Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0584/17
Data do Acordão:09/13/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
APENSAÇÃO
INDEFERIMENTO LIMINAR
Sumário:I - A dedução de uma única oposição a várias execuções fiscais que não se encontrem apensadas constitui excepção dilatória inominada que determina o indeferimento da petição inicial, se conhecida em fase liminar (cfr. arts. 278.º, n.º 1, alínea e), 576.º, n.ºs 1 e 2, 578.º, e 590.º, n.º 1, todos do CPC).
II - No entanto, a apensação de diversas execuções que corram contra o mesmo executado, nos termos do disposto no art. 179.º do CPPT, deve ser conhecida pelo órgão de execução fiscal, oficiosamente ou logo que tal questão seja suscitada pelo executado no processo de execução fiscal ou num dos seus apensos.
III - Se o órgão da execução fiscal o não fizer, deve o juiz providenciar por que o faça.
Nº Convencional:JSTA00070297
Nº do Documento:SA2201709130584
Data de Entrada:05/18/2017
Recorrente:A......
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF BRAGA
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART276 ART179 ART207 ART208 N2.
CPC13 ART278 N1 E ART576 N1 N2 ART578 ART590 N1 ART3 N3 ART6 ART590 N3.
LGT98 ART103.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC068/16 DE 2016/04/20.; AC STA PROC0840/12 DE 2012/11/28.; AC STA PROC092/15 DE 2016/06/15.; AC STA PROC054/16 DE 2017/01/11.; AC STA PROC0921/15 DE 2016/06/15.; AC STA PROC020/17 DE 2017/05/10.
Referência a Doutrina:ALBERTO DOS REIS - CPC ANOTADO VOLII PAG373.
JORGE DE SOUSA - CPPT ANOTADO E COMENTADO VOLIII PAG550.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de oposição à execução fiscal com o n.º 1361/16.5BEBRG

1. RELATÓRIO

1.1 A………. (adiante Recorrente ou Oponente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo do despacho por que o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga lhe indeferiu liminarmente a oposição que deduziu a diversas execuções fiscais que correm termos contra ele, com o fundamento de que não pode ser deduzida uma única oposição contra execuções que não se encontram apensadas.

1.2 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e o Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«a) O Recorrente não pode concordar com o entendimento sufragado na Douta Decisão, uma vez que considera que ao premiar-se a inércia e omissão de pronúncia da Autoridade Tributária, coloca o Oponente/Recorrente numa posição de desigualdade injusta e inaceitável.

b) O Apelante deduziu oposição à execução fiscal em relação a vários processos de execução fiscal, contra si revertidos: 3425201501245139, 3425201501148362, 3425201501202430 e 3425201501203258, para cobrança de dívidas fiscais da sociedade “B………, Lda.”, com os demais sinais dos autos.

c) Resulta evidenciado na Oposição Judicial como questão prévia o seguinte: “(...) Assim, e atendendo ao princípio de economia processual, princípio que visa obstar à prática desnecessária de actos judiciais, requer ao Órgão de Execução Fiscal a apensação dos processos de execução (...). Na medida em que é também aplicável aos autos o art. 179.º do CPPT, que legitima a apensação dos processos que se encontrem na mesma fase processual” (Sublinhado nosso).

d) Por outro lado, e até esta data, o Apelante não foi notificado de qualquer decisão relativa ao requerido ao Órgão de Execução Fiscal, na referida questão prévia na Oposição Judicial.

e) Subsidiariamente ao mesmo pedido, o Recorrente/Oponente apresentou o articulado de oposição à execução fiscal que deu origem ao presente processo judicial.

f) Ainda assim, veio o Tribunal a quo julgar verificada a excepção dilatória inominada com o consequente indeferimento liminar da oposição com o fundamento de que não pode ser deduzida uma oposição, contra execuções que não se encontrem apensadas.

g) Na verdade, nos termos do art. 208.º do CPPT, o órgão de execução fiscal, pode pronunciar-se sobre o mérito da oposição e revogar o acto que lhe tenha dado fundamento.

h) O Recorrente requereu, oportuna e tempestivamente, a apensação dos processos de execução fiscal, o que deveria ter sido determinado, mas que, no entanto, não foi sequer alvo de pronúncia por parte do órgão de execução fiscal.

i) A douta decisão recorrida não teve em conta a conduta ilegal da AT, na omissão de pronúncia quanto à apensação dos PEF, nos termos do art. 56.º da LGT.

j) Para além de ilegal, é também manifesta a nulidade da decisão em causa pois, salvo melhor opinião, o Recorrente entende que o indeferimento liminar deve ser imputado ao órgão de execução fiscal, por não se ter pronunciado sobre o pedido de apensação apresentado pelo Recorrente.

k) Entende ainda o Recorrente que a douta decisão recorrida, viola também o princípio da economia processual, o qual visa obstar à prática desnecessária de actos processuais.

1) A douta decisão recorrida errou, também, na determinação das normas legais aplicáveis, pois a rejeitar liminarmente o articulado de oposição, deveria tê-lo feito por causa imputável ao órgão de execução fiscal e não do Recorrente.

m) Cumpre ainda verificar se, deveria imputar-se ao órgão de execução fiscal a causa de rejeição liminar.

n) A ser assim, de antemão, o órgão de execução fiscal sabe que ao não decidir sobre o pedido formulado, e a seguir a oposição subsidiariamente, obsta ao conhecimento do mérito da causa, e conduz ao indeferimento liminar da oposição, imputável ao Recorrente.

o) Nesse sentido, entende o Recorrente que o Tribunal a quo, deveria ter notificado a AT para informar se já se tinha pronunciado sobre o pedido de apensação e não o tendo feito, conceder um prazo para o fazer.

p) Acresce que, o direito de defesa do Oponente, aqui apelante, não poderá ficar comprometido.

Nestes termos e nos demais de direito, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser julgado procedente, em conformidade com as presentes conclusões, e revogando a douta sentença recorrida,

Porém, como sempre, V.Exas, farão a sempre acostumada JUSTIÇA».

1.3 Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4 Recebidos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja concedido provimento ao recurso com a seguinte fundamentação (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.): «[…]

É pacífica a jurisprudência no sentido de que não é legalmente admissível deduzir uma única oposição a várias execuções fiscais que não se encontram apensadas, gerando esse facto uma excepção dilatória inominada que acarreta o indeferimento liminar da petição inicial ou a absolvição da Fazenda Pública da instância, consoante seja verificada em fase liminar ou na sentença.
E, com efeito, funcionando a oposição como uma contestação à execução fiscal, não parece adequado que possa ser deduzida uma única oposição ou ensaiada uma única defesa relativamente a várias pretensões executivas, não se achando apensados os respectivos processos de execução fiscal.
Contudo, a apensação dos processos de execução fiscal é da competência do órgão de execução fiscal, não podendo o tribunal, tal como está desenhado o processo de execução fiscal, ordenar à administração fiscal que proceda a essa apensação. Só o órgão da execução fiscal está em condições de saber, como se refere no douto Acórdão deste Supremo Tribunal de 28.11.2012, in Rec. n.º 0840/12, se «(i) as execuções se encontram na mesma fase; (ii) se há ou não prejuízo para cumprimento de formalidades especiais e (iii) ou qualquer outro motivo que possa comprometera eficácia da execução» (cfr. o douto Acórdão deste STA de 28.11.2012, in Rec. n.º 0840/12).
No entanto, como se ponderou no douto Acórdão deste STA de 11-01-2017, in Rec. n.º 054/16, “a questão da apensação das execuções fiscais, nos termos do disposto no artigo 179.º do CPPT, apenas se coloca para o órgão de execução fiscal a partir do momento em que as execuções são instauradas e para o interessado a partir do momento em que é citado para as execuções. E, portanto, este apenas pode requerer ou introduzir nos autos a questão da apensação de várias execuções após a sua citação, e deve fazê-lo no momento em que deduz a oposição à execução fiscal, uma vez que é nesse momento que tem a primeira intervenção processual, cfr. acórdão proferido no recurso n.º 1233/16, e quanto a si todas as execuções estarão na mesma fase processual”.
No caso dos autos, tal como na situação apreciada naquele douto acórdão, o revertido requereu ao OEF, como questão prévia, na petição de oposição, ou seja, na primeira intervenção processual legalmente prevista que ocorre após a citação, a apensação ao processo em causa dos processos de execução fiscal n.ºs 3425201501148362, 3425201501202430 e 3425201501203258 (cfr. fls 4).
O OEF, como se vê dos autos, não se pronunciou sobre esse requerimento.
Ora, como ainda se ponderou no douto Acórdão de 11-01-2017, “a oposição não pode ser julgada, de mérito ou de forma, até que o órgão de execução fiscal decida a questão da apensação das execuções, o que se lhe impõe, como atrás vimos, por dever de ofício. Impondo-se, por conseguinte, que estes autos aguardem a tramitação processual adequada e necessária a tal questão e, só após se ter concluído com decisão transitada em julgado que tal apensação não é possível, nem viável (ou seja, se houver reclamação de eventual decisão de improcedência, apenas após o trânsito em julgado da respectiva decisão), é que poderá ser decidida a questão suscitada pela Fazenda Pública no tocante à não apensação das execuções. E, no caso de o órgão de execução fiscal não se pronunciar sobre a questão da apensação, por negligência ou por se recusar a fazê-lo, então o juiz deverá certificar-se da verificação dos requisitos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 179.º do CPPT e ordenar o prosseguimento da oposição relativamente a todas as execuções, incumbindo posteriormente ao órgão de execução fiscal adequar a tramitação das diversas execuções entre si”.
Adere-se inteiramente a esta doutrina, revendo anterior posição sobre a matéria.
Assim, acompanhando, com a devida vénia, o teor da decisão proferida no douto Acórdão que se vem citando, emite-se parecer no sentido da procedência do presente recurso e da revogação da sentença recorrida, baixando os autos ao Tribunal a quo para que os mesmos aí aguardem a pronúncia por parte do OEF sobre a apensação das execuções fiscais que lhe foi requerida na petição de oposição».

1.5 Dispensaram-se os vistos dos Conselheiros adjuntos, dada a existência de jurisprudência recente e uniforme sobre a questão a dirimir.

1.6 A questão suscitada pelo Recorrente e que ora cumpre apreciar e decidir é a de saber se o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga fez correcto julgamento ao indeferir liminarmente a petição inicial com fundamento na verificação da excepção dilatória inominada de cumulação ilegal de oposições.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

2.1.1 Pese embora a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga a tanto não estivesse obrigada, por a decisão ter sido proferida em sede liminar, no despacho recorrido deixou dito:

«Com interesse para a apreciação liminar da presente acção, consideram-se provados os seguintes factos, tendo em consideração os documentos juntos aos presentes autos:

1) Correm termos no Serviço de Finanças de Braga-2 os processos de execução fiscal n.ºs 3425201501245139, 3425201501148362, 3425201501202430 e 3425201501203258, contra A…………., ora Oponente, na qualidade de responsável subsidiário de B…………, LDA., NIPC ……….., para cobrança coerciva de dívidas de IVA do ano de 2015, no valor global de 20.681,86 EUR, acrescido de juros de mora no montante de 648,56 EUR – fls. 23 a 26 o suporte físico dos autos e processo de execução fiscal apenso, os quais se dão aqui por integralmente reproduzidos;

2) Os processos de execução fiscal mencionados no ponto anterior não foram objecto de apensação – fls. 60 do suporte físico dos autos, bem como processo de execução fiscal apenso, os quais se dão aqui por integralmente reproduzidos;

3) O Oponente, na sequência das citações levadas a cabo nos processos mencionados em 1), deduziu a presente oposição relativamente a todos os processos de execução fiscal fls. 4-18 e 23-26 do suporte físico dos autos, as quais se dão aqui por integralmente reproduzidas».

2.1.2 Com interesse para a decisão a proferir, cumpre ainda ter em conta o seguinte circunstancialismo processual:

4) A petição inicial foi apresentada no Serviço de Finanças de Braga 2, que lhe apôs carimbo de entrada com data de 2 de Junho de 2016 (cfr. fls. 4);

5) Na parte inicial da parte expositiva da petição inicial, imediatamente após o intróito e a título de «QUESTÃO PRÉVIA», o Oponente deixou dito: «

· O Oponente acima id., tem a correr no Serviço de Finanças de Braga 2 vários processos de execução fiscal, para além do mencionado em epígrafe [refere-se ao processo de execução fiscal n.º 3425201501245139].

· Assim, e atendendo ao princípio de economia processual.

· Princípio que visa obstar à prática desnecessária de actos judiciais, requer ao Órgão de Execução Fiscal a apensação dos processos de execução: 3425201501148362, 3425201501202430 e 3425201501203258.

· Na medida em que é também aplicável aos autos o art. 179.º do CPPT, que legitima a apensação dos processos que se encontram na mesma fase processual» (cfr. petição inicial, a fls. 4).

6) Após a recepção da petição inicial e a sua autuação como processo de oposição à execução fiscal, o Serviço de Finanças de Braga 2 prestou a informação a que alude o art. 208.º do CPPT nos termos constantes de fls. 28 v.º;

7) O Chefe desse serviço de finanças, após emitir despacho de concordância com essa informação, ordenou a remessa dos autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (cfr. fls. 28);

8) Por despacho proferido em 30 de Novembro de 2016, a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga solicitou ao Serviço de Finanças de Braga 2 «que informe quais os processos de execução fiscal que aí se encontram em curso contra a executada B………, Lda. – Sociedade em Liquidação (NIPC ………….) e que tenham sido revertidos contra o ora Oponente, mais informando se os mesmos se encontram apensados» e «se foi requerida a respectiva apensação e qual a decisão proferida quanto a esse pedido, juntando aos auto os respectivos documentos comprovativos» (cfr. despacho de fls. 58);

9) Em resposta a essa solicitação, aquele órgão da execução fiscal informou que «[…] os processos executivos abaixo identificados e instaurados em nome da sociedade B……….., Lda. – Sociedade em Liquidação, NIPC ……….., com reversão activa contra o oponente A…………, NIF ………, são os seguintes:

Mais informo que aqueles PEF´s não se encontram apensados entre si, nem foi apresentada ou recepcionada por este SF qualquer petição a requerer a respectiva apensação» (cfr. ofício de fls. 60);

10) Essa informação não foi notificada ao Oponente (cfr. processado ulterior a fls. 60);

2.1.3 Na decisão recorrida, se bem que já não na parte em que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga se propôs consignar a matéria de facto pertinente para a decisão a proferir, consta ainda, com relevo para a decisão a proferir, que:

11) O Serviço de Finanças de Braga 2 não se pronunciou sobre o pedido de apensação das execuções fiscais formulado na petição inicial da oposição (cfr. despacho recorrido, a fls. 67).


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2.2 DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga indeferiu liminarmente a petição inicial porque considerou verificada a excepção dilatória inominada decorrente da dedução pelo ora Recorrente de uma única oposição a execuções que não se encontravam apensadas.
Essa decisão louvou-se na jurisprudência consolidada desta Secção do Contencioso Tributário, que afirmou já por várias vezes não ser admissível deduzir uma única oposição a várias execuções fiscais que não estejam apensadas (Vide, entre muitos outros, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 28 de Novembro de 2012, proferido no processo n.º 840/12, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/cf888cbbc1a77b8080257acc004107c0;
- de 16 de Janeiro de 2013, proferido no processo n.º 292/12, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d412b2b82d1a2a4a80257afa005c0f35;
- de 17 de Abril de 2013, proferido no processo n.º 199/13, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/40894a6720033f4780257b5f003ade90;
- de 12 de Fevereiro de 2015, proferido no processo n.º 1193/14, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3065c5a83d6850ab80257df00039fe0c;
- de 20 de Abril de 2016, proferido no processo n.º 68/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/82b6b0ff7a4ccd9280257fa1003795f1.).
Mais considerou a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que o pedido de apensação das execuções fiscais, que reconhece ter sido formulado na petição inicial, deveria ter sido endereçado ao órgão da execução fiscal, a quem compete a decisão do mesmo, sendo que a intervenção do tribunal só poderia ocorrer em sede de reclamação judicial, deduzida ao abrigo do disposto no art. 276.º e segs. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), da eventual decisão desse requerimento.
O Recorrente discorda da decisão de indeferimento liminar. Em síntese, afirma que requereu ao órgão da execução fiscal a apensação das execuções fiscais, como “questão prévia” à oposição, e que, sem que esse requerimento esteja decidido, não podia o Tribunal a quo decidir pelo indeferimento liminar com o fundamento em que não estavam apensadas as execuções fiscais contra as quais foi deduzida a presente oposição.
Cumpre, pois, sindicar o julgamento de indeferimento liminar da petição inicial, o que passa por indagar
i) se o Oponente requereu ou não a apensação das execuções fiscais (quanto à questão, há divergência entre a informação prestada pelo Serviço de Finanças de Braga 2 e o Recorrente); na afirmativa,
ii) se esse requerimento foi dirigido ao órgão da execução fiscal (a divergência, quanto a este ponto, é entre a referida informação e a decisão recorrida, por um lado, e o Recorrente, por outro lado) e, em qualquer caso,
iii) se podia indeferir-se liminarmente a petição inicial com fundamento na sua dedução contra execuções fiscais não apensadas, sem que o órgão da execução fiscal se pronunciasse sobre a requerida apensação.

2.2.2 DO REQUERIMENTO DE APENSAÇÃO DE EXECUÇÕES FISCAIS

É inequívoco que o ora Recorrente pediu a apensação de 4 das execuções fiscais que contra si foram revertidas pelo Serviço de Finanças de Braga 2. A mera leitura da petição inicial não deixa margem para dúvida, pois aí deixou escrito: «requer ao Órgão de Execução Fiscal a apensação [ao processo de execução fiscal em epígrafe] dos processos de execução: 3425201501148362, 3425201501202430 e 3425201501203258» [cfr. n.º 5) do ponto 2.1.2].
Ademais, invocou expressamente o art. 179.º do CPPT, que dispõe sobre a apensação dos processos de execução fiscal, e cujo n.º 1 diz: «Correndo contra o mesmo executado várias execuções, nos termos deste Código, serão apensadas, oficiosamente ou a requerimento dele, quando se encontrarem na mesma fase».
Assim, não pode dizer-se, como disse o órgão da execução fiscal na informação prestada a pedido da Juíza do Tribunal a quo, que não «foi apresentada ou recepcionada por este SF qualquer petição a requerer a respectiva apensação» [cfr. n.ºs 8) e 9) do ponto 2.1.2].
Na verdade, o Executado por reversão apresentou pedido expresso de apensação dos processos executivos que identificou na petição inicial de oposição à execução fiscal e (apesar de a petição inicial ir endereçada, como devia, ao Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga) dirigiu-o ao órgão da execução fiscal, que é quem, em primeira linha (Isto sempre sem prejuízo de reclamação judicial, ao abrigo do art. 276.º do CPPT, de eventual decisão desfavorável aos interesses do executado, como bem salientou a Juíza do Tribunal a quo. ),tem competência para decidir a questão, como resulta do disposto no art. 179.º do CPPT ( Vide,também, os arts. 10.º, n.º 1, alínea f), e 151.º, n.º 1, do CPPT.).
Questão diferente é a de saber se o ora Recorrente formulou correctamente esse pedido, mais concretamente, se o podia formular na própria petição de oposição.
Tenha-se presente a petição de oposição, que, de acordo com o disposto no n.º 1 do art. 207.º do CPPT, deve ser apresentada no órgão da execução fiscal onde pender a execução (Nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, se tiver sido expedida carta precatória poderá a petição inicial ser apresentada no serviço deprecado, o qual deverá remetê-la ao órgão da execução fiscal. ), é endereçada ao juiz do tribunal tributário competente, ao qual deverá ser remetida, depois de autuada e de devidamente informada, nos termos do n.º 1 do art. 208.º do CPPT; o n.º 2 deste artigo prevê ainda que o órgão da execução fiscal, a menos que a competência para o efeito esteja legalmente deferida a outro órgão, possa também pronunciar-se sobre o mérito da oposição e inclusive revogar o acto que lhe tenha dado fundamento ( Sobre o alcance deste segmento da norma e restringindo-o aos casos de reversão da execução fiscal, vide JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, III volume, anotação 3 ao art. 208.º, pág. 550, cujo entendimento subscrevemos. ). Quer a obrigação de prestar informação quer a possibilidade de se pronunciar sobre o mérito da pretensão e de revogar o acto de reversão, exigem do órgão da execução fiscal a leitura da petição inicial e análise dos respectivos fundamentos.
Admitimos que a forma escolhida pelo Oponente para formular o pedido de apensação das execuções fiscais não foi a mais curial: não se nos afigura correcto enxertar na petição inicial de oposição, endereçada ao juiz do tribunal tributário, um pedido de apensação de execuções fiscais dirigido ao órgão da execução fiscal; o mais correcto, do ponto de vista formal, seria a apresentação de um requerimento autónomo, dirigido ao órgão da execução fiscal, fazendo-se menção a esse requerimento na petição inicial da oposição, de modo a dele dar conhecimento ao juiz, designadamente em ordem a poder aguardar a decisão do órgão da execução fiscal ou, até, se for caso disso, providenciar por que seja proferida. Mas, respeitando ou não a forma adequada, o pedido foi formulado e, por isso, nem o órgão da execução fiscal podia ignorá-lo nem a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga podia encará-lo exclusivamente sob a óptica da impossibilidade de o tribunal conhecer desse pedido, tanto mais que o Oponente nem sequer o dirigiu ao Tribunal, mas ao órgão da execução fiscal.
É certo que, do ponto de vista formal, o pedido de apensação, porque endereçado ao órgão da execução fiscal, não deveria ter sido formulado na petição inicial da oposição, que é endereçada ao juiz do tribunal tributário competente, não sendo ajustado que dois pedidos diversos e endereçados a entidades diferentes sejam formulados através de uma mesma peça processual. Isto sem prejuízo de a execução fiscal ser um processo único, de natureza judicial, não obstante os órgãos da AT nele poderem praticar actos que não tenham natureza jurisdicional [cfr. art. 103.º da Lei Geral Tributária (LGT)]. Mas até se pode compreender a opção do Oponente, na medida em que, como deixámos já dito, a petição inicial antes de ser remetida a tribunal deve ser apreciada pelo órgão da execução fiscal, que pode inclusive revogar o acto de reversão. Ou seja, o órgão da execução fiscal não podia deixar de dar conta do pedido que lhe foi formulado na petição inicial da oposição.
Mas, ainda que se conceda que a formulação do pedido de apensação na própria petição inicial de oposição é menos correcta, essa incorrecção formal não justifica o indeferimento liminar da petição inicial com o fundamento na dedução de uma única oposição a várias execuções fiscais que não se encontram apensadas.
Note-se, por um lado, que a jurisprudência (Vide, por mais recente e com indicação de jurisprudência, o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Junho de 2016, proferido no processo n.º 921/5, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/008ec4c2e50e2e5f80257fd500522a16.
) tem vindo a afirmar que o indeferimento liminar só é admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório [cfr. art. 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (CPC)] e inútil qualquer instrução e discussão posterior, isto é, «quando o seguimento do processo não tenha razão alguma de ser, seja desperdício manifesto de actividade judicial» (Cfr. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, vol. II, pág. 373.) e, por outro lado, que o direito adjectivo tem hoje como princípio basilar que não haja perda de direitos por deficiências formais, impondo-se ao juiz, sempre que possível, providenciar pela sanação das irregularidades susceptíveis de comprometer o conhecimento do mérito (cfr. arts. 6.º e 590.º, n.º 3, do CPC e art. 7.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos).
Ou seja, no caso sub judice nada impedia e, ao invés, impunha-se que, perante a inércia do órgão da execução fiscal – que, não só ignorou o pedido que lhe foi endereçado, ainda que, como deixámos já dito, de modo formalmente irregular, como ainda prestou informação no sentido de que não foi apresentada (Informação que, aliás, se impunha tivesse sido notificada ao Oponente. Neste sentido, vide os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 13 de Abril de 2016, proferido no processo n.º 548/15, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/e8e18ae788cfca4280257f99002d970c;
- de 15 de Junho de 2016, proferido no processo n.º 921/15, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/008ec4c2e50e2e5f80257fd500522a16.) –, o juiz tivesse intervindo no sentido de, suprindo a irregularidade, providenciar pela pronúncia do órgão da execução fiscal quanto ao pedido de apensação das execuções fiscais.
Concluindo, a nosso ver, o Oponente requereu a apensação das execuções fiscais e dirigiu-a ao órgão da execução fiscal, apesar de o não ter feito de modo formalmente correcto, motivo por que, tendo o órgão da execução fiscal ignorado esse pedido, deveria o Juiz do Tribunal a quo ter diligenciado para que o mesmo fosse apreciado e decidido, ao invés de ter indeferido liminarmente a petição inicial.
Tanto basta para que se considere que a decisão recorrida não pode manter-se.

2.2.3 DA APENSAÇÃO DE EXECUÇÕES FISCAIS

Mas há ainda outra razão para que não possamos acompanhar o despacho recorrido. São as que ficaram expostas no acórdão desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 11 de Janeiro de 2007, proferido no processo n.º 54/16 (Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8d68bee6de05a055802580a7003bc29f.) e que têm vindo a ser reafirmadas em ulteriores arestos (Referimo-nos aos seguintes acórdãos:
- de 22 de Março de 2017, proferido no processo n.º 895/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b214c4a37478f54a802580f00031fb90;
- de 3 de Maio de 2017, proferido no processo n.º 1489/15, disponível em
http://www.gde.mj.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/7be752ec08382f048025811d0046973e;
- de 10 de Maio de 2017, proferido no processo n.º 20/17, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/266e41e2decd196a80258123004a4c59.).
A apensação de execuções fiscais, dissemo-lo já, compete ao órgão da execução fiscal, que a deve exercer, oficiosamente ou a requerimento do executado, desde que verificados os respectivos pressupostos, designadamente que i) as execuções instauradas contra o mesmo executado se encontrem na mesma fase, ii) que não haja prejuízo para cumprimento de formalidades especiais e iii) não ocorra qualquer outro motivo que possa comprometer a eficácia da execução.
Mas como, ficou dito no referido aresto proferido no processo n.º 54/16, que foi também citado pelo Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, «a questão da apensação das execuções fiscais, nos termos do disposto no artigo 179.º do CPPT, apenas se coloca para o órgão de execução fiscal a partir do momento em que as execuções são instauradas e para o interessado a partir do momento em que é citado para as execuções. E, portanto, este apenas pode requerer ou introduzir nos autos a questão da apensação de várias execuções após a sua citação, e deve fazê-lo no momento em que deduz a oposição à execução fiscal, uma vez que é nesse momento que tem a primeira intervenção processual, cfr. acórdão proferido no recurso n.º 1233/16, e quanto a si todas as execuções estarão na mesma fase processual». Assim,«a oposição não pode ser julgada, de mérito ou de forma, até que o órgão de execução fiscal decida a questão da apensação das execuções, o que se lhe impõe, como atrás vimos, por dever de ofício. Impondo-se, por conseguinte, que estes autos aguardem a tramitação processual adequada e necessária a tal questão e, só após se ter concluído com decisão transitada em julgado que tal apensação não é possível, nem viável (ou seja, se houver reclamação de eventual decisão de improcedência, apenas após o trânsito em julgado da respectiva decisão), […]. E, no caso de o órgão de execução fiscal não se pronunciar sobre a questão da apensação, por negligência ou por se recusar a fazê-lo, então o juiz deverá certificar-se da verificação dos requisitos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 179.º do CPPT e ordenar o prosseguimento da oposição relativamente a todas as execuções, incumbindo posteriormente ao órgão de execução fiscal adequar a tramitação das diversas execuções entre si».
Também por esta ordem de razões, a decisão recorrida não pode manter-se.

2.2.4 CONCLUSÕES

Por tudo o que deixámos dito, o recurso será provido e, preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - A dedução de uma única oposição a várias execuções fiscais que não se encontrem apensadas constitui excepção dilatória inominada que determina o indeferimento da petição inicial, se conhecida em fase liminar (cfr. arts. 278.º, n.º 1, alínea e), 576.º, n.ºs 1 e 2, 578.º, e 590.º, n.º 1, todos do CPC).
II - No entanto, a apensação de diversas execuções que corram contra o mesmo executado, nos termos do disposto no art. 179.º do CPPT, deve ser conhecida pelo órgão de execução fiscal, oficiosamente ou logo que tal questão seja suscitada pelo executado no processo de execução fiscal ou num dos seus apensos.
III - Se o órgão da execução fiscal o não fizer, deve o juiz providenciar por que o faça.


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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em conceder provimento ao recurso, em revogar o despacho recorrido e ordenar que os autos regressem ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, onde deverão aguardar que o órgão da execução fiscal se pronuncie sobre a requerida apensação das execuções fiscais, para o que deverá o Juiz desse Tribunal indagar junto desse mesmo órgão sobre qual a decisão expressa que recaiu sobre tal questão, fixando-lhe um prazo peremptório para o fazer se ainda não tiver sido proferida tal decisão, seguindo, se necessário, a tramitação anteriormente descrita.

Sem custas, sem prejuízo da obrigação de pagamento da taxa de justiça.


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Lisboa, 13 de Setembro de 2017. – Francisco Rothes (relator) – Aragão Seia – Casimiro Gonçalves.