o requerimento de 05.07.2018 (Ref.ª 122501), pelo que inexiste prova credível e suficiente produzida nos autos para dar como provado o facto pretendido pela Recorrente, sendo que era sobre a mesma que recaía o ónus da prova porquanto foi a mesma que o alegou,
T. Entende a Recorrente que o Tribunal a quo deveria ter dado por provado que “h) Em 08.04.2015, face à falta de informação, a B solicitou informações à A.”;
U. Ora, à semelhança do que se referiu quanto ao facto dado por não provado sob a alínea c), aquela alegação da Recorrente (artigo 34.º da oposição) nem deveria constar da decisão referente à matéria de facto, uma vez que comporta expressões genéricas não concretizando a que tipo de informação se reporta ou sobre o quê, motivo pelo qual se entende que, salvo melhor entendimento, deve aquele ponto h) ser expurgado da matéria de facto dada por não provada;
V. Entende a Recorrente que o Tribunal a quo deveria ter dado por provado que “i) Em 08.04.2015, a B obtém informação da A de que andavam a tentar localizar o contentor.”, tendo em consideração o Documento n.º 9 (páginas 7 e 8) junto pela Recorrida com o requerimento de 05.07.2018 (Ref.ª 122501) e considerando as declarações de parte do gerente da Recorrida o qual terá referido que “Nós não sabíamos onde estava a mercadoria (…) A mercadoria foi ao destinatário, descarregou se 14 paletes e depois a partir daí nós não temos informação nenhuma onde estava a mercadoria”(20190909141259_16294_64673, minuto 14:20 a 14:47).”
W. Não obstante, do teor daquelas páginas 7 e 8 do Documento n.º 9 junto pela Recorrida com o requerimento de 05.07.2018 (Ref.ª 122501), a única coisa que se pode extrai, per se, é que a Recorrente a mensagem de correio eletrónico ali constante à Recorrida e nada mais, sendo inalcançável o raciocínio lógico que leva a Recorrente a concluir que pelo facto de a Recorrida ter junto aquela mensagem de correio eletrónico “aceitou essa factualidade de que a recorrente lhe havia solicitado informações a 08/04/2015 e de que informou que andavam a ver onde se localizava o contentor”;
X. Já quanto às alegadas declarações de parte do gerente da Recorrida, importa apenas esclarecer que as citadas declarações foram prestadas pelo gerente da Recorrente e não de Recorrida, apenas se compreendendo tal alegação por manifesto lapso ou desatenção;
Y. Assim, deve ser mantida a decisão proferida pelo Tribunal a quo no sentido de dar como não provado o facto constante na alínea i) da matéria de facto não provada;
Z. Por último, entende a Recorrente que que o Tribunal a quo deveria ter dado por provado que “j) A paralisação do contentor resultou de um abalroamento exterior ocorrido contra o contentor, provocado pela Autora, no decurso do transporte ou no destino final.”;
AA. Ora, o constante naquele ponto trata-se de uma afirmação conclusiva pelo que deve extirpar-se da decisão quanto à matéria de facto dada como não provada (de facto, o que se poderia dar por provado ou não seria se houve ou não uma paralisação do contentor, se houve ou não um abalroamento contra o contentor e de que modo é que se deu esse abalroamento);
BB. Ainda que assim não se entendesse, sempre seria de acolher a posição do Tribunal a quo no sentido de que “o facto referido na alínea j) não foi apoiado por qualquer dos meios de prova produzidos, nada permitindo concluir por uma ação da Autora na produção do dano verificado no contentor”;
DO PEDIDO DE AMPLIAÇÃO DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
CC. Pretende a Recorrente pretende que o Tribunal ad quem adite à matéria de facto dada por provada “o “E-MAIL DA RÉ DE 15.04.2015 e que consta do documento n.º 7 da peça processual da Autora (Requerimento com Refª: 29638869)”;
DD. Ora, a este respeito, cumpre destacar que os documentos não são factos, mas sim meios de prova, e, portanto, é descabido requerer que seja aditada à matéria de facto dada por provada um documento, como fez a Recorrente, sendo que, ademais, a Recorrente, não apresentou a redação que deveria ser dada ao facto que pretenderia aditar à decisão sobre a matéria de facto, pelo que, e desde logo, deve ser desatendida aquela pretensão da Recorrente;
EE. Para o caso de assim não se entender, e à semelhança da técnica (bem) utilizada pelo Tribunal a quo, a redação do facto a aditar sempre deverá ser que “no dia 15.04.2015, a Ré remeteu à Autora, uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: (transcrição do teor da comunicação)”;
FF. Seguidamente, entende a Recorrente ser de aditar à matéria de facto dada por provada que “Em 11.03.2015, a B informou a Autora de que o perito andava à procura da carga”;
GG. Desde logo, e antes de mais, entende-se, uma vez mais, que aquele facto não se trata de matéria relevante para a apreciação da causa, e, portanto, que o Tribunal ad quem não tem, não deve, em todo o caso, apreciar se o mesmo deve ou não ser dado por provado;
HH. A acrescer, trata-se de facto não alegado por nenhuma das partes, nomeadamente pela Recorrente, pelo que não poderia, o Tribunal, dar por provado o que não foi alegado;
II. Por último, o envio e teor do email remetido pela Recorrente à Recorrida, em 11.03.2015, a que aquela alude para sustentar que tal facto deveria ser dado por provado, já se encontram provados (ponto 44. da matéria de facto dada por provada), sendo apenas isso (o envio e o teor da comunicação) que permite provar, per se, o documento em que foi junta aquela comunicação;
JJ. A Recorrente entende ser de aditar à matéria de facto dada por provada que “Por responsabilidade da autora, a mercadoria ficou dentro do contentor até 08.04.2015”;
KK. Desde logo, a Recorrente não cumpre com o ónus de indicar obrigatoriamente os concretos meios probatórios que impunham que tal “facto” fosse dado como provado, pelo que deve ser rejeitada a apreciação do recurso nesta parte;
LL. A acrescer, discorrida a oposição apresentada pela Recorrente, constata-se que a mesma não alegou tal “facto”, motivo pelo qual está o Tribunal impedido de o apreciar e/ou dar como provado;
MM. Ademais, resulta dos factos provados que a carga ficou dentro do contentou até ao dia 23.04.2015 (ponto n.º 58 da matéria de facto dada por provada, o qual não foi impugnado pela Recorrente), e não até ao dia 08.04.2015;
NN. Por último, a afirmação que a Recorrente pretende que seja aditada à matéria de facto dada por provada é conclusiva e contém, ademais, uma expressão de cariz jurídico (“responsabilidade”), sendo que apesar de na formulação proposta a Recorrente utilizar o vocábulo “responsabilidade” no corpo das suas alegações equipara sempre o mesmo a “culpa” que tem também um cariz manifestamente jurídico, motivo pelo qual aquela afirmação nunca poderia constar da decisão sobre a matéria de facto;
OO. Por fim, a Recorrente entende ser de aditar à matéria de facto dada por provada que “Os procedimentos a adotar pela autora, em caso de acidente ocorrido durante o contrato de transporte, variam consoante o tipo de dano em causa”;
PP. Desde logo, entende-se, uma vez mais, que aquele facto não se trata de matéria relevante para a apreciação da causa, e, portanto, na senda do já supra defendido, que o Tribunal ad quem não tem, nem deve, em todo o caso, apreciar se o mesmo deve ou não ser dado por provado;
QQ. Ademais, estamos na presença de uma afirmação genérica que não concretiza quais os “procedimentos”, a que tipo de “acidente”, quais os “contratos de transporte” ou “danos” a que se refere, nem materializa de que modo é que “variam os procedimentos”, pelo que aquela afirmação nunca poderia fazer parte da matéria de facto provada ou não provada;
RR. Por último, sempre se refira, também, que se trata de um “facto” que não foi sequer alegado pela Recorrente ou pela Recorrida nos seus articulados;
DA INSUFICIÊNCIA DA FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
SS. Da análise do pedido (alínea d)) formulado pela Recorrente confrontado com confrontado com as conclusões apresentadas (em particular a 174.ª a 205.º), conclui-se que a Recorrente entende que o Tribunal a quo procedeu a uma insuficiente fundamentação da decisão proferida quanto aos factos dados por não provados sob as alíneas c), d), e), f) e j);
TT. A Recorrente não imputa, assim, à sentença nenhuma das causas de nulidade previstas no n.º 1, do artigo 615.º, do Código de Processo Civil, mas sim um desacerto da decisão proferida quanto àqueles pontos da matéria de facto dada por não provada, estando-se, assim, no âmbito do eventual erro de julgamento e não no âmbito das causas da nulidade da sentença;
UU. Ora, quanto aos factos dados por não provados sob as alíneas c) e j) já se tomou posição supra, pelo que se julga desnecessário voltar a reproduzir o que já ali ficou plasmado;
VV. Por sua vez, quanto aos factos dados por não provados sob as alíneas c) e j), os meios de prova indicados pela Recorrente para defender que os mesmos deveriam ter sido dados por provados (declarações prestadas pelo representante legal da Recorrente e pela testemunha João ...) não permitem chegar a uma tal conclusão, sendo, ao invés, infirmadas pela demais factualidade dada por provada nos autos (nomeadamente, pelos factos dados por provados sob os números 15, 16 e 20);
– DO ERRO DE JULGAMENTO QUANTO À APLICAÇÃO/INTERPRETAÇÃO DO DIREITO
WW. A final, aponta, a Recorrente, à sentença proferida, erro de julgamento quanto à aplicação/interpretação do Direito (conclusões 206.ª a 247.ª);
XX. Não obstante, a Recorrente parece fazer confusão entre a eventual responsabilidade pelos danos na mercadoria transportada pela Recorrida e a responsabilidade pela paralisação/imobilização do contentor, sendo isso mesmo se faz notar na sentença recorrida e já ao longo do julgamento tinha sido realçado pelo Juiz a quo;
YY. Na verdade, o fornecimento de contentores, que sempre se traduzirá num aluguer, poderá considerar-se incorporado no regime do transporte marítimo durante o estrito período de deslocação da mercadoria, a que se reporta o disposto no artigo 1.º, alínea e) da Convenção de Bruxelas, e artigo 23.º, n.º 1, do Decreto-Lei 352/86;
ZZ. Não obstante, findo este prazo (de estrito período de deslocação da mercadoria), o carregador ou o destinatário da carga passam a incorrer em sobrestadia, denominada “demurrage”, que se traduz, como acima se referiu, na cedência de contentores para além do aludido período, e no qual terá aplicação as regras da locação, portanto, alvo de remuneração (artigos 1022.º e 1023.º do Código Civil, sendo que já quanto à armazenagem serão aplicáveis as regras do depósito, neste caso oneroso (artigos 1185.º do Código Civil e 403.º e seguintes do Código Comercial);
AAA. A Recorrente nunca pôs em causa os concretos valores peticionados ou o seu método de cálculo, nem sequer a título subsidiário, mas tão-só a sua responsabilidade pelo pagamento dos mesmos, sendo certo que, porém, não conseguiu provar quaisquer factos capazes de afastar/excluir a sua responsabilidade pelo pagamento dos mesmos;
BBB. Destarte, salvo melhor opinião, mostra-se, assim, devido o pagamento, por parte da Recorrente, de todos os valores faturados e peticionados na ação, conforme se decidiu na sentença recorrida, pelo que a mesma não merece qualquer censura.
Remata as suas conclusões nos seguintes termos:
“Nestes termos, e nos demais de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve, desde logo, nos termos do disposto no n.º 3, do artigo 639.º, do Código de Processo Civil, ser convidada, a Recorrente, a apresentar novas conclusões, elaboradas de forma sintética, e respeitando o objeto do recurso que ficou definido nas alegações originais, sob pena de não o fazendo, no prazo de cinco dias, ser rejeitado o recurso.
Não havendo lugar à rejeição do recurso, deve, ainda assim, ser negado provimento ao mesmo, por infundado, e, por conseguinte, mantida a decisão recorrida proferida pelo Tribunal a quo.
Admitido o recurso, e remetido o mesmo a este Tribunal da Relação, pelo relator foi proferido despacho admitindo o recurso. No mesmo despacho considerou o relator não ser necessário formular convite ao aperfeiçoamento das conclusões da apelante, nos termos previstos no art. 639º, nº 3 do CPC.
Seguidamente foram colhidos os vistos.
2.  Questões a decidir
Conforme resulta das disposições conjugadas dos arts. 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do CPC, é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso, seja quanto à pretensão dos recorrentes, seja quanto às questões de facto e de Direito que colocam[4]. Esta limitação dos poderes de cognição do Tribunal da Relação não se verifica em sede de qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. art. 5º n.º 3 do CPC).
Não obstante, excetuadas as questões de conhecimento oficioso, não pode este Tribunal conhecer de questões que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas[5].
Assim, as questões a apreciar e decidir são as seguintes[6]:
- Da motivação da decisão sobre matéria de facto e da sua alegada insuficiência (conclusões 174 a 205)
- Da impugnação da decisão sobre matéria de facto (conclusões 37 a 173, e 249)
- Do mérito da causa (conclusões 206 a 248, e 250 a 252)
3. Fundamentação
3.1. Os factos
O Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos:
1. A Autora é uma sociedade comercial por quotas, que se dedica ao exercício das atividades de agente de navegação, de agente transitário e de prestação de serviços relacionados com o transporte de mercadorias e passageiros.
2. A Ré é uma sociedade comercial por quotas, que se dedica à atividade de transitário, agência marítima, transportes internacionais em geral, comissões e consignações e todas as atividades conexas ou afins.
3. A Ré solicitou à Autora a prestação de um serviço de transporte marítimo de 3 contentores tipo 45 HPW, desde o porto de Setúbal até ao destino final, em CHURCHSTOKE – MONTGOMERY - SY156AR POWYS – Reino Unido.
4. A Autora e a Ré acordaram nesse transporte marítimo, tendo esse acordo dado lugar à emissão da Waybill n.º SETLIV003313, a qual se rege pelos termos e condições da correspondente Bill of Lading, nos termos que constam dos documentos juntos a fls. 64 e 65/74, que aqui se dão por reproduzidos.
5. Na cláusula 20 dos termos e condições referidos no ponto anterior consta: “(4) If the delivery of the Goods or any part thereof is not taken by the Merchant at the time and place when and where the Carrier is entitled to call upon the Merchant to take delivery thereof whether the Carriage called for by this Bill of Lading is a Port to Port Shipment or Combined Transport the Carrier shall be entitled without notice to unstow the Goods or that part thereof if stowed in Containers and or to store the Goods or that part thereof ashore, afloat, in the open or under cover, at the sole risk of the Merchant. Such storage shall constitute due delivery hereunder and there upon the liability of the Carrier in respect of the Goods or that part thereof stored as aforesaid (as the case may be) shall wholly cease and the cost of such storage (if paid or payable by the Carrier ar any agent or subcontractor of the Carrier) shall forthwith upon demand be paid by the Merchant to the Carrier”; e “(5) If the Merchant fails to take delivery of the Goods within thirty days of delivery becoming due under Clause 20(2) or (3), or if in the opinion of the Carrier they are likely to deteriorate, decay, become worthless or incur charges whether for storage or therwise in excess of their value, the Carrier may, without prejudice to any other rights which he may have against the Merchant, without notice and without any responsibility whatsoever attaching to him, sell, destroy or dispose of the Goods and apply any proceeds of sale in reduction of the sums due to the Carrier from the Merchant.”
6. A Ré conhece os termos do contrato celebrado pelas partes, as suas condições e termos.
7. Pelo transporte de cada contentor, a Requerente cobrou o valor de € 1875,00, que a Ré pagou em 01.04.2015.
8. A B procedeu à reserva, no dia 15.01.2015, de 3 contentores tipo 45 HPW, tendo os mesmos sido entregues no porto de Setúbal a 20.01.2015.
9. Os contentores atribuídos à B tinham as seguintes identificações: CRXU050386/8, TCLU480073/5 e TCLU482416/7.
10. Os mesmos foram entregues no porto de Setúbal sem qualquer tipo de indicação de anomalia.
11. A Autora, A, procedeu ao transporte dos contentores, apresentando-os, para entrega no destino final, no dia 3 de Fevereiro de 2015.
12. Ocorreu um embate no exterior de um dos contentores, no decurso do transporte ou no destino final, que provocou estragos visíveis no contentor e, consequentemente, danos na mercadoria interiormente acondicionada.
13. O destinatário da mercadoria danificada recusou o seu recebimento.
14. O Sr. João ...., colaborador da Ré, foi quem comunicou com a Autora sobre esta situação, desde o seu início.
15. No dia 03.02.2015, através da colaboradora da Autora, Marina ....., foi remetido email ao João ..., colaborador da Ré, com o seguinte teor: “O contentor TCLU4824167 do lote abaixo foi recusado no recebedor, ainda estamos a aguardar mais informações / fotografias, mas penso que a carga esteja danificada. Logo que possível passaremos mais informação.”
16. No mesmo dia e após o anterior, através da colaboradora da Autora, Marina ....., foi remetido novo email ao João ...., colaborador da Ré, com o seguinte teor: “Parte da carga foi descarregada, tudo o que estava danificado ficou no interior do contentor, Necessitamos de saber o que faremos à carga”.
17. João .... respondeu por email com a mesma data e com o seguinte teor: “Sem mais elementos, não podemos tomar nenhuma decisão. Necessitamos de fotos para averiguar o tipo de danos e onde poderão ter acontecido.”
18. Seguidamente, no mesmo dia, Marina ..., remeteu um email ao João ...., com o seguinte teor: “Eu estou a aguardar o envio de fotografias, logo que as tenha envio”.
19. Em seguida, Marina ...., remeteu outro email ao Sr. João ....., com o seguinte teor: “Em anexo algumas fotografias tiradas pelo recebedor da carga, durante o descarregamento. O contentor já foi direcionado para cais, aguardamos a vossa decisão”.
20. Em resposta e na mesma data, o Sr. João ..... remeteu a Marina ......um email com o seguinte teor: “São claramente visíveis os danos na lateral do contentor. O contentor não estava neste estado durante o carregamento aqui na origem. Parece-nos claro que o impacto que o contentor sofreu na lateral danificou algumas paletes. Não foi registada nenhuma ocorrência durante o carregamento no navio aqui na origem, depreendemos então que o dano ocorreu já no navio, ao descarregar do mesmo, ou em qualquer ponto no destino, ou seja, já à responsabilidade da A visto a entrega ser por vossa conta. O exportador não aceita a devolução da mercadoria nesse estado e vai ser indemnizado pelo valor da mesma.”
21. No mesmo dia e após o email referido em 20., Marina .... enviou a João .... com o seguinte teor: “Necessito saber se a ordem é para destruir a carga”.
22. No dia 4.02.2015, Nicole ....., colaboradora da Autora, remeteu um email à Ré com o seguinte teor: “Necessitamos instruções claras sobre o que fazer a mercadoria”.
23. Em resposta a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor: “Já falamos com o José ..... Os danos na mercadoria foram provocados por danos causados ao contentor. O exportador vai querer ser indemnizado por o valor das paletes, pois o importador afirma ter recusado o contentor inteiro. Antes de mais precisamos esclarecer esta questão”.
24. No dia 6.02.2015, Alberto ….., colaborador da Autora, remeteu à Ré um email com o seguinte teor: “Dear srs., Pls note that it has been brought to our attention that consignee has refused to accept the above load ... Based on the above we await yr instructions as to what action you wish us to take. Following on the instructions of our rep. A/UK, we also take the opportunity to quote below clause 20.6 of the A bill terms. Quote. Refusal by the Merchant to take delivery of the Goods in accordance with the terms of this clause and/or to mitigate any loss or damage thereto shall constitute a waiver by the Merchant to the Carrier of any claim whatsoever relating to the Goods or the Carriage thereof. Unquote Awaiting yr instructions”.
25. No dia 24.02.2015, o mesmo colaborador da Autora, remeteu novo email à Ré, com o seguinte teor: “Would you pls kindly instruct as what action you wish us to take as we have been informed today that cntr is still Present at the terminal full. Awaiting yr soonest instructions”.
26. Na sequência do anterior email e também no dia 24.02.2015, a Ré remeteu à Autora, na pessoa da sua colaboradora Nicole ....., um email com o seguinte teor: “Boa tarde Nicole. o cliente recusou um contentor por inteiro? Continuamos a aguardar da vossa parte um relatório preciso sobre o que aconteceu com cada um dos 3 contentores. Muito urgente por favor.”
27. Em resposta e na mesma data, a Autora remeteu à Ré um email com o seguinte teor: “o meu colega Alberto está a tratar deste assunto e entrará em contacto assim que possível”.
28. No dia 25.02.2015, a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor: “Continuamos sem informação. Estou a ficar muito preocupado.”
29. No dia 26.02.2015, a Autora remeteu à Ré um email com o seguinte teor: “Following on the abv issue and as per yr request of information, pls note that part of the cargo loaded in cntr nr TCLU482416/7 has been rejected, as per Attached POD. We await for yr instructions as to what action you wish us to take.”
30. Em resposta e na mesma data, a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor: “I am sorry but this information is absolutely late. Only today we receive copy of the POD? This is more than 20 days after the event. Part of the cargo? For what I can understand from the attached POD, the receiver accepted 14 pallets and rejected 12. Is this accurate? That is not the information we had from shipper and consignee from the beginning. As mentioned on my e-mail of February 3rd the damages to the side of the container are clearly visible. The container has suffered a strong lateral impact. It was not recorded any evidence of this damage here at origin while delivering the container for export. Therefore, we have to assume the damaged occurred on the vessel during the voyage, or while offloading at destination or even during inland transport. ln either case, the damaged occurred while the container was at care of A and shipper/Savino del Bene cannot be held accountable for any damages to the cargo. As mentioned previously, please send photos of the damaged pallets to verify actual damages. If the pallets are indeed unusable as we suspect, shipper will not require them back. But it must be their quality department to confirm that, and for that, we need pictures showing clearly the type of damages to the pallets. Also as mentioned on our previous correspondence, since the damages were inflicted while the container was at your care, shipper will want to be reimbursed for the amount of the damage pallets. Has your claims department investigated the origin of the damages to the container? Why are the pallets still inside the box? We will absolutely not accept any demurrage charges. Has any survey been done? Please send comments, photos urgently. We need to resolve this issue asap.”
31. No dia 27.02.2015, a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor: “We are still waiting for your details. I will kindly remind you that we will not be responsible for any expenses.”
32. Em resposta do mesmo dia, a Autora remeteu à Ré um email com o seguinte teor: “We will respond in due course, but as the information signed for by the receiver and that you allege to have already received differ. Perhaps you could elaborate further so we may bring a swift resolution.”
33. Em resposta também do mesmo dia, a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor: “We have no direct communication with receiver. The information we have is from shipper who claims there were only two pallets rejected. The rejected merchandise is currently at your care. Please send report and photos of their current condition.”
34. Em seguida, a Autora, no mesmo dia, remeteu à Ré um email com o seguinte teor: “I've discussed this matter with my colleagues in UK and Portugal, and I would like to comment as follows: TCLU4824167 was carrier under bill of lading 5ETLlV003313, subject to its terms and conditions of carriage. The container arrived at the cnee's premises on the 3rd February, 14 pallets were accepted (13x250ml and íxrtr). The rest 12 pallets were not discharged and were rejected on site. We have no evidence to suggest that the consignee accepted any more ar less than what is stated on the bill of lading and POD (attached). The cnee made no attempt to take any photographs of the alleged damage and simply states that the container is damaged, of course this is two very different things. This is surprising and rather odd to say the least. As my colleague has already advised you, failure to accept cargo a mitigate lasses results ln a full waiver of any claim against the carrier (Clause 20.6). Furthermore, where delivery is not taken, and cargo is stowed remaining ln our care, such storage constitutes delivery and our liability towards the cargo ceases (c1ause 20.4). The merchant shall indemnify A for such costs arising. 50 I do not agree with you, that you (as merchant) are not liable to pay us the cost of storing the cargo to date. We will pursue to storage costs in accordance with the incorporated tariff. 20 (4) If the delivery of the Goods or any part thereof is not taken by the Merchant at the time and place when and where the Carrier is entitled to call upon the Merchant to take delivery thereof whether the Carriage called for by this Bill of Lading is a Port to Port Shipment ar Combined Transport the Carrier shall be entitled without notice to unstow the Goods or that part thereof if stowed in Containers and ar to store the Goods or that part thereof ashore, afloat, in the open or under cover, at the sole risk of the Merchant. Such storage shall constitute due delivery hereunder and thereupon the liability of the Carrier in respect of the Goods or that part thereof stored as aforesaid (as the case may bel shall wholly cease and the cost of such storage (if paid or payable by the Carrier or any agent or subcontractor of the Carrier) shall forthwith upon demand be paid by the Merchant to the Carrier. The options: (1) either Salvino dei Bene/your clientfcnee can ask A to arrange a survey. The costs of this will be for your account. Pictures can be taken of the container, cargo as it should of done when in the care of the cnee. (2) the container is shipped back to your premises ar to your nominated agent or the original receiver. Subject to contract, terms. (3) without acceptance of the goods by the cnee and payment of additional haulage storage, ar a resolution of the issue by way of points 1 or 2, A will hold lien over the goods and dispose of them whatever way we see fit. All rights of claim against the carrier are waived as provided above. This is will actioned in accordance with the terms and in particular, but not limited to, c1ause 20.5 hereunder: 20(5) (5) If the Merchant fails to take delivery of the Goods within thirty days of delivery becoming due under Clause 20(2) or (3), or if in the opinion of the Carrier they are Iikely to deteriorate, decay, become worth/ess or íncur charges whether for storage or otherwise in excess of their volue, the Carrier may, without prejudice to any other rights which he may have against the Merchant, without notice and without any responsibility whatsoever attaching to him, sell, destroy or dispose of the Gaads and app/y any proceeds of sale in reduction of the sums due to the Carrier fram the Merchant. We therefore require your/your clients instructions in respect to this matter. If there is anything outstanding from your clients side, then I suggest that you he/she speaks to the buyer. We will however not allow storage costs to spiral”.
35. Em resposta da mesma data, a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor: “What is the total amount of storage costs so far? Any idea of the cost of the survey? Your e-mail only addresses the costs and what to do with the damaged merchandise. It does not mention anything about the real origin of the problem, which is the damage to the container, which in turn, originated the damages to the cargo. As mentioned to your colleagues in Portugal, the container was delivered on quay for export with no annotation of any kind damages. It is however clear that afterward the container suffered a lateral impact, which caused the damages to the pallets. Since it has been established that the container had no damages at origin, this damaged must have occurred during the journey on the vessel, offloading at destination terminal, ar even during the inland delivery. ln either case, the damaged occurred while the container was under care of A and under the transport contract. If the damages to the pallets are as severe was one would expect, shipper will order it's destruction and will demand reimbursement for value of the lost pallets, as should be expected, since they have no liability in the matter. What are your thoughts on the damaged container? Thank you for your help in trying to resolve this matter swiftly.”.
36. No dia 3.03.2015, a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor: “Any developments or any further comments?”.
37. Em resposta, da mesma data, a Autora remeteu à Ré um email com o seguinte teor: “My colleague Donald is going to revert to you with demmurage and quay rent tariff, and also an indication of survey costs. I cannot comment cause of the damage as the cnee failed to provide any photographs and no inspection has been undertaken to date, however we are discussing the matter with the terminals and vessel.”
38. Seguidamente, no mesmo dia, a Ré enviou à Autora um email com o seguinte teor: “We would just like to remind you that we were only informed of the lack of survey or even the lack of pictures on your e-mail dated of February 26th. We spent 23 days asking A for information and status of the situation. POD with the annotation was only sent by A last week. You can see on the messages attached, that we have been asking for details since February 4th.
Please take that into consideration.”.
39. A Autora respondeu enviando à Ré, no mesmo dia, um email com o seguinte teor: “We are not obliged to provide you photos or undertake a survey, the issue originates because the cnee simply didn't accept the goods and mitigate their loss in accordance with b/l terms. We are the wrong party to ask these questions, the buyer/cnee should have had all of this but neglected to do so - they allege the cargo is damaged. You will find below a calculation of the tariff demurrage and quay rent, the cost of our local survey is around 500-800 GBP approx. We can supply you with contact details if you wish to appoint someone. Otherwise, per my message 27th Feb, please give instructions for delivery.”.
40. A Autora indicou, no mesmo email, os montantes referentes aos custos de “Quay Rent” (30 GBP por cada dia nos primeiros quatro dias; 60 GBP por cada dia nos subsequentes cinco dias; e 100 GBP por cada dia no período subsequente), de “Demurrage” (20 GBP por cada dia nos primeiros quatro dias; 40 GBP por cada dia nos subsequentes seis dias; e 80 GBP por cada dia no período subsequente).
41. Ainda em 3.03.2015, a Ré enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “If the cnee had rejected the pallets due to damages on the cargo itself, i.e., with no apparent cause of damages being related the transport, I would absolutely agree with you. But this case is very different We are talking about a container that was delivered at Setubal port, Portugal with no damages reported, and this same container arrives to the cnee with a huge dent on the side, precisely on the exact same place where the bad pallets were loaded, evidence of a strong impact to the side. The quay accepted the container here at origins with no mention of damages, A Portugal had no information of any damages to the container while it was at quay awaiting loading on the vessel, there is no evidence of any damage during the loading on the vessel, so we must assume the damages originated on the vessel itself ar already at destination. Since the damage to the container at care of A is the probable cause of the damage to the cargo itself, shouldn't A undergo a survey on its own? We continue to discuss the demurrage amount but still there is no mention on your part about the value of the merchandise itself. If the pallets are unusable, shipper will want to be reimbursed for their loss. We have stated that from day one. Should we/shipper be responsible for paying a survey for a damage that occurred at destination, while the container was at A care?”.
42. A Autora, em resposta da mesma data, enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “Joao, I don't dispute it may be the case that the damage occurred whilst in our care, but the carrier's liability is limited. The original picture of the container looks as if it is wave damage, we are not liable for the 1055 and a claim will have to be made to cargo insurer usually. The burden of proof lay with the c1aimant not A so I will not be undertaking a survey unless I see it necessary - we do not even know if the cargo is even damaged. The shipper won't be reimbursed for any proven liability if the goods are not accepted and loss is mitigated - see email dated 6th Feb. I am not adverse to come to an amicable conclusion over the matter, but if the carrier doesn't receive instruction as to what to do with this cargo in the coming days then we simply have no choice but to dispose of them and avoid our mounting costs. We would do so by invoking clause 20(5) as I have described below.”.
43. Em 9.03.2015, a Ré enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “Please note that real shipper (exporter) has already submitted the c1aim to their insurance company. The insurance company will be contacting you to schedule the survey.”
44. Em 11.03.2015, a Ré enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “Please note we need the current location of the merchandise for the purpose of survey. The merchandise is still inside the damaged container correct?”.
45. A Autora, em resposta da mesma data, enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “The container was returned to the port. Port of Liverpool, Liverpool, Merseyside L21 1LA 0151 9496000. It has not been opened since it was rejected by the consignee. I suggest that your surveyor contacts Pauline Guest regarding arrangements to move the container to an inspection area pauline.Guest@peelports.com. There will be shut costs.”.
46. Em 25.03.2015, a Ré enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “We have been trying to get an answer from your local office with no success. We have been contacted by the insurance company, they are asking us for details of a warehouse where the survey can be conducted. Does A have any warehouse where the container can be offloaded and insurance survey done? What would the cost of such operation be? Please reply urgently, we are losing valuable time here.”
47. A Autora, em resposta da mesma data, enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “A do not have a warehouse, but we can recommend you a warehouse in which we could arrange delivery to, your client will need to contract with the warehouse directly and we will need to rearrange for the contract of carriage to be discharged in Liverpool. Donald - Can you please supply IDR details to all in copy. Thereafter we await your instructions.”
48. Ainda no mesmo dia e após a comunicação que antecede, a Autora enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “The warehouse is IDR Logistics Ltd, 10 Dunnings Bridge Road Liverpool, L30 4UZ. (0)151 5251128.
Contact Dave Redmond. idrlogistics ltd@btcannect.com”.
49. A Ré, em resposta da mesma data, enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “Can you please obtain the cost of the transport of the container to this warehouse? The local surveyors will contact the warehouse directly regarding the handling costs.”
50. Seguidamente, a Autora enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “IDR offer collection of the container as part of their service, they will be cheaper than if we had to arrange delivery.”
51. Entre os dias 25.03.2015 e 08.04.2015 não existiram comunicações entre a Autora e a B.
52. Em 8.04.2015, a Autora enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “Your insurers surveyor is looking at the container at Seaforth this afternoon - hopefully they will be authorising the devanning of the remaining cargo shortly.”
53. A perícia teve lugar no dia 08.04.2015.
54. Em 13.04.2015, a Ré enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “Status update please.”
55. A Autora, em resposta da mesma data, enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “The inspection took place on Wednesday we are now waiting for your insurers to give their instructions.”
56. Em 22.04.2015, a Ré enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “The insurance company would like to send the container to a warehouse for further inspection. Would you please arrange with IDR to collect the container from the port urgently and transfer the container to the their warehouse. Then the cargo will be offloaded in the presence of the surveyor. I ask you to please provide a date for this operation. Please tell me when the container can be positioned at the warehouse, that immediately that surveyor will be there to conduct further inspection. I kindly ask for your assistance in this matter.”
57. A Autora, em resposta da mesma data, enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: ”Please contact IDR per the message Donald sent to you on the 25th March. Liverpool will arrange release of the container per instructions to us. "IDR Logistics Ltd. 10 Dunnings Bridge Road Liverpool, L30 4UZ. (0)151 525 1128. Contact Dave Redmond idrlogistics/td@btconnect.com". For the sake of good order we wish to re-affirm:  20(4) If the delivery of the Goods or any part thereof is not taken by the Merchant at the time and place when and where the Carrier is entitled to call upon the Merchant to take delivery thereof whether the Carriage called for by this Bill of Lading is a Port to Port Shipment or Combined Transport the Carrier shall be entitled without notice to unstow the Goods are that part thereof if stowed in Containers and or to store the Goods or that part thereof ashore, afloat, in the open or under cover, at the sole risk of the Merchant. 5uch storage shall constitute due delivery hereunder and thereupon the liability of the Carrier in respect of the Goads or that part thereof stored as aforesaid (as the case may bel shall wholly cease and the cost of such storage (if paid are payable by the Carrier or any agent or subcontractor of the Carrier) shall forthwith upon demand be paid by the Merchant to the Carrier. (Bill of lading T&Cs).”
58. A carga ficou dentro do contentor desde o dia 03.02.2015 até ao dia 23.04.2015.
59. A Requerente emitiu as seguintes faturas referentes a despesas de estacionamento e armazenamento do contentor: Fatura n.º AELIS/2261208 emitida em 19/03/2015 e com vencimento a 19/04/2015, no valor de € 8 063,22, cuja cópia foi junta a fls. 88; Fatura n.º AELIS/2261913 emitida em 23/04/2015 e com vencimento a 23/05/2015, cuja cópia foi junta a fls. 88v.
60. As referidas faturas foram lançadas no extrato da conta-corrente aberto em nome da Ré, que não realizou o seu pagamento.
61. A Ré reclamou das duas faturas enviadas pela Autora por entender que, encontrando-se o frete respeitante ao transporte marítimo em questão estava devidamente pago, nada mais havia a pagar no âmbito daquela prestação de serviços.
3.1.2. Factos não provados
O Tribunal a quo considerou que “Não se provou qualquer outro facto pertinente para a apreciação da causa e, designadamente, que”
a) A Autora, A, procedeu à entrega dos contentores no destino final entre os dias 5 e 6 de fevereiro de 2015.
b) No dia 06.02.2015, a Ré B informou telefonicamente e ainda por email a A de que havia uma recusa por parte do importador, solicitando à Requerente informação sobre o motivo da recusa.
c) Desde 06.02.2015 a 24.02.2015, a Autora não prestou qualquer informação ou esclarecimento à Ré.
d) Em 26.02.2015, a Autora, informou que apenas parte da carga tinha sido recusada, não referindo qual o motivo.
e) Em 27.02.2015, a B reiterou à A o seu pedido de informações sobre a razão da recusa de recebimento da mercadoria em questão.
f) A Autora informou a Ré sobre os motivos da recusa só a 27.02.2015.
g) Em 25.03.2015, a B informou a Autora que o perito andava à procura da carga.
h) Em 08.04.2015, face à falta de informação, a B solicitou informações à A.
i) Em 08.04.2015, a B obtém informação da A de que andavam a tentar localizar o contentor.
j) A paralisação do contentor resultou de um abalroamento exterior ocorrido contra o contentor, provocado pela Autora, no decurso do transporte ou no destino final.
3.2. Os factos e o direito
3.2.1. Da motivação da decisão sobre matéria de facto e da sua alegada insuficiência
Como já se deu nota, a apelante criticou amplamente a motivação da decisão sobre matéria de facto, que reputou de insuficiente – cfr. conclusões 174. a 205.
Numa primeira análise, a argumentação expendida pela apelante a propósito desta questão poderia ser interpretada como reiteração dos argumentos expendidos a propósito da impugnação da decisão sobre matéria de facto.
Porém, a verdade é que, por um lado, a apelante criticou a motivação da decisão sobre a matéria de facto relativamente a pontos de facto que não impugnou (vd. por exemplo as conclusões 194. a 198., nas quais a apelante visou a motivação da decisão relativa às als. d) a f) dos factos não provados, sendo certo que não impugnou a decisão sobre matéria de facto relativa a estes pontos) e, por outro, nos considerandos finais das suas alegações de recurso sustentou que “deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência (…) E. Proceder-se a uma completa e cabal motivação da decisão sobre a matéria de facto quer quanto à motivação subjacente à factualidade dada como provada quer quanto à factualidade dada como não provada”.
O que se retira do inciso citado é que a apelante pretende que o Tribunal da Relação, substituindo-se à primeira instância, elabore uma nova motivação da decisão sobre matéria de facto, quer no tocante aos factos provados, quer no que respeita aos factos não provados.
Não obstante, não indica a apelante qual o quais as disposições legais que sustentam tal pretensão.
Pela nossa parte, cremos que a mesma carece em absoluto de fundamento legal.
Com efeito, conforme tivemos oportunidade de expor no acórdão proferido nestes mesmos autos em 03-03-2020, os vícios da motivação da decisão sobre matéria de facto podem manifestar-se de diversas formas, e conduzir a diversas consequências.
Assim:
- se a sentença for absolutamente omissa quanto à decisão sobre matéria de facto, ou seja, se cumulativamente, não constarem da mesma os factos que o Tribunal considera provados e não provados nem a respetiva motivação da convicção do Tribunal, a sentença será nula, nos termos do disposto no art. 615º, nº 1, al. b) do CPC;
- se a sentença contiver um elenco de factos provados e não provados, mas se não contiver a motivação da decisão sobre matéria de facto, ou se a mesma for obscura ou omissa, e se, neste último caso, tais vícios se reportarem a factos essenciais para o julgamento da causa, o Tribunal da Relação devolve o processo à 1ª instância, a fim de que o Tribunal a quo supra a ausência ou insuficiência da fundamentação – art. 662º, nº 2, al. d) do CPC;
- já se a motivação não for nem insuficiente nem obscura, mas não traduzir a melhor apreciação da prova relativamente a factos essenciais, se o apelante impugnar a decisão sobre matéria de facto, a questão será apreciada pelo Tribunal da Relação, no âmbito da apreciação do recurso em matéria de facto – arts. 640º, e 662º, nº 1 do CPC. Nestes casos, a fundamentação da decisão do Tribunal da Relação implica necessariamente, o reexame da motivação da decisão impugnada, de acordo com os parâmetros enunciados no art. 607º, nº 4 do CPC. O mesmo se dirá, mutatis mutandis, quanto às alterações oficiosas da decisão sobre matéria de facto (art. 662º, nº 1 do CPC).
Não tendo a apelante invocado a nulidade da sentença prevista no art. 615º, nº 1, al. b) do CPC, nem pugnado pela aplicação do disposto no art. 662º, nº 2, al. d) do CPC, e entendendo este coletivo que não se verifica nenhum dos vícios previstos nestas disposições legais, resta apenas concluir pela improcedência da pretensão manifestada pela apelante, no sentido de este Tribunal se substituir ao Tribunal a quo na elaboração ex novo de uma nova motivação da decisão sobre matéria de facto quer no tocante aos factos provados quer no tocante aos factos não provados.
Tudo isto, obviamente, sem prejuízo da ponderada apreciação da impugnação da decisão sobre matéria de facto e do eventual uso dos poderes oficiosos de alteração da decisão sobre matéria de facto, caso tal intervenção se justificar, que implicam a análise da motivação da decisão recorrida e, caso este Tribunal considere ser de alterar aquela decisão, a motivação da convicção diversa.
3.2.2. Da impugnação da decisão sobre matéria de facto
3.2.2.1. Considerações gerais
Dispõe o art. 662º n.º 1 do CPC que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos por assentes, a prova produzida ou um documento superveniente, impuserem decisão diversa.
Por seu turno estatui o art. 640º n.º 1 do mesmo código que quando seja impugnada a decisão sobre matéria de facto deve o recorrente especificar, sob pena de rejeição, os concretos factos que considera incorretamente julgados; os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
O n.º 2 do mesmo preceito concretiza que, sempre que o recorrente se baseie no teor de depoimentos prestados, incumbe-lhe, sob pena de imediata rejeição, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o recurso. A observância desse ónus pressupõe a indicação do início e fim das passagens dos depoimentos tidas por relevantes, podendo o recorrente, se assim o entender, proceder à transcrição dessas passagens. Tal indicação não tem necessariamente que constar das conclusões, mas deve constar da motivação do recurso. No sentido exposto cfr., entre muitos outros, os acs. RC de 17-12-2017 (Isaías Pádua), proc. 320/15.0T8MGR.C1; e STJ 06-12-2016 (Garcia Calejo), p. 437/11.0TBBGC.G1.S1.
A lei impõe assim ao apelante específicos ónus de impugnação da decisão de facto, sendo o primeiro o ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida, o qual implica a análise crítica da valoração da prova feita em primeira instância, tendo como ponto de partida a totalidade da prova produzida em primeira instância.
Sumariando os ónus impostos pelo citado preceito, ensina ABRANTES GERALDES[7]:
“(…) podemos sintetizar da seguinte forma o sistema que agora vigora sempre que o recurso de apelação envolva a impugnação da decisão sobre a matéria de facto:
a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso, e síntese nas conclusões;
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) Relativamente aos pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;
d) (…)
e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente;
f) (…).”
3.2.2.2. O caso dos autos
No caso em apreço, considera este Tribunal que, em geral, a apelante observou os ónus probatórios acima enunciados. Não obstante, não deixaremosde apreciar mais em concreto as situações em que a apelada alegou que os mesmos não foram observados.
3.2.2.2. Ponto 12 dos factos provados – conclusões 45 a 49
O ponto 12. dos factos provados contém a seguinte redação:
12. Ocorreu um embate no exterior de um dos contentores, no decurso do transporte ou no destino final, que provocou estragos visíveis no contentor e, consequentemente, danos na mercadoria interiormente acondicionada.
A apelante pretende que a redação deste ponto seja alterada, de modo a que se precise que o contentor danificado era o contentor com o nº TCLU482416/7.
Da leitura dos arts. 18. e 19. do articulado de oposição pode retirar-se que a apelante alegou oportunamente que o contentor danificado seria efetivamente o TCLU482416/7.
A apelada reconhece que o contentor danificado era exatamente este[8].
Esse dado é confirmado pela documentação junta aos autos que documenta a troca de correspondência registada no elenco de factos provados – cfr. pontos 15., 29., e 34. dos factos provados.
Tal troca de correspondência foi confirmada pelas testemunhas e legais representantes de ambas as partes que depuseram na audiência de julgamento e cujos depoimentos este Tribunal ouviu, na íntegra.
Assim sendo, e tendo igualmente presente que se regista consenso das partes quanto a tal alteração[9], nada obsta a que se altere o referido ponto 12., no tocante à identificação do contentor danificado.
Porém, pretende a apelada que o mencionado ponto de facto seja expurgado do inciso “e, consequentemente, danos na mercadoria interiormente acondicionada”.
Esta pretensão não pode proceder, porquanto a apelada não requereu a ampliação do objeto do recurso, nos termos previstos no art. 636º, nº 1 do CPC.
Assim sendo, o ponto 12. dos factos provados passará a ter a seguinte redação:
“12. Ocorreu um embate no exterior do contentor TCLU482416/7 no decurso do transporte ou no destino final, que provocou estragos visíveis no contentor e, consequentemente, danos na mercadoria interiormente acondicionada.”
3.2.2.3. Ponto 13 dos factos provados – conclusões 50 a 57
O ponto 13. dos factos provados tem o seguinte teor:
13. O destinatário da mercadoria danificada recusou o seu recebimento.
A apelante pretende que este ponto seja alterado, passando a constar que “O destinatário da mercadoria danificada recusou o recebimento de parte da mercadoria inserida no contentor acidentado TCLU482416/7 atentos os danos apresentados no contentor.”.
Sucede porém que do ponto 12., com a redação resultante da alteração mencionada no ponto anterior, já resulta a identificação do contentor danificado, e a referência a danos na mercadoria nele colocada.
Por outro lado, da redação deste ponto 12. decorre que apenas a mercadoria danificada foi recusada.
Quanto ao mais, resulta da leitura dos arts. 18. e 19. do articulado de oposição, a apelante não alegou quais as razões invocadas pelo destinatário para recusar a mercadoria.
Porém, o mesmo facto é expressamente reconhecido pela autora, no art. 4. do articulado de “resposta”[10].
Nesta conformidade, justifica-se a alteração da redação do ponto 13., nos seguintes termos:
13. O destinatário da mercadoria recusou receber a mercadoria que se encontrava no contentor referido em 12. e se achava danificada, em virtude dos danos que a mesma sofrera.
3.2.2.4. Ponto 59 dos factos provados – Conclusões 58 a 108
O ponto 59 dos factos provados tem a seguinte redação:
59. A Requerente emitiu as seguintes faturas referentes a despesas de estacionamento e armazenamento do contentor: Fatura n.º AELIS/2261208 emitida em 19/03/2015 e com vencimento a 19/04/2015, no valor de € 8 063,22, cuja cópia foi junta a fls. 88; Fatura n.º AELIS/2261913 emitida em 23/04/2015 e com vencimento a 23/05/2015, cuja cópia foi junta a fls. 88v.
A apelante pretende que a redação deste ponto de facto seja alterada, passando o mesmo a ter o seguinte teor:
“A Requerente emitiu as seguintes faturas: Fatura n.º AELIS/2261208 emitida em 19/03/2015 e com vencimento a 19/04/2015, no valor de € 8 063,22, cuja cópia foi junta a fls. 88; Fatura n.º AELIS/2261913 emitida em 23/04/2015 e com vencimento a 23/05/2015, cuja cópia foi junta a fls. 88v”
A convicção do Tribunal a quo relativamente a este facto foi motivada nos seguintes termos:
“A convicção sobre a verificação dos factos julgados provados sob os pontos 59. a 61. resultou da apreciação, crítica e conjunta, das declarações prestadas por Diogo .... e José .... e ainda dos depoimentos prestados por João ... (todos confirmando a troca de comunicações eletrónicas juntas aos autos, nos termos já referidos; Diogo .... referiu ainda que apesar das faturas não serem explícitas quanto ao que referenciavam, compreendeu a que se reportavam, tendo reagido mediante reclamação no sentido de que tais montantes não eram devidos) e dos documentos juntos a fls. 88/88v (faturas em apreço), 22/24 e 84/89 (comunicações eletrónicas que confirmam os factos em apreço)”.  
Apreciando, diremos que da análise da mensagem de correio eletrónico datada de 15-04-2015 que constitui o documento nº 7 junto pela autora com o já referido articulado de “resposta” e que constitui uma mensagem de correio eletrónico enviada pela ré à autora (fls. 89) resulta, de modo evidente, que a ré e ora apelante ali reconheceu, de modo expresso que a fatura no valor de € 8.063,22 dizia respeito a despesas de demurrage, embora tenha manifestado o entendimento de que não é responsável por tais despesas.
E, por outro lado, da análise do doc. 8 junto com o mesmo requerimento, resulta que em 23-04-2015 a ré enviou à autora uma outra mensagem de correio eletrónico (fls. 90), na qual se insurgia pelo facto de esta pretender faturar “More than 17000€ of demurrage”.
Esta mensagem surge como resposta a uma outra, que a ré lhe havia enviado na mesma data, cuja cópia consta do mesmo documento (fls. 90), e na qual lhe transmite:
“Pls find attached invoice copy for the remaining quay rent and demurrages (16th March to 23rd April)”.
Portanto destes documentos resulta de forma cristalina que as faturas dos autos se reportam a despesas de estacionamento e armazenamento, e que a ré sempre assim as interpretou.
Ouvidos o depoimento do gerente da ré, Diogo ....., verificamos que o mesmo confirmou a troca de tais mensagens, e que as quantias a que se reportavam as faturas em discussão se deviam a “quay rent” e “demurrage” ou “detention” (15:00 – 16:30).
Tal foi igualmente confirmado pelo gerente da autora (04:00 – 07:15) e pela testemunha arrolada pela ré João .....(08:00 – 08:30), que confirmaram que o litígio entre as partes dizia respeito a despesas de armazenagem e ocupação do contentor.
Assim sendo, conclui-se pela improcedência da pretendida alteração à redação deste ponto 59.
Não obstante, cremos que se impõe a alteração oficiosa da redação deste ponto, nos termos previstos no art. 662º, nº 1 do CPC, de modo a ali se consignar o montante da fatura nº AELIS/2261913. Aliás cremos que tal omissão se deve a lapso manifesto, visto que relativamente à outra fatura o Tribunal a quo não deixou de indicar o respetivo valor.
Tal facto acha-se provado pelo documento nº 6 junto com o articulado de resposta.
Assim, a redação do ponto 59. dos factos provados passará a ser a seguinte:
59. A autora emitiu as seguintes faturas referentes a despesas de estacionamento e armazenamento do contentor: Fatura n.º AELIS/2261208 emitida em 19/03/2015 e com vencimento a 19/04/2015, no valor de € 8 063,22, cuja cópia foi junta a fls. 88; Fatura n.º AELIS/2261913 emitida em 23/04/2015 e com vencimento a 23/05/2015, no valor de € 9.161,53, cuja cópia foi junta a fls. 88v.
Pelas mesmas razões e fundamentos, cremos igualmente que se justifica o aditamento ao elenco de factos provados de dois pontos, com os números 59a e 59b, que ilustrem a troca de correspondência entre as partes no dia 23-04-2015, e que terão o seguinte teor:
59a. Em 23-04-2015 a autora enviou à ré uma mensagem de correio eletrónico com o seguinte teor:
“Pls find attached invoice copy for the remaining quay rent and demurrages (16th March to 23rd April)”
59b. Na mesma data de 23-04-2015, a ré enviou à autora uma mensagem de correio eletrónico na qual, em resposta à mensagem referida em 59a., lhe comunicou o que segue:
“The container hasl already been transferred to the wharehouse.
More than 17000€ of demurrage!
As mentioned before, we will really need your cooperation reducing these costs.
A has mentioned its openness regarding that subject.”
3.2.2.5. Ponto 60 dos factos provados – conclusões 109 e 110
O ponto 60 dos factos provados tem a seguinte redação:
60. As referidas faturas foram lançadas no extrato da conta-corrente aberto em nome da Ré, que não realizou o seu pagamento.
A apelante pretende que este ponto seja alterado, passando a constar que “As referidas faturas não foram pagas pela Ré.”
A convicção do Tribunal a quo relativamente a este facto foi motivada nos termos referidos no ponto anterior.
A apelante sustentou que “Inexiste suporte – documental ou testemunhal para a afirmação de que as faturas foram lançadas no extrato da conta-corrente aberto em nome da Ré, já que esta não juntou aos autos documento comprovativo, como por exemplo a conta-corrente, bem como nem a testemunha a recorrida nem o gerente referiram ou corroboraram tal afirmação.”.
Sucede, contudo, que a referência a extrato de conta-corrente não significa que vigorasse entre as partes um contrato de conta-corrente (art. 344º do Código Comercial), que nunca foi alegado nem se acha demonstrado, face ao teor da factualidade provada.
Assim, deste ponto da matéria de facto apenas se poderá extrair que a apelada documentaria dessa forma, na sua contabilidade, os movimentos a débito e a crédito resultantes dos negócios mantidos com a apelante (conta-corrente contabilística), coisa que em dada vincula esta última[11].
Nesta medida, a alteração pretendida não tem qualquer relevância para a decisão a causa.
Ora, sempre que se verifique que a alteração da decisão sobre matéria de facto pretendida pelo apelante é manifestamente insuscetível de ter como efeito a alteração da decisão quanto ao fundo da causa, deve concluir-se que a impugnação da decisão sobre matéria de facto contraria os princípios da celeridade e celeridade e economia processuais (arts. 2º, nº 1, 137º e 138º, todos do CPC), e constitui um ato inútil, e como tal proibido (art. 130º), razão pelo qual deve o Tribunal da Relação rejeitá-la – Neste sentido cfr. acs. RL 17-04-2018 (Torres Vouga), p. 3830/15.5T8LRA.L1-1; RG 08-02-2018 (Maria Amália Santos), p. 96/14.8TBAMR.G1; RC 16-10-2018 (Moreira do Carmo), p. 1467/15.8T8CBR-A.C1; RL 26-09-2019 (Carlos Castelo Branco), p. 144/15.4T8MTJ.L1-2; STJ 17-05-2017 (Fernanda Isabel Pereira), p. 4111/13.4TBBRG.G1.S1; STJ 13-07-2017 (Fonseca Ramos), p. 442/15.7T8PVZ.P1.S1.
Termos que nesta parte, não se conhece da pretendida impugnação da decisão sobre matéria de facto.
3.2.2.6. Al. c) dos factos não provados – conclusões 112 a 118, e 183 a 193
A al. c) dos factos não provados tem a seguinte redação:
c) Desde 06.02.2015 a 24.02.2015, a Autora não prestou qualquer informação ou esclarecimento à Ré.
A apelante pretende que este este facto seja considerado provado, invocando em abono deste entendimento o depoimento prestado pelo seu gerente.
A convicção do Tribunal a quo relativamente a este facto foi motivada nos seguintes termos:
“Os factos não provados assim foram considerados em virtude de não terem sido suficientemente sustentados pela prova produzida, sendo até, em alguns casos, contrariados por esta, nos seguintes termos: (…) o facto referido na alínea c) foi contrariado pelos elementos probatórios que sustentaram a convicção formada sobre a verificação dos factos dados como assentes nos pontos 24. a 27., nos termos já acima referidos (que contrariam a circunstância de ter sido a Ré a quem aguardava informação da Autora sobre a rejeição da mercadoria danificada pelo destinatário, já que, por um lado já tina sido informado, e, por outro lado, quem aguardava instruções sobre o que fazer à mercadoria danificada era a Autora).”
Analisando, diremos que o que se retira do depoimento do gerente da ré é que entre as datas de 06-02-2015 e 24-02-2015 não houve contactos entre as partes (05:20 – 05:33). O mesmo resulta, também do depoimento da testemunha João .... (02:25 – 04:40).
Da prova documental junta aos autos, vertida na factualidade provada e do teor dos depoimentos acima referidos, bem como dos depoimentos da testemunha Nicole ... e do legal representante da autora resulta de forma inequívoca, que as comunicações entre autora e ré relativas à situação dos autos se estabeleceram por escrito, através de mensagens de correio eletrónico.
A factualidade provada não menciona qualquer mensagem de correio eletrónico trocada pelas partes no período temporal em apreço (vd. pontos 24. e 25).
Por outro lado, não consta dos autos qualquer documento que ateste que nesse período temporal houve troca de correspondência entre as partes.
Nenhuma das testemunhas ou representantes das partes que depuseram em audiência aludiu a qualquer intercâmbio epistolar, contacto telefónico, ou comunicação presencial entre as partes nesse período.
Finalmente, importa salientar que num contexto probatório semelhante que o Tribunal a quo deu como provado o facto vertido no ponto 51. dos factos provados no qual consignou que num período temporal subsequente “não existiram comunicações entre a Autora e a Ré”.
Neste contexto, cremos que deve considerar-se provado que no período compreendido entre os dias 6 e 24 de fevereiro as partes não comunicaram.
Assim sendo, decide-se aditar um novo ponto ao elenco de factos provados, a inserir entre os atuais pontos 24. e 25.,  ao qual se dará o nº 24a., com a seguinte redação:
“Entre os dias 06.02.2015 e 24.02.2015 não existiram comunicações entre a autora e a ré.”
Em consequência, decide-se igualmente suprimir a al. c) dos factos não provados.
3.2.2.7. Al. h) dos factos não provados – conclusões 118 a 121
A al. h) dos factos não provados tem a seguinte redação:
h) Em 08.04.2015, face à falta de informação, a B solicitou informações à A.
A apelante pretende que este este facto seja considerado provado.
A convicção do Tribunal a quo relativamente a este facto foi motivada nos seguintes termos:
“Os factos não provados assim foram considerados em virtude de não terem sido suficientemente sustentados pela prova produzida, sendo até, em alguns casos, contrariados por esta, nos seguintes termos: (…) os factos referidos nas alíneas g) a i) foram contrariados pelos elementos probatórios que sustentaram a convicção formada sobre a verificação dos factos dados como assentes nos pontos 46. a 52., comunicações que, a par das que anteriormente já se mencionaram, não deixam dúvidas sobre a não verificação dos factos em apreço”.
Por seu turno, o Tribunal recorrido justificou desta forma a demonstração dos a propósito dos factos vertidos nos pontos 46. a 52.: “A convicção sobre a verificação dos factos julgados provados sob os pontos 15. a 52. e 54. a 57. resultou da apreciação, crítica e conjunta, das declarações prestadas por Diogo ....e José ....e ainda dos depoimentos prestados por Nicole .... e João .... (todos confirmando a troca de comunicações eletrónicas juntas aos autos, nos termos já referidos) e dos documentos juntos a fls. 15v/20v, 74v/76 e 78/87 (comunicações eletrónicas em causa, que confirmam os factos em apreço).”
Ouvidos os depoimentos em apreço, o que dos mesmos resulta é que o diálogo entre as partes relativamente ao assunto a que se reporta a presente ação foi sempre mantido por escrito, e veiculado através de mensagens de correio eletrónico.
Ora não se mostra junta aos autos qualquer documento que ateste que em 08-04-2015 a ré tenha enviado à autora uma mensagem de correio eletrónico solicitando informações.
É certo que no documento nº 9 junto pela autora com o articulado de “resposta” consta uma mensagem de correio eletrónico enviada pelo gerente da ré e datada de 04-01-2017 (fls. 93 v. – 94)) na qual este declara que “Dia 8/4/2015 solicitamos informações”.
Mas este documento só demonstra que na mencionada data de 04-01-2017 a ré enviou à autora uma mensagem, na qual afirmou que em 08-04-2015 lhe tinha solicitado informações, e não que este último facto aconteceu efetivamente.
Não tem por isso razão a apelante ao sustentar que relativamente a este facto o Tribunal a quo utilizou um critério decisório diverso do adotado para a apreciação de outros factos que julgou provados por documento, na medida em que aquilo que o Tribunal recorrido retirou de tais documentos foi que nas datas registadas nos mesmos a parte emissora enviou a respetiva mensagem, com o teor que da mesma consta, e que a parte recetora a recebeu.
Tais documentos não provam por isso, e por si mesmos, que os factos invocados pela parte emissora aconteceram efetivamente, mas apenas que naquela data a parte emissora proferiu tal afirmação.
Logo, o documento invocado pela apelante não prova que em 08-04-2015 pediu informações à apelada, mas apenas que em 04-01-2017, a ré afirmou, numa mensagem de correio eletrónico dirigida à autora que “Dia 8/4/2015 solicitamos informações”.
Acresce que, repete-se, nenhuma das pessoas que depôs em audiência de julgamento declarou que no dia 08-04-2015 a ré solicitou informações à autora.
Nesta conformidade, resta apenas concluir que os factos vertidos na al. h) em análise não resultaram provados.
3.2.2.8. Al. i) dos factos não provados – conclusões 118 a 121
A al. i) dos factos não provados tem a seguinte redação:
i) Em 08.04.2015, a B obtém informação da A de que andavam a tentar localizar o contentor.
A apelante pretende que este este facto seja considerado provado.
A convicção do Tribunal a quo relativamente a este facto foi motivada nos seguintes termos:
“Os factos não provados assim foram considerados em virtude de não terem sido suficientemente sustentados pela prova produzida, sendo até, em alguns casos, contrariados por esta, nos seguintes termos: (…) os factos referidos nas alíneas g) a i) foram contrariados pelos elementos probatórios que sustentaram a convicção formada sobre a verificação dos factos dados como assentes nos pontos 46. a 52., comunicações que, a par das que anteriormente já se mencionaram, não deixam dúvidas sobre a não verificação dos factos em apreço;”
Apreciando, diremos que valem aqui por inteiro, as considerações acima expendidas: Inexiste nos autos qualquer mensagem enviada pela autora à ré em 08-04-2015 onde conste tal afirmação. O facto de, no email de -01-2017 o gerente da ré afirmar que “dia 8/4/2015 informam que andam a ver onde se encontra o contentor” não faz prova de que este facto se verificou mesmo. Aliás, o que a prova produzida demonstra, é que em 08.04.2015 a autora enviou à ré uma mensagem de correio eletrónico na qual lhe comunicou que o perito da seguradora iria inspecionar o contentor na tarde daquele dia (ponto 52. dos factos provados).
Finalmente, cumpre consignar que nenhuma das pessoas que depôs em audiência de julgamento declarou que em 08-04-2015 a ré comunicou à autora que o perito andava à procura da mercadoria.
Termos em que se conclui que os factos vertidos na al. i) devem permanecer indemonstrados.
3.2.2.9. Al. j) dos factos não provados (conclusões 122 a 126, e 199 a 205)
A al. j) dos factos não provados tem a seguinte redação:
j) A paralisação do contentor resultou de um abalroamento exterior ocorrido contra o contentor, provocado pela Autora, no decurso do transporte ou no destino final.
A apelante pretende que este este facto seja considerado provado.
A convicção do Tribunal a quo relativamente a este facto foi motivada nos seguintes termos:
“Os factos não provados assim foram considerados em virtude de não terem sido suficientemente sustentados pela prova produzida, sendo até, em alguns casos, contrariados por esta, nos seguintes termos: (…) o facto referido na alínea j) não foi apoiado por qualquer dos meios de prova produzidos, nada permitindo concluir por uma ação da Autora na produção do dano verificado no contentor”.
Apreciando, diremos liminarmente, que a pretendida alteração não pode ser acolhida.
Com efeito, a ocorrência de um embate no contentor e os estragos daí decorrentes já consta do ponto 12. dos factos provados.
Quanto ao mais, trata-se de dois juízos conclusivos, que constituem matéria de Direito.
O primeiro decorre do pretendido estabelecimento de uma relação de causa e efeito entre o mencionado embate e a paralisação do contentor. Não sendo possível estabelecer entre os dois factos uma relação de causalidade natural, restaria a causalidade jurídica, que não é questão de facto, mas de Direito.
Quanto à afirmação de que aquele embate foi “provocado pela autora”, a mesma revela-se absolutamente vazia de qualquer conteúdo factual concreto.
Aliás, a demais factualidade apurada nem sequer permite aferir como e em que circunstâncias ocorreu o embate no contentor danificado – vd. ponto 12. dos factos provados.
Daí que se conclua que a proposição vertida na al. j) dos factos não provados não deve transitar para o elenco dos factos provados, e que tal alínea deve, sim, ser suprimida, o que se determina.
3.2.2.1. Email de 15-04-2015 (conclusões 131 a 139)
A apelante pugnou pela inclusão de um novo facto, que contenha a transcrição de uma mensagem de correio eletrónico que a apelada lhe enviou em 15-04-2015.
A mensagem em apreço constitui o documento nº 7 junto pela autora com o articulado de “resposta” (fls. 89).
Tal documento foi junto pela própria autora, em termos que permitem concluir que a mesma admite ter recebido a mensagem em questão.
Tal documento é pertinente para a decisão da causa, não só porque no mesmo a ré se reporta às razões pelas quais considera que não deve à autora o montante inscrito na fatura no valor de € 8063, mas também porque na mesma mensagem a ré reconhece que a mesma se reporta a “demurrage”.
Ao contrário do sustentado pela apelada[12], não cremos que a parte que impugna a decisão sobre matéria de facto tenha de enunciar a redação dos pontos de facto que pretende sejam aditados.
Com efeito, o ónus que a al c) do nº 1 do art. 640º do CPC atribui ao apelante que impugna a decisão sobre matéria de facto consiste em “especificar (…) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.
A observância de tal ónus basta-se com a indicação do sentido da decisão a proferir, não implicando por isso, necessariamente, a enunciação da redação do mesmo ponto de facto (embora este procedimento seja o mais aconselhável).
No caso vertente, resulta claro que a apelante pretende que este tribunal inclua na factualidade provada um ponto de facto que aluda ao envio pela ré à autora da mensagem em apreço, com indicação do seu teor.
Nesta medida, consideramos satisfeito aquele ónus.
Ora estando o facto em apreço provado por documento junto pela própria autora, não temos dúvidas que o mesmo pode e deve incluir o elenco de factos provados, a constar de um novo ponto, a inserir entre os atuais pontos 55. e 56., que passará a ser o ponto 55a., com a seguinte redação:
55a. Em 15-04-2015 a ré enviou à autora uma mensagem de correio eletrónico, com o seguinte teor:
“We received an invoice for demurrage in the amount of 8063 El-JR.
I would like to recall you that you have mentioned earlier in the process, that A was not adverse to an amicable solution regarding the demurrage. This seems like an extremely high amount. It is worth noting that the damaged merchandise is not even worth such an amount.
I am sure the insurance company will pose problems accepting such an high amount.
As I have informed, these charges will be on account of the insurance company but we cannot neglect the fact that a great portion of this demurrage occurred while waiting for details needed to activate the insurance.
On my e-mail of February 3rd (which I attached) I mention a 23 days' time period between the occurrence and finally getting from you the official POD stating the damages.
Throughout this period I emphasized that without the POD shipper would not be able to initiate the insurance procedures. They would need an official document stating what had in fact been refused by the receiver. No one can work with statements like " a portion of the cargo was refused"
Only when we received the POD on 26/02, the shipper could send the file to the insurance company.
I'm sure a great portion of these 8063 EUR in demurrages correspond to these 23 days awaiting documentation.
I would kindly ask you to consider revising the demurrage amount taking into consideration these 23 days that all parties were in fact awaiting the necessary documents to proceed to take action.
The insurance company understands the need for the existence of a demurrage charge but we would absolutely ask you to consider not applying a straight tariff rate for the demurrage due to the circumstances above mentioned.
Thank you in advance for your attention to this matter.”
3.2.2.11. Da prestação de informação pela ré à autora em 11-03-2015 (conclusões 140 a 147)
Sustenta a apelante que deve ser aditado ao elenco de factos provados um novo ponto com o seguinte teor:
“Em 11.03.2015 a B informou a autora de que o perito andava à procura da carga”.
Muito embora nos pareça que o facto em apreço não foi alegado por qualquer das partes, o certo é que o teor da comunicação enviada pela ré à autora em 11-03-2015 é o que consta do ponto 44. dos factos provados (vd. doc. 4 junto pela autora com o articulado de “resposta”).
Da audição do registo dos depoimentos indicados pela apelante resulta de forma clara que nenhuma delas aludiu a qualquer outra comunicação da autora à ré na referida data.
Tanto basta, pois, para concluir que a pretensão da apelante quanto ao aditamento deste ponto de facto não pode proceder.
3.2.2.12. Da permanência da mercadoria no contentor até 08-04-2015, por responsabilidade da autora (conclusões 148 a 153)
Pretende a apelante que se adite um novo facto com o seguinte teor:
“Por responsabilidade da Autora, a mercadoria ficou dentro do contentor até 08.04.2015.”
A permanência da mercadoria no contentor até 08-04-2015 emerge já do ponto 58., no qual se refere que tal situação se manteve desde 03-02-2015 até 23-04-2015.
Quanto à referência à “responsabilidade” da autora, a mesma não configura um facto, mas sim um juízo conclusivo, de natureza jurídica.
A sede própria para aferir um tal juízo será, pois, a fundamentação jurídica da causa.
Termos em que se conclui pela improcedência desta pretensão.
3.2.2.13. Da variabilidade dos procedimentos a adotar pela autora (conclusões 154 a 173)
Sustenta ainda a apelante que deve ser aditado ao elenco de factos provados um ponto com o seguinte teor:
“Os procedimentos a adotar pela Autora, em caso de acidente ocorrido durante o contrato de transporte, variam consoante o tipo de dano em causa.”
Para além de não descortinarmos em que articulado esta afirmação foi proferida, e portanto nos parecer que se trata de matéria não alegada, o certo é que a proposição enunciada pela apelante é vaga, genérica, e absolutamente vazia de conteúdo factual concreto.
Assim sendo, e sem necessidade de outras considerações, conclui-se pela improcedência do aditamento em apreço.
3.2.2.14. Da matéria de facto “revista”
Factos provados:
1. A Autora é uma sociedade comercial por quotas, que se dedica ao exercício das atividades de agente de navegação, de agente transitário e de prestação de serviços relacionados com o transporte de mercadorias e passageiros.
2. A Ré é uma sociedade comercial por quotas, que se dedica à atividade de transitário, agência marítima, transportes internacionais em geral, comissões e consignações e todas as atividades conexas ou afins.
3. A Ré solicitou à Autora a prestação de um serviço de transporte marítimo de 3 contentores tipo 45 HPW, desde o porto de Setúbal até ao destino final, em CHURCHSTOKE – MONTGOMERY - SY156AR POWYS – Reino Unido.
4. A Autora e a Ré acordaram nesse transporte marítimo, tendo esse acordo dado lugar à emissão da Waybill n.º SETLIV003313, a qual se rege pelos termos e condições da correspondente Bill of Lading, nos termos que constam dos documentos juntos a fls. 64 e 65/74, que aqui se dão por reproduzidos.
5. Na cláusula 20 dos termos e condições referidos no ponto anterior consta:
“(4) If the delivery of the Goods or any part thereof is not taken by the Merchant at the time and place when and where the Carrier is entitled to call upon the Merchant to take delivery thereof whether the Carriage called for by this Bill of Lading is a Port to Port Shipment or Combined Transport the Carrier shall be entitled without notice to unstow the Goods or that part thereof if stowed in Containers and or to store the Goods or that part thereof ashore, afloat, in the open or under cover, at the sole risk of the Merchant. Such storage shall constitute due delivery hereunder and there upon the liability of the Carrier in respect of the Goods or that part thereof stored as aforesaid (as the case may be) shall wholly cease and the cost of such storage (if paid or payable by the Carrier or any agent or subcontractor of the Carrier) shall forthwith upon demand be paid by the Merchant to the Carrier”; e “(5) If the Merchant fails to take delivery of the Goods within thirty days of delivery becoming due under Clause 20(2) or (3), or if in the opinion of the Carrier they are likely to deteriorate, decay, become worthless or incur charges whether for storage or otherwise in excess of their value, the Carrier may, without prejudice to any other rights which he may have against the Merchant, without notice and without any responsibility whatsoever attaching to him, sell, destroy or dispose of the Goods and apply any proceeds of sale in reduction of the sums due to the Carrier from the Merchant.”
6. A Ré conhece os termos do contrato celebrado pelas partes, as suas condições e termos.
7. Pelo transporte de cada contentor, a Requerente cobrou o valor de € 1875,00, que a Ré pagou em 01.04.2015.
8. A B procedeu à reserva, no dia 15.01.2015, de 3 contentores tipo 45 HPW, tendo os mesmos sido entregues no porto de Setúbal a 20.01.2015.
9. Os contentores atribuídos à B tinham as seguintes identificações: CRXU050386/8, TCLU480073/5 e TCLU482416/7.
10. Os mesmos foram entregues no porto de Setúbal sem qualquer tipo de indicação de anomalia.
11. A Autora, A, procedeu ao transporte dos contentores, apresentando-os, para entrega no destino final, no dia 3 de Fevereiro de 2015.
12. Ocorreu um embate no exterior do contentor TCLU482416/7 no decurso do transporte ou no destino final, que provocou estragos visíveis no contentor e, consequentemente, danos na mercadoria interiormente acondicionada.
13. O destinatário da mercadoria recusou receber a mercadoria que se encontrava no contentor referido em 12. e se achava danificada, em virtude dos danos que a mesma sofrera.
14. O Sr. João ...., colaborador da Ré, foi quem comunicou com a Autora sobre esta situação, desde o seu início.
15. No dia 03.02.2015, através da colaboradora da Autora, Marina ...., foi remetido email ao João ...., colaborador da Ré, com o seguinte teor:
“O contentor TCLU4824167 do lote abaixo foi recusado no recebedor, ainda estamos a aguardar mais informações / fotografias, mas penso que a carga esteja danificada.
Logo que possível passaremos mais informação.”
16. No mesmo dia e após o anterior, através da colaboradora da Autora, Marina ...., foi remetido novo email ao João ..., colaborador da Ré, com o seguinte teor:
“Parte da carga foi descarregada, tudo o que estava danificado ficou no interior do contentor,
Necessitamos de saber o que faremos à carga”.
17. João ... respondeu por email com a mesma data e com o seguinte teor:
“Sem mais elementos, não podemos tomar nenhuma decisão.
Necessitamos de fotos para averiguar o tipo de danos e onde poderão ter acontecido.”
18. Seguidamente, no mesmo dia, Marina ...., remeteu um email ao João ...., com o seguinte teor:
“Eu estou a aguardar o envio de fotografias, logo que as tenha envio”.
19. Em seguida, Marina ..., remeteu outro email ao Sr. João ...., com o seguinte teor:
“Em anexo algumas fotografias tiradas pelo recebedor da carga, durante o descarregamento.
O contentor já foi direcionado para cais, aguardamos a vossa decisão”.
20. Em resposta e na mesma data, o Sr. João .... remeteu a Marina ..... um email com o seguinte teor:
“São claramente visíveis os danos na lateral do contentor.
O contentor não estava neste estado durante o carregamento aqui na origem. Parece-nos claro que o impacto que o contentor sofreu na lateral danificou algumas paletes.
Não foi registada nenhuma ocorrência durante o carregamento no navio aqui na origem, depreendemos então que o dano ocorreu já no navio, ao descarregar do mesmo, ou em qualquer ponto no destino, ou seja, já à responsabilidade da A visto a entrega ser por vossa conta.
O exportador não aceita a devolução da mercadoria nesse estado e vai ser indemnizado pelo valor da mesma.”
21. No mesmo dia e após o email referido em 20., Marina .... enviou a João ... com o seguinte teor:
“Necessito saber se a ordem é para destruir a carga”.
22. No dia 4.02.2015, Nicole ...., colaboradora da Autora, remeteu um email à Ré com o seguinte teor:
“Necessitamos instruções claras sobre o que fazer a mercadoria”.
23. Em resposta a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor:
“Já falamos com o José .....
Os danos na mercadoria foram provocados por danos causados ao contentor.
O exportador vai querer ser indemnizado por o valor das paletes.
No entanto, precisamos de fotos mais detalhadas, pois o importador afirma ter recusado o contentor inteiro. Antes de mais precisamos esclarecer esta questão”.
24. No dia 6.02.2015, Alberto …., colaborador da Autora, remeteu à Ré um email com o seguinte teor:
“Dear srs., Pls note that it has been brought to our attention that consignee has refused to accept the above load ...
Based on the above we await yr instructions as to what action you wish us to take.
Following on the instructions of our rep. A/UK, we also take the opportunity to quote below clause 20.6 of the A bill terms.
Quote.
Refusal by the Merchant to take delivery of the Goods in accordance with the terms of this clause and/or to mitigate any loss or damage thereto shall constitute a waiver by the Merchant to the Carrier of any claim whatsoever relating to the Goods or the Carriage thereof. Unquote Awaiting yr instructions”.
24a. Entre os dias 06.02.2015 e 24.02.2015 não existiram      comunicações entre a autora e a ré.
25. No dia 24.02.2015, o mesmo colaborador da Autora, remeteu novo email à Ré, com o seguinte teor:
“Would you pls kindly instruct as what action you wish us to take as we have been informed today that cntr is still Present at the terminal full.
Awaiting yr soonest instructions”.
26. Na sequência do anterior email e também no dia 24.02.2015, a Ré remeteu à Autora, na pessoa da sua colaboradora Nicole ..., um email com o seguinte teor:
“Boa tarde Nicole.
O cliente recusou um contentor por inteiro? Continuamos a aguardar da vossa parte um relatório preciso sobre o que aconteceu com cada um dos 3 contentores.
Muito urgente por favor.”
27. Em resposta e na mesma data, a Autora remeteu à Ré um email com o seguinte teor:
“o meu colega Alberto está a tratar deste assunto e entrará em contacto assim que possível”.
28. No dia 25.02.2015, a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor: “Continuamos sem informação. Estou a ficar muito preocupado.”
29. No dia 26.02.2015, a Autora remeteu à Ré um email com o seguinte teor: “Following on the abv issue and as per yr request of information, pls note that part of the cargo loaded in cntr nr TCLU482416/7 has been rejected, as per Attached POD.
We await for yr instructions as to what action you wish us to take.”
30. Em resposta e na mesma data, a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor:
“I am sorry but this information is absolutely late. Only today we receive copy of the POD? This is more than 20 days after the event.
Part of the cargo? For what I can understand from the attached POD, the receiver accepted 14 pallets and rejected 12. Is this accurate? That is not the information we had from shipper and consignee from the beginning.
As mentioned on my e-mail of February 3rd the damages to the side of the container are clearly visible. The container has suffered a strong lateral impact.
It was not recorded any evidence of this damage here at origin while delivering the container for export.
Therefore, we have to assume the damaged occurred on the vessel during the voyage, or while offloading at destination or even during inland transport.
ln either case, the damaged occurred while the container was at care of A and shipper/Savino del Bene cannot be held accountable for any damages to the cargo.
As mentioned previously, please send photos of the damaged pallets to verify actual damages. If the pallets are indeed unusable as we suspect, shipper will not require them back.
But it must be their quality department to confirm that, and for that, we need pictures showing clearly the type of damages to the pallets.
Also as mentioned on our previous correspondence, since the damages were inflicted while the container was at your care, shipper will want to be reimbursed for the amount of the damage pallets.
Has your claims department investigated the origin of the damages to the container? Why are the pallets still inside the box? We will absolutely not accept any demurrage charges. Has any survey been done?
Please send comments, photos urgently. We need to resolve this issue asap.”
31. No dia 27.02.2015, a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor:
“We are still waiting for your details.
I will kindly remind you that we will not be responsible for any expenses.”
32. Em resposta do mesmo dia, a Autora remeteu à Ré um email com o seguinte teor: “We will respond in due course, but as the information signed for by the receiver and that you allege to have already received differ. Perhaps you could elaborate further so we may bring a swift resolution.”
33. Em resposta também do mesmo dia, a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor:
“We have no direct communication with receiver. The information we have is from shipper who claims there were only two pallets rejected.
The rejected merchandise is currently at your care. Please send report and photos of their current condition.”
34. Em seguida, a Autora, no mesmo dia, remeteu à Ré um email com o seguinte teor: “I've discussed this matter with my colleagues in UK and Portugal, and I would like to comment as follows:
TCLU4824167 was carrier under bill of lading 5ETLlV003313, subject to its terms and conditions of carriage. The container arrived at the cnee's premises on the 3rd February, 14 pallets were accepted (13x250ml and 1x1tr). The rest 12 pallets were not discharged and were rejected on site. We have no evidence to suggest that the consignee accepted any more or less than what is stated on the bill of lading and POD (attached). The cnee made no attempt to take any photographs of the alleged damage and simply states that the container is damaged, of course this is two very different things. This is surprising and rather odd to say the least.
As my colleague has already advised you, failure to accept cargo a mitigate lasses results ln a full waiver of any claim against the carrier (Clause 20.6). Furthermore, where delivery is not taken, and cargo is stowed remaining ln our care, such storage constitutes delivery and our liability towards the cargo ceases (c1ause 20.4). The merchant shall indemnify A for such costs arising. 50 I do not agree with you, that you (as merchant) are not liable to pay us the cost of storing the cargo to date. We will pursue to storage costs in accordance with the incorporated tariff.
20 (4) If the delivery of the Goods or any part thereof is not taken by the Merchant at the time and place when and where the Carrier is entitled to call upon the Merchant to take delivery thereof whether the Carriage called for by this Bill of Lading is a Port to Port Shipment or Combined Transport the Carrier shall be entitled without notice to unstow the Goods or that part thereof if stowed in Containers and or to store the Goods or that part thereof ashore, afloat, in the open or under cover, at the sole risk of the Merchant. Such storage shall constitute due delivery hereunder and thereupon the liability of the Carrier in respect of the Goods or that part thereof stored as aforesaid (as the case may bel shall wholly cease and the cost of such storage (if paid or payable by the Carrier or any agent or subcontractor of the Carrier) shall forthwith upon demand be paid by the Merchant to the Carrier.
The options:
(1) either Salvino dei Bene/your client/cnee can ask A to arrange a survey. The costs of this will be for your account. Pictures can be taken of the container, cargo as it should of done when in the care of the cnee.
(2) the container is shipped back to your premises or to your nominated agent or the original receiver. Subject to contract, terms.
(3) without acceptance of the goods by the cnee and payment of additional haulage storage, or a resolution of the issue by way of points 1 or 2, A will hold lien over the goods and dispose of them whatever way we see fit. All rights of claim against the carrier are waived as provided above. This is will actioned in accordance with the terms and in particular, but not limited to, c1ause 20.5 hereunder:
20(5) (5) If the Merchant fails to take delivery of the Goods within thirty days of delivery becoming due under Clause 20(2) or (3), or if in the opinion of the Carrier they are likely to deteriorate, decay, become worthless or incur charges whether for storage or otherwise in excess of their value, the Carrier may, without prejudice to any other rights which he may have against the Merchant, without notice and without any responsibility whatsoever attaching to him, sell, destroy or dispose of the Goods and app/y any proceeds of sale in reduction of the sums due to the Carrier from the Merchant.
We therefore require your/your clients instructions in respect to this matter. If there is anything outstanding from your clients side, then I suggest that you he/she speaks to the buyer. We will however not allow storage costs to spiral”.
35. Em resposta da mesma data, a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor: “What is the total amount of storage costs so far?
Any idea of the cost of the survey?
Your e-mail only addresses the costs and what to do with the damaged merchandise. It does not mention anything about the real origin of the problem, which is the damage to the container, which in turn, originated the damages to the cargo.
As mentioned to your colleagues in Portugal, the container was delivered on quay for export with no annotation of any kind damages. It is however clear that afterward the container suffered a lateral impact, which caused the damages to the pallets.
Since it has been established that the container had no damages at origin, this damaged must have occurred during the journey on the vessel, offloading at destination terminal, or even during the inland delivery.
ln either case, the damaged occurred while the container was under care of A and under the transport contract.
If the damages to the pallets are as severe was one would expect, shipper will order it's destruction and will demand reimbursement for value of the lost pallets, as should be expected, since they have no liability in the matter.
What are your thoughts on the damaged container?
Thank you for your help in trying to resolve this matter swiftly.”.
36. No dia 3.03.2015, a Ré remeteu à Autora um email com o seguinte teor: “Any developments or any further comments?”.
37. Em resposta, da mesma data, a Autora remeteu à Ré um email com o seguinte teor: “My colleague Donald is going to revert to you with demmurage and quay rent tariff, and also an indication of survey costs. I cannot comment cause of the damage as the cnee failed to provide any photographs and no inspection has been undertaken to date, however we are discussing the matter with the terminals and vessel.”
38. Seguidamente, no mesmo dia, a Ré enviou à Autora um email com o seguinte teor: “We would just like to remind you that we were only informed of the lack of survey or even the lack of pictures on your e-mail dated of February 26th.
We spent 23 days asking A for information and status of the situation. POD with the annotation was only sent by A last week.
You can see on the messages attached, that we have been asking for details since February 4th.
Please take that into consideration.”.
39. A Autora respondeu enviando à Ré, no mesmo dia, um email com o seguinte teor: “We are not obliged to provide you photos or undertake a survey, the issue originates because the cnee simply didn't accept the goods and mitigate their loss in accordance with b/l terms. We are the wrong party to ask these questions, the buyer/cnee should have had all of this but neglected to do so - they allege the cargo is damaged. You will find below a calculation of the tariff demurrage and quay rent, the cost of our local survey is around 500-800 GBP approx. We can supply you with contact details if you wish to appoint someone. Otherwise, per my message 27th Feb, please give instructions for delivery.”.
40. A Autora indicou, no mesmo email, os montantes referentes aos custos de “Quay Rent” (30 GBP por cada dia nos primeiros quatro dias; 60 GBP por cada dia nos subsequentes cinco dias; e 100 GBP por cada dia no período subsequente), de “Demurrage” (20 GBP por cada dia nos primeiros quatro dias; 40 GBP por cada dia nos subsequentes seis dias; e 80 GBP por cada dia no período subsequente).
41. Ainda em 3.03.2015, a Ré enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
“If the cnee had rejected the pallets due to damages on the cargo itself, i.e., with no apparent cause of damages being related the transport, I would absolutely agree with you.
But this case is very different We are talking about a container that was delivered at Setubal port, Portugal with no damages reported, and this same container arrives to the cnee with a huge dent on the side, precisely on the exact same place where the bad pallets were loaded, evidence of a strong impact to the side.
The quay accepted the container here at origins with no mention of damages, A Portugal had no information of any damages to the container while it was at quay awaiting loading on the vessel, there is no evidence of any damage during the loading on the vessel, so we must assume the damages originated on the vessel itself or already at destination.
Since the damage to the container at care of A is the probable cause of the damage to the cargo itself, shouldn't A undergo a survey on its own?
We continue to discuss the demurrage amount but still there is no mention on your part about the value of the merchandise itself.
If the pallets are unusable, shipper will want to be reimbursed for their loss. We have stated that from day one. Should we/shipper be responsible for paying a survey for a damage that occurred at destination, while the container was at A care?”.
42. A Autora, em resposta da mesma data, enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
“Joao, I don't dispute it may be the case that the damage occurred whilst in our care, but the carrier's liability is limited.
The original picture of the container looks as if it is wave damage, we are not liable for the loss and a claim will have to be made to cargo insurer usually. The burden of proof lay with the c1aimant not A so I will not be undertaking a survey unless I see it necessary - we do not even know if the cargo is even damaged. The shipper won't be reimbursed for any proven liability if the goods are not accepted and loss is mitigated - see email dated 6th Feb.
I am not adverse to come to an amicable conclusion over the matter, but if the carrier doesn't receive instruction as to what to do with this cargo in the coming days then we simply have no choice but to dispose of them and avoid our mounting costs. We would do so by invoking clause 20(5) as I have described below.”.
43. Em 9.03.2015, a Ré enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
“Please note that real shipper (exporter) has already submitted the c1aim to their insurance company. The insurance company will be contacting you to schedule the survey.”
44. Em 11.03.2015, a Ré enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor: “Please note we need the current location of the merchandise for the purpose of survey. The merchandise is still inside the damaged container correct?”.
45. A Autora, em resposta da mesma data, enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
“The container was returned to the port.
Port of Liverpool,
Liverpool,
Merseyside L21 1LA
0151 9496000.
It has not been opened since it was rejected by the consignee. I suggest that your surveyor contacts Pauline Guest regarding arrangements to move the container to an inspection area
pauline.Guest@peelports.com.
There will be shut costs.”.
46. Em 25.03.2015, a Ré enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
“We have been trying to get an answer from your local office with no success.
We have been contacted by the insurance company, they are asking us for details of a warehouse where the survey can be conducted.
Does A have any warehouse where the container can be offloaded and insurance survey done? What would the cost of such operation be?
Please reply urgently, we are losing valuable time here.”
47. A Autora, em resposta da mesma data, enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
A do not have a warehouse, but we can recommend you a warehouse in which we could arrange delivery to, your client will need to contract with the warehouse directly and we will need to rearrange for the contract of carriage to be discharged in Liverpool.
Donald - Can you please supply IDR details to all in copy. Thereafter we await your instructions.”
48. Ainda no mesmo dia e após a comunicação que antecede, a Autora enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
“The warehouse is
IDR Logistics Ltd,
10 Dunnings Bridge Road Liverpool, L30 4UZ
(0)151 5251128.
Contact Dave Redmond
idrlogisticsltd@btcannect.com”.
49. A Ré, em resposta da mesma data, enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
“Can you please obtain the cost of the transport of the container to this warehouse? The local surveyors will contact the warehouse directly regarding the handling costs.”
50. Seguidamente, a Autora enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
“IDR offer collection of the container as part of their service, they will be cheaper than if we had to arrange delivery.”
51. Entre os dias 25.03.2015 e 08.04.2015 não existiram comunicações entre a Autora e a B.
52. Em 8.04.2015, a Autora enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
“Your insurers surveyor is looking at the container at Seaforth this afternoon - hopefully they will be authorising the devanning of the remaining cargo shortly.”
53. A perícia teve lugar no dia 08.04.2015.
54. Em 13.04.2015, a Ré enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
“Status update please.”
55. A Autora, em resposta da mesma data, enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
“The inspection took place on Wednesday we are now waiting for your insurers to give their instructions.”
55a. Em 15-04-2015 a ré enviou à autora uma mensagem de correio eletrónico, com o seguinte teor:
“We received an invoice for demurrage in the amount of 8063 El-JR.
I would like to recall you that you have mentioned earlier in the process, that A was not adverse to an amicable solution regarding the demurrage. This seems like an extremely high amount. It is worth noting that the damaged merchandise is not even worth such an amount.
I am sure the insurance company will pose problems accepting such an high amount.
As I have informed, these charges will be on account of the insurance company but we cannot neglect the fact that a great portion of this demurrage occurred while waiting for details needed to activate the insurance.
On my e-mail of February 3rd (which I attached) I mention a 23 days' time period between the occurrence and finally getting from you the official POD stating the damages.
Throughout this period I emphasized that without the POD shipper would not be able to initiate the insurance procedures. They would need an official document stating what had in fact been refused by the receiver. No one can work with statements like " a portion of the cargo was refused"
Only when we received the POD on 26/02, the shipper could send the file to the insurance company.
I'm sure a great portion of these 8063 EUR in demurrages correspond to these 23 days awaiting documentation.
I would kindly ask you to consider revising the demurrage amount taking into consideration these 23 days that all parties were in fact awaiting the necessary documents to proceed to take action.
The insurance company understands the need for the existence of a demurrage charge but we would absolutely ask you to consider not applying a straight tariff rate for the demurrage due to the circumstances above mentioned.
Thank you in advance for your attention to this matter.”
56. Em 22.04.2015, a Ré enviou à Autora uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
“The insurance company would like to send the container to a warehouse for further inspection. Would you please arrange with IDR to collect the container from the port urgently and transfer the container to the their warehouse. Then the cargo will be offloaded in the presence of the surveyor. I ask you to please provide a date for this operation. Please tell me when the container can be positioned at the warehouse, that immediately that surveyor will be there to conduct further inspection. I kindly ask for your assistance in this matter.”
57. A Autora, em resposta da mesma data, enviou à Ré uma comunicação eletrónica com o seguinte teor:
”Please contact IDR per the message Donald sent to you on the 25th March. Liverpool will arrange release of the container per instructions to us.
"IDR Logistics Ltd.
10 Dunnings Bridge Road Liverpool, L30 4UZ.
(0)151 525 1128.
Contact Dave Redmond idrlogistics/td@btconnect.com".
For the sake of good order we wish to re-affirm:  20(4) If the delivery of the Goods or any part thereof is not taken by the Merchant at the time and place when and where the Carrier is entitled to call upon the Merchant to take delivery thereof whether the Carriage called for by this Bill of Lading is a Port to Port Shipment or Combined Transport the Carrier shall be entitled without notice to unstow the Goods are that part thereof if stowed in Containers and or to store the Goods or that part thereof ashore, afloat, in the open or under cover, at the sole risk of the Merchant. 5uch storage shall constitute due delivery hereunder and thereupon the liability of the Carrier in respect of the Goads or that part thereof stored as aforesaid (as the case may bel shall wholly cease and the cost of such storage (if paid are payable by the Carrier or any agent or subcontractor of the Carrier) shall forthwith upon demand be paid by the Merchant to the Carrier. (Bill of lading T&Cs).”
58. A carga ficou dentro do contentor desde o dia 03.02.2015 até ao dia 23.04.2015.
59. A autora emitiu as seguintes faturas referentes a despesas de estacionamento e armazenamento do contentor: Fatura n.º AELIS/2261208 emitida em 19/03/2015 e com vencimento a 19/04/2015, no valor de € 8 063,22, cuja cópia foi junta a fls. 88; Fatura n.º AELIS/2261913 emitida em 23/04/2015 e com vencimento a 23/05/2015, no valor de € 9.161,53, cuja cópia foi junta a fls. 88v.
59a. Em 23-04-2015 a autora enviou à ré uma mensagem de correio eletrónico com o seguinte teor:
“Pls find attached invoice copy for the remaining quay rent and demurrages (16th March to 23rd April).”
59b. Na mesma data de 23-04-2015, a ré enviou à autora uma mensagem de correio eletrónico na qual, em resposta à mensagem referida em 59a., lhe comunicou o que segue:
“The container has already been transferred to the warehouse.
More than 17000€ of demurrage!
As mentioned before, we will really need your cooperation reducing these costs.
A has mentioned its openness regarding that subject.”
60. As referidas faturas foram lançadas no extrato da conta-corrente aberto em nome da Ré, que não realizou o seu pagamento.
61. A Ré reclamou das duas faturas enviadas pela Autora por entender que, encontrando-se o frete respeitante ao transporte marítimo em questão estava devidamente pago, nada mais havia a pagar no âmbito daquela prestação de serviços.
Factos não provados[13]
a) A Autora, A, procedeu à entrega dos contentores no destino final entre os dias 5 e 6 de fevereiro de 2015.
b) No dia 06.02.2015, a Ré B informou telefonicamente e ainda por email a A de que havia uma recusa por parte do importador, solicitando à Requerente informação sobre o motivo da recusa.
d) Em 26.02.2015, a Autora, informou que apenas parte da carga tinha sido recusada, não referindo qual o motivo.
e) Em 27.02.2015, a B reiterou à A o seu pedido de informações sobre a razão da recusa de recebimento da mercadoria em questão.
f) A Autora informou a Ré sobre os motivos da recusa só a 27.02.2015.
g) Em 25.03.2015, a B informou a Autora que o perito andava à procura da carga.
h) Em 08.04.2015, face à falta de informação, a B solicitou informações à A.
i) Em 08.04.2015, a B obtém informação da A de que andavam a tentar localizar o contentor.
3.2.3. Do mérito da causa
3.2.3.1. Considerações gerais e delimitação do regime jurídico aplicável
Resulta da factualidade provada que autora e ré acordaram entre si o transporte “marítimo” de três contentores, desde o porto de Setúbal até Churchstoke, Montgomery, Reino Unido[14].
O Tribunal a quo qualificou o contrato dos autos como contrato de transporte marítimo de mercadorias, mas a apelante apelida-o de “contrato de transporte combinado (marítimo e terrestre) de mercadorias”.
Muito embora não fundamente a divergência quanto à qualificação jurídica do contrato dos autos, cremos que a mesma se deve à circunstância de o destino final das mercadorias não ser um porto, mas uma localidade no interior do país de Gales.
O contrato de transporte é um contrato comercial típico, previsto e regulado nos arts. 366º ss. do Código Comercial[15] (exceto no tocante ao transporte rodoviário de mercadorias, atualmente regulado pelo DL nº 293/2003, de 04-10, que expressamente derrogou o Código Comercial), mediante o qual uma parte (o transportador) se obriga perante outra (o expedidor) a transportar determinada pessoa ou mercadoria de um lugar para outro, mediante contrapartida em dinheiro[16].
Na execução da prestação a que está obrigado, pode o transportador socorrer-se de outros intervenientes, v.g. os seus funcionários, ou entidades subcontratadas (art. 367º do CCom).
Por outro lado, sobretudo no caso do transporte marítimo de mercadorias, é muito frequente a intervenção de uma terceira entidade, que não intervém na negociação nem na outorga do contrato de transporte, mas com importante intervenção da fase final da sua execução: o destinatário.
A qualificação tipológica deste tipo contratual não tem sido consensual, sustentando entre nós MENEZES CORDEIRO[17] que se trata de um contrato bilateral a favor de terceiro, e argumentando FRANCISCO COSTEIRA DA ROCHA[18] que se trata de um contrato trilateral assíncrono.
Como refere FRANCISCO COSTEIRA DA ROCHA[19], “(…) o contrato de transporte é um contrato triangular. (…) O contrato celebrado entre carregador e transportador não pode atingir o seu escopo sem a intervenção do destinatário, sem que o destinatário adira ao contrato. Por esta razão se afirma que o contrato de transporte nasce bilateral, mas potencialmente trilateral. (…)
O destinatário não é parte desde o início, porém desde o início existe a expectativa de que intervirá como parte. O contrato de transporte apresenta-se como um contrato inicialmente bilateral (celebrado entre carregador e transportador), aberto à adesão do destinatário; é celebrado na expectativa da adesão in itinere do destinatário. (…)”.
Esta tese, denominada da trilateralidade assíncrona, tem sido sustentada na jurisprudência nacional (em detrimento de outra tese que qualifica este contrato como um contrato bilateral a favor de terceiro) – cfr., entre outros, os acs. RL 22-06-2010 (Roque Nogueira), p. 1/08.0TNLSB.L1-7; RL 23-11-2011 (Teresa Albuquerque), p. 5849/04.2YXLSB.L1-2; RL 03-05-2012 (Aguiar Pereira), p. 43/09.9TNLSB.L1-6RC 16-12-2015 (Manuel Capelo), p. 2308/13.6TJCBR.C1, RL 19-10-2017 (Ondina Carmo Alves), p. 79/12.2TNLSB.L1-2, e RL 15-12-2020 (Diogo Ravara), p. 175/17.0TNLSB.L1-7.
De qualquer modo, a doutrina vem salientando que a prestação típica do contrato de transporte de mercadorias se reconduz a uma obrigação de resultado, a saber, a deslocação dos bens do ponto de origem para um ponto de destino, com a inerente obrigação que impende sobre o transportador de entregar esse bens, íntegros, ao seu destinatário[20].
Tal entendimento foi igualmente manifestado no ac. RL 17-02-2005 (Granja da  Fonseca), p. 837/2005-6.
Numa perspetiva mais abrangente, o conjunto das posições jurídicas dos três intervenientes neste tipo de contrato foi lapidarmente enunciada no já identificado ac. RL 19-10-2017 (Ondina Carmo Alves), p. 79/12.2TNLSB.L1-2  nos seguintes termos[21]:
“São direitos do expedidor:
a)-A operação de deslocação da mercadoria de um local para outro, se proceda no tempo convencionado,
b)-Ter a disposição das mercadorias (artigo 380º, do Código Comercial), já que, em qualquer momento da execução do contrato, o expedidor pode dar novas ordens para o transportador, alterando o que, inicialmente, foi convencionado.
c)-A entrega das mercadorias seja feita ao destinatário no mesmo estado em que foram recebidas pelo transportador.
d)-Poder demandar contra o transportador em caso de incumprimento obrigacional, decorrente de perda ou avaria das mercadorias ou por atraso no cumprimento da prestação.
(…) deveres do carregador/expedidor:
a)-Entregar a mercadoria para o transportador no local convencionado.
b)-Efectuar o pagamento pela contraprestação do serviço (remuneração do transportador).
c)-Responsabilidade do transportador, mediante a descrição e individualização das mercadorias objecto do transporte, pelos danos resultantes de omissões ou incorreções sobre os elementos necessários à descrição das mercadorias e seus defeitos não declarados na embalagem e acondicionamento adequado das coisas a transportar, nos termos do artigo 4º do Decreto Lei 352/86 e também do artigo 3º, nº 5, da Convenção de Bruxelas.
(…) direitos do transportador:
a)-Recebimento da remuneração pela prestação do serviço de transporte (artigo 1º do Decreto Lei 352/86).
b)-Recebimento da mercadoria, objecto do contrato de transporte (artigo 3º, nº 3, da Convenção de Bruxelas).
c)-Apresentação de reserva no conhecimento de carga sobre o estado da mercadoria recebida (artigo 376º do Código Comercial e artigo 3º, nº 6, da Convenção de Bruxelas).
d)-Retenção da mercadoria enquanto não efetuado o pagamento do frete (artigo 390º do Código Comercial).
e)-Poder escolher o trajecto de deslocamento que melhor lhe seja conveniente, salvo estipulação em contrário.
(…) obrigações do transportador:
a)-Providenciar o deslocamento das mercadorias objecto do contrato de transporte de um lugar para outro, de forma incólume, no local e no tempo convencionado (artigos 383º a 385º do Código Comercial e artigo 4º, nº 1, da Convenção de Bruxelas), visto que é obrigação do transportador receber a mercadoria e entregá-la ao destinatário. Essa entrega pode ser: i) a bordo (compete ao destinatário as operações de descarga); ii) no cais (compete ao transportador descarregar a mercadoria); iii) no domicílio do destinatário (o transportador deve fazer as operações terrestres necessárias – descarga para o cais e subsequente transporte até o domicílio do destinatário).
b)-Emitir o conhecimento de transporte nos termos legais ou convencionados (artigo 369º do Código Comercial). Além de emitir o conhecimento, o transportador também tem a obrigação de verificar a exactidão das indicações que nele são apostas relativamente às mercadorias, em relação àquelas que, em razão da natureza e do acondicionamento das mercadorias e diante da modalidade técnica das operações de carga, seja possível o controle prévio pelo transportador (cfr. MÁRIO RAPOSO, Sobre o contrato de transporte de mercadorias por mar, Boletim do Ministério da Justiça (BMJ) 376, 1988, 36).
c)-Dever de informação que, em geral, resulta da boa fé na execução dos contratos (artigo 762º, nº. 2 do Código Civil). Na hipótese do transporte não se poder realizar ou estiver extraordinariamente em atraso, por caso fortuito ou força maior, deve o transportador avisar imediatamente o expedidor, podendo este rescindir unilateralmente o contrato, reembolsando o transportador pelo frete proporcional (artigo 379º, do Código Comercial) e restituindo a guia de transporte. O ónus da prova de que houve força maior é do transportador (artigo 383º do Código Comercial).
d)-Responsabilização pelas perdas e avarias das mercadorias e atrasos no cumprimento do contrato de transporte (artigos 377º, 383º e 384º do Código Comercial e artigos 3º e 5º da Convenção de Bruxelas).
(…) direitos do destinatário:
a)-Receber a entrega da mercadoria transportada, quando dispõe do título necessário, cabendo ao transportador fazer a prova dessa entrega (artigos 387º e 388º do Código Comercial). A entrega da mercadoria, para efeitos jurídicos, ocorre no momento em que o destinatário aceita a mercadoria transportada e entrega a declaração de recepção ao transportador, liberando-o, a partir daí, de qualquer risco sobre o objeto transportado.
b)-Verificar o estado da mercadoria transportada antes de seu recebimento (artigo 385º do Código Comercial).
c)-Disposição da mercadoria, como o expedidor, de forma alternativa (artigo 380º, § 2º do Código Comercial).
d)-Exigir a entrega da mercadoria transportada ou ressarcimento dos danos ocasionados por inadimplemento contratual (artigo 389º do Código Comercial).
(…) deveres do destinatário:
a)-Recebimento da mercadoria.
b)-Pagamento do preço, sendo o contrato de transporte um contrato bilateral entre o expedidor e o transportador, a questão que surge é a da possibilidade de ser cobrado o valor do frete ao destinatário e, se possível, em que condições.”
Seja como for, sempre que o contrato de transporte implique a conjugação de trajetos por via terrestre e trajetos por via marítima, estaremos perante um contrato de transporte multimodal.
Este tipo contratual foi objeto da Convenção das Nações Unidas sobre transporte  multimodal internacional[22], assinada em Genebra, em 1980, e ali definido como «o transporte de mercadorias efetuado por, pelo menos, dois diferentes modos de transporte, na base de um contrato de transporte multimodal, de um lugar no país onde as mercadorias são tomadas pelo operador de transporte multimodal para um lugar designado para a entrega, situado num país diferente. As operações de levantamento e de entrega dos bens transportados, realizados no âmbito de performance do contrato de transporte unimodal, não devem ser consideradas como transporte internacional multimodal».
Como salienta MÓNICA MARQUES DA SILVA VITTO[23], “ O contrato de transporte multimodal é celebrado entre o  carregador  e  o operador de transporte multimodal. A figura do carregador é imbuída, desde logo, de grande importância, uma vez que marca o início da operação de transporte. Desde logo, o carregador assume 28a obrigação de entregar as mercadorias ao operador de transporte multimodal. Naturalmente que sem o envio das mesmas a operação de transporte não se poderá iniciar. O carregador tem ainda a seu cargo outras obrigações, mais concretamente, a entrega de todos os documentos inerentes à mercadoria; a obrigação de descrição da mercadoria – que assume um papel muito importante na medida em que será responsável perante o transportador pelos danos resultantes das omissões ou incorreções de elementos necessários à descrição da mercadoria; e, ainda, a obrigação de pagar o preço de transporte. Em contrapartida, obtém o direito de disposição e o direito de deslocação das mercadorias no mesmo estado de conservação em que as recebeu. Por sua vez, em termos gerais, o operador de transporte multimodal assume contratualmente a obrigação de deslocação das mercadorias – no mesmo estado de conservação em que as recebeu – e de entrega no local de destino. Como contrapartida das obrigações assumidas adquire o direito a auferir uma prestação pecuniária pelo cumprimento da prestação a que se encontra adstrito, designada frete. O destinatário vem definido no n.º 6 do artigo 1.º das Regras UNCTAD/ICC de 1992 como a pessoa a quem devem ser entregues as mercadorias transportadas 71. Este adquire o direito à entregada mercadoria transportada e o direito de disposição.”
Sucede, porém que a Convenção de Genebra não recolheu o número de ratificações suficientes para entrar em vigor[24].
De qualquer modo, a doutrina tem entendido que o regime do transporte multimodal é integrado pelas regras que regem cada um dos troços do trajeto das mercadorias - Neste sentido cfr. tb. o acórdão RL 02-02-2021 (Carlos Oliveira), p. 326/11.8TNLSB.L1[25], deste Tribunal e secção, que o aqui relator e 1ª adjunta subscreveram na qualidade de adjuntos.
No caso vertente, não é claro que o dissídio a dirimir nos presentes autos se reporte à parte do trajeto em que foi utilizada a via marítima, na medida em que as faturas a que se reportam os presentes autos se reportam a despesas de armazenamento e sobredemoras (Quay and demurrage), que tiveram a sua génese na parcial recusa da carga transportada por parte do destinatário, que invocou danos na mercadoria, sem que se tenha apurado se tais danos ocorreram no trajeto marítimo, ou no trajeto rodoviário[26].
De qualquer modo, tal como salientou o Tribunal a quo na sentença recorrida, na sua vertente de transporte marítimo, o contrato dos autos rege-se pela Convenção Internacional Para a Unificação de Certas Regras em Matéria de Conhecimento de Carga, assinada em Bruxelas em 25-08-1924[27], expressamente incorporada no direito interno pelo DL n.º 37748, de 01-02-1950[28] e, subsidiariamente, pelo DL n.º 352/86, de 31-10.
Este último diploma dispõe, no seu nº 1 que o contrato de transporte de mercadorias por mar “é aquele em que uma das partes se obriga em relação à outra a transportar determinada mercadoria, de um porto para porto diverso, mediante uma retribuição pecuniária, denominada frete”.
Tal contrato está sujeito à forma escrita, consubstanciada num escrito particular denominado conhecimento de embarque, ou conhecimento de carga (bill of lading, connaissement, Konossement, polizza di carico) – art. 3º do mesmo diploma.
Como sublinhou o Tribunal a quo na sentença recorrida, neste tipo contratual o conhecimento de embarque assume “(…) importância capital, porquanto emitido e entregue pelo transportador ao carregador o mesmo constitui um título representativo da mercadoria nele descrita - podendo ser nominativo, à ordem e ao portador - e é transmissível de acordo com o regime geral dos títulos de crédito (arts. 3.° e 11.° do DL n.º 352/86).
O conhecimento de embarque ou de carga desempenha, assim, uma tríplice função:  serve de recibo de entrega ao transportador de uma certa e determinada mercadoria nele descrita; prova o contrato de transporte firmado entre carregador e transportador e as condições do mesmo; e representa a mercadoria nele escrita, sendo negociável e transmissível, de acordo com o regime geral dos títulos de crédito.”[29]
3.2.3.2. Da responsabilidade da ré pelos custos relativos a despesas de estacionamento e armazenamento (“quay” e “demurrage”), da alegada violação dos deveres do transportador, e da invocada nulidade da cláusula 20ª das condições gerais do conhecimento de embarque (“bill of lading”)
3.2.3.2.1. Dos custos relativos a despesas de estacionamento e armazenamento “quay” e “demurrage”)
Como se afere da factualidade provada, a autora fez entregar a mercadoria no seu destino em 03-02-2015, mas parte da mercadoria permaneceu dentro do contentor até 23-05-2015 [30], razão pela qual a autora faturou à ré despesas de estacionamento e armazenamento[31].
Ora, sobre esta matéria referiu o Tribunal a quo que[32] “o conhecimento de embarque ou de carga que titula o de transporte não é totalmente omisso relativamente ao titular da responsabilidade pelo atraso na libertação (desocupação) dos contentores cedidos pelo transportador para a deslocação das mercadorias.
Efetivamente, na cláusula 20. do conhecimento de carga[33], consagra-se entre outras a obrigação do carregador/destinatário aceitarem as mercadorias transportadas no local acordado para a entrega das mesmas, sem prejuízo de eventuais reservas a tal receção, incorrendo em responsabilidade pelo pagamento das despesas resultantes da recusa de tal aceitação, para além de se conferir ao transportador outros direitos (vg. de armazenamento da mercadoria recusada em local à sua escolha) no sentido de permitir a libertação do contentor. Mais se refere naquela cláusula que a recusa do comerciante em receber a mercadoria de acordo com os termos ali referidos e, ou, para mitigar qualquer perda ou dano ao mesmo constituirá uma renúncia do destinatário ao transportador de qualquer reivindicação qualquer que seja relacionado aos bens ou ao transporte dos mesmos.
Tratam-se de estipulações que se encontram em linha com os usos da atividade (por demais conhecidos por qualquer transportador ou interessado na carga, seja este carregador ou consignatário ou destinatário da mercadoria), no sentido de que os contentores, uma vez desembarcados no porto de destino, devem ser levantados e restituídos devolutos ao transportador num determinado prazo. Tal restituição deve acontecer no local que previamente foi convencionado no contrato de transporte, configurando uma das obrigações do carregador/destinatário, no que concerne ao resgate e devolução do contentor utilizado na deslocação marítima, que cessa apenas com a restituição efetiva da unidade de carga ao transportador.
Os atrasos no levantamento dos contentores e na sua restituição, relativamente aos tempos acordados, oneram o interessado na carga relapso no pagamento dos custos de imobilização/retenção e armazenagem, respetivamente, ambos consagrados pelas partes do contrato de transporte ajustado.
A origem das despesas de imobilização/retenção dos contentores remonta às cartas-partidas dos contratos de fretamento por viagem. Como se sabe, nestes fretamentos o tempo corre contra o fretador (owner), cujo interesse não é o de manter o navio parado no porto, mas antes o de encetar o maior número de viagens em sucessivos contratos de fretamento. Por isso, e dado que a permanência em cais não gera rendimento ao fretador, é usual as partes convencionarem uma duração (estadia ou laytime) para as operações de carga e descarga por banda do afretador e o pagamento de sobrestadias (ou sobre-demoras) caso aquela seja ultrapassada. Estas sobrestadias acabam, pois, por satisfazer as exigências, por um lado, do owner interessado na utilização/rentabilização do navio e, por outro, do afretador que quer transportar as mercadorias: elas traduzem-se no estabelecimento de um prazo acrescido para que o afretador possa concluir as operações de carga e descarga mediante o pagamento de uma quantia extraordinária ao fretador, que deste modo se vê compensado pela imobilização do navio.
Pegando nesta realidade, o princípio das sobreestadias foi sendo transposto para o universo dos contentores, dada a similitude existente entre o fornecimento de um módulo de transporte que vai ser expedido pelo carregador e a disponibilização de um navio que, ao abrigo de uma carta-partida, realiza uma viagem. 
Os armadores «de frete contentorizado» passaram, assim, a cobrar toda a utilização da unidade de transporte para além do tempo acordado, exigindo dos interessados na carga o pagamento de uma importância para o levantamento e/ou restituição tardia(s) do contentor que foi utilizado na deslocação marítima das suas mercadorias.
A equiparação entre as sobreestadias do navio e as «sobre-demoras» do contentor deve ser tida como normal, pois ambas se referem a uma realidade comum: o atraso na devolução do bem disponibilizado por uma parte à outra com o propósito de transportar uma carga determinada.
Porém, tal não significa que sobreestadias e «sobre-demoras» estejam sujeitas ao mesmo regime jurídico, pois a disponibilização do contentor por banda do transportador marítimo radica numa verdadeira locação e engendra ainda um depósito.
A locação é sempre onerosa: o aluguer do contentor, incluído dissimuladamente no frete, garante a retribuição do gozo da unidade de transporte desde o seu levantamento na origem até ao termo do decurso do período que habitualmente o transportador marítimo concede no destino aos interessados na carga para, após o desembarque, lhe devolverem o contentor. Esta dilação no destino (apelidada na gíria de free time) visa fundamentalmente permitir o desembaraço aduaneiro das mercadorias e a obtenção do meio terrestre de transporte do contentor desde o parque do terminal até ao destino final a fim de o mesmo aí ser «desovado». Mas uma vez ultrapassada, permite ao transportador-locador exigir uma quantia diária pré-estabelecida, a qual, para além de poder ser contabilizada desde o primeiro dia de free time e continuar a remunerar a fruição do contentor, tem ainda como fim recuperar uma parte do custo do tempo de inatividade do módulo de transporte e compelir à libertação rápida da unidade de carga para que a sua exploração seja maximizada. Tal quantia diária, que se denomina de demurrage (quando se refere ao período que antecedeu o levantamento do contentor) ou detention (caso respeite ao atraso na devolução do módulo de transporte), tem assim a natureza de um verdadeiro aluguer.
O depósito do contentor é tendencialmente gratuito para o interessado na carga, o qual dispõe de um free time para tratar do desembaraço e transporte terrestre do contentor para o destino final. Durante este período («de carência»), o contentor fica armazenado e à guarda do terminal sem qualquer custo que não tenha já sido refletido no frete. Uma vez ultrapassada tal dilação, o terminal debita uma quantia diária pré-estabelecida ao consignatário / destinatário da carga, a qual pode retroagir ao momento fixado para o início do cálculo dos dias livres. Tal importância é habitualmente conhecida no meio marítimo como «storage».”
Subscrevemos, no essencial o entendimento manifestado pelo Tribunal a quo relativamente à natureza jurídica da demurrage e quay expenses, ou storage.
Com efeito, das cláusulas do conhecimento de embarque resulta claramente que tal clausulado rege todo o percurso da mercadoria, seja na vertente marítima, seja na vertente rodoviária (vd. e especial as cláusulas 6. relativa à responsabilidade do transportador; 8. Relativa à utilização e contentores; 12 sobre a responsabilidade do expedidor, e 20 respeitante à entrega da mercadoria).
Debruçando-se sobre a problemática da utilização dos contentores nos transportes internacionais de mercadorias discorreu, de forma particularmente esclarecedora, o já citado ac. RL 19-10-2017 (Ondina Carmo Alves), p. 79/12.2TNLSB.L1-2, nos seguintes termos:
“O contentor, seja qual for a modalidade de transporte utilizado (marítimo, rodoviário ou ferroviário), pode pertencer tanto ao próprio armador, o qual constitui parte ou acessório do veículo transportador, ou pode mesmo ser arrendado ou adquirido pelos próprios interessados, para serem utilizados no transporte de suas cargas.
Pertencendo ou não ao armador, é sabido que o contentor deve ser retirado, pelo destinatário (ou expedidor/destinatário) após a conclusão do transporte, devendo ser devolvido no prazo estipulado, sob pena de este incorrer no pagamento de sobrestadia (demurrage), devida justamente pelo atraso na devolução do equipamento.
A expressão “demurrage” vem a ser consagrada no ramo de comércio internacional para designar a remuneração devida ao transportador marítimo pela continuação da utilização de contentores e a não devolução desse equipamento no prazo de utilização estipulado.
Tal cobrança tem como princípio a devolução dos contentores fora do prazo contratualizado, sabendo-se que os mesmos são essenciais para a realização de novos transportes, sem os quais os armadores precisam alterar a sua logística e incorporar novos equipamentos para atender às suas solicitações, deslocando contentores vazios de outros portos ou mesmos países.
Importa, todavia, ter em consideração que os conceitos de “demurrage” e “free time” não são coincidentes.
O free time, há muito utilizado em todos os transportes marítimos de mercadorias, refere-se ao período livre para utilização do contentor pelo destinatário da carga, durante o qual não há incidência de demurrage, período de pode variar, dependendo da negociação acordada entre as partes contratantes.
É certo que a natureza jurídica da demurrage não tem sido unívoca.
Pode considerar-se que se trata de uma cláusula acessória do próprio contrato de transporte marítimo (cláusula penal), ou, ao invés, de um contrato associado ao contrato de transporte marítimo, mas autónomo, de locação.
Como é sabido a cláusula penal, consagrada no artigo 810º do Código Civil resulta de um acordo das partes, no âmbito do princípio da liberdade contratual, e tem como finalidade a fixação antecipada de uma indemnização (antes de ocorrer o facto constitutivo de responsabilidade), normalmente uma quantia em dinheiro, que o devedor deverá satisfazer ao credor em situações de inadimplemento, cumprimento a destempo ou cumprimento defeituoso da obrigação, com intuito de se evitarem futuras dúvidas e litígios entre as partes, quanto à determinação do montante da indemnização.
Como já referia CASTRO MENDES, Teoria Geral, 1968, 3º, 345 trata-se de uma “cláusula sobre o montante da responsabilidade”, que não visa apenas estabelecer uma sanção para o incumprimento das obrigações contratuais, mas, também, fixar, previamente, a forma de cálculo da indemnização devida, em caso de incumprimento, por forma a que o credor da indemnização não tenha de provar, em ação judicial competente, com vista à sua validade e eficácia, a existência de danos, nem o montante dos prejuízos sofridos, já que o valor indemnizatório será aquele que as partes tiverem, antecipadamente acordado, prevenindo, portanto, dificuldades de cálculo da indemnização e dispensando o credor da alegação e prova do dano concreto – v. também a este propósito PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, II, 4ª edição, revista e atualizada, 1997, 73 e Acs. STJ, de 20.10.98, CJ (STJ), Ano VI, T3, 73 e de 09.02.99, CJ (STJ), Ano VII, T1, 97.
O devedor, vinculado à cláusula penal, não se encontra obrigado ao ressarcimento do dano que, efetivamente, cause ao credor com o incumprimento, mas antes à compensação do prejuízo, negocial e antecipadamente fixado, através da cláusula penal, sempre que não tenha sido pactuada a indemnização pelo dano excedente, nos termos do disposto pelo artigo 811º, nº 2, do Código Civil - v. CALVÃO DA SILVA, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, 4ª ed., 2007, 248 e 249.
Também lhe compete, simultaneamente, uma função de estímulo e de reforço do cumprimento do contrato, como meio eficaz de pressão ao próprio cumprimento da obrigação.
A cláusula penal desempenha, por isso, na prática, uma função ressarcidora e função coercitiva. Reveste uma função, fundamentalmente, ressarcidora e tarifada, de natureza compulsória, agindo como meio de pressão sobre o devedor, mediante a ameaça de uma sanção pecuniária, com vista ao cumprimento pontual das obrigações que assumiu, mas cujos danos advenientes do seu incumprimento ou mora, em consequência da inexecução da obrigação ou da violação do contrato, não importa averiguar, nem determinar o seu montante, na hipótese da sua verificação, e bem assim como, igualmente, o respetivo nexo causal. – Acs. STJ, de 12.01.1994, BMJ nº 433, 559 e de 24.04.2012 (Pº 605/06.6TBVRL.P1.S1).
É possível sintetizar, da forma seguinte os entendimentos da doutrina e da jurisprudência acerca das diversas modalidades de cláusula penal:
i)-Cláusula com função moratória ou compensatória, dirigida à reparação de danos mediante a  fixação antecipada da indemnização em caso de não cumprimento definitivo ou de simples mora do devedor (única figura expressamente prevista no artigo 810.º do Código Civil);
ii)-Cláusula penal em sentido estrito ou propriamente dita, em que a sua estipulação substitui o cumprimento ou a indemnização, não acrescendo a nenhum deles;
iii)-Cláusula penal de natureza compulsória, em que há uma pena que acresce ao cumprimento ou que acresce à indemnização pelo incumprimento, sendo a finalidade das partes, nesta última hipótese, a de pressionar o devedor a cumprir, e já não a de substituir a indemnização.
- Cfr. a propósito desta tripla modalidade de cláusula penal, na doutrina, nomeadamente, PINTO MONTEIRO, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 141.º, n.º 3972, 177 e ss. e NUNO PINTO DE OLIVEIRA, Cláusulas Acessórias ao Contrato, Almedina, 2.ª ed., 63 e ss. e, na jurisprudência, entre muitos, Acs. S.T.J. de 27.09.2011, (Pº 81/1998.C1.S1).
Defende a apelante a natureza de cláusula penal da demurrage. Seguiu a sentença recorrida a tese do contrato de locação, entendimento que se corrobora.
Na verdade, o fornecimento de contentores, que sempre se traduzirá num aluguer, poderá considerar-se incorporado no regime do transporte marítimo durante o estrito período de deslocação da mercadoria, a que se reporta o disposto no artigo 1º, alínea e) da Convenção de Bruxelas, e artigo 23º, nº 1 do Decreto-Lei 352/86, podendo embora o período do free time se encontrar diluído no frete acordado.
Findo este prazo, o destinatário da carga passa a incorrer em sobrestadia, denominada demurrage, que se traduz, como acima se referiu, na cedência de contentores para além do aludido período, e no qual terá aplicação as regras da locação, portanto, alvo de remuneração (artigos 1022º e 1023º do C.C.). Já quanto à armazenagem será aplicável as regras do depósito, neste caso oneroso (artigos 1185º do C.C. e 403º e ss. do C.Comercial).
(…)
Mas, ainda que se considerasse que a demurrage se enquadrava numa cláusula contratual acessória – cláusula penal com consagração no artigo 810º do C.C., com função moratória ou compensatória, dirigida à reparação de danos mediante a   fixação  antecipada   da indemnização - à mesma conclusão se chegaria.”
Subscrevemos inteiramente este entendimento quanto à qualificação jurídica das prestações pecuniárias relativas a quay rent e demurrages.
3.2.3.2.2. Da invocada nulidade da clª 20 do conhecimento de embarque
A apelante sustentou, nas suas alegações de recurso, que a mencionada cláusula 20. do conhecimento de embarque é nula por violar o disposto no art. 3º, nº 8 da Convenção de Bruxelas[34].
Trata-se de uma questão que a apelante não havia suscitado na discussão da causa em primeira instância e que só agora, em sede de recurso de apelação, vem suscitar.
Cumpre, pois, aferir se este Tribunal deve apreciar tal questão.
Estabelece o art.  573º do nº 1 do CPC que “toda a defesa deve ser deduzida na contestação, excetuados os incidentes que a lei mande deduzir em separado”, acrescentando o nº 3 do mesmo preceito que “Depois da contestação só podem ser deduzidas as exceções, incidentes, e meios de defesa que sejam supervenientes, ou que a lei expressamente admita passado esse momento, ou de que se deva conhecer oficiosamente”.
O preceito citado consagra o princípio da concentração da defesa, do qual decorre que o demandado deve deduzir na contestação ou oposição todos os meios de defesa que tenha ao seu alcance, sob pena de preclusão dos mesmos.
Não obstante, a lei processual consagra quatro exceções a esse princípio:
- os incidentes que devem ser deduzidos em separado;
- os meios de defesa supervenientes, ou seja, os fundados em factos que se verifiquem depois de esgotado o prazo para contestar ou deduzir oposição (superveniência objetiva), ou de que o demandado só tenha conhecimento depois de esgotado esse prazo (superveniência subjetiva);
- os meios de defesa que a lei expressamente admita após tal momento;
- os meios de defesa de que o Tribunal deva conhecer oficiosamente.
Como decorrência deste princípio, a doutrina e a jurisprudência têm sublinhado que os recursos não servem para apreciar questões (de direito ou de facto) novas, mas apenas reapreciar questões já debatidas.
Nessa medida, bem aponta ABRANTES GERALDES[35], “A natureza do recurso como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina uma outra importante limitação ao seu objeto decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se com questões novas.
Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis. Segundo a terminologia proposta por Teixeira de Sousa, podemos concluir que tradicionalmente temos um modelo de reponderação que vis o controlo da decisão recorrida, e não um modelo de reexame que permita a repetição da instância no tribunal de recurso.”
Por seu turno sustenta FRANCISCO FERREIRA DE ALMEIDA[36]: “No nosso sistema processual (no que concerne à apelação e à revista) predomina o «esquema do recurso de reponderação: o objeto do recurso é a decisão impugnada, encontrando-se à partida, vedada a produção de efeitos jurídicos “ex-novo”. Através do recurso, o que se visa é a impugnação de uma decisão já ex ante proferida, que não o julgamento de uma qualquer questão nova.”
RUI PINTO[37] sintetiza os efeitos práticos do sistema de reponderação nos seguintes termos: “não se admitem nem novos factos, nem novos fundamentos de ação ou de defesa, nem novas provas. A estes recursos dá-se a qualificação de recursos de reponderação: a decisão impugnada é reavaliada no quadro do seu próprio objeto e em razão dos seus vícios específicos, pelo que o objeto do pedido é na parte da revogação a própria decisão e na substituição a matéria que fora objeto da decisão revogada, tal e qual fora conhecida pelo tribunal a quo.”
Este entendimento foi amplamente acolhido pela jurisprudência. Como se refere no ac. STJ de 07-07-2016 (Gonçalves Rocha), p.156/12.0TTCSC.L1.S1, “Efetivamente, e como é entendimento pacífico e consolidado na doutrina e na Jurisprudência, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação”. – No mesmo sentido, cfr. RC 14-01-2014 (Mª Inês Moura), p. 154/12.3TBMGR.C1, e RP 16-10-2017 (Miguel Baldaia de Morais), p. 379/16.2T8PVZ.P1.
Mas precisamente porque a lei processual admite a invocação de exceções de conhecimento oficioso após a contestação, a jurisprudência tem sublinhado que essas questões podem ser suscitadas apenas em sede de recurso – neste sentido cfr. ac. STJ 17-11-2016 (Ana Luísa Geraldes), p. 861/13.3TTVIS.C1.S2.
No caso em apreço, está em causa a invocação da nulidade de uma cláusula do contrato de transporte firmado entre as partes.
Tendo este vício sido invocado pela apelante, que é ré nos presentes autos, o mesmo tem natureza impeditiva ou extintiva do direito invocado pela autora / apelada, pelo que configura uma exceção perentória (cfr. arts. 342º, nº 2 do CPC e 576, nºs 1 e 3º do CPC).
Sendo a nulidade um vício de conhecimento oficioso (art. 286º do CC), o mesmo pode e deve ser apreciado pelo Tribunal da Relação, ainda que tenha sido invocado apenas em sede de recurso de apelação.
Vejamos então se a cláusula 20 do conhecimento de embarque subscrito por autora e ré é nula.
Estabelece o art. 3º, nº 8 da Convenção de Bruxelas que “Será nula, de nenhum efeito e como se nunca tivesse existido toda a cláusula, convenção ou acordo num contrato de transporte exonerando o armador ou o navio da responsabilidade por perda ou dano concernente a mercadorias proveniente de negligência, culpa ou omissão dos deveres ou obrigações preceituados neste artigo, ou atenuando essa responsabilidade por modo diverso do preceituado na presente Convenção. Uma cláusula cedendo o benefício do seguro do armador ou qualquer cláusula semelhante será considerada como exonerando o armador da sua responsabilidade.”
Como se afere da leitura desta norma, a nulidade nela cominada incide sobre cláusulas que excluam ou atenuem a responsabilidade por danos causados na mercadoria cujo ressarcimento constitua  responsabilidade do armador.
E, como menciona a apelante, é incontroverso que regra geral, a responsabilidade pelos danos sofridos pela mercadoria durante o transporte da mesma por mar é da responsabilidade do armador, embora esta regra conheça exceções, previstas no art. 4º da Convenção de Bruxelas.
É também incontroverso que no caso em apreço, por força da outorga do contrato que celebrou com a ré, a autora assumiu as responsabilidades inerentes ao estatuto de armador, sendo igualmente incontroverso que a mercadoria sofreu danos no decurso do transporte ou no destino final[38].
Porém, a invocação pela autora da cláusula 20 do conhecimento de carga não visou a exoneração da sua responsabilidade pelo ressarcimento dos danos na carga transportada, mas apenas para invocar a violação, pela ré, da sua obrigação de libertar os contentores após a receção de uma parte da carga pelo destinatário, e concomitante recusa da receção da parte da carga que se achava danificada[39].
Com efeito, estão apenas em causa os nºs 4 e 5 da referida cláusula, que não prevêm nenhuma exclusão da responsabilidade da autora por danos causados na mercadoria transportada.
Não tendo a autora invocado a cláusula 20 do conhecimento de carga para se eximir da obrigação e indemnizar a ré, que não está sequer em discussão nos presentes autos, e não tendo a ré deduzido reconvenção, a nulidade invocada configura uma questão incidental.
A ser nula, a cláusula 20 do conhecimento de carga, o vício incidiria apenas sobre eventual exclusão da responsabilidade por danos na carga, e não sobre a imposição à ré da obrigação de libertar os contentores após a receção ou recusa da carga.
Por isso uma tal nulidade em nada influi na decisão da causa.
Porque assim é, não tem este Tribunal que apreciar tal questão.
3.2.3.2.2. Da invocada violação pela autora dos deveres de entrega da mercadora no estado em que a recebeu, e de informação
Sustentou também a apelante que a apelada violou os seus deveres de entrega incólume da mercadora, e de informação[40].
Quanto à primeira questão, já se deixou consignado que tendo ocorrido danos na carga durante o transporte das mercadorias ou nas operações de descarga e armazenamento da mesma no porto de destino, a responsabilidade pelo ressarcimento tais danos incide sobre o armador, no caso a apelada.
Porém, tendo sido outorgado seguro de carga e acionado tal seguro, como sucedeu no caso em apreço[41], sem que a apelante alguma vez tenha instado a apelada a ressarci-la por tais danos, é manifesto que tal responsabilidade não está em discussão nos presentes autos.
A questão estaria em determinar se, devido à ocorrência de danos na carga e em consequência da recusa pelo destinatário da mercadoria danificada, a ora apelante se deve considerar desonerada da obrigação de libertar os contentores.
E nesse particular, a reposta é negativa.
Perante a mencionada recusa, cabia à apelante decidir do destino da carga recusada, acionando o seguro de carga ou responsabilizando a apelada, ou determinando a sua destruição.
Obviamente que se optasse pela primeira alternativa, seria expectável que a seguradora ou a apelada quisessem efetuar peritagem, e que esta pudesse de alguma forma retardar a libertação do contentor danificado, mas de qualquer modo impunha--se que a apelante decidisse prontamente, de modo que a libertação do contentor ocorresse tão cedo quanto possível.
Ora, tendo a apelada informado a apelante, logo em 03-2-2015, isto é, na mesma data em que a mercadoria chegou ao porto de destino que parte da carga havia sido recusada pelo destinatário devido a danos sofridos pela mesma[42], cabia à apelante decidir se pretendia submeter a mercadoria a peritagem, ou ordenar a sua destruição, conforme a apelada manifestou à apelante em comunicações de 03-02-2015, 04-02-2015, 24-02-2015, e 26-02-2015[43].
Argumentou contudo a apelante que a apelada violou a obrigação de informação a que estava vinculada[44], e que também não observou a obrigação de facilitar o acesso às mercadorias danificadas[45].
Vejamos então.
Estabelece o art. 3º, nº 6 da Convenção de Bruxelas que “em  casos  de  perda  ou  dano  certos  ou  presumidos,  o  armador  e  o  destinatário concederão  reciprocamente  todas  as  facilidades  razoáveis  para  a  inspeção  da mercadoria e verificação do número de volumes”.
Porém, desta disposição não decorre que o armador tenha a obrigação de fornecer ao expedidor informação detalhada sobre as causas do evento danoso, nem sobre o estado da mercadoria danificada. Tais questões serão objeto de inquérito ou  peritagem (“survey”), sendo caso disso, mas não constituem encargo do transportador.
Nesta medida, muito embora a apelante tenha solicitado à apelada informações e elementos mais precisos, como fotografias da carga[46], a verdade é que esta não estava vinculada a tal, nem a ré se podia considerar desonerada da obrigação de determinar o destino da mercadoria danificada, por considerar insuficientes os elementos transmitidos pela autora. Foi essa aliás, a posição manifestada pela apelada à apelante em 03/03/2015[47]. Contudo, só em 11-03-2015 a apelante manifestou junto da apelada a intenção de levar a cabo um inquérito ou peritagem sobre a mercadoria danificada[48], tendo tal diligência sido efetuada em 08-04-2015[49], e permanecendo a carga danificada no contentor até 23-04-2015[50].
Finalmente, diremos ainda que da letra do conhecimento de carga resulta que a mercadoria transportada eram paletes com garrafas de vidro vazias e que o destinatário das mesmas era uma empresa de comercialização de água de nascente[51]. Ora, tendo em conta a natureza da mercadoria transportada, perante a notícia da recusa de parte da mercadoria, por estar danificada, um expedidor medianamente razoável, colocado na situação da apelante, teria pelo menos considerado a grande probabilidade de as garrafas transportadas e recusadas se encontrarem partidas, o que dispensaria maiores cuidados na averiguação do estado dessa mercadoria, sem prejuízo da eventual averiguação das causas dos danos, a efetuar mediante peritagem.
Em face do exposto, concluímos que não resultou demonstrada a violação pela apelada dos deveres legais e contratuais de boa-fé, informação, ou cooperação.
3.2.3.2.3. Da responsabilidade da ré pelas despesas de quay e demurrage: perspetiva da sentença recorrida
Nada obstando à aplicação da cláusula 20 do conhecimento de embarque, na parte em que impõe à apelada a obrigação de libertar os contentores após desembarque dos mesmos, independentemente dos direitos que lhe assistam em caso de ocorrência de danos na mercadoria transportada, cumpre aferir se a autora tem direito às quantias peticionadas.
A este propósito, considerou o Tribunal a quo:
“No caso em apreço, está em causa a demora na libertação do contentor cedido pela Autora para o transporte da carga, não existindo quaisquer dúvidas, em face da factualidade  provada, que esta demora é imputável à Ré, informada pela Autora da recusa do destinatário em receber parte da mercadoria transportada e desde essa data também interpelada sobre os procedimentos a adotar quanto à mercadoria não aceite e que ocupava o contentor cedido pela Autora, sendo por esta alertada sobre os custos atinentes a «demurrage» e a «storage» (e informada dos respetivos quantitativos diários, tal como resulta das comunicações eletrónicas trocadas entre as partes).
E nada impedia o carregador (a ré ou o seu cliente, por conta de quem terá contratado com a Autora) ou o destinatário (consignatário) de proceder à perícia de eventuais danos sofridos pela mercadoria durante o seu transporte, com vista a apurar as causas de tais danos, pelo menos qualquer óbice decorrente de ação ou omissão da Autora (não configurando a comunicação da exata quantidade de mercadoria recusada e, ou, a comunicação do exato estado da mesma quaisquer requisitos essenciais à atuação dos interessados na carga no sentido de verificar a sua eventual falta de integridade e as causas desta, como procurou sustentar a Ré). Efetivamente, como se evidencia nas comunicações trocadas entre as partes, a Ré tomou conhecimento da rejeição de parte da mercadoria pelo destinatário em virtude da mesma se encontrar danificada, sendo-lhe mesmo enviadas fotografias do estado do contentor e da mercadoria (rejeitada) que permaneceu no seu interior, bem como do retorno do contentor ao cais e ainda da necessidade de proceder à indicação do destino da mercadoria rejeitada. Sendo, ao menos formalmente (no âmbito do contrato de transporte), a maior interessada na carga, perante tais informações (que sempre poderiam ser complementadas pelo cliente da Ré ou pelo cliente desta, as quais estavam em contacto com a Ré, como se constata da troca de mensagens junta pela Ré com a sua oposição – cfr. fls. 20/21v -, e lhe comunicaram o sucedido) e o anúncio expresso, realizado no dia 6.02.2015 pela Autora, de que, em face da rejeição da mercadoria pelo recebedor, não assumiria qualquer responsabilidade pelo sucedido quanto à mesma, não vemos como pode a Ré pretender justificar a sua inação.
Desta feita, a Ré violou a sua obrigação de libertar o contentor que lhe foi cedido pela autora no âmbito do contrato de transporte celebrado entre ambas.
O devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado (artigo 762.º, n.º 1, do CC); no cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé (artigo 762.º, n.º 2, do CC). Por isso é que a prestação debitória deve ser realizada de acordo com o estipulado quanto ao tempo, ao modo e ao lugar respetivos (artigos 406.º, n.º 1, e 762.º, n.º 1, e 763.º do CC).
Incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa (apreciada nos termos aplicáveis à responsabilidade civil) sua, sendo responsável perante o credor pelos atos dos seus representantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais atos fossem praticados pelo próprio devedor (artigos 799.º, n.ºs 1 e 2, e 800.º, n.º 1, do Código Civil).
Faltando culposamente ao cumprimento da obrigação, o devedor torna-se responsável pelo prejuízo que causar ao credor, tanto no caso do inadimplemento definitivo como no da simples mora ou do cumprimento defeituoso (arts. 798.º, 799.º, 801.º e 804.º do CC). De sorte que a obrigação de indemnizar reveste natureza claramente contratual ou obrigacional, porquanto, subordinada embora aos pressupostos comuns a todas as formas de responsabilidade – ato ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade entre o facto e o dano –, ela resulta da violação de um direito de crédito ou obrigação em sentido técnico (ou de um contrato). Ao contrário do que acontece com a responsabilidade extracontratual, que é fonte autónoma da obrigação de indemnizar, a responsabilidade contratual é apenas condição modificativa da obrigação de prestar em obrigação de indemnizar – mas a obrigação é a mesma.”
Também nesta parte subscrevemos o entendimento manifestado na sentença apelada.
3.2.3.3. Dos “requisitos” das faturas e do cálculo dos montantes faturados
Sustentou a apelante que as faturas emitidas pela autora “não respeitam os requisitos necessários para que pudessem pretender cobrar custos de armazenagem e estacionamento pois nada referem a esse respeito, em relação a cada contentor, o período inicial e final do estacionamento, o período grátis que comumente existe neste tipo de relação comercial, a unidade (n.º de contentores em causa), a taxa bem como o preço respetivo.
Todos esses elementos se encontram em falta.”
Não indicou, porém, qual a disposição legal ou contratual que impusesse tais requisitos e muito menos o fundamento legal para concluir que a sua inobservância constitui motivo legítimo para recusar o pagamento das mesmas faturas.
Não tendo este Tribunal conhecimento da existência de uns ou outros, tanto bastaria para concluir pela improcedência de tal exceção.
Porém, a verdade é que a eventual falta de clareza das faturas poderia de alguma forma conduzir a uma situação de mora do credor (art. 813º do CC).
Sucede contudo que resultou provado que apesar de as faturas emitidas pela autora ostentarem os dizeres “frete e despesas”, resultou provado que as mesmas diziam respeito a despesas de estacionamento e armazenamento do contentor que continha a mercadoria danificada e recusada pelo destinatário[52], que, em mensagens de correio eletrónico datadas de 15-04-2015 e 23-04-2015 a apelante reconheceu expressamente que as faturas em apreço se reportavam a custos de demurrage[53], e que pelo menos em 23-04-2015, a apelada comunicou por escrito à apelante que a fatura emitida na mesma data se reportava a “remaining quay rent and demurrages”.
Nesta conformidade, nenhuma razão assiste à apelada em pretender escusar-se a pagar as faturas em apreço com fundamento na falta dos mencionados requisitos formais.
Resta pois aferir se os montantes faturados correspondem efetivamente ao montante devido a título de despesas de quay e demurrage.
Sobre esta questão, pronunciou-se o Tribunal a quo nos seguintes termos:
“Posto isto e revertendo ao caso em análise, apenas poderemos concluir que a quantia cobrada pela Autora à Ré a título de imobilização dos contentores no período compreendido entre 3 de Fevereiro de 2015 e 23 de Abril de 2015 não é mais do que as despesas atinentes à imobilização do contentor cuja libertação não foi oportunamente providenciada pela Ré. O método de cálculo do montante peticionado a esse título não foi sequer questionado pela Ré, que apenas contrapôs ser a importância em apreço imputável à própria Autora e, repete-se, não colocou em crise o respetivo apuramento. Isto significa que devem ter-se como demonstradas as quantias de € 8.063,22 (oito mil e sessenta e três euros e vinte e dois cêntimos) e de € 9.161,53 (nove mil cento e sessenta e um euros e cinquenta e três cêntimos), por conta da imobilização dos contentores. Em qualquer caso, considerando os setenta e oito dias de imobilização do contentor (com as inerentes despesas de armazenamento), bem como a publicidade dos valores em cujo pagamento incorrem todos aqueles que não libertam os contentores na data acordada (vide, na versão atual, existindo outra da data dos factos https://www.A.com/wp-content/uploads/2020/03/3.0-Containerships-DD-2020-Quay-Rent-and-demurrage-Tariff_v_final.pdf), constata-se, fazendo ainda apelo ao que era então anunciado pela Autora (constante da comunicação eletrónica de fls. 82v) e à taxa cambial vigente na data em que foram emitidas as faturas objeto dos presentes autos (vide https://www.bportugal.pt./taxas-cambio/GBP) que as quantias demandadas pela Autora se mostram até inferiores ao que seria devido (sendo ainda certo que os fatores de determinação dos valores constantes das faturas e ao que estes se referiam já eram do conhecimento da Ré, como se comprova das comunicações eletrónicas trocadas entre as partes, mormente a constante de fls. 82v e 90).“
Concordamos inteiramente com este entendimento, embora consideremos que o mesmo justifica uma demonstração mais desenvolvida, que passamos a fazer.
Em primeiro lugar, cumpre sublinhar que no caso vertente não há que ter em consideração qualquer período a título de free time, porque a mercadoria chegou a ser entregue no destino, ou seja em Churchstoke, País de Gales, embora tenha sido parcialmente recusada e por isso o contentor danificado veio a ser “devolvido” ao porto de Liverpool[54].
A sentença recorrida reportou-se ao período temporal de imobilização do contentor, de 03-02-2015 até 23-04-2015[55], que totaliza 80 dias. Não obstante, teve em conta apenas 78 dias, desconsiderando assim o dia da descarga no destino e o dia em que o contentor foi libertado.
Haverá então que aplicar as tarifas comunicadas pela autora à ré na mensagem de correio eletrónico de 03-03-2015[56]:
a) “Quay rent”:
a. 30 GBP por cada dia nos primeiros 4 dias
b. 60 GBP por dia nos 5 dias subsequentes;
c. 100 GB por dia no período subsequente
b) “Demurrage”:
a. 20 GBP por dia nos primeiros 4 dias
b. 40 GBP por dia nos 6 dias subsequentes;
c. 80 GBP por dia no período subsequente
Assim:
c) “Quay rent”:
a. 30 x 4 = 120
b. 60 x 5 = 300
c. 100 x 69 = 6900
d. Total (78 dias) = 7320 GBP
d) “Demurrage”:
a. 20 x 4 = 80
b. 40 x 6 dias = 240
c. 80 x 69 = 5520
d. Total (78 dias) = 5840  GBP
Total de despesas de “quay” e “demurrage” = 7320 + 5840 = 13160 GBP.
De acordo com a informação colhida na página internet do Banco de Portugal, à data em que foi emitida a primeira fatura (19-03-2015)[57], 1 € = 0,7183 GBP; ao passo que na data em que foi emitida a segunda fatura (23-04-2015)[58], tal taxa de câmbio cifrava-se em 0,717.
Aplicando a taxa mais favorável à apelante:
13.160 : 0,717 = 18.354,253835
13.160 : 0,7183 = 18.321,035778
… obtemos contra-valores de € 18.354,25, e € 18.354,04.
Os montantes das duas faturas emitidas pela autora são de, respetivamente, € 8.063,22 e € 9.161,53[59], ou seja, totalizam € 17.224,75.
Verifica-se, pois, que a quantia faturada pela autora foi até inferior àquela que resultaria da aplicação das tarifas aplicáveis, à taxa de câmbio mais favorável à apelante.
3.2.3.3. Síntese conclusiva
De todo o exposto decorre que a apelante é efetivamente responsável pelas quantias peticionadas pela apelada, as quais se reportam a despesas de armazenamento e estadia (quay and demurrage) das mercadorias recusadas, após a sua apresentação ao destinatário, improcedendo todos os fundamentos invocados pela apelante para sustentar a improcedência da presente ação.
Nesta conformidade, sem prejuízo da alteração da decisão sobre matéria de facto, que nada influi na decisão da causa, resta apenas concluir pela total improcedência da presente apelação.
3.2.4. Das custas
Nos termos do disposto no art. 527º, nº 1 do CPC, “A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito“.
No caso vertente, entendemos que, não obstante se tenha determinado a alteração da decisão sobre matéria de facto, tal alteração não tem qualquer influência na decisão da presente apelação, que deve ser julgada totalmente improcedente.
Nesta medida, consideramos que a recorrente decaiu totalmente, devendo por isso suportar a totalidade das custas.
4. Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes nesta 7ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em:
a) alterar a decisão sobre matéria de facto, nos termos expostos na fundamentação do presente acórdão;
b) julgar a presente apelação totalmente improcedente, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela apelante.
Consigna-se ser entendimento deste coletivo que os prazos para eventual reclamação ou interposição de recurso de revista se iniciam com a notificação às partes do presente acórdão, não se sendo aplicável qualquer causa de suspensão prevista na Lei nº 4-b/2021, de 1 de fevereiro.

Lisboa, 23 de fevereiro de 2021 [60]
Diogo Ravara
Ana Rodrigues da Silva
Micaela Sousa
_______________________________________________________
[1] Regista-se o caráter prolixo e injustificadamente extenso das alegações, e a incapacidade da apelante em enunciar conclusões que constituam uma verdadeira síntese da motivação do recurso.
[2] Em diversos passos das suas alegações, a recorrente utiliza a expressão “Bill of Landing”. E a mesma expressão é utilizada na decisão recorrida. Sucede, porém que, como se afere da leitura da versão inglesa da Convenção de Bruxelas de 1924, a expressão correta é “Bill of Lading(acentuado nosso). Por entender que se trata de mero lapso de escrita, procedemos, no presente aresto, à sua retificação.
[3] A recorrente, certamente por lapso, escreveu “Proval of delivery”. A expressão correta é, efetivamente, “Proof of delivery”. Por se entender que se tratou de um lapso de escrita, inserimos as necessárias correções.
[4] Neste sentido cfr. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Ed., Almedina, 2018, pp. 114-117
[5] Vd. Abrantes Geraldes, ob. cit., p. 119
[6] As conclusões 1. a 36. contêm meras referências genéricas à posição manifestada pela apelante, que a mesma desenvolve (aliás de forma prolixa e exageradamente desenvolvida) nas conclusões subsequentes.
[7] “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Edição, Almedina, 2018, pp. 165-166.
[8] Conclusão E. das contra-alegações.
[9] Cfr. o assentimento expresso da apelada, manifestado na conclusão E. das contra-alegações.
[10] Refª 122501 / 29638869, de 05-07-2018.
[11] Acerca da diferença entre o contrato de conta-corrente comercial e a conta-corrente contabilística cfr., entre outros, os acs. RP 18-05-2004/Durval Morais), p. 0421597; RL 26-04-2007 (Manuel Gonçalves), p. 9854/2006-6; RC 14-02-2012 (Henrique Antunes), p. 53/09.6T2AND.C1, e RL 19-09-2013 (Ezagüy Martins), p. 679/09.8YXLSB.L2-2.
[12] Conclusão DD.
[13] As als. b) e j) forma suprimidas, como resulta do exposto supra. Mantém-se a identificação das demais alíneas.
[14] Pontos 2 e 3 dos factos provados.
[15] Aprovado pela Carta de Lei nº Carta de Lei, de 28 de Junho de 1888. Este diploma, que constitui o mais antigo código em vigor em Portugal, passará a ser designado pela sigla “CCom”.
[16] Sobre esta matéria cfr. CUNHA GONLÇAVES, “Comentário ao Código Comercial Português”, vol. 2º.,  Empresa Editora  p. 394 e Adriano Anthero, “Comentário ao Código Comercial” Vol. II, 2ª ed., 1915, p. 39
[17] “Introdução ao Direito dos Transportes”, in, I Jornadas de Lisboa do Direito Marítimo, Centro de Direito Marítimo e dos Transportes da FDUL, Almedina, 2008, pp. 23 ss.
[18] “O contrato de transporte de mercadorias – Contributo para o estudo da posição jurídica do destinatário no contrato de transporte de mercadorias”, Almedina, 2000
[19] Ob. cit., p. 236.
[20] Cfr. MENEZES CORDEIRO, ob. cit., p. 24
[21] Os acentuados são da nossa responsabilidade.
[22] Aprovada pela resolução nº 33/160 da Assembleia Geral das Nações Unidas.
[23] “A responsabilidade civil do transportador no transporte multimodal de mercadorias”, 2016, disponível em https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/31967/1/ulfd133548_tese.pdf.
[24] Sobre esta matéria cfr. tb. MARTINHO MARTINS BOTELHO e LUÍS ALEXANDRE CARTA WINTER, “O regime jurídico internacional do transporte multimodal de mercadorias: um comparativo entre a Convenção de Genebra de 1980 e as regras CNUCED/CCI “ in Lex Humana,  Universidade Católica de Petrópolis, disponível em https://digitalis-dsp.uc.pt/bitstream/10316.2/33942/1/LexHumana6-1_artigo7.pdf?ln=pt-pt.
[25] Inédito.
[26] Cfr. em especial, os pontos 3. a 13. 58., e 59. dos factos provados.
[27] Publicada no Diário do Governo, I.ª Série, de 02-06-1932, com retificação publicada em 11-07-1932.
[28] Como explica MÁRIO RAPOSO, não é inteiramente rigorosa a afirmação de que este diploma tornou a Convenção de Bruxelas Direito interno, visto que a mesma já vigorava na ordem jurídica interna desde a sua ratificação pelo Estado Português, em 1932 – Cfr. “Transporte marítimo de mercadorias – Os problemas”, in I Jornadas de Direito Marítimo, pp 44 ss., em especial p. 50, e 78.
[29] Os acentuados são da nossa responsabilidade.
[30] Pontos 11. e 58. dos factos provados.
[31] Pontos 55A. e 59. dos factos provados.
[32] As notas de rodapé inseridas no trecho citado são da responsabilidade deste coletivo, e visam identificar os pontos da matéria de facto tidos por relevantes.
[33] Ponto 5. dos factos provados
[34] Vd. conclusões 235 a 239
[35] Ob. cit., p. 119.
[36] “Direito Processual Civil”, Vol. II, 2.ª Ed., Almedina, 2019, p. 468.
[37] “O Recurso Civil. Uma Teoria Geral”, AAFDL, 2017, p. 69.
[38] Ponto 12 dos factos provados.
[39] Pontos 13. a 58. dos factos provados.
[40] vd. conclusões 218 a 223.
[41] Vd. pontos 43., 46., 56.,
[42] Pontos 12. a 16. dos factos provados.
[43] Pontos 16, 22, 25, 26
[44] Vd. conclusões 220 e 221.
[45] Conclusão 234.
[46] Vd. pontos 17., 23., 26., 31.,
[47] Ponto 39. dos factos provados.
[48] Ponto 45. dos factos provados.
[49] Ponto 53. dos factos provados.
[50] Ponto 58. dos factos provados.
[51] Factos amplamente confirmados pela prova testemunhal e declarações de parte produzidas em audiência.
[52] Ponto 59. dos factos provados.
[53] Pontos 55a. e 59b. dos factos provados.
[54] Vd. pontos. 11., 15., 19., 34., e 45. dos factos provados.
[55] Ponto 58. dos factos provados.
[56] Ponto 40. dos factos provados.
[57] Ponto 59. dos factos provados.
[58] Idem.
[59] Ponto 59. dos factos provados.
[60]Acórdão assinado digitalmente – cfr. certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.