Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00177/13.5BEMDL |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 02/16/2023 |
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Tribunal: | TAF de Mirandela |
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Relator: | Ana Patrocínio |
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Descritores: | CRÉDITOS VENCIDOS APÓS DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA; ILEGALIDADE DA INSTAURAÇÃO DA EXECUÇÃO FISCAL, ENCERRAMENTO DA ACTIVIDADE DO ESTABELECIMENTO; ADMINISTRADOR DA INSOLVÊNCIA; |
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Sumário: | I - Nada obsta a que após a declaração de insolvência sejam instauradas execuções fiscais contra a sociedade insolvente, possibilidade que constitui um regime especial para os processos de execução fiscal (afastando a regra geral do artigo 88.º, n.º 1, do CIRE), sendo que - se para cobrança de créditos vencidos antes da declaração de insolvência, deverão ser imediatamente sustadas e avocadas pelo tribunal judicial para apensação ao processo de insolvência (artigo 180.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT, e artigo 85.º, n.ºs 1 e 2, do CIRE); - para cobrança de créditos vencidos após a declaração de insolvência, prosseguindo a execução, mas apenas se forem penhorados bens não apreendidos no processo de insolvência (artigo 180.º, n.º 6, do CPPT, interpretado tendo em conta a unidade do sistema jurídico, como imposto pelo artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil). II - A declaração de insolvência não determina a sustação da execução fiscal instaurada para cobrança de crédito vencido posteriormente – cfr. artigo 180.º, n.º 6, do CPPT. III - O crédito decorrente de facto tributário ocorrido antes da declaração de insolvência, mas que só foi determinado posteriormente, constitui crédito vencido após a declaração de insolvência, para os efeitos do disposto no artigo 180.º, n.º 6, do CPPT. IV - A declaração de insolvência priva o insolvente dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência (artigo 81.º, n.º 1 do CIRE). V - O administrador de insolvência fica investido nas vestes de administrador de facto, assumindo a gestão da massa insolvente, tarefa que exerce pessoalmente, arcando ainda com a representação do devedor em todos os assuntos com carácter patrimonial que importem à insolvência.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório A Representação da Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, proferida em 04/04/2017, que julgou procedente a oposição deduzida pela MASSA INSOLVENTE DE “A, LDA.”, representada por "BB", administradora de insolvência nomeada no Processo de Insolvência de pessoas colectivas n.º 17/12.... da Secção única do Tribunal Judicial da Comarca de ..., contra o Processo de Execução Fiscal n.º ...11, instaurado pelo Serviço de Finanças ..., para cobrança de dívida de IVA de 2010 e 2011 (três primeiros trimestres), no montante global de €143.836,88. A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “I. Nos autos à margem melhor identificados, foi proferida sentença, julgando a oposição judicial procedente e, em consequência, de harmonia com o pedido formulado pela OPONENTE, extinguindo a execução fiscal, aresto contra o qual vem dirigido o presente recurso jurisdicional. II. Para tanto, o Tribunal a quo entendeu que, sendo a EXECUTADA uma sociedade comercial declarada insolvente, a execução fiscal não poderia contra ela prosseguir, por inexistirem bens penhorados, antes ou depois da declaração de insolvência, e por inexistirem bens penhoráveis adquiridos após a declaração de insolvência. III. Contudo, sempre com elevado e devido respeito por melhor opinião, que é muito, e com a devida vénia, a douta sentença sob recurso cometeu clamoroso erro de julgamento, motivado pela imprecisa fixação da matéria de facto que, com interesse para a decisão, julgou provada e por errada interpretação e aplicação do direito, tudo em claro prejuízo da FAZENDA PÚBLICA. IV. Por um lado, na fixação da matéria de facto que, com interesse para a decisão, julgou provada, o Tribunal a quo não fez qualquer menção à data em que ocorreu o vencimento das dívidas em execução fiscal, facto determinante para saber qual o regime jurídico aplicável ao caso. V. Assim, a redacção do facto 2., da douta sentença sob recurso, deveria ter a seguinte redacção, que desde já se sugere: Em 26/2/2013 o SF de ... instaurou execução fiscal n.° ...11 contra a sociedade “A, LDA.”, NIF ..., por dívidas de IVA de 2010 (quatro trimestres) e de 2011 (três primeiros trimestres), no valor global de 142.964,81€, cujo termo final do prazo legal de pagamento ou data de vencimento ocorreu a 31-01-2013 - Fls. 30 dos autos e PA; VI. Por outro lado, o facto 4. deveria ser expurgado da matéria de facto que foi julgada provada, porque o seu conteúdo é absolutamente irrelevante para a determinação do regime jurídico aplicável ao caso. VII. Tanto bastaria para que o Tribunal a quo tivesse constatado que, se o termo final do prazo legal de pagamento dos tributos subjacentes às dívidas em execução ou a data do seu vencimento ocorreu em 3 1-01-2013 e a EXECUTADA foi declarada insolvente 09-03-2012, estávamos em presença de uma execução fiscal instaurada para cobrança coerciva de (...) créditos vencidos após a declaração de falência (...). VIII. E que, estando em presença de uma execução fiscal instaurada para cobrança coerciva de (...) créditos vencidos após a declaração de falência (...), tinha aplicação o disposto no artigo 180.°, n.° 6, do CPPT, que, derrogando o regime dos efeitos da declaração de insolvência no processo de execução fiscal, contido nos n.°s 1 a 5 do mesmo artigo, determinava que a execução fiscal deveria prosseguir os seus termos normais até à extinção. IX. Devendo a expressão (...) prosseguir os seus termos normais até à extinção (...) ser interpretada no sentido de, quanto à EXECUTADA, só poderem ser praticados actos de execução em bens não apreendidos à ordem do processo de insolvência, o que significa em bens que a EXECUTADA tivesse adquirido após a declaração da sua insolvência, já que os bens adquiridos antes dessa data ficam sempre e imediatamente apreendidos à ordem do processo de insolvência. X. Isto, sem prejuízo de, em face da inexistência absoluta de bens penhoráveis na esfera da EXECUTADA, a execução fiscal poder ainda prosseguir contra os devedores solidários ou reverter contra responsáveis tributários subsidiários. XI. Se, ainda assim, não fosse possível obter o pagamento da totalidade ou parte dos créditos exequendos, sempre a execução fiscal seria de declarar em falhas, nos termos do artigo 272.°, n.º 1, alínea a), do CPPT, podendo ainda prosseguir, em data posterior, logo que o OEF tivesse conhecimento da existência de bens penhoráveis na esfera da EXECUTADA, dos responsáveis solidários ou dos responsáveis subsidiários, como se retira do artigo 274.° do mesmo código. XII. Em qualquer circunstância, porém, nunca a declaração de insolvência tem como efeito a extinção de processos de execução fiscal instaurados ou a instaurar contra a pessoa, singular ou colectiva, declarada insolvente, sejam por créditos vencidos antes ou após a declaração de insolvência, apenas sendo susceptível, por diversas formas, de afectar a sua normal tramitação. XIII. Donde, ao considerar que, por não existirem bens penhorados à EXECUTADA, fosse antes ou depois da declaração da sua insolvência, e por não existirem bens penhoráveis, adquiridos pela EXECUTADA após a declaração da sua insolvência, a execução fiscal era de extinguir, a douta sentença sob recurso incorreu em clamoroso erro de julgamento, por equivoca interpretação e aplicação do Direito, não podendo, por isso, manter-se indemne na ordem jurídica. XIV. Não merecendo qualquer censura a actuação do OEF, que, constatando ter instaurado uma execução fiscal contra uma sociedade comercial declarada insolvente e em cumprimento do que dispõe o artigo 156.° do CPPT, ordenou a citação na pessoa da Administradora da Insolvência. NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO, QUE HÃO-DE SER POR V. EX.AS, COM CERTEZA DOUTAMENTE SUPRIDOS, DEVERÁ O PRESENTE RECURSO, DEPOIS DE ADMITIDO, OBTER PROVIMENTO E, EM CONSEQUÊNCIA, ANULAR-SE A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA E, EM SEU LUGAR, PROFERIR-SE OUTRA, QUE, JULGANDO A OPOSIÇÃO JUDICIAL TOTALMENTE IMPROCEDENTE, MANTENHA, NA ORDEM JURÍDICA, O PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL N.° 2399201301000411 CONTRA A “A, LDA.”, BEM COMO A CITAÇÃO EFECTUADA NA PESSOA DA ADMINISTRADORA DA INSOLVÊNCIA. PORQUE, ASSIM DECIDINDO, FARÃO V. EX.AS, DE FORMA SÃ, SERENA E OBJECTIVA, COMO A ISSO JÁ NOS ACOSTUMARAM, A ALMEJADA JUSTIÇA.” **** A Recorrida contra-alegou, tendo concluído da seguinte forma: I. A dívida tributária reclamanda por parte do SF ... refere-se a “…dividas de IVA de 2010 (quatro trimestres) e de 2011 (três primeiros trimestres), no valor global de 142.964,81 €… “; II. As dívidas de IVA trimestralmente apuradas tal como se verificava nas obrigações declarativas e de pagamento da insolvente vencem-se, no caso de tributos que devem ser autoliquidados, não apenas no vencimento da obrigação de apresentar a declaração periódica, como na obrigação de liquidar o montante devido e enviar o respectivo meio de pagamento, sem qualquer necessidade de interpelação; III. Verificando-se, in casu, que as dívidas de IVA se constituíram nos trimestres 1 a 4 de 2010 e 1 a 3 de 2011, o prazo de vencimento destas obrigações decorreu já nos anos de 2010 e, no caso de 2011, em 15.11.2011; IV. A sentença que decretou a insolvência da devedora data de 09.03.2012, razão pela qual, à data da declaração da insolvência e no caso dos tributos IVA, as dívidas fiscais encontravam-se vencidas e assim sendo, a aplicação do n.º 6 do art.º 180.º do CPPTributário como o pretende a recorrente AT não encontra campo de actuação nas circunstâncias factuais a que se reporta a questão subjacente aos presentes autos; V. Entrou em vigor no pretérito dia 20.05.2012 o CIRE renovado pela Lei n.º 6/2012, de 20 de Abril, diploma renovador aplica-se a todos os processos em curso à data da entrada em vigor do diploma nos termos do art.º 6.º da Lei n.º 6/2012, de 20 de Abril; VI. Actualmente e nos termos do disposto no art.º 65.º do CIRE e tendo em atenção que a Administradora da Insolvência cumpriu a sua obrigação declarativa no sentido da comunicação do encerramento do estabelecimento e que foi deliberado na Assembleia de Credores o encerramento do estabelecimento da devedora, deverá ser levada em linha de conta a prerrogativa/comunicação oficiosa a que faz referência o art.º 65.º, n.º 3 do CIRE actualizado, com a cominação expressa dirigida à Administração Fiscal no sentido da ANULAÇÃO de todo o expediente executivo dirigido contra a massa desde os momentos supra referidos; VII. Por outro lado, a massa insolvente não pode ser destinatária do procedimento executivo emergente dos tributos que constam do título executivo a sua execução a um acto ilegal, sendo, por isso, parte ilegítima, já que, encontrando-se notificada para a necessidade de pagamento de valores emergentes de liquidações de impostos/IVA dos anos de 2010 a 2011, o processo executivo deverá ser objecto de anulação e extinção, porquanto a sentença de declaração de Insolvência foi produzida em DATA MUITO POSTERIOR AO DECURSO DOS FACTOS TRIBUTÁRIOS PELOS QUAIS A RESPONDENTE SE ENCONTRA A SER EXECUTADA; VIII. Contra a insolvente e durante o decurso do processo de insolvência não pode ser instaurado qualquer procedimento executivo; IX. A tal obsta, expressa, taxativa e vinculisticamente, o disposto no art.º 88.º, n.º 1 do CIRE e não nos encontramos no âmbito da execução de dívidas da massa insolvente que possam ser actuadas nos termos do disposto no art.º 89.º do CIRE; X. Revelar-se-ia manifestamente desproporcional que o processo de insolvência fosse colocado em pé de igualdade com a actividade fiscal, servindo apenas para a Fazenda Nacional actuar na mera posição de reclamante dos seus créditos, mais a mais privilegiados, sem atender à particular condição dos demais credores e da insolvência; XI. Em caso de declaração de insolvência, as normas fiscais cedem perante a prevalência das normas que regulam o processo de insolvência e não existe nesta linha de entendimento qualquer divergência ou incompatibilidade entre as normas do CIRE e as normas da Lei Geral Tributária/LGT e do Código de Procedimento e de Processo Tributário/CPPT, já que o carácter indisponível destas normas, encontrando o seu fundamento no princípio da legalidade da administração tributária nas suas relações com os devedores, terá de se reduzir à concepção de que, atenta a especificidade do processo de insolvência e a tendencial igualdade dos credores do insolvente, NÃO devem ser invocadas de modo a postergar a auto-regulação dos credores; XII. Os normativos processuais tributários têm o seu campo de aplicação na relação tributária, em sentido estrito, não encontrando apoio no contexto do processo especial como é o processo de insolvência, onde o Estado deve intervir também com o fito de contribuir para uma solução, se essa for a vontade dos credores, numa perspectiva ampla de auto-regulação e de desjudicialização; XIII. Logo e porque a insolvência da ora respondente foi decretada em data POSTERIOR ao período tributário de vencimento das dívidas de onde emana a liquidação que deu origem à execução e a própria Administradora da Insolvência apenas iniciou a sua função nos presentes autos por despacho datado daquela data e porque no momento dos factos tributários agora em execução já o Serviço de Finanças e o Ministério Público tinham não só conhecimento da declaração da insolvência como, aliás, sabiam da sua obrigação em reclamar os seus créditos nos termos do disposto nos art.ºs 128.º e seguintes do CIRE; XIV. A satisfação do crédito em causa apenas poderá ser realizada na sequência da sua reclamação a operar nos termos do disposto no art.º 146.º, n.º 2, alínea b), 2.ª parte do diploma em citação e por parte do Digno Magistrado do Ministério Público em representação do Estado; XV. A massa insolvente não pode sobrestar-se ao espírito da lei no sentido do pagamento do tributo devido no âmbito dos autos executivos supra referidos, já que apenas podem ser objecto de pagamento os créditos que se encontrarem reconhecidos por sentença de verificação e graduação de créditos nos termos do art.º 173.º do CIRE; XVI. A eventual imposição dirigida à massa insolvente/Administradora da Insolvência no sentido de ter de suportar o imposto objecto da execução obriga-a a um acto ilegal, ou seja, a proceder ao pagamento de um valor não reclamado, reconhecido e graduado no processo de insolvência; XVII. A pretensão da recorrente AT viola, por conseguinte e para além do disposto no art.º 180.º, n.º 6 do CPPT bem assim como o disposto nos art.ºs 146.º, n.º 2, alínea b), 2.ª parte e 173.º do CIRE ; XVIII. Pugnando-se pela manutenção da sentença recorrida, por legal e JUSTA !” **** O Ministério Público junto deste Tribunal, em face da alegação de recurso de imprecisa fixação da matéria de facto, emitiu parecer pugnando pela remessa dos autos ao TAF de Mirandela, para que aí seja proferida nova decisão da matéria de facto. **** Tendo-se afigurado que este tribunal poderia vir a conceder provimento ao recurso e, na eventualidade de assim ser, haver que fazer apelo ao disposto no artigo 665.º do CPC, dado que o Tribunal Central Administrativo deve proceder à apreciação das questões que o tribunal recorrido considerou prejudicadas pela solução que encontrou para o litígio, se dispuser dos elementos necessários para tal, tendo em vista conhecer em substituição ao tribunal recorrido, notificou-se cada uma das partes, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 665.º, n.º 3 do CPC. Nenhuma emitiu pronúncia. **** Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; submete-se o processo à Conferência para julgamento. **** II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa analisar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento da matéria de facto, e, consequentemente, de direito, ao acolher a invocada ilegalidade da instauração da execução fiscal na sequência de declaração da insolvência da sociedade executada. III. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “Factos provados: 1. Por sentença de 9/3/2012 a sociedade “A, LDA.”, NIF ..., foi declarada insolvente – Fls. 60/v; 2. Em 26/2/2013 o SF de ... instaurou execução fiscal n.º ...11 contra a sociedade “A, LDA.”, NIF ..., por dívidas de IVA de 2010 (quatro trimestres) e de 2011 (três primeiros trimestres), no valor global de 142.964,81 € – Fls 30 dos autos e PA; 3. A sociedade identificada foi citada em 12/4/2013 – Fls. 30 dos autos e última fl. do PA (não numerada); 4. No processo de execução fiscal em referência não foram penhorados quaisquer bens – cfr, à contrário, informação de fls. 30 dos autos, e, também à contrário, PA, constituído por 30 fls. numeradas sequencialmente e 4 fls. finais não numeradas ( apesar da 3ª fl. destas fls. finais conter o n.º 31).” * Pela sua pertinência para o conhecimento do presente recurso, indo ao encontro da solicitação da Recorrente, e uma vez que consta da cópia do processo de execução fiscal apensa a correspondente prova documental, reformula-se o ponto 2 do probatório, nos termos do artigo 662.º, n.º 1 do Código de Processo Civil [cfr. conclusões IV e V das alegações do recurso]: 2. Em 26/2/2013 o SF de ... instaurou execução fiscal n.º ...11 contra a sociedade “A, LDA.”., NIF ..., por dívidas de IVA de 2010 (quatro trimestres) e de 2011 (três primeiros trimestres), no valor global de 142.964,81 €, que tiveram como data limite de pagamento voluntário 31/01/2013 – cfr. todas as certidões de dívida ínsitas a fls. 02 a 28 da cópia do processo de execução fiscal apensa autos. O ponto 4 do probatório encerra matéria de conhecimento oficioso, pois decorre da análise do processo de execução fiscal (cfr. artigo 412.º do Código de Processo Civil). Na medida em que tal factualidade se apresentou fulcral no julgamento realizado pelo tribunal recorrido, não vislumbramos motivo para a eliminar da decisão da matéria de facto, desatendendo, portanto, o pedido formulado pela Recorrente – cfr. conclusão VI das alegações do recurso. 2. O Direito A Recorrente não se conforma com o julgamento de procedência da presente oposição, o que, consequentemente, significa a extinção do processo de execução fiscal objecto da mesma, por considerar que em circunstância alguma a declaração de insolvência tem como efeito a extinção de processos de execução fiscal. A sentença recorrida considerou ter ficado prejudicado o conhecimento de outras questões com o seguinte julgamento: “(…) Ora no processo de execução fiscal a que os autos se reporta, após (ou antes) da declaração de falência da sociedade não foram penhorados quaisquer bens - pelo que a execução não pode prosseguir contra a executada. Por outro lado, não tendo sido alegado (e muito menos provado), nem constando dos autos ou do PA, que a falida tivesse adquirido qualquer bem, também não se pode considerar que a execução em apreço seja uma “nova execução” para efeitos da aplicação do disposto no n.º 5 do art.º 180.º do CPPT. (…)” Como consta da decisão da matéria de facto, demos acolhimento à necessidade de esclarecer a data limite de pagamento voluntário das dívidas em apreço. Salientamos que, apesar de tal decisão recorrida se mostrar incompleta, o Meritíssimo Juiz “a quo” assumiu no seu julgamento que as dívidas exequendas eram posteriores à data de declaração da insolvência da sociedade executada. Analisado o teor das contra-alegações do recurso, percepciona-se, agora ainda com mais clareza, que a construção jurídica plasmada na oposição judicial assenta na ideia de que o processo executivo deverá ser objecto de anulação e extinção, porquanto a sentença de declaração de insolvência foi produzida em data muito posterior ao decurso dos factos tributários pelos quais a Recorrida se encontra a ser executada, sustentando que a declaração da insolvência da devedora importa o vencimento imediato das suas obrigações, ainda que não vencidas ou em pagamento à data da sentença declaratória, aludindo ao disposto no artigo 91.º, n.º 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE). Para cabal enquadramento da realidade em discussão nos autos, crê-se pertinente ter presente o exposto no Acórdão do STA, de 29/02/2012, proferido no âmbito do processo n.º 0885/11, onde se aponta que: “(…) Nos termos do n.º 1 do art. 180.º do CPPT, «proferido o despacho judicial de prosseguimento da acção de recuperação da empresa ou declarada falência, serão sustados os processos de execução fiscal que se encontrem pendentes e todos os que de novo vierem a ser instaurados contra a mesma empresa, logo após a sua instauração». No entanto, esta disposição não se aplica «aos créditos vencidos após a declaração de falência ou despacho de prosseguimento da acção de recuperação da empresa» que, nos termos do disposto no n.º 6 do mesmo art. 180.º, «seguirão os termos normais até à extinção da execução». Embora o preceito se refira à falência ou recuperação de empresa, «[o] mesmo regime deverá aplicar-se à declaração de insolvência, por força do redireccionamento das remissões imposto pelo art. 11.º do DL n.º 53/2004» (JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume III, anotação 7 ao art. 180.º, pág. 323.), diploma que aprovou o CIRE. Por sua vez, o art. 88.º, n.º 1, do CIRE (Diz o art. 88.º, n.º 1, do CIRE: «A declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência; porém, se houver outros executados, a execução prossegue contra estes». Anteriormente, também o art. 154.º, n.º 3, do Código de Processos Especiais de Recuperação de Empresas e de Falência (CPEREF) estabelecia que «a declaração de falência obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva contra o falido». O CPEREF, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de Abril, foi revogado pelo art. 10.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, que aprovou o CIRE, determina a suspensão de todas as execuções fiscais instauradas contra o devedor e todas as diligências de acções executivas que atinjam o seu património, bem como proíbe a instauração de novas execuções. Verifica-se, pois, uma contradição entre os referidos preceitos legais: enquanto o art. 88.º, n.º 1, do CIRE, não admite a instauração ou prosseguimento de execuções contra o insolvente após a declaração de insolvência, o art. 180.º do CPPT, quer no seu n.º 1, quer no seu n.º 6, admite-as. (Também a admite no n.º 5, mas aí a situação é diferente, pois o processo de falência já estará findo. A possibilidade prevista no n.º 5 – de continuação das execuções fiscais já instauradas contra o falido ou responsáveis subsidiários ou de instauração de novas execuções fiscais – tem aí como pressuposto a ulterior aquisição de bens pela falido os pelos responsáveis subsidiários.). Tratando-se de disposições literalmente contraditórias, há que procurar harmonizá-las, tendo nomeadamente em conta a unidade do sistema jurídico, elemento primacial da interpretação jurídica (art. 9.º, n.º 1, do Código Civil) (Diz o n.º 1 do art. 9.º do CC: «A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada»). JORGE LOPES DE SOUSA Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume III, anotação 7 ao art. 180.º, pág. 324 indica-nos a melhor interpretação: «Os novos processos relativos a dívidas vencidas antes da prolação do despacho de prosseguimento da acção de recuperação de empresa ou de declaração de falência ou insolvência deverão ser também avocados pelo tribunal competente e enviados pelos tribunais fiscais. O mesmo não sucede, porém, com os processos de execução relativos a créditos vencidos após a declaração de falência ou despacho de prosseguimento da acção de recuperação da empresa, que, nos termos do n.º 6 deste art. 180.º, do CPPT, seguirão os termos normais até à extinção da execução. No entanto, quanto a estes processos, apesar de aqui se referir o seu seguimento nos termos normais, deverá entender-se este seguimento em consonância com as normas do CPEREF e do CIRE, sob pena de se abrir a porta à possibilidade de se inutilizar todo o esforço de recuperação da empresa e de satisfação equilibrada dos direitos dos credores que se visa com estes processos especiais, o que seria uma solução manifestamente desacertada, atentos os fins de interesse público e social estão subjacentes àqueles», pelo que: «[…] a interpretação razoável daquele n.º 6, que se compagina com a unidade do sistema jurídico, que é o elemento primacial da interpretação jurídica (artigo 9.º, n.º 1 do Código Civil), é a de que só será viável o prosseguimento dos processos de execução fiscal por créditos vencidos após a declaração de falência ou insolvência ou do despacho de prosseguimento da acção de recuperação da empresa se forem penhorados bens não apreendidos naqueles processos de falência ou recuperação ou insolvência». Assim, concluímos que é possível a instauração de novas execuções fiscais após a declaração de insolvência, sendo que, - se para cobrança de créditos vencidos antes da declaração de insolvência, deverá a execução fiscal ser imediatamente sustada e avocada pelo tribunal judicial para apensação àquele processo, ao qual deverá ser enviada pelo tribunal tributário; - se para cobrança de créditos vencidos após a declaração de insolvência, a execução prosseguirá, mas apenas se forem penhorados bens não apreendidos no processo de insolvência. É esta a doutrina que tem vindo a ser afirmada uniforme e reiteradamente pelo Supremo Tribunal Administrativo (Vide os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - de 15 de Novembro de 2006, proferido no processo com o n.º 625/06, publicado no Apêndice ao Diário da República de 16 de Novembro de 2007 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2006/32240.pdf), págs. 1894 a 1901, também disponível emhttp://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/217bb13afc58cc1880257230003d51b5?OpenDocument; - de 29 de Novembro de 2006, proferido no processo com o n.º 603/06, publicado no Apêndice ao Diário da República de 16 de Novembro de 2007 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2006/32240.pdf), págs. 2046 a 2055, também disponível emhttp://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/5eba140fb2b2f66e80257243004e299c?OpenDocument; - de 31 de Janeiro de 2008, proferido no processo com o n.º 887/07, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Maio de 2008 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2008/32210.pdf), págs. 188 a 191, também disponível em - http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/f38acac3fd7d43f8802573ed0040ae68?OpenDocument. - de 6 de Abril de 2008, proferido no processo com o n.º 249/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 29 de Setembro de 2008 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2008/32220.pdf), págs. 699 a 702, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1pbb1e680256f8e003ea931/c125b391150eb1de8025746c0048879a?OpenDocument; - de 12 de Novembro de 2009, proferido no processo com o n.º 102/09, publicado no Apêndice ao Diário da República de 19 de Abril de 2010 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2009/32240.pdf), págs. 1712 a 1717, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/e2aeb82ed61f339d80257677004b704c?OpenDocument; - de 14 de Abril de 2010, proferido no processo com o n.º 51/10, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Março de 2011 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2010/32220.pdf), págs. 586 a 590, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/6ef8be60395ae0988025770b0056dc05?OpenDocument - de 6 de Abril de 2011, proferido no processo com o n.º 981/10, publicado no Apêndice ao Diário da República de 6 de Janeiro de 2012 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2011/32220.pdf), págs. 599 a 603, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/48810ab2bb3a729980257870004b7c1a?OpenDocument.)).(…)”. Naturalmente, em função do que fica exposto, tem importância decisiva o momento em que se devem ter por vencidas as dívidas exequendas, sendo que a Recorrida reclama que tal situação terá ocorrido antes da declaração de insolvência, enquanto a sentença recorrida aponta que tal situação terá ocorrido após a declaração de insolvência, assim como a Recorrente. É, portanto, fulcral averiguar se os créditos exequendos se venceram em momento ulterior ao da declaração de insolvência e se, por isso, nada obstava à instauração e prossecução da execução fiscal para cobrança das respectivas dívidas, nos termos do n.º 6 do artigo 180.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Com efeito, a Recorrida parece perfilhar um entendimento, que existia inicialmente na jurisprudência, de que «todas as dívidas constituídas à data da declaração de insolvência se consideram vencidas nessa data independentemente de ter ou não sido efectuado o seu apuramento pelo sujeito passivo ou pela Administração Tributária». Mas esse entendimento foi revisto, por exemplo, nos acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 30 de Abril de 2014, processo n.º 656/13.4BEPNF, e de 15 de Maio do mesmo ano, processo n.º 567/13.3BEPNF. De resto, apoiados em jurisprudência emanada do Supremo Tribunal Administrativo: o acórdão de 29 de Fevereiro de 2012, processo n.º 885/11. Entretanto reafirmada por outro acórdão: o de 04 de Março de 2015, processo n.º 903/14. Sendo definitivamente resolvida a questão com a prolação do acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Abril de 2015, processo n.º 1087/14, e que a seguir se transcreve na parte relevante: «Como se exarou no já referido Acórdão de 29.02.2012 (885/11), a propósito da questão de saber em que data se vence uma dívida tributária, e recordando o ensinamento de SALDANHA SANCHES (Manual de Direito Fiscal, 3.ª edição, Coimbra Editora, pág. 255, "importa distinguir «entre a existência de uma obrigação na forma de uma mera pretensão fiscal e uma obrigação que atingiu a fase da exigibilidade», sendo que esta só ocorre «depois de se ter verificado o momento de vencimento dessa mesma obrigação»; ou seja, «[e]nquanto a obrigação se não encontra vencida, aquilo que existe para o sujeito ativo da obrigação tributária é uma mera pretensão fiscal – na altura, ainda destituída de exigibilidade. O facto legalmente previsto para o nascimento dessa pretensão já se verificou, mas não decorreu ainda o prazo legalmente previsto ou o facto exigido por lei para que se dê o vencimento desta obrigação". É certo que a recorrente, argumenta, na senda da tese acolhida no acórdão fundamento, que esta distinção já não faz sentido relativamente aos tributos que, como o I.V.A., devam ser autoliquidados. Nestes casos, acrescenta, o decurso do prazo importa não apenas o vencimento da obrigação de apresentar a declaração periódica, como a obrigação de liquidar o montante devido e enviar o respetivo meio de pagamento, sem qualquer necessidade de interpelação. Mas nem sempre será assim, como não é, no caso subjudice. Se o contribuinte não apresentar pontualmente a sua declaração de IVA ou nela não proceder à autoliquidação haverá, necessariamente, lugar a uma liquidação administrativa, que terá de ser notificada ao contribuinte e que define a nova data de vencimento da obrigação (Vide, neste sentido, Rui Duarte Morais, A Execução Fiscal, 2ª edição, Almedina, pág. 34.). In casu resulta do exame da factualidade provada e nomeadamente de fls. 34 a 36 v., que a liquidação da dívida de IVA referente ao terceiro trimestre de 2010, e que deu origem ao processo de execução fiscal n.º ...98, foi posterior à declaração de insolvência da sociedade recorrente, proferida em 28.11.2011, sendo que a data limite de pagamento voluntário de tal obrigação tributária ocorreu em 31.12.2012. Por outro lado dúvidas não há de que a data limite de pagamento voluntário das dívidas de coimas e custas do processo de contra - ordenação, constantes da certidão de dívida de fls. 31 e verso que deu origem ao PEF n.º ...66, terminou em 7/1/2013 (fls. 30 a 32 e 57 a 61), ou seja, também em data posterior à declaração de insolvência da sociedade recorrente. Neste contexto, considerando que a dívida tributária se vence no momento em que o credor adquire o direito de exigir o seu pagamento ao devedor e esse momento, no caso sub judice, se refere o termo final do prazo para o pagamento voluntário, ou seja 7.01.2013 (para a dívida de coimas) e 31.12.2012 (para a dívida de IVA), forçoso é concluir que bem andou o acórdão recorrido ao julgar que os créditos exequendos se venceram em momento ulterior ao da declaração de insolvência. Acresce referir que não impressiona também a argumentação de que o legislador utilizou o termo «créditos vencidos» no artigo 180°, n.º 6, do C.P.P.T., para remeter para a legislação das falências. À luz desta tese os «créditos vencidos após a declaração de falência» para efeitos deste dispositivo legal seriam aqueles que, à luz da lei falimentar, só viessem a vencer-se após a declaração de falência. Na verdade as normas dos nºs. 1 e 6 do artº 180º do CPPT constituem normas especiais que regulam os efeitos do processo de recuperação de empresa e de falência no processo de execução fiscal e que não foram revogadas pelo CIRE. Como refere Jorge Lopes de Sousa, no seu Código de Procedimento e Processo Tributário, Áreas Edit., 6ª edição, Volume III, pag. 321, este art. 180.º foi mantido no CPPT, apesar da sua revisão operada já depois da publicação do CIRE, pelo que é de concluir que se pretendeu manter este regime processual das execuções fiscais, fazendo corresponder ao processo de insolvência as referências aos processos de recuperação de empresa e falência. Ora constituindo o artº 180º, nº 6 do CPPT norma que estabelece um regime processual específico para as execuções fiscais, que não foi revogado pelo CIRE (Vide, neste sentido, Lopes de Sousa, ob. citada, pag. 323, e os Acórdãos desta Secção de 06.04.2011, recurso 981/10, de 14.04.2010, recurso 51/10, ambos in www.dgsi.pt.), seria certamente ilógico e contraditório que a sua interpretação e a interpretação do conceito de "créditos vencidos" fosse feita à luz do CIRE, nomeadamente do seu artº 91º, nº 1 (que estabelece que a declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente não subordinadas a uma condição suspensiva). Acresce por outro lado, como bem notam a entidade recorrida e Ministério Público neste Supremo Tribunal Administrativo, a lei fiscal estabelece prazos rígidos quanto às obrigações declarativas e de pagamento, sendo que o vencimento dos créditos fiscais por via da declaração de falência permitiria que a Administração Tributária exigisse impostos já liquidados em períodos de tempo inferiores a esses prazos legais, surpreendendo o contribuinte com exigências de que não estava à espera e tomaria quase impossível que aquela AT reclamasse em tempo útil os créditos não liquidados em sede de insolvência, situações que não podem, obviamente, corresponder à intenção do legislador. Em face de tudo o exposto haveremos de concluir é de manter o entendimento sufragado no acórdão recorrido no sentido de que as obrigações tributárias se vencem no termo do prazo legal para pagamento voluntário, e que, no caso subjudice, os créditos exequendos se venceram em momento ulterior ao da declaração de insolvência.» [fim de citação no Acórdão do STA, de 21/11/2019, proferido no âmbito do processo n.º 0409/14.2BELRA]. Na nossa situação, verificamos que as obrigações tributárias se venceram no termo do prazo legal para pagamento voluntário em 31/01/2013 (cfr. ponto 2 do probatório reformulado por este tribunal). Portanto, após a data da declaração de insolvência da sociedade executada, que ocorreu por sentença de 09/03/2012 (cfr. ponto 1 do probatório). Na perspectiva do tribunal recorrido, verifica-se a ilegalidade da instauração da execução, uma vez que não foram adquiridos, logo não penhorados, quaisquer bens após a declaração de insolvência pelo que, mesmo sendo a dívida em causa posterior à declaração de insolvência, a execução não poderia ter sido instaurada. Acompanhando a Recorrente, impõe-se concluir que o problema não reside na instauração da execução fiscal. Da convocação do artigo 180.º, n.º 6 do CPPT resulta apenas a inviabilidade da execução fiscal prosseguir sobre outros bens que não os que a ora Recorrida tenha eventualmente adquirido após a insolvência – cfr. Acórdão do STA, de 20/02/2019, proferido no âmbito do processo n.º 0216/14.2BEBRG 0134/18. Tal não invalida a instauração da execução fiscal e que possam, eventualmente, estar reunidos os pressupostos para operar a reversão da execução, por exemplo. Compulsados os elementos do processo de execução fiscal apenso aos autos, não vislumbramos que a execução tenha prosseguido sem que exista a penhora de bens adquiridos após a insolvência. Na verdade, do processo de execução fiscal apenas constam as certidões de dívida e a citação da sociedade executada, nada mais – cfr. ponto 3 do probatório. Se o órgão da execução fiscal vier a desrespeitar esse comando previsto no artigo 180.º do CPPT, a executada terá ao seu dispor os meios judiciais de reacção contra a penhora, designadamente, a reclamação prevista no artigo 276.º e seguintes do CPPT. Não colocamos em causa a jurisprudência do STA: “a instauração da execução fiscal por créditos vencidos posteriormente à declaração de falência, como são os créditos exequendos, encontra expresso apoio legal no disposto no n.º 6 do artigo 180.º do CPPT, preceito que há-de ser, contudo, interpretado razoavelmente, atenta a unidade do sistema jurídico, no sentido de que só será viável o prosseguimento dos processos de execução fiscal por créditos vencidos após a declaração de falência se forem penhorados bens não apreendidos naquele processo.” - cfr., entre outros, os Acórdãos de 06/04/2011, no âmbito do processo n.º 0981/10, de 06/06/2018, no processo n.º 01342/17, ou de 04/03/2020, no âmbito do processo n.º 0410/14.6BELRA. Contudo, a mera instauração do processo executivo e a chamada do devedor a esse processo não contende com o disposto no artigo 180.º, n.º 6 do CPPT, não podendo falar-se em ilegalidade da instauração da execução, tendo em vista o fundamento previsto no artigo 204.º, n.º 1, alínea i), do CPPT – cfr. Acórdão do STA, de 17/06/2020, proferido no âmbito do processo n.º 0547/17.0BEPRT. Com efeito, é nossa convicção não se verificar este fundamento de oposição à execução, que possa gerar a extinção da mesma. Efectivamente, como vimos, perante a prossecução ilegal da execução fiscal, o visado poderá impugnar judicialmente o respectivo acto. A verdade é que perante a inexistência de bens penhoráveis adquiridos posteriormente à insolvência na esfera da executada, a execução fiscal poderá existir para, eventualmente, ainda prosseguir contra devedores solidários ou reverter contra responsáveis tributários subsidiários (cfr. artigo 24.º da LGT e 153.º, n.º 2 do CPPT). Por isso, a sua instauração, por si só, não enferma de ilegalidade. Donde, ao considerar que, por não existirem bens penhorados à executada, fosse antes ou depois da declaração da sua insolvência, e por não existirem bens penhoráveis, adquiridos pela executada após a declaração da sua insolvência, a execução fiscal era de extinguir, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento. Nesta conformidade, urge conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida. Aqui chegados, haverá que apreciar, em substituição ao tribunal recorrido, as restantes questões, cujo conhecimento esse tribunal considerou prejudicado. Em face de tudo o que já deixámos expressado supra, no contexto identificado, não detectamos fundamentos invocados na petição de oposição que sejam susceptíveis de determinar a extinção do processo de execução fiscal. Não merecerá qualquer censura a actuação do órgão de execução fiscal, que, tendo instaurado uma execução fiscal contra uma sociedade declarada insolvente, em cumprimento do que dispõe o artigo 156.° do CPPT, ordenou a citação na pessoa da Administradora da Insolvência: “Se o funcionário ou a pessoa que deva realizar o acto verificarem que o executado foi declarado insolvente, o órgão de execução fiscal ordena que a citação se faça na pessoa do liquidatário judicial”. Como decorre do artigo 81.º, nºs.1 e 4, do CIRE, a declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si ou pelos seus administradores/gerentes, dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência. Tal significa que o administrador de insolvência fica investido nas vestes de administrador de facto, assumindo a gestão da massa insolvente, tarefa que exerce pessoalmente (cfr. artigo 55.º, n.º 2, do CIRE), arcando ainda com a representação do devedor em todos os assuntos com carácter patrimonial que importem à insolvência, designadamente a cobrança dos créditos do insolvente sobre terceiros, vencidos e vincendos (excepcionando-se a intervenção do devedor no próprio processo de insolvência, nos termos do artigo 223.º e seg. do CIRE). Nestes termos, também porque a oponente assentou a sua tese e defendia que a declaração da insolvência importaria igualmente o vencimento imediato das obrigações fiscais, ainda que não vencidas à data da sentença declaratória de insolvência (que, como vimos, não é assim, relevando o termo do prazo legal para o pagamento voluntário das liquidações), não observamos que a citação dirigida à administradora da insolvência, como impõem os artigos 156.º do CPPT e 55.º do CIRE, viole o disposto no artigo 173.º ou do artigo 146.º, n.º 2, alínea b), 2.ª parte, ambos do CIRE. Por último, a oponente alude ao disposto no artigo 65.º, n.º 3 do CIRE, afirmando que a comunicação oficiosa da deliberação de encerramento da actividade do estabelecimento pelo tribunal à AT tem como consequência a “anulação de todo o expediente executivo dirigido contra a massa insolvente”. Esse normativo dispõe o seguinte: Com a deliberação de encerramento da actividade do estabelecimento, nos termos do n.º 2 do artigo 156.º, extinguem-se necessariamente todas as obrigações declarativas e fiscais, o que deve ser comunicado oficiosamente pelo tribunal à administração fiscal para efeitos de cessação da actividade. É nossa convicção que a oponente não terá interpretado devidamente esta norma, dado que o legislador não teve em vista a extinção de processos de execução fiscal, por força do encerramento da actividade do estabelecimento. Aliás, a norma é expressa ao dizer que é “para efeitos de cessação da actividade”. Com efeito, é importante que a AT detenha essa informação de encerramento da actividade do estabelecimento, porque a cessação da actividade a partir de um determinado momento desobriga ao cumprimento de obrigações declarativas e fiscais; estando-se a falar, a título ilustrativo, do dever de entrega de declarações de IVA. Logo, um processo de execução fiscal não poderá ser extinto somente pelo facto de ter sido proferida sentença declaratória de insolvência, nem, tão-pouco, por ter sido deliberado o encerramento da actividade do estabelecimento; note-se que a respectiva consequência, neste caso, é a cessação da actividade para efeitos fiscais. Nada obsta a que após a declaração de insolvência sejam instauradas execuções fiscais contra a sociedade insolvente, possibilidade que constitui um regime especial para os processos de execução fiscal. Nesta conformidade, verificamos que todos os fundamentos invocados pela oponente, tendo em vista o objectivo da oposição – a extinção da execução fiscal – terão que ser julgados improcedentes, com a consequência da total improcedência da oposição judicial em apreço. Conclusões/Sumário I - Nada obsta a que após a declaração de insolvência sejam instauradas execuções fiscais contra a sociedade insolvente, possibilidade que constitui um regime especial para os processos de execução fiscal (afastando a regra geral do artigo 88.º, n.º 1, do CIRE), sendo que - se para cobrança de créditos vencidos antes da declaração de insolvência, deverão ser imediatamente sustadas e avocadas pelo tribunal judicial para apensação ao processo de insolvência (artigo 180.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT, e artigo 85.º, n.ºs 1 e 2, do CIRE); - para cobrança de créditos vencidos após a declaração de insolvência, prosseguindo a execução, mas apenas se forem penhorados bens não apreendidos no processo de insolvência (artigo 180.º, n.º 6, do CPPT, interpretado tendo em conta a unidade do sistema jurídico, como imposto pelo artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil). II - A declaração de insolvência não determina a sustação da execução fiscal instaurada para cobrança de crédito vencido posteriormente – cfr. artigo 180.º, n.º 6, do CPPT. III - O crédito decorrente de facto tributário ocorrido antes da declaração de insolvência, mas que só foi determinado posteriormente, constitui crédito vencido após a declaração de insolvência, para os efeitos do disposto no artigo 180.º, n.º 6, do CPPT. IV - A declaração de insolvência priva o insolvente dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência (artigo 81.º, n.º 1 do CIRE). V - O administrador de insolvência fica investido nas vestes de administrador de facto, assumindo a gestão da massa insolvente, tarefa que exerce pessoalmente, arcando ainda com a representação do devedor em todos os assuntos com carácter patrimonial que importem à insolvência. IV. Decisão Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e, em substituição, julgar a oposição judicial improcedente. Custas a cargo da Recorrida em ambas as instâncias, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhe tenha sido concedido. Porto, 16 de Fevereiro de 2023 Ana Patrocínio Paula Moura Teixeira Conceição Soares |