| Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
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| Nº Convencional: | JTRC | ||
| Relator: | LUÍS RICARDO | ||
| Descritores: | ACIDENTE DE VIAÇÃO COLISÃO DE VEÍCULOS RESPONSABILIDADE PELO RISCO DÚVIDA SOBRE A CULPA DIREITO À VIDA INDEMNIZAÇÃO | ||
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| Data do Acordão: | 09/30/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – LEIRIA – JUÍZO CENTRAL CÍVEL – JUIZ 3 | ||
| Texto Integral: | S | ||
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| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | REVOGADA PARCIALMENTE | ||
| Legislação Nacional: | ARTIGOS 483.º, N.º 1, 487.º, N.º 2, 494.º, 496.º, N.º 3 E 4, 506.º, N.º 2 DO CÓDIGO CIVIL ARTIGOS 24.º 29.º, N.º 2, 31.º, N.º 1 DO CÓDIGO DA ESTRADA ARTIGO 21º DO DECRETO REGULAMENTAR N.º 22-A/98 DE 1 DE OUTUBRO - REGULAMENTO DE SINALIZAÇÃO DO TRÂNSITO | ||
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| Sumário: | I – A decisão proferida em 1ª instância sobre a matéria de facto deve ser alterada se os elementos probatórios carreados para os autos o impuserem de forma inequívoca. II – Ocorrendo uma colisão de veículos e não se tendo apurado se os condutores actuaram de forma negligente, é aplicável o regime da responsabilidade pelo risco que se encontra previsto no art. 506º do Código Civil. III – Em caso de dúvida, considera-se igual a medida da contribuição de cada um dos veículos para os danos, bem como a contribuição da culpa de cada um dos condutores (art. 506º, nº2, do Código Civil). IV – Afigura-se ajustado o montante de 100.000,00 € para ressarcir a perda do direito à vida quando está em causa um sinistrado, falecido em acidente de viação, com a idade de 34 anos, atento o critério da equidade legalmente consagrado e a orientação jurisprudencial que é seguida em casos semelhantes. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
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| Decisão Texto Integral: | * Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I – RELATÓRIO. AA, por si e em representação dos seus filhos menores BB e CC, todos devidamente identificados nos autos, instauraram no Juízo Central Cível de Leiria acção comum contra A..., S.A – actualmente B..., S.A. -, pedindo, com base no acidente de viação melhor descrito na petição inicial, que a ré seja condenada a pagar ao autores a quantia global de 665.613,87 € (seiscentos e sessenta e cinco mil seiscentos e treze euros e oitenta e sete cêntimos), a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros moratórios. *** A ré contestou, impugnando, de forma motivada, uma parte substancial da factualidade alegada pelos autores, quer no que diz respeito à responsabilidade pelo sinistro que se discute nos autos, quer no que se refere aos danos daí resultantes. 
 *** Após ter sido citado, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 1º, nº2, do DL n.º 59/89, de 22 de Fevereiro, o Instituto da Segurança Social, IP, formulou pedido de reembolso no montante de 11.160,45€ [1], acrescido das pensões que se vencerem e forem pagas na pendência da acção, até ao limite da indemnização a conceder, bem como os respectivos juros de mora legais, desde a data da citação até integral e efectivo pagamento. 
 *** Em 4/2/2020, foi proferido despacho que identificou o objecto do litígio e enunciou os temas da prova, após o que se procedeu à realização de perícia com vista a apurar a dinâmica do acidente a que se reporta o presente litígio. 
 *** Realizou-se audiência final, com observância do formalismo legalmente prescrito, tendo, nessa sequência, em 28/11/2024, sido proferida sentença, cujo dispositivo apresenta o seguinte teor: 
 “Na parcial procedência da demanda: ***Não se conformando com a decisão proferida, a ré interpôs o presente recurso, no qual formula as seguintes conclusões: “A) Salvo o devido respeito que nos merecem a opinião e a ciência jurídica do Meritíssimo Juiz a quo, afigura-se à Recorrente que a douta Sentença recorrida, não poderá manter-se. Na verdade, a decisão recorrida consubstancia uma solução que viola os mais basilares preceitos legais e processuais, afigurando-se como injusta e não rigorosa. B) Com efeito, em face da prova constante dos autos e produzida em sede de audiência de julgamento não pode a Recorrente conformar-se com a douta sentença, nomeadamente no que respeita às circunstâncias de tempo, modo e lugar em que se deu o acidente dos autos e a apreciação da respectiva dinâmica e, assim mesmo, à análise e valoração da prova produzida e ao enquadramento jurídico da mesma. C) Tanto mais que existem pontos da matéria de facto – desde logo os pontos 7.1, 12 e 13 da lista de factos provados e as alíneas a) e b) dos factos não provados – que, no entender da Recorrente, foram incorrecta e/ou deficientemente julgados, verificando-se, da mesma forma, uma omissão quanto a vários factos que, também na perspectiva da Recorrente, face à prova produzida, deverão ser acrescentados à lista de factos provados. D) O Tribunal a quo incorreu, assim, em erro notório na apreciação da prova e erro de julgamento da matéria de facto na medida em que não valorou, ou valorou erradamente, diversos elementos probatórios constantes no processo que, na perspectiva da Recorrente, deveriam ter assumido relevância probatória. E) Na “Análise dos Factos e Aplicação do Direito”, na Sentença refere-se, na avaliação da ilicitude, que “No presente caso temos que ao existir o embate entre o tratocarro e o motociclo tal acarretou em consequência danos para ambas, mormente para o condutor do motociclo que por via do embate e das sequelas dele advenientes veio a falecer no local da ocorrência. De outra banda o condutor do tratocarro entrou numa via, e antes disso tinha um sinal stop o que o obrigava a parar e caso na estrada em que ia circular existisse trânsito teria que ceder passagem e ao entrar devia ter as cautelas que se impõe a quem pretende virar à esquerda (vide artigos 29º e 44º do Código da Estrada). Provada está a ilicitude da conduta.” F) Adiante, na apreciação da existência de culpa, afirma-se que “Não se provando a culpa do lesado na produção do acidente nem que o mesmo se ficou a dever a terceiro ou a causa de força maior ou sequer estranha ao funcionamento do veículo, há lugar a indemnização nos termos do artigo 503º do Código Civil aplicando-se o disposto no artigo 506º do mesmo diploma. E descendo ao caso dos autos a responsabilidade pelo risco é toda ela assacada ao condutor do tratocarro e segurado na R. Foi ele o único responsável pela produção do acidente já que, consabidamente conduzir veículos e fazer manobras como a que o condutor do tratocarro fez constitui um risco que é tutelado pelo direito. Assim não há que repartir em qualquer proporção o risco, o qual é todo imputado ao segurado da R. pois que o motociclista não contribuiu para o aumento do risco, a menos que se entendesse tal contribuição com o mero facto de circular na estrada, o que de todo se nos mostra ser atendível. Diferente seria se houvesse prova de que o motociclo seguia a mais de 90 quilómetros por hora, o que, contudo, não se logrou demonstrar.” G) No essencial, o Meritíssimo Juiz a quo considerou ser a Ré Seguradora, por força do contrato de seguro celebrado, exclusivamente responsável pelo pagamento dos danos decorrentes do embate ocorrido, o que não se aceita! H) De facto, como se propõe demonstrar, desde logo, a Recorrente entende que os autos mostram que o motociclo circulava a velocidade superior a 90 quilómetros por hora, contrariamente ao que, erradamente, tribunal a quo considerou. I) Nas palavras da própria Sentença, “o condutor do veículo seguro na Ré foi o único responsável pela produção do acidente já que, consabidamente conduzir veículos e fazer manobras como a que o condutor do tratocarro fez constitui um risco que é tutelado pelo direito. Assim não há que repartir em qualquer proporção o risco, o qual é todo imputado ao segurado da R. pois que o motociclista não contribuiu para o aumento do risco, a menos que se entendesse tal contribuição com o mero facto de circular na estrada, o que de todo se nos mostra ser atendível. Diferente seria se houvesse prova de que o motociclo seguia a mais de 90 quilómetros por hora, o que, contudo, não se logrou demonstrar.” J) Considera a ora Recorrente, porém, que a diferença apontada se verificou e verifica efectivamente e que – além de tudo o mais – o Tribunal a quo deveria ter mesmo concluído que o motociclo circulava a velocidade superior a 90 quilómetros por hora, como mostram diversos factos que resultam dos autos. K) Assim resulta, desde logo, da prova documental constantes dos autos, também referida na Sentença, muito concretamente do Relatório Final do NICAV (amplamente referido na Sentença, junto como documento nº 3 da contestação da Ré apresentada a 05/12/2019 e cujas fotografias a cores foram juntas pela GNR/NICAV por ofício de 26/01/2022, de fls …), do Relatório pericial (também amplamente referido na Sentença junto aos autos a 26-10-2022, de fls …) e do vídeo da câmara de vigilância do posto de combustíveis (novamente amplamente referido na Sentença e cujas imagens constam em CD existente na capa do processo e em ficheiro anexo à PI e junto como documento nº 2 da PI), tudo manifestamente reforçado e demonstrado pela própria prova testemunhal gravada (cujas transcrições se juntam para um maior e melhor esclarecimento, caso se pretenda a respectiva consulta) e que permitirão a este tribunal, querendo avaliar a verdade, decidir de forma diversa. L) Considera a Recorrente, então, que os seguintes factos foram incorrectamente julgados: Factos considerados provados: 7.1. - O motociclo estava a cerca de 43,57 metros do tratocarro quando este parou à entrada da via; 12- A visibilidade entre os condutores era de entre um mínimo de 70 metros a um máximo de 150 metros; 13 - O motociclo circulava a uma velocidade média de entre 78 a 83 quilómetros por hora, e na altura do embate entre 65 a 75 quilómetros por hora; Factos considerados não provados: a - O motociclo circulava a uma velocidade média de cerca de 132 quilómetro por hora; b - O condutor do tratocarro olhou para ambos os lados antes de entrar na EN...14 e iniciou a marcha sem avistar o motociclo; M) No que respeita à fundamentação dos factos provados, diz a Sentença, quanto aos “Factos 6º 7º e 7.1.”, que “A prova deles é resultado do exame ao relatório pericial acima já aludido mormente a páginas 46º onde é feita a análise da visibilidade entre condutores, e 51 aqui em resposta a quesitos onde é referida a velocidade do motociclo e o local do impacto. A fls. 42 do relatório está igualmente uma simulação do local do embate a qual aliás se coaduna com o teor dos croquis juntos com a contestação em documento epigrafado de “croquis – NUIPC 196/17....”. Tomaram-se também em atenção as fotografias com os números 8º 9º, 11º, 12º 13º, 19º, 20º, juntos por ofício de 26 de Janeiro de 2022 remetido pela GNR (NICAV), onde é visível o local em que está o tratocarro após o embate, e o local dos danos em ambos os veículos.” N) O tribunal a quo não levou em linha de conta, pelo menos da forma correcta, a figura 72 (pág. 46) do relatório pericial (junto aos autos a 26-10-2022 de fls …), que a ora Recorrente considera ser de extrema relevância para a boa decisão deste recurso. O) A referida figura tem de facto a medida de 43,57 metros mas como sendo a distância do ponto D “Posição do motociclo quando o tratocarro para à entrada na via” até ao ponto C “Posição do motociclo quando o tratocarro inicia manobra de entrada na via”. P) A referida distância não é a distância a que o motociclo estava do tratocarro aquando da paragem deste à entrada da via. Q) A figura em questão tem ainda referenciado o ponto B “Início de visualização do motociclo na câmara de videovigilância” e o ponto A “Posição do motociclo quando está alinhado transversalmente à estação de serviço. D ----------------»C-----------------»B--------------»A--------------» ponto de embate 43,570 m 24900 m 36,000 m 12,000 m R) Considerando que o ponto D é a posição do motociclo quando o tratocarro para à entrada da via e somando as distâncias apuradas entre os pontos D e C, C e B, B e A até ao ponto de embate concluímos, sem grande dificuldade, e de forma inequívoca e cabal (simples cálculo aritmético) que o motociclo estava a 116,47 metros do tratocarro quando este parou à entrada da via, facto que o tribunal a quo deveria ter dado como provado. S) Estamos perante um erro de 72,90 metros e como adiante se verá este erro terá prejudicado a análise do julgador relativamente a outros factos, nomeadamente a velocidade a que circulava o motociclo antes do embate. T) Assim mostra-se incorrectamente julgada tal matéria, não correspondendo à realidade e à verdade que “o motociclo estava a cerca de 43,57 metros do tratocarro quando este parou à entrada da via”. U) Assim deveria ter sido dado como provado, quanto a tal matéria de facto, que “O motociclo estava a cerca de 116,47 metros do tratocarro quando este parou à entrada da via.” V) No que concerne aos “Factos 12º e 13º”, diz a mesma Sentença que “A prova destes factos resulta do teor do relatório pericial acima já referido conjugado com as declarações prestadas em audiência pelos peritos também melhor identificados supra. No relatório pericial e na parte relativa às questões a que os peritos responderam (página 51) é dito a que velocidade média seguia o condutor do motociclo e a que velocidade se deu o impacto. Os senhores peritos em audiência de forma exaustiva diga-se, clara e concisa, disseram como chegaram àquele valor. Não temos razões para duvidar dos valores relativos à velocidade nem aquela prova foi posta em causa por outra de igual valia. Abaixo e em sede de fundamentação do facto não provado a) se voltará a esta questão da velocidade. No que tange à visibilidade entre os 70 e os 150 metros, baseamo-nos também no relatório pericial, compaginado com os esclarecimentos dados pelos senhores peritos, de onde se conclui que a visibilidade máxima seria de 150 metros, aqui se referindo a uma visibilidade geométrica, ou seja, independentemente de objectos na via, e que pelo menos ela seria de 70 metros, aqui também pelo que foi dito de forma objectiva e clara por DD (averiguadora de sinistros), que esteve no local após o acidente, e referiu de modo explicito que a visibilidade do condutor do tratocarro era de 70 metros no local onde ele parou, ou seja perto do stop, sendo superior quando o mesmo inicia o trajecto de entrada”. W) A enumeração dos factos provados e não provados a integrar a fundamentação que obrigatoriamente deve constar na sentença traduz-se na tomada de posição por parte do tribunal sobre todos os factos sujeitos à sua apreciação e em relação aos quais a decisão terá que incidir. X) Ora, salvo o devido respeito, entende a Recorrente que o Tribunal a quo nem sequer se preocupou e ocupou de efectivamente concretizar a visibilidade de cada um dos condutores quando tinha elementos mais do que suficientes para ter concretizado esta matéria, ainda que na fundamentação o tenha tentado. Y) De acordo com a prova produzida em julgamento, a visibilidade do condutor do motociclo era de, pelo menos, 130 metros. Z) A visibilidade do condutor do tratocarro poderia ser de 130 metros, já na faixa de rodagem mas junto ao STOP e à linha de paragem a visibilidade era de 70 metros. AA) A este propósito, aliás, veja-se o depoimento da testemunha DD: sessão de audiência de julgamento, do dia 20-11-2024, aos minutos 00:02:35 a 00:28:27 do sistema de gravação da prova (cuja transcrição integral se junta para maior e melhor esclarecimento e contextualização, para o caso de se entender útil); AB) Em face do depoimento da referida testemunha o tribunal a quo deveria ter dado como provado que a visibilidade do condutor do motociclo era de, pelo menos, 130 metros e que a visibilidade do condutor do tratocarro era entre 70 e 130 metros, consoante estivesse parado junto à linha e ao sinal stop ou se já tivesse iniciado a sua marcha. AC) Assim mostra-se incorrectamente julgada tal matéria, não correspondendo à realidade e à verdade que “a visibilidade entre os condutores era de entre um mínimo de 70 metros a um máximo de 150 metros”. AD) Assim, em suma, deveria ter sido dado como provado, quanto a tal matéria de facto, que “A visibilidade do condutor do motociclo era de, pelo menos, 130 metros e que a visibilidade do condutor do tratocarro era entre 70 e 130 metros, consoante estivesse parado junto à linha e ao sinal stop ou se já tivesse iniciado a sua marcha.” AE) Relativamente ao faco provado 13 teremos como ponto de partida os números dados como provados pelo tribunal a quo “saltando” logo à vista que a velocidade a que o motociclo circulava é praticamente a mesma a que se dá o embate com o tratocarro, o que poderia indiciar que a distância entre o motociclo e o tratocarro era mínima aquando do início da manobra de mudança de direcção à esquerda. AF) A vítima, se circulasse à velocidade indicada no ponto 13 teria tido tempo para imobilizar o motociclo antes do embate. AG) Voltamos a socorrer-nos da figura 72 (pág. 46 do relatório pericial junto aos autos a 26-10-2022) de fls … que aqui tentamos, novamente, reproduzir: D ----------------»C-----------------»B--------------»A--------------» ponto de embate 43,570 m 24,900 m 36,000 m 12,000 m O ponto D é a posição do motociclo quando o tratocarro para à entrada da via. AH) O motociclo apercebe-se do tratocarro a 116,47 metros de distância, de acordo com as medidas da figura em questão e de acordo com a visibilidade que teria, de pelo menos 130 metros, naquela posição. AI) Esta medida é de particular importância porque permite ao motociclista poder antecipar alguma manobra necessária atenta a presença do tratocarro à saída do posto de combustível. AJ) Recorde-se que a esta distância o tratocarro não visualizava o motociclo. Entre o ponto D e o ponto C são percorridos 43,570 metros pelo motociclo. AK) O ponto C é indicado como a posição do motociclo no momento em que o tratocarro inicia a manobra de entrada na via. AL) Nesse momento o motociclo está a 72,90 metros do tratocarro. AM) Mais uma vez, atenta a visibilidade que cada um dos condutores tinha naquelas posições (ver ponto 12) o condutor do tratocarro não conseguia visualizar o motociclo, uma vez que a sua visibilidade era de 70 metros e o motociclo se encontrava, aquando do início da sua manobra de mudança de direcção à esquerda, a 72,90 metros. AN) O motociclista tinha 72,90 metros para accionar os órgãos de travagem e imobilizar o motociclo. AO) Se o motociclo circulasse a cerca de 80 quilómetros por hora nunca teria embatido no tratocarro – passados 72,90 metros - entre os 65 e os 75 quilómetros por hora. AP) Importa ainda referir que no vídeo da câmara das bombas de combustível é possível apurar que o motociclista circulava aos ziguezagues mas não acciona os órgãos de travagem. AQ) A este propósito da velocidade a que circulava o motociclo convém ter presente, além do já referido Relatório Final do NICAV, importa considerar também os depoimentos das testemunhas EE e FF. AR) De facto, assim mesmo resulta também do depoimento da testemunha EE, Militar da GNR, destacado no NICAV e que elaborou o referido Relatório Final do NICAV e que na sessão de audiência de julgamento do dia 20-11-2024, aos minutos 00:05:46 e 00:46:31 (cuja transcrição integral se junta para maior e melhor esclarecimento e contextualização, para o caso de se entender útil). AS) Da mesma forma, veja-se também do depoimento da testemunha FF na sessão de audiência de julgamento do dia 20-11-2024, aos minutos 00:04:17 a 00:29:57 (cuja transcrição integral se junta, para maior e melhor esclarecimento e contextualização, para o caso de se entender útil), averiguador e com funções de coordenação na supervisão e avaliação de acidentes de viação, consultado pela Recorrente para o efeito. AT) Ora, no entendimento da Recorrente, no que à velocidade do motociclo diz respeito, o tribunal a quo valorizou indevidamente a prova, quer de natureza documental quer testemunhal, produzida, bem como não a conjugou com as regras da experiência comum. AU) Desvalorizou totalmente o relatório do NICAV (junto aos autos como documento 3 da contestação e cujas fotografias foram juntas a cores por ofício de 26/01/2022, de fls …), bem como os depoimentos das testemunhas EE e FF (ambos de dia 20-11-2024). AV) Desvalorizou que o condutor do motociclo se apercebeu do tratocarro parado no stop a 116,47 metros e que este iniciou a manobra de mudança de direcção quando o motociclo estava a 72,90 metros. AW) Ora, se o motociclo circulasse à velocidade de 78 a 83 quilómetros por hora embateria no tratocarro, percorridos 72,90 metros, a uma velocidade de 65 a 75 quilómetros por hora? AX) A essa velocidade teria, em 72,90 metros, conseguido abrandar substancialmente a sua marcha e até teria conseguido parar antes do embate. AY) O que nos conduz a concluir, tal como disseram as testemunhas EE e FF e tal como consta do relatório do NICAV, que o motociclo circulava a velocidade bastante superior a 90 kms/hora. AZ) Em face do exposto deveria ter sido dado como provado que o motociclo circulava a uma velocidade média superior a 90 quilómetros por hora, e na altura do embate entre 65 a 75 quilómetros por hora. BA) Assim mostra-se incorrectamente julgada tal matéria, não correspondendo à realidade e à verdade que “o motociclo circulava a uma velocidade média de entre 78 a 83 quilómetros por hora, e na altura do embate entre 65 a 75 quilómetros por hora”. BB) Assim, em suma, deveria ter sido dado como provado, quanto a tal matéria de facto, que “O motociclo circulava a uma velocidade média superior a 90 quilómetros por hora, e na altura do embate entre 65 a 75 quilómetros por hora.” BC) Quanto à Fundamentação dos factos não provados, relativamente ao “Facto a)”, refere a Sentença que “A não prova deste facto é o resultado da prova do facto 13º. Existe uma grande discrepância entre os valores de velocidade média indicados pelo relatório do NICAV e confirmados em audiência pela testemunha EE, e o relatório pericial cujo seu conteúdo foi também alvo de esclarecimentos em audiência por parte dos peritos que o elaboraram. E não temos dúvidas em afirmar que a prova pericial pelo valor que tem, reforçado, é de seguir pelo Tribunal e bem assim a velocidade lá indicada. Os peritos esclareceram como chegaram àqueles valores, ou seja, entre o mais com o uso de software próprio para tal, ao invés do NICAV que se baseou apenas no visionamento das imagens e daí partiu para a velocidade indicada. Pois bem, os meios usados pelos peritos e todo o relatório por si feito, por contraposição ao do NICAV é mais completo, mais complexo, fazendo uso de meios informáticos para os resultados que se obtiveram.” BD) Continua ainda dizendo que “Não se vê que o mesmo padeça de qualquer deficiência nem compete a testemunhas - neste caso GG - coloca-lo em dúvida, já que as testemunhas depõem sobre factos e não são ouvidas para infirmar relatórios periciais. Repete-se, não temos dúvidas da validade, idoneidade e credibilidade do relatório pericial, nem do mesmo resulta qualquer contradição nos seus termos. Uma última palavra para referir que o teor de fls. 46. do relatório pericial – reportamo-nos às doutas alegações da R. - não permite concluir pela impossibilidade de eventual travagem do motociclo só o ter feito abrandar de velocidade em menos de 10 quilómetros por hora, pelo facto de se desconhecer quando é que o condutor iniciou manobra de travagem, ou seja, quando vê o obstáculo ao longe, quando ao vê-lo ao longe presume que pode passar e não trava mas mais à frente vê que não consegue passar e já trava? Ou a diminuição de velocidade é só consequência do uso das mudanças manuais do veículo e não de qualquer travagem? Concluindo que a não prova de a) é resultado do relatório pericial e esclarecimentos dos senhores peritos em julgamento.” BD) Quanto ao “Facto b)”, diz a Sentença que “Inexiste qualquer prova de b). Não se sabe se após parar o condutor do tratocarro olhou para ambos os lados ou não.” BE) Admite-se que da prova produzida não foi possível apurar, categoricamente, a velocidade exacta a que o motociclo circulava. Ainda assim, conforme exposto anteriormente não subsistem dúvidas que de o motociclo circulava a velocidade manifestamente superior a 90 kms/hora. BF) Tal matéria, como se disse, resulta expressa e directamente de tudo o já descrito e analisado supra quanto ao ponto 13 da matéria de facto considerada provada, que aqui se dá por integralmente reproduzido. BG) É, por isso, decorrência puramente lógica e consequencial do ali referido que também tal alínea a) se mostra incorrectamente julgada. BH) Deverá ser eliminada tal alínea, ficando expressamente consignado, como já referido supra, a propósito do aludido ponto 13, que “O motociclo circulava a uma velocidade média superior a 90 quilómetros por hora, e na altura do embate entre 65 a 75 quilómetros por hora.” BI) No que respeita ao facto não provado b mais uma vez se aponta, salvo o devido respeito, falta de rigor na apreciação de toda a prova produzida, uma vez que foi feita prova que permitirá dar este facto como provado, mais concretamente do depoimento da já referida testemunha DD, sessão de audiência de julgamento do dia 20-11-2024, aos minutos 00:09:45 a 00:11:29 do sistema de gravação da prova (cuja transcrição integral, como já se disse, se junta, para maior e melhor esclarecimento e contextualização, para o caso de se entender útil): BJ) A testemunha confirmou que, em sede de declarações, o condutor do tratocarro indicou que parou, junto ao STOP, olhou para ambos os lados sem ter avistado o motociclo e só depois iniciou a marcha. BK) As declarações do condutor do tratocarro constam igualmente do processo crime que veio a ser arquivado e do relatório do NICAV, tendo sido as mesmas que, em uníssono, foram prestadas à aqui testemunha DD. BL) Isso mesmo decorre, com a normalidade das coisas, do facto – provado – desse próprio condutor ter cumprido a obrigação de paragem junto ao sinal existente e, após tal paragem, ter iniciado a manobra, dado que nenhum veículo se mostrava a si em circulação, executando a manobra, aliás, de forma correcta. BM) O motociclo, por sua vez e pelo contrário, aproxima-se daquele já em reação, em trajectória desalinhada, em zigue-zagues. BN) De resto, e tal como decorre do documento 2 anexo à Contestação da Recorrente, de fls … (“Auto de Inquirição de Testemunha – HH”), tal condutor do tratocarro, HH, declarou expressamente que “pretendia seguir o sentido de marcha direcção ...” e que se “deslocava com frequência áquele local, e conhece perfeitamente bem o local do acidente”. Esclareceu que “imobilizou a marcha do veículo que conduzia junta da intersecção da linha de saída da área de serviço com a Estrada Nacional ...14, em obediência à sinalização de STOP existente no local, olhou para o lado direito e viu um veículo em circulação proveniente do sentido ... em direcção a ..., olhos para o lado esquerdo, e assim que se inteirou que a mesma se encontrava livre de circulação de veículo, decidiu avançar a marcha do veículo para a esquerda, com a primeira mudança da caixa de velocidades engrenada, e poucos instantes decorridos veio a ocorrer o acidente”, mais indicando que “não viu nem ouviu qualquer ruído que lhe pudesse indicar a presença do motociclo na via”. BO) Continua dizendo que “nunca se apercebeu do motociclo antes de ocorrer a colisão, pelo que não realizou qualquer manobra para tentar evitar o acidente” e que a “colisão ocorreu já na via de trânsito destinada ao sentido de marcha .../..., tendo a percepção de que nesse momento o seu veículo já estaria quase por completo na via de trânsito .../..., ou seja, que a via de trânsito contrária .../..., já estaria livre para o motociclo passar”. BP) Decorre do exposto que os autos contêm e foi produzida prova testemunhal e documental no sentido de dar como provado que o condutor do tratocarro olhou para ambos os lados antes de entrar na EN...14 e iniciou a marcha sem avistar o motociclo, razão pela qual o facto em questão tem que ser dado como provado. BQ) Assim, o tribunal deveria ter dado como provado que o condutor do tratocarro olhou para ambos os lados antes de entrar na EN...14 e iniciou a marcha sem avistar o motociclo. BR) Mais diga-se, por fim e em abono do referido, que assim mesmo também mostra e sustenta – sem margem para quaisquer dúvidas – o Relatório Final do NICAV, anexo como documento 3 à Contestação da Recorrente e cujas fotografias foram juntas em oficio da GNR/NICAV de 26-01-2022, de fls …) que aqui, mas mal, foi totalmente desconsiderad0. BS) Assim, em suma, andou mal o Tribunal a quo ao decidir, como decidiu, considerar como provados os factos 7.1, 12 e 13, e não provados – nos termos descritos – os factos das alíneas a) e b) conforme anteriormente alegado. BT) Considerando a distância a que o condutor do motociclo se apercebe da presença do tratocarro parado junto à linha de stop (116,47 metros), bem como a distância a que o motociclo está do tratocarro aquando da entrada deste na via (72,90 metros), tudo conjugado com a velocidade a que seguia no momento do embate (entre 65 e 75 kms/hora) é totalmente inverosímil – em respeito pela verdade e pela normalidade das coisas – que o motociclo circulasse entre os 78 e os 83 kms/hora. BU) O motociclo circularia - e seguramente - a uma velocidade superior a 90 kms/hora. BV) No local a velocidade máxima permitida era de 90 kms/hora. BW) A velocidade que imprimia ao motociclo, por superior ao limite legal, foi o factor decisivo para a ocorrência do acidente. BX) Na própria sentença se pode ler: “Diferente seria se houvesse prova de que o motociclo seguia a mais de 90 quilómetros por hora, o que, contudo, não se logrou demonstrar.” BY) Ora, tendo ficado demonstrada a velocidade excessiva imprimida pelo condutor ao motociclo, a culpa pela produção do acidente a este se ficou a dever. BZ) Acrescente-se ainda – fazendo nossas as palavras do Relatório Final do NICAV já referido -que “a manobra do condutor HH terá sido executada de forma correcta”. CA) Isso mesmo se confirmou nestes autos: - o condutor do veículo seguro na Ré não violou qualquer norma estradal; - parou junto ao stop; - olhou para a esquerda e para a direita (para a esquerda apenas tinha uma visibilidade de 70 metros (encontrando-se o motociclo a mais de 70 metros); - iniciou a marcha por não ter visto qualquer veículo a circular na via; - dadas as características do tratocarro este circulava a velocidade reduzida; - foi embatido, já na faixa que pretendia seguir, pelo motociclo. CB) Ainda que este tribunal venha a considerar que o condutor do motociclo não circulava a mais de 90 kms./hora – o que apenas se equaciona por mero dever de patrocínio – o que é certo é que este, muito embora beneficiasse de prioridade, atendendo ao sinal de stop implantado no sentido seguido pelo tratocarro, sempre deveria e estava obrigado a ter tomado as devidas precauções, uma vez que o direito de prioridade não é um direito absoluto, não dispensando aquele que dela beneficia de adoptar os deveres de diligência e cautela. CC) Aliás, conforme se pode ler no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24/02/1999 (processo 98A1233), “II – O direito de prioridade de passagem não é absoluto, pressupondo, por parte do condutor que dele goza, a adopção as precauções indispensáveis em ordem a evitar acidentes, como a diminuição de velocidade e a certificação da aproximação de outro veículo”. CD) Ora, no entendimento da Recorrente nenhuma razão há – apesar do princípio da livre apreciação da prova – para que os factos constantes da prova documental descrita e depoimentos prestados pelas referidas testemunhas em julgamento (de resto também documentadas nos relatórios técnicos, como o é o Relatório Final do NICAV) não serem – como não foram – considerados pelo Tribunal a quo. CE) Não podendo o Tribunal incorrer – como incorreu – no livre arbítrio de julgar os factos contra as provas constantes do processo. CF) Pelo que, em face de tudo quanto ficou exposto, a douta sentença recorrida, não pode manter-se, devendo os referidos pontos 7.1, 12 e 13 dos factos provados serem alterados por forma a que a sejam acrescentados os demais factos que, sobre as circunstâncias e causa do acidente, foram e ficaram aqui demonstrados. CG) A saber: o motociclo estava a cerca de 116,47 metros do tratocarro quando este parou à entrada da via; a visibilidade do condutor do motociclo era de, pelo menos, 130 metros e que a visibilidade do condutor do tratocarro era entre 70 e 130 metros, consoante estivesse parado junto à linha e ao sinal stop ou se já tivesse iniciado a sua marcha; o motociclo circulava a uma velocidade média superior a 90 quilómetros por hora, e na altura do embate entre 65 a 75 quilómetros por hora; o condutor do tratocarro olhou para ambos os lados antes de entrar na EN...14 e iniciou a marcha sem avistar o motociclo. CH) Com efeito, dos factos descritos e que deverão ser dados como provados, nada aponta para qualquer comportamento culposo imputável ao condutor do veículo seguro na Ré. CI) A mesma factualidade exclui qualquer juízo de censura ou de reprovação da conduta desse condutor, que cumpriu todas as obrigações que sobre o mesmo recaíam, e nenhum outro comportamento se poderia exigir, em abstracto, ao mesmo. CJ) Entende a Ré, de facto, que a prova mostra que o motociclo estava a cerca de 116,47 metros do tratocarro quando este parou à entrada da via e que a visibilidade do condutor do motociclo era de, pelo menos, 130 metros (enquanto a visibilidade do condutor do tratocarro era entre 70 e 130 metros, consoante estivesse parado junto à linha e ao sinal stop ou se já tivesse iniciado a sua marcha), sendo certo que o motociclo circulava a uma velocidade média superior a 90 quilómetros por hora. CK) Factos estes que, associados aos demais constantes do elenco dos factos provados, mostram, a nosso ver, que o condutor do motociclo estaria em condições de ter evitado o acidente, mostrando-se este imputável ao mesmo, que assim se mostra o seu único e exclusivo responsável. CL) Porém, mesmo que assim não se considere – o que apenas por cautela se admite sem conceder – não se fazendo prova dessa culpa, o tribunal pode e deve averiguar o pedido à sombra da responsabilidade pelo risco. CM) Ora, mesmo lançando mão do critério do Mmo. Juiz a quo, fica claro que o motociclista contribuiu, de forma evidente face aos factos descritos, para o aumento do risco, desde logo porque efectivamente conduzia a mais de 90 quilómetros por hora. CN) Sendo que o condutor do tratocarro nada fez ou contribuiu para o efeito, limitando-se a fazer a sua manobra da forma correcta e devida, como descrito. Nada de distinto, aliás, podia ou devia ter efectuado. CO) Ora, caso V. Exas. considerem não existir nos autos prova suficiente da efectiva e exclusiva culpa do condutor do motoclico na produção do acidente dos autos, parece absolutamente claro que – mesmo em sede de risco – sempre seria este o único responsável pelo acidente em causa. CP) Mas, novamente, mesmo que assim não fosse, o facto é que, nestes autos, bem pelo contrário, foi essa responsabilidade integralmente atribuída ao condutor do tratocarro, o que não mostra cabimento algum. CQ) Entende a Recorrente, de facto, que a responsabilidade pela produção do sinistro não pode, em caso algum, ser atribuída – como foi – ao condutor do veículo seguro na Recorrente, pelo que, mesmo em sede de risco, só poderia, no máximo, ser considerada repartida essa responsabilidade entre este e o motociclista, em igual medida, desde logo nos termos e para os efeitos do artigo 506º do Código Civil. CR) Em suma, de facto, caso não se mostre comprovada a culpa efectiva daquele condutor do motociclo, o presente caso de colisão de veículos deverá ficar sujeito à disciplina dos artigos 505º e 506.º do Código Civil. CS) Nesta hipótese, em conformidade com o descrito, e na impossibilidade de critério distinto, deverá considerar-se igual a medida da contribuição de cada um dos veículos para os danos, tal como previsto no artigo 506º do CC. CT) Dispõe o n.º 1 deste artigo que “se da colisão entre dois veículos resultarem danos em relação aos dois ou em relação a um deles, e nenhum dos condutores tiver culpa no acidente, a responsabilidade é repartida na proporção em que o risco de cada um dos veículos houver contribuído para os danos; se os danos forem causados somente por um dos veículos, sem culpa de nenhum dos condutores, só a pessoa por eles responsável é obrigada a indemnizar.” E no número seguinte diz-se que “em caso de dúvida, considera-se igual a medida da contribuição de cada um dos veículos para os danos…”. CU) É pacífico na jurisprudência e na doutrina portuguesa que o âmbito deste dispositivo legal abrange todos e quaisquer veículos capazes de causar danos por via da sua circulação terrestre. CV) Desta forma, nesta hipótese, sempre se teria que repartir entre ambos os condutores, na medida da contribuição de cada um para o aumento do risco, a responsabilidade. CW) O que, não sendo possível definir, deverá considerar-se igual. CX) Consequentemente e como resultado lógico, também a medida indemnizatória atribuída aos Autores – quer a título de danos patrimoniais quer não patrimoniais – deverá ser revista e alterada em conformidade com o descrito, na medida da responsabilidade a atribuir ao condutor do veículo seguro. CY) A Recorrente discorda da atribuição indemnizatória relativa ao Direito à vida, quanto ao respectivo montante, não concordando com quantificação avançada a título de danos não patrimoniais, salientando o excesso do valor arbitrado, que se mostra desajustado face àqueles que são e vêm sendo os critérios legais e jurisprudenciais aplicados. CZ) É certo que não obstante ser de atender aos danos não patrimoniais que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, certo é também que os critérios a utilizar para a determinação do dano não devem ser abstractos ou mecânicos, devendo antes atender ao caso concreto e sempre temperados por juízos de equidade. DA) É a própria Jurisprudência, diga-se, a sugerir alguns bons indicadores que podem ser seguidos para encontrar a equidade nos critérios para a atribuição de indemnizações, sendo por muitos aceite e defendido que a forme de apurar se não foram afrontados critérios de equidade é o confronto dos valores fixados com os estabelecidos como orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel de proposta razoável para indemnização do dano corporal, que constam da Portaria n.º 377/08, de 26 de Maio, entretanto actualizada pela Portaria n.º 679/2009, de 25 de Junho], conforme esclarece, entre muitos outros, o Acórdão do mesmo Supremo Tribunal de Justiça de 05.02.2009, in www.dgsi.pt DB) Ora, os valores avançados, face à referida legislação, que regula este tipo de danos e à idade da malograda vítima à data do sinistro é, a nosso ver, exagerado. DC) “a Portaria nº 377/2008 de 26 de Maio, estabelecendo embora meros critérios e valores orientadores para efeitos de indemnização do dano corporal na fase pré ou extrajudicial e não sendo, qua tale, vinculativa em processos judiciais, não prejudica a possibilidade de os tribunais – sem abdicarem do recurso à equidade – dela se servirem como critério aferidor de carácter preferencial, face ao seu grau de racionalidade, razoabilidade e actualização. De acordo com as Portarias aplicáveis, a privação do direito à vida de uma vítima entre 25 e 49 anos, deve ser indemnizada tendo por valor de referência até € 50.000,00. DD) Quanto ao caso dos autos, sabe-se que a vítima tinha 34 anos à data. DE) O valor atribuído pelo tribunal a quo pelo direito à vida (100.000,00 €) – sem prejuízo da consequência que do ponto A. supra deste Recurso sempre seria de retirar – mostra-se, a nosso ver, exagerado e não equitativo, sobretudo se atentos casos similares e para vítimas de idade superior similar à do lesado. DF) É hoje também totalmente pacífico que, apesar de se impor o recurso à equidade, esta não afasta o princípio da igualdade, o que implica, de facto, uma uniformização de critérios, sem deixar de atender às circunstâncias do caso. DG) Olhando a decisões relativamente à avaliação pelo dano da morte, mais pormenorizadamente transcritas no corpo das Alegações de recurso, para onde se remete, diz: - Tribunal da Relação de Lisboa, em Acórdão de 01-12-2015, in www.dgsi.pt, “I- É perfeitamente ajustado, em termos de equidade, o montante de 70.000 € arbitrado como valor para ressarcir a perda do direito à vida de um jovem com 19 anos de idade, saudável e trabalhador.” - Supremo Tribunal de Justiça, “O dano morte na jurisprudência das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça”, em Acórdão de 14-12-2016: “vítima tinha 32 anos de idade; (…) adequado o montante de € 80 000, fixado pela Relação, para o dano respeitante à morte.” - Supremo Tribunal de Justiça, em Acórdão de 07-03-2017, Revista n.º 431/10.8TBOHP.C1.S1 - 6.ª Secção, ”€ 80 000 o montante indemnizatório pela perda do direito à vida de uma lesada com 19 anos de idade”. - Supremo Tribunal de Justiça, em Acórdão de 28-09-2017, Revista n.º 1181/05.2TBFND.C2.S1 - 7.ª Secção, “(…) (32 anos), (…) o montante de € 70 000 a título de indemnização pela perda da vida.” DH) Face aos valores acima descritos, e considerando a idade do falecido (34 anos), afigura-se-nos que o valor arbitrado se mostra desajustado, devendo ser fixado o montante da indemnização pela perda do direito à vida – na eventualidade de vir a ser concedido e sem prejuízo da decorrente, eventual, repartição da responsabilidade, conforme descrito no ponto A. supra – no valor de 80.000,00 €, revogando-se, também nesta parte, a decisão recorrida. DI)A douta Sentença recorrida violou, assim, no entendimento da Ré, as normas dos artigos 483º, 496º, 505º e 506º do Código Civil, 24º, 25º, 29º e 31º do Código da Estrada, assim como 607.º, n.ºs 4 e 5, do C.P.C, desde logo pela forma em que (não) aplicou ou aplicou erradamente no caso dos autos. DJ) Face a tudo o exposto, em suma, deve ser revogada a sentença e declarada a culpa exclusiva no acidente ao condutor do motociclo, com a consequente absolvição da Recorrente. Se assim se não entender, o que por mera hipótese se admite, deve ser fixado o risco para a eclosão do acidente, no máximo, em 50% para ambos os veículos (motociclo e tratocarro) e, seguidamente, serem fixadas as indemnizações não só de acordo com o já descrito quanto aos danos morais, mas, também, de acordo com essa percentagem.”. 
 *** Os autores contra-alegaram, pronunciando-se no sentido da total improcedência do recurso. 
 *** Questões objecto do recurso: - Alteração da decisão proferida sobre matéria de facto; - Responsabilidade pelo sinistro em discussão e valor indemnizatório adequado a ressarcir a perda do direito à vida. 
 *** II – FUNDAMENTOS. 2.1. Factos provados. A 1ª instância considerou assentes os seguintes factos: 1- No dia 20 de Maio de 2017 cerca das 18h20m, frente ao posto de abastecimento da BP em ..., concelho das ..., EN...14, quilómetro 36, ocorreu um embate entre o veículo de matrícula ..-IO-.. propriedade de II, por ele conduzido, e o tratocarro2 de marca Sima, modelo 1200, matrícula C-....3 propriedade de HH e pelo mesmo conduzido. 2- II seguia no motociclo indicado em 1 no sentido .../.... 3- HH saía do posto de estabelecimento da BP e pretendia entrar na estrada na qual circulava II, e à esquerda, para o sentido .../.... 4- Antes de entrar na via, HH parou no sinal de STOP que lá existia. 5- Seguidamente entra na EN...14 na qual circulava o II, vindo os veículos de ambos a embater um no outro. 6- A colisão entre as duas viaturas deu-se na faixa da esquerda no sentido .../..., estando o tratocarro com a dianteira já naquela via e a traseira ainda na via de sentido contrário de forma perpendicular à mesma, e o motociclo no interior da faixa de rodagem da esquerda no sentido .../... em posição oblíqua. 7- O choque entre os veículos dá-se entre frontal esquerda do tratocarro e a frente e lateral direita do motociclo. 7.1.- O motociclo estava a cerca de 43,57 metros do tratocarro quando este parou à entrada da via. 8- Após o embate, o condutor do motociclo foi projectado para a berma da estrada e para o seu lado esquerdo, ficando a cerca de 6 metros do local da colisão entre os dois veículos. 9- O local do embate é um traçado formado por uma recta com ligeiro declive e ligeira lomba, com duas faixas de trânsito em sentidos contrários, com linha longitudinal contínua a separar as vias e ladeada por bermas dos dois lados. 10- A largura da faixa de rodagem é de cerca de 5,30 metros. 11- A velocidade permitida no local para quem circulava na EN...14 era de 90 quilómetros hora. 12- A visibilidade entre os condutores era de entre um mínimo de 70 metros a um máximo de 150 metros. 13- O motociclo circulava a uma velocidade média de entre 78 a 83 quilómetros por hora, e na altura do embate entre 65 a 75 quilómetros por hora. 14- Na sequência do embate e por causa do mesmo II veio a falecer, o que foi declarado pelas 18h35m, sendo que a causa da morte foram múltiplas lesões de natureza crânio-encefálicas. 15- À data do embate o HH tinha 91 anos e II tinha 34 anos de idade. 16- II era casado com AA, e ambos eram pais de ... nascida em ../../2010, e de ... nascido em ../../2017. 17- À data do falecimento do II, a A. AA não trabalhava, tendo auferido durante o ano de 2017 e no período entre 04 de Julho e 31 de Agosto o valor diário a título de subsidio de desemprego de € 14,04, num total de € 800,28. 17.1. - Antes de receber subsídio de desemprego que se iniciou em Janeiro de 2016, a A. AA, era auxiliar de acção educativa auferindo o ordenado mínimo nacional. 18- II era trabalhador por conta própria dedicando-se a isolamentos térmicos de veículos de transporte de mercadorias, sendo que no ano de 2016, efectuou vendas e prestou serviços no valor de € 98.448,73. 19- No ano de 2016 o rendimento bruto do II e da A. AA foi de € 16.979,65, o que lhes levou a um reembolso de IRS de 1.562,77. 20- No ano de 2017 os AA. e II tiveram rendimentos de trabalho dependente/pensões no valor de € 2.099,69, e vendas de produtos e prestação de serviços no valor de € 8.825,00 a A., e € 62.279,39 o II. 21- No ano de 2018 os AA. tiveram rendimentos de trabalho dependente/pensões no valor de € 3.346,33 e a A. prestou serviços e realizou vendas no valor de € 63.656,00. 22- A A. AA algum tempo depois do falecimento do II, passou a fazer o trabalho que o mesmo fazia e indicado em 18. 23- Contudo, não mais conseguiu o mesmo nível de vendas e prestação de serviços feitas pelo II. 24- Com o funeral do II, a A. AA despendeu a quantia de € 2.575,00. 25- E com uma campa em granito com escultura em pedra onde ficaram os restos mortais de II, liquidou a mesma A. a quantia de € 5.500,01. 26- E o valor de € 260,00 em flores. 27- A A. todas as semanas compra flores para colocar na campa do II gastando entre € 10,00 e € 15,00. 28- À data do falecimento do II, e excluindo despesas com habitação o casal tinha gastos aproximados de € 800,00 com água, gás, luz, alimentação, despesas escolares, vestuário, calçado e outras despesas domésticas. 29- II tinha uma forte ligação afectiva à mulher e filhos. 30- A morte de II deixou a sua mulher e pelo menos a filha mais velha em estado de choque e abaladas. 31- Tendo todas elas sofrido emocionalmente com a perda do seu ente, o que se prolongará por tempo indefinido. 32- ... não se lembra e nunca se lembrará do pai, perguntando por vezes à mãe onde ele se encontra o que a mesma responde dentro do que lhe é possível. 33- A Segurança Social atribui à A. AA o valor de € 158,89 que começou a ser pago em Agosto de 207 relativo a pensão de sobrevivência, valor que tem vindo a ser actualizado anualmente e que em 2024 é de € 225,90 por mês. 34- A Segurança Social atribuiu aos demais AA. mensalmente a título de pensão de sobrevivência a quantia de € 39,65 a cada um, valor que tem vindo a ser actualizado anualmente e que em 2024 é de € 89,24 por mês. 35- A Segurança Social atribui à A. AA o valor de € 1.263,96 em Agosto de 2017 relativo a subsídio por morte. 36- Desde Agosto de 2017 e até Novembro de 2024 a Segurança Social liquidou aos AA. por conta de pensões de sobrevivência e subsidio por morte o valor total de € 34.938,56, sendo € 19.885,87 à 1ª A., € 6.854,53 à segunda A. e € 6.064,20 ao terceiro A. 37- II era titular de carta de condução da categoria A desde 28 de Julho de 2014. 38- O tratocarro era à data do incidente relatado nestes autos, objecto de contrato de seguro titulado pela apólice nº ...18 da actual R. e que abrangia a cobertura de responsabilidade civil obrigatória para a circulação do aludido veículo e seu reboque. 
 *** 2.2. Factos não provados. Pelo Tribunal a quo foram considerados não provados os seguintes factos: a- O motociclo circulava a uma velocidade média de cerca de 132 quilómetro por hora. b- O condutor do tratocarro olhou para ambos os lados antes de entrar na EN...14 e iniciou a marcha sem avistar o motociclo. c- A A. AA despendeu a quantia de € 206,00 com escritura de habilitação de herdeiros. cc- E a quantia de € 500,00 com terreno onde foi sepultado o II. d- E o valor de € 130,00 com alteração de titulares de registo de propriedade de veículos. e- II antes do acidente receou pela própria vida e apercebeu-se da colisão que iria ocorrer. f- Teve medo e dores. 
 **** 2.3. Impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto. Nos presentes autos, como vimos, a apelante coloca em causa a decisão recorrida no que diz respeito ao acervo vertido nos pontos 7.1., 12 e 13 da matéria assente, discordância que, paralelamente, se estende à matéria que integra as alíneas a) e b) dos factos não provados. Vejamos, pois, considerando os elementos indicados em sede de alegações, se há lugar à alteração pretendida pela recorrente. ** Consta no ponto 7.1. dos factos provados que “O motociclo estava a cerca de 43,57 metros do tratocarro quando este parou à entrada da via.” Relativamente a esta factualidade e à que se encontra descrita nos pontos 6 e 7, o Tribunal a quo exarou a seguinte fundamentação: “A prova deles é resultado do exame ao relatório pericial acima já aludido mormente a páginas 46º onde é feita a análise da visibilidade entre condutores, e 51 aqui em resposta a quesitos onde é referida a velocidade do motociclo e o local do impacto. A fls. 42 do relatório está igualmente uma simulação do local do embate a qual aliás se coaduna com o teor dos croquis juntos com a contestação em documento epigrafado de “croquis – NUIPC 196/17....”. Tomaram-se também em atenção as fotografias com os números 8º 9º, 11º, 12º 13º, 19º, 20º, juntos por oficio de 26 de Janeiro de 2022 remetido pela GNR (NICAV), onde é visível o local em que está o tratocarro após o embate, e o local dos danos em ambos os veículos.”. O relatório pericial a que a 1ª instância faz alusão foi incorporado nos autos em 26/10/2022, sendo que no mesmo, entre outras referências, é indicada, graficamente, a distância que o motociclo sinistrado terá percorrido antes do embate. Ora, se atentarmos na página 46 do relatório [2] verificamos que a representação gráfica aí inserida não permite chegar à conclusão que consta do ponto 7.1. dos factos assentes, o que poderá dever-se, segundo julgamos, a um lapso manifesto cometido pelo Tribunal a quo. Com efeito, o que resulta do relatório é que o motociclo percorreu uma distância de 43,570 metros quando o tratocarro se encontrava parado à entrada da via, ou seja, durante o período de imobilização ou paragem do veículo segurado, o motociclo percorreu a referida distância. Por outro lado, refere-se no relatório em apreço – cf. a aludida representação gráfica – que o motociclo percorreu a distância de 72,904 metros após o tratocarro ter entrado na via, o que significa, no total, que foram percorridos 116,47 metros. Os Srs. Peritos, no âmbito dos esclarecimentos que prestaram em sede de audiência final – cuja audição foi realizada em sede de recurso – confirmaram o teor do respectivo relatório, em particular quanto às distâncias a que fizemos menção. Em face do exposto, procede a impugnação deduzida pela recorrente, passando, consequentemente, o ponto 7.1. a apresentar a seguinte redacção: 7.1. O motociclo estava a cerca de 116,47 metros do tratocarro quando este parou à entrada da via. 
 ** Refere-se no ponto 12 dos factos assentes que “A visibilidade entre os condutores era de entre um mínimo de 70 metros a um máximo de 150 metros.” A propósito desta matéria, sustenta a recorrente que, face ao depoimento da testemunha DD, deveria ter sido dado como provado que “A visibilidade do condutor do motociclo era de, pelo menos, 130 metros e que a visibilidade do condutor do tratocarro era entre 70 e 130 metros, consoante estivesse parado junto à linha e ao sinal stop ou se já tivesse iniciado a sua marcha A motivação da 1ª instância, em relação a esta factualidade e à que se mostra inserida no ponto 13, é a seguinte: “A prova destes factos resulta do teor do relatório pericial acima já referido conjugado com as declarações prestadas em audiência pelos peritos também melhor identificados supra. No relatório pericial e na parte relativa às questões a que os peritos responderam (página 51) é dito a que velocidade média seguia o condutor do motociclo e a que velocidade se deu o impacto. Os senhores peritos em audiência de forma exaustiva diga-se, clara e concisa, disseram como chegaram àquele valor. Não temos razões para duvidar dos valores relativos à velocidade nem aquela prova foi posta em causa por outra de igual valia. Abaixo e em sede de fundamentação do facto não provado a) se voltará a esta questão da velocidade. No que tange à visibilidade entre os 70 e os 150 metros, baseamo-nos também no relatório pericial, compaginado com os esclarecimentos dados pelos senhores peritos, de onde se conclui que a visibilidade máxima seria de 150 metros, aqui se referindo a uma visibilidade geométrica, ou seja, independentemente de objectos na via, e que pelo menos ela seria de 70 metros, aqui também pelo que foi dito de forma objectiva e clara por DD (averiguadora de sinistros), que esteve no local após o acidente, e referiu de modo explicito que a visibilidade do condutor do tratocarro era de 70 metros no local onde ele parou, ou seja perto do stop, sendo superior quando o mesmo inicia o trajecto de entrada”. Se atentarmos no relatório pericial (cf. figuras 21 e 22 que integram o mesmo), verificamos que a visibilidade efectiva entre ambos os condutores ascende a 153,7 metros [3], sendo que do depoimento da testemunha DD [4] resulta que no local onde o tratocarro parou (junto ao STOP mencionado nos autos) a visibilidade, em relação ao condutor deste veículo, se reduz para 70 metros. Paralelamente, a referida testemunha referiu uma visibilidade de 130 metros entre ambos os condutores, distância que, segundo mencionou [5], foi medida no local do sinistro, com a sua própria viatura. Tendo o sinistro sido averiguado pelo NICAV [6], resulta do respectivo relatório final (cf. documento nº2 junto com a contestação) que a visibilidade entre os condutores era de 130 metros, distância que foi confirmada em audiência final pela testemunha EE, militar da GNR que elaborou tal suporte documental [7]. Conjugando todos os elementos probatórios supra referidos, verifica-se que assiste razão à apelante no que concerne à visibilidade do condutor do tratocarro – distinta consonante o local onde este veículo estivesse posicionado -, visibilidade, aliás, a que o próprio Tribunal a quo fez referência em sede de motivação, embora, por motivos que se desconhecem, não tenha levado essa circunstância em linha de conta quando fixou o acervo factual provado. Em face do exposto, considerando que os reparos suscitados pela recorrente a propósito da matéria em questão são pertinentes, determina-se que o ponto 12 dos factos provados passe a apresentar a seguinte redacção: 12 - A visibilidade do condutor do motociclo era de, pelo menos, 130 metros e a visibilidade do condutor do tratocarro era entre 70 e 130 metros, consoante estivesse parado junto à linha e ao sinal stop ou se já tivesse iniciado a sua marcha. ** Sustenta ainda a apelante que o ponto 13 dos factos provados se mostra incorrectamente julgado, sendo defendido que a correspondente factualidade deve ser considerada não assente. No ponto 13, é mencionado que “O motociclo circulava a uma velocidade média de entre 78 a 83 quilómetros por hora, e na altura do embate entre 65 a 75 quilómetros por hora”, matéria esta que a 1ª instância considerou provada com base no relatório pericial já mencionado. Como corolário da alteração pretendida em sede de recurso, é sustentado que a matéria vertida na alínea a) dos factos não provados deve considerada assente, alínea, como vimos, que faz referência a uma velocidade média de cerca de 132 quilómetros por hora. Relativamente à alínea a) dos factos não provados, a 1ª instância exarou a seguinte fundamentação: “Facto a) A não prova deste facto é o resultado da prova do facto 13º. Existe uma grande discrepância entre os valores de velocidade média indicados pelo relatório do NICAV e confirmados em audiência pela testemunha EE, e o relatório pericial cujo seu conteúdo foi também alvo de esclarecimentos em audiência por parte dos peritos que o elaboraram. E não temos dúvidas em afirmar que a prova pericial pelo valor que tem, reforçado, é de seguir pelo Tribunal e bem assim a velocidade lá indicada. Os peritos esclareceram como chegaram àqueles valores, ou seja, entre o mais com o uso de software próprio para tal, ao invés do NICAV que se baseou apenas no visionamento das imagens e daí partiu para a velocidade indicada. Pois bem, os meios usados pelos peritos e todo o relatório por si feito, por contraposição ao do NICAV é mais completo, mais complexo, fazendo uso de meios informáticos para os resultados que se obtiveram. Não se vê que o mesmo padeça de qualquer deficiência nem compete a testemunhas - neste caso GG - coloca-lo em dúvida, já que as testemunhas depõem sobre factos e não são ouvidas para infirmar relatórios periciais. Repete-se, não temos dúvidas da validade, idoneidade e credibilidade do relatório pericial, nem do mesmo resulta qualquer contradição nos seus termos. Uma última palavra para referir que o teor de fls. 46. do relatório pericial - reportamo-nos às doutas alegações da R. - não permite concluir pela impossibilidade de eventual travagem do motociclo só o ter feito abrandar de velocidade em menos de 10 quilómetros por hora, pelo facto de se desconhecer quando é que o condutor iniciou manobra de travagem, ou seja, quando vê o obstáculo ao longe, quando ao vê-lo ao longe presume que pode passar e não trava mas mais à frente vê que não consegue passar e já trava? Ou a diminuição de velocidade é só consequência do uso das mudanças manuais do veículo e não de qualquer travagem? Concluindo que a não prova de a) é resultado do relatório pericial e esclarecimentos dos senhores peritos em julgamento.” Em defesa da sua tese, a apelante invoca, como elementos probatórios, o já referido relatório do NICAV e os depoimentos das testemunhas EE e FF, sendo que este último realizou, a título extrajudicial e a pedido a ré, uma peritagem que procurou determinar as causas do acidente. Atentos os elementos probatórios carreados para os autos, não vemos razão para divergir do entendimento firmado pelo Tribunal recorrido. Vejamos porquê. Em primeiro lugar, recorde-se que a decisão impugnada se funda no relatório pericial a que temos vindo a fazer referência, sendo que os Srs. Peritos, no âmbito dos esclarecimentos que prestaram em audiência final, esclareceram a metodologia utilizada para o efeito e os meios de que socorreram, tendo confirmado que o veículo sinistrado (motociclo) circulava à velocidade que vem indicada no ponto 13 dos factos assentes. Sendo certo que no relatório do NICAV vem referida a velocidade de 132Km/h, a verdade é que o autor do mesmo (testemunha EE) esclareceu, no respectivo depoimento, que não dispunha de meios técnicos para apurar a mesma, designadamente o programa informático utilizado em sede pericial, não podendo, por isso, atribuir-se ao relatório do NICAV e às declarações prestadas por esta testemunha a relevância que a ré pretende. Em segundo lugar, também não pode atribuir-se relevo ao depoimento da testemunha FF [8], dado que o mesmo referiu que não consegue precisar a velocidade a que o motociclo circulava. Não sendo relevantes os elementos probatórios indicados pela recorrente, tem necessariamente de concluir-se no sentido da improcedência da impugnação que incide sobre a matéria vertida no ponto 13 e, bem assim, da que diz respeito à alínea a) dos factos não provados. ** Considera ainda a apelante que o Tribunal a quo deveria ter considerado assente a matéria incluída na alínea b) dos factos não provados, da qual resulta que “O condutor do tratocarro olhou para ambos os lados antes de entrar na EN...14 e iniciou a marcha sem avistar o motociclo.”. No caso vertente, constata-se que o condutor do tratocarro não foi inquirido em audiência final, sendo que as testemunhas que prestaram depoimento nessa sede não presenciaram a actuação do referido condutor aquando do sinistro em que o mesmo esteve envolvido. As declarações prestadas no âmbito do processo de natureza criminal a que a recorrente faz referência (também mencionadas no relatório do NICAV) não relevam, nos presentes autos, para demonstração da mencionada factualidade, uma vez que não estão reunidos os pressupostos a que alude o art. 421º, nº1, primeira parte do C.P.C. [9] (audiência contraditória e identidade das partes em ambos os processos) [10]. Também não se afigura relevante para este efeito, salvo melhor opinião, o depoimento da testemunha DD, dado que a mesma se limitou a descrever ou relatar o que o referido condutor lhe terá transmitido no quadro das diligências que foram levadas a efeito com vista a apurar a dinâmica do acidente [11]. Conforme se salienta no Acórdão da Relação de Évora de 26/10/2023 (Aresto disponível em https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/1723bab69b953dfb80258a6e0033fde4?OpenDocument), “O testemunho de ouvir dizer significa que a testemunha não presenciou os factos sobre os quais incide o seu depoimento, tenho-lhe sido os mesmos relatados por terreiros. Trata-se de um depoimento indireto, não passível de contraditório, ainda mais falível do que o depoimento testemunhal em si mesmo, já por si, com essas caraterísticas. O valor deste meio de prova é o de indicar o meio de prova direto, permitindo que o juiz possa, então, ouvir essa fonte e desencadear o princípio do contraditório.”. Pelos motivos expostos, não deve ser alterada a decisão recorrida na que diz respeito à alínea b) dos factos não provados. 
 *** 2.4. Enquadramento jurídico. A responsabilidade civil por factos ilícitos tem como pressuposto, entre outros requisitos legais, a culpa do agente, ou seja, a imputação a determinada pessoa, de uma conduta danosa, que pode ser praticada a título doloso ou por simples negligência. É o que resulta do art. 483º, nº1, do Código Civil, o qual estabelece que “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilìcitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.” [12]. De harmonia com o preceituado no art. 487º, nº2, do mesmo Código, “A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso.”. Trata-se de um critério geral que, transposto para o domínio rodoviário, significa que um condutor médio, no exercício de uma actividade que comporta riscos evidentes, deve actuar de forma prudente ou cautelosa, avaliando, em cada momento, todo o circunstancialismo envolvente (características da via, velocidade, circulação de peões, manobras que outros veículos efectuam, etc.), de forma a adequar a condução a esse conjunto de variáveis e evitar, de acordo com a avaliação que faz de tais circunstâncias, acidentes de viação. Como se salienta no Acórdão do STJ de 23/2/2016 (Aresto disponível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/-/3F33BD87C0A6EFCA80257F6400395380) “O critério legal de apreciação da culpa é um critério abstracto, ou seja, tendo em conta as concretas circunstâncias da dinâmica do acidente de viação em causa, por referência a um condutor normal.”. Por sua vez, no Acórdão da Relação de Guimarães de 16/11/2017 (Aresto que se encontra disponível em https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:TRG:2017:833.15.3T8BGC.G1), observa-se, como toda a pertinência que “O condutor diligente e prudente, o bom pai de família, é aquele que, em cada momento, atende aos diversos fatores que envolvem a atividade em curso, nomeadamente tendo em atenção as características da viatura que conduz e o contexto ou envolvente em que esta se situa ou circula, exigindo esse processo etapas de perceção, avaliação e decisão que não podem ser ultrapassadas, sob pena de se incumprir o dever de cuidado exigido;”. Na mesma linha de orientação, refere-se no Acórdão da Relação de Évora de 10/4/2014 (disponível em https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/-/F7AECA78EB44C9BC80257CDF005607B3) que “a diligência relevante para a determinação da culpa há-de ser a de uma pessoa normal colocada perante o circunstancialismo do caso concreto.”. A corrente jurisprudencial que citámos – e que também seguimos – funda-se, por um lado, nas normas de carácter geral previstas no nosso Código Civil e, por outro, no quadro normativo inserido no Código da Estrada (CE) e no Regulamento de Sinalização do Trânsito (Decreto Regulamentar n.º 22-A/98, de 1 de Outubro), diplomas que integram um conjunto de princípios e regras que, de forma mais específica e detalhada, se ocupam desta matéria. Atentas as posições expressas em sede de articulados, era imputado a condutor do tratocarro, por parte dos autores, a violação de uma regra de cedência de prioridade, sendo que a ré, por sua vez, imputava ao condutor do motociclo o incumprimento das disposições legais que se ocupam da velocidade dos veículos. No caso vertente, não pode deixar de reconhecer-se que a factualidade que integra a decisão recorrida não permite determinar, com rigor, se a responsabilidade pelo sinistro decorre, em exclusivo, da actuação de um dos condutores envolvidos, sendo certo, no entanto que existem indícios que apontam para uma concorrência de culpas, pelos motivos que iremos indicar seguidamente. Os elementos factuais – escassos – presentes nos autos demonstram, em primeiro lugar, que o condutor do tratocarro estava obrigado a ceder a prioridade, atenta a sinalização existente no local de onde provinha. Trata-se do sinal B2 [13] previsto no art. 21º do Regulamento de Sinalização do Trânsito, norma que, a este propósito, estabelece o seguinte: “paragem obrigatória no cruzamento ou entroncamento: indicação de que o condutor é obrigado a parar antes de entrar no cruzamento ou entroncamento junto do qual o sinal se encontra colocado e ceder a passagem a todos os veículos que transitem na via em que vai entrar;”. Independentemente da existência da referida sinalização, no local em apreço era obrigatória a cedência de passagem aos veículos que circulassem na EN...14, atento o disposto no art. 31.º, nº1, alínea a), do CE, o qual prescreve que “Deve sempre ceder a passagem o condutor: a) Que saia de um parque de estacionamento, de uma zona de abastecimento de combustível ou de qualquer prédio ou caminho particular;” [14]. A regra de cedência de passagem, note-se, não é absoluta, uma vez que o art. 29º, nº2, do CE dispõe que “O condutor com prioridade de passagem deve observar as cautelas necessárias à segurança do trânsito.”. Atenta a visibilidade existente no local [15], existem, paralelamente indícios de que o condutor do motociclo terá desrespeitado a disposição inserida no art. 24º, nº1, do CE, dado que não se compreende, por que motivo, considerando a velocidade que foi apurada (cf. ponto 13 dos factos provados ) não conseguiu imobilizar o veículo que tripulava no espaço que teria disponível – ou reduzir a velocidade, de forma substancial, minimizando as consequências do acidente. O art. 24º, nº1, do CE, estabelece que “O condutor deve regular a velocidade de modo a que, atendendo à presença de outros utilizadores, em particular os vulneráveis, às características e estado da via e do veículo, à carga transportada, às condições meteorológicas ou ambientais, à intensidade do trânsito e a quaisquer outras circunstâncias relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente.” Sem embargo de todas as considerações anteriormente expendidas, a verdade é que se desconhece, em concreto, qual a manobra causal do acidente, não sendo possível, com base na factualidade apurada e no confronto da mesma com o quadro normativo vigente, determinar se os condutores actuaram de forma negligente e em que medida contribuíram para o sinistro que está na génese do litígio. Isto significa, na ausência de outros elementos relevantes, que é aplicável o regime previsto no art. 506º do Código Civil, o qual dispõe o seguinte: “1. Se da colisão entre dois veículos resultarem danos em relação aos dois ou em relação a um deles, e nenhum dos condutores tiver culpa no acidente, a responsabilidade é repartida na proporção em que o risco de cada um dos veículos houver contribuído para os danos; se os danos forem causados somente por um dos veículos, sem culpa de nenhum dos condutores, só a pessoa por eles responsável é obrigada a indemnizar. 2. Em caso de dúvida, considera-se igual a medida da contribuição de cada um dos veículos para os danos, bem como a contribuição da culpa de cada um dos condutores.” A matéria de facto presente nos autos não permite determinar, salvo melhor opinião, o grau em que cada um dos veículos contribuiu para os danos decorrentes do sinistro, não sendo, de igual forma, possível apurar, como já se referiu, se existiu culpa, e em que moldes, dos respectivos condutores. Por esse motivo, a atenta a regra consagrada no citado art. 506º, nº2, do Código Civil, deverá a responsabilidade ser repartida na proporção de 50% para cada um dos intervenientes [16], estando, consequentemente, a ré/apelante obrigada a indemnizar o valor correspondente a metade dos prejuízos que foram apurados. ** No que diz respeito a danos, a recorrente coloca em causa o valor indemnizatório fixado pelo Tribunal a quo para ressarcir a perda do direito à vida, considerando excessivo o montante atribuído na sentença impugnada (100.000,00 €). Os critérios normativos que devem ser levados em consideração, para este efeito, encontram-se previstos no art. 496º, nº4, do Código Civil, disposição que apresenta o seguinte teor: “O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos dos números anteriores.” O art. 494º do citado Código – para o qual o art. 496º, nº4, remete – refere-se ao o grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado e às demais circunstâncias do caso que sejam consideradas relevantes. À data do acidente, o sinistrado tinha 34 anos de idade, encontrando-se a sua situação patrimonial discriminada nos pontos 18 a 21 dos factos provados [17]. Possuía uma forte ligação afectiva à esposa e filhos, conforme referido no ponto 29, igualmente dos factos assentes. Como é sabido, a perda do direito à vida traduz-se num dano que, progressivamente, tem a vindo a ser cada vez mais valorizado pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, o que não é de estranhar, dada a relevância do bem que está em causa. Assim, no Acórdão da Relação de Lisboa de 16/11/2021 (Aresto disponível em https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/8079c0ed2b4c8ec8802587aa005a8c78) considerou-se adequado o montante de 120.000,00 € para ressarcir este dano, sendo que o caso analisado dizia respeito a uma vitima, falecida na sequência de um acidente de viação, que tinha a idade de 17 anos [18]. No Acórdão do STJ de 27/9/2022 (Aresto disponível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/3215da7f820f25a8802588cb004b94bf?OpenDocument) foi atribuída a importância de 95.000,00 € [19], estando em causa uma vítima, com a idade de 41 anos, falecida em acidente de viação [20]. No Acórdão da Relação do Porto de 23/4/2024 (Aresto disponível em https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381f df/e8ca9e8af6f27a9f80258b2b0034b1da?OpenDocument), foi fixado o montante de 70.000,00 €, estando em causa um sinistrado, também falecido num acidente rodoviário, que tinha a idade de 72 anos [21]. Por sua vez, num caso que tem paralelismo com o dos presentes autos (vítima, falecida em acidente de viação, com a idade de 39 anos), o STJ, em Acórdão de 10/10/2023 (Aresto disponível em https://juris.stj.pt/9039%2F20.9T8SNT.L1.S1/PEP0BfkUYq4FbmQ9wWkqFWGg5Zk?search=bAdmKV2iNWcmQJT9TpI), considerou ajustado o montante de 100.000,00 € para ressarcir o dano em apreço, tendo, com toda a propriedade, a propósito desta matéria, exarado as seguintes observações: “2.8.- O dano pela perda do direito à vida ou “dano morte” O acórdão recorrido quantificou o chamado dano morte em € 100.000,00. Os Autores aceitam-no, mas a Ré Seguradora impugna-o, considerando-o exagerado, reclamando o valor de € 80.000,00. Não está em causa a ressarcibilidade do dano não patrimonial constituído pela perda do direito à vida (art.496 nº3 CC), que é o mais importante dos direitos fundamentais e o dano morte, no plano dos interesses da ordem jurídica, o prejuízo supremo. A jurisprudência portuguesa, sobretudo a partir de meados da década de 90 ( do século passado) deu um salto qualitativo, aumentando progressivamente a indemnização pela perda do direito à vida, como se resumiu no Ac do STJ de 17/2/2002 ( www dgsi.pt/jstj ), com indicação de diversas decisões. Como critério adjuvante para a determinação equitativa do dano, a jurisprudência passou a socorrer-se da Resolução do Conselho de Ministros sobre o caso do acidente de Entre-os Rios de 4/3/2001, segundo o parecer do Provedor de Justiça ( Diário da República, n.º 96, 2ª série, de 24 de Abril de 2001 - resumo, parte VIII, páginas 7142 ). Funcionando então o acidente de Entre-os-Rios como uma espécie de “precedente” ou “premissa endoxal”, não pode deixar de se entender hoje a posterior evolução do custo de vida, os aumentos dos prémios de seguros, e sobretudo o princípio da dignidade da compensação dos danos. Se já em 2013 a jurisprudência passou a atribuir valores que oscilam entre € 50.000,00 e € 80.000,00, chegando a atingir € 100.000,00 para vítimas jovens ( cf., por ex., Ac STJ de 29/10/2013 ( proc. nº 62/10.2TBVZL ), Ac STJ de 18/12/2013 ( proc. nº 1749/06.0TBSTS), em www dgsi.pt ), a posterior evolução e o princípio da actualidade reclamam claramente valores superiores. Sendo assim e partindo destes valores de referência, é evidente que o valor arbitrado de € 100.000,00 não se mostra exagerado, justificando-se hoje uma quantificação mais elevada.”. Face aos critérios legais apontados e à orientação jurisprudencial referida, afigura-se ajustado o montante atribuído pela 1ª instância para ressarcir a perda do direito à vida, improcedendo, nesta parte, o recurso interposto pela ré. Em conclusão, deverá recorrer-se ao critério de repartição da responsabilidade, face ao regime previsto no art. 506º, nº2, do Código Civil, e, nessa medida, proferir decisão a fixar o respectivo valor indemnizatório, com as consequências legais. 
 *** III – DECISÃO. Pelo exposto, decide-se julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência, condenar a ré/apelante a pagar aos autores/apelados as seguintes quantias, todas acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento: a) À A. AA o valor de 128.406,33 € (cento e vinte e oito mil quatrocentos e seis euros e trinta e três cêntimos); b) À autora BB o valor de 49.358,77 € (quarenta e nove mil trezentos e cinquenta e oito euros e setenta e sete cêntimos); c) Ao autor CC o valor de 56.762,69 € (cinquenta e seis mil setecentos e sessenta e dois euros e sessenta e nove cêntimos). 
 *** Custas pela apelante e pelos apelados, na proporção do decaimento, sem prejuízo das decisões proferidas em matéria de apoio judiciário. Coimbra, 30 de Setembro de 2025 (assinado digitalmente) Luís Manuel de Carvalho Ricardo (relator) Hugo Meireles (1º adjunto) Luís Miguel Caldas (2º adjunto) 
 [14] O sublinhado é nosso. [15] A visibilidade não era reduzida. A este propósito, estabelece-se no art. 19º do CE que “Para os efeitos deste Código e legislação complementar, considera-se que a visibilidade é reduzida ou insuficiente sempre que o condutor não possa avistar a faixa de rodagem em toda a sua largura numa extensão de, pelo menos, 50 m.”. [16] Sobre esta matéria, cf. o Acórdão do STJ de 3/7/2025, disponível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/6a276011255a072080258cbc0049ec17?OpenDocument. [17] A maior parte dos proventos do agregado familiar tinham a sua origem na actividade que o sinistrado desenvolvia. [18] Refere-se no referido Aresto que “Seguindo um critério de equidade e de comparação com os valores médios da jurisprudência, parece adequado concluir que o valor vida deva fixar-se em patamar não acima de 120.000 euros (atribuindo-se aos pais do falecido metade (60.000, euros) para cada um), actualizado à presente data, valor esse que será o agora determinado, reduzindo-se aquele outro inicial de 150.000,00 para este montante.” [19] Valor idêntico (95.000,00 €) foi fixado no Acórdão do STJ de 19/1/2023 (Aresto disponível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e1254c9ed5f6c8f08025893d003474a0?OpenDocument), estando em causa uma vítima, com a idade de 29 anos, falecida em acidente de viação. [20] No respectivo sumário, consta o seguinte: “I - O dano morte/perda do direito à vida e os danos morais/não patrimoniais (que precederam o decesso, também designados por “danos intercalares”) sofridos pela vítima/cônjuge de acidente de viação constituem danos indemnizáveis autonomamente, cujo direito radica na esfera do de cujus e que depois se transmite (em conjunto) aos seus familiares-herdeiros referidos no nº. 2 do artº. 496º do C. Civil. II - Por sua vez, os danos de cariz patrimonial daí decorrentes sofridos por aqueles seus familiares-herdeiros são danos próprios dos mesmos, cujo direito de indemnização radica ab initio na sua esfera jurídica. III - Todos esses danos, e particularmente aquele decorrente da perda do direito à vida, devem ser condignamente indemnizados/compensados, tendo sempre como critério nuclear de fundo a equidade, embora sem perder de vista o recurso a outros elementos circunstanciais, quer aqueles de caráter mais geral, e particularmente aqueles que a lei manda atender, quer aqueles que resultam da peculiaridade de que se reveste o caso concreto. IV - À luz desses critérios mostra-se minimamente ajustado compensar o dano decorrente da perda do direito à vida da falecida com o montante indemnizatório de € 95.000,00, na sequência de um acidente de viação para o qual não contribuiu, tendo na altura 41 anos de idade e sendo então uma pessoa saudável, feliz/alegre, com família constituída, com um agregado familiar composto pelo seu marido e uma filha menor, e estabilizada ainda profissionalmente.”. [21] No sumário do referido Acórdão consta o seguinte: “Relativamente a uma vítima de 72 anos de idade, casado e com dois filhos, com relações de profunda afeição com a sua esposa, a quem dava apoio, e com os seus filhos, consideramos justo e equitativo que a indemnização pela perda do seu direito à vida seja fixada em 70.000,00€.” |