Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0543/15 |
Data do Acordão: | 07/08/2015 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | FRANCISCO ROTHES |
Descritores: | PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA SISA ISENÇÃO CONDIÇÃO RESOLUTIVA |
Sumário: | I - O prazo de prescrição conta-se, salvo disposição especial em contrário, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu (n.º 1 do art. 48.º da LGT). II - O termo inicial da contagem do prazo de prescrição da obrigação tributária, em caso de verificação da condição resolutiva da isenção de sisa (arts. 11.º, n.º 3, e 16.º, n.º 1, do CIMSISD e art. 48.º, n.º 1, da LGT) reporta à data do facto tributário e não à data da revogação da isenção. III - A referida doutrina corresponde actualmente a jurisprudência consolidada neste Supremo Tribunal Administrativo. |
Nº Convencional: | JSTA00069282 |
Nº do Documento: | SA2201507080543 |
Data de Entrada: | 05/04/2015 |
Recorrente: | FAZENDA PÚBLICA |
Recorrido 1: | A............, SA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Meio Processual: | REC JURISDICIONAL |
Objecto: | SENT TT1INST LISBOA |
Decisão: | NEGA PROVIMENTO |
Área Temática 1: | DIR FISC - SISA. DIR PROC TRIBUT CONT. |
Legislação Nacional: | CIMSISD91 ART2 ART11 N3 ART16 N1 ART180. LGT98 ART48 ART49. CCIV66 ART306. |
Jurisprudência Nacional: | AC STAPLENO PROC0873/09 DE 2010/02/22.; AC STAPLENO PROC01135/12 DE 2013/04/10.; AC STAPLENO PROC0728/12 DE 2013/11/13.; AC STA PROC0211/10 DE 2010/05/26.; AC STA PROC0383/10 DE 2010/09/22.; AC STA PROC0174/11 DE 2011/06/06.; AC STA PROC0888/11 DE 2012/05/09.; AC STA PROC0865/12 DE 2012/11/28.; AC STA PROC01183/13 DE 2013/06/24.; AC STA PROC01421/14 DE 2015/04/29.; AC STA PROC0673/14 DE 2014/07/02.; AC STA PROC01183/13 DE 2013/10/30. |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de oposição à execução fiscal com o n.º 2514/11.8BELRS
1. RELATÓRIO 1.1 A Fazenda Pública (adiante Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, com fundamento na prescrição da dívida exequenda, julgou procedente a oposição deduzida pela sociedade denominada “A…………, S.A.” (adiante Executada, Oponente ou Recorrida) à execução fiscal instaurada contra ela para cobrança de uma dívida de imposto de sisa. 1.2 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. A Recorrente apresentou as alegações de recurso, com conclusões do seguinte teor: «I- A oponente, citada para pagamento de sisa relativa a aquisição de imóvel adquirido por operação de revenda, veio alegar a prescrição da divida. II- Por sentença proferida pelo tribunal a quo, entendeu-se que se entre o facto tributário ocorrido a 22 de Março de 2001 e a citação da Opoente, verificada a 11 de Novembro de 2011, sendo este o primeiro facto ocorrido com a virtualidade de interromper o curso da prescrição da dívida exequenda, art. 49.º n.º 1 da Lei Geral Tributária — sem que outros anteriores se observassem, interruptivos ou suspensivos do curso do prazo de prescrição da dívida –, mediaram mais de oito anos; como tal, então a citação teve lugar quando a divida era já prescrita em relação à Opoente – desde 22 de Março de 2009. III- Ora, os presentes autos correm por dívida de SISA, imposto municipal que nos termos do art. 2.º do CIMSISD incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade de bens imóveis e, que quanto à sua incidência num sentido restrito, impõe que o imposto de sisa seja devido por aqueles para quem se transmitem os bens – art. 7.º do CIMSISD. IV- Estão isentas de acordo com o art. 11.º do CIMSISD, as aquisições de prédios para revenda previstas nos termos do art. 13.º-A do mesmo código, situação que corresponde ao caso dos autos. V- A isenção de sisa de que goza a aquisição de prédios para revenda, está sujeita a condição resolutiva, caducando se os mesmos prédios não forem vendidos no prazo de 3 anos (arts. 11.º n.º 3 e 16.º n.º 1 CIMSISD). VI- A questão fundamental consiste pois em determinar qual é o termo inicial de contagem do prazo de prescrição. VII- “Ficou consignado no Acórdão de 6/6/2011, proc. n.º 0174/2011, que “Enquanto não for possível à AT liquidar o tributo, não poderá ter início o prazo de prescrição, pois este só começa a correr quando o direito puder ser exercido, nos termos do disposto no artigo 306.º do CC” (Cfr. Jurisprudência reiterada, entre outros, nos Acórdãos, de 26/5/2010, recurso n.º 211/10 e de 22/9/2010, recurso n.º 383/10)” – vide alegações. VIII- De acordo com a “doutrina expressa no Acórdão de 8/6/2011 por se entender que fundando-se a prescrição na inércia do titular do direito, ela deve, logicamente, só começar a correr no momento em que o direito pode ser exercido (Cfr. VAZ SERRA, “Prescrição e Caducidade” BMJ, 1961, p 190.). Trata-se, assim, de um princípio geral inerente à própria teleologia intrínseca da prescrição e, por isso, de aplicação geral, independentemente da sua expressa consagração nas leis gerais tributárias”. IX- “Por outro lado, a acolher-se a tese contrária, significa que passado o prazo da prescrição estava aberto o caminho para se alterar o destino dos imóveis, pondo em causa as razões de interesse público que presidiram à atribuição da isenção (...). Assim, aplicando a jurisprudência mencionada ao caso em apreço, o prazo de prescrição da dívida exequenda apenas se inicia com a verificação da condição resolutiva de não verificação dos pressupostos que determinaram a atribuição da isenção…” in acórdão STA n.º 0865/12. X- Contrariamente à sentença decidenda o que verdadeiramente está em causa não será propriamente a ocorrência do facto tributário mas antes uma limitação ou impossibilidade de reacção perante a prescrição que não se funda na não inércia do titular do direito, mas numa impossibilidade do exercício desse direito pelo seu titular ser efectivado face à ulterioridade do momento em que o direito pode ser exercido; concretizando, apenas a partir do momento em que fizeram três anos contados da aquisição do prédio que não foi revendido nesse prazo, pode ser exigido o imposto. XI- Assim, sendo e sendo certo que a ideia de prescrição tem como imanentes os princípios da certeza e segurança jurídica, também a Administração Pública, acometida nas suas funções deve prosseguir os fins que lhe estão constitucionalmente acometidos, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, também subordinados à Constituição, não podendo ser impedida de tal exercício que consagra ainda o respeito pelo princípio da justiça. XII- Apenas assim podem ser preenchidas as expectativas dos cidadãos no que respeita ao princípio da legalidade, prevalecendo o interesse público sobre o interesse privado. XIII- Segundo o acima demonstrado e tendo por base o entendimento jurisprudencial anteriormente exposto, a dívida não se encontra prescrita. XIV- Ou seja: no dia 22 de Março de 2001 (facto dado como provado nos autos), a oponente adquiriu quatro lotes de terreno para construção, todos sitos na ………, ………, designados por C1, C2, C3 e C4 e inscritos respectivamente sob os arts. 4840, 4841, 4842, 4843. No hiato temporal de três anos que se seguiu a essa aquisição sob isenção de tributação de Sisa, a oponente não revendeu os referidos lotes. Nesse conspecto e, uma vez que até aí a AT não negligenciou a cobrança da dívida, mas não agiu por impossibilidade de o fazer, não correu o prazo de prescrição. XV- Ou seja, sendo a negligência o fundamento da prescrição uma vez que o credor estava impossibilitado de cobrar a dívida, a contagem do referido prazo prescricional ter-se-á iniciado apenas após a verificação da condição resolutiva da isenção, em 21 Março de 2004 (ou seja, três anos após a aquisição efectuada em 22 de Março de 2001). Tal, teria como consequência que o prazo de 8 anos apenas se viria a completar em 2012, sem contar ainda com quaisquer condições interruptivas. XVI- Contudo, como a oponente foi citada em 22 de Novembro de 2011, tal citação teria tido outro efeito, a interrupção do decurso do prazo de prescrição eliminando todo o prazo decorrido até aí – n.º 1 do art. 49.º da LGT, na redacção dada pela Lei n.º 100/99, de 26 de Julho. Como aliás se pode verificar compulsando o PEF, a partir dessa data, o processo não esteve parado por mais de um ano, passando até a estar suspenso desde 2012-08-02, após associação de diversas garantias. XVII- Portanto, a sentença recorrida fez uma errada interpretação da lei quando não atendeu ao facto de que, havendo declaração de revogação de sisa, por o mesmo imóvel não ter sido revalidado no prazo de três anos, o prazo de prescrição deva contar-se a partir da referida declaração de revogação do tributo – condição essa resolutiva. XVIII- Tal interpretação vai além do mais contra os fins da tributação, tal como consta do artigo 5.º da mesma lei, por não respeitar os princípios da generalidade, da igualdade, da legalidade e da justiça material porque, tal como é referido no já amplamente citado acórdão do STA n.º 0865/12, vingando tal interpretação idêntica à da sentença recorrida, “significa que ultrapassado o prazo da prescrição estava aberto o caminho para se alterar o destino dado aos imóveis, pondo em causa as razões do interesse público que presidiram à atribuição da isenção”. Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a oposição improcedente, por não verificação da prescrição, com as devidas consequências legais». 1.3 Não foram apresentadas contra-alegações. 1.4 O Representante do Ministério Público neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso e mantida a decisão recorrida, com a seguinte fundamentação: 1.5 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos. 1.6 A questão suscitada pela Recorrente é a de saber se o Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa fez correcto julgamento quando considerou procedente a oposição à execução fiscal com fundamento na prescrição da dívida exequenda, o que passa por indagar qual o dies a quo do prazo prescricional nos casos, como o sub judice, de verificação da condição resolutiva da isenção de sisa [arts. 11.º, n.º 3, e 16.º, n.º 1, do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações (CIMSISD) e art. 48.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT)]: a data do facto tributário ou a data da revogação da isenção? * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos: «1. No dia 22 de Março de 2001 a Opoente, A…………, S.A., adquiriu a B………… e a C…………, pelo preço global de 132.000.000$00 (e unitário de 33.000.000$00): a) um lote de terreno destinado a construção, com a área de 567 m2, situado na ………, ……… lote C 1, na freguesia de ………, concelho de Vila Franca de Xira, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira sob a ficha 196, então ainda omisso na matriz mas para que fora já então pedida inscrição; b) um outro lote de terreno destinado a construção, com a área de 567 m2, situado na mesma Quinta, ……… lote C 2, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira sob a ficha 197, então ainda omisso na matriz mas para que fora já então pedida inscrição; c) um terceiro lote de terreno destinado a construção, com a área de 567 m2, situado naquela Quinta ……… lote C, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira sob a ficha 198, então igualmente ainda omisso na matriz mas para o qual já fora então pedida inscrição; e d) um quarto lote de terreno destinado a construção, com a área de 567 m2, situado naquela Quinta ……… lote C4, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira sob a ficha 199, então igualmente ainda omisso na matriz mas para o qual já fora então pedida inscrição. 2. Na celebração do negócio a Opoente declarou destinar os bens à sua revenda e, em face dessa finalidade, celebrou-o sob isenção da sua tributação em sede de Imposto Municipal de Sisa, sendo o seu objecto social, também, a compra e venda de imóveis. 3. Todavia, no lapso de três anos que se seguiu à aquisição a Opoente não vendeu os referidos quatro lotes, entretanto já inscritos na matriz predial urbana da mencionada freguesia sob os arts. 4840.º, 4841.º, 4842.º e 4843.º, respectivamente. 4. Detectando aquela omissão sem que a Opoente lhe tivesse pedido a liquidação no prazo de 30 dias subsequentes ao termo daquele prazo, a Administração Tributária desenvolveu procedimento inspectivo interno sobre o seu exercício de 2001 e no âmbito do Imposto Municipal de Sisa [ordem de serviço n.º OI201010835] no qual, por relatório de 5 de Janeiro de 2011, se concluía pela tributação daquelas aquisições por caducidade da isenção referida nos pontos 2-3., por omissão de venda ao cabo dos três anos passados sobre a compra referida no ponto 1., pelo que deveria ela ter pedido a liquidação e pago o imposto antes isentado, concluindo-se que a par do prazo da caducidade corria o da prescrição da dívida de imposto, discordando-se da posição expressa pela Opoente no âmbito da sua audição, que invocava que esse prazo se iniciara com a compra dos lotes; propunha-se assim que a tributação incidisse, à taxa aplicável, sobre o preço [132.000.000$00/€658.413,20] liquidando-se ainda os juros compensatórios desde a referida omissão do pedido de liquidação. 5. Tendo sido aprovadas tais conclusões, por despacho de 31 de Janeiro de 2011, a Administração Tributária, pelo Serviço de Finanças de Vila Franca de Xira 2, elaborou liquidação do Imposto Municipal de Sisa e dos seus juros compensatórios [entre 22 de Abril de 2004 (termo do prazo para pedir a liquidação), e 31 de Janeiro de 2011 (data de aprovação do relatório inspectivos), que notificou a 4 ou 5 de Julho de 2011 à Opoente, indicando-lhe os termos da liquidação, sua fundamentação, bem como proceder à sua satisfação em dez dias, a ela reagir e prazos a tanto aplicáveis; a liquidação compreendida os seguintes termos: Valor atribuído/matéria colectável: € 658.413,20; Sisa devida: € 67.617,36 x 10% = € 200.000; Juros compensatórios [entre as datas já referidas]: €18.347,46. 6. Não tendo a Opoente procedido à satisfação da dívida emergente da liquidação até ao termo do prazo que lhe tinha sido assinalado, nem depois, a 2 de Novembro de 2011 foi instaurado no citado Serviço de Finanças o processo visando a sua cobrança coerciva, ao qual coube o n.º 3573201101154842, com base em certidão de dívida da liquidação extraída, com o n.º 1/Outubro/2011. 7. Nele citada a Opoente a 11 de Novembro de 2011, no dia 11 ou 12 do mês seguinte apresentou ela a petição na origem dos presentes autos.». * 2.2 DE DIREITO 2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR O Serviço de Finanças de Lisboa instaurou uma execução fiscal contra uma sociedade para cobrança de dívida de sisa, que foi liquidada oficiosamente na sequência da caducidade da isenção, nos termos dos arts. 11.º, n.º 3 e 16.º, n.º 1, do CIMSISD, na medida em que aquela sociedade, que adquiriu prédios para revenda, revendeu-os já depois de esgotado o prazo de 3 anos previsto na referida norma legal. 2.2.2 DO ERRO DE JULGAMENTO - A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA Como bem salientou o Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, a posição sustentada na sentença recorrida corresponde a jurisprudência consolidada nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo. 2.2.3 CONCLUSÕES Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões, sendo as duas primeiras decalcadas do citado acórdão do Pleno da Secção de 10 de Abril de 2013, proferido no processo n.º 1135/12: * * * 3. DECISÃO Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso. Custas pela Fazenda Pública. * |