Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00169/01 - COIMBRA |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
Data do Acordão: | 02/04/2010 |
Relator: | Francisco Rothes |
Descritores: | PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA - DEDUTIBILIDADE DE CUSTOS - ALMOÇO DE NATAL - JUROS DAS RENDAS LEASING DE VIATURA AUTOMÓVEL LIGEIRA |
Sumário: | I - A sede própria para declarar a prescrição de uma obrigação tributária (que determina a inexigibilidade da correspondente dívida, com a consequente impossibilidade de cobrança coerciva) é a execução fiscal em que esta esteja a ser exigida, podendo o executado, caso a prescrição não seja conhecida oficiosamente (como deve ser – cf. art. 175.º do CPPT), arguí-la mediante requerimento dirigido à execução ou, dentro do prazo da oposição à execução fiscal, como fundamento desta. II - Em todo o caso, porque, verificada a prescrição da obrigação tributária, a impugnação judicial que visa a apreciação da legalidade da liquidação que lhe deu origem deixa de ter utilidade (a AT não mais pode cobrar a dívida e se tiver já instaurado execução fiscal deve declará-la extinta), deve, nesse circunstancialismo, extinguir-se a instância por inutilidade superveniente da lide (cf. art. 287.º, n.º 1, alínea e), do CPC). III - Estando em causa o IRC do ano de 1995, sendo a única causa interruptiva conhecida nos presentes autos a instauração da impugnação judicial, em 26 de Setembro de 2000, tendo este processo completado um ano de paragem por motivo não imputável ao Contribuinte em 26 de Janeiro de 2005, em 4 de Fevereiro de 2010 não está ainda decorrido o prazo de prescrição – que é de 10 anos, nos termos do art. 34.º do CPT, aplicável por força do disposto no art. 297.º do CC, e tendo em conta na sua contagem o disposto no art. 49.º, n.ºs 1 e 2, da LGT, este na redacção inicial. IV - Os encargos com um almoço oferecido por uma empresa aos seus trabalhadores são de qualificar como despesa de representação, nos termos do art. 41.º, n.ºs 1, alínea g), 3, na redacção da Lei n.º 39-B/94, de 27 de Dezembro, ainda que escriturados a outro título, não relevando para essa qualificação a finalidade ou natureza do almoço. V - Os encargos com juros das rendas dum contrato de locação financeira integram o tipo legal previsto no art. 41.º, n.º 4, do CIRC, na redacção da referida Lei n.º 39-B/94. VI - Atento o disposto nas referidas disposições do CIRC, as despesas ditas em IV e V não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável na proporção de 20%. |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
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Decisão Texto Integral: | 1. RELATÓRIO 1.1 A Administração tributária (AT), na sequência de uma acção de fiscalização à sociedade denominada “SILMOTA - , Lda.” (adiante Contribuinte, Impugnante ou Recorrente), considerou, para além do mais que ora não releva, que a Contribuinte deduziu indevidamente como custos da sua actividade para efeitos do apuramento da matéria tributável relativamente ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do ano de 1995, a totalidade das despesas com um almoço oferecido ao pessoal e dos juros das rendas suportadas com contratos de leasing de viaturas ligeiras de passageiros, sendo que não o poderia fazer relativamente a 20% dos respectivos valores. Assim, procedeu às pertinentes correcções da matéria tributável declarada e à consequente liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios. 1.2 A Contribuinte deduziu impugnação judicial, pedindo ao Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Coimbra a anulação daquele acto tributário na parte relativa às referidas correcções. Invocou a violação de lei, sustentado que os custos em causa devem ser relevados fiscalmente pela totalidade. 1.3 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (() Entretanto, o Tribunal Tributário de 1.ª instância de Coimbra foi extinto, tendo-lhe sucedido na sua competência o Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra.) julgou a impugnação improcedente. Para tanto, em resumo, considerou o seguinte: 1.4 Inconformada com essa sentença, a Impugnante dela recorreu para este Tribunal Central Administrativo Norte e o recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo. 1.5 A Recorrente apresentou alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: Nestes termos e nos melhores de Direito deverá a sentença ser revogada e substituída por uma outra que: Tudo o mais com as consequências legais» (() As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, são transcrições.). 1.6 A Fazenda Pública não contra alegou. 1.7 Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Norte, foi dada vista ao Ministério Público e a Procuradora Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso. 1.8 Foram colhidos os vistos dos Juízes adjuntos. 1.9 No presente recurso, as questões que cumpre apreciar e decidir são as de saber * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO2.1 DE FACTO 2.1.1 Na sentença recorrida o julgamento de facto foi efectuado nos seguintes termos: «3. Matéria de Facto 3.1. Factos Provados 3.1.1. Em cumprimento da ordem de serviço n.º 28413, de 99.10.29, os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção Distrital de Finanças de Coimbra, procederam a exame à escrita da Impugnante dos exercícios de 1995 a 1997, em resultado do qual foi elaborado, em 2000.03.06, o relatório de fiscalização de que se junta cópia de fls. 16 a fls. 65 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos e de onde, além do mais, resultaram correcções à matéria colectável em sede de I.R.C. de 1995 com a fundamentação que assim se transcreve parcialmente: «Em sede de IRC, foi detectado que o Sujeito Passivo considerou custos não aceites fiscalmente, que deveriam ter sido acrescidos no quadro 17 da respectiva declaração modelo 22, conforme explicado nas alíneas a seguir e discriminado nos quadros posteriores: (…) b) Não acresceu 20% das despesas de representação, consubstanciadas em: 1995 – almoço convívio com colaboradores; (…); c) Não acresceu 20% dos encargos com viaturas ligeiras de passageiros, designadamente os encargos financeiros com a aquisição em regime de locação financeira e um aluguer de um “BMW 318”.
[Doc.s de fls. 7 dos autos. Que esta liquidação tem origem nas correcções supra indicadas é facto admitido por ambas as partes] 3.1.3. A impugnação deu entrada no Serviço de Finanças de Figueira da Foz 2 em 2000.09.26. [Cfr. carimbo aposto no cabeçalho da douta P.I.] * 3.2. Factos Não Provados
Não há factos alegados a considerar com interesse para a decisão e a dar aqui como não provados». * 2.2 DE FACTO E DE DIREITO2.2.1 DA PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA Invoca a Recorrente, pela primeira vez em sede de recurso, a prescrição da obrigação tributária. Como é sabido, a prescrição da obrigação tributária não pode constituir fundamento da impugnação da liquidação pois respeita, não à validade deste acto, mas à exigibilidade da obrigação criada com a liquidação. Ou seja, a prescrição da obrigação tributária determina a inexigibilidade da correspondente dívida, com a consequente impossibilidade de cobrança coerciva. Assim, a sede própria para invocar a prescrição da obrigação tributária, quando esta não seja oficiosamente conhecida – como deve ser, nos termos do art. 175.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) – é a execução fiscal, onde o executado pode arguí-la, ou mediante requerimento endereçado ao órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial de eventual decisão desfavorável, nos termos do disposto no art. 276.º do CPPT, ou, se estiver em tempo, mediante oposição à execução fiscal (cf. arts. 203.º e 204.º, n.º 1, alínea d), do CPPT). Em todo o caso, o prosseguimento da impugnação, no caso de a obrigação tributária não estar ainda solvida e de ser inquestionável o decurso do prazo da respectiva prescrição, constitui acto inútil: a AT, ainda que a impugnação seja julgada improcedente, não poderá instaurar execução com vista à cobrança da dívida correspondente, bem como deverá oficiosamente declarar extinta a execução, caso esta tenha já sido instaurada. Assim, apesar de a prescrição não poder constituir fundamento de impugnação judicial da liquidação, a jurisprudência tem vindo a admitir que pode ser apreciada nessa sede como motivo da inutilidade superveniente da lide: verificada a prescrição da obrigação tributária, que determina a inexigibilidade da correspondente dívida, com a consequente impossibilidade de cobrança coerciva, a impugnação judicial em que se visa apenas a apreciação da legalidade da liquidação que lhe deu origem deixa de ter utilidade; nesse circunstancialismo, deve extinguir-se a instância por inutilidade superveniente da lide (cf. art. 287.º, n.º 1, alínea e), do CPC) (() Neste sentido, · na doutrina, JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 5.ª edição, I volume, anotação 5 ao art. 99.º, pág. 708/709, e II volume, anotação 4 ao art. 175.º, pág. 205, e Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, págs. 21 a 23; · na jurisprudência, entre muitos outros, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: – de 5 de Julho de 2007, proferido no processo com o n.º 407/07, publicado no Apêndice ao Diário da República de 13 de Maio de 2008 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2007/32230.pdf), págs. 1322 a 1324, e com texto integral também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/18480721f53e6d8180257316003ac408?OpenDocument; – de 11 de Março de 2009, proferido no processo com o n.º 659/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Abril de 2009 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2009/32210.pdf), págs. 378 a 384, e com texto integral também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/1b119221f4bccaa48025757b00441aaa?OpenDocument.). No entanto, a nosso ver, a referida possibilidade de conhecer prejudicialmente da prescrição em sede de impugnação judicial apenas se impõe ao tribunal ad quem, ainda que com competência em matéria de facto, caso o processo forneça todos os elementos que permitam uma decisão segura dessa questão e não exige que aquele tribunal indague, oficiosamente e pela primeira vez, da factualidade pertinente para apreciar da prescrição. Isto, por um lado, porque essa factualidade não foi objecto de julgamento algum em 1.ª instância e os poderes do tribunal de 2.ª instância em matéria de facto não são para efectuar julgamento ex novo, mas para sindicar erros verificados no julgamento efectuado pelo tribunal a quo e, por outro lado, porque, se a obrigação tributária estiver realmente prescrita, sempre o impugnante poderá invocar com sucesso a prescrição na execução fiscal, nos termos que deixámos já referidos. Dito isto, comecemos por apreciar se os elementos constantes dos autos nos permitem concluir que a obrigação tributária correspondente à liquidação impugnada está prescrita pois, na procedência desta questão, ficará prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas no recurso. Pese embora a Recorrente invoque a prescrição da obrigação tributária, a única factualidade que aduz susceptível de abonar a sua tese é que o imposto em causa respeita ao ano de 1995 e não se encontra pago. Vejamos: Está em causa nos presentes autos a liquidação adicional de IRC do ano de 1995. De acordo com o art. 34.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Tributário (CPT), em vigor à data em que ocorreram os factos, a obrigação tributária prescrevia no prazo de dez anos. Entretanto, em 1 de Janeiro de 1999 entrou em vigor a Lei Geral Tributária (LGT) (() Cf. art. 6.º do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, diploma legal que aprovou a LGT.), que veio regular a matéria da prescrição da obrigação tributária nos seus arts. 48.º e 49.º, encurtando o prazo da prescrição de dez para oito anos (cf. art. 48.º, n.º 1). Para determinar qual o prazo há que atender ao disposto no art. 297.º, n.º 1 do Código Civil (CC) (() Disposição legal que dispõe: «A lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar».), aplicável ex vi do art. 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, diploma que aprovou a LGT. Assim, antes do mais, há que verificar se, à data em que entrou em vigor a LGT, faltava menos de oito anos para o termo do prazo de dez anos, previsto no art. 34.º do CPT, chegar ao seu termo. A resposta é negativa. Vejamos: Nos termos dos n.ºs 2 e 3 do art. 34.º do CPT, o prazo de prescrição começou a correr em 1 de Janeiro de 1996 (() Note-se que é irrelevante o facto de, àquela data, não estar ainda efectuada a liquidação, pois a prescrição refere-se directamente ao facto tributário, podendo ocorrer sem que tenha tido lugar a liquidação. Neste sentido, – na doutrina, BENJAMIM SILVA RODRIGUES, A prescrição no Direito Tributário, Problemas fundamentais do Direito Tributário, Vislis, 1999, pág. 287; – na jurisprudência, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 22 de Outubro de 1997, proferido no processo com o n.º 21.813, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Março de 2001 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/1997/32240.pdf), págs. 2704 a 2707 e com sumário disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/90465c001ec49dfe802568fc003991fc?OpenDocument.) e correu ininterruptamente até 1 de Janeiro de 1999, data em que entrou em vigor a LGT. Ou seja, nesta última data, apenas faltavam sete anos, à luz do art. 34.º do CPT, para o termo do prazo da prescrição; menos que os oito anos fixados pelo art. 48.º, n.º 1, da LGT, e que apenas pode contar-se a partir da data da entrada em vigor desta lei, de acordo com o disposto no art. 297.º, n.º 1, do CC. Assim, como resulta desta norma legal, o prazo de prescrição a considerar é o de dez anos, previsto no CPT. O referido prazo, interrompeu-se pela dedução da presente impugnação judicial, em 26 de Setembro de 2000 (cf. art. 49.º, n.º 1, da LGT). A impugnação judicial, que desde a sua entrada em juízo até 26 de Janeiro de 2004 não conheceu qualquer paragem por período superior a um ano, parou nessa data e manteve-se sem tramitação alguma por mais de um ano por motivo não imputável à Contribuinte (cf. os factos que demos como assentes sob as alíneas b) a d) do ponto 2.1.3). Essa paragem determina que o efeito interruptivo decorrente da instauração da impugnação se tenha degradado em suspensivo, nos termos do n.º 2 do art. 49.º da LGT, na redacção inicial do preceito (() A Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2007), através do seu art. 83.º-B, revogou o n.º 2 do art. 49.º da LGT. No entanto, à data da sua entrada em vigor – 1 de Janeiro de 2007 (cf. o seu art. 163.º) – já se tinha verificado a paragem do processo de execução fiscal por mais de um ano.), havendo que retomar a contagem do prazo nos termos indicados naquele preceito legal: «somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período [de paragem por mais de um ano] ao que tiver decorrido até à data da autuação». Ou seja, no cômputo do prazo da prescrição há que somar o período decorrido desde o seu termo inicial até à data da instauração da impugnação judicial (1 de Janeiro de 1996 até 26 de Setembro de 2000, ou seja, 4 anos 9 meses e 25 dias) com o que decorreu após um ano da paragem até ao presente (27 de Janeiro de 2005 até 4 de Fevereiro de 2010, ou seja, 5 anos e 8 dias). O que significa que, mesmo que não existam outros motivos de interrupção ou de suspensão a considerar, o que os autos não nos permitem estabelecer, não está ainda esgotado o prazo da prescrição. Note-se que está hoje ultrapassada a tese sustentada pela Recorrente, de que, no âmbito do CPT e da versão inicial da LGT, a «interrupção da prescrição só ocorre uma vez». Segundo a melhor interpretação, para efeitos da prescrição deve inutilizar-se o período que decorrer entre a autuação do processo a que se refere cada acto interruptivo e o primeiro aniversário da paragem do processo por motivo não imputável ao contribuinte. Parafraseando JORGE LOPES DE SOUSA, se for praticado um novo acto interruptivo (por exemplo, se for instaurada execução fiscal ou efectuada a citação (() Note-se que no âmbito da vigência do CPT, a lei concedia efeito interruptivo à instauração da execução fiscal (art. 34.º, n.º 3). Com a LGT, tal efeito deixou de resultar da instauração da execução, como resulta do n.º 1 do art. 49.º, passando, na redacção dada a este preceito pela Lei n.º 100/99, de 26 de Julho, a verificar-se com a citação do executado.) na pendência de uma impugnação judicial), será com base em qualquer destes actos que se apreciará, autonomamente, se decorreu o prazo de prescrição, não se podendo considerar decorrido esse prazo se, à face de qualquer dos actos interruptivos, ele não se puder considerar esgotado (() Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado, 5.ª edição, II volume, anotação 3 c)1 ao art. 175.º, pág. 196. Embora nesta anotação, o Autor se refira ao art. 49.º, n.º 2, da LGT, a doutrina que aí expende é inteiramente transponível para o art. 34.º do CPT.). «Esta é uma conclusão que se extrai com alguma segurança, pois se a lei atribui a diversos actos efeito interruptivo autónomo e não afasta a possibilidade da sua cumulação, a ilação lógica a retirar é reconhecer o efeito que cada um tem (inclusivamente o suspensivo quando é este aquele que acaba por ter) quando o seu âmbito de aplicação não se sobreponha» (() Ibidem.). É esta a interpretação actualmente acolhida unânime e reiteradamente pelo Supremo Tribunal Administrativo (() Neste sentido, entre outros, os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo: · da Secção do Contencioso Tributário – de 16 de Janeiro de 2008, proferido no processo com o n.º 451/07, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Maio de 2008 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2008/32210.pdf), págs. 38 a 42 e com texto integral disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/22e98ba36e893ecc802573d90040950e?OpenDocument; – de 15 de Outubro de 2008, proferido no processo com o n.º 409/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 11 de Fevereiro de 2009 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2008/32240.pdf), págs. 1169 a 1170 e com texto integral também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/2041f273fbee9cd9802574e9002ac22f?OpenDocument. · do Pleno da Secção do Contencioso Tributário – de 28 de Maio de 2008, proferido no processo com o n.º 840/07, publicado no Apêndice ao Diário da República de 22 de Setembro de 2008 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2008/32420.pdf), págs. 67 a 70 e com texto integral também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/80d58f973c6d75078025746600540eda?OpenDocument.). Assim, no caso de haver dois actos interruptivos, ambos têm potencialidade para interromper a prescrição e, se ambos os processos em que se verificaram tais actos pararam por mais de um ano por motivo não imputável ao contribuinte, os dois actos passam a ter efeito suspensivo da prescrição durante o período em que estiveram pendentes sem terem parado há mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, pelo que «[é] indiferente, naturalmente, que os efeitos suspensivos de cada um dos processos se sobreponham ou não, pois basta um deles ter efeito suspensivo durante um determinado período de tempo para esse período se tornar irrelevante para a prescrição. Por isso, o período de prescrição é calculado tomando como ponto de partida o momento inicial do prazo de prescrição e subtraindo os dois períodos em que os processos tiveram efeito suspensivo, dando relevância apenas a um dos factos, na parte em que os efeitos suspensivo se sobrepuserem. Ou, dito de outra forma: – por efeito do primeiro processo, conta para a prescrição o período desde o início do prazo até à instauração do primeiro processo; – não corre a prescrição enquanto o primeiro processo estiver pendente até estar parado por mais de um ano; – não corre a prescrição enquanto o segundo processo estiver pendente até estar parado por mais de um ano» (() Referido acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo com o n.º 409/08.). O que significa que, para podermos emitir um julgamento seguro no sentido da inutilidade superveniente da lide, impunha-se que os autos nos fornecessem todos os elementos necessários à apreciação de eventuais causas de interrupção e suspensão da prescrição, que poderão ter ocorrido noutros processos administrativos ou contenciosos Sem prejuízo do que deixámos dito, os elementos disponíveis nos autos permitem-nos desde já afirmar com segurança que a obrigação tributária que teve origem na liquidação aqui impugnada ainda não está prescrita. 2.2.2 DO ERRO NO JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO Pretende a Recorrente que se dê como provada a matéria de facto que alegou nos artigos 5.º e 6.º da petição inicial, ou seja, que a despesa em causa respeita a «almoço de Natal com os trabalhadores», que visou «o estreitar das relações sociais entre todos, com o objectivo último de todos levar, em harmonia, à prossecução cabal dos fins da empresa». Salvo o devido respeito, a AT levou ao relatório que esteve na base das correcções que deram origem à liquidação impugnada que a despesa respeita a «almoço convívio com colaboradores» e a sentença, que o referiu no ponto 3.3.1 dos factos provados (cf. supra 2.1.1), não pôs em causa tal facto, estando adquirido nos autos que a referida despesa se refere a um almoço com os trabalhadores da empresa ora Recorrente. Quanto à finalidade visada com o almoço, por certo entendeu o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra ser a mesma irrelevante para a decisão da causa, como aliás se pode verificar pela fundamentação de direito que expendeu sob o n.º 4.1 da sentença. Aí salientou que «a limitação, ou rejeição da dedutibilidade de custos mencionados no art. 41.º do C.I.R.C. tem carácter liminar «sem cuidar de investigar da eventual inserção no interessa societário da empresa», opção «assumida para evitar uma sindicância casuística sobre a natureza societária ou pessoal da despesa» (ANTÓNIO MOURA PORTUGAL, «A Dedutibilidade de Custos em IRC: Reflexões Sobre Custos Incorridos em Actividades Isentas e Não Tributadas», in C.T.F. nº 401, pág. 80). Daí que nem a fiscalização tivesse que indagar do interesse mais ou menos indirecto que a despesa pudesse assumir na cultura social da empresa (juízo sempre subjectivo e de difícil sindicância) nem a Impugnante pudesse invocar esse interesse para sustentar a dedutibilidade integral da despesa». Seja como for, na tarefa hermenêutica que, de forma exaustiva, foi empreendida na sentença, o Juiz do Tribunal a quo ponderou, aceitando-a para fins de exposição, que a finalidade do referido almoço fosse a de “estreitar as relações sociais”. Em todo o caso, sempre diremos que nunca o referido facto respeitante à finalidade do almoço poderia ser dado como provado com base no depoimento das testemunhas, pela simples razão de que, como pode verificar-se através da leitura da acta da inquirição das mesmas, nenhuma se referiu àquele almoço nem à finalidade que a ora Recorrente prosseguia com a realização do mesmo (() Note-se que a Recorrente sempre estaria obrigada, nos termos do art. 690.º-A, n.º 1, alínea b), do CPC, em vigor à data, a indicar «os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida», ou seja, quais as passagens que no registo escrito do depoimento das testemunhas apoiavam a sua pretensão, de nada valendo, para se eximir desse ónus, a sua alegação de que, porque a prova não foi gravada, «não pode […] remeter para as voltas das cassetes». ). O recurso não merece provimento nesta parte. 2.2.3 DO ERRO NO JULGAMENTO DA MATÉRIA DE DIREITO A Recorrente imputa à sentença o erro no julgamento da matéria de direito relativamente à legalidade das duas correcções que a AT efectuou na matéria tributável por ela declarada para efeitos de IRC do ano de 1995 e que ela pôs em causa na presente impugnação judicial. 2.2.3.1 Quanto à inadmissibilidade da dedução do montante total dos encargos suportados com o almoço de Natal, sustenta a Recorrente que, antes do mais, importa determinar se os referidos encargos se referem ou não a despesas sumptuosas, por considerar que apenas na afirmativa se deve concluir no sentido de não ser possível a dedução da totalidade dos respectivos encargos. Depois, considera que a despesa com o referido almoço não pode ter-se como sumptuosa, mas antes que este «foi para estreitar as relações no seio da empresa e foi um almoço absolutamente normal e sem qualquer carácter de sumptuosidade», sendo que deve «ser acrescido aos factos dados como provados o alegado em 5º e 6º da P.I.» (cf., respectivamente, as alegações de recurso com os n.ºs 57 e 58, bem como as conclusões m) a q)). Ou seja, depois de na petição inicial ter procurado afastar a qualificação dos custos em causa como despesas de representação argumentando com natureza e finalidade das mesmas – «não foram efectuadas com clientes, fornecedores os quaisquer outras entidades […] mas sim e antes com elementos do sector produtivo e com vista» ao «estreitar de relações sociais entre todos, com o objectivo último de todos levar, em harmonia, à prossecução cabal dos fins da empresa» (cf. arts. 6.º e 7.º da petição inicial) –, agora, em sede de recurso, a par desse argumento, alinha um outro, qual seja o de que a despesa em causa não assume carácter sumptuoso, antes se referindo a «um almoço absolutamente normal e sem qualquer carácter de sumptuosidade». Salvo o devido respeito, a Recorrente alheia-se da fundamentação aduzida na sentença recorrida e insiste pela inexistência de fundamento legal para a desconsideração como custo fiscal de 20% da despesa com um almoço de Natal oferecido aos trabalhadores da empresa. A esse propósito, a sentença deixou dito o seguinte: «A questão sobre a qual o Tribunal é chamado a pronunciar-se é a seguinte: o artigo 41.º, n.ºs 1, alínea g), e 3, do C.I.R.C., na redacção então em vigor, abrangia ou não as despesas com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos a funcionários da empresa? A Impugnante defende que não por entender – se bem interpreto – que só podem ser consideradas “despesas de representação” as suportadas com entidades alheias à empresa. Valendo-se para o efeito de um parecer da “APECA” apresentado aquando do exercício do direito de audição e que se encontra inserto a fls. 55 dos autos. Parece, no entanto que a Impugnante interpretou erradamente o parecer em causa: a “APECA” não distingue entre pessoas da empresa e pessoas alheias à empresa, mas entre pessoas que integram o “Corpo Social” e pessoas alheias ao “Corpo Social”, sendo que é neste grupo que se enquadram os trabalhadores da empresa. De qualquer modo, entende este Tribunal que todos os factores hermenêuticos infirmam a interpretação que a Impugnante faz do normativo em causa. Desde logo o elemento gramatical: a lei inclui nestes encargos os que forem suportados com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos (1) “a clientes” (2) “a fornecedores” (3) “ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades”. Do normativo decorre, assim, que o legislador quis ser particularmente abrangente ao incluir nos beneficiários destas despesas “quaisquer pessoas ou entidades”. Por isso a letra da lei não exclui os trabalhadores da empresa. De salientar, também, que as despesas de representação são, como a própria expressão indica, destinadas a representar a empresa onde esta não se encontra presente, isto é, fora do circuito económico onde naturalmente se manifesta. Em abstracto, nada impede que os beneficiários directos destas despesas sejam os próprios trabalhadores, no seu todo ou em parte, na medida em que estejam presentes fora desse circuito económico onde essas acções de representação são realizadas. Do ponto de vista conceptual, não é o beneficiário que identifica as despesas de representação, mas o facto de se tratar de despesas com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos (eventos que o legislador associou tradicionalmente a funções de representatividade). Depois, o elemento teleológico: as razões na não dedutibilidade destes custos prendem-se com a necessidade de limitar externamente o encaixe fiscal de despesas ditas sumptuosas. Entendeu o legislador que seria eticamente incorrecto que o contribuinte pudesse, acima de determinado limite, deduzir custos com eventos desta natureza. Ora, esta razão de ser não se modifica pelo facto de os beneficiários serem fornecedores, clientes os trabalhadores da empresa. Do ponto de vista ético, não se vê que devam ser tratadas de modo diferente, por exemplo, viagens turísticas ou festas de Natal e de fim de ano oferecidas a trabalhadores ou a fornecedores (ou a ambos). Aliás, o argumento que a Impugnante apresenta (o «estreitar das relações sociais») pode ser usado em ambas as situações. Também se pode defender que a realização de tais despesas com fornecedores cimentam as relações sociais e os laços afectivos com a empresa e, por esta via, promovem um bom relacionamento comercial. E nem por isso o legislador deixou de limitar a dedutibilidade destes custos. Finalmente, o elemento sistemático: se apelarmos a lugares paralelos no nosso ordenamento jurídico fiscal, podemos verificar que também o artigo 21.º, n.º 1, alíneas d) e e), do C.I.V.A. rejeita a dedutibilidade de custos respeitantes a alojamento, alimentação, bebidas e tabaco e «despesas de recepção» bem como «despesas de divertimento e de luxo». E que o legislador do C.I.V.A. tinha em vista, em primeiro lugar, os gastos desta natureza com pessoal da empresa resulta da necessidade que teve de especificar que também se incluíam as relativas «ao acolhimento de pessoas estranhas à empresa» e de excluir, nas despesas com alojamento, refeições, alimentação e bebidas do pessoal da empresas, as que fossem efectuadas em «cantinas, economatos, dormitórios e similares». Importa salientar, para terminar esta questão, que a limitação, ou rejeição da dedutibilidade de custos mencionados no artigo 41.º do C.I.R.C. tem carácter liminar, «sem cuidar de investigar da eventual inserção no interesse societário da despesa», opção «assumida para evitar uma sindicância casuística sobre a natureza societária ou pessoal da despesa». Daí que nem a fiscalização tivesse que indagar do interesse mais ou menos indirecto que a despesa pudesse assumir na cultura social da empresa (juízo sempre subjectivo e de difícil sindicância) nem a Impugnante pudesse invocar esse interesse para sustentar a dedutibilidade integral da despesa». Ou seja, a sentença deu resposta cabal, e que subscrevemos sem reservas, à questão que se lhe impunha apreciar. «Nesta parte, a questão sobre a qual o Tribunal é chamado a pronunciar-se é a seguinte: o artigo 41.º, n.º 4, do C.I.R.C., na redacção então em vigor, abrangia ou não os encargos com juros incluídos na renda de locação financeira de viaturas ligeiras de passageiros? Sustenta a Recorrente que a expressão “designadamente” utilizada na redacção do n.º 4 do art. 41.º do CIRC, «não pode ter o alcance que a sentença lhe dá» – de que a enumeração que se lhe segue é meramente exemplificativa –, sob pena de violação dos princípios da legalidade tributária e da tipicidade, consagrados no art. 103.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa e no art. 8.º da LGT, na medida em que se permitiria à AT «a concretização por via administrativa de preceitos sujeitos à reserva de lei, a que se encontram submetidas as normas de incidência tributária». Por outro lado, sustenta que «as normas fiscais não se podem dissociar do tratamento contabilístico que é dado às matérias que aquelas pretendem alcançar», daí pretendendo retirando o argumento de que «no presente caso o tratamento contabilístico ainda que em conta diversa é objecto de tratamento diferenciado no POC, não podendo aqui colher os motivos de ratio legis que a sentença considera». * * * 3. DECISÃOFace ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte acordam, em conferência, negar provimento ao recurso. Custas pela Recorrente, fixando-se a taxa de justiça em seis UC. Porto, 4 de Fevereiro de 2010 (Francisco Rothes) (Fonseca Carvalho) (Moisés Rodrigues) |