Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
5295/22.6T8BRG.G1
Relator: JOSÉ FLORES
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/02/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Nos termos dos Artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de actuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial.
Por isso, em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões.
A alínea b), do nº 1, do art. 640º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique “os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”, impõe que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respectivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos.
Não observa o ónus impugnatório fixado no art. 640º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, o impugnante da decisão da matéria de facto que, de forma confusa, prolixa e ambígua, não indica com precisão e certeza o sentido decisório a adoptar.
Decisão Texto Integral:
Assinado digitalmente por:                                                    
Rel. – Des. José Manuel Flores
1º Adj. - Des. Sandra Melo
2º - Adj. - Des. Elisabete Coelho de Moura Alves

Recorrente(s): AA;

Recorrido(s): BB e CC.            
*
Acordam os Juízes na 3ª Secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

1. RELATÓRIO

AA intentou contra BB e CC acção declarativa, com processo comum, pedindo que: a) seja declarada a anulação da escritura de doação outorgada a 30 de Janeiro de 2021, com base na falta de capacidade de exercício de direitos da doadora e na falta de consciência da declaração negocial, bem como dos seus efeitos; b) seja decretado o cancelamento da AP. ...45... 04/02/2021 efectuada na Conservatória do Registo Predial ... (...), restituindo-se o bem descrito sob o n.º ...99 da Conservatória do Registo Predial ..., regressando a fracção ..., da INSCRIÇÃO ...09... União de Freguesias ..., ... e ... à esfera jurídica e património da Autora.
Alega, para tanto e em síntese, a Autora que fez a doação a favor dos Réus numa altura em que sofria de síndrome confusional agudo, e não estava esclarecida e em perfeita consciência dos seus actos, não correspondendo o negócio realizado à sua vontade.
Os Réus devidamente citados, contestaram, impugnando os factos relatados pela Autora e excepcionando a caducidade do direito de instaurar a acção.
Deduziram ainda pedido reconvencional, que não foi admitido.
Replicou a Autora, sustentando que apenas teve conhecimento em 23 de Fevereiro de 2022 do estado em que se encontrava quando fez a doação, data do relatório junto como doc. ... com a petição inicial.

A final foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, julga-se procedente a excepção de caducidade do direito de acção de anulação e, consequentemente, absolve-se os Réus do pedido.
Custas a cargo da Autora (art. 527º do CPC).”

Inconformada com esta decisão, a Autora recorreu, formulando as seguintes

Conclusões

1º . A Autora, aqui Recorrente, não se conformando com a Sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Central Cível de Braga – Juiz ..., vem dela interpor Recurso Ordinário de Apelação por considerar que existem erros de julgamento sobre pontos da matéria de facto, os quais impunham decisão diversa.
2. A Recorrente peticiona que seja ser declarada a anulação da escritura de doação outorgada a 30 de janeiro de 2021, pela notária dr.ª DD, com base na falta de capacidade de exercício de direitos da doadora e na falta de consciência da declaração negocial
3. No caso em apreço, a doadora, em virtude da doença de foro psiquiátrico que padecia na data da escritura de doação, coadjuvado com as promessas de que o “que ela estava a fazer era o melhor para ela” que os Réus/Recorridos encenaram sobre a Autora/Recorrente, em conluio, levaram que a declaração de vontade no ato notarial ora colocado em sindicância encontra-se viciado na vontade,
4. Ou seja, a vontade declarada, não corresponde à vontade real e a mesma não foi proferida de forma livre e esclarecida.
5. A douta sentença ora recorrida enferma de enumeras contrariedades, designadamente entre a factualidade dado como provada e dada como não provada, como passaremos a explanar.
6. O tribunal a quo andou bem ao dar como provado que a doadora preparou-se, levando uma única e exclusiva muda de roupa, dado que era sua intenção passar somente a véspera de Natal, achando que no dia 25 de Dezembro, já estaria de regresso a sua casa, sita na ... e não o tempo todo que se seguiu (facto K dado como provado)
7. Logo, está claro de ver a clara falta de vontade de doadora em celebrar qualquer escritura de doação
8. E antes passar apenas o natal e não uma temporada na casa dos Réus
 9. Veja-se que até decorreu na residência dos Réus, no dia 30/01/2021, na Sr.ª Dr.ª DD, notária, dois médicos de seu nome EE e FF, a Sr.ª Dr.ª GG e o Sr. Dr. HH, estes dois últimos Advogados, na sala da casa dos Réus, pessoas que a Autora não conhecia.”
10. No mesmo dia, a Autora assina um testamento através do qual instituía como seu único e universal herdeiro II e assina uma procuração em que lhe atribuía amplos poderes, para em seu nome comprar, vender e permutar pelos preços e condições que entendesse convenientes quaisquer bens móveis ou imóveis que possua ou venha a possuir.”
11. E foi assinar na mesma data a escritura pública de doação, pela qual por conta da sua quota disponível doa aos Réus o prédio fracção autónoma designada pelas letras ..., correspondente a uma habitação do tipo T-três no ... andar, com entrada pelo número cento e quarenta e três da Avenida ..., ..., a qual faz parte do prédio urbano em regime da propriedade horizontal descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o número ... e que aí estava registado a favor da Autora pela apresentação ..., de ..., inscrito na respetiva matriz sob o artigo ...09, com o valor patrimonial correspondente à fração de €102.431,39 (cento e dois mil quatrocentos e trinta e um euros e trinta e nove cêntimos), valor que atribuíram à doação.”
12. Nos referidos documentos consta que intervieram como peritos médicos, os Srs. Drs. EE e FF, tendo estes abonado a sanidade mental da Autora naquela data, podendo ler-se “a pedido da doadora dita AA, e não porque eu, notária, tivesse quaisquer dúvidas sobre a sanidade mental, intervieram neste ato como peritos médicos”.”
13. Ora, se não existiam dúvidas quanto à sanidade mental da doadora, porque razão teriam que se socorrer em todos os documentos de peritos médicos quanto à sanidade mental?
14. Dúvidas existissem teria sempre que se recorrer à via judicial para aferir da capacidade da Autora, mas para ser mais célere e conveniente à vontade dos Réus, não foi isso que sucedeu.
15. Porque os Réis sabiam que só assim conseguiriam valer a sua vontade, quanto à vontade real da doadora
16. Mas veja-se que em Agosto de 2021, a Autora, num encontro com o empreiteiro da obra da moradia sita na Rua ..., JJ, desabafa e diz que nunca teve qualquer intenção em doar o apartamento de tipologia ..., sito na Avenida ... e que era intenção dela viver na moradia objeto de intervenção por este e arrendar o já melhor identificado apartamento.”
17. Tendo-se pedido àquele empreiteiro que lhe indicasse um profissional da área jurídica para que pudesse reverter os efeitos jurídicos dos atos notariais que lhe mostrou que passavam tão somente, pelo testamento e procuração.
18. Ou seja, a doadora sabia que assinou uns documentos dos quais não conhecia o seu teor, nem efeitos.
19. Tanto é que dos factos considerados não provados, andou mal o tribunal a quo a não considerar que um dos Réus, II confiava no empreiteiro JJ, quando era aquele que tratava dos assuntos de obras dando instruções ao empreiteiro ora contratado e indicado por este, bem como ajustando o prédio às suas necessidades laborais
20. II e os Réus convidaram a Autora para passar o Natal, alegando que esta não poderia passar tal noite sozinha e afirmando que, a partir daquela data, seriam “como família” para a ora Autora.”
21. O tribunal a quo deveria ter dado que os Réus ao convencerem a Autora de que, dada a sua idade avançada e resultante do contacto com diversas pessoas na noite da Natal, o mais sensato seria manter-se em confinamento por um período de uma semana na casa deles, apenas quiseram que esta se mantivesse com estes em ..., e que a mesma ficasse isolada e sem contactar as suas habituais pessoas de confiança e relações de amizade.
22. São inúmeras as incongruências entre os factos provados e não provados, sendo que a factualidade que foi dada como não provada, deveria ter sido dado como provada, dado que através dos meios de prova carreados para o processo o tribunal deveria ter ficado com a vil convicção de que a Autora só deteve conhecimento do conteúdo da escritura de doação inquinada e objeto de litigio em data posterior não concretamente apuradas, mas sempre posterior à data de 31 de agosto de 2021
23. É a testemunha JJ que disse que o Sr. II ter conhecido a D. AA e terem travado uma amizade, tendo referido até que aquele senhor representava para ela um filho que não tinha, uma figura masculina que lhe dava muita atenção, que proporcionava carinho, no sentido mesmo do carinho efetivo, que ela era uma pessoa muito sozinha, acho que, basicamente era isso.
24. Das declarações prestadas em sede de audiência de julgamento e nestas alegações transcritas resulta claro e cristalino que aqui Autora/Recorrente não tinha em agosto de 2021 do conteúdo do contrato de doação outorgado e que padecia de um vicio da vontade declarada, vicio este que serve de fundamento à anulabilidade deste contrato e que cessa nas palavras de Pires de Lima Antunes Varela, quando o interessado dele toma conhecimento.
25. Ora, do depoimento supratranscrito nada se pode retirar de que a Autora tenha tido conhecimento do real conteúdo da outorga em 31 de agosto de 2021, isto porque naquela data Autora apenas tinha revertido os documentos que esses tinha na sua posse se fez menção expressa ao à testemunha JJ,
26. Ou seja, a Autora apenas tinha conhecimento dos documentos que exibiu ao Sr. JJ, designadamente o testamento e a procuração que fez chegar ao Dr. KK, no dia em que foi à consulta advogado a quem recorreu à data e este posteriormente a esta data é que encetou diligências para junto do Cartório da Drª DD, para perceber quais os atos notariais praticados naquele fatídico (para a Recorrente) dia 30/01/2021 e conseguir explicar aqui a Autora qual conteúdo dos mesmos, visto que ela lhe transmitiu que o aqui Réu, dizia pela ... que era dono de um apartamento na ....
27. Tanto assim o é que da douta sentença ora recorrida pode ler-se que a testemunha JJ, empresário, conhece a Autora porque fez obras na casa dela em Novembro de 2020, e não conhece os Réus;
28. Relatou que conheceu a Autora através do referido Sr. II, que o abordou em Agosto de 2020, promoveu um encontro entre a testemunha e a Autora, para dar esclarecimentos sobre um orçamento de obras e acabou por ser ele a fazer as obras, a pedido dos dois em conjunto
29. O II iria ser arrendatário da Autora e era ele que acompanhava a Autora à visita da obra e dava indicações; depois, era ele que aparecia em representação da Autora, que deixou de aparecer; os pagamentos eram feitos pela Autora, por transferência; a relação entre a Autora e o II era boa, elevada, revelando carinho e respeito;
30. Resolvendo o tribunal a quo que a Autora era uma senhora muito solitária, e que disse à testemunha JJ que passava sempre o Natal sozinha, e convidou-a para passar o Natal com ele, ela recusou;
31. Só no final de Agosto de 2021 ela lhe mostrou uma procuração e um testamento, ao Sr. JJ, tendo-lhe pedido para os ver e explicar o que eram e este aconselhou-a a consultar um advogado.
32. Só depois desta consulta é que a Autora percebeu que revogou a procuração e anulou o testamento.
33. Em momento algum, a Testemunha JJ faz qualquer referência ao contrato impugnado nos presentes autos,
34. Pelo que, não se pode conformar a aqui Recorrente com o facto de o tribunal a quo ter dado como provada no ponto Z) Em Agosto de 2021, a Autora, num encontro com o empreiteiro da obra da moradia sita na Rua ..., JJ, desabafa e diz que nunca teve qualquer intenção em doar o apartamento de tipologia ..., sito na Avenida ... e que era intenção dela viver na moradia objeto de intervenção por este e arrendar o já melhor identificado apartamento.
35. E no ponto AA) Agendaram, para tal, um encontro, no qual a Autora mostrou ao Sr. JJ, os actos notariais invocados e pediu-lhe que a auxiliasse a reverter os efeitos jurídicos dos mesmos, pelo que Tal factualidade só poderá ter sido dada como não provada, pois não existe qualquer conclusão que se possa retirar do testemunho aqui transcrito de que foi na data de 31 de agosto, a Autora demonstra tomar consciência da doação.
36. Ora, corrigindo o tribunal ad quem, os vícios de valoração da prova e da fundamentação da aplicação do Direito ao caso concerto deverão os factos supre citados ser valorado como provados face a todo o já vertido na sentença objeto de recurso e em consequência de tal valoração ser aplicado ao caso em concreto o instituto do negócio usurário e com consequente anulabilidade da escritura pública de doação impugnada… só assim se verá concretizada A COSTUMADA JUSTIÇA
37. A força probatória material dos documentos autênticos restringe-se, nos termos do art. 371.º, n.º 1, do CC, aos factos, praticados ou percecionados pela autoridade ou oficial público, que emanam dos documentos, já não abarcando, porém, a veracidade e eficácia jurídica das declarações que deles constam.
38. Resulta do art. 257.º, n.º 1, do CC, que o ato será anulável com fundamento em incapacidade acidental se a incapacidade for notória, no sentido de manifesta a uma pessoa de normal inteligência, ou conhecida da outra parte. São, assim, anuláveis as declarações que constam de documento autêntico quando o declarante delira, referindo factos desconexos com a realidade, exteriorizando sinais de tal estado.
39. Para a anulabilidade destes atos não basta a prova da incapacidade natural, exige-se igualmente, para tutela da boa fé do declaratário e da segurança jurídica, a prova da cognoscibilidade da incapacidade.
40. Serão inválidos se, acidentalmente, na altura em que são praticados, o declarante está incapacitado, nos termos do artigo 257° do Código Civil.
41. Temos, pois, que, nestes casos, a capacidade é a regra e a incapacidade é a exceção, pelo que quem invocar esta tem o ónus de a provar, ou seja, compete a quem invoca uma incapacidade fundada no artigo 257.º do Código Civil alegar e provar que o declarante se encontrava, na altura da prática do ato, incapacitado nos termos e para o efeito do disposto neste artigo.
42. A pessoa afetada com a alegada incapacidade, tem legitimidade para requerer a anulação da escritura por ser no seu interesse que se atribui o direito de anular o ato, tal como o disposto no n.º 3 do artigo 154 do Código Civil, isto, torna-se veemente necessário frisar o facto de que a Autora/Recorrente foi coagida na formação da sua vontade, sendo, por seu turno, um facto que não poderemos deixar passar impune e isento de censura.
43. Resultante de toda estas manobras ardilosas, causa, conseguiram os aqui Réus/Recorridos e a perfeita noção, que caso tal não se verificasse e operasse, nos termos e moldes com que conseguiram viciar a vontade da Autora, nunca estaríamos nesta presente lide.
44. Não nos compete, nem por uma questão de patrocínio, equacionarmos a longínqua hipótese de um profissional de saúde poder afirmar, perentoriamente, que alguém está ou não está capaz, para per si poder celebrar contratos como os que se encontram aqui em discussão.
45. No entanto, suspeito e estranho é o facto de termos opiniões tão distintas, no que concerne ao estado de capacidade de celebrar negócios por parte da Autora/Recorrente.
46. A incapacidade para entender e querer, no momento da feitura ato notarial e no contrato, não tem necessariamente de estar afirmada por uma sentença que declare a interdição do testador, o que pressupõe um estado continuado, permanente, de incapacidade volitiva; essa incapacidade pode ser meramente ocasional, transitória, desde que seja contemporânea da declaração volitiva plasmada no testamento, situação que se verifica no caso em apreço.
47. Ora, de uma leitura atenta dos depoimentos das testemunhas ora transcritas, pode-se inferir de forma clara e objetiva que a sua presença naquele dia e naqueles atos foi a pedido do aqui Réu e por intermédio dos seus advogados Drª GG e Dr. HH, o que demonstra e fica sobejamente mostrado que estes não estavam ali a pedido da aqui Recorrente e naquele ato doadora, mas sim a pedido dos donatários, para a acautelar o sue fundado e certo receio que a Autora quisesse e como assim pretende reverter um contrato que só teve vantagens e largo beneficio económico para os aqui Recorridos, que passaram a deter, através do ato notarial objeto de litigio um aumento no seu património imobiliário de cerca de €350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros).
48. Mais se pode verificar do depoimento prestado pelo Dr. FF transcrito, que a aqui Recorrente não pretendia celebrar qualquer contratos com os aqui Réus/Recorrido diz ele que foi a solução arranjada no momento, os Donatários/Réus/Recorridos, lê-se da douta sentença ora objeto de impugnação que “ ela queria fazer uma doação ao filho dos Réus”
49. Disto decorre que os documento que previamente tinham sido elaborados e foram de supetão mostrados à Autora/Recorrente naquele dia, tiveram apenas anuência e concordância dos donatários/Réus/Recorridos e do seu filho, ardilando aquele aparato e com aquele sem número de pessoas e intervenientes, na casa destes, no dia seguinte à Autora ter tido alta por pneumonia por Covid 19, de forma a que esta não tivesse outra alternativa que de forma em nada livre e esclarecida assinasses os documentos que fizessem dos Réus e do seu filho II donos e senhores do património da Autora, avaliado nuns largos milhares de euros, muito próximo de um milhão de euros.
50. De uma apreciação de toda a prova, da globalidade da mesma, bem como, do confronto entre as versões trazidas aos autos, para que fosse realizada acostumada justiça não poderia resultar, como não provado o factos vertidos nos pontos 15, 16, 17, 18 e 19 da factualidade valorada como não provada.
51.A Autora foi transportada após a alta do hospital para a casa dos Réus contra a sua vontade, visto que pretendia regressar para a sua residência.
52.A Autora no dia 29/01/2021 recebe instruções dos Réus para no dia seguinte levantar-se cedo porque precisavam dela de manhã, informação que recebeu com estranheza, porque o que pretendia era ter umas boas horas de sono e de descanso.
53. No dia 30/01/2021,a Autora é surpreendida pela presença da Dr.ª DD, notária, dois médicos de seu nome EE e FF, da Dr.ª GG e Dr. HH, na sala da casa dos Réus.
54.Tais pessoas foram convocadas pelos Réus e pelo seu filho II, para que, de supetão a Autora dispusesse e os tornasse únicos e exclusivos beneficiários do seu património.
55. Nessa data a Autora encontrava-se com síndrome confusional agudo, não estando na posse das suas capacidades cognitivas plenas com um prejuízo muito relevante em particular das funções atencionais e mnésicas.
56. Esse síndrome confusional agudo verificou-se desde o dia ../../2021 até ao dia ../../2021.
57. Posto isto, torna-se veemente necessário frisar o facto de que a Autora/Recorrente foi coagida na formação da sua vontade, sendo, por seu turno, um facto que não poderemos deixar passar impune e isento de censura.
58. Resultante de toda estas manobras ardilosas, causa, conseguiram os aqui Réus/Recorridos e a perfeita noção, que caso tal não se verificasse e operasse, nos termos e moldes com que conseguiram viciar a vontade da Autora, nunca estaríamos nesta presente lide.
59. Não nos compete, nem por uma questão de patrocínio, equacionarmos a longínqua hipótese de um profissional de saúde poder afirmar, perentoriamente, que alguém está ou não está capaz, para per si poder celebrar contratos como os que se encontram aqui em discussão.
60. No entanto, suspeito e estranho é o facto de termos opiniões tão distintas, no que concerne ao estado de capacidade de celebrar negócios por parte da Autora/Recorremte.
61. A incapacidade para entender e querer, no momento da feitura ato notarial e no contrato, não tem necessariamente de estar afirmada por uma sentença que declare a interdição do testador, o que pressupõe um estado continuado, permanente, de incapacidade volitiva; essa incapacidade pode ser meramente ocasional, transitória, desde que seja contemporânea da declaração volitiva plasmada no testamento, situação que se verifica no caso em apreço.
62. O estado de incapacidade acidental do Outorgante deve existir no momento da feitura do testamento, incumbindo ao interessado na invalidade o ónus da prova dos factos reveladores de incapacidade acidental – art. 342º, nº1, do CódigoCivil.
63. Em face disto, a incapacidade acidental, no momento da celebração do negócio, para entender o sentido das declarações ou exercer livremente a vontade torna este documento anulável, incumbindo ao autor, beneficiário da pretendida anulação, o ónus de alegar e provar factos que permitam ao julgador afirmar esse estado de incapacidade.
64. Resulta clara e cristalina que o simples facto de a notária, tendo ouvido as declarações da Outorgante a e com ela conversado, não se ter apercebido de qualquer incapacidade da mesma é inqualificada garantia de que a Autora/Recorrente não gozava, quando declarou, de capacidade de entender, de querer e de adequadamente manifestar a sua vontade.
65. A prova do conhecimento pelos outros outorgantes da incapacidade do Outorgante pode ser feita através de presunções judiciais, mormente extraindo-se, por dedução lógica, do facto daquele conviver regularmente.

TERMOS EM QUE DEVE SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, ALTERANDO-SE A DOUTA DECISÃO DO TRIBUNAL A QUO POR OUTRA QUE DECLARE A ANULAÇÃO DA ESCRITURA DE DOAÇÃO OUTORGADA A 30 DE JANEIRO DE 2021, PELA NOTÁRIA DR.ª DD, FLS. 32 A 34 DO LIVRO ...17... DO CARTÓRIO NOTARIAL SITUADO NA RUA ..., NO MUNICÍPIO ... COM BASE NA FALTA DE CAPACIDADE DE EXERCÍCIO DE DIREITOS DA RECORRENTE E NA FALTA DE CONSCIÊNCIA DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL, BEM COMO DOS SEUS EFEITOS; SEJA DECRETADO O CANCELAMENTO DA AP. ...45... 04/02/2021 EFETUADA NA CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL ... (...), RESTITUINDO-SE OBEM DESCRITO SOB NÚMERO ...99... DA CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL ..., REGRESSANDO A FRAÇÃO ..., ... INSCRIÇÃO ...09... UNIÃO DE FREGUESIAS ..., ... E ... À ESFERA JURÍDICA E PATRIMÓNIO DA RECORRENTE…

 Os Recorridos responderam ao recurso pugnando pela sua rejeição, por incumprimento do disposto no art. 639º, do C.P.C., e, sempre, pela sua improcedência, por falta de fundamento.

2. QUESTÕES A DECIDIR

Nos termos dos Artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de actuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial.[1] Esta limitação objectiva da actividade do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas[2] que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.[3]
As questões enunciadas pelo/a(s) recorrente(s) podem sintetizar-se da seguinte:
- Modificação da decisão da matéria de facto;
- Seu reflexo no sentido da decisão e seus fundamentos de direito.

Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir.

3. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO JULGADA

Nos termos do Artigo 640º, nº 1, do Código de Processo Civil,
«Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”
No que toca à especificação dos meios probatórios - «Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (Artigo 640º, nº 2, al. a) do Código de Processo Civil).

Como refere Abrantes Geraldes[4], sendo certo que actualmente a possibilidade de alteração da matéria de facto é agora assumida como função normal da Relação, verificados que sejam os requisitos que a lei consagra, certo é que nessa operação “foram recusadas soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição do julgamento, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, tendo o legislado optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente.

De acordo com este mesmo autor e Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, em síntese, o sistema actual de apelação que envolva a impugnação sobre a matéria de facto exige ao impugnante, o seguinte:
a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenha sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos[5];
c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considera oportunos; (…)
e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos[6], exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos e pendor genérico e inconsequente;(…).

Sublinha ainda o mesmo autor que não existe, quanto ao recurso da matéria de facto despacho de aperfeiçoamento.
Tendo em mente esta exigência do dispositivo do citado art. 640º, entende ainda Abrantes Geraldes que, mediante uma apreciação rigorosa, decorrente do princípio da auto-responsabilidade das partes[7], sempre com respeito do princípio da proporcionalidade, da letra e espírito da lei, “a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se em alguma das seguintes situações: A falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (cf. arts. 635º, nº 4, e 641º, nº 2, al. b)); Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados (art. 640º, nº 1, al. a)); Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g., documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc); Falta de indicação exacta, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente cada segmento da impugnação.”
Sobre esta última exigência temos seguido posição, em consonância com o que tem sido a evolução da jurisprudência deste Tribunal da Relação de Guimarães e de outros tribunais de recurso, que, como ficou dito em Ac. de 19.11.2020[8], por nós subscrito, é a seguinte: “Em síntese, as conclusões têm a importante função de definir e delimitar o objecto do recurso e, desta forma, circunscrever o campo de intervenção do tribunal superior encarregado do julgamento.
Deste modo, sendo a impugnação de matéria de facto uma autêntica questão fundamental, susceptível de conduzir a decisão diferente, deve ela ser incluída nas conclusões das alegações, de forma sintética mas obviamente com indicação expressa e precisa dos pontos de facto impugnados e com as correspondentes conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio.[9]
Essa leitura veio entretanto a ser mitigada com o Ac. uniformizador de jurisprudência proferido pelo S.T.J., em , no qual ficou dito que, sic: “O recorrente que impugne a decisão sobre a matéria de facto, cumpre o ónus constante do nº 1, c), do art. 640º, se a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, constar das conclusões, mas também da leitura articulada destas últimas com a motivação do vertido na globalidade das alegações, e mesmo na sequência do aludido, apenas do corpo das alegações, desde que, do modo realizado, não se suscitem quaisquer dúvidas.
Ficou por isso expressa uniformização de jurisprudência nos seguintes termos: Nos termos da alínea c), do nº 1, do artigo 640º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações.
Decorre também dessa leitura, conforme jurisprudência recente do Supremo Tribunal de Justiça que devemos ter em conta, de acordo com o disposto no art. 8º, nº 3, do Código Civil, que não são admissíveis impugnações em bloco que avolumem num ou em vários conjuntos de factos diversos a referência à pertinente prova que motiva a pretendida alteração das decisões e que, na prática, se reconduzem a uma impugnação genérica, ainda que parcelar.
É exemplo disso o recente Ac. do S.T.J., de 20.12.2017, onde, em sumário, se escreveu o seguinte: sic: I- A alínea b), do nº 1, do art. 640º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique “os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”, impõe que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respectivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos[10]. II - Não cumpre aquele ónus o apelante que, nas alegações e nas conclusões, divide a matéria de facto impugnada em três “blocos distintos de factos” e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna.
Nesse sentido o mesmo Supremo Tribunal considerou, em acórdão inédito de 14.06.2018, relatado pelo Conselheiro A. Joaquim Piçarra, em apreciação e confirmação de acórdão relatado por nós que envolvia essa matéria, no Proc. 2926/16.0T8BRG.G1.S1, em síntese e a propósito, que, sic: Não observa o ónus impugnatório fixado no art. 640º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, o impugnante da decisão da matéria de facto que, de forma confusa, prolixa e ambígua, não indica com precisão e certeza o sentido decisório a adoptar[11], nem correlaciona a parte concreta dos depoimentos ou documentos oferecidos relativamente a cada um do conjunto alargado de factos impugnados[12].

Além disso, como já acima se foi adiantando e afirma Ana Geraldes, in “Impugnação e reapreciação da decisão da matéria de facto”,:
« (…) tal como se impõe que o Tribunal faça a análise crítica das provas (de todas as provas que se tenham revelado decisivas), (…), também o recorrente, ao enunciar os concretos meios de prova que devem conduzir a uma decisão diversa, deve fundar tal pretensão numa análise (crítica) dos meios de prova, não bastando reproduzir um ou outro segmento descontextualizado dos depoimentos.
Como é sabido, a prova de um facto não resulta, regra geral, de um só depoimento ou parte dele, mas da conjugação de todos os meios de prova carreados para os autos.
E ainda que não existam obstáculos formais a que um determinado facto seja julgado provado pelo Tribunal mediante o recurso a um único depoimento a que seja atribuída suficiente credibilidade, não deve perder-se de vista a falibilidade da prova testemunhal quotidianamente comprovada pela existência de depoimentos testemunhais imprecisos, contraditórios ou, mais grave ainda, afectados por perjúrio.
Neste contexto, é facilmente compreensível que se reclame da parte do recorrente a explicitação da sua discordância fundada nos concretos meios probatórios ou pontos de facto que considera incorrectamente julgados, ónus que não se compadece com a mera alusão a depoimentos parcelares e sincopados, sem indicação concreta das insuficiências, discrepâncias ou deficiências de apreciação da prova produzida, em confronto com o resultado que pelo Tribunal foi declarado.
Exige-se, pois, o confronto desses elementos com os restantes que serviram de suporte para a formulação da convicção do Tribunal (e que ficaram expressos na decisão), com recurso, se necessário, às restantes provas, v.g., documentais, relatórios periciais, etc., apontando as eventuais disparidades e contradições que infirmem a decisão impugnada.”

Por sua vez, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9.2.2012, Abrantes Geraldes, 1858/06[13], afirmou-se, relativamente ao regime semelhante do art. 690ºA, do Código de Processo Civil revogado, que:
 «Insurgindo-se contra uma decisão fundada em determinados meios de prova que ficaram concretizados na motivação, era suposto que se aprimorasse na enunciação dos reais motivos da sua discordância traduzidos na análise crítica (e séria) da prova produzida e não na genérica discordância quanto ao facto de o tribunal de 1ª instância ter dado mais relevo a umas testemunhas do que a outras. Ónus esse que deveria passar pela análise conjugada dos diversos meios de prova, relevando os que foram oralmente produzidos e os de outra natureza constantes dos autos.
Em face de tantas e tão graves distorções em relação aos trâmites impostos pela lei, não seria exigível que a Relação desse seguimento à referida pretensão genérica, justificando-se a rejeição do recurso na parte respeitante à decisão da matéria de facto.
Com efeito, o regime legal instituído não acolhe de forma alguma a impugnação genérica e imotivada de todos os pontos inscritos na base instrutória, do mesmo modo que se afastou de um modelo alternativo que impusesse à Relação a realização de um segundo julgamento. O que está subjacente ao regime vigente é a impugnação especificada e motivada dos pontos relativamente aos quais existe discordância, levando a que a Relação repondere a decisão que foi tomada sobre determinados pontos de facto, servindo-se dos meios de prova que se mostram acessíveis.
Resulta deste excurso pela doutrina e jurisprudência que o ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida não é observado quando o apelante: (i) se insurge genericamente quanto à convicção formada pelo tribunal a quo; (ii) se limita a sinalizar que existe um meio de prova, v.g., testemunha, que diverge dos factos tidos como provados pelo tribunal a quo, pretendendo arrimar – sem mais – nesse meio de prova uma decisão de facto diversa da expressa pelo tribunal a quo.
Com efeito, o tribunal de primeira instância – no âmbito do contexto de justificação – elabora uma motivação-documento em que explicita as razões que permitem, ou não, aceitar os enunciados fácticos como verdadeiros. Nessa motivação, o juiz a quo valora o conjunto dos meios de prova que foram carreados para o processo, expressando uma convicção que tem que ser objectivável e intersubjectiva[14]. O standard de prova do processo civil é, na maioria dos casos, o da probabilidade prevalecente (“more-likely-than-not”) que se consubstancia em duas regras fundamentais: (i) entre as várias hipóteses de facto deve preferir-se e considerar-se como verdadeira aquela que conte com um grau de confirmação relativamente maior face às demais e (ii) deve preferir-se aquela hipótese que seja “mais provável que não”, ou seja, aquela hipótese que é mais provável que seja verdadeira do que seja falsa[15].
Assim sendo, cabe ao apelante – para efeitos de cumprimento do ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida – argumentar, de forma concretizada, no sentido de que os meios de prova produzidos no processo, apreciados em conjunto e de forma crítica, impõem uma convicção diversa quanto à reconstituição dos factos, atingindo essa diferente versão dos factos o patamar da probabilidade prevalecente, arredando - do mesmo passo - a versão aceite pelo tribunal a quo. Cabe ao apelante colocar-se na posição do juiz a quo e exercitar - ele próprio - a apreciação crítica da prova, hierarquizando a credibilidade dos meios de prova (enunciando os parâmetros que majoram ou diminuem a credibilidade de cada meio de prova), concluindo por uma versão alternativa dos factos. Deste modo, este exercício não se basta com a mera enunciação da existência de meios de prova em sentido oposto/diverso da versão dos factos tida como provada pelo tribunal a quo. A existência de sentidos díspares dos meios de prova é conatural a qualquer processo judicial pelo que o cumprimento do ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto não pode ter-se por observado com tal enunciação singela.
É incumbência do apelante actuar numa dupla vertente: (i) rebater, de forma suficiente e explícita, a apreciação crítica da prova feita no tribunal a quo, (ii) tentando demonstrar que a prova produzida inculca outra versão dos factos que atinge o patamar da probabilidade prevalecente. Assim, não chega sinalizar a existência de meios de prova em sentido divergente, cabendo ao apelante aduzir argumentos no sentido de infirmar directamente os termos do raciocínio probatório adoptado pelo tribunal a quo, evidenciando que o mesmo é injustificado e consubstancia um exercício incorrecto da hierarquização dos parâmetros de credibilização dos meios de prova produzidos, ou seja, que é inconsistente.
 Em suma, não observa o ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida o apelante que se abstém de desconstruir a apreciação crítica da prova, realizada pelo tribunal a quo na decisão impugnada, limitando-se a assinalar que existe um meio de prova em sentido diverso do aceite como prevalecente pelo mesmo tribunal.
Com refere Abrantes Geraldes[16] - As referidas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor. Trata-se a final, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo.

Tendo em mente a interpretação do art. 640º, que acima enunciamos, analisemos a pretensa impugnação dos Apelantes.
*
Descendo ao caso.

A Apelante sindica expressamente a decisão da matéria de facto quando afirma na sua primeira conclusão (1.) que, sic, existem erros de julgamento que impunham decisão diversa.
Em reacção, os Recorridos alegam, em suma, que essa impugnação não cumpre alguns dos ónus acima registados e é confusa.
Será assim?
Na verdade, compulsada a apelação da Autora a impressão que perpassa imediatamente da leitura das motivações e conclusões que a compõem é a de alguma confusão e imprecisão na fixação do objecto dessa impugnação e no cumprimento dos ónus estabelecidos no acima citado art. 640º, do Código de Processo Civil.
Posto isto, em sintonia com o que acima ficou adiantado, vejamos em que medida foram cumpridas essas exigências.
Antes de mais, como ficou assinalado supra, é nas conclusões do recurso que se deve conter o objecto da apelação e, em particular, no caso da impugnação da matéria de facto decidida, a identificação do seu objecto, com a referência clara àquela cuja revisão se pretende que venha ser realizada por este Tribunal de recurso.
Ora, neste aspecto algumas das conclusões da Apelante revelam-se sobretudo vagas e imprecisas, fazendo apenas menções genéricas sobre alegados erros de julgamento (v.g., conclusões 1., 5., 22.), o que não cumpre o disposto no art. 640º, nº 1, al. a), do C.P.C., e importa, pelas razões que já ficaram acima expostas e nos abstemos de repetir aqui, a rejeição dessa impugnação genérica.
Além disso, no seio dessas conclusões, a Apelante aparenta concretizar, por vezes, algumas discordâncias com a decisão em crise.
É isso que sucede nos seus itens 19. a 21., nos quais aparentemente a Autora entende que o Tribunal a quo, sic, “andou mal” ao não considerar provados factos que, só após confronto com a decisão em crise, percebemos que são, em parte, os julgados negativamente nos itens 2., 3., 4., 6. e 7., da decisão recorrida.
De seguida, nos seu item 22., a Apelante afirma ainda a esse propósito que, sic: São inúmeras as incongruências entre os factos provados e não provados, sendo que a factualidade que foi dada como não provada, deveria ter sido dado como provada, dado que através dos meios de prova carreados para o processo o tribunal deveria ter ficado com a vil convicção de que a Autora só deteve conhecimento do conteúdo da escritura de doação inquinada e objecto de litigio em data posterior não concretamente apuradas, mas sempre posterior à data de 31 de Agosto de 2021.
Esta dita “conclusão”, que peca por consubstanciar a habitual repetição do que se alegou em sede de motivação, sem o devido contexto, significa de forma exemplar a falta de precisão e coerência da impugnação da Apelante.
Com efeito, a Apelante, em sede de conclusões, parece, num primeiro momento, querer impugnar a factualidade (parcial) que literalmente cita nos itens 20. e 21., para depois alargar o seu âmbito a toda[17]a factualidade que foi dada como não provada” (1ª parte do item 22.) e depois concluir que, a final, deveria era o Tribunal  ter ficado convencido daquele “conhecimento” posterior a 31.8.2021 que não vimos ser alegado oportunamente.
Perante isto, deixamos desde já claro que apenas consideramos relevante para apreciação nesta sede aquilo que ficou expresso em sede de conclusões, em sintonia com o que a esse propósito ficou dito supra em 2. e 3.1. sobre o papel, único, dessas em fixar o objecto do recurso e, neste caso, da impugnação a apreciar, pelo que nos abstemos de conhecer de outra matéria referida em sede de motivação mas que não foi indicada nessas conclusões (cf. arts. 639º e 640º, nº 1, al. c), do C.P.C.).
Sem prejuízo disso, dir-se-á ainda que, no que respeita à mencionada factualidade dos itens 2., 3., 4., 6. e 7., dos factos não provados, não foi cumprido o disposto no art. 640º, nº 1, al. b), do C.P.C., com a concretização, relativamente a cada um desses factos históricos, da prova e/ou, neste caso, passagens da prova pessoal gravada citada, que fosse relevante para a sua específica revisão, antes optando a Apelante pela invocação genérica de uma série de elementos probatórios, nomeadamente testemunhos, por vezes com transcrições completas, e que na argumentação da motivação do recurso se confundem com a apreciação de outros factos além dos acima mencionados.
Por isso, a rejeição dessa particular impugnação também decorreria do incumprimento do disposto no art. 640º, nº 1, al. b), do C.P.C., com a interpretação que acima enunciámos.
Ainda sem prejuízo de tudo isso, sucede que, como adiantam os Recorridos, essa matéria é impertinente para o julgamento que se quer criticar.
É preciso ter em mente que o recurso para este Tribunal de apelação não é um exercício de argumentação teórica desgarrado da concreta decisão que, aparentemente, se pretende questionar mas que, sem dúvida, é o único objecto possível desta apelação.
Sucede que, como se afirma em arresto deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 1.3.2018, relatado pela Des. Maria João Matos[18], a jurisprudência veio precisar que a impugnação da decisão de facto não se justifica a se, de forma independente e autónoma da decisão de mérito proferida, assumindo antes um carácter instrumental face à mesma.
“Com efeito, a «impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, consagrada no artigo 685.º-B [do anterior C.P.C.], visa, em primeira linha, modificar o julgamento feito sobre os factos que se consideram incorrectamente julgados. Mas, este instrumento processual tem por fim último possibilitar alterar a matéria de facto que o tribunal a quo considerou provada, para, face à nova realidade a que por esse caminho se chegou, se possa concluir que afinal existe o direito que foi invocado, ou que não se verifica um outro cuja existência se reconheceu; ou seja, que o enquadramento jurídico dos factos agora tidos por provados conduz a decisão diferente da anteriormente alcançada. O seu efectivo objectivo é conceder à parte uma ferramenta processual que lhe permita modificar a matéria de facto considerada provada ou não provada, de modo a que, por essa via, obtenha um efeito juridicamente útil ou relevante» (Ac. da RC, de 24.04.2012, António Beça Pereira, Processo nº 219/10.6T2VGS.C1, com bold apócrifo).
Logo, por força dos princípios da utilidade, economia e celeridade processual, o Tribunal ad quem não deve reapreciar a matéria de facto «quando o(s) facto(s) concreto(s) objecto da impugnação for insusceptível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente», convertendo-a numa «pura actividade gratuita ou diletante» (conforme Ac. da RC, de 27.05.2014, Moreira do Carmo, Processo nº 1024/12.0T2AVR.C1).
Por outras palavras, se, «por qualquer motivo, o facto a que se dirige aquela impugnação for, "segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito", irrelevante para a decisão a proferir, então torna-se inútil a actividade de reapreciar o julgamento da matéria de facto, pois, nesse caso, mesmo que, em conformidade com a pretensão do recorrente, se modifique o juízo anteriormente formulado, sempre o facto que agora se considerou provado ou não provado continua a ser juridicamente inócuo ou insuficiente.
Quer isto dizer que não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto objecto da impugnação não for susceptível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, antemão, ser inconsequente, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processual consagrados nos artigos 2.º n.º 1, 137.º e 138.º.» (Ac. da RC, de 24.04.2012, António Beça Pereira, Processo nº 219/10.6T2VGS.C1, com bold apócrifo. No mesmo sentido, Ac. da RC, de 14.01.2014, Henrique Antunes, Processo nº 6628/10.3TBLRA.C1, onde se lê que, de «harmonia com o princípio da utilidade a que estão submetidos todos os actos processuais, o exercício dos poderes de controlo da Relação sobre a decisão da matéria de facto da 1ª instância só se justifica se recair sobre factos com interesse para a decisão da causa (artº 137 do CPC de 1961, e 130 do NCPC)», pelo que se «o facto ou factos cujo julgamento é impugnado não forem relevantes para nenhuma das soluções plausíveis de direito da causa é de todo inútil a reponderação da decisão correspondente da 1ª instância»; e isso «sucederá sempre que, mesmo com a substituição, a solução o enquadramento jurídico do objecto da causa permanecer inalterado, porque, por exemplo, mesmo com a modificação, a factualidade assente continua a ser insuficiente ou é inidónea para produzir o efeito jurídico visado pelo autor, com a acção, ou pelo réu, com a contestação»).”
No caso, é patente que factualidade instrumental em causa, que nem deveria constar do rol dos factos julgados com esse formalismo, não serve sequer para reapreciar a excepção alegada pelos Réus, que foi julgada procedente pelo Tribunal a quo e constituiu o factor determinante do julgamento de improcedência que agora se pretende reverter.
Nesta medida, ao abrigo do disposto nos arts. 2º, nº 1, 6º e 130º, do Código de Processo Civil, nunca seria conhecida esta particular impugnação.

Resta ponderar o desfecho pretendido pela Autora relativamente à matéria nova que invoca no item 22. das suas conclusões.
No que diz respeito a esta matéria – a alegada consciência da Autora, relativamente ao negócio em crise, posterior ao mês de Agosto de 2021 – estamos perante factualidade que não foi alegada por si no momento próprio (art. 5º, do C.P.C.) e não pode agora, ser objecto, novo, em sede de recurso sobre a matéria de facto (vide o que ficou dito a propósito no ponto 2., supra).
Portanto, não iremos conhecer dessa impugnação.
Sem prejuízo disso, sempre se dirá que é a própria Autora que admite em sede de petição inicial que já em Agosto tinha consciência do alegado vício do negócio em crise (cf. itens 54º e 55º da p.i. – “nunca teve qualquer intenção de doar”) e, por isso, agiu em conformidade (itens 56º e ss.), chegando a afirmar expressamente no 60º artigo, da mesma petição, que foi em Agosto de 2021 que, sic, “tomou a verdadeira consciência dos actos notariais realizados naquele dia 30.1.2021”.
Por isso e pelo que mais desenvolvidamente se refere infra a propósito, ainda que fosse objecto admissível dessa revisão, sempre improcederia a sua impugnação e teria de ser questionada a (in)coerência da sua postura processual nesse âmbito, à luz da previsão do art. 542º, do Código de Processo Civil.

Mais à frente, a Apelante afirma (itens 34. e 35. das suas conclusões), que “não se pode conformar” com o facto de o Tribunal a quo ter dado como provado no ponto Z), dos factos provados, o que aí se reproduz e, aparentemente, tem igual inconformismo sobre o ponto AA) da mesma decisão positiva.
Concluindo, de seguida, em 36., que, sic, “os factos supracitados” devem “ser valorado como provados face a todo o já vertido na sentença”.
Ora, este é outro exemplo, também notado pelos Apelados, da enorme dificuldade em perceber as pretensões da Recorrente.
E se formos às respectivas motivações, que deveriam consubstanciar essa impugnação ou, em última instância, conforme a última jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça acima citada, elucidar este Tribunal sobre o sentido da decisão pretendida pela Recorrente quanto a esses dois pontos da matéria de facto, o que encontramos é, desde logo, a seguinte afirmação, que antecede uma selecção de vários factos, entre os quais os que acima se mencionam: “O tribunal a quo andou bem ao dar como provada a seguinte factualidade que se passa a transcrever da sentença ora recorrida, pois a mesma resultou clara e evidente,(...)”.
Mais adiante (p. 15), diversamente, a Apelante afirma, sic: “(…) não entende aqui Recorrente como a juiz a quo deu como provada no ponto Z) (…) ”. (…) Tal factualidade só poderá ter sido dada como não provada, (…).
Estamos, portanto, perante uma indefinição clara, no cumprimento do ónus da citada al. c), do nº 1, do art. 640º, que importa a rejeição da impugnação dessa matéria.
Sem prejuízo disso, sempre improcederia essa impugnação dos itens Z) e AA), dado que, como já se afirmou foi a própria Autora que admitiu inicialmente na sua petição esse conhecimento e agiu em conformidade com o que ficou demonstrado em CC) e DD), o que ficou suportado em documentos autênticos juntos com a p.i. (revogação de procuração e de testamento).
Essa admissão por parte da Autora (arts. 54º e 56º da p.i.) subjaz à convicção do Tribunal a quo, fazendo a Apelante por ignorar essa fundamentação quando tenta rebater a decisão em crise, o que, repete-se, não abona à credibilidade da sua nova versão dos factos.
De resto, em nosso entender a prova indicada não permite, com segurança, modificar esse raciocínio probatório.
É, desde logo, estranho que a Autora (sem melhor explicação) seleccionasse, os documentos que iria exibir à testemunha JJ, e, por outro lado, é patente, no testemunho deste último, que auditámos, ser muito (demasiado) pronto em negar em absoluto o conhecimento ou exibição desse documento nos termos em que aquela o admitiu inicialmente.
De resto, as declarações iniciais da Autora, que ouvimos, são, nessa parte, tendentes a afastar também de si esse cálice, ao dizer que não se lembrava de ter exibido ao JJ algum documento, contrariamente ao que admitira, parcialmente, este último. Só mais tarde a Autora admite poder ter levado o testamento e, mais adiante, a nova instância, admite que os documentos que mostrou a advogado foram os que mostrou ao JJ (1h15mn), tendo no entanto dado a entender que foi em Agosto de 2021 (disse 2020 mas no contexto em que o disse percebe-se que foi 2021) que tomou consciência daquilo que tinha sido feito, sem exclusão alguma. É igualmente de assinalar que a Autora declarou que o JJ tinha entretanto entrado em conflito com o II, o que pode ajudar a explicar alguma tendência do depoimento daquele.
Ficamos convencidos de que esta mudança na versão dos factos ocorre como reacção à contestação dos Réus e em face da constatação de que tinham sido reconhecidos factos que eram desfavoráveis à Autora, perante a invocada excepção de caducidade.
Pelo exposto, sempre manteríamos a decisão invocada, julgando improcedente a impugnação em apreço.

Por fim, defende a Autora (item 50.) que, sic: “não poderia resultar, como não provado o factos vertidos nos pontos 15, 16, 17, 18 e 19 da factualidade valorada como não provada”
Igualmente neste ponto, o que a Apelante pretende é uma repetição alargada do julgamento, pois apela à “globalidade” da prova produzida, e ao “confronto das versões trazidas aos autos” para justificar a sua impugnação da decisão negativa destes factos, sem concretização dos elementos probatórios que, em relação a cada um deles, seria fundamento dessa modificação.
Essa impugnação fácil não cumpre, como acima salientamos, o ónus da al. b), do nº 1, do citado art. 640º, do Código de Processo Civil, razão pela qual rejeitamos esta impugnação em bloco.
Sem prejuízo disso, estamos em sintonia com o decidido na primeira instância a esse propósito, tendo em conta o relato dos médicos que efectivamente observaram a Autora no momento da outorga da doação em causa e os documentos clínicos que atestam o estado de saúde da mesma no momento em que teve alta do internamento que precedera esse episódio, por contraponto com o exame e relatório realizados pelo médico LL, que observou aquela muito mais tarde, num contexto em que esta discutia a validade do negócio que aqui se discute.
Por essas razões, sempre improcederia a impugnação destes pontos da matéria de facto.
                                             
3.2. FACTOS A CONSIDERAR

a) Factos provados. 

A) A Autora tem 80 anos de idade (por referência a ../../2022), vivia sozinha, desde o falecimento da sua mãe, até passar a viver com os Réus.
B) Em meados de Agosto de 2020, o filho dos Réus, II, tendo conhecimento que a Autora é proprietária de um prédio sito na Rua ..., União das freguesias ..., ... e ..., contactou a Autora com o objectivo de arrendar o mesmo.
C) II apresentou à Autora um empreiteiro, JJ.
D) A Autora ficou sensibilizada com a atitude de prontidão e vontade de ajuda demonstrada por parte de II e passou a considerar o mesmo como uma pessoa de sua especial confiança, e nas sucessivas conversas partilhou com este que durante o dia fazia as suas refeições no prédio sito na Rua ..., porém, pernoitava num outro prédio destinado à habitação e de Tipologia ..., também sua propriedade, sito na Avenida ..., ..., na cidade ....
E) II passou a acompanhar a Autora nos actos respeitantes às obras do prédio da Rua ...,
F) E como se manteve próximo desta, apercebeu-se que a Autora detinha outros bens imóveis, tendo-se apercebido também, que se tratava de uma senhora de idade avançada e sem qualquer família de retaguarda, isto é, sem filhos, irmãos ou sobrinhos próximos.
G) Em sequência e pela sucessiva convivência de vários meses, em Dezembro de 2020, II inteirou-se que a Autora passaria a noite de Natal e os dias festivos sozinha, o que já era habitual.
H) II apresentou os Réus à Autora.
I) Os Réus convidaram a Autora para passar a noite de Natal na casa da filha e do genro, sita em ....
J) A Autora aceitou tal convite para passar a noite festiva de 24 de Dezembro de 2020 com os Réus e a família destes.
K) Preparou-se para tal, levando uma única e exclusiva muda de roupa, dado que era sua intenção passar somente a véspera de Natal, achando que no dia 25 de Dezembro, já estaria de regresso a sua casa, sita na ....
L) A Autora permaneceu na casa dos Réus depois do dia 25 de Dezembro, acabando por passar com os Réus e seus filhos a quadra festiva da passagem de ano, permanecendo na casa dos Réus no mês de Janeiro de 2021.
M) Durante o período de confinamento que se iniciou a 15/01/2021, os Réus testam positivo à Covid-19.
N) Porém, nessa mesma data, a Autora, também submetida a teste antigénio, testa negativo apesar de coabitar com os Réus.
O) Apesar de naquela data não ter testado positivo à Covid-19, a ora Autora acaba por testar positivo à Covid-19 em 20/01/2021, tendo começado a sentir sintomas em 16 de Janeiro, nomeadamente, cefaleias e febre.
P) Tendo a sua infecção por Covid19 agudizado em 27/01/2021, data em que a Autora foi avaliada na ADR – Casa dos Pescadores, sendo que em face desta avaliação foi-lhe atribuída alta médica, mediante a toma de um anti-histamínico.
Q) Contudo, em 28 de Janeiro, o estado de saúde da Autora volta a agravar-se, tendo sido atendida no Serviço de Urgência do Hospital ... e posteriormente transferida para o Centro Hospitalar ..., no qual é internada com um quadro de pneumonia associada à infecção por SARS-CoV-2 (COVID-19), apresentando febre e necessitando de oxigenoterapia.
R) A Autora teve alta em 29 de Janeiro de 2021 e é levada por II para a residência dos Réus em ....
S) A Autora encontrava-se em recuperação da pneumonia por covid-19, necessitando ainda, aquando da alta, de medicação para controlo de febre.
T) No dia 30/01/2021, na residência dos Réus, sita na Rua ..., na cidade ..., compareceram a Sr.ª Dr.ª DD, notária, dois médicos de seu nome EE e FF, a Sr.ª Dr.ª GG e o Sr. Dr. HH, estes dois últimos Advogados, na sala da casa dos Réus, pessoas que a Autora não conhecia.
U) Nesse dia a Autora assina um testamento através do qual instituía como seu único e universal herdeiro II e assina uma procuração em que lhe atribuía amplos poderes, para em seu nome comprar, vender e permutar pelos preços e condições que entendesse convenientes quaisquer bens móveis ou imóveis que possua ou venha a possuir.
V) Nessa mesma data a Autora assinou a escritura pública de doação, pela qual por conta da sua quota disponível doa aos Réus o prédio fracção autónoma designada pelas letras ..., correspondente a uma habitação do tipo T-três no ... andar, com entrada pelo número cento e quarenta e três da Avenida ..., ..., a qual faz parte do prédio urbano em regime da propriedade horizontal descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o número ... e que aí estava registado a favor da Autora pela apresentação ..., de ..., inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...09, com o valor patrimonial correspondente à fracção de €102.431,39 (cento e dois mil quatrocentos e trinta e um euros e trinta e nove cêntimos), valor que atribuíram à doação.
W) Nos referidos documentos consta que a pedido da Autora intervieram como peritos médicos, os Srs. Drs. EE e FF, tendo estes abonado a sanidade mental da Autora naquela data, podendo ler-se “a pedido da doadora dita AA, e não porque eu, notária, tivesse quaisquer dúvidas sobre a sanidade mental, intervieram neste acto como peritos médicos”.
X) Em 26 de Fevereiro de 2021, a Autora regressa ao apartamento da ..., prédio objecto do contrato de doação, na companhia dos Réus e de II.
Y) Os Réus aí residiram até ../../2021, data em que a Autora trocou a fechadura da casa.
Z) Em Agosto de 2021, a Autora, num encontro com o empreiteiro da obra da moradia sita na Rua ..., JJ, desabafa e diz que nunca teve qualquer intenção em doar o apartamento de tipologia ..., sito na Avenida ... e que era intenção dela viver na moradia objecto de intervenção por este e arrendar o já melhor identificado apartamento.
AA) Agendaram, para tal, um encontro, no qual a Autora mostrou ao Sr. JJ, os actos notariais invocados e pediu-lhe que a auxiliasse a reverter os efeitos jurídicos dos mesmos.
BB) Perante aquele pedido, o Sr. JJ aconselha à Autora o recurso a um advogado, indicando-lhe o Dr. KK.
CC) É com o aconselhamento jurídico do Dr. KK, que a Autora procede, no cartório do Dr. MM, em 31/08/2021 à revogação da procuração e do testamento outorgados a favor do filho dos Réus.
DD) Em Agosto de 2021, a Autora tomou diligências no sentido de reverter aqueles actos e os seus efeitos jurídicos.
EE) A presente acção deu entrada em juízo, mediante submissão da petição inicial na plataforma Citius, no dia 8/09/2022, tendo os Réus sido citados no dia 13/09/2022.

b) Factos não provados.

1. Logo numa primeira interpelação, II pintou um cenário de vulnerabilidade à Autora, afirmando que precisava de um contrato de arrendamento para não perder a guarda dos seus filhos menores, dado que estava a passar por um processo de divórcio sem consentimento, não dispondo de habitação para os seus filhos menores, o que, assim sendo, o poderia fazer perder a guardar destes.
2. JJ era um empreiteiro da confiança de II.
3. II passou a pôr e a dispor como bem pretendia - dando instruções ao empreiteiro ora contratado e indicado por este, bem como ajustando o prédio às suas necessidades laborais sem o consentimento da Autora - sobre as obras a realizar no prédio que viria a ser objecto de arrendamento, mas do qual até à data de Dezembro de 2020 não detinha qualquer contrato, ou qualquer documento que o vinculasse.
4. II e os Réus convidaram a Autora para passar o Natal, alegando que esta não poderia passar tal noite sozinha e afirmando que, a partir daquela data, seriam “como família” para a ora Autora.
5. A Autora aceitou, face à situação pandémica, tendo-se visto isolada de todos os seus amigos e vizinhos durante dois anos, em que vigoraram os sucessivos períodos de confinamento.
6. Os Réus convenceram a Autora de que, dada a sua idade avançada e resultante do contacto com diversas pessoas na noite da Natal, o mais sensato seria manter-se em confinamento por um período de uma semana na casa deles, para que desta forma evitasse o contágio pela Covid-19 e ou contaminar alguém, com a qual esta tivesse contacto no seu prédio sito na Avenida ..., na cidade ....
7. Ora, com este comportamento os Réus, ao convencerem a Autora a manter-se com estes em ..., fizeram com que esta ficasse isolada e sem contactar as suas habituais pessoas de confiança e relações de amizade.
8. E, por seu turno, começaram a engendrar ardilosamente, juntamente com o seu filho, o plano para, de forma gratuita, se tornarem os únicos e universais herdeiros e beneficiários e proprietários do património da Autora.
9. II e os próprios Réus, detentores de uma chave do apartamento da Autora, sito na Avenida ..., na ..., prontificaram-se para na ausência da Autora, efectuarem uma limpeza ao referido locado e com esta oportunidade tiveram acesso à documentação do património da Autora, designadamente, escrituras, certidões, acesso ao portal das finanças, bem como a toda a informação tida como pessoal, particular, intransmissível e confidencial da Autora.
10. Depois desta data, a Autora pediu aos Réus para regressar à sua habitual rotina, ao qual estes responderam, que dado o aumento do número de casos de Covid-19 e confinamento que estava imposto por lei a partir de 15 de Janeiro de 2021, seria mais benéfico para a Autora ficar a residir com os Réus em ....
11. O que a Autora não aceitou de bom grado, mas, atendendo à conjuntura pandémica, decidiu assentir.
12. Durante este período, os Réus tiveram sempre um discurso cuidado e atencioso, porém falacioso com a Autora, tecendo por diversas vezes comentários abonatórios e elogiosos, às suas pessoas e ao seu filho, chegando a verbalizar que a melhor coisa que aconteceu à Autora foi conhecer o seu filho.
13. Disseram que tinham muita experiência em lidar e tomar conta de idosos, pelo que o Réu ainda acrescentou que era presidente de uma Associação Humanitária de “...” e que se dedicava ao cuidado de idosos.
14. Em 28 de Janeiro de 2021 a Autora apresentava um quadro neuropsiquiátrico agudo.
15. A Autora foi transportada após a alta do hospital para a casa dos Réus contra a sua vontade, visto que pretendia regressar para a sua residência.
16. A Autora no dia 29/01/2021 recebe instruções dos Réus para no dia seguinte levantar-se cedo porque precisavam dela de manhã, informação que recebeu com estranheza, porque o que pretendia era ter umas boas horas de sono e de descanso.
17. No dia 30/01/2021, a Autora é surpreendida pela presença da Dr.ª DD, notária, dois médicos de seu nome EE e FF, da Dr.ª GG e Dr. HH, na sala da casa dos Réus.
18. Tais pessoas foram convocadas pelos Réus e pelo seu filho II, para que, de supetão a Autora dispusesse e os tornasse únicos e exclusivos beneficiários do seu património.
19. Nessa data a Autora encontrava-se com síndrome confusional agudo, não estando na posse das suas capacidades cognitivas plenas com um prejuízo muito relevante em particular das funções atencionais e mnésicas.
20. Esse síndrome confusional agudo verificou-se desde o dia ../../2021 até ao dia ../../2021.
21. É nessas circunstâncias que a Autora é levada a assinar o testamento, é coagida a assinar a procuração e compelida a assinar a escritura pública de doação.
22. As testemunhas do testamento são os advogados dos Réus, GG e HH, que asseguraram toda a estratégia dos Réus e do filho destes de fazer seus os diversos prédios que faziam parte do património da Autora.
23. Neste regresso, os Réus e o seu filho deram instruções à Autora, para não comunicar a ninguém das suas relações de amizade, o que havia sucedido em 30/01/2021, e que todos os documentos estavam na posse dos Réus.
24. A Autora sentia-se retraída e muito confusa, sobre os documentos que havia assinado.
25. Tendo a partir de meados de Junho de 2021 começado a demonstrar o seu descontentamento aos Réus e ao seu filho, manifestando que vivia oprimida e privada das suas normais relações e que não se encontrava bem com aquela situação e circunstâncias causadas por estes.
26. Perante a manifestação do descontentamento da Autora sobre a forma como, quer os Réus, quer o seu filho II, punham e dispunham da vida desta, começaram a surgir diversos conflitos.
27. Em Agosto de 2021, a Autora tomou a verdadeira consciência dos actos notariais realizados naquele dia 30/01/2021.
28. A Autora disse a JJ que se sentia profundamente enganada.
29. É apenas em 23 de Fevereiro de 2022 com o conhecimento do relatório elaborado pelo médico psiquiatra e que se encontra nos autos, junto com a petição inicial, que a Autora tem o verdadeiro e real conhecimento de que a escritura de doação padecia de um vício da vontade, que se consubstanciava na sua incapacidade acidental para outorga daquela escritura.
30. A Autora foi alertada pelo seu empreiteiro JJ, para toda a manigância de que foi vítima ao ver entregue todo o seu património a um suposto amigo e seus pais.
31. Alertada que foi, só em Agosto de 2021, a Autora tentou inteirar-se de tudo o que havia sucedido, designadamente, do conteúdo dos documentos celebrados, bem como de quais as suas possibilidades para reverter tais efeitos.

3.3. DO DIREITO APLICÁVEL

Manteve-se inalterada decisão da matéria de facto.
A Autora assentava o seu pedido de modificação da decisão recorrida essencialmente na alteração da matéria de facto relacionada com a invocada excepção de caducidade do direito de anular no negócio em apreço, aquela que foi determinante para o julgamento que lhe foi desfavorável, realizado pelo Tribunal a quo.
Em rigor, a apelação não discutiu a aplicação das normas que a primeira instância considerou pertinentes na procedência da mencionada excepção, sendo a sua argumentação, nesta e noutras questões suscitadas, fundada na modificação da decisão da matéria de facto, com alegações e conclusões que não distinguiam devidamente a discussão daquela da respeitante à do direito aplicado.
Posto isto, fica inelutavelmente prejudicado o seu conhecimento ou a pretendida alteração da decisão de mérito recorrida, o que aqui se declara (cf. arts. 608º, n.º 2, 663º, n.ºs 2 e 6, ambos do Código de Processo Civil).
Termos em que improcede a apelação em apreço.

4. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação.

Custas pela Recorrente (art. 527º, n.º 1, do C. P. Civil).   
*
Sumário[19]:
Nos termos dos Artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de actuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial.
Por isso, em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões.
A alínea b), do nº 1, do art. 640º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique “os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”, impõe que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respectivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos.
Não observa o ónus impugnatório fixado no art. 640º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, o impugnante da decisão da matéria de facto que, de forma confusa, prolixa e ambígua, não indica com precisão e certeza o sentido decisório a adoptar.
*
Guimarães, 02-05-2024



[1] Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2017, pp. 106.
[2] Conforme se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.7.2016, Gonçalves Rocha, 156/12, «Efetivamente, e como é entendimento pacífico e consolidado na doutrina e na Jurisprudência, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação». No mesmo sentido, cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4.10.2007, Simas Santos, 07P2433, de 9.4.2015, Silva Miguel, 353/13.
[3] Abrantes Geraldes, Op. Cit., p. 107.

[4] In Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª Ed., p. 155 e ss.
[5] Cf. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 19.2.2015, relatado por Maria dos Prazeres Pizarro Beleza :II - A impugnação da decisão de facto, feita perante a Relação, não se destina a que este tribunal reaprecie global e genericamente a prova valorada em 1.ª instância, razão pela qual se impõe ao recorrente um especial ónus de alegação, no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação. III - Não observa tal ónus o recorrente que identifica os pontos de facto que considera mal julgados, mas se limita a indicar os depoimentos prestados e a listar documentos, sem fazer a indispensável referência àqueles pontos de facto, especificando os concretos meios de prova que impunham que cada um desses pontos fosse julgado provado ou não provado. IV - A apresentação das transcrições globais dos depoimentos das testemunhas não satisfaz a exigência determinada pela al. a) do n.º 2 do art. 640.º do NCPC (2013). V - O incumprimento de tais ónus – prescritos para a delimitação e fundamentação do objecto do recurso de facto – impedem a Relação de exercer os poderes-deveres que lhe são atribuídos para o respectivo conhecimento. – in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/83d97510a180fd5f80257df1005b598c?OpenDocument
[6] Com se refere no Ac. do Supremo Tribunal de Justiçam, de 27.9.2018, infra citado: “Por outro lado, não basta transcrever os depoimentos que se invocam para alterar as respostas dadas. É necessário dizer porquê. Qual a razão pela qual deve ser num sentido e não noutro. Essa análise crítica também não foi feita pela Recorrente”.
[7] E, como acentua o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça infra citado, do princípio da cooperação, pretendendo-se que, por essa via, a 2ª instância facilmente aceda à informação tida pelo recorrente como interessante, em lugar de despender tempo nessa actividade – “há um mínimo de exigência e rigor a impor ao recorrente que impugna a matéria de facto, sob pena de, perante a ambiguidade, inconcludência e prolixidade na elaboração da peça recursória, transferir para a 2ª instância tarefas funcionais desmesuradas, exorbitantes e desproporcionadas que, nos termos legais, àquele cabem.
[8] In http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/9484dd49e64d74d28025863a00574f6a?OpenDocument 
[9] No mesmo sentido vide Ac. STJ de 01.10.2015, proc. 824/11.3TTLSB.L1.S1, relatora Ana Luísa Geraldes; Ac. 07.07.2016, proc. 220/13.8TTBCL.G1.S1, relator Gonçalves Rocha; Ac. STJ de 16.05.2018, proc. 2833/16.7T8VFX.L1.S1, relator Ribeiro Cardoso; Ac. STJ de 06.06.2018, proc. 552/13.5TTVIS.C1.S1, relator Pinto Hespanhol; Ac. STJ de 31.10.2018, proc. 2820/15.2T8LRS.L1.S1 e Ac. STJ de 06.11.2019, proc. 1092/08.0TTBRG.G1.S1, ambos relatados por Chambel Mourisco, todos acessíveis em www.dgsi.pt.
[10] Nesse sentido ainda o recente Ac. do mesmo Supremo Tribunal de Justiça, de 27.9.2018, in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/9cd6ef26b3a23d8f8025831500549377?OpenDocument : I - Como decorre do art. 640.º do CPC o recorrente não satisfaz o ónus impugnatório quando omite a especificação dos pontos de facto que entende terem sido incorrectamente julgados, uma vez que é essa indicação que delimita o objecto do recurso. II - Também não cumpre os seus ónus quando se limita a discorrer genericamente sobre o teor da prova produzida, sem indicar os concretos meios probatórios que, sobre cada um dos pontos impugnados, impunham decisão diversa da recorrida, devendo ainda especificar a decisão concreta a proferir sobre cada um dos diversos pontos da matéria de facto impugnados. – “Ora, é a própria recorrente que admite que não constam – como se lhe impunha – expressamente das conclusões os pontos concretos da matéria de facto não provada e impugnado (…). “Ora, quando se verifica uma falta de conclusões sobre a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, quando existe uma falta de especificação nas conclusões dos concretos pontos de facto que a recorrente considera incorrectamente julgados e quando se verifica também uma falta de especificação dos concretos meios probatórios e uma falta de posição expressa sobre o resultado pretendido, uma análise crítica da prova, as conclusões são deficientes impondo-se a rejeição do recurso (quanto á pretendida impugnação da decisão sobre a matéria de facto).”
[11] “Acresce que, na definição do sentido decisório a ser tomado, a recorrente manteve, em especial, nos pontos em que ocorreu rejeição liminar do recurso, clara ambiguidade e incerteza, isto mesmo no corpo alegatório em que sugere um conteúdo ou qualquer outro diferente do que foram assumido pela 1ª instância.”, assim se considerando frustrado o propósito legislativo subjacente à previsão da al. a), do nº 2, do art. 640º do Código de Processo Civil, “já que prática, transpôs para a Relação o ónus de discernir, em concreto, quais os meios probatórios e real sentido decisório relativamente aos blocos de questões que agrupou, sem os relacionar com cada facto concreto, como seria ajustado.” / “Era mister que, perante tais circunstâncias, fosse precisa e concisa na indicação dos factos concretos, com reporte directo aos meios probatórios, análise crítica dos mesmos e expressa definição do sentido decisório que caberia a cada um desses factos.
[12] Salienta-se que “a recorrente não se afadigou em fazer corresponder a cada uma das pretendidas alterações da matéria de facto o (s) segmento(s) dos depoimentos testemunhais e a parte concreta dos documentos que fundou as mesmas” (…) concluindo que é inviável estabelecer uma concreta correlação entre estes e aquelas.
[13] In http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/8e86daac001d58518025799f00505946?OpenDocument
[14] cf. LUÍS FILIPE SOUSA, in Prova Testemunhal, 2013, pp. 319-330
[15] cf. LUÍS FILIPE SOUSA, in Prova por Presunção no Direito Civil, 2017, 3ª ed., pp. 165-180.
[16] Ob.cit., p. 159
[17] Já que não contextualiza qualquer outro objecto…
[18] In http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/e59018c01102be3e80258257004d9b55?OpenDocument 
[19] Da responsabilidade do relator – cf. art. 663º, nº 7, do Código de Processo Civil.