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Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0657/14
Data do Acordão:09/24/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:TAXA DE EXIBIÇÃO DE PUBLICIDADE
ESTRADA NACIONAL
COMPETÊNCIA
LIQUIDAÇÃO
Sumário:I - Por força, primeiro do Decreto-Lei n.º 637/76, de 29 de Junho, e, posteriormente, da Lei n.º 97/88, de 17 de Agosto (art. 2.º, n.º 2), o art. 10.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, na parte em que exigia a aprovação ou licença da Junta Autónoma das Estradas, foi derrogado e essa exigência foi desgraduada, limitando-se à emissão de parecer.
II - Por força dos mencionados diplomas, o licenciamento da afixação e inscrição de mensagens de publicidade passou a ser atribuído de forma universal às câmaras municipais, na área do respectivo concelho, sem prejuízo da intervenção obrigatória, através da emissão do respectivo parecer, por parte de entidades com jurisdição exclusiva para defesa de interesses públicos específicos que têm de ser tidos em conta na emissão de licença final pelo respectivo município.
III - Assim sendo, depois da entrada em vigor daqueles diplomas a “EP - Estradas de Portugal, S.A.” deixou de ter competência para licenciar a afixação de mensagens publicitárias, carecendo, por isso, de competência para tributar esse licenciamento.
Nº Convencional:JSTA000P17942
Nº do Documento:SA2201409240657
Data de Entrada:06/04/2014
Recorrente:EP - ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A.
Recorrido 1:A...., LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 294/13.1BEBRG

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade denominada “A………., Lda.” (adiante Impugnante ou Recorrida) instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga impugnação judicial contra a liquidação de taxa por afixação de publicidade em instalações comerciais sitas à margem da Estrada Nacional n.º 201, efectuada pela “EP – Estradas de Portugal, S.A.” (adiante Recorrente), no valor de € 1.476,54.

1.2 O Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga julgou procedente a impugnação e anulou a liquidação da referida taxa com o fundamento de que a “EP – Estradas de Portugal, S.A.” carecia de competência para a liquidação, uma vez que também não tinha competência para licenciar a publicidade afixada à margem das estradas nacionais, que está atribuída, exclusivamente, às câmaras municipais.

1.3 A entidade liquidadora – “EP – Estradas de Portugal, S.A.” – interpôs recurso da sentença para o Supremo Tribunal Administrativo, que foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

1.4 A Recorrente apresentou alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.): «

I - Pretende a Recorrida através da presente acção obter nulidade da liquidação da taxa (1.476,54 €) notificada pela Delegação Regional de Viana do Castelo, pela afixação de publicidade à margem da EN …….. ao km 35+440, do lado direito, em Ponte de Lima, imputando ao mencionado acto, entre outros, o vício de incompetência absoluta da EP.

II - A Recorrida defende, além de outros fundamentos que a competência para licenciar a publicidade afixada à margem das estradas nacionais está atribuída, exclusivamente, às câmaras municipais, enquanto a Recorrente advoga que a mesma não está excluída dos poderes que lhe foram concedidos, podendo consubstanciar um acto de licenciamento ou de autorização.

III - É muito importante ter em conta, que o legislador, apesar de discordar da afixação da publicidade margem das estradas nacionais por razões estéticas e de salvaguarda da segurança rodoviária, admitiu-a (tolerou-a) desde que permitida (licenciada/autorizada) por entidade competente (a Recorrente no caso) e depois de paga a respectiva taxa (proibição relativa).

IV - Ora, resulta da actual legislação que:

a) Fora dos aglomerados urbanos o legislador não permite a afixação de publicidade pelo que a questão do licenciamento só se coloca nos casos de excepção ao regime de proibição (alínea a) art. 4.º do DL 105/98);

b) Dentro dos aglomerados urbanos, existe um concurso aparente ou real de competências sobre o licenciamento da publicidade apesar de ser evidente que os terrenos à margem das estradas nacional estão dentro da zona de protecção sobre os quais se verificam permissões condicionadas a aprovação autorização ou licença da JAE (faixa de respeito) (cfr. alínea b), do artigo 3.º do DL 13/71).

V - Por sua vez, a competência da Recorrente para conceder licença e liquidar as taxas devidas pela implantação de tabuletas ou objectos de publicidade à margem das estradas nacional decorre da conjugação da seguinte legislação:

a) A Lei 97/88 no artigo 1.º, n.º 1, prevê que a afixação de mensagens publicitárias obedece às regras gerais sobre publicidade e depende do licenciamento prévio das autoridades competentes;

b) No n.º 2, daquele artigo 1.º, é dito que “Sem prejuízo de intervenção necessária de outras entidades, compete às câmaras municipais ...

c) A Lei 97/88 (tal como o anterior DL 637/76) não revogou o DL 13/71 quanto ao poder concedido à JAE para licenciar a aposição de publicidade na denominada zona de protecção à estrada (cfr. artigos 1.º, 2.º, 3.º, 10.º e 15.º, todos do DL 13/71).

VI - E mesmo que se aceite a concorrência de duas competências (duas jurisdições) com a intervenção de duas entidades distintas no mesmo procedimento ela resulta das diferentes atribuições que cada uma destas entidades assegura.

VII - Assim compete as Câmaras Municipais definição dos critérios de licenciamento para salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental, nos termos do n.º 2, do artigo 1.º da Lei n.º 97/88, enquanto à Recorrente lhe cabe averiguar se a estrada ou a perfeita visibilidade de trânsito não são afectadas (cfr n.º 1, do artigo 12.º do DL n.º 13/71 de 23 de Janeiro).

VIII -É que os serviços prestados pelas Câmaras e pela EP não são os mesmos, pelo que não se podem confundir.

IX - Por isso, a intenção do legislador ao publicar o DL 637/76 e depois a Lei 97/88 foi, inequivocamente, a de salvaguardar o regime especial previsto nas normas de protecção às estradas nacionais, mais propriamente no DL 13/74 de 23 de Janeiro.

X - Ao decidir como decidiu, o tribunal a quo violou o constante nos artigos 3.º, alínea b); 10.º, n.º 1 alínea b); 12.º e alínea j), do n.º 1, do 16.º, todos do DL 13/74 de 23 de Janeiro, acabando por perfilhar solução oposta à jurisprudência maioritária desse tribunal.

NESTES TERMOS,

E nos que V. Exs. mui doutamente suprirão, deverá ser revogada a sentença recorrida, ordenando-se ao TAF do Braga que proceda à apreciação das outras questões, assim se fazendo como sempre, inteira e sã JUSTIÇA».

1.5 A Recorrida não contra-alegou.

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto, que enunciou a questão a decidir como sendo a da «competência da EP - Estradas de Portugal, S.A. para aplicar taxa de publicidade em zona de protecção à estrada, conforme previsto no art. 15.º do Dec.-Lei n.º 13/71, de 23/1, actualizado pelo Dec.-Lei n.º 25/04, de 17/1», emitiu parecer no sentido de «se manter a competência da EP - Estradas de Portugal, S.A., enquanto sucessora do IEP - Instituto de Estradas de Portugal, IP e da Junta Autónoma das Estradas, para aplicar taxas de publicidade em zona de protecção à estrada, de que decorre, na procedência do recurso interposto, ser de anular o decidido e mandar remeter o processo à 1.ª Instância para, após apuramento da pertinente matéria de facto, se decidir da matéria da impugnação».

1.5 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.

1.6 A questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se a sentença recorrida fez correcto julgamento ao considerar que a “Estradas de Portugal, S.A.” não tem competência para licenciar e taxar a afixação de publicidade situada na margem da estrada nacional.


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2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga deu como provados os seguintes factos: «

A) A aqui impugnante foi notificada, pela comunicação da EP - Estradas de Portugal, S.A. (Delegação Regional de Viana do Castelo), para proceder ao pagamento de taxa de publicidade no valor de € 1.476,54 (mil quatrocentos e setenta e seis euros e cinquenta e quatro cêntimos), pela legalização de publicidade já instalada ao Km 34,440 D da EN ……;

B) É contra a liquidação identificada em A. que a autora deduz a presente impugnação.

FACTOS NÃO PROVADOS

Não se provaram, com relevância para a decisão da causa, outros factos que estejam em contradição com a factualidade provada».


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2.2 DE DIREITO

2.1.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

Como decorre do que deixámos dito, a questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber quem é a entidade competente para licenciar e, consequentemente, tributar a afixação de publicidade nas estradas nacionais, rectius, na zona de protecção das estradas nacionais, tal como definida pelo art. 3.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro (Formada pelas faixas com servidão non aedificandi e pelas faixas de respeito, sendo estas últimas constituídas pelos terrenos limítrofes até 100 metros para além da zona non aedificandi, tal como definido pelo Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro.), após o início da vigência da Lei n.º 97/88, de 17 de Agosto.


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2.2.2 DA INCOMPETÊNCIA DA RECORRENTE PARA LIQUIDAR A TAXA DE EXIBIÇÃO DE PUBLICIDADE

A questão tem-se colocado repetidamente neste Supremo Tribunal Administrativo e tem vindo a ser respondida uniforme e unanimemente por esta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo. Assim, vejam-se, entre outros, os seguintes acórdãos:

˗ de 26 de Junho de 2013, no processo n.º 232/13 (Publicado no Apêndice ao Diário da República de 15 de Abril de 2014 (http://dre.pt/pdfgratisac/2013/32220.pdf), págs. 2856 a 2863, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/f38a09da1dbac0c880257bc500414cea?OpenDocument.), que foi aquele em que se louvou a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga na sentença recorrida;
˗ de 18 de Junho de 2014, no processo n.º 1435/13 (Ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/f328483943cf9a1180257d1e00541e53?OpenDocument.) e no processo 205/14 (Ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/f36d8a70c7ed607d80257d2b003ce6a2?OpenDocument.);
˗ de 2 de Julho de 2014, no processo n.º 492/14 ( Ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/322cce6380175c6680257d27004f05b1?OpenDocument.), no processo n.º 615/14 (Ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/fa45bcb7465ac19280257d0f005233b3?OpenDocument.) e no processo 1566/13 (Ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/894c36a9d0541d1e80257d0f00336c65?OpenDocument.);
˗ de 9 de Julho de 2014, no processo n.º 483/14 (Ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d47aafec0599584380257d23002ee0c9?OpenDocument.);
˗ de 10 de Setembro de 2014, no processo n.º 79/14 (Ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/6bdca20e1af1c1d780257d51004ebcd5?OpenDocument.).

Ainda que referindo-se à questão do licenciamento em si – enquanto a Secção de Contencioso Tributário aborda a questão sob a óptica da tributação do licenciamento – também a Secção de Contencioso Administrativo tem vindo a decidir repetida e uniformemente. Vejam-se, entre outros, os seguintes acórdãos:

˗ de 20 de Fevereiro de 2013, no processo n.º 1418/13;
˗ de 20 de Março de 2014, nos processos n.ºs 983/13, 1340/13, 1415/13, 1417/13, 1500/13, 1597/13, 1604/13, 1786/13, 1813/13, 1814/13 e 1854/13;
˗ de 3 de Abril de 2014, nos processos n.ºs 1499/13, 1556/13, 1600/13, 1741/13, 1815/13, 1896/13; 1792/13 e 24/14;
˗ de 29 de Abril de 2014, no processo n.º 73/14;
˗ de 15 de Maio de 2014, nos processos n.ºs 1516/13, 133/14, 135/14 e 140/14;
˗ de 19 de Junho de 2014, nos processos n.ºs 134/14, 138/14, 228/14, 233/14 e 236/14;
˗ de 26 de Junho, no processo n.º 338/14;
˗ de 9 de Julho, no processo n.º 235/14.

Podemos, pois, concluir que existe actualmente jurisprudência consolidada sobre a questão, conclusão à qual não obsta a existência de algumas decisões mais antigas desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em sentido diverso, designadamente os acórdãos que a Recorrente cita em abono da sua tese, proferidos ambos em 25 de Junho de 2009, pela mesma formação, nos processos n.º 243/09 (Publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Setembro de 2009
(http://dre.pt/pdfgratisac/2009/32220.pdf), págs. 997 a 1003, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/0c5c4a70a2d7f524802575e5004dec2d?OpenDocument.) n.º 244/09 (Publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Setembro de 2009
(http://dre.pt/pdfgratisac/2009/32220.pdf), págs. 1003 a 1008, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/a837fe04d5ac11c1802575e5004fa145?OpenDocument.). Aliás, nesse sentido, decidiu esta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em aresto proferido em 9 de Julho de 2014 (Ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/92b7c0a3b92af68b80257d27003833c2?OpenDocument.), votado unanimemente pelos nove Conselheiros actualmente em exercício de funções, que julgou findo o recurso interposto ao abrigo do disposto no art. 284.º do CPPT do acórdão em que a sentença se louvou – proferido em 26 de Junho de 2013, no processo n.º 232/13 – e no qual foi invocado como fundamento o referido acórdão de 25 de Junho de 2009, proferido no processo n.º 244/09. Na verdade, o motivo por que esse recurso foi julgado findo foi o de que a doutrina adoptada no acórdão recorrido constituía «jurisprudência consolidada» para os efeitos do art. 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Assim, pelos fundamentos constantes do referido acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 26 de Junho de 2013, proferido no processo n.º 232/13, para cuja fundamentação remetemos – dispensando junção da cópia do mesmo, por estar já publicado no jornal oficial –, o recurso não merece provimento, pois a sentença recorrida não enferma do erro de julgamento que lhe vem assacado, tanto mais que, também ela, se louvou na doutrina desse aresto.


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2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - Por força, primeiro do Decreto-Lei n.º 637/76, de 29 de Junho, e, posteriormente, da Lei n.º 97/88, de 17 de Agosto (art. 2.º, n.º 2), o art. 10.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, na parte em que exigia a aprovação ou licença da Junta Autónoma das Estradas, foi derrogado e essa exigência foi desgraduada, limitando-se à emissão de parecer.

II - Por força dos mencionados diplomas, o licenciamento da afixação e inscrição de mensagens de publicidade passou a ser atribuído de forma universal às câmaras municipais, na área do respectivo concelho, sem prejuízo da intervenção obrigatória, através da emissão do respectivo parecer, por parte de entidades com jurisdição exclusiva para defesa de interesses públicos específicos que têm de ser tidos em conta na emissão de licença final pelo respectivo município.

III - Assim sendo, depois da entrada em vigor daqueles diplomas a “EP - Estradas de Portugal, S.A.” deixou de ter competência para licenciar a afixação de mensagens publicitárias, carecendo, por isso, de competência para tributar esse licenciamento.


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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

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Lisboa, 24 de Setembro de 2014. - Francisco Rothes (relator) - Aragão Seia - Casimiro Gonçalves.