Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0543/15
Data do Acordão:07/08/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA
SISA
ISENÇÃO
CONDIÇÃO RESOLUTIVA
Sumário:I - O prazo de prescrição conta-se, salvo disposição especial em contrário, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu (n.º 1 do art. 48.º da LGT).
II - O termo inicial da contagem do prazo de prescrição da obrigação tributária, em caso de verificação da condição resolutiva da isenção de sisa (arts. 11.º, n.º 3, e 16.º, n.º 1, do CIMSISD e art. 48.º, n.º 1, da LGT) reporta à data do facto tributário e não à data da revogação da isenção.
III - A referida doutrina corresponde actualmente a jurisprudência consolidada neste Supremo Tribunal Administrativo.
Nº Convencional:JSTA00069282
Nº do Documento:SA2201507080543
Data de Entrada:05/04/2015
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A............, SA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TT1INST LISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - SISA.
DIR PROC TRIBUT CONT.
Legislação Nacional:CIMSISD91 ART2 ART11 N3 ART16 N1 ART180.
LGT98 ART48 ART49.
CCIV66 ART306.
Jurisprudência Nacional:AC STAPLENO PROC0873/09 DE 2010/02/22.; AC STAPLENO PROC01135/12 DE 2013/04/10.; AC STAPLENO PROC0728/12 DE 2013/11/13.; AC STA PROC0211/10 DE 2010/05/26.; AC STA PROC0383/10 DE 2010/09/22.; AC STA PROC0174/11 DE 2011/06/06.; AC STA PROC0888/11 DE 2012/05/09.; AC STA PROC0865/12 DE 2012/11/28.; AC STA PROC01183/13 DE 2013/06/24.; AC STA PROC01421/14 DE 2015/04/29.; AC STA PROC0673/14 DE 2014/07/02.; AC STA PROC01183/13 DE 2013/10/30.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de oposição à execução fiscal com o n.º 2514/11.8BELRS

1. RELATÓRIO

1.1 A Fazenda Pública (adiante Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, com fundamento na prescrição da dívida exequenda, julgou procedente a oposição deduzida pela sociedade denominada “A…………, S.A.” (adiante Executada, Oponente ou Recorrida) à execução fiscal instaurada contra ela para cobrança de uma dívida de imposto de sisa.

1.2 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. A Recorrente apresentou as alegações de recurso, com conclusões do seguinte teor:

«I- A oponente, citada para pagamento de sisa relativa a aquisição de imóvel adquirido por operação de revenda, veio alegar a prescrição da divida.

II- Por sentença proferida pelo tribunal a quo, entendeu-se que se entre o facto tributário ocorrido a 22 de Março de 2001 e a citação da Opoente, verificada a 11 de Novembro de 2011, sendo este o primeiro facto ocorrido com a virtualidade de interromper o curso da prescrição da dívida exequenda, art. 49.º n.º 1 da Lei Geral Tributária — sem que outros anteriores se observassem, interruptivos ou suspensivos do curso do prazo de prescrição da dívida –, mediaram mais de oito anos; como tal, então a citação teve lugar quando a divida era já prescrita em relação à Opoente – desde 22 de Março de 2009.

III- Ora, os presentes autos correm por dívida de SISA, imposto municipal que nos termos do art. 2.º do CIMSISD incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade de bens imóveis e, que quanto à sua incidência num sentido restrito, impõe que o imposto de sisa seja devido por aqueles para quem se transmitem os bens – art. 7.º do CIMSISD.

IV- Estão isentas de acordo com o art. 11.º do CIMSISD, as aquisições de prédios para revenda previstas nos termos do art. 13.º-A do mesmo código, situação que corresponde ao caso dos autos.

V- A isenção de sisa de que goza a aquisição de prédios para revenda, está sujeita a condição resolutiva, caducando se os mesmos prédios não forem vendidos no prazo de 3 anos (arts. 11.º n.º 3 e 16.º n.º 1 CIMSISD).

VI- A questão fundamental consiste pois em determinar qual é o termo inicial de contagem do prazo de prescrição.

VII- “Ficou consignado no Acórdão de 6/6/2011, proc. n.º 0174/2011, que “Enquanto não for possível à AT liquidar o tributo, não poderá ter início o prazo de prescrição, pois este só começa a correr quando o direito puder ser exercido, nos termos do disposto no artigo 306.º do CC” (Cfr. Jurisprudência reiterada, entre outros, nos Acórdãos, de 26/5/2010, recurso n.º 211/10 e de 22/9/2010, recurso n.º 383/10)” – vide alegações.

VIII- De acordo com a “doutrina expressa no Acórdão de 8/6/2011 por se entender que fundando-se a prescrição na inércia do titular do direito, ela deve, logicamente, só começar a correr no momento em que o direito pode ser exercido (Cfr. VAZ SERRA, “Prescrição e Caducidade” BMJ, 1961, p 190.). Trata-se, assim, de um princípio geral inerente à própria teleologia intrínseca da prescrição e, por isso, de aplicação geral, independentemente da sua expressa consagração nas leis gerais tributárias”.

IX- “Por outro lado, a acolher-se a tese contrária, significa que passado o prazo da prescrição estava aberto o caminho para se alterar o destino dos imóveis, pondo em causa as razões de interesse público que presidiram à atribuição da isenção (...). Assim, aplicando a jurisprudência mencionada ao caso em apreço, o prazo de prescrição da dívida exequenda apenas se inicia com a verificação da condição resolutiva de não verificação dos pressupostos que determinaram a atribuição da isenção…” in acórdão STA n.º 0865/12.

X- Contrariamente à sentença decidenda o que verdadeiramente está em causa não será propriamente a ocorrência do facto tributário mas antes uma limitação ou impossibilidade de reacção perante a prescrição que não se funda na não inércia do titular do direito, mas numa impossibilidade do exercício desse direito pelo seu titular ser efectivado face à ulterioridade do momento em que o direito pode ser exercido; concretizando, apenas a partir do momento em que fizeram três anos contados da aquisição do prédio que não foi revendido nesse prazo, pode ser exigido o imposto.

XI- Assim, sendo e sendo certo que a ideia de prescrição tem como imanentes os princípios da certeza e segurança jurídica, também a Administração Pública, acometida nas suas funções deve prosseguir os fins que lhe estão constitucionalmente acometidos, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, também subordinados à Constituição, não podendo ser impedida de tal exercício que consagra ainda o respeito pelo princípio da justiça.

XII- Apenas assim podem ser preenchidas as expectativas dos cidadãos no que respeita ao princípio da legalidade, prevalecendo o interesse público sobre o interesse privado.

XIII- Segundo o acima demonstrado e tendo por base o entendimento jurisprudencial anteriormente exposto, a dívida não se encontra prescrita.

XIV- Ou seja: no dia 22 de Março de 2001 (facto dado como provado nos autos), a oponente adquiriu quatro lotes de terreno para construção, todos sitos na ………, ………, designados por C1, C2, C3 e C4 e inscritos respectivamente sob os arts. 4840, 4841, 4842, 4843. No hiato temporal de três anos que se seguiu a essa aquisição sob isenção de tributação de Sisa, a oponente não revendeu os referidos lotes. Nesse conspecto e, uma vez que até aí a AT não negligenciou a cobrança da dívida, mas não agiu por impossibilidade de o fazer, não correu o prazo de prescrição.

XV- Ou seja, sendo a negligência o fundamento da prescrição uma vez que o credor estava impossibilitado de cobrar a dívida, a contagem do referido prazo prescricional ter-se-á iniciado apenas após a verificação da condição resolutiva da isenção, em 21 Março de 2004 (ou seja, três anos após a aquisição efectuada em 22 de Março de 2001). Tal, teria como consequência que o prazo de 8 anos apenas se viria a completar em 2012, sem contar ainda com quaisquer condições interruptivas.

XVI- Contudo, como a oponente foi citada em 22 de Novembro de 2011, tal citação teria tido outro efeito, a interrupção do decurso do prazo de prescrição eliminando todo o prazo decorrido até aí – n.º 1 do art. 49.º da LGT, na redacção dada pela Lei n.º 100/99, de 26 de Julho. Como aliás se pode verificar compulsando o PEF, a partir dessa data, o processo não esteve parado por mais de um ano, passando até a estar suspenso desde 2012-08-02, após associação de diversas garantias.

XVII- Portanto, a sentença recorrida fez uma errada interpretação da lei quando não atendeu ao facto de que, havendo declaração de revogação de sisa, por o mesmo imóvel não ter sido revalidado no prazo de três anos, o prazo de prescrição deva contar-se a partir da referida declaração de revogação do tributo – condição essa resolutiva.
A decisão em crise violou o art. 306.º do Código Civil aplicável às relações jurídico-tributárias por via do artigo 2.º da LGT.

XVIII- Tal interpretação vai além do mais contra os fins da tributação, tal como consta do artigo 5.º da mesma lei, por não respeitar os princípios da generalidade, da igualdade, da legalidade e da justiça material porque, tal como é referido no já amplamente citado acórdão do STA n.º 0865/12, vingando tal interpretação idêntica à da sentença recorrida, “significa que ultrapassado o prazo da prescrição estava aberto o caminho para se alterar o destino dado aos imóveis, pondo em causa as razões do interesse público que presidiram à atribuição da isenção”.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a oposição improcedente, por não verificação da prescrição, com as devidas consequências legais».

1.3 Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4 O Representante do Ministério Público neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso e mantida a decisão recorrida, com a seguinte fundamentação:
«[…] O prazo de prescrição era de 20 anos para os impostos, no caso em análise a SISA, contados desde o ano seguinte aquele em que tiver ocorrido o facto tributário, nos termos do estatuído no artigo 27.º do CPCI e 180.º do CIMSISD.
Com a nova redacção introduzida ao artigo 180.º do CIMSISD, pelo DL 119/94, de 7 de Maio, em vigor em 12 de Maio de 1994, o prazo de prescrição da SISA passou a ser o de 10 anos, nos termos do estatuído no artigo 34.º do CPT.
Ainda, com a redacção introduzida ao artigo 180º do CIMSISSD, pelo DL 472/99, de 8 de Novembro, em vigor em 13 de Novembro de 1999, o prazo de prescrição da SISA passou a ser de 8 anos, nos termos dos artigos 48.º e 49.º da LGT.
Portanto, no caso em análise em que está em causa o imposto de SISA do ano de 2001, o prazo de prescrição é de [8] anos.
A questão controvertida consiste em saber se o prazo de prescrição de 8 anos se conta desde a data da aquisição do imóvel (2001.03.22) ou a data em que caducou a isenção (2004.03.22).
Em consonância com a jurisprudência consolidada do STA (acórdão do PLENO da SCT, de 2013.04.10-P.01135/12, e da SCT, de 2013.07.24-P.01183/14, de 2014.07.02-P.0673/14 e de 2015.04.29-P.01421/14, todos disponíveis no sítio da Internet www.dgsi.pt), sustentamos que, o prazo de prescrição se conta desde a data do facto tributário e não da caducidade da isenção.
Na verdade e, em síntese:
- O artigo 48.º/1 da LGT não prevê a suspensão do prazo de prescrição no caso de benefícios fiscais de natureza condicionada, contrariamente ao que sucede com o prazo de caducidade da liquidação da liquidação do imposto, nos termos do estatuído no artigo 46.º/2/c) da LGT;
- Quer os pressupostos da prescrição, que os pressupostos relativos ao regime do respectivo prazo integram o âmbito da garantia dos contribuintes;
- A LGT fixa como momento relevante para o termo inicial do prazo de prescrição a ocorrência do facto tributário, enquanto facto material que preenche os pressupostos legais da norma de incidência do imposto e que determina o nascimento da obrigação tributária, pelo que a norma do artigo 48.º/1 da LGT não deve ser interpretada com outro sentido que não seja o de o prazo de prescrição da SISA, imposto de obrigação única, se inicia a partir da data da ocorrência do facto tributário, ou seja, da transmissão e não a partir da data em que ocorreu a caducidade da isenção.
Estando esta matéria regulada na LGT não há, assim, que lançar mão do normativo do artigo 306.º do CC.
Assim temos que, iniciando-se o prazo de prescrição em 22 de Março de 2001, data da aquisição dos imóveis, e uma vez que, entretanto não ocorreu qualquer facto interruptivo nos 8 anos posteriores a esta data, quando ocorre a citação da recorrida, em 11 de Novembro de 2011, já a prescrição se havia consumado em 22 de Março de 2009, como bem decidiu a sentença recorrida».

1.5 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.

1.6 A questão suscitada pela Recorrente é a de saber se o Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa fez correcto julgamento quando considerou procedente a oposição à execução fiscal com fundamento na prescrição da dívida exequenda, o que passa por indagar qual o dies a quo do prazo prescricional nos casos, como o sub judice, de verificação da condição resolutiva da isenção de sisa [arts. 11.º, n.º 3, e 16.º, n.º 1, do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações (CIMSISD) e art. 48.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT)]: a data do facto tributário ou a data da revogação da isenção?


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:

«1. No dia 22 de Março de 2001 a Opoente, A…………, S.A., adquiriu a B………… e a C…………, pelo preço global de 132.000.000$00 (e unitário de 33.000.000$00):

a) um lote de terreno destinado a construção, com a área de 567 m2, situado na ………, ……… lote C 1, na freguesia de ………, concelho de Vila Franca de Xira, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira sob a ficha 196, então ainda omisso na matriz mas para que fora já então pedida inscrição;

b) um outro lote de terreno destinado a construção, com a área de 567 m2, situado na mesma Quinta, ……… lote C 2, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira sob a ficha 197, então ainda omisso na matriz mas para que fora já então pedida inscrição;

c) um terceiro lote de terreno destinado a construção, com a área de 567 m2, situado naquela Quinta ……… lote C, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira sob a ficha 198, então igualmente ainda omisso na matriz mas para o qual já fora então pedida inscrição; e

d) um quarto lote de terreno destinado a construção, com a área de 567 m2, situado naquela Quinta ……… lote C4, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira sob a ficha 199, então igualmente ainda omisso na matriz mas para o qual já fora então pedida inscrição.

2. Na celebração do negócio a Opoente declarou destinar os bens à sua revenda e, em face dessa finalidade, celebrou-o sob isenção da sua tributação em sede de Imposto Municipal de Sisa, sendo o seu objecto social, também, a compra e venda de imóveis.

3. Todavia, no lapso de três anos que se seguiu à aquisição a Opoente não vendeu os referidos quatro lotes, entretanto já inscritos na matriz predial urbana da mencionada freguesia sob os arts. 4840.º, 4841.º, 4842.º e 4843.º, respectivamente.

4. Detectando aquela omissão sem que a Opoente lhe tivesse pedido a liquidação no prazo de 30 dias subsequentes ao termo daquele prazo, a Administração Tributária desenvolveu procedimento inspectivo interno sobre o seu exercício de 2001 e no âmbito do Imposto Municipal de Sisa [ordem de serviço n.º OI201010835] no qual, por relatório de 5 de Janeiro de 2011, se concluía pela tributação daquelas aquisições por caducidade da isenção referida nos pontos 2-3., por omissão de venda ao cabo dos três anos passados sobre a compra referida no ponto 1., pelo que deveria ela ter pedido a liquidação e pago o imposto antes isentado, concluindo-se que a par do prazo da caducidade corria o da prescrição da dívida de imposto, discordando-se da posição expressa pela Opoente no âmbito da sua audição, que invocava que esse prazo se iniciara com a compra dos lotes; propunha-se assim que a tributação incidisse, à taxa aplicável, sobre o preço [132.000.000$00/€658.413,20] liquidando-se ainda os juros compensatórios desde a referida omissão do pedido de liquidação.

5. Tendo sido aprovadas tais conclusões, por despacho de 31 de Janeiro de 2011, a Administração Tributária, pelo Serviço de Finanças de Vila Franca de Xira 2, elaborou liquidação do Imposto Municipal de Sisa e dos seus juros compensatórios [entre 22 de Abril de 2004 (termo do prazo para pedir a liquidação), e 31 de Janeiro de 2011 (data de aprovação do relatório inspectivos), que notificou a 4 ou 5 de Julho de 2011 à Opoente, indicando-lhe os termos da liquidação, sua fundamentação, bem como proceder à sua satisfação em dez dias, a ela reagir e prazos a tanto aplicáveis; a liquidação compreendida os seguintes termos:

Valor atribuído/matéria colectável: € 658.413,20;

Sisa devida: € 67.617,36 x 10% = € 200.000;

Juros compensatórios [entre as datas já referidas]: €18.347,46.

6. Não tendo a Opoente procedido à satisfação da dívida emergente da liquidação até ao termo do prazo que lhe tinha sido assinalado, nem depois, a 2 de Novembro de 2011 foi instaurado no citado Serviço de Finanças o processo visando a sua cobrança coerciva, ao qual coube o n.º 3573201101154842, com base em certidão de dívida da liquidação extraída, com o n.º 1/Outubro/2011.

7. Nele citada a Opoente a 11 de Novembro de 2011, no dia 11 ou 12 do mês seguinte apresentou ela a petição na origem dos presentes autos.».


*

2.2 DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

O Serviço de Finanças de Lisboa instaurou uma execução fiscal contra uma sociedade para cobrança de dívida de sisa, que foi liquidada oficiosamente na sequência da caducidade da isenção, nos termos dos arts. 11.º, n.º 3 e 16.º, n.º 1, do CIMSISD, na medida em que aquela sociedade, que adquiriu prédios para revenda, revendeu-os já depois de esgotado o prazo de 3 anos previsto na referida norma legal.
A Executada deduziu oposição, invocando a prescrição da dívida exequenda.
O Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, após exaustivo tratamento da questão, considerando prescrita a dívida exequenda, julgou procedente a oposição. Isto, em síntese, porque entendeu, com a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo, que citou, que o prazo prescricional não pode contar-se senão da data em que ocorreu o facto tributário.
A Fazenda Pública, discordando da sentença, dela recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo. Sustenta, em síntese, que a sentença fez errado julgamento ao efectuar a contagem do prazo prescricional com início da data do facto tributário e que tal contagem deve ter-se por iniciada apenas na data em que se verificou a condição resolutiva da isenção, atento o disposto no art. 306.º do Código Civil (CC). Invoca a favor da sua tese jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo (A Recorrente refere os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 26 de Maio de 2010, proferido no processo n.º 211/10, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Março de 2011 (http://dre.pt/pdfgratisac/2010/32220.pdf), págs. 899 a 905, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/5147bc8ea85325db80257735004f38ec?OpenDocument;
- de 22 de Setembro de 2010, proferido no processo n.º 383/10, publicado no Apêndice ao Diário da República de 1 de Abril de 2011 (http://dre.pt/pdfgratisac/2010/32230.pdf), págs. 1407 a 1409, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/f67340eea41e2720802577b20046de84?OpenDocument;
- de 6 de Junho de 2011, proferido no processo n.º 174/11, publicado no Apêndice ao Diário da República de 6 de Janeiro de 2012 (http://dre.pt/pdfgratisac/2011/32220.pdf), págs. 971 a 974, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/663f593d359d426d802578b1002e4a12?OpenDocument;
- de 28 de Novembro de 2012, proferido no processo n.º 865/12, publicado no Apêndice ao Diário da República de 8 de Novembro de 2013 (http://dre.pt/pdfgratisac/2012/32240.pdf), págs. 3679 a 3684, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d595fe4e1d9cc6b680257acd004de9fd?OpenDocument.
Note-se que o primeiro dos referidos acórdãos não pode ser invocado em abono da posição sustentada pela Recorrente, pois a situação factual nele tratada é diversa: aí estava em causa, não a revogação da isenção de sisa, mas o incumprimento dos objectivos ou condições a que o Decreto-Lei n.º 194/80, de 19 de Junho, subordinava a concessão de incentivos fiscais, do qual resultava a obrigação de pagamento das importâncias fiscais não arrecadadas, acrescidas de juros compensatórios, obrigação esta que não se confunde, nem coincide com as obrigações tributárias que lhe estão subjacentes. Por isso, a doutrina fixada nesse acórdão – no sentido de que o prazo de prescrição da dívida em causa conta-se, nos termos do n.º 3 do art. 43.º do referido Decreto-Lei n.º 194/80, do prazo de 30 dias após a notificação do despacho que determinou a caducidade dos incentivos – tem como pressuposto que o facto gerador do dever de os restituir é a constatação do não cumprimento das condições que motivaram a sua concessão, pelo que, nos termos do n.º 1 do art. 306.º do Código Civil, o prazo de prescrição só começa a correr quando o direito puder ser exercido.
Não obstante, também subscrevendo a tese defendida pela Recorrente, encontramos ainda o seguinte acórdão:
- de 9 de Maio de 2012, proferido no processo n.º 888/11, publicado no Apêndice ao Diário da República de 8 de Outubro de 2013 (http://dre.pt/pdfgratisac/2012/32220.pdf), págs. 1319 a 1329, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/9b367959cf2aac9780257a01003b2bf1?OpenDocument.).
Daí termos considerado como questão a apreciar e decidir a de saber se a sentença fez correcto julgamento quanto à contagem do prazo de prescrição da obrigação tributária, o que passa por saber se, em caso de verificação da condição resolutiva da isenção de sisa, nos termos dos arts. 11.º n.º 3 e 16.º, n.º 1, do CIMSISD e do art. 48.º n.º 1 da LGT, o dies a quo do prazo se situa na data do facto tributário ou na data da revogação da isenção.

2.2.2 DO ERRO DE JULGAMENTO - A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA

Como bem salientou o Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, a posição sustentada na sentença recorrida corresponde a jurisprudência consolidada nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.
O acórdão do Pleno da Secção de 10 de Abril de 2013, proferido no processo n.º 1135/12 (No Apêndice ao Diário da República de 6 de Março de 2014 (http://dre.pt/pdfgratisac/2013/32420.pdf), págs. 130 a 138, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/cbe4b72185fbd0ca80257b5c003b7a33?OpenDocument.), subscreveu a tese – que a sentença adoptou – de que «[o] prazo de prescrição conta-se, salvo o disposto em lei especial, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu (n.º 1 do art. 48.º da LGT). O termo inicial da contagem do prazo de prescrição da obrigação tributária, em caso de verificação da condição resolutiva da isenção de Sisa (arts. 11.º n.º 3, 16.º n.º 1 CIMSISD e 48.º n.º 1 da LGT) reporta à data do facto tributário e não à data da revogação da isenção» (cfr. o respectivo sumário doutrinal).
A referida doutrina, já anteriormente acolhida em diversa jurisprudência – que nos escusamos de referir, mas de que salientamos o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 22 de Fevereiro de 2010, proferido no processo n.º 873/09 (No Apêndice ao Diário da República de 3 de Março de 2011 (http://dre.pt/pdfgratisac/2010/32410.pdf), págs. 49 a 53, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/2fa158d8209225f7802576dd00502ffa?OpenDocument.) – foi seguida pelos ulteriores acórdãos de 24 de Julho de 2013, proferido no processo n.º 1183/13 (No Apêndice ao Diário da República de 26 de Maio de 2014 (http://dre.pt/pdfgratisac/2013/32230.pdf), págs. 3262 a 3267, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/cc80f7af735904a680257be400317843?OpenDocument.), de 2 de Julho de 2014, proferido no processo n.º 673/14 (Ainda não publicado no jornal oficial, mas disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/fe18194d00c4470580257d0e004db45d?OpenDocument.), de 29 de Abril de 2015, proferido no processo n.º 1421/14 (Ainda não publicado no jornal oficial, mas disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8b2a696dc69b28a780257e3e0045d274?OpenDocument.); e foi considerada como jurisprudência consolidada, para efeitos de aferir da admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos, pelos acórdãos de 30 de Outubro de 2013, proferido no processo n.º 1183/13 (No Apêndice ao Diário da República de 26 de Junho de 2014 (http://dre.pt/pdfgratisac/2013/32240.pdf), págs. 4331 a 4333, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/91de8dac5e677cb980257c1a00570777?OpenDocument.), e de 13 de Novembro de 2013, proferido no processo n.º 728/12 (No Apêndice ao Diário da República de 8 de Setembro de 2014 (http://dre.pt/pdfgratisac/2013/32440.pdf), págs. 387 a 392, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3a208c4bbf5ce0e180257c2a0038516d?OpenDocument.), este do Pleno.
Aliás, tal entendimento é também o seguido pelo Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo relativamente a outros impostos (Vide o acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 24 de Fevereiro de 2010, proferido no processo n.º 873/09, publicado no Apêndice ao Diário da República de 3 de Março de 2011 (http://dre.pt/pdfgratisac/2010/32410.pdf), págs. 49 a 54, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/2fa158d8209225f7802576dd00502ffa?OpenDocument.).
Também nós sufragamos o entendimento de que o termo inicial da contagem do prazo de prescrição da obrigação tributária, em caso de verificação da condição resolutiva da isenção de sisa, nos termos dos arts. 11.º n.º 3 e 16.º, n.º 1, do CIMSISD e do art. 48.º n.º 1 da LGT, se reporta à data do facto tributário e não à data da revogação da isenção, pelas razões expressas no citado acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 10 de Abril de 2013 (processo n.º 1135/12), para cuja ampla e profícua fundamentação jurisprudencial e doutrinal remetemos, e que aí se encontram desta forma sintetizadas: «[…] (i) não prevendo o n.º 1 do art. 48.º da LGT a suspensão do prazo de prescrição no caso de benefícios fiscais de natureza condicionada (ao contrário do que sucede com o prazo de caducidade da liquidação do imposto – alínea c) do n.º 2 do art. 46.º da LGT); (ii) integrando a matéria da prescrição da obrigação tributária (quer os pressupostos da prescrição, quer os pressupostos relativos ao regime do respectivo prazo) o âmbito das garantias dos contribuintes e (iii) fixando a LGT, como momento relevante para o termo inicial do prazo de prescrição, a ocorrência do facto tributário (sendo este o facto material que preenche os pressupostos legais da norma de incidência do imposto e que determina o nascimento da obrigação tributária), não é de interpretar a norma contida no n.º 1 do art. 48.º da LGT com outro sentido que não seja o de que, no caso, o prazo de prescrição da sisa devida (imposto de obrigação única) se inicia a partir da data em que ocorreu o facto tributário substanciado na transmissão (aquisição por parte do sujeito passivo respectivo) e não a partir da data em que ocorreu a caducidade da condição a que ficara subordinada a isenção de que o mesmo usufruiu».
Assim, tendo em conta que (i) nos termos do art. 2.º do CIMSISD o facto tributário se verifica com a transmissão do prédio, (ii) que na situação sub judice os imóveis foram adquiridos pela sociedade em 22 de Março de 2001, (iii) que nessa data se encontrava em vigor o art. 180.º do CIMSISD, na redacção introduzida pelo art. 4.º do Decreto-Lei n.º 472/99, de 8 de Novembro, que, para efeitos de prescrição, manda aplicar o disposto nos arts. 48.º e 49.º da LGT, (iv) que nos termos do art. 48.º da LGT o prazo de prescrição é de 8 anos, (v) que esse prazo se conta, no caso de impostos de obrigação única, como é o caso da sisa, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, somos a concluir que, tendo o facto tributário ocorrido em 22 de Março de 2001, o prazo de prescrição terminou em 22 de Março de 2009, caso não tenham entretanto ocorrido quaisquer factos interruptivos ou suspensivos da prescrição.
Da matéria de facto que foi dada como assente resulta que o primeiro facto com virtualidade interruptivo ocorreu com a citação do Recorrente, em 11 de Novembro de 2011.
Ou seja, à data da citação do Recorrente, porque não se verificaram entretanto factos interruptivos ou suspensivos da execução fiscal, já se verificara a prescrição da execução fiscal, como bem decidiu a sentença recorrida, que deu exemplar tratamento à questão.
Assim, sem necessidade de outros considerandos, deve ser negado provimento ao recurso, como decidiremos a final.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões, sendo as duas primeiras decalcadas do citado acórdão do Pleno da Secção de 10 de Abril de 2013, proferido no processo n.º 1135/12:
I - O prazo de prescrição conta-se, salvo disposição especial em contrário, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu (n.º 1 do art. 48.º da LGT).
II - O termo inicial da contagem do prazo de prescrição da obrigação tributária, em caso de verificação da condição resolutiva da isenção de sisa (arts. 11.º, n.º 3, e 16.º, n.º 1, do CIMSISD e art. 48.º, n.º 1, da LGT) reporta à data do facto tributário e não à data da revogação da isenção.
III - A referida doutrina corresponde actualmente a jurisprudência consolidada neste Supremo Tribunal Administrativo.


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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso.

Custas pela Fazenda Pública.


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Lisboa, 8 de Julho de 2015. – Francisco Rothes (relator) – Aragão SeiaCasimiro Gonçalves.