Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 4.ª SECÇÃO | ||
Relator: | PAULA SÁ FERNANDES | ||
Descritores: | UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA CONTRAORDENAÇÃO IMPUGNAÇÃO JUDICIAL PRAZO | ||
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Data do Acordão: | 03/10/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Referência de Publicação: | - DRE N.º 73/2022, I.ª SÉRIE DE 13-04-2022, P. 3-14 (ACÓRDÃO N.º 3/2022); - BTE N.º 14, VOLUME 89 DE 15-04-2022 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA (CÍVEL) | ||
Decisão: | REVOGADO O ACÓRDÃO RECORRIDO, FIXANDO-SE A UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA NO SEGUINTE SENTIDO: "É APLICÁVEL À IMPUGNAÇÃO JUDICIAL DA DECISÃO DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA PROFERIDA EM SEDE DE PROCEDIMENTO DE CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL, PREVISTA NO ARTIGO 33.º DA LEI N.º 107/09, DE 14-09, O DISPOSTO NOS ARTIGOS 107.º, N.º 5, 107.º-A DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E 139.º, N.º 5 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, POR REMISSÃO DOS ARTIGOS 6.º, N.º 1 DA LEI N.º 107/09, DE 14-09 E 104.º, N.º 1 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL." | ||
Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO. | ||
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Sumário : | É aplicável à impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa proferida em sede de procedimento de contra-ordenação laboral, prevista no artigo 33.º da Lei n.º 107/09 de 14 de setembro, o disposto nos artigos 107.º, n.º 5, 107.º-A do Código de Processo Penal e 139.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, por remissão dos artigos 6.º, n.º 1 da Lei n.º 107/09, de 14 de setembro e 104.º, n.º 1 do Código de Processo Penal. | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 249/19.2T8CVL.C1-A. S1 Recurso de Uniformização de Jurisprudência
Uniformização de Jurisprudência Supremo Tribunal de Justiça Secção Social
I. Relatório
A Autoridade para as Condições do Trabalho, Unidade Local ..., condenou o Lar Residencial ... como autora de oitenta e seis contraordenações leves negligentes, previstas e punidas no artigo 521.º, n.º 2 do Código do Trabalho de 2009, na coima única de € 35.088,00; e AA, legal representante da arguida, no pagamento da mesma coima, na qualidade de responsável solidário.
A arguida, Lar Residencial ..., foi notificada da decisão condenatória da autoridade administrativa em 4.01.2019. E AA foi notificado no mesmo dia, por via postal registado com AR. Em 31.01.2019, o Lar Residencial ... e AA impugnaram judicialmente a referida decisão.
O Tribunal da 1.ª Instância proferiu decisão julgando extemporânea a impugnação judicial, com fundamento na inaplicabilidade do disposto nos artigos 107.º-A do Código de Processo Penal e 139.º, n.º 5 do Código de Processo Civil.
O Lar Residencial ... e AA, inconformados, interpuseram recurso para o Tribunal da Relação …. Por acórdão de 11.10.2019, o Tribunal da Relação … julgou improcedente o recurso e confirmou a decisão recorrida, com uma declaração de vencimento.
Novamente inconformados, o Lar Residencial ... e AA interpõem recurso de uniformização de jurisprudência, tendo elaborado as seguintes conclusões: 1.ª - A questão deste caso concreto tem como regime legal especial a Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, Regime Processual aplicável às Contraordenações Laborais e de Segurança Social (RPCOLSS); 2.ª- Estabelece o art.6.º, do RPCOLSS, sob a epígrafe, Contagem de Prazos, que: 1. À contagem dos prazos para a prática dos atos processuais previstos na presente lei são aplicáveis as disposições constantes da lei de processo penal. 2. A contagem referida no número anterior não se suspende durante as férias judiciais”. 3.ª- Estatuindo o art.60.º, do RPCOLSS que “são aplicáveis, (…) os preceitos reguladores do processo de contraordenação previstos no regime geral das contraordenações.” 4.ª- O art.º 41, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro que instituiu o Ilícito de Mera Ordenação Social, refere que “Sempre que o contrário não resulte deste diploma, são aplicáveis, devidamente adaptados, os preceitos reguladores do processo criminal.” 5.ª- Deste modo, seja por recurso ao art.6.º, n.º 2 ou pelo art.60.º, o resultado seria necessariamente o mesmo, utilização das normas processuais do Código de Processo Penal; 6.ª - Por outro lado, foram fixados os dias 08/01/2019 e 27/01/2019 como o primeiro e o último dia, dos 20 dias úteis, para impugnação da decisão administrativa, tendo aquelas datas por referência, a contagem do prazo a partir da notificação do co-arguido AA; 7ª - O prazo de apresentação da impugnação judicial daquele co-arguido terminou em data posterior à do co-arguido Lar …. O Tribunal, corretamente, considerou como último dia do prazo, aquele que correu em último lugar, beneficiando o co-arguido Lar … desse facto, 8ª - Ao abrigo do disposto no art.113º, n.º 14, CPP; 9ª - Por último, ao pretender afastar a aplicação do Código de Processo Penal, por forma a fundamentar a não aplicação dos respetivos arts. 107.º, n.º 5 e 107.º-A, a M.ª Juiz a quo acaba por dele fazer uso, no que ao disposto no art.133.º, n.º 14 diz respeito; 10ª - O argumento que o RPCOLSS não contém uma norma idêntica à dos arts. 107.º, n.º 5 in fine e 107.º-A, do CPP, é, salvo o devido respeito, totalmente falacioso. Porque é exatamente da constatação da omissão de normas que o legislador do RPCOLSS identificou o direito subsidiário que deverá ser aplicado nesses casos. Se norma existisse, o direito subsidiário seria inútil; 11ª – A Lei n.º 107/2009 não contém norma especial expressa sobre a contagem dos prazos, 12ª – Pois que, tanto pelo art.6.º ou através do art.60.º, terá de ser feito uso das normas do Código de Processo Penal, 13ª – Sendo por demais evidente concluir que todo o regime processual do Código de Processo Penal deve ser aplicado, nomeadamente o art.º.107 -A e, subsidiariamente as normas do Código de Processo Civil, quanto à prática dos atos nos três dias úteis posteriores ao fim do prazo, mediante o pagamento de multa; 14ª - Forçoso é concluir que, a impugnação judicial foi apresentada tempestivamente, no 3.º dia útil subsequente ao termo do prazo por legítima aplicação do art.107.º, n.º 5, in fine e 107.º-A, al. c), do CPP, mediante o pagamento da correspondente multa devida, 15ª - Mal andou, pois, e salvo melhor opinião, o Tribunal recorrido ao não aplicar, no caso dos autos, os normativos dos citados arts. 107.º, n.º 5 in fine, 107.º-A, do CPP e arts. 139.º, n.º 5 e 6 e 145.º, n.º 5 e 6, CPC e ao denegar aos Recorrentes a apreciação da impugnação judicial interposta, 22ª - Desse modo, violando, os preceitos do RGCO.
O Tribunal da Relação … admitiu o recurso por despacho de 13.12.2019.
O recurso foi distribuído à 3.ª secção (criminal) do Supremo Tribunal de Justiça como recurso extraordinário de uniformização de justiça.
Neste Tribunal, por acórdão de 26.02.2020, foi declarada a incompetência material do Pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça para o julgamento do presente Recurso Extraordinário de Fixação de Jurisprudência e deferida a competência ao Pleno da Secção Social.
Na Secção Social, deste Tribunal, por acórdão de 24.03.2021, foi admitido o recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, face aos requisitos impostos pelos artigos 437.º e 438.º do Código de Processo Penal. (cf. fls.81 a 88 e 120).
Os Recorrentes apresentaram alegações, reproduzindo no essencial as apresentadas aquando da interposição do recurso, concluindo: Deste modo, deverá ser determinada a fixação de jurisprudência no sentido do acórdão-fundamento, isto é, que ao Regime Processual aplicável às Contraordenações Laborais e de Segurança Social é aplicável o regime processual do Código de Processo Penal, nomeadamente que a impugnação judicial pode ser apresentada nos três dias úteis posteriores ao término do prazo, mediante o pagamento da multa correspondente, fazendo-se uso legítimo do art.107.º-A, do CPP e do art.139.º, n.ºs 5 e 6 e 145.º, n.º 5 e 6, através da remissão legal imposta ou pelo art.6.º ou pelo art.60.º, do RPCOLSS”.
O Exmo. Procurador‑geral Adjunto emitiu parecer, no sentido de ser negada revista, cf. fls.123 e sgts, confirmado o acórdão recorrido e fixada jurisprudência no sentido de que a remissão feita pelo artigo 6.º da Lei n.º 107/09 para os artigos 107.º, n.º 5, 107.º-A, do Código de Processo Penal e artigo 139.º, n.º 5 do Código de Processo Civil é uma remissão específica, devendo a sua interpretação ser no sentido dado pelo aresto recorrido.
Foram colhidos os vistos legais.
II. Fundamentação
A questão suscitada é sobre a aplicação à impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa, proferida em sede de procedimento de contra-ordenação laboral (Lei n.º 107/09, de 14 de setembro), do disposto nos artigos 107.º n.º 5, 107.º- A do Código de Processo Penal e 139.º n.º 5 do Código de Processo Civil.
a) Vejamos os entendimentos em causa
Acórdão Recorrido Factos assentes 1. A Autoridade para as Condições do Trabalho, Unidade Local ..., condenou o Lar Residencial ..., na coima única de € 35.088, como autora de 86 contraordenações leves negligentes previstas e punidas no artigo 521.º, n.º 2 do Código do Trabalho de 2009. 2. O legal representante da arguida foi condenado no pagamento da mesma coima na qualidade de correspondente responsável solidário (artigo 551.º, alínea 3 do Código do Trabalho de 2009). 3. A arguida foi notificada da decisão condenatória da autoridade administrativa em 4.01.2019. 4. O legal representante da arguida foi notificado dessa decisão nesse mesmo dia 4.01.2019, por via postal registada com AR, tendo este sido assinado por pessoa diversa do referido legal representante, 5. A arguida e o seu legal representante interpuseram recurso daquela decisão no dia 31.01.2019. Face aos factos assentes e conjugando-os com o disposto nos artigos 6.º, n.º 2, 8.º, n.º 3 e 33.º, n.º 2 da Lei n.º 107/09, de 14 de setembro, o prazo para interposição do recurso da decisão da autoridade administrativa terminou no dia 27.01.2019[1]. O recurso foi interposto no terceiro dia útil após o términus do prazo. Fundamentos do acórdão recorrido O acórdão recorrido considerou que a impugnação judicial da decisão que aplicou a coima não pode ser apresentada nos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, mediante o pagamento de multa com os seguintes fundamentos:
Acórdão Fundamento
O direito de mera ordenação social foi introduzido no sistema jurídico português com o Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de julho, com o objetivo de dotar o ordenamento jurídico de um regime sancionatório alternativo e diferente do direito criminal que desse resposta às necessidades decorrentes da crescente intervenção do Estado. Conforme consta do preâmbulo do Decreto-Lei n.º433/82, de 27 de outubro (RGCO), que viria a substituir aquele primeiro diploma, “o aparecimento do direito das contraordenações ficou a dever-se ao pendor crescentemente intervencionista do Estado contemporâneo, que vem progressivamente alargando a sua ação conformadora aos domínios da economia, saúde, educação, cultura, equilíbrios ecológicos. (…) A necessidade de dar consistência prática às injunções normativas decorrentes deste novo e crescente intervencionismo do Estado, convertendo-as em regras efetivas de conduta, postula naturalmente o recurso a um quadro específico de sanções”. As especificidades do direito laboral levaram a que, em 26 de novembro de 1985, fosse publicado o Decreto-Lei n.º 491/85 relativo às contraordenações no âmbito do Direito Laboral e da Disciplina Jurídica sobre Higiene, Segurança, Medicina do Trabalho, Acidente de Trabalho e Doenças Profissionais.
1. Lei n.º107/2009, de 14 de setembro - Regime Processual Aplicável às Contra-ordenações Laborais e de Segurança Social. Capítulo II - Atos processuais na fase administrativa Artigo 6.º - Contagem dos prazos 1 - À contagem dos prazos para a prática de actos processuais previstos na presente lei são aplicáveis as disposições constantes da lei do processo penal. 2 - A contagem referida no número anterior não se suspende durante as férias judiciais. Capítulo IV - Tramitação processual Secção II - Fase judicial Artigo 33.º- Forma e prazo 1 - A impugnação judicial é dirigida ao tribunal de trabalho competente e deve conter alegações, conclusões e indicação dos meios de prova a produzir. 2 - A impugnação judicial é apresentada na autoridade administrativa que tenha proferido a decisão de aplicação da coima, no prazo de 20 dias após a sua notificação. Artigo 36.º - Envio dos autos ao Ministério Público 1 - Recebida a impugnação judicial e, sendo caso disso, efetuado o depósito referido no artigo anterior, a autoridade administrativa competente envia os autos ao Ministério Público no prazo de 10 dias, podendo, caso o entenda, apresentar alegações. 2 - Até ao envio dos autos, pode a autoridade administrativa competente revogar, total ou parcialmente, a decisão de aplicação da coima ou sanção acessória. Artigo 37.º - Apresentação dos autos ao juiz O Ministério Público torna sempre presentes os autos ao juiz, com indicação dos respetivos elementos de prova, valendo este ato como acusação. Capítulo VI - Disposições finais Artigo 60.º - Direito subsidiário Sempre que o contrário não resulte da presente lei, são aplicáveis, com as devidas adaptações, os preceitos reguladores do processo de contraordenação previstos no regime geral das contraordenações.
2. Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro – Regime Geral das Contraordenações II Parte - Do processo de contra-ordenação Capítulo II - Princípios e disposições gerais Artigo 41.º - Direito subsidiário 1 - Sempre que o contrário não resulte deste diploma, são aplicáveis, devidamente adaptados, os preceitos reguladores do processo criminal. 2 - No processo de aplicação da coima e das sanções acessórias, as autoridades administrativas gozam dos mesmos direitos e estão submetidas aos mesmos deveres das entidades competentes para o processo criminal, sempre que o contrário não resulte do presente diploma. Capítulo IV - Recurso e processo judiciais Artigo 59.º - Forma e prazo 1 - A decisão da autoridade administrativa que aplica uma coima é susceptível de impugnação judicial. 2 - O recurso de impugnação poderá ser interposto pelo arguido ou pelo seu defensor. 3 - O recurso é feito por escrito e apresentado à autoridade administrativa que aplicou a coima, no prazo de 20 dias após o seu conhecimento pelo arguido, devendo constar de alegações e conclusões. Artigo 60.º - Contagem do prazo para impugnação 1 - O prazo para a impugnação da decisão da autoridade administrativa suspende-se aos sábados, domingos e feriados. 2 - O termo do prazo que caia em dia durante o qual não for possível, durante o período normal, a apresentação do recurso, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte.
3. Código de Processo Penal Livro II - Dos actos processuais Título III - Do tempo dos actos e da aceleração do processo Artigo 104.º - Contagem dos prazos de actos processuais 1 - Aplicam-se à contagem dos prazos para a prática de actos processuais as disposições da lei do processo civil. 2 - Correm em férias os prazos relativos a processos nos quais devam praticar-se os actos referidos nas alíneas a) a e) do n.º 2 do artigo anterior. Artigo 107.º - Renúncia ao decurso e prática de acto fora do prazo 1 - A pessoa em benefício da qual um prazo for estabelecido pode renunciar ao seu decurso, mediante requerimento endereçado à autoridade judiciária que dirigir a fase do processo a que o acto respeitar, a qual o despacha em vinte e quatro horas. 2 - Os actos processuais só podem ser praticados fora dos prazos estabelecidos por lei, por despacho da autoridade referida no número anterior, a requerimento do interessado e ouvidos os outros sujeitos processuais a quem o caso respeitar, desde que se prove justo impedimento. 3 - O requerimento referido no número anterior é apresentado no prazo de três dias, contado do termo do prazo legalmente fixado ou da cessação do impedimento. 4 - A autoridade que defira a prática de acto fora do prazo procede, na medida do possível, à renovação dos actos aos quais o interessado teria o direito de assistir. 5 - Independentemente do justo impedimento, pode o acto ser praticado no prazo, nos termos e com as mesmas consequências que em processo civil, com as necessárias adaptações. 6 - Quando o procedimento se revelar de excecional complexidade, nos termos da parte final do n.º 3 do artigo 215.º, o juiz, a requerimento do Ministério Público, do assistente, do arguido ou das partes civis, pode prorrogar os prazos previstos nos artigos 78.º, 287.º e 315.º e nos n.ºs 1 e 3 do artigo 411.º, até ao limite máximo de 30 dias. Artigo 107.º-A - Sanção pela prática extemporânea de actos processuais Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, à prática extemporânea de actos processuais penais aplica-se o disposto nos n.ºs 5 a 7 do artigo 145.º do Código de Processo Civil, com as seguintes alterações: a) Se o acto for praticado no 1.º dia, a multa é equivalente a 0,5 UC; b) Se o acto for praticado no 2.º dia, a multa é equivalente a 1 UC; c) Se o acto for praticado no 3.º dia, a multa é equivalente a 2 UC.
4. Código de Processo Civil Artigo 139.º - Modalidades do prazo (artigo 145.º do anterior Código de Processo Civil) 1 - O prazo é dilatório ou perentório. 2 - O prazo dilatório difere para certo momento a possibilidade de realização de um ato ou o início da contagem de um outro prazo. 3 - O decurso do prazo perentório extingue o direito de praticar o ato. 4 - O ato pode, porém, ser praticado fora do prazo em caso de justo impedimento, nos termos regulados no artigo seguinte. 5 - Independentemente de justo impedimento, pode o ato ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediato de uma multa, fixada nos seguintes termos: a) Se o ato for praticado no 1.º dia, a multa é fixada em 10 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 1/2 UC; b) Se o ato for praticado no 2.º dia, a multa é fixada em 25 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 3 UC; c) Se o ato for praticado no 3.º dia, a multa é fixada em 40 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 7 UC. 6 - Praticado o ato em qualquer dos três dias úteis seguintes sem ter sido paga imediatamente a multa devida, logo que a falta seja verificada, a secretaria, independentemente de despacho, notifica o interessado para pagar a multa, acrescida de uma penalização de 25 % do valor da multa, desde que se trate de ato praticado por mandatário. 7 - Se o ato for praticado diretamente pela parte, em ação que não importe a constituição de mandatário, o pagamento da multa só é devido após notificação efetuada pela secretaria, na qual se prevê um prazo de 10 dias para o referido pagamento. 8 - O juiz pode excecionalmente determinar a redução ou dispensa da multa nos casos de manifesta carência económica ou quando o respetivo montante se revele manifestamente desproporcionado, designadamente nas ações que não importem a constituição de mandatário e o ato tenha sido praticado diretamente pela parte. - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 05.12.2011 proferido no processo n.º 228/11.8TTBGC.P1: https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:TRP:2011:228.11.8TTBGC.P1.89 - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 07.12.2018 proferido no processo n.º 3223/18.2T8MTS.P1: - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 13.02 2017 proferido no processo n.º 2416/15.9T8VFR.P1: - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 16.01.2012 proferido no processo n.º 229/11.6TTBGC.P1: e) Na Doutrina . Paulo Pinto Albuquerque in Comentário do Regime Geral das Contraordenações à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Anotação ao artigo 59.º (página 247 e 248): Ao invés, no regime especial das contraordenações laborais e da segurança social, o artigo 6.º, nº1 da Lei nº 107/2009, de 14.9 determina a aplicabilidade das regras do CPP, ou seja, a regra da continuidade da contagem dos prazos, não se suspendendo aos sábados, domingos e feriados (com razão, nota SOARES RIBEIRO 2011: 67, que esta disposição não afasta a natureza administrativa da fase de impugnação judicial). (…) Uma terceira consequência é a da aplicabilidade do artigo 145.º, nº 5 do CPC por força dos artigos 104.º, nº1 e 107.º, nº 5 do CPP (concorda, SOARES RIBEIRO, 2011: 70). Mas o prazo para interposição do recurso da decisão administrativa não se suspende em férias judiciais nos termos do artigo 6.º, n.º 2. . João Soares Ribeiro – Contraordenações Laborais, Regime Jurídico, Almedina, 3.ª Edição, 2011. Anotação ao artigo 6.º (página 22): 3 - Era entendimento unânime o de que, porque se não tinham os prazos do regime processual da fase administrativa das CO como prazos judiciais, não lhes eram aplicáveis as regras no justo impedimento ou aquela que permite que o acto possa ser praticado nos três dias seguintes ao termo do prazo mediante o pagamento de multa (art.145.º/5 do CPC). Embora se continue a entender que na fase administrativa os prazos não são judiciais, a verdade é a que a remissão feita no n.º1 para “as disposições constantes da lei do processo penal”, ou seja, designadamente, arts 104.º/1 e 107.º/5 do CPP, postulam agora outra interpretação”. Anotação ao artigo 33.º (página 70): 2 - A regra da apresentação da impugnação no prazo de 20 dias mantém-se do regime anterior. Todavia, agora face à nova regra de contagem do prazo (contínuo) há, de facto, um encurtamento desse período de tempo. Era até hoje indubitável o entendimento de que se não aplicavam aqui as regras do art.145.º/5 do CPC, ex. vi art.104.º/1 e 107.º/5 do CPP, ou seja, que não podia ser praticado o acto nos três dias após o termo do prazo mediante o pagamento de uma multa. Face a redação do art.6.º a dúvida é agora, pelo menos, legítima e, no nosso modo de ver, a sua aplicação defensável”. . Paula Leal de Carvalho, Prontuário de Direito do Trabalho Janeiro/Abril Maio/Agosto 2012, nºs 91 e 92, Contraordenações laborais - Questões Práticas (página 167): 1. Quanto à contagem dos prazos Relativamente à norma de contagem de prazos constante do art. 6.º da Lei 107/2009 têm sido suscitadas algumas questões, havendo já alguma jurisprudência dos Tribunais da Relação e sobre ela se pronunciando João Soares Ribeiro, in Contraordenações Laborais, Regime Jurídico, 2011, 3.ª Edição, em anotação a esse preceito. Do Capítulo II, sob a epígrafe: Actos processuais na fase administrativa, consta o art.º 6 que dispõe: 1. À contagem dos prazos para a prática de actos processuais previstos na presente lei são aplicáveis as disposições constantes da lei do processo penal. 2. A contagem referida no número anterior não se suspende durante as férias judiciais. A Lei 107/2009 afastou-se do regime constante do DL 433/82, o qual, no seu art. 60.º do DL433/82 (após várias divergências jurisprudenciais, que ora não importa analisar) dispõe, no seu n.º 1, que "O prazo para a impugnação da decisão da autoridade administrativa suspende-se aos sábados, domingos e feriados". Relativamente à fase administrativa, no âmbito do citado DL 433/82, entendia-se que a esta, por não ter natureza judicial, mas sim administrativa, eram aplicáveis as regras próprias — administrativas — de contagem de prazos. A 1.ª conclusão a retirar da alteração feita pela Lei 107/2009 é que o art. 6.º, inserido no Capítulo II relativo à fase administrativa, é aplicável a esta fase, donde decorre, face ao seu n.º 1, que à contagem dos prazos se aplicarão as regras do processo penal. Ou seja, os prazos passam a ser contínuos, não se suspendendo aos sábados, domingos e feriados (art.144. °, n.º 1, do CPC, ex. vi do art.104.º, n.º 1, do CPP). Mas, por via do n.º 2 desse art.6.º, não se suspendem em férias judicias (ao contrário do que sucede nos processos judiciais, salvo os de natureza urgente que, como tal, são os expressamente tipificados na lei). Ora, significa isso que a regra constante do art.6. °, n.º 1, será, a meu ver, aplicável à contagem do prazo para impugnação judicial da decisão administrativa. Com efeito, esta impugnação ainda se insere nessa fase, sendo apresentada na autoridade administrativa (art.33.º, n.º 2), não havendo que aplicar o art.60.º, n.º 1, do DL 433/82. Este tem natureza meramente subsidiária (art.60.º da Lei 107/2009), pelo que, perante a existência de norma expressa no âmbito do RGCOLSS, aquele art.60.º do DL 433/82 não é aplicável. Esclareça-se que o art.33.º, n.º 2, ainda que inserido em Secção denominada "Fase judicial, tem por objeto, apenas, o prazo de dedução da referida impugnação (fixando-o em 20 dias), mas não já a sua forma de contagem. Por outro lado, aplicar subsidiariamente o art.60.º do DL 433/82, levaria a que a impugnação judicial da decisão administrativa fosse o único processual seja na fase administrativa, seja na fase judicial, em que a contagem do prazo se suspenderia aos sábados, domingos e feriados, o que não faz muito sentido. Com efeito: por via do art.º 6, n.º 1, os prazos na fase administrativa não se suspendem em fins de semana e feriados; e também não se suspendem na fase judicial (por via da aplicação subsidiária do CPP e CPC ou, para quem assim o entenda, por via do art.6º, n.º 1, da Lei 107/2009). Ora, assim sendo, por que razão haveria de ser a impugnação judicial a única exceção (para mais, por via de aplicação subsidiária do art.60.º do DL 433/82) a este novo regime de contagem de prazos? No âmbito do DL 433/82, aos actos da fase administrativa eram aplicáveis, em matéria de prazos, as regras, de natureza administrativa, de contagem de prazos. E, quanto ao acto de impugnação judicial da decisão administrativa, o art. 60.º do referido diploma, na redação introduzida pelo DL 244/95, após longa controvérsia jurídica, acabou por consagrar, também, o regime administrativo de contagem de prazos (tendo em conta a natureza, ainda administrativa, do acto de impugnação judicial da decisão administrativa). Porém, o novo RGCOLSS, consagrou solução inversa, adaptando os prazos, que eram administrativos, aos prazos judiciais. A aplicação do art.6.º, n.º 1, e a aplicação subsidiária do art.60.º, n.º 1, do DL 433/82 levaria a que, na fase administrativa, se aplicassem as regras de contagem dos prazos judiciais, mas na impugnação judicial (e apenas nesta), se aplicassem as regras de contagem dos prazos administrativos, o que não faz sentido. A 2.ª conclusão a retirar, é a de que, remetendo o art.6.º, n.º 1, para as regras do CPP, então terá que se passar a admitir que lhe seja, igualmente, aplicável a possibilidade da prática do acto num dos 3 dias úteis subsequentes ao termo do prazo nos termos do art. 145.º, n.ºs 5 a 7, do CPC, ex. vi do art. 107.º, n.º 5, do CPC (ao contrário do que se entendia no âmbito do RGCO, já que os prazos relativos a actos praticados na fase administrativa, incluindo o de impugnação da decisão administrativa, não tinham natureza judicial). Neste sentido, cf. Ac. RP 05.12.2011, in www.dgsi.pt.
Apreciando
Perante a oposição de julgados entre os referidos acórdãos, importa uniformizar jurisprudência quanto à admissibilidade da apresentação da impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa, proferida em sede de procedimento de contraordenação laboral (Lei n.º 107/09, de 14 de setembro), nos três dias úteis subsequentes ao término do prazo. Duas ordens de argumentos se debatem nos acórdãos recorrido e fundamento, em síntese: Contra: - A natureza administrativa da fase na qual se insere a impugnação judicial da decisão contraordenacional afastaria a aplicação de uma regra própria do processo judicial como a prevista nos artigos 107.º, n.º 5 e 107.º-A do Código Processo Penal e artigo 139.º do Código Processo Civil; - A remissão prevista no artigo 6.º, n. º1 da Lei n.º 107/2009 não inclui o artigo 107.º, n.º 5 do Código Processo Penal; - A remissão do artigo 60.º da Lei n.º 107/2009 para o RGCO, no qual não se prevê a aplicação de tal regra. A favor: - A remissão prevista no artigo 6.º, n.º 1 da Lei n.º 107/2009 deve ser interpretada como incluindo os artigos 107.º, n.º 5 e 107.º-A do Código Processo Penal e artigo 139.º do Código Processo Civil; - A intenção do legislador em afastar-se do modo de contagem de prazos previsto no artigo 60.º, n.º 1 do RGCO e da natureza administrativa do prazo de impugnação judicial.
Vejamos Partindo, então, do pressuposto de que o artigo 6.º n.º1 da Lei n.º 107/2009, se aplica ao prazo para dedução de impugnação judicial, pois o legislador referiu-se nessa norma à contagem dos prazos para a prática de atos processuais, importa agora apreciar o alcance da remissão aí contemplada, ou seja, se deve tal remissão ser interpretada de forma restrita como incluindo, apenas, o artigo 104.º do Código Processo Penal, nos termos em que o foi no acórdão recorrido ou, ao invés, deverá incluir também as normas dos artigos 107.º, n.º 5 e 107.º-A do Código de Processo Penal. Ao invés, o Regime Jurídico das Contra-ordenações Económicas recentemente aprovado pelo Decreto-Lei n.º 9/2021 de 29.01 prevê que o prazo é contínuo e a aplicação subsidiária do Código de Processo Penal com as devidas adaptações, incluindo, consequentemente, a possibilidade da prática do acto processual nos três dias úteis subsequentes. Este diploma é aplicável às Infrações Antieconómicas e contra a Saúde Pública (artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 28/84 de 20.01) e às Contra-ordenações previstas no Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (artigo 204.º) e no Código da Propriedade Industrial (artigo 316.º, n.º 1). Com este Regime Jurídico das Contra-ordenações Económicas e da sua aplicação às infrações referidas, transparece a intenção do legislador em aproximar o regime jurídico de tais contra-ordenações às disposições processuais penais. Verificamos, assim, no que concerne às regras aplicáveis aos prazos para dedução de impugnação judicial e excluindo por agora a Lei n. º107/2009, que os regimes sectoriais agrupam-se em duas lógicas: - Um grupo em que se aplicam as normas dos prazos administrativos, contabilizando-se em dias úteis e sem aplicação das regras processuais penais; - Outro grupo em que se aplicam as regras dos prazos judiciais com a remissão para as regras do processo penal e, consequentemente, com a aplicação da possibilidade de praticar os actos nos três dias úteis subsequentes.
É aplicável à impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa proferida em sede de procedimento de contra-ordenação laboral, prevista no artigo 33.º da Lei n.º 107/09 de 14 de setembro, o disposto nos artigos 107.º, n.º 5, 107.º-A do Código de Processo Penal e 139.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, por remissão dos artigos 6.º, n.º 1 da Lei n.º 107/09, de 14 de setembro e 104.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
b) Acorda-se na revogação do acórdão recorrido e em considerar tempestiva a impugnação judicial interposta pelos recorrentes.
Sem custas. STJ, 10 de março de 2022.
Maria Paula Sá Fernandes (Relatora) Leonor Cruz Rodrigues Pedro B. Ferreira Dias José Luiz Ramalho Pinto (revendo a posição tomada no acórdão recorrido) Júlio Manuel Vieira Gomes Joaquim António Chambel Mourisco
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