Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0154/15
Data do Acordão:05/06/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:TAXA DE JUSTIÇA
APOIO JUDICIÁRIO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
Sumário:I - Há situações, designadamente, aquela em que à data da apresentação da petição inicial faltem menos de cinco dias para o termo do prazo da caducidade, em que a lei, ao invés de exigir que, com a apresentação daquele articulado, o autor comprove o pagamento da taxa de justiça ou a concessão do apoio judiciário, se basta com a apresentação do documento comprovativo de que foi pedido o apoio judiciário, mas ainda não concedido (cf. n.º 5 do art. 552.º, antigo 467.º, do CPC).
II - Nessas situações, se o pedido de apoio judiciário vier a ser indeferido, deve o autor efectuar o pagamento da taxa de justiça em dez dias, sob pena de desentranhamento da petição inicial, «salvo se o indeferimento do pedido de apoio judiciário só for notificado depois de efectuada a citação do réu» (cf. n.º 6 do art. 552.º, antigo 467.º, do CPC).
III - Se não se comprovar a notificação do indeferimento do pedido de apoio judiciário antes da notificação da Fazenda Pública para contestar, a petição não será desentranhada, mas o autor não está dispensado de pagar a taxa de justiça; para tanto, deverá ser notificado para, em dez dias, pagar a taxa de justiça em falta com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC, tudo nos termos do n.º 4 do art. 570.º (antigo 486.º-A) do CPC, aplicável à situação por analogia.
Nº Convencional:JSTA00069189
Nº do Documento:SA2201505060154
Data de Entrada:02/10/2015
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:A.... E FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PENAFIEL
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL
Legislação Nacional:CPC13 ART552 N3 N5 N6 ART570 ART255 N1 ART254 N3 ART278 N1 E.
CPA91 ART70 N1 A ART68.
L 34/2004 ART24 N2 N3 ART37.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0361/13 DE 2013/11/27.; AC STA PROC0563/12 DE 2012/11/07.; AC STA PROC0358/13 DE 2013/06/26.; AC STA PROC0905/11 DE 2015/01/21.; AC STA PROC0739/13 DE 2014/02/20.; AC STA PROC01618/13 DE 2015/01/14.; AC STA PROC0309/14 DE 2015/01/28.
Referência a Doutrina:ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO GONÇALVES E PACHECO DE AMORIM - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMENTADO 2ED PAG361.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da decisão que julgou extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide no processo de impugnação judicial com o n.º 220/13.8BEPNF

1. RELATÓRIO

1.1 O Ministério Público (adiante Recorrente), através do seu Representante junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da decisão por que o Juiz daquele Tribunal, com fundamento na verificação da excepção dilatória inominada decorrente da falta de pagamento da taxa da taxa de justiça na sequência do indeferimento de pedido de apoio judiciário, ordenou o desentranhamento da petição inicial, apresentada por A…….. na impugnação judicial que aí deduziu contra uma liquidação, e julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e o Recorrente apresentou alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.):

«1- O Ministério Público promoveu a fls. 58 que fosse dado cumprimento ao disposto no n.º 5 do art. 570.º do actual CPC, aplicável ao impugnante e autor por força dos princípios da igualdade das partes, consagrado no art. 4.º do CPC e do princípio “pro actione”, o qual constitui uma concretização do princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva e sob a cominação da FP ser absolvida da instância.

2- Assim não entendendo, o Sr. Juiz conheceu de imediato a excepção dilatória inominada de falta de pagamento da taxa de justiça e determinou o desentranhamento da petição inicial, nos termos do art. 467.º – n.º 6 e 552.º do CPC e julgou extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do art. 277.º – al. e) do CPC, decisão que o MP considera extemporânea, porque ao impugnante deveria ter sido concedida a faculdade prevista na parte final do n.º 5 do art. 570.º do actual CPC.

3- Salvo o devido respeito, parece-nos que deveria o autor ter sido notificado para pagar a taxa de justiça, acrescida da multa e, mesmo que assim se não entendesse, porque existe já contestação, não deveria ter sido ordenado o desentranhamento da petição, mas tão somente absolvida a Ré da instância, por falta do cumprimento do pressuposto processual do pagamento da taxa de justiça, pois a Ré FP já apresentara a sua contestação, defendendo a improcedência da impugnação.

4- A questão já foi parcialmente tratada em decisões deste Alto Tribunal, em vários acórdãos atrás citados, sendo a única diferença o facto de naqueles se tratar da notificação do oponente para pagar a taxa de justiça em falta, acrescida da legal multa e se entender que a oposição a um PEF equivale à contestação da execução proposta, mas, em tudo o mais se entende que os princípios acima referidos se dão como violados, caso não ocorra a aludida notificação.
(Vejam-se acórdãos do STA de 26/06/2013, proferido no P. 358/13, e de 27/11/2013, proferido no P. 361/13, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).

5- Entendemos, tal como se decidiu no acórdão do TRP acima citado, que “neste caso parece-nos que deve ser concedido ao autor um tratamento igual ao que é concedido ao réu no art. 486.º -A, n.º 4 do CPC”, aplicável à data.

6- Não é pelo facto do n.º 5 do art. 570.º do CPC vir sistematizado na parte reguladora dos termos da contestação, que o mesmo não é aplicável ao autor, pois a razão de não haver norma idêntica prende-se com o facto do legislador achar quase impossível, na prática, a existência duma acção sem estar paga a taxa de justiça, ou haver decisão a conceder apoio judiciário, como se exige no n.º 3 do art. 552.º do CPC.

7- Foram violadas as normas previstas no n.º 5 do art. 570.º do CPC, aplicável por força do princípio da igualdade das partes consagrado no art. 4.º do mesmo diploma e do princípio “pro actione”, o qual constitui uma concretização do princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva.

Nestes termos, procedendo o recurso e revogando-se: a sentença recorrida, a qual deverá ser substituída por um despacho que ordene o cumprimento do disposto no n.º 5 do art. 570.º do CPC como promovido, será feita JUSTIÇA!».

1.3 Não foram apresentadas contra alegações.

1.4 Recebidos neste Supremo Tribunal Administrativo, os autos foram com vista ao Procurador-Geral Adjunto, que se absteve de emitir parecer com o fundamento de que era o Ministério Público o Recorrente.

1.5 Foram colhidos os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.

1.6 As questões que cumpre apreciar e decidir são as de saber (i) se, previamente à decisão proferida, de extinção da instância por impossibilidade superveniente na sequência do ordenado desentranhamento da petição inicial por falta de pagamento da taxa de justiça dentro do prazo legal na sequência do indeferimento de pedido de apoio judiciário, devia o Impugnante ter sido notificado para pagamento da taxa de justiça devida, acrescida de multa, notificação que o Recorrente considera impor-se nos termos do n.º 5 do art. 570.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por força do princípio da igualdade de tratamento das partes consagrado no art. 3.º-A daquele mesmo Código, bem como do princípio pro actione e, subsidiariamente, (ii) se a falta de pagamento podia levar ao desentranhamento da petição inicial ou apenas, como sustenta o Recorrente, à absolvição da instância da Fazenda Pública.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel deu como provados os seguintes factos:

«A) Com a petição inicial o impugnante apresentou um pedido de apoio judiciário subscrito por si, apresentado em 26/02/2013 (fls. 3 a 25).

B) Os serviços da Segurança Social remeteram para o requerente o ofício constante de fls. 50 e 51, cujo teor aqui se dá por reproduzido, por carta registada em 20/03/2013 (fls. 49 a 52, 60 e 61).

C) Nesse oficio o requerente foi notificado para juntar os documentos aí referidos, no prazo aí fixado, tendo sido expressamente advertido que a falta de junção dos documentos solicitados implica o indeferimento imediato do pedido de protecção jurídica no primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo de resposta, não se procedendo a qualquer outra notificação (fls. 50 e 51).

D) O ofício não foi entregue ao destinatário em 21/03/2013, por não ter atendido o carteiro (fls. 49 a 52, 60 e 61).

E) O requerente foi avisado para levantar a correspondência (fls. 49 a 52, 60 a 61).

F) O requerente não reclamou a correspondência nos serviços dos CTT (fls. 49 a 52, 60 e 61).

G) O ofício foi devolvido à Segurança Social em 02/04/2013, por não ter sido reclamado pelo requerente (fls. 49 a 52, 60 a 61).

H) O ofício devolvido foi entregue na Segurança Social em 03/04/2013 (fls. 49 a 52, 60 e 61).

I) A Segurança Social juntou aos autos a informação e os documentos constantes de fls. 49 a 52, cujo teor aqui se dá por reproduzido.

J) O pedido de apoio judiciário foi considerado indeferido nos termos constantes da decisão notificada ao oponente, referida em B) e C) (fls. 49 e seguintes).

K) O impugnante foi ainda notificado nestes autos dos documentos de fls. 49 a 52, por carta registada em 11/12/2013 e nada disse ou fez (fls. 55).

L) Até 13/02/2013, o impugnante nada disse ou fez, nem juntou aos autos o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida (dos autos).

M) A Fazenda Pública foi notificada para contestar a impugnação judicial em 07/05/2013 (fls. 27 a 29)».

2.2 DE FACTO E DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

A……… apresentou impugnação judicial no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel. Com a petição inicial juntou documento comprovativo de que tinha pedido protecção jurídica, na modalidade de apoio judiciário, sob a vertente de dispensa de pagamento da taxa de justiça.
Ulteriormente, a Segurança Social, no âmbito do procedimento de protecção jurídica, remeteu-lhe uma carta, registada em 20 de Março de 2013, com vista a notificá-lo para juntar determinados documentos, com a cominação de que a falta de junção dos mesmos no prazo aí estabelecido – 10 dias úteis – implicaria o indeferimento imediato do pedido de protecção jurídica no primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo de resposta, sem que houvesse lugar a qualquer outra notificação.
Essa carta não foi recebida pelo destinatário e foi devolvida ao remetente, apesar de ter sido deixado aviso pelo funcionário postal para o destinatário a levantar no posto dos correios.
Nos presentes autos, a Fazenda Pública foi notificada para contestar a impugnação judicial em 7 de Maio de 2013.
Por carta registada em 11 de Dezembro de 2013, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel notificou o Impugnante da junção aos autos dos documentos que a Segurança Social lhe remeteu a ele Impugnante pela carta de 20 de Março acima referida.
O Impugnante não comprovou nos autos o pagamento da taxa de justiça devida pela dedução da presente impugnação judicial.
Por decisão do Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferida já depois de junta a contestação aos autos, foi ordenado o desentranhamento da petição inicial por não ter sido paga a taxa de justiça dentro dos 10 dias após a notificação do indeferimento do pedido de apoio judiciário, atento o disposto no n.º 6 do art. 552.º do CPC, após o que julgou extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art. 277.º do mesmo Código.
O Representante do Ministério Público junto daquele Tribunal discorda dessa decisão e dela interpôs recurso com os seguintes fundamentos:
i) antes de decidir pelo desentranhamento da petição inicial, devia o Tribunal a quo ter notificado o Impugnante para efectuar o pagamento da taxa de justiça devida, acrescida de multa e sob a cominação da Fazenda Pública ser absolvida da instância, ao abrigo do disposto no n.º 5 do art. 570.º do CPC, disposição legal que, embora prevista para a contestação, também deve considerar-se aplicável à petição inicial, por força dos princípios da igualdade das partes, consagrado no art. 4.º do CPC, e do pro actione, o qual constitui uma concretização do princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva; ainda que assim não seja,
ii) devia o Tribunal a quo ter-se limitado a absolver a Fazenda Pública da instância e não a extingui-la por impossibilidade superveniente, atento o disposto no n.º 6 do art. 552.º do CPC e uma vez que a Fazenda Pública já fora notificada para contestar e já apresentara a contestação.

Assim, a questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber (i) se, previamente à decisão de desentranhamento da petição inicial por falta de pagamento da taxa de justiça dentro do prazo legal na sequência do indeferimento de pedido de apoio judiciário, devia o Impugnante ter sido notificado para pagamento da taxa de justiça devida, acrescida de multa, nos termos do n.º 5 do art. 570.º do CPC, aplicável por força do princípio da igualdade de tratamento das partes consagrado no art. 3.º-A daquele mesmo Código, bem como do princípio pro actione e, subsidiariamente, (ii) se a falta de pagamento podia levar ao desentranhamento da petição inicial ou apenas, como sustenta o Recorrente, à absolvição da instância da Fazenda Pública.

2.2.2 DA CONSEQUÊNCIA PARA A IMPUGNAÇÃO JUDICIAL DA FALTA DE COMPROVAÇÃO DO PAGAMENTO DA TAXA DE JUSTIÇA PELO IMPUGNANTE APÓS O INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE APOIO JUDICIÁRIO

Cumpre indagar da consequência que advém da falta de comprovação do pagamento da taxa de justiça inicial após o indeferimento do pedido de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça para a impugnação judicial cuja petição inicial foi apresentada com documento comprovativo do pedido de apoio judiciário requerido, mas ainda não concedido.
Considerou o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que tal consequência é o desentranhamento da petição inicial, com base no disposto no art. 24.º, n.º 3, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho (que aprovou o regime do acesso ao direito e aos tribunais) e no art. 552.º (antigo art. 467.º) n.º 6, do CPC. Vejamos o que nos dizem essas normas.
O art. 24.º, n.ºs 2 e 3, da Lei n.º 34/2004:

«[…]
2. Nos casos previstos no n.º 4 do artigo 467.º do Código de Processo Civil e, bem assim, naqueles em que, independentemente das circunstâncias aí referidas, esteja pendente impugnação da decisão relativa à concessão de apoio judiciário, o autor que pretenda beneficiar deste para dispensa ou pagamento faseado da taxa de justiça deve juntar à petição inicial documento comprovativo da apresentação do respectivo pedido.

3 - Nos casos previstos no número anterior, o autor deve efectuar o pagamento da taxa de justiça ou da primeira prestação, quando lhe seja concedido apoio judiciário na modalidade de pagamento faseado de taxa de justiça, no prazo de 10 dias a contar da data da notificação da decisão que indefira, em definitivo, o seu pedido, sob a cominação prevista no n.º 5 do artigo 467.º do Código de Processo Civil».

Os n.ºs 3, 5 e 6 do art. 552.º (antigo art. 467.º) n.º 6, do CPC:

«[…]
3. O autor deve juntar à petição inicial o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça devida ou da concessão do benefício de apoio judiciário, na modalidade de dispensa do mesmo.
[…]
5. Sendo requerida a citação nos termos do artigo 561.º, faltando, à data da apresentação da petição em juízo, menos de cinco dias para o termo do prazo de caducidade ou ocorrendo outra razão de urgência, deve o autor apresentar documento comprovativo do pedido de apoio judiciário requerido, mas ainda não concedido.
6. No caso previsto no número anterior, o autor deve efectuar o pagamento da taxa de justiça no prazo de 10 dias a contar da data da notificação da decisão definitiva que indefira o pedido de apoio judiciário, sob pena de desentranhamento da petição inicial apresentada, salvo se o indeferimento do pedido de apoio judiciário só for notificado depois de efectuada a citação do réu».
Da leitura dos citados artigos resulta que há situações em que se admite que o autor, à data da apresentação da petição inicial, ao invés de comprovar o pagamento da taxa de justiça ou a concessão do apoio judiciário, se possa limitar a apresentar o documento comprovativo de que foi pedido o apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento da taxa de justiça, mas ainda não decidido [o Juiz do Tribunal a quo parece ter aceitado que o caso sub judice integra uma dessas situações (Certamente, a situação de, à data da apresentação da petição em juízo, faltar menos de cinco dias para o termo do prazo de caducidade, sabido que, nos termos do art. 102.º do CPPT, o prazo para deduzir a impugnação judicial é de 90 dias, contados a partir os factos elencados nas diversas alíneas daquele artigo, das quais avulta a a), ou seja, do «[t]ermo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte».)]; nessas situações, caso o pedido de apoio judiciário venha a ser indeferido, o autor dispõe do prazo de dez dias para proceder ao pagamento da taxa de justiça, sob pena de desentranhamento da petição inicial, «salvo se o indeferimento do pedido de apoio judiciário só for notificado depois de efectuada a citação do réu».
É esta a solução legal para os casos em que, tendo sido admitida a petição inicial com a mera comprovação de que foi pedido o apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento da taxa de justiça, este pedido vem a ser indeferido.
A solução prevista na lei para idêntica situação – pedido de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento da taxa de justiça efectuado na data da apresentação da peça processual, mas ainda não decidido – reportada à contestação é diversa, pois, se não for efectuado o pagamento da taxa de justiça no prazo de 10 dias após o indeferimento do pedido de apoio judiciário na referida modalidade, interpõe a necessidade de uma notificação, a efectuar oficiosamente pela secretaria: tão logo se aperceba de que foi indeferido o pedido de apoio judiciário, a secretaria deve notificar o réu para, em 10 dias, efectuar o pagamento omitido com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 5 UC; se o não fizer, o juiz, findos os articulados, profere despacho convidando o réu a proceder, no prazo de 10 dias, ao pagamento da taxa de justiça e da multa em falta, acrescida de multa de valor igual ao da taxa de justiça inicial, com o limite mínimo de 5 UC e máximo de 15 UC. Só se o réu não aceder a esse convite o juiz determina o desentranhamento da contestação. É este o regime fixado pelo art. 570.º (antigo art. 486.º-A.º) do CPC:

«1. É aplicável à contestação, com as necessárias adaptações, o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 552.º [antes 467.º], podendo o réu, se estiver a aguardar decisão sobre a concessão do benefício de apoio judiciário, comprovar apenas a apresentação do respectivo requerimento.
2. No caso previsto na parte final do número anterior, o réu deve comprovar o prévio pagamento da taxa de justiça ou juntar ao processo o respectivo documento comprovativo no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão que indefira o pedido de apoio judiciário.
3. Na falta de junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida ou de comprovação desse pagamento, no prazo de 10 dias a contar da apresentação da contestação, a secretaria notifica o interessado para, em 10 dias, efectuar o pagamento omitido com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 5 UC.
4. Após a verificação, por qualquer meio, do decurso do prazo referido no n.º 2, sem que o documento aí mencionado tenha sido junto ao processo, a secretaria notifica o réu para os efeitos previstos no número anterior.
5. Findos os articulados e sem prejuízo do prazo concedido no n.º 3, se não tiver sido junto o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida e da multa por parte do réu, ou não tiver sido efectuada a comprovação desse pagamento, o juiz profere despacho nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 590.º, convidando o réu a proceder, no prazo de 10 dias, ao pagamento da taxa de justiça e da multa em falta, acrescida de multa de valor igual ao da taxa de justiça inicial, com o limite mínimo de 5 UC e máximo de 15 UC.
6. Se, no termo do prazo concedido no número anterior, o réu persistir na omissão, o tribunal determina o desentranhamento da contestação.
[…]».
Como resulta do confronto entre os arts. 552.º e 570.º (antes arts. 467.º e 486.º-A, respectivamente) do CPC, acima citados, existe uma diversidade de tratamento legal das situações ulteriores ao indeferimento do pedido de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento da taxa de justiça, consoante este se refira à petição inicial ou à contestação.
Essa diversidade de tratamento encontra justificação nos diferentes efeitos processuais relativos à falta de junção de comprovativo de pagamento da taxa de justiça inicial. Como judiciosamente se referiu no acórdão desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de Novembro de 2013, proferido no processo n.º 361/13 (No Apêndice ao Diário da República de 26 de Junho de 2014 (http://dre.pt/pdfgratisac/2013/32240.pdf), págs. 4575 a 4578, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/de6ef635f693e2a080257c37003a06b8?OpenDocument.), «do âmbito de aplicação das referidas normas resulta a razão de ser dos diferentes efeitos processuais relativos à falta de junção de comprovativo de pagamento da taxa de justiça inicial: o art. 467.º [actual art. 552.º] do CPC aplica-se ao «autor», sobre quem recai o impulso processual, mas cujo incumprimento não impede a propositura de nova acção (cfr. também o n.º 2 do art. 289.º do CPC); a segunda norma [art. 570.º, correspondente ao anterior 486.º-A] aplica-se ao «réu», cujo incumprimento o impossibilita de se defender da acção, colocando-o numa situação de revelia que, por regra, tem por efeito a confissão dos factos articulados pelo autor (art. 484.º do CPC). Perante a gravidade desta última sanção, não pode deixar de se considerar uma “justa medida”, fundada no princípio de proporcionalidade, dar ao réu nova oportunidade de pagar a taxa de justiça, embora acrescida de multa pelo atraso causado».
É certo que, como bem refere o Recorrente, este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a admitir, relativamente ao oponente, que se imporá uma notificação prévia antes do desentranhamento da petição inicial por falta de pagamento da taxa de justiça no prazo de 10 dias após a notificação do indeferimento do pedido de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça. Essa jurisprudência (Vide, entre muitos outros e para além do citado na nota anterior, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 7 de Novembro de 2012, proferido no processo n.º 563/12, publicado no Apêndice ao Diário da República de 8 de Novembro de 2013 (http://dre.pt/pdfgratisac/2012/32240.pdf), págs. 3319 a 3323, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/659bb1bdb4769ebc80257ab800430c09?OpenDocument;
- de 26 de Junho de 2013, proferido no processo n.º 358/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 15 de Abril de 2014 (http://dre.pt/pdfgratisac/2013/32220.pdf), págs. 2877 a 2880, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/bc9c1bbaf4e5f23c80257b9f003fbc72?OpenDocument.), no entanto, reporta-se sempre a casos de oposição à execução fiscal. Como ficou dito no já referido acórdão de 26 de Junho de 2013, «não repugna, ao menos para os efeitos de falta de pagamento atempado da taxa de justiça, aplicar o disposto no artigo 486.º-A do CPC – relativo ao pagamento da taxa de justiça na contestação – à oposição à execução fiscal, porquanto nesta há lugar à citação do executado e a oposição configura-se como que uma contestação à própria execução fiscal. E não repugnando tal aplicação, que se traduz em possibilitar o pagamento, embora tardio, da taxa de justiça devida pelo impulso processual (acrescida de multa), deve ela ser considerada aplicável, atento o princípio “pro actione”, concretização processual do princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva, mais do que pelo princípio da igualdade das partes» pois «por força da lei, não há como assegurar, nesta matéria, igualdade de tratamento quanto às consequências do não pagamento atempado da taxa de justiça».
Essa jurisprudência, a que aderimos sem reserva, justifica-se no caso da oposição, dada a natureza deste meio processual (que se assume como uma contestação à execução fiscal), mas, salvo o devido respeito, já não no caso da impugnação judicial. Neste meio processual, não vemos argumento convincente para deixar de aplicar o n.º 6 do art. 552.º (antigo art. 467.º) do CPC às situações em que o impugnante deixa de efectuar o pagamento da taxa de justiça no prazo de 10 dias após a notificação do indeferimento do pedido de apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento de taxa de justiça. Já deixámos dito que a diversidade de tratamento que a lei dá ao autor e ao réu encontra justificação nos diferentes efeitos processuais relativos à falta de junção de comprovativo de pagamento da taxa de justiça inicial. Por outro lado, o princípio do pro actione aponta para uma interpretação e aplicação das normas processuais no sentido de favorecer o acesso ao tribunal ou de evitar as situações de denegação de justiça, por excessivo formalismo, mas não se destina a subverter as regras do processo, postergando outros princípios processuais, designadamente, a ultrapassar as normas que imponham ónus processuais específicos às partes (Vide, por mais recentes e com indicação de doutrina e jurisprudência, os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 29 de Janeiro de 2014, proferido no processo n.º 1233/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 3 de Outubro de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2014/32110.pdf), págs. 242 a 247, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/91015951db35b60280257c780041ef43?OpenDocument;
- de 20 Fevereiro de 2014, proferido no processo n.º 739/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 3 de Outubro de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2014/32110.pdf), págs. 520 a 521, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/a2d56ddd996ce10b80257c91004b8316?OpenDocument; e
desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 21 de Janeiro de 2015, proferido no processo 905/11, ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/495cc58afef2e26280257dd60055c410?OpenDocument.).
O recurso não pode, pois, ser provido com base no primeiro fundamento invocado pelo Recorrente.
Temos, pois, que passar a conhecer do fundamento invocado a título subsidiário, qual seja o de saber se a consequência da falta de pagamento da taxa de justiça nos dez dias seguintes à notificação do indeferimento do apoio judiciário na modalidade de dispensa daquela taxa era o desentranhamento da petição inicial.

2.2.3 DO MOMENTO EM QUE O IMPUGNANTE FOI OU SE CONSIDERA TER SIDO NOTIFICADO DA DECISÃO DE INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE APOIO JUDICIÁRIO

Cumpre, pois, verificar se o Impugnante foi notificado do indeferimento do pedido de apoio judiciário antes ou depois da notificação da Fazenda Pública para contestar. Como resulta do disposto no n.º 6 do art. 552.º (anterior art. 467.º) do CPC, que vimos já ser o aplicável à situação sub judice, só no primeiro caso será permitido o desentranhamento da petição inicial.
O Juiz do Tribunal a quo considerou que assim foi e, por isso, ordenou o desentranhamento daquela peça processual, com a consequente impossibilidade superveniente da lide, a justificar a decisão de extinção da instância.
Vejamos:
Considerou o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que o Impugnante foi notificado por carta registada em 20 de Março de 2013 do despacho proferido pela Segurança Social, para, «no prazo de 10 dias úteis», apresentar documentos, com a cominação de que «a falta de junção dos documentos solicitados implica o indeferimento imediato do pedido de protecção jurídica […] no 1.º dia útil seguinte ao termo do respectivo prazo de resposta […], não se procedendo a qualquer outra notificação», presumindo-se a notificação feita em 25 de Março de 2013 (o terceiro dia posterior ao registo foi sábado).
Invoca o Juiz, para fazer funcionar a presunção de recepção no terceiro dia útil posterior à data do registo, os termos do disposto no art. 70.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo (CPA), na redacção em vigor à data (Entretanto, entrou em vigor o novo CPA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de Janeiro.), e no art. 255.º, n.º 1, do CPC.
Mas, salvo o devido respeito, não podia à data aplicar-se às notificações efectuadas no procedimento de protecção jurídica por carta registada a presunção de recepção no terceiro dia útil seguinte ao do registo, que o Juiz considerou aplicável nos termos do disposto no art. 70.º, n.º 1, do CPA, na redacção vigente à data, e no art. 255.º, n.º 1, do CPC, rectius, nos termos do n.º 3 do art. 254.º («A notificação postal presume-se feita no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja».), aplicável ex vi do art. 255.º, n.º 1 («Se a parte não tiver constituído mandatário, as notificações ser-lhe-ão feitas no local da sua residência ou sede ou no domicílio escolhido para o efeito de as receber, nos termos estabelecidos para as notificações aos mandatários».), ambos do CPC, na redacção em vigor à data, ou seja, a anterior à aprovada pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho.
Desde logo, cumpre notar que o art. 70.º, n.º 1, do CPT, naquela redacção, dizia na sua alínea a): «1. As notificações podem ser feitas: a) Por via postal, desde que exista distribuição domiciliária na localidade de residência ou sede do notificando; […]», não estabelecendo presunção alguma de recebimento da carta registada, nem indicando o CPC como lei subsidiariamente aplicável.
É certo que, como vimos, a referida presunção de que a carta registada remetida para notificação se considera recebida no terceiro dia útil seguinte ao do registo estava (como continua a estar) estabelecida no CPC. O que significa que essa presunção deve aplicar-se nos processos a que este Código é aplicável, directa ou subsidiariamente. Mas não é esse o caso dos processos administrativos – como o procedimento de concessão de protecção jurídica –, que são regulados em primeira linha pelo CPA, em que não há qualquer norma que determine a aplicação subsidiária do CPC.
Aliás, a própria Lei n.º 34/2004, no seu art. 37.º, fixa como lei subsidiária o CPA.
Ora, no CPA antigo (No novo CPA, já o n.º 1 do art. 113.º estabelece: «A notificação por carta registada presume-se efectuada no terceiro dia útil posterior ao registo ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil». ), que é o aplicável, não há regra alguma que estabeleça aquela presunção.
Permitimo-nos citar aqui o recente acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 14 de Janeiro de 2015 no processo n.º 1618/13 (Ainda não publicado no jornal oficial, mas disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/69e369db828a86da80257dd6004ca1f4?OpenDocument.
No mesmo sentido, também o acórdão de 28 de Janeiro de 2015 desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 309/14, ainda não publicado no jornal oficial, mas disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d18edcbdb80df3da80257ddc0055e185?OpenDocument.), pelo intensivo tratamento da questão. Refere o acórdão que os actos administrativos «quando gozam de eficácia externa, têm de ser notificados aos interessados, mediante comunicação oficial e formal, na forma prevista na lei, de acordo com a imposição do n.º 3 do art. 268.º da Constituição, tendo a falta de notificação como consequência legal a ineficácia do acto. Por isso, na concretização desse imperativo constitucional, o art. 66.º do CPA estabelece que devem ser notificados aos interessados os actos administrativos que decidam sobre quaisquer pretensões por eles formuladas, que imponham deveres, sujeições ou sanções, ou causem prejuízos, ou que criem, extingam, aumentem ou diminuam direitos ou interesses legalmente protegidos, ou afectem as condições do seu exercício.
A notificação desempenha, assim, um papel garantístico ou processual, na medida em que só após a notificação pode o acto ser oponível e iniciar-se o decurso do prazo de impugnação.
Nessa consonância, o art. 70.º, n.º 1, alínea a), do CPA dispõe que “as notificações podem ser feitas por via postal, desde que exista distribuição domiciliária na localidade de residência ou sede do notificando (…)”.
Em anotação a este preceito legal, MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e JOÃO PACHECO DE AMORIM, referem, no “Código de Procedimento Administrativo – Comentado”, 2.ª Ed., pág. 361, que “o envio da notificação pelos correios é feito sob a forma registada, não havendo nenhuma razão para distinguir neste aspecto o processo judicial e o processo administrativo, considerando-se, portanto, que vale aqui, até por razões de certeza, a regra do artigo 254.º do Código de Processo Civil: fica feita prova no processo (ao qual é junto o respectivo talão de registo) de que a notificação foi enviada e em que data, podendo presumir-se (como em juízo) que os serviços postais entregaram, nos prazos normais, aos respectivos destinatários, a correspondência que lhes é confiada. Note-se, porém, que não funciona para as notificações procedimentais feitas por registo postal a regra aplicável em matéria de notificações judiciais (n.º 3 do art. 1.º do Decreto-Lei n.º 121/76) [à data dos factos, deve ler-se n.º 3 do art. 254.º do CPC, pois embora o Decreto-Lei n.º 126/76 não haja sido expressamente revogado, a redacção ulteriormente dada ao art. 254.º do CPC consumiu-o], segundo o qual elas se consideram feitas no terceiro dia posterior à data do registo (ou no primeiro dia útil imediatamente subsequente)».
E também na jurisprudência (Cfr., entre outros, o acórdão da Secção de C.A. do STA de 1/10/2008, no recurso n.º 0337/08, onde se deixou frisado que a presunção constante do n.º 3 do art. 254.º do CPC «não é aplicável aos processos administrativos, que são regulados em primeira linha pelo CPA, em que não há qualquer norma que determine a aplicação subsidiária do CPC.».) se firmou o entendimento de que não vale para os procedimentos administrativos a presunção que o n.º 3 do art. 254.º do anterior Código de Processo Civil (a que corresponde o art. 248.º do actual CPC) prevê para as notificações de actos judiciais aos mandatários, isto é, de que a notificação produz efeitos ainda que a carta seja devolvida.
É certo que quando a comunicação é efectuada através dos serviços postais, que podem levar algum tempo a colocar a carta em condições de o destinatário ter possibilidade de a conhecer, a lei processual presume, através de uma regra de experiência (id quod plerumque accidit), que a comunicação postal demora três dias (após o registo) a entrar na esfera de perceptibilidade do seu destinatário (3.º dia que se transfere para o 1.º dia útil seguinte se aquele for um dia não útil), o que constitui uma presunção legal destinada a facilitar a prova de que a notificação foi introduzida na esfera de cognoscibilidade do notificando.
Todavia, a atribuição legal de certa relevância ao registo da carta não permite obter a certeza inabalável de que o seu destinatário a recebeu nesse prazo. Assim como a forma de notificação postal não exclui o risco da carta não ser efectivamente recebida pelo destinatário (razão por que o notificado pode ilidir essa presunção), também se a carta for devolvida não se pode inferir que o registo faz presumir que ela foi colocada na esfera de cognoscibilidade do destinatário. É que se nenhum aviso for deixado no domicílio do notificando, não há, sequer, a garantia da cognoscibilidade da existência da carta; e se o aviso foi deixado, vicissitudes várias, como a ausência temporária do domicílio (v.g. trabalho, férias, doença, etc.), podem impedir o acesso à carta.
Assim, a consequência lógica que a lei deduz do registo da carta, ou seja, que se presume que demora três dias a ser posta alcance do destinatário, deixa de poder ser feita, pelo menos com o mesmo grau de probabilidade, se a carta for devolvida.
E daí que a presunção legal da notificação por via postal de acto administrativo só possa funcionar se a carta não vier devolvida.
Por conseguinte, recaindo o dever de notificação sobre a administração pública, sobre a qual impende o ónus de diligenciar pela sua efectiva concretização, de forma a levar o acto ao conhecimento do seu destinatário, não pode dar-se como concretizada a notificação efectuada através de uma carta que, comprovadamente, veio devolvida e que não chegou, assim, à esfera de cognoscibilidade do respectivo destinatário.
Em suma, atendendo à função garantística que a notificação representa e ao papel integrativo de eficácia que se lhe reconhece, cremos que qualquer outra afirmação se torna inviável, por inexistência da necessária situação objectiva de certeza legal da cognoscibilidade do acto notificando.
No caso vertente, a Segurança Social procedeu à notificação através de carta registada, mas esta não chegou a ser entregue e recepcionada pela destinatária, ora Recorrida, pois a carta foi devolvida pelos serviços postais dos CTT com a menção “não atendeu” e “não reclamado”. Isto é, a notificação não chegou a concretizar-se, por a carta não ter sido recepcionada.
E não se aplicando aqui a regra contida no n.º 3 do artigo 254.º do CPC, no sentido de que «a notificação não deixa de produzir efeito pelo facto de o expediente ser devolvido, desde que a remessa tenha sido feita para o escritório do mandatário ou para o domicílio por ele escolhido», não pode afirma-se que o acto administrativo chegou ao conhecimento da interessada, ora recorrida (independentemente das razões subjacentes à não reclamação da correspondência junto dos correios), motivo por que ela não pode considerar-se notificada – pois que também nada indicia que tivesse tido, nessa data e por via de tal carta, conhecimento efectivo do teor da notificação remetida e dos elementos pertinentes previstos no artigo 68.º do CPA.
Impunha-se, neste caso, que a Segurança Social diligenciasse pela confirmação da residência da recorrida no endereço em causa e pela realização de nova tentativa de notificação, uma vez que não beneficia de qualquer presunção de notificação e nada evidencia que a correspondência só não foi reclamada porque a recorrida assim não o pretendeu».
Nem se argumente como uma eventual aplicação subsidiária daquele preceito do CPC por força do art. 25.º («Sem prejuízo do que, neste Código, especificamente se estabelece a propósito da citação dos contra-interessados quando estes sejam em número superior a 20, é aplicável o disposto na lei processual civil em matéria de citações e notificações».) do Código de Processo dos Tribunais Administrativos pela simples razão de que o procedimento de apoio judiciário não cabe no âmbito da aplicação deste Código, uma vez que não pode ser tido como “processo nos tribunais administrativos” (cf. art. 1.º).
Assim, afigura-se-nos não haver suporte legal que permita concluir pela notificação ao ora Impugnante da decisão de indeferimento do pedido de apoio judiciário na data fixada pelo Juiz do Tribunal a quo: 25 de Março de 2013.
Não pode, pois, manter-se a decisão judicial recorrida que, no pressuposto daquela notificação antes da notificação da Fazenda Pública para contestar e do não pagamento da taxa de justiça dentro do prazo legal a contar desde a data da mesma, ordenou o desentranhamento da petição inicial.
Não significa isto que o Impugnante não haja de pagar a taxa de justiça, pois que não goza do apoio judiciário. Significa apenas que a petição inicial não deve ser desentranhada.
A nosso ver, deve, isso sim, é notificar-se o Impugnante de que – porque o Tribunal tomou conhecimento de que lhe foi indeferido o pedido de apoio judiciário – deve efectuar o pagamento da taxa de justiça.
Note-se que não incumbe ao tribunal notificar as decisões administrativas (designadamente as proferidas no âmbito do procedimento de concessão de protecção jurídica), nem sequer suprir a falta de notificação das mesmas, devendo apenas verificar se a entidade administrativa – no caso, a Segurança Social – notificou ou não o requerente do apoio judiciário de que esse pedido foi indeferido.
Mas também não pode escamotear-se que, desde que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel remeteu ao Impugnante, por carta registada em 11 de Dezembro de 2013, os documentos juntos aos autos e que são constituídos por cópias dos documentos que a Segurança Social lhe remeteu a ele Impugnante pela carta de 20 de Março do mesmo ano, o Impugnante passou a ter conhecimento do indeferimento do pedido.
Ora, por um lado, não há notícia de que tenha impugnado judicialmente essa decisão – e, se o tivesse feito, o princípio da colaboração exigia-lhe essa comunicação ao Tribunal – e, por outro, também não veio aos autos pagar a taxa de justiça.
Assim, por manifesta similitude das situações (não ao abrigo do princípio da igualdade entre as partes, nem sequer ao abrigo do princípio do pro actione,hipóteses que afastámos no ponto anterior), deve cumprir-se o disposto no n.º 4 do art. 570.º (antigo art. 486.º-A), do CPC, ou seja, deve notificar-se o Impugnante para, em dez dias, efectuar o pagamento da taxa de justiça, acrescida de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC.
Só depois – na eventualidade de o pagamento não ser efectuado – poderá o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel ordenar, não o desentranhamento dos autos (porque não se verifica a já referida condição de notificação do indeferimento do pedido de apoio judiciário previamente à notificação da Fazenda Pública para contestar), mas a verificação da excepção dilatória inominada de falta de pagamento da taxa da justiça na sequência do indeferimento de pedido de apoio judiciário, a determinar a absolvição da Fazenda Pública da instância, à luz do disposto na alínea e) do n.º 1 art. 278.º (antigo art. 288.º) e no n.º 6 do citado art. 552.º (antigo 467.º), ambos do CPC.
Assim, com estes fundamentos, o recurso merece provimento.

2.2.4 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - Há situações, designadamente, aquela em que à data da apresentação da petição inicial faltem menos de cinco dias para o termo do prazo da caducidade, em que a lei, ao invés de exigir que, com a apresentação daquele articulado, o autor comprove o pagamento da taxa de justiça ou a concessão do apoio judiciário, se basta com a apresentação do documento comprovativo de que foi pedido o apoio judiciário, mas ainda não concedido (cf. n.º 5 do art. 552.º, antigo 467.º, do CPC).
II - Nessas situações, se o pedido de apoio judiciário vier a ser indeferido, deve o autor efectuar o pagamento da taxa de justiça em dez dias, sob pena de desentranhamento da petição inicial, «salvo se o indeferimento do pedido de apoio judiciário só for notificado depois de efectuada a citação do réu» (cf. n.º 6 do art. 552.º, antigo 467.º, do CPC).
III -Se não se comprovar a notificação do indeferimento do pedido de apoio judiciário antes da notificação da Fazenda Pública para contestar, a petição não será desentranhada, mas o autor não está dispensado de pagar a taxa de justiça; para tanto, deverá ser notificado para, em dez dias, pagar a taxa de justiça em falta com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC, tudo nos termos do n.º 4 do art. 570.º (antigo 486.º-A) do CPC, aplicável à situação por analogia.


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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em conceder provimento, revogar a decisão recorrida e ordenar a baixa dos autos ao Tribunal a quo, a fim de aí prosseguirem nos termos indicados.

Sem custas.


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Lisboa, 6 de Maio de 2015. - Francisco Rothes (relator) - Aragão Seia - Casimiro Gonçalves.