Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0946/16
Data do Acordão:09/14/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:NULIDADE PROCESSUAL
FALTA DE INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS
EXCESSO DE PRONÚNCIA
INTERPRETAÇÃO DE DECISÃO JUDICIAL
Sumário:I - A falta de inquirição das testemunhas arroladas no processo judicial tributário, porque não está prevista como nulidade processual nem constitui uma nulidade processual à luz do art. 195.º e segs. do CPC, na medida em que a lei não prescreve que deva ter sempre lugar a produção de prova, antes conferindo ao juiz o poder de ajuizar da necessidade da sua produção, não permite que, se o juiz dispensar a produção de prova se possa dizer que foi preterida uma formalidade legal, sem prejuízo de a omissão de diligências de prova, na medida em que possa afectar o julgamento da matéria de facto, poder acarretar a anulação da sentença por défice instrutório.
II - A falta de notificação do despacho que dispensar a inquirição das testemunhas, na medida em que a prolação de tal despacho também não está prescrita na lei (dela não poderá resultar prejuízo algum para a parte) e é insusceptível de influir na decisão, não constitui nulidade processual.
III - A notificação do parecer do Ministério Público prévio à sentença a proferir em processo tributário só se impõe, sob pena de violação do princípio do contraditório, nos casos em que aí sejam suscitadas questões que obstem ao conhecimento do mérito ou sobre as quais as partes ainda não tenham tido oportunidade de se pronunciar.
IV - O excesso de pronúncia é um vício formal das decisões judiciais resultante do conhecimento pelo tribunal de questão que, não sendo do conhecimento oficioso, não lhe tenha sido colocada pelas partes (cfr. art. 125.º, n.º 1, do CPPT e art. 660.º, n.º 2, do CPC), pelo que o mesmo não pode verificar-se relativamente à questão da inutilidade superveniente da lide, que, enquanto causa de extinção da instância [cfr. art. 277.º, alínea e), do CPC], é do conhecimento oficioso.
V - A sentença constitui um acto jurídico a que se aplicam, ex vi do art. 295.º do CC, as regras e os princípios gerais de interpretação da declaração negocial, maxime a regra prevista no art. 236.º, n.º 1º, daquele código, de que a declaração deve interpretar-se com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do seu contexto, tendo em conta não só a parte decisória como toda a sua fundamentação.
Nº Convencional:JSTA00069820
Nº do Documento:SA2201609140946
Data de Entrada:07/25/2016
Recorrente:A............
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF VISEU
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - OPOSIÇÃO.
Legislação Nacional:CPPT ART98 ART214 ART131 ART120 ART118 ART285 ART2 ART125 ART136.
LGT ART99.
CPC13 ART5 ART195 ART682 N3 ART615 ART608 N2 ART277 E ART660.
CPC08 ART511.
CCIV66 ART236 ART295.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0388/13 DE 2013/10/28.; AC STA PROC01159/09 DE 2013/11/27.; AC STA PROC01869/13 DE 2014/04/09.; AC TCAS PROC7203/02 DE 2004/10/19.; AC TCAS PROC1186/03 DE 2006/03/07.; AC TCAS PROC2330/08 DE 2008/09/30.; AC TCAS PROC2065/07 DE 2008/10/07.; AC STA PROC01197/12 DE 2013/02/27.; AC STA PROC01492/13 DE 2013/10/30.; AC STA PROC0862/12 DE 2012/09/19.; AC STA PROC01109/12 DE 2012/11/07.; AC STA PROC043/16 DE 2016/01/27.; AC STA PROC01053/10 DE 2011/02/24.; AC STA PROC0446/11 DE 2011/08/24.; AC STA PROC01153/11 DE 2013/02/23.
Referência a Doutrina:MANUEL ANDRADE - NOÇÕES ELEMENTARES DE PROCESSO CIVIL (1979) PÁG176.
JORGE LOPES SOUSA - CÓDIGO PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLII PÁG87 PÁG300-304 VOLIV PÁG312-313.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de oposição ao arresto com o n.º 881/15.3BEVIS

1. RELATÓRIO

1.1 A………… (doravante Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu julgou extinta parcialmente a instância, por inutilidade superveniente da lide, e improcedente na parte restante a oposição por ele deduzida ao arresto decretado nos presentes autos.

1.2 Com o requerimento de interposição do recurso apresentou a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.):

«A. A Douta Sentença recorrida, salvo o devido respeito, é censurável do ponto de vista jurídico-legal porque enfermada de nulidade processual por falta de notificação ao Recorrente de actos essenciais, de nulidade processual por não terem sido inquiridas as testemunhas arroladas e de nulidade por excesso de pronúncia.

B. O Recorrente não foi notificado de actos essenciais dos autos – o Douto Parecer do Ilustre Magistrado do Ministério Público e o Douto Despacho pelo qual o Tribunal a quo, que dispensou a produção da prova testemunhal arrolada – o que configura uma nulidade (dita secundária), nos termos do artigo 195.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC) [ex vi art. 2.º, alínea e), do CPPT] pois tais omissões impediram que o Recorrente se pronunciasse sobre aqueles actos, o que poderia ter como consequência que o Tribunal a quo tivesse proferido uma diferente decisão da que veio a proferir.

C. As omissões in casu ferem o Princípio do Contraditório, previsto no artigo 3.º do CPC [aplicável ex vi art. 2.º, alínea e), do CPPT], na vertente proibitiva da decisão-surpresa, e o Princípio da Igualdade das Partes,

D. Por outro lado, o Tribunal a quo, tendo dispensado a realização da prova testemunhal, impediu o Recorrente de provar parte substancial da matéria invocada na sua Oposição e levou a que a Douta sentença ora recorrida fosse proferida sem contraditório do Recorrente, logo em clara violação do Princípio do Contraditório, previsto no artigo 3.º do CPC [aplicável ex vi art. 2.º, alínea e), do CPPT], do Princípio da igualdade das Partes, do Princípio da Proibição da Indefesa e do Direito à Prova, e do Princípio da Justiça (Verdade Material), porque o Tribunal a quo em violação do artigo 13.º, n.º 1, do CPPT, não realizou nem ordenou todas as diligências úteis ao apuramento da verdade.

E. O que significa uma nulidade (dita secundária), nos termos do artigo 195.º, n.º 1, do CPC (aplicável ex vi art. 2.º, alínea e), do CPPT), pois tal recusa de inquirição, ainda para mais sem justificação, impediu a produção de prova importante pelo Recorrente, a qual poderia levar a que o Tribunal a quo, face a esses elementos de prova, tivesse proferido uma diferente decisão da que veio a proferir,

F. Por outro lado ainda, resulta expressamente da Douta Decisão que decretou o arresto que os créditos que o fundamentam são os relativos aos processos de execução fiscal n.º 2704200901000667, 2704201501075993, 270420150107520, 270420150107538 e 27042015010759409 (cfr., designadamente, a indicação dos fundamento invocados pela Fazenda Pública, constantes do “Relatório” da Douta Decisão; e a alínea t) dos factos dados como provados).

G. Quatro desses processos de execução fiscal foram extintos por pagamento e, no outro, o despacho que ordenou a reversão foi revogado pelo Serviço de Finanças de Tondela, factos que foram corroborados pela Fazenda Pública na sua Contestação, e que foram considerados como provados e procedentes pelo Tribunal a quo, que consequentemente decidiu, através da Douta Sentença ora recorrida, julgar parcialmente extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

H. O Tribunal a quo apenas não extinguiu totalmente a instância porque entendeu, erradamente, que a Decisão que decretou o arresto sustentava este último, não apenas nos supra referidos cinco processos executivos, mas também noutros processos executivos, o que o Recorrente não aceita, por várias razões.

I. De facto, o ora Recorrente nunca foi notificado do Requerimento Inicial/Pedido de Arresto apresentado pela Fazenda Pública, o que significa que nunca poderia ter impugnado, através de Oposição ou Recurso, a inclusão de processos executivos que desconhecia e cuja existência não lhe foi dada a conhecer, nem poderia ter sido proferida Sentença – a ora recorrida – que considera improcedente uma Oposição por factos que o Recorrente não contestou, porque não constantes da Douta Decisão alvo de Oposição.

J. Tendo-o feito, a Douta Sentença ora recorrida considerou créditos não referidos na Douta Decisão que decretou o arresto, impedindo o que seria de outra forma uma decisão de extinção total da lide por inutilidade superveniente, sendo logo nula, nos termos e para os efeitos do artigo 125.º, n.º 1, do CPPT e do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC [aplicável ex vi art. 2.º, alínea e), do CPPT], por se ter pronunciado sobre questões das quais não podia tomar conhecimento.

K. De todo o modo, nunca poderia a Douta Decisão que decretou o arresto ter incluído, na sustentação deste, os processos executivos que a Douta Sentença ora recorrida pretende adicionar, pois, nos termos do artigo 136.º, n.º 1, alínea b), do CPPT, o arresto apenas pode ser decretado se o tributo estiver liquidado ou em fase de liquidação, o que acontecia apenas com os cinco processos executivos que foram tidos em conta na Decisão decretou o arresto, que encontravam-se, à data, em preparação de reversão, ao passo que os outros processos executivos que agora a Douta Sentença pretende que sejam incluídos não se encontravam nessa situação.

Termos em que e, com o douto suprimento de V. Exas., deverá dar-se provimento ao presente recurso, devendo ser proferido Acórdão que julgue procedentes as nulidades arguidas, e ser a Douta Sentença ora recorrida reformada e, em consequência, revogada a providência, decretada por inutilidade superveniente da lide, ordenando-se o levantamento do arresto».

1.3 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

1.4 A Fazenda Pública contra alegou, resumindo a sua posição em conclusões do seguinte teor:

«A) Vêm as presentes contra-alegações do recurso interposto pela arrestada da sentença exarada na oposição ao arresto, que declarou parcialmente extinta a instância por inutilidade superveniente da lide e improcedente a oposição ao arresto por não provada;

B) Nas alegações de recurso são invocadas: nulidade processual por falta de notificação ao recorrente de actos essenciais; nulidade processual por não terem sido inquiridas as testemunhas arroladas e nulidade por excesso de pronúncia;

C) Encontra-se assente jurisprudencialmente no contencioso administrativo que “a notificação do parecer do Ministério Público, para garantir o contraditório, só tem de existir quando, sem ela, fique prejudicada, para uma das partes, a ampla discussão de todos os fundamentos de direito em que a decisão se possa basear, sendo injustificada a notificação quando no referido parecer não seja suscitada ou abordada qualquer questão nova” (vejam-se os Acórdãos do STA - Pleno de 21-02-2002, no recurso n.º 40961 [(Permitimo-nos corrigir o manifesto lapso de escrita: escreveu-se 4096 onde queria dizer-se 40961.)], e de 08-05-2003, recurso n.º 44196);

D) Relativamente a essa matéria atente-se igualmente ao Acórdão do STA de 09-04-2014, processo n.º 01869/13: “II- A notificação ao reclamante do parecer do Ministério Público só se impõe, sob pena de violação do princípio do contraditório, nos casos em que aí sejam suscitadas questões que obstem ao conhecimento do mérito ou sobre as quais as partes ainda não tenham tido oportunidade de se pronunciar”.

E) Estabelece o art. 3.º, n.º 3, do CPC que: “O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem”.

E) Um dos princípios informadores da matéria de nulidades dos actos processuais é o da redução da nulidade à mera irregularidade do acto, sem consequências, sempre que haja atingido o seu fim, que se encontra consagrado n.º 1 do artigo 195.º do CPC;

G) Incluem-se, portanto, todas as irregularidades ou desvios ao formalismo processual que atinjam o contraditório, havendo que aferir, casuisticamente, se a ausência de pronúncia das partes sobre o parecer do Ministério Público as prejudicou, o que apenas acontece quando o parecer levanta questões novas ou excepções nunca discutidas pelas partes, que tenham influência decisiva no desfecho da causa;

H) No caso em apreço, o parecer emitido pelo Ministério Público não suscita nenhuma questão nova ou excepção que merecesse o contraditório, logo, em nosso entender, não estamos perante qualquer nulidade;

I) No tocante à falta de notificação do despacho que dispensa a produção de prova testemunhal, veja-se que a jurisprudência (Acórdão do TCA Sul [(Permitimo-nos corrigir o manifesto lapso de escrita: escreveu-se Norte onde queria dizer-se Sul.)] de 30-09-2008, processo n.º 02330/08) entende que a falta do próprio despacho que dispensa a prova testemunhal não consubstancia qualquer nulidade processual, logo, por maioria de razão a falta da sua notificação também não poderá consubstanciar;

J) Mais, a jurisprudência entende até que o juiz não tem que proferir despacho algum a dispensar a produção da prova, quer porque a lei não prevê tal despacho, quer porque o mesmo não teria qualquer utilidade;

K) O que é lícito ao recorrente é, em sede de recurso, pôr em cheque a própria decisão de dispensa da prova testemunhal (o que também faz) e não já arguir a nulidade por falta de notificação da mesma, como se retira do Acórdão do TCA Sul de 07-03-2006, processo n.º 01186/03;

L) A nulidade por preterição de formalidade legal decorrente da falta de audição de testemunhas arroladas só ocorre se na apreciação das questões decidendas os depoimentos das testemunhas se revestissem de interesse para a boa decisão da causa;

M) In casu, afigura-se-nos que o recorrente limita-se a invocar a falta de audição sem especificar em que termos a referida audição contribuiria para a boa decisão da causa;

N) Tendo considerado o juiz, sendo as questões a dirimir de direito e de facto, que o processo continha já todos os elementos que permitiam a decisão, conheceu e bem de imediato do pedido (após dar vista ao MP), não tendo havido necessidade de produção prova, – ao arrimo também do Acórdão do TCA Sul de 19/10/2004, recurso n.º 7203/02.

O) Não se vislumbra qualquer insuficiência da matéria de facto, não sendo alegada factualidade não assente na sentença recorrida que a provar-se conduzisse a outro desfecho, ou seja, à improcedência do pedido de arresto;

P) Nos termos da alínea d) do art. 615.º, n.º 1, do CPC, ocorre nulidade da sentença quando o juiz se pronuncia sobre questões de que não deva conhecer, conexionando-se esta norma com a segunda parte do n.º 2 do art. 608.º do CPC, em que se estabelece que o juiz não pode ocupar-se senão de questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras;

O) Alega o recorrente que na sentença de oposição o tribunal a quo não extinguiu totalmente a instância porque entendeu erradamente que a Decisão que decretou o arresto sustentava este último não apenas nos processos executivos especificamente referidos, mas também noutros processos executivos.

R) Da sentença que decretou o arresto consta: “O REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, veio requerer o arresto de determinados bens, que melhor identificou na petição inicial, contra A………… contribuinte fiscal n.º ………, residente na Rua ………, n.º ……, ……-… ……….---
Para o efeito alegou que encontram-se em cobrança, no Serviço de Finanças de Tondela, actualmente, 128 processos executivos activos, em nome da sociedade “B………… Lda”, perfazendo o valor total em dívida de € 45.452.449,66.---
No entanto, refere que no âmbito dos processos executivos activos existem processos em que, tendo em conta a natureza da dívida, não é passível efectivar-se a reversão para os responsáveis subsidiários ou relativamente aos quais a FP não poderá representar as entidades credoras em juízo pelo que na medida cautelar que se peticiona apenas se abarcam as dívidas relativas a imposto, coimas e juros que se cifram no montante global de 3.564.773,05, sendo essa a quantia exequenda e acrescido.---” (sublinhado e negrito nosso);

S) Ora, de um total de 128 processos executivos cujo valor em dívida era de € 45.452.449,86, partimos para o montante de € 3.564.773,05, sobre o qual nos era permitido propor a medida cautelar, é certo que na sentença não são elencados os processos executivos, porém, estes encontram-se devidamente discriminados no pedido de arresto;

T) Atento o princípio do pedido e tendo a providência requerida sido total e não parcialmente deferida, não pode obter merecimento a pretensão de considerar apenas objecto do arresto os processos executivos que estavam em fase de preparação para reversão;

U) Aliás, a menção aos cinco processos apenas é feita aquando dos argumentos para o fundado receio: “Invoca o fundado receio da diminuição/inexistência das garantias como fundamento do seu pedido.---
Diz que encontram-se em preparação de reversão os processos executivos n.º 2709200901000667, 2704201501075993, 2704201501077520, 2704201501077538 e 2704201501079409, sendo que A…………, na qualidade de responsável subsidiário, foi já notificado para audição prévia tendo exercido esse direito apenas no processo executivo n.º 2704200901000667”.

V) Dos 23 processos executivos para os quais se propôs a medida cautelar de arresto, 5 havia que já se encontravam em fase de preparação para reversão;

W) Nos processos executivos n.ºs 2704200901000667, 2704201001001280, 2704201001002716 e 2704201001012436 foi reconhecida a prescrição da dívida no tocante ao responsável subsidiário, já os processos executivos n.ºs 2704200501017586, 2704201501075993, 2705201501077520, 2704201501077538 e 2704201501079409 foram estes extintos por pagamento voluntário e compensação, pelo que apenas em relação a estes existe fundamento para se decretar a caducidade do arresto, mantendo-se o interesse da medida para os restantes processos executivos n.ºs 2704201101003330, 2704201101008714, 2704201481017430, 2704201501003348, 2704201501011480, 2704201501016164, 2704201501053280, 2704201501058070, 2704201501058797, 2704201501058860, 2704201501058878, 2704201501058886, 2704201501065645 e 2704201501074130;

X) Restam, portanto, 14 processos activos em que se deve manter a medida cautelar decretada, tendo sido este o mesmo entendimento preconizado pelo Mmo. Juiz [do Tribunal] a quo, na sentença da oposição ao arresto;

Y) A representação da Fazenda Pública considera que não existe excesso de pronúncia uma vez que o juiz se ocupou de questão suscitada pela parte FP no seu próprio pedido de arresto e resposta à oposição ao arresto e que havia sido já referida na sentença que decretou a medida cautelar;

Z) Entende o recorrente que a Decisão que decretou o arresto só poderia incluir os processos executivos em que havia a preparação para reversão uma vez que o arresto apenas pode ser decretado se o tributo estiver liquidado ou em fase de liquidação, o que demonstra a confusão entre liquidação e reversão;

AA) Sendo o arresto requerido com base no art. 214.º, n.º 1 do CPPT que estatui que: “Havendo justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens, pode o representante da Fazenda Pública junto do competente tribunal tributário requerer arresto em bens suficientes para garantir a dívida exequenda e o acrescido, com aplicação do disposto pelo presente Código para o arresto no processo judicial tributário” norma esta que se refere não a tributos liquidados ou em fase de liquidação, mas sim a dívida exequenda e acrescido, não faz sentido reportar-nos ao pressuposto previsto no art. 136.º, n.º 1, alínea b), do CPPT;

BB) Sem prescindir, nos impostos de obrigação única o imposto considera-se em fase de liquidação a partir do momento da ocorrência do facto tributário o mesmo não acontece no tocante aos impostos periódicos, caso em que só se encontra em fase de liquidação a partir do final do ano civil ou de outro período de tributação a que os respectivos rendimentos se reportem, vide n.ºs 2 e 3 do art. 136.º do CPPT;

CC) No caso em apreço, estamos perante dívidas respeitantes a IVA, retenções na fonte de IRS e de IRC, IRC, Coimas e Juros cujas liquidações foram já emitidas e que, não tendo sido pagas no prazo de pagamento voluntário, evoluíram para cobrança coerciva;

DD) Desta feita, todos os tributos a que o pedido de arresto e a sentença que o decretou se reportam, cujo período de tributação vai de Agosto de 2002 a Agosto de 2015, se encontram efectivamente liquidados;

EE) A reversão está prevista no art. 23.º da LGT e 159.º do CPPT e efectiva a responsabilidade subsidiária, não se confundindo com a liquidação, que foi notificada à devedora originária;

FF) De conformidade com a jurisprudência do STA, nomeadamente o Acórdão de 10-03-2011, processo n.º 0126/11: “O arresto de bens do responsável subsidiário pode ter lugar em momento anterior à reversão da execução fiscal (cfr. os artigos 9.º n.º 3 e 136.º n.º 1 do CPPT) desde que seja feita prova, não apenas dos requisitos próprios do arresto previstos no n.º 1 do artigo 136.º do CPPT, mas igualmente de que o responsável reúne as condições de ser chamado à execução por via da reversão, o que implica, a prova da gerência de facto e da (fundada) insuficiência de bens da devedora originária”.

GG) Face ao exposto, entende a Fazenda Pública que não assiste qualquer razão ao recorrente.

Motivo pelo qual, não deve ser dado provimento ao recurso apresentado, mantendo-se a sentença recorrida, com as legais consequências».

1.5 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, antes de ordenar a remessa dos autos ao Supremo Tribunal Administrativo, proferiu despacho ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 617.º do Código de Processo Civil (CPC), pronunciando-se, no que ora interessa (A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu também se pronunciou sobre as nulidades processuais invocadas pelo Recorrente. No entanto, o art. 617.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), só impõe que o juiz aprecie a questão da nulidade da sentença suscitada no âmbito do recurso dela interposto, apreciação a efectuar no próprio despacho em que se pronuncia sobre a admissibilidade do recurso, e o n.º 2 do mesmo artigo só lhe abre a possibilidade de suprir a nulidade, mas a lei já não lhe impõe esse dever, nem lhe faculta essa possibilidade, relativamente às nulidades processuais que hajam de ser invocadas em sede de recurso e como fundamento deste.), sobre a invocada nulidade da sentença por excesso de pronúncia, que considerou não se verificar, uma vez que «[n]os presentes autos de arresto, e ao contrário do alegado pelo Recorrente, não estavam apenas em causa os cinco processos de execução fiscal por aquele mencionados», mas antes «a Fazenda Pública propôs a medida cautelar de arresto para 23 processos executivos, no valor global de 3 564 773,05 €, cinco dos quais já se encontravam em fase de reversão».

1.6 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo e dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação:


«A – Da Falta de Notificação do Parecer do M.P.

1. É jurisprudência uniforme deste STA que o parecer do M.P. só tem de ser notificado às partes, para assegurar o princípio do contraditório, quando nele sejam suscitadas questões novas. O que bem se compreende, dado que as partes ainda não se puderam pronunciar sobre as mesmas. Caso contrário, a falta de notificação do parecer não constitui nulidade.
Permitimo-nos transcrever, como exemplo, uma parte do Ac. deste STA de 27.2.13, Proc. n.º 01197/12 – “A notificação do parecer do Ministério Publico ao recorrente só se impõe, sob pena de violação do princípio do contraditório, nos casos em que aí sejam suscitadas questões que obstem ao conhecimento do mérito ou sobre as quais as partes ainda não tenham tido oportunidade de se pronunciar1 [1 No mesmo sentido, Acs. STA, Pleno de 21.2.2002, proc. 40961 [(Idem nota 3.)], e de 8.5.2003, proc. 44196; Acs. do STA de 6.12.2011, proc. 0414/10; de 9.4.2014, proc. 01869/13; de 30.11.11, proc. 0992/11; de 29.11.05, proc. 0969/05; de 11.7.12, proc. 0534/12; de 6.3.12, Proc. 0842/12; de 25.9.13, proc. 01376/13; de 28.10.09, proc.0342/09; de 5.12.07, proc. 03/07; de 11.7.12, Proc. 0237/12].
No presente caso, no parecer do M.P. de fls. 745/49 não foram levantadas quaisquer questões novas e sobre as quais o recorrente não se tivesse já pronunciado. Assim, não há qualquer nulidade a considerar.

B - Da Falta de Notificação do Despacho que dispensou a Audição das Testemunhas

1. Compete ao Juiz avaliar da necessidade ou não de produzir prova e decidir se deve ou não realizar as diligências que foram requeridas ou outras que entender necessárias à descoberta da verdade. Assim, a falta de inquirição de testemunhas arroladas não constitui nulidade já que compete ao julgador avaliar se tal inquirição se impõe ou não, não existindo aqui um imperativo legal. É neste sentido a jurisprudência deste STA. Por todos, o Ac. deste STA de 9.4.2014, Proc. n.º 01869/13 – “A falta de inquirição das testemunhas arroladas no processo de reclamação judicial previsto no art. 276.º e segs. do CPPT, porque não está prevista como nulidade processual nem constitui uma nulidade processual à luz do art. 195.º e segs. do CPC, na medida em que a lei não prescreve que deva ter sempre lugar a produção de prova, antes conferindo ao juiz o poder de ajuizar da necessidade da sua produção, não permite que, se o juiz dispensar a produção de prova se possa dizer que foi preterida uma formalidade legal, sem prejuízo de a omissão de diligências de prova, na medida em que possa afectar o julgamento da matéria de facto, poder acarretar a anulação da sentença por défice instrutório”.
Assim sendo, é óbvio que não pode constituir nulidade a falta de notificação do despacho que dispensou a audição de testemunhas, sendo certo que tal diligência não se afigurava necessária para a decisão da causa.

C – Do Excesso de Pronúncia.

1. Como se escreveu, por exemplo, no douto Ac. deste STA de 30.10.008, rec. 0641/08 (ainda que em questão concreta diferente) – “De acordo com o disposto no art. 668.º, n.º 1, alínea d) 2 [2 Hoje, art. 615.º, n.º 1, al. d) do C. P. C./13] do CPC é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. O conteúdo desta norma deve ser avaliado à luz do art. 660.º, n.º 2 3 [3 Hoje, art. 608.º, n.º 2 do C. P. C./13] segundo o qual “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”. Como se diz no acórdão deste Supremo Tribunal de 7.4.05, no recurso 1322/04, “a nulidade da sentença por omissão ou por excesso de pronúncia está relacionada com o dever do Juiz de conhecer de todas as questões que as partes lhe colocaram e apenas estas”.
2. Ora, pelas razões expendidas pela Ex.ma juiz a fls. 792 (ao fim) não se vê onde e como se configura tal nulidade por excesso de pronúncia».

1.7 Dispensaram-se os vistos dos Juízes adjuntos, atento o carácter urgente do processo.

1.8 As questões que cumpre apreciar e decidir, como procuraremos demonstrar, são as de saber se se verificam as nulidades por falta de inquirição da testemunha, por falta de notificação do despacho que dispensou essa inquirição e por falta de notificação do parecer do Ministério Público proferido em 1.ª instância e se a sentença deveria ter julgado totalmente (e não apenas parcialmente, como julgou) extinta a instância por inutilidade superveniente, sendo que o Recorrente invocou esse vício como nulidade da sentença por excesso de pronúncia.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

2.1.1 A sentença recorrida efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«Com relevância para a decisão da questão prévia, em resultado da apreciação dos documentos constantes dos autos, julgam-se provados os seguintes factos:

1. Em 16.11.2015 a Fazenda Pública requereu junto deste Tribunal o arresto dos bens pertencentes a A…………, para garantia de dívidas tributárias em cobrança coerciva nos seguintes processos de execução fiscal:

1.1. 2704200501017586, no montante de 1.483,10 €;

1.2. 2704200901000667, no montante de 1.282.807,03 €;

1.3. 2704201001001280, no montante de 761.555,72 €;

1.4. 2704201001002716, no montante de 373.899,08 €;

1.5. 2704201001012436, no montante de 193.309,97 €;

1.6. 2704201101003330, no montante de 536.018,36 €;

1.7. 2704201101008714, no montante de 304 810,33 €;

1.8. 2704201481017430, no montante de 2.547,72 €;

1.9. 2704201501003348, no montante de 240,75 €;

1.10. 2704201501011480, no montante de 1.570,09 €;

1.11. 2704201501016164, no montante de 2.293,88 €;

1.12. 2704201501053280, no montante de 14.615,25 €;

1.13. 2704201501058070, no montante de 25.603,04 €;

1.14. 2704201501058797, no montante de 7.561,01 €;

1.15. 2704201501058860, no montante de 3.997,07 €;

1.16. 2704201501058878, no montante de 3.424,22 €;

1.17. 2704201501058886, no montante de 3.345,15 €;

1.18. 2704201501065645, no montante de 5.012,22 €;

1.19. 2704201501074130, no montante de 16.487,04 €;

1.20. 2704201501075993, no montante de 7.399,60 €;

1.21. 2704201501077520, no montante de 51,86 €;

1.22. 2704201501077538, no montante de 33,77 €;

1.23. 2704201501079409, no montante de 16.706,97 €;

Perfazendo no total o montante de 3.564.773,05 €. – cfr. fls. 3/4 do requerimento inicial.

2. Por sentença datada de 30.11.2015, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto julgou a providência cautelar requerida procedente e decretou o arresto dos bens requeridos. – cfr. fls. 183 e ss. dos autos.

3. Da sentença a que alude o ponto anterior consta que no Serviço de Finanças de Tondela encontram-se em cobrança, actualmente, 128 processos executivos activos, em nome da sociedade B…………, Lda., perfazendo o valor total em dívida 45.452.449,86 €, no entanto a medida cautelar que a Fazenda peticiona apenas abarca as dívidas relativas a impostos, coimas e juros que se cifram no montante global de 3.564.773,05 € – cfr. fls. 183 dos autos.

4. Por despacho do Chefe de Finanças, datado de 15.03.2016, foi reconhecida a prescrição no tocante ao responsável subsidiário nos processos executivos n.ºs 2704200901000667, 2704201001001280, 2704201001002716 e 2704201001012436 – cfr. anexo 1 junto com a contestação à oposição.

5. Os processos executivos n.ºs 2704200501017586, 2704201501075993, 2705201501077520, 2704201501077538 e 2704201501079409 foram extintos por compensação e pagamento voluntário – cfr. anexo 2 junto com a contestação à oposição.

6. Encontram-se ainda em cobrança coerciva processos de execução fiscal m.i. no anexo 2 junto com a contestação à oposição, cuja quantia exequenda ascende a 927.526,13 €».

[…]

Com interesse para a decisão a proferir, julgam-se sumariamente provados os seguintes factos:

1. Por acórdãos proferidos nos autos n.ºs 208/09.3TBTND.C1 e 208/09.3TBTND-A.C1 o Tribunal da Relação de Coimbra julgou improcedentes as apelações e confirmou as decisões que julgaram as acções de impugnação pauliana procedentes e declararam ineficazes em relação à Administração Tributária os actos de alienação impugnados. – cfr. docs. 4 e 5 juntos com o requerimento de oposição.

2. O Requerido, ora Oponente, tem 85 anos de idade. – cfr. doc. 6 junto com o requerimento de oposição.

3. Entre Abril de 2013 e Outubro de 2015 a sociedade B…………, Lda. fez vários requerimentos no sentido de os reembolsos de IVA a que tem direito serem usados no pagamento das dívidas em execução fiscal. – cfr. docs. 7 a 17 juntos com o requerimento de oposição.

4. A penhora da pensão do Oponente foi efectuada no âmbito dos processos de execução fiscal n.ºs 270420150107993, 2704201501077520, 2704201577538 e 2704201501079409, não abrangidos pelo procedimento cautelar de arresto e entretanto extintos por pagamento voluntário. – cfr. fls. 737/740 dos autos.

Para a decisão da presente oposição tem-se ainda em consideração a factualidade dada como assente na decisão de fls. 183/198 dos autos, sob os pontos a) a y), a qual não foi infirmada pela prova agora produzida e que aqui se dá por reproduzida».

2.1.2 A factualidade referida no parágrafo antecedente (e aí dada por reproduzida) é do seguinte teor:

«a) A sociedade “B…………, Lda.” é uma sociedade por quotas, com capital social de € 2.600.000,00 distribuído pelos sócios A…………, “C…………, SGPS, SA” e “D…………, SA”, tem como objecto a produção de uvas e sua transformação em vinho e comércio de aguardentes e seus derivados, obriga-se com a intervenção de um gerente, tendo sido designado como gerente, em 2008/02/04, o sócio A………… (cf doc. 1 que consta do CD apenso aos autos, doravante, apenas, PA);

b) Contra a sociedade identificada em a) estão activos no competente Serviço de Finanças 128 processos de execução fiscal, de diversas proveniências, no montante global de € 45.452.499,86 (cf. doc. 2 do PA);

c) Em nome da executada referida em a) foram instaurados 295 processos de contencioso judicial designadamente impugnações judiciais, oposições, reclamações ao abrigo do art. 276.º do CPPT e recursos jurisdicionais (cf. doc. 3.1 do PA);

d) Foram apresentadas 148 impugnações das quais 106 já se mostram decididas; 48 oposições, das quais 30 estão decididas; 95 reclamações de actos do órgão de execução fiscal das quais 75 estão decididas (cf doc. 3.2, 3.3 e 3.4 do PA);

e) Em consulta às aplicações informáticas do Serviço de Finanças, designadamente o SIPE – Sistema de Penhoras Electrónicas – constatou-se que os activos detidos pela executada susceptíveis de penhora se traduzem em créditos detidos junto de outras entidades e outros valores e rendimentos (cf. doc. 4.1 do PA);

f) Consta do balanço relativo ao ano de 2014, constante do IES daquele ano, que a conta clientes apresenta o valor de € 6.370.473,20 (cf. doc. 4.2 do PA);

g) Nos sucessivos pedidos de dispensa de prestação de garantia a executada referida em a) invoca que grande parte daquele valor se refere a créditos incobráveis (cf. doc. 4.3 do PA);

h) Das várias tentativas de penhora de créditos efectuadas pelo SF (297 pedidos registados no SIPE), apenas 12 foram concretizadas, das quais resultaram penhoras no montante de € 282.370,33 (cf. doc. 4.4 e 4.5 do PA);

i) No decurso do ano de 2015 foram registados 35 pedidos de penhora de créditos sem que algum tenha sido concretizado (cf. doc. 4.6 do PA);

j) No que concerne a imóveis da primitiva devedora, apesar de constar no Sistema de Imposto Municipal informação sobre o prédio U-5497 da freguesia da ………, Município de Ílhavo, com o VPT de € 367.775,73, tal corresponde aos balões destinados ao armazenamento dos vinhos situados em terreno da Administração do Porto de ………, SA, os quais se equiparam a benfeitorias em terrenos alheios e que foram alvo de venda no ano de 2015 em sede do processo de execução fiscal n.º 2704201501027654 (c.f doc. 4.7 e 4.8 do PA);

k) A executada referida em a) não é proprietária de qualquer veículo (cf. doc. 4.9 do PA);

l) Os restantes bens do activo tangível da executada referida em a), assim como os inventários, tal com resulta do termo de Penhor Mercantil, foram dados em penhor à sociedade “D…………, Lda.” (cf. doc. 4.2, 4.3 e 4.10 do PA);

m) Da análise das IES da executada constata-se uma diminuição muito significativa do volume de negócios (cf. fls. 34 dos autos);

n) Em 28/12/2005 a devedora referida em a) vendeu à sociedade “E…………, SA”, os imóveis inscritos na matriz predial sob os artigos R-5365 da freguesia de ………, concelho de Tondela, os prédios U-1554, U-1555, U-1556 da freguesia de ………, concelho de Alenquer e o prédio R-19 (secção M) da freguesia de ………, concelho de Alenquer (cf. doc. 5.3 do PA);

o) Em 14/03/2006 a devedora referida em a) vendeu à sociedade referida em n) o prédio U-2179 da freguesia da ……… (cf. doc. 5.4 do PA);

p) Em 11/08/2005 vendeu à sociedade “F…………, SA”, o prédio misto inscrito na matriz predial da freguesia de ………, concelho de Vila Nova de Gaia sob os artigos U-85, R-2503 e R-3192 (cf. doc. 5.5 do PA);

q) Os administradores/gerentes da executada referida em a) são, eles próprios, administradores das sociedades adquirentes dos bens imóveis (cf. doc. 6 e 7 do PA);

r) Foram intentadas impugnações paulianas relativas aos negócios supra referidos (processos n.ºs 208/09.3TBTND, 208/09.3TBTND-A e 208/09.3TDTND-B), onde após prolação de sentença, já transitada em julgado, se apurou que as ditas “escrituras tiveram o propósito de prejudicar os credores” (cf. doc. 8 a 12 do PA);

s) Relativamente aos veículos detidos pela executada referida em a), com as matrículas ……, ……, ……, ……, ……, ……, ……, ……, ……, e ……, verificou-se a transferência dos mesmos a favor da “D…………, SA” (cf. doc. 13 do PA);

t) Encontram-se em preparação para reversão contra o A…………, os processos executivos (PEF) n.ºs 2709200901000667 relativo a dívidas de IRC no montante de € 1.282.807,03 e n.º 2704201501075993, n.º 2704201501077520, n.º 2704201501077538 e n.º 2704201501079409 todos relativos a dívidas por imposto retido na fonte (IRS e juros) a que se seguirão os restantes processos de execução fiscal (cf. f.s. 32/49 dos autos);

u) A………… exerceu o direito de audição prévia no âmbito do processo executivo n.º 2704200901000667 (cf. fls. 50/77 dos autos);

v) A………… foi administrador e é gerente da executada referida em a), e nessa qualidade subscreveu vários documentos (cf. doc. 5.1 a 5.9 do PA);

w) A………… apôs o seu número de identificação fiscal (NIF), enquanto representante da executada, mediante a assinatura electrónica, quer nas declarações Mod. 22, quer nas IES/Declarações Anuais relativas aos anos de 2012, 2013 e 2014 (cf. doc. de fls. 78/95 dos autos);

x) A………… integrou todas as sociedades do “grupo” constituído pelas seguintes sociedades:

- ………… S. A.
- B………… Lda. (Doc. 1 da Informação Proposta de Arresto)
- D………… S. A.
- ………… Lda.
- ………… S. A.
- G………… Lda.
- ………… I. S. A.
- F………… I. T. S. A. (Doc. 7 da Informação Proposta de Arresto)
- E………… I. T. S. A. (Doc. 6 da Informação Proposta de Arresto)
- ………… Lda.
- …………, SGPS, S. A.
- ………… S. A.
- ………… – SGPS S. A.
- ………… S. A.
- ………… S. A.
- ………… Lda.

quer como sócio quer como administrador (cf. doc. de fls. 96/166 dos autos);

y) A………… é gerente da sociedade “G…………, Lda.”, a qual já tem dívidas no montante de € 161.009,01, que se encontram a ser exigidas coercivamente (cf. doc. de fls. 164/168 dos autos)».


*

2.2 DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

O presente recurso vem interposto por A………… da sentença que, julgando a oposição por ele deduzida contra o arresto dos seus bens ordenado pela Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu a requerimento da Fazenda Pública, decidiu no seguinte sentido: julgar a instância parcialmente extinta por inutilidade superveniente da lide, na medida em que o arresto caducou relativamente a parte dos créditos que visava garantir, uma vez que os mesmos foram pagos, uns, ou julgados prescritos, outros; julgar a oposição improcedente na parte restante.
O arrestado interpôs recurso dessa sentença. Alega, em síntese, que o processo enferma de três nulidades: porque não foi produzida a prova testemunhal por ele oferecida, porque não foi notificado do despacho que dispensou a inquirição das testemunhas e porque não foi notificado do parecer do Ministério Público anterior à prolação da sentença.
Ademais, sustenta que a sentença incorreu em excesso de pronúncia, na medida em que não extinguiu a instância na totalidade, mas apenas parcialmente, porque entendeu, na perspectiva do Recorrente, erradamente, que o arresto se sustentava não apenas nos cinco processos executivos que foram julgados extintos, mas noutros processos. Sem prejuízo de adiante analisarmos a natureza desta invocação – como nulidade da sentença ou como erro de julgamento (O tribunal de recurso não está impedido de apreciar como erro de julgamento aquilo que é apresentado pelo recorrente como nulidade da sentença e vice-versa, já que, na sua função jurisdicional, não fica sujeito à alegação das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 5.º, n.º 3, do CPC).) – a questão suscitada pela mesma é a de saber se a Juíza deveria ou não ter julgado totalmente extinta a instância.
Daí termos fixado as questões a apreciar e decidir nos termos enunciados em 1.8.

2.2.2 DA NULIDADE POR FALTA DE PRODUÇÃO DA PROVA TESTEMUNHAL E POR FALTA DE NOTIFICAÇÃO DO DESPACHO QUE A DISPENSOU

2.2.2.1 Como este Supremo Tribunal tem vindo a dizer, a falta de produção da prova testemunhal oferecida não constitui nulidade processual (Vide, entre outros, os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 28 de Outubro de 2013, proferido no processo n.º 388/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 26 de Junho de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2013/32240.pdf), págs. 4160 a 4165, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/0e126c51f7ed08eb80257c12003aaec9;
- de 27 de Novembro de 2013, proferido no processo n.º 1159/09, publicado no Apêndice ao Diário da República de 26 de Junho de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2013/32240.pdf), págs. 4619 a 4645, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d3fa5d25ce444b4c80257c3600544933;
- de 9 de Abril de 2014, proferido no processo n.º 1869/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 20 de Novembro de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2014/32220.pdf), págs. 1489 a 1503, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/142bb0c6fcc2fe0980257cc30037d936.). Vejamos:
Nulidades processuais são desvios do formalismo processual seguido em relação ao formalismo processual prescrito na lei e a que esta faça corresponder – embora não de modo expresso – uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais (Vide MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 176.). Ora, a falta de inquirição das testemunhas não consta do rol exaustivo de nulidades insanáveis constante do art. 98.º do CPPT, nem constitui uma nulidade processual à luz do regime do art. 195.º e segs. do CPC, segundo o qual «a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa».
Ou seja, as nulidades, enquanto violações da lei processual, têm que revestir uma de três formas: (i) prática de um acto proibido; (ii) omissão de um acto prescrito na lei; (iii) realização de um acto imposto ou permitido por lei, mas sem as formalidades requeridas. Concomitantemente, têm de poder influir no exame ou na decisão da causa (Como salienta JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume II, anotação 9 d) ao art. 98.º, pág. 87, «como decorre do citado art. 201.º, n.º 1, do CPC [hoje, 195.º], na falta de norma especial que comine a sanção de nulidade para determinada irregularidade, estas só produzem nulidade quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa. Isto significa que, quando não há tal possibilidade de influência, não há nulidade, mas também que, para haver nulidade basta a mera possibilidade de influência da irregularidade na decisão da causa, não dependendo a existência de uma nulidade da demonstração de que houve efectivo prejuízo. No entanto, se se demonstrar positivamente que a irregularidade que tinha potencialidade para influenciar a decisão da causa acabou por não ter qualquer influência negativa para a parte a quem o cumprimento da formalidade ou o eliminação do acto indevidamente praticado podia interessar, a nulidade deverá considerar-se sanada, pois, nessas condições, seria cumprir essa formalidade ou eliminar o acto indevidamente praticado».).
Ora, a falta de inquirição de testemunhas não constitui nulidade porque não surge como diligência cuja realização se imponha inelutavelmente ao juiz, antes cabendo a este avaliar se a questão a dirimir no processo é meramente de direito ou, sendo também de facto, constam do processo todos os elementos pertinentes para a decisão e, nesse caso, decidir-se pelo imediato conhecimento do pedido.
Compete ao juiz aferir da necessidade ou não de produzir prova, decidindo «se deve ou não realizar diligências que forem requeridas, podendo oficiosamente realizar as diligências que entender úteis para a descoberta da verdade, em relação aos factos alegados ou de que oficiosamente possa conhecer (art. 99.º, n.º 1, da LGT)» (JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., IV volume, anotação 8 g) ao art. 278.º, págs. 312/313.).
Ou seja, a lei não prescreve que deve haver sempre lugar a produção de prova, antes conferindo ao juiz o poder de ajuizar da necessidade da sua produção; pelo que, não havendo essa imposição legal, se o juiz dispensa a produção de prova não se pode dizer que foi preterida uma formalidade legal geradora de nulidade processual.
O que não obsta a que a omissão de diligências de prova, quando existam factos controvertidos que possam relevar para a decisão da causa, possa afectar o julgamento da matéria de facto, acarretando a anulação da sentença por défice instrutório com vista a obter o devido apuramento dos factos. Por conseguinte, se a avaliação efectuada pelo juiz – que suporta a decisão de prescindir da inquirição das testemunhas arroladas – estiver inquinada de erro, por, ao contrário do que ele julgou, os elementos disponíveis nos autos não serem suficientes para permitir um cabal conhecimento das causas de pedir e do pedido formulado, esse erro inquinará o valor doutrinal da sentença que venha a ser proferida, por insuficiência da matéria de facto e/ou erro de julgamento de facto.
Regressando ao caso sub judice, a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu considerou dispensável a inquirição das testemunhas e essa dispensa, nos termos que deixámos referidos, não constitui nulidade processual.
Improcede, pois, a arguida nulidade por falta de inquirição das testemunhas arroladas na petição inicial.

2.2.2.2 Poderá, é certo e como ficou dito, questionar-se a falta de inquirição das testemunhas como erro de julgamento, na medida em que poderia a omissão dessa diligência ter impedido o ora Recorrente de fazer prova de factualidade que alegou.
É precisamente isso que alega o Recorrente, que a não inquirição da testemunha que arrolou o impediu de fazer a prova de que «não tem intenção de subtrair o património», sobre os «contornos em que […] transmitiu o património há mais de dez anos, e com fim empresarial», a sua «situação pessoal», «designadamente, o seu afastamento da actividade empresarial, decorrente das suas condições de saúde» e as suas «necessidades de subsistência básica […] e as consequências que o arresto, nos termos em que foi decretado, têm numa vida com um mínimo de dignidade» (cfr. alegações vertidas sob os n.ºs 23 a 28 e a conclusão D).
Salvo o devido respeito, o Recorrente não tem razão, sendo que o depoimento a prestar pela única testemunha por ele arrolada se mostra irrelevante para a decisão a proferir, à luz de qualquer das soluções jurídicas plausíveis (cfr. art. 511.º do anterior CPC), juízo efectuado oportunamente pela Juíza do Tribunal a quo e que também nós subscrevemos.
Desde logo, quanto à falta de intenção de subtrair o património, e sendo certo que os factos do foro psicológico juridicamente relevantes são susceptíveis de prova, há que ter em conta o seguinte: por um lado, tais factos não são directamente apuráveis, sendo que se chega a eles através das regras da experiência, do cálculo de probabilidades, da lógica ou da própria intuição humana (todos eles, métodos sindicáveis), e a partir de factos sensorialmente captáveis (sendo sobre estes que poderão ser inquiridas as testemunhas), os quais não foram alegados na petição inicial, onde o ora Recorrente se limitou a afirmar, conclusivamente, que «não tem qualquer intenção de subtrair o seu património ao pagamento de quaisquer dívidas» (cfr. art. 10.º da petição inicial); por outro lado, não pode ignorar-se que o arresto foi decretado ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 214.º do CPPT, o qual se basta com o «justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens», não tendo como requisito necessário a intenção do devedor subtrair o património.
Quanto à actuação do ora Recorrente, designadamente os «contornos em que […] transmitiu o património» das sociedades por ele administradas, o Recorrente parece ignorar ou, pelo menos, fazer tábua rasa das decisões de impugnação pauliana já transitadas em julgado, onde se deu por demonstrado que as transmissões foram efectuadas com a intenção de prejudicar os credores. Acresce que, em ordem à demonstração do “justo receio” previsto no n.º 1 do art. 214.º, a Fazenda Pública invocou, não só as referidas transmissões de património, como também se valeu da presunção do n.º 2 do mesmo artigo (Diz o art. 214.º do CPPT nos seus dois primeiros números:
«1. Havendo justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens, pode o representante da Fazenda Pública junto do competente tribunal tributário requerer arresto em bens suficientes para garantir a dívida exequenda e o acrescido, com aplicação do disposto pelo presente Código para o arresto no processo judicial tributário.
2 - As circunstâncias referidas no número anterior presumem-se no caso de dívidas por impostos que o executado tenha retido ou repercutido a terceiros e não entregue nos prazos legais».).
Já no que respeita ao «seu afastamento da actividade empresarial, decorrente das suas condições de saúde», o mesmo revela-se de todo inócuo para averiguar dos requisitos do arresto, tal como os configura o art. 214.º do CPPT.
Finalmente, quanto às suas «necessidades de subsistência básica […] e as consequências que o arresto, nos termos em que foi decretado, têm numa vida com um mínimo de dignidade», o ora Recorrente também nada alegou, pois se limitou, no art. 21.º da petição inicial, a afirmar que «ao proceder à penhora dos saldos bancários de toda e quaisquer contas bancárias do Requerido, na prática, pode impedi-lo de receber a totalidade da pensão de reforma a que tem direito (€ 1.238,37) que, o mesmo é dizer, de fazer face às despesas da sua vida corrente».
Ora, nada na decisão do arresto permite concluir que este abranja a pensão de reforma do ora Recorrente, sendo inclusive que este utiliza uma expressão («pode») que não é peremptória quanto à impossibilidade de receber a pensão. Em todo o caso, sempre poderia questionar-se a adequação da prova testemunhal para comprovar essa impossibilidade.
Em suma, a inquirição da única testemunha arrolada na petição inicial revela-se ab initio uma diligência espúria e inútil, pelo que bem andou a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, no uso dos seus poderes-deveres (O juiz tem a obrigação de seleccionar, de entre a prova oferecida a que se mostre pertinente à descoberta da verdade, obviando à produção da que o não for, tanto mais que a lei proíbe a prática de actos inúteis (cfr. art. 130.º do CPC). ), ao dispensar aquela diligência.
Não há, pois, erro de julgamento na dispensa da prova testemunhal.

2.2.2.3 O Recorrente invoca também como nulidade processual a falta de notificação do despacho que dispensou a inquirição da testemunha por ele arrolada.
Salvo o devido respeito, a falta dessa notificação também não constitui nulidade processual, na medida em que a lei não impõe tal notificação nem da omissão da mesma resulta prejuízo algum para o ora Recorrente, sendo a mesma insusceptível de influir na decisão.
Desde logo, a lei não prevê decisão alguma a dispensar a produção da prova oferecida pelas partes. O que a lei refere, no n.º 1 do art. 131.º do CPPT, é que o juiz, após verificar se pode ou não conhecer do pedido sem que haja lugar à produção da prova, caso conclua pela afirmativa, deve, após vista ao Ministério Público, de imediato proferir sentença. A lei não impõe qualquer despacho em que o juiz expresse o seu juízo sobre a possibilidade ou impossibilidade de conhecimento imediato do pedido, juízo que fica implícito na tramitação que imprimir ao processo: se ordenar a realização de qualquer diligência de prova, quer ela tenha sido requerida pelo impugnante ou pela Fazenda Pública, quer o faça oficiosamente, é porque entende que o processo ainda não reúne as condições para conhecer do pedido; se proferir sentença de imediato (após dar vista ao Ministério Público, entenda-se), é porque entende desnecessária a produção de prova.
Ora, se a lei não prescreve tal despacho, não vemos como sustentar que a omissão do mesmo consista um desvio ao formalismo processual que deveria ter sido seguido e, consequentemente, como sustentar que se verifica uma nulidade. Recorde-se que a nulidade processual consiste num desvio entre o formalismo prescrito na lei e o formalismo efectivamente seguido nos autos.
Aliás, qual seria a utilidade desse despacho? Se o juiz entende conhecer imediatamente do pedido, não vemos por que há-de proferir despacho a anunciar que o vai fazer e só depois conhecer do pedido, ao invés de fazê-lo de imediato. Tal despacho não teria utilidade alguma, nem sequer a de dar a conhecer às partes que não houve lugar à produção de prova. É que estas, logo que notificadas da sentença, facilmente se podem aperceber de que não houve fase de instrução, quer porque não foram notificadas da prática de quaisquer diligências instrutórias, quer porque não foram notificadas para alegar nos termos do art. 120.º do CPPT, quer porque na sentença não existirá qualquer referência àquelas diligências na apreciação crítica dos elementos de prova que o juiz utilizou para formar a sua convicção.
Nem se diga que as partes não podem aperceber-se através da notificação da sentença de que não houve lugar à fase da instrução, que poderia ter ocorrido à sua revelia, que poderia ter ocorrido mesmo que não tenha havido notificação nos termos do art. 120.º do CPPT e, finalmente, que poderia ter tido ocorrido sem que lhe seja feita referência alguma para fundamentar o julgamento da matéria de facto. Na verdade, se em relação a esta última circunstância, é certo que a mesma, só por si, nada revela relativamente à prática ou não de diligências instrutórias (se bem que, normalmente, o juiz deva proceder à análise crítica de toda a prova produzida), já as duas primeiras circunstâncias – ter havido lugar à instrução à revelia das partes, que não teriam sido notificadas para assistir às diligências instrutórias ou aos seus resultados, e não terem as partes sido notificadas para alegarem – são situações patológicas, que não podem erigir-se em critério de normalidade para aferir da regularidade da tramitação processual; a regra é que seja observado o formalismo processual prescrito na lei: normal é que, se existir instrução, as partes sejam notificadas para as diligências instrutórias, designadamente para a inquirição das testemunhas, e normal é também que, terminada que seja a instrução, as partes sejam notificadas para alegações.
Mas, se porventura ocorressem tantos e tão graves atropelos no processo – que, esses sim, constituiriam nulidades (Na verdade, caso houvesse lugar à realização de diligências instrutórias, designadamente à inquirição de testemunhas, a falta de notificação das partes para estarem presentes na diligência, bem como a falta de notificação para alegações, constituiriam nulidades, porque desvios ao formalismo processual prescrito na lei – cfr. arts. 118.º, n.º 3, do CPPT, do qual se infere a necessidade de notificação das partes, e 120.º do mesmo Código – e susceptíveis de influir no exame e decisão da causa.) –, nem por isso as partes ficariam desprotegidas pela ausência de despacho a dispensar a realização de diligências instrutórias e respectiva notificação.
Na verdade, essas nulidades sempre poderiam ser arguidas no recurso a interpor da sentença final, bem como deveriam ser conhecidas oficiosamente pelo tribunal ad quem.
Nem se diga que esse despacho (a anunciar o conhecimento imediato do pedido) teria como vantagem a possibilidade de as partes poderem suscitar desde logo a sua reapreciação por instância superior, mediante recurso, assim obviando à prossecução do processo e à prolação de sentença que, a verificar-se a nulidade, viriam a ser anulados por força da mesma. É que, embora admitamos que, a ser proferido despacho que dispense a produção da prova, este será passível de recurso, tal recurso sempre seria a subir com o que fosse interposto da decisão final (cfr. art. 285.º do CPPT), motivo por que nem sequer se pode invocar que a prolação desse despacho teria o mérito de, através da possibilidade do recurso do mesmo, obstar à prossecução do processo e à prática de actos que poderiam vir a ser anulados.
Note-se, finalmente e de novo, que o facto de sustentarmos a desnecessidade de despacho expresso a dispensar a inquirição das testemunhas arroladas não significa que o juízo sobre a necessidade ou não de produção de prova não esteja sujeito a controlo. Na verdade, sempre essa decisão do juiz poderá ser sindicada em sede do recurso interposto da sentença. Aí, não só as partes podem sustentar a insuficiência da matéria de facto e/ou o erro no seu julgamento, como o próprio tribunal ad quem pode e deve, se considerar que a sentença não contém os factos pertinentes à decisão da causa e que os autos não fornecem os elementos probatórios necessários à reapreciação da matéria de facto, anular a sentença oficiosamente [cfr. art. 682.º, n.º 3, do CPC, por força do art. 2.º, alínea e), do CPPT].
Assim, também a falta de notificação do despacho que dispensou a inquirição das testemunhas não constitui nulidade (Neste sentido, não encontramos jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, mas do Tribunal Central Administrativo Sul, de que são exemplo mais antigo os seguintes acórdãos:
- de 19 de Outubro de 2004, proferido no processo n.º 7203/02, disponível em
http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/fd7c059808b3d0e180256f350037a5ee;
- de 7 de Março de 2006, proferido no processo n.º 1186/03, disponível em
http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/40870d90eef78fc58025712b00442a1a;
- de 30 de Setembro de 2008, proferido no processo n.º 2330/08, disponível em
http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/f55cb59c24ede773802574d7004e9b28;
- de 7 de Outubro de 2008, proferido no processo n.º 2065/07, disponível em
http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/d7316e11396cd64a802574e100333f43.).

2.2.3 DA NULIDADE POR FALTA DE NOTIFICAÇÃO DO PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO

O Recorrente invoca também a nulidade processual decorrente do facto de lhe não ter sido notificado o parecer do Ministério Público.
É certo que o ora Recorrente não foi notificado desse parecer, como pode verificar-se pela consulta dos autos. Mas, contrariamente ao que parece supor o Recorrente, a notificação desse parecer não se impõe em todas as circunstâncias e não se impunha no caso sub judice,como procuraremos demonstrar.
A notificação só se impõe nos casos em que, no parecer, o representante do Ministério Público suscite questões que obstem ao conhecimento do mérito ou sobre as quais as partes ainda não tenham tido oportunidade de se pronunciar. Recordemos, pela sua pertinência, o que diz JORGE LOPES DE SOUSA em anotação ao art. 121.º do CPPT, exprimindo doutrina sobre a intervenção do Ministério Público no processo de impugnação judicial que, referindo-se embora à fase pré-sentencial em sede de impugnação judicial, deve também ser observada relativamente aos demais processos tributários:
«No n.º 2 do presente art. 121.º, faz-se referência à necessidade de audição do impugnante e do representante da Fazenda Pública apenas relativamente às situações em que o Ministério Público suscitar questão que obste ao conhecimento do pedido.
No entanto, se o Ministério Público arguir novos vícios do acto impugnado ou suscitar questões sobre as quais as partes ainda não tenham tido oportunidade de se pronunciar, será também obrigatória a audição das partes, em conformidade com o princípio do contraditório, enunciado no n.º 3 do art. 3.º do CPC, em que se estabelece que o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem. Será manifestamente desnecessário assegurar o princípio do contraditório quando as questões a apreciar sejam de solução evidente, não susceptíveis de séria controvérsia por quem tenha os conhecimentos jurídicos exigíveis para intervenção em processos judiciais.
Por outro lado, torna-se necessário dar oportunidade de se pronunciarem a ambas as partes, como se prevê no n.º 2 deste art. 121.º relativamente às questões de obstem ao conhecimento do pedido. Na LPTA, relativamente aos recursos contenciosos, não se impunha a audição do recorrido sobre questões prévias suscitadas pelo Ministério Público, pois, no n.º 1 do seu art. 54.º, referia-se apenas a audição do recorrente. No entanto, no contencioso tributário, por força do princípio da igualdade de faculdades e meios de defesa (art. 98.º da LGT), não é admissível conceder faculdades processuais apenas a uma das partes.
Não será necessária, porém, a audição das partes sobre questões relativamente às quais elas já se tenham pronunciado. Designadamente, a necessidade de tal audição, que não é imposta neste art. 121.º, também não decorre do preceituado no n.º 3 do art. 3.º do CPC, que apenas proíbe que sejam decididas questões sem que as partes tenham tido a possibilidade de se pronunciarem.
A omissão de audição das partes, quando é obrigatória, constitui nulidade processual, enquadrável no art. 201.º, n.º 1, do CPC, com o regime de arguição previsto no art. 205.º do mesmo Código» (Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume II, anotação 5 ao art. 121.º, págs. 300/301.).
No caso sub judice, como resulta da leitura do referido parecer (de fls. 745 a 748), o Representante do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu não suscitou questão alguma obstativa do conhecimento do recurso, antes se tendo limitado a emitir a sua posição no sentido da improcedência da oposição.
Note-se que aí também não foi invocada causa obstativa do conhecimento do mérito.
Por outro lado, naquele parecer também não foi suscitada qualquer questão nova.
O que significa que não havia que notificar o parecer do Ministério Público ao ora Recorrente, como tem vindo a decidir este Supremo Tribunal Administrativo (Neste sentido, vide os seguintes acórdãos desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 27 de Fevereiro de 2013, proferido no processo n.º 1197/12, publicado no Apêndice ao Diário da República de 11 de Março de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2013/32210.pdf), págs. págs. 1000 a 1003;
- de 30 de Outubro de 2013, proferido no processo n.º 1492/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 26 de Junho de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2013/32240.pdf), págs. 4354 a 4359, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/729f21495abeae2c80257c1a005a5f34;
- de 9 de Abril de 2014, proferido no processo n.º 1869/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 20 de Novembro de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2014/32220.pdf), págs. 1489 a 1503, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/142bb0c6fcc2fe0980257cc30037d936.). A falta dessa notificação não contende, de modo algum, com o princípio do contraditório, que em nada saiu beliscado.
Assim, porque não se impunha a notificação do parecer do Ministério Público aos Reclamantes, a omissão desse acto não constitui nulidade [cf. art. 195.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT].
Improcede, pois, a arguida nulidade por violação do princípio do contraditório por falta de notificação ao Recorrente do parecer emitido pelo Representante do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu.

2.2.4 DA EXTINÇÃO TOTAL DA INSTÂNCIA POR INUTILIDADE SUPERVENIENTE

O Recorrente invocou a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, na medida em que nesta não foi declarada a extinção total da instância, mas apenas parcial. Argumenta o Recorrente que a sentença entendeu, erradamente, que o arresto se sustentava não apenas nos cinco processos executivos que foram julgados extintos, mas noutros processos. Sem prejuízo de adiante analisarmos a natureza desta invocação – como nulidade da sentença ou como erro de julgamento (O tribunal de recurso não está impedido de apreciar como erro de julgamento aquilo que é apresentado pelo recorrente como nulidade da sentença e vice-versa, já que, na sua função jurisdicional, não fica sujeito à alegação das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 5.º, n.º 3, do CPC).) – a questão suscitada pela mesma é a de saber se a Juíza deveria ou não ter julgado totalmente extinta a instância.
O excesso de pronúncia, como decorre da parte final do n.º 1 do art. 125.º do CPPT, preceito legal que prevê as nulidades da sentença, consiste na «pronúncia [pelo juiz] sobre questões que não deva conhecer».
O preceito está em consonância com o art. 615.º, n.º 1, do CPC, cuja alínea d) prevê como uma das nulidades da sentença que «[o] juiz […] conheça de questões de que não podia tomar conhecimento». Trata-se de uma norma correlacionada com o n.º 2 do art. 608.º do mesmo código, que dispõe: «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras». Note-se que, na falta de norma do CPPT sobre os deveres de cognição do tribunal, há que recorrer àquele art. 608.º, n.º 2, do CPC, ex vi do disposto no art. 2.º, alínea e), do CPPT.
Se bem interpretamos as alegações de recurso e respectivas conclusões, o Recorrente entende que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu deveria ter julgado a instância totalmente extinta por inutilidade superveniente e não, como julgou, apenas em parte. Isto porque entende que o arresto se suportou apenas em cinco processos executivos, os quais foram entretanto julgados extintos, motivo por que deveria julgar-se totalmente extinta a instância por inutilidade superveniente. Mais sustenta que ao considerar outros processos executivos, que defende não terem sido referidos na decisão que decretou o arresto, a sentença se pronunciou sobre questão de que não podia tomar conhecimento, pelo que incorreu em nulidade por excesso de pronúncia.
Da própria alegação do Recorrente resulta manifesto que o vício assacado à sentença não é meramente formal – como o seria no caso de o juiz ter conhecido de questão cujo conhecimento lhe estava vedado –, mas antes um verdadeiro erro de julgamento. Na verdade, dificilmente poderá sustentar-se a ocorrência de excesso de pronúncia relativamente ao juízo sobre a utilidade da lide, pois o conhecimento desta, como causa de extinção da instância [cfr. art. 277.º, alínea e), do CPC], se impõe oficiosamente ao juiz, a quem incumbe obstar à prossecução de uma lide de que, em virtude de facto ulterior à sua instauração, não possa resultar efeito útil algum.
Como adiantámos, não será esse erro de qualificação a inviabilizar o conhecimento da questão pelo tribunal ad quem. Na verdade, o tribunal de recurso jurisdicional não está impedido de apreciar como erro de julgamento aquilo que é apresentado pelo recorrente como nulidade da sentença e vice-versa, já que, na sua função jurisdicional, como resulta do n.º 3 do art. 5.º do CPC, não fica sujeito à alegação das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. e vol. cit., anotação 20 ao art. 125.º, pág. 375, com indicação de jurisprudência. Vide também, entre muitos outros, os seguintes acórdãos desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 19 de Setembro de 2012, proferido no processo n.º 862/12, publicado no Apêndice ao Diário da República de 17 de Outubro de 2013 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2012/32230.pdf), págs. 2665 a 2669, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/e46947495061fff580257a85005669e9;
- de 7 de Novembro de 2012, proferido no processo n.º 1109/12, publicado no Apêndice ao Diário da República de 8 de Novembro de 2013 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2012/32240.pdf), págs. 3406 a 3412, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8673ffdcf026532480257abb003306da;
- 27 de Janeiro de 2016, proferido no processo n.º 43/16, ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/605684522d35f1b680257f4c005084c2.).
Vejamos, pois, se a Juíza fez errado julgamento ao considerar que se mantinham em parte as situações de facto que justificaram que fosse decretado o arresto dos bens do ora Recorrente. Dito de outro modo, vejamos se o arresto foi decretado apenas com referência às dívidas a que respeitam os cinco processos executivos, como sustenta o Recorrente, ou se o foi também relativamente a outras dívidas, como sustenta a sentença ora recorrida.
Ou seja, tudo passa pela interpretação da sentença proferida nestes autos e que decretou o arresto.
Vista essa sentença, resulta inquestionável: que o Representante da Fazenda Pública, alegando que estão em cobrança, no Serviço de Finanças de Tondela, dívidas do valor global de € 45.452.449,66, correspondentes a 128 processos executivos insaturados contra a sociedade denominada “B…………, Lda.”, requereu o arresto com referência a dívidas do montante global de € 3.564.773,05, as únicas que considerou reunirem as condições que lhe permitiam requerer aquela providência cautelar; que o pedido foi totalmente deferido.
Ou seja, é seguro que o arresto não foi proferido apenas tendo em conta as dívidas em cobrança nas 5 execuções fiscais referidas pelo Recorrente, mas também em dívidas em cobrança em muitas outras execuções, mais concretamente nas 23 identificadas no art. 8.º da petição inicial da providência cautelar requerida pela Fazenda Pública.
É certo que na sentença não se identificaram um por um os 23 processos que justificaram o requerimento e deferimento da providência, mas da leitura da mesma resulta inequívoco que eles não são apenas os 5 processos que ulteriormente foram julgados extintos. Na verdade, a providência foi requerida e concedida relativamente a créditos do montante global de € 3.564.773,05 – o que o ora Recorrente não podia ignorar – e, apesar da extinção daqueles 5 processos, o valor global dos créditos que permanecem por pagar é de € 927.526,13.
É certo também que apenas alguns dos processos executivos estavam em fase de preparação da reversão. Mas, para que seja decretado o arresto ao abrigo do art. 214.º do CPPT não é necessário que esteja já em preparação a reversão, bastando que os créditos estejam em cobrança executiva. Se o arresto for requerido contra o responsável subsidiário, terá ainda a Fazenda Pública que fazer prova das condições para o chamamento à execução fiscal por via da reversão.
Salvo o devido respeito, o Recorrente parece incorrer em confusão entre os requisitos do arresto ao abrigo do art. 136.º do CPPT – onde se exige que os tributos estejam liquidados ou em fase de liquidação – com os requisitos do arresto ao abrigo do art. 214.º do CPPT, onde as dívidas devem estar já em fase de execução fiscal.
Ou seja, a interpretação da sentença não permite razoavelmente outra conclusão senão a de que o arresto foi requerido e concedido para garantia do pagamento dos créditos em cobrança coerciva do montante de € 3.452.449,86. É essa a interpretação que fazemos da sentença que decretou o arresto à luz das regras hermenêuticas que devem presidir a essa tarefa. Como este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar, também a sentença constitui um acto jurídico a que se aplicam, ex vi do art. 295.º do Código Civil (CC), as regras e os princípios gerais de interpretação da declaração negocial, maxime a regra prevista no art. 236.º, n.º 1.º, daquele Código, de que a declaração deve interpretar-se com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do seu contexto, tendo em conta não só a parte decisória como toda a sua fundamentação (Neste sentido, entre outros, os seguintes acórdãos desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 24 de Fevereiro de 2011, proferido no processo n.º 1053/10, publicado no Apêndice ao Diário da República de 11 de Agosto de 2011 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2011/32210.pdf), págs. 308 a 312, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/f730a5f7bcf14c3c8025784800549ad6;
- de 24 de Agosto de 2011, proferido no processo com o n.º 446/11, publicado no Apêndice ao Diário da República de 22 de Março de 2012 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2011/32230.pdf), págs. 1370 a 1378, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/74819ee643a485c3802578fc00332f94;
- de 23 de Fevereiro de 2012, proferido no processo n.º 1153/11, publicado no Apêndice ao Diário da República de 18 de Abril de 2013 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2012/32210.pdf), págs. 503 a 508, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/e6650fe4e5f8cf99802579bf003aa1f1.).
O recurso também não pode ser provido com fundamento no erro de julgamento quanto à inutilidade superveniente da lide.

2.2.5 CONCLUSÕES

Na improcedência de todos os fundamentos do recurso e preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - A falta de inquirição das testemunhas arroladas no processo judicial tributário, porque não está prevista como nulidade processual nem constitui uma nulidade processual à luz do art. 195.º e segs. do CPC, na medida em que a lei não prescreve que deva ter sempre lugar a produção de prova, antes conferindo ao juiz o poder de ajuizar da necessidade da sua produção, não permite que, se o juiz dispensar a produção de prova se possa dizer que foi preterida uma formalidade legal, sem prejuízo de a omissão de diligências de prova, na medida em que possa afectar o julgamento da matéria de facto, poder acarretar a anulação da sentença por défice instrutório.
II - A falta de notificação do despacho que dispensar a inquirição das testemunhas, na medida em que a prolação de tal despacho também não está prescrita na lei (dela não poderá resultar prejuízo algum para a parte) e é insusceptível de influir na decisão, não constitui nulidade processual.
III - A notificação do parecer do Ministério Público prévio à sentença a proferir em processo tributário só se impõe, sob pena de violação do princípio do contraditório, nos casos em que aí sejam suscitadas questões que obstem ao conhecimento do mérito ou sobre as quais as partes ainda não tenham tido oportunidade de se pronunciar.
IV - O excesso de pronúncia é um vício formal das decisões judiciais resultante do conhecimento pelo tribunal de questão que, não sendo do conhecimento oficioso, não lhe tenha sido colocada pelas partes (cfr. art. 125.º, n.º 1, do CPPT e art. 660.º, n.º 2, do CPC), pelo que o mesmo não pode verificar-se relativamente à questão da inutilidade superveniente da lide, que, enquanto causa de extinção da instância [cfr. art. 277.º, alínea e), do CPC], é do conhecimento oficioso.
V - A sentença constitui um acto jurídico a que se aplicam, ex vi do art. 295.º do CC, as regras e os princípios gerais de interpretação da declaração negocial, maxime a regra prevista no art. 236.º, n.º 1º, daquele código, de que a declaração deve interpretar-se com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do seu contexto, tendo em conta não só a parte decisória como toda a sua fundamentação.


* * *

3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente.


*

Lisboa, 14 de Setembro de 2016. – Francisco Rothes (relator) – Aragão SeiaCasimiro Gonçalves.