Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0461/17.9BESNT
Data do Acordão:01/23/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
APENSAÇÃO
EXECUÇÃO FISCAL
INDEFERIMENTO LIMINAR
Sumário:I - A apensação de diversas execuções que corram contra o mesmo executado, nos termos do disposto no artigo 179.º do CPPT, deve ser conhecida pelo órgão de execução fiscal, oficiosamente ou logo que tal questão seja suscitada pelo executado no processo de execução fiscal ou num dos seus apensos.
II - Conhecida a questão, ainda que a mando do juiz que apreciou a petição inicial de oposição deduzida contra várias execuções fiscais não apensadas, impõe-se que seja proferida decisão pelo órgão da execução fiscal – e não a prestação de uma mera informação – e que essa decisão seja notificada ao executado, com respeito pelo n.º 2 do art. 36.º do CPPT, designadamente com a indicação de que o executado dela pode reclamar nos termos do art. 286.º do CPPT.
III - Não tendo sido proferida essa decisão, não pode o juiz do tribunal tributário indeferir liminarmente a petição inicial com fundamento na impossibilidade de dedução de uma única oposição contra execuções fiscais não apensadas.
Nº Convencional:JSTA000P24110
Nº do Documento:SA2201901230461/17
Recorrente:A.......
Recorrido 1:AT- AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da decisão de indeferimento liminar proferida no processo de oposição à execução fiscal supra identificado

1. RELATÓRIO

1.1 O acima identificado Recorrente (a seguir também denominado Executado ou Oponente) apresentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra uma petição em que disse vir deduzir oposição a dezoito execuções fiscais, que identificou e que, instauradas contra uma sociedade, prosseguem contra ele por reversão porque foi considerado responsável subsidiário pelas dívidas aí em cobrança coerciva.

1.2 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, após notificar o Oponente para escolher uma das execuções fiscais em ordem a que a oposição prosseguisse apenas contra ela e também após colher junto do órgão da execução fiscal a informação de que os referidos processos executivos se não encontravam apensados, indeferiu liminarmente a petição inicial, com o fundamento de que a dedução de uma única oposição contra execuções fiscais não apensadas constitui excepção dilatória inominada e determina o indeferimento liminar.

1.3 Inconformado, o Oponente interpôs recurso da decisão para o Tribunal Central Administrativo Sul, que foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

1.4 A Recorrente apresentou as alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«I. A Recorrente nunca foi notificada da decisão da 1.ª instância.

II. Onde não era admitida a oposição pois esta versava sobre vários processos.

III. Acontece que o recorrente não se pode conformar com isso.

IV. Pois do modo como a decisão foi preferida deveria o recorrente fazer oposições sucessivas a vários processos.

V. Ora a AT está isenta da taxa de justiça o que não acontece com o recorrente.

VI. Assim não existe a possibilidade de existência da concretização do direito por violação do princípio da igualdade.

VII. A não aceitação da oposição é tempestiva em face do disposto no art. 205.º do CPC, porquanto a mesma não teve antes qualquer intervenção nos autos, nem dela teve conhecimento antes.

Em face do exposto, formula-se o seguinte

PEDIDO:

Deverá conceder-se provimento ao presente Recurso, julgando procedente a nulidade decorrente de falta de aceitação da oposição».

1.4 O Tribunal Central Administrativo Sul julgou-se incompetente em razão da hierarquia, indicando este Supremo Tribunal Administrativo como sendo o tribunal competente para conhecer do recurso, ao qual os autos foram remetidos a requerimento do Recorrente.

1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, a Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação:«[…]

2. O Ministério Público avança, desde já, que não sufraga o entendimento do aqui Recorrente […], no que tange à assacada afronta ao princípio do contraditório e ao princípio da igualdade de armas entre o Oponente e a Oponida, consagrados nos artigos 3.º e 4.º ambos do Código de Processo Civil, aqui aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT.
Assim, examinados os autos, constata-se que a julgadora do tribunal a quo não afrontou o princípio do contraditório, porquanto, no despacho interlocutório que proferiu, em 22/05/2017, entendeu que a dedução de uma única oposição, a diversas execuções fiscais não apensadas entre si, constituía uma excepção dilatória inominada de cumulação ilegal de oposições (cfr. fls. 144 do p. f.).
Nessa esteira, no mencionado despacho, providenciou no sentido de proceder à notificação do Oponente, a fim de, no prazo que lhe foi fixado em 10 dias, vir indicar relativamente a que processo de execução fiscal (PEF) pretendia que os autos prosseguissem os seus termos e, ainda, para se pronunciar sobre a referida excepção, cuja verificação obstava ao conhecimento do mérito da causa (cfr. fls. 144 do p. f.).
Na sequência dessa notificação, o Oponente limitou-se a renovar o seu pedido de prosseguimento da oposição, quanto a todos os processos de execução fiscal (cfr. fls. 149 do p.f.).
Acresce que, por despacho de 21/06/2017, a M. Juíza do TAF de Sintra determinou, oficiosamente, que o Serviço de Finanças de Cascais-2 informasse, documentada e fundamentadamente, as razões da insusceptibilidade de apensação, questão que fora expressamente invocada na informação prevista no artigo 208.º do CPPT (vide fls. 152 do p. f.).
Na resposta que apresentou, o órgão de execução fiscal veio informar que os PEF não se encontravam apensados, desde logo, por tal pretensão não ter sido formulada e, ademais, por insusceptibilidade de apensação processual, porquanto implicaria prejuízo para o bom andamento dos processos, face à declaração de insolvência da devedora originária e à consequente sustação dos PEF (v. fls. 152 e 155 a 161 do p. f.).
Dessa informação do Serviço de Finanças de Cascais-2 e, bem assim, do despacho de concordância que ela mereceu, proferido em 14/09/2017, pelo respectivo Chefe, foi o Oponente devidamente notificado (cfr. fls. 163 - segmento I - a 165 do p. f.).
Todavia, perante essa comunicação do TAF de Sintra, cingiu-se a reiterar o pedido de prosseguimento dos autos, quanto a todos os PEF, e não manifestando, por qualquer meio, o propósito de contra ele reagir, mormente mediante a dedução de reclamação da decisão do órgão de execução fiscal, ao abrigo do disposto nos artigos 276.º e seguintes do CPPT (vide fls. 163 a 165 do p. f.).
Destarte, perante esta sumária resenha de todo o processado que antecedeu a prolação do despacho de indeferimento liminar ora em crise, impõe-se concluir que inexistiu qualquer decisão surpresa do tribunal a quo, razão por que carece de sentido a invocada violação do mencionado princípio do contraditório, que de todo se inverifica, no caso em presença.
Ante o explanado supra, o Ministério Público propende no sentido da improcedência da pretensão recursiva do Recorrente quanto a esta parte.
3. Em adição, não ocorreu a violação do princípio da igualdade e, eventualmente, do direito de acesso à justiça e aos tribunais, com assento no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.
Na verdade, os mesmos não se mostram infringidos pelo tribunal a quo porquanto, da simples leitura da fundamentação do despacho de indeferimento liminar, emerge que a decisão proferida se mostra alicerçada nos doutos arestos deste Colendo STA (1) [(1) Acórdãos do STA, proferidos em 28/11/2012, no Processo n.º 0840/12; em 26/04/2012, no Processo, 0255/12; em 21/03/2012, no Processo n.º 0867/11; em 25/01/2012, no Processo n.º 802/11 e em 14/09/2011, no Processo n.º 0242/11, consultáveis em www.dgsi.pt/sta], aí citados e parcialmente reproduzidos (cfr. fls. 170 in fine a 172 do p. f.).
Sucede que, pese embora o entendimento sufragado na decisão em crise não constitua, actualmente, o sentido uniforme da jurisprudência dimanada deste Supremo Tribunal, quanto a esta específica questão, o Ministério Público considera que não valem, no caso em presença, as razões subjacentes ao entorse, aí reconhecido, a esse entendimento outrora consolidado.
Assim, o Ministério Público não ignora e, daí, não desconsidera a corrente jurisprudencial mais recente deste Colendo STA, de que são expressão os doutos Acórdãos de 08/11/2017, tirado no Processo n.º 0363/17; de 04/10/2017, no Processo n.º 0373/17; de 13/09/2017, no Processo n.º 0584/17; de 10/05/2017, no Processo n.º 020/17; de 03/05/2017, no Processo n.º 01489/15; de 22/03/2017, no Processo n.º 0895/16; de 11/01/2017, no Processo n.º 054/16 (2) [(2) Arestos que estão, também, disponíveis in www.dgsi.pt/jsta].
De harmonia com essa posição, “A apensação de diversas execuções que corram contra o mesmo executada, nos termos do disposto no art. 179.º do CPPT, deve ser conhecida pela órgão de execução fiscal oficiosamente, ou logo que tal questão seja suscitada pela executada no processo de execução fiscal ou num dos seus apensos”.
Ora, in casu, o órgão de execução fiscal, a solicitação do tribunal a quo, exarou informação, amplamente circunstanciada e exaustiva, sobre as razões por que não procedera à apensação, informação sobre a qual foi proferido despacho de concordância do Chefe do respectivo Serviço de Finanças, datado de 14/09/2017, decisão com que o Oponente se conformou inteiramente.
A ser assim, atenta a falta de reacção, por banda do Oponente, ao despacho de indeferimento da apensação dos PEF, não se justifica que se imponha à Mma. Juíza do TAF de Sintra que intervenha ex officio, de novo, no processo, de modo a que o órgão de execução fiscal profira nova decisão sobre a suscitada questão da apensação, a qual seria, seguramente, confirmativa da anterior, proferida em 14/09/2017 (vide fls. 156 do p. f.).
Destarte, afigura-se ao Ministério Público que seria um acto inútil e, como tal, preterida pela lei a prolação de douto acórdão por este Colendo STA que determinasse a revogação da decisão judicial recorrida e a consequente baixa dos autos ao tribunal a quo, para que o órgão de execução fiscal emitisse, outra vez, pronúncia sobre a apensação das diversas execuções».

1.6 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.

1.7 A questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra decidiu correctamente ao rejeitar in limine a petição inicial de oposição.


* * *

2. FUNDAMENTOS
2.1 DE FACTO

2.1.1 A decisão recorrida não fixou factualidade alguma, o que bem se compreende porque se trata de uma rejeição liminar, ou seja, uma decisão que não entrou no mérito da causa, motivo por que também não entrou na apreciação e discussão da matéria de facto, designadamente com a produção de prova sobre os fundamentos que poderiam relevar para a decisão de fundo.

2.1.2 Com interesse para a decisão a proferir, cumpre ter presente o teor da fundamentação expendida na decisão recorrida para justificar o decretado indeferimento liminar:

«[…] Alega [o Oponente], em síntese:
- a sua ilegitimidade por não ter exercido a gestão de facto no período a que se reportam as dívidas tributárias e por inexistência de culpa na insuficiência de bens da devedora originária;
- a falta de fundamentação do despacho de reversão, por não ter sido demonstrado o desempenho de funções efectivas de gestão.
Termina pedindo a anulação do despacho de reversão, atenta a sua ilegitimidade, e a extinção da execução. (cf. fls. 8 a 11, da numeração em suporte de papel, a que correspondem futuras referências sem menção de origem).

*
O órgão de execução fiscal elaborou a informação prevista no artigo 208.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), informando que a presente oposição vem deduzida “para doze processos autónomos insusceptíveis de apensação” e suscitando a verificação da excepção inominada de cumulação ilegal de oposições.
O PEF foi apenso aos autos. (cf. fls. 98 a 104 e 125)
*
Notificado para se pronunciar quanto à matéria de excepção, o Oponente requereu a apreciação dos doze processos que identifica na sua petição inicial, salientando a “desmultiplicação” dos PEF, “o que dificulta a defesa aos oponentes sobretudo pelos valores e custos”. (cf. fls. 144 e 147)
*
Em resposta a diligência deste Tribunal, o órgão de execução fiscal informou que os PEF não se encontravam apensados, desde logo, por não ter existido qualquer requerimento do Oponente nesse sentido, acrescentando que atenta a declaração de insolvência da devedora originária e a, consequente, sustação dos PEF, a apensação “implicaria (...) prejuízo para o bom andamento dos processos (...) porque poderia vir a ficar comprometido ou prejudicado o cumprimento de formalidades especiais incindíveis especificadamente sobre qualquer dos processos unitariamente considerados”, concluindo e reiterando a insusceptibilidade de apensação processual. (cf. fls. 152 e 155 a 161)
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Notificado da informação do órgão de execução fiscal e, mais uma vez, para identificar qual o PEF que pretendia ver apreciado na presente oposição, o Oponente reiterou o prosseguimento dos autos relativamente a “todos” os PEF. (cf. fls. 163 e 165)
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Importa antes de mais, apreciar a matéria de excepção, porquanto a sua verificação obsta ao conhecimento do mérito da causa.
Resulta dos autos (em concreto da petição inicial e das informações de fls. 98 a 104 e 155 a 161 e dos requerimentos de fls. 147 e 165), que os PEF acima identificados, não se encontram apensados entre si, e que a petição que instrui o presente processo, visa opor-se a todos eles.
Saliente-se que, convidado a esclarecer qual das oposições pretendia que prosseguisse, o Oponente reiterou que pretendia opor-se a todas. (cf. fls. 147 e 165)
Deste modo, mesmo quando advertido da eventual verificação de uma excepção dilatória que obstaria ao conhecimento de mérito, o Oponente reiterou a sua pretensão, mas eximiu-se de escolher relativamente a qual dos PEF deveriam os presentes autos de oposição prosseguir.
Ora, esta questão é objecto de ampla e pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (STA), que tem afirmado que a oposição a dois ou mais processos de execução fiscal distintos não pode ser concretizada através de uma única oposição, mesmo considerando a circunstância de a fundamentação de facto e de direito poder ser idêntica relativamente às diversas oposições, constituindo tal facto uma excepção dilatória inominada que obsta ao conhecimento da oposição. (neste sentido, podem consultar-se, entre outros, os acórdãos proferidos nos processos n.º 0840/12 em 28 de Novembro de 2012, n.º 0255/12 em 26 de Abril de 2012; n.º 0867/11, de 21 de Março de 2012; n.º 802/11 de 25 de Janeiro de 2012; ou n.º 0242/11 em 14 de Setembro de 2011)
Como sumariza o STA, no acórdão proferido no processo n.º 0867/11 de 21 de Março de 2012, em sentido que acompanhamos:
“I- Se as execuções são autuadas em diferentes processos, a oposição deduzida numa delas não pode projectar os seus efeitos processuais nas demais, sem que as execuções sejam reunidas num único processo.
II- Apesar da oposição ter a natureza de contra-acção, o nexo funcional que une a oposição à acção executiva impede que uma só oposição possa servir de instrumento para obstar a eficácia de títulos executivos diversos daquele que fixou o fim e os limites da acção.
III- O juiz não viola o poder de conformação do processo estabelecido no artigo 265.º do CPC, se não ordena ao órgão de execução fiscal a apensação das execuções, uma vez que a autoria desse acto não é da sua competência.
IV- A oposição a execuções processadas autonomamente constitui uma excepção dilatória inominada”.
E no Acórdão n.º 0802/11 de 25 de Janeiro de 2012, como noutros, o mesmo STA explica ainda que:
“I- Porque a oposição à execução fiscal, embora com tramitação processual autónoma, funciona como uma contestação à execução fiscal, não pode aquele que foi citado em várias execuções fiscais que não se encontram apensadas deduzir uma única oposição, ainda que os fundamentos por que se opõe sejam os mesmos;
II- Nessa situação, a instauração de uma única oposição constitui excepção dilatória inominada, a determinar o indeferimento liminar da petição inicial ou a absolvição da instância, consoante seja verificada em fase liminar ou na sentença (arts. 234.º-A, n.º 1, 288.º, n.º 1, alínea e), 493.º, n.ºs 1 e 2, 495.º e 660.º, n.º 1, todos do CPC);
III- No entanto, sempre pode o oponente prevalecer-se do disposto nos arts. 234.º-A e 476.º do CPC, se houve indeferimento liminar ou do disposto no art. 289.º do CPC, se houve absolvição da instância.
IV- Relativamente aos pressupostos processuais que visam acautelar, não o interesse das partes, mas o interesse público da boa administração da justiça, não pode funcionar o princípio contido no n.º 3 do art. 288.º do CPC.” (sublinhados e destaques nossos, refira-se que o acórdão citado se reporta à anterior versão do CPC; mas invoca artigos cujo conteúdo, embora sob nova numeração, não sofreu alteração).
Acompanhando a jurisprudência citada e aplicando-a ao caso dos autos, conclui-se que o Oponente não pode deduzir uma só oposição contra os aludidos processos.
O mesmo é dizer que a forma de reacção adequada é a oposição separada em relação a cada uma das execuções fiscais, e não uma oposição conjunta às mesmas
Desta forma, conclui-se que a dedução de uma única oposição constitui uma razão obstativa do conhecimento do mérito e, como tal, uma excepção dilatória, nos termos do disposto no artigo 576.º do CPC, inominada, por não constar do elenco meramente exemplificativo do artigo 577.º do mesmo diploma legal.
Tal excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, obsta a que o Tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância (cf. artigos 278.º n.º 1 alínea e), 576.º, n.º 2 e 578.º do CPC, aplicáveis por remissão do artigo 2.º alínea e) do CPPT).
No caso vertente, atenta a fase liminar em que os autos se encontram, a verificação de tal excepção dilatória deverá conduzir ao indeferimento liminar da petição em análise.
Saliente-se que, com a presente decisão, não se denega o acesso do Oponente ao direito e aos Tribunais, porquanto este pode, nos termos do disposto no artigo 560.º do CPC, deduzir oposições autónomas.
Transpondo para o caso vertente, o Oponente pode deduzir oposições autónomas contra os doze processos de execução fiscal em causa, no prazo aí estabelecido (aproveitando para rever, se assim o entender, os fundamentos invocados), sendo as mesmas consideradas interpostas na data da apresentação da petição inicial desta oposição».

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2.2 DE FACTO E DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR – A REJEIÇÃO LIMINAR DA PETIÇÃO INICIAL

O ora Recorrente deduziu oposição contra 18 execuções fiscais, que identificou, das quais o órgão da execução fiscal informou existirem apenas 12 (dúvida que não foi esclarecida nos autos, como se impunha, tanto mais que, apesar daquilo que se nos afigura serem meros lapsos de escrita na identificação das execuções fiscais efectuadas no intróito da petição inicial, estas serão as que constam do ofício, de que o Oponente juntou cópia com a petição inicial como documento 1, que o Serviço de Finanças de Cascais-2 lhe remeteu sob o n.º 010927, com data de «2016-12-14» e sob o assunto «Citação nos termos do art. 233.º do CPPT», como o Oponente esclareceu a fls. 61).
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, com o fundamento de que da informação prestada pelo órgão da execução fiscal nos termos do art. 208.º do CPPT «resulta que os processos de execução fiscal a que se reporta a presente oposição não se encontram apensados entre si, o que constitui uma excepção dilatória inominada», ordenou a notificação do Oponente «para, no prazo de 10 dias querendo, indicar relativamente a que processo de execução fiscal pretende que os autos prossigam e para se pronunciar sobre a excepção suscitada, a qual obsta ao conhecimento do mérito da causa» (cfr. despacho de fls. 144).
Em resposta, o Oponente veio dizer que «os processos que pretende ver apreciados são os que constam em doc. 1.// Porquanto a AT desmultiplica os processos o que dificulta a defesa aos oponentes sobretudo pelos valores e custos» (cfr. fls. 149).
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra solicitou ao Serviço de Finanças de Cascais-2 que informasse «documentada e fundamentadamente quais as razões que justificam a “insusceptibilidade” de apensação, invocada na informação de fls. 94, dos Processos de Execução Fiscal a que se reportam os presentes autos», bem como «se a tal nada obstar, que proceda à sua apensação e informe os presentes autos» (cfr. despacho de fls. 152).
Em resposta a essa solicitação, o órgão da execução fiscal, depois de tecer diversos considerandos, entendeu que «[d]evem manter-se os processos inalterados, sem procedimentar sobre os mesmos qualquer tipo de apensação processual».
Desse entendimento do Serviço de Finanças de Cascais-2 foi dado conhecimento ao Oponente pelo Tribunal, que também ordenou de novo a notificação do Oponente «para, no prazo de 10 dias querendo, indicar relativamente a que processo de execução fiscal pretende que os autos prossigam e para se pronunciar sobre a excepção suscitada, a qual obsta ao conhecimento do mérito da causa» (cfr. despacho de fls. 163).
O Oponente veio reiterar que «pretende que prossigam sobre todos os processos, pois infelizmente a AT desfaz e desmultiplica os processos em processos em vários e como consequência os impugnantes teriam que recorrer dos vários processos importando custos», mais invocando que esse comportamento «não poderá existir e que os tribunais terão de ser chamados a decidir» (cfr. requerimento de fls. 165).
De seguida, a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra proferiu o despacho transcrito em 2.1.2, de indeferimento liminar da petição inicial. Em síntese, considerou que a oposição vinha deduzida contra execuções fiscais que não se encontravam apensadas (na decisão recorrida considera-se que são 12 execuções fiscais, mas, como dissemos, não se esclareceu se não serão antes as 18 acima referidas, ainda que na petição inicial possa existir lapso de escrita quanto à sua identificação), o que constitui excepção dilatória inominada, a determinar o indeferimento liminar da petição inicial, tudo nos termos do disposto nos arts. 576.º, 578.º e 590.º, n.º 1, do CPC, aplicável subsidiariamente.
O Oponente discordou desse entendimento e, por isso, recorreu do despacho de rejeição liminar. Se bem interpretamos as alegações de recurso e respectivas conclusões, sustenta que, ao invés do decidido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, deve ser admitida a oposição relativamente a todas as execuções fiscais, insurgindo-se contra a circunstância de o órgão da execução fiscal “desmultiplicar” os processos de execução fiscal. Ou seja, é inequívoco que o Oponente pretende a apensação das execuções fiscais.
Cumpre, pois, verificar se a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra decidiu correctamente ao rejeitar in limine a petição inicial de oposição à execução fiscal, o que passa por indagar se podia considerar definitivamente estabelecida a impossibilidade de apensação das execuções fiscais.

2.2.2 DO INDEFERIMENTO LIMINAR – DA APENSAÇÃO DAS EXECUÇÕES FISCAIS

Como é sabido, o indeferimento liminar só terá lugar quando for de todo impossível o aproveitamento da petição inicial, uma vez que o princípio da pronúncia sobre o mérito se sobrepõe a questões formais que não interfiram e ponham em causa o mesmo. Assim, o despacho de indeferimento liminar só admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório (Princípio do contraditório, hoje entendido, não na sua dimensão negativa, de direito de defesa, oposição ou resistência à actuação alheia, mas na sua dimensão positiva, de direito de influir activamente, no desenvolvimento e no êxito do processo, é um dos mais elementares princípios que enformam todo o direito adjectivo e também o processo tributário. Para maior desenvolvimento quanto ao princípio do contraditório, designadamente com aprofundados considerandos de natureza doutrinal e citação de jurisprudência, vide o seguinte acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 3 de Março de 2010, proferido no processo n.º 63/10, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/1f4bfa574b6a7515802576e10040e44b.) (cfr. art. 3.º, n.º 3, do CPC) e inútil qualquer instrução e discussão posterior, isto é, «quando o seguimento do processo não tenha razão alguma de ser, seja desperdício manifesto de actividade judicial» ( Cfr. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, vol. II, pág. 373.).
Daí que a jurisprudência tenha vindo a afirmar que o despacho de indeferimento liminar, dada a sua natureza “radical”, na medida em que coarcta à partida toda e qualquer expectativa de o autor ver a sua pretensão apreciada e julgada, encontrando a sua justificação em motivos de economia processual, deve ser cautelosamente decretado (Neste sentido, entre muitos outros e por mais recentes, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 9 de Agosto de 2017, proferido no processo n.º 927/17, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/9f99540e3f3d0d2e8025817f0032803e;
- de 19 de Setembro de 2018, proferido no processo n.º 350/18, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/afb23f359fab0977802583120050a7d7;
- de 17 de Outubro de 2018, proferido no processo n.º 646/17.8BEAVR (121/18), disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/e959fb7614ed2abf8025832e003aca97.).
Afigura-se-nos que no caso sub judice não estão verificados os requisitos para a rejeição liminar da petição inicial. Vejamos:
Como a mais recente jurisprudência deste Supremo Tribunal (Vide, entre outros, os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 11 de Janeiro de 2017, proferido no processo n.º 54/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8d68bee6de05a055802580a7003bc29f;
- de 21 de Junho de 2017, proferido no processo n.º 883/14, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/c6058ea75887d01a8025814c004938b9;
- de 11 de Abril de 2018, proferido no processo n.º 1027/17, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/985f8a0346f29b15802582790049b5a2;
-de 4 de Outubro de 2018, proferido no processo n.º 373/17, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/cf40d9853dba91b0802581b4004eb9bb;
- de 7 de Novembro de 2018, proferido no processo n.º 490/18 (1762/17.1BEPRT), disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/a9d19c898d3d6633802583430043403c..) tem vindo a afirmar, a apensação de diversas execuções que corram contra o mesmo executado, deve ser apreciada e decidida pelo órgão de execução fiscal, oficiosamente ou logo que tal questão seja suscitada pelo executado no processo de execução fiscal ou num dos seus apensos, nos termos do disposto no art. 179.º do CPPT; mais do que isso, nalgumas situações em que não houve decisão de apensação, mas a tramitação dos processos seguiu como se a tivesse havido, deverá admitir-se a dedução de uma única oposição deduzida contra mais do que uma execução fiscal.
Seja como for, no caso dos autos, sendo inquestionável que a questão da apensação foi suscitada, a Juíza do Tribunal a quo, ao invés de ordenar inequivocamente ao órgão da execução fiscal que a apreciasse e decidisse, ficou-se pelo pedido de informação sobre «quais as razões que justificam a “insusceptibilidade” de apensação invocada na informação de fls. 94, dos processos de execução fiscal a que se reportam os presentes autos». É certo que também ordenou que «se a tal nada obstar, que [o órgão da execução fiscal] proceda à sua apensação e informe os presentes autos», o que levou o Serviço de Finanças de Cascais-2 a tecer alguns considerandos impertinentes.
Salvo o devido respeito, o que o Tribunal a quo deveria ter ordenado, de acordo com a jurisprudência deste Supremo Tribunal, é que o órgão da execução fiscal decidisse a pretendida apensação das execuções fiscais e não, como ordenou, que se limitasse a informar sobre se entende possível tal apensação.
Porque o não fez e porque o Serviço de Finanças de Cascais-2 também não decidiu essa questão e se limitou a informar sobre os motivos por que entende que a apensação não é possível, não pode ter-se como estabelecida a impossibilidade de apensação.
Assim, cumpre revogar o despacho recorrido e ordenar a devolução dos autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, o qual deverá ordenar ao Serviço de Finanças de Cascais-2 que decida sobre a pretensão do Oponente, de apensação das execuções fiscais – que deve reportar-se a todas as que são referidas no ofício com cópia a fls. 12 dos autos – e, depois, notificar dessa decisão o aqui Oponente e Recorrente, notificação que, designadamente, deverá indicar ao Executado que pode reclamar da decisão ao abrigo do disposto no art. 276.º do CPPT, como impõe o n.º 2 do art. 36.º do CPPT.
Salvo o devido respeito, a posição assumida pela Procuradora-Geral Adjunta não pode ser acolhida, pela simples razão de que não houve ainda decisão do órgão da execução fiscal sobre a pretendida apensação de execuções fiscais e, por isso, contrariamente ao sustentado no parecer, também o ora Recorrente não teve possibilidade de com ela se conformar ou contra ela reagir contenciosamente.
Por tudo o que deixámos dito, o recurso será provido, o despacho recorrido será revogado e os autos regressarão ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, o qual, se a tal nada mais obstar, deverá proferir despacho a ordenar ao Serviço de Finanças de Cascais-2 que profira decisão sobre a pretendida apensação de execuções fiscais.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - A apensação de diversas execuções que corram contra o mesmo executado, nos termos do disposto no artigo 179.º do CPPT, deve ser conhecida pelo órgão de execução fiscal, oficiosamente ou logo que tal questão seja suscitada pelo executado no processo de execução fiscal ou num dos seus apensos.
II - Conhecida a questão, ainda que a mando do juiz que apreciou a petição inicial de oposição deduzida contra várias execuções fiscais não apensadas, impõe-se que seja proferida decisão pelo órgão da execução fiscal – e não a prestação de uma mera informação – e que essa decisão seja notificada ao executado, com respeito pelo n.º 2 do art. 36.º do CPPT, designadamente com a indicação de que o executado dela pode reclamar nos termos do art. 286.º do CPPT.
III - Não tendo sido proferida essa decisão, não pode o juiz do tribunal tributário indeferir liminarmente a petição inicial com fundamento na impossibilidade de dedução de uma única oposição contra execuções fiscais não apensadas.

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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e ordenar que os autos regressem à 1.ª instância, para aí ser proferido despacho nos termos supra referidos.

Custas pelo Recorrente, que, na ausência de parte vencida, é quem retira proveito da decisão (cfr. art. 527.º do CPC), sem prejuízo do decidido quanto ao apoio judiciário (cfr. fls. 178).


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Lisboa, 23 de Janeiro de 2019. – Francisco Rothes (relator) – Aragão Seia – Dulce Neto.