Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:0602/09.0BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/02/2023
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Carlos de Castro Fernandes
Descritores:RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO
PRESCRIÇÃO
IMPUGNAÇÃO
Sumário:I – Como se refere o atual art.º 627.º nº 1 do CPC o âmbito do recurso é delimitado pela própria decisão recorrida, limitando assim, objeto do mesmo. Deste modo, em princípio e salvo as invalidades que sejam de conhecimento oficioso, não se pode em sede recursiva apreciar a validade dos atos impugnados em si mesma considerada.
II - A impugnação judicial não tem como objeto o conhecimento da prescrição da obrigação tributária, porque se trata de um processo que visa apreciar a legalidade ou ilegalidade do ato de liquidação e a prescrição não contende com a legalidade da liquidação, mas apenas com a exigibilidade da obrigação tributária por ela criada, razão pela qual em sede de impugnação judicial a prescrição não pode ser conhecida senão incidentalmente e como pressuposto da utilidade ou não do prosseguimento da lide, sendo esta questão do conhecimento oficioso.
III – Não se dispondo dos elementos necessários para aferir da prescrição da dívida decorrente da liquidação em causa e não existindo a obrigação da realização de quaisquer diligências processuais para aferir de tal questão na presente forma processual de impugnação, o Tribunal pode dela legitimamente não conhecer.
Recorrente:A..., S.A
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação - Reclamação graciosa. - 1ª espécie - Recursos jurisdicionais [Del. 2186/2015]
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:I – A "A..., S.A." (Recorrente), veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, pela qual se julgou improcedente a impugnação que deduziu contra a decisão de indeferimento do recurso hierárquico interposto contra a decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa, esta última dirigida contra a liquidação de IRC do exercício do ano de 2000 e correspetiva liquidação de juros.

No presente recurso, a Apelante formula as seguintes conclusões:
I. Omitindo a prova apresentada no exercício do direito de audição, a Fazenda Pública cometeu preterição de uma formalidade legal, cuja consequência é falta de fundamentação do acto tributário de liquidação adicional de IRC relativo a 2000;
II. A liquidação adicional de IRC instaurada sob o n.º ...60, datada de 04/08/2004, foi anulada, por força do deferimento parcial da Reclamação Graciosa apresentada em 10 de Março de 2005, cuja decisão foi notificada em 11 de Setembro de 2007.
III. Assim, a notificação da correcção a que aludia o art.º 83º, n.º 10, do CIRC (na redacção então vigente) teria de ser notificada à aqui recorrente até 9 de Novembro de 2007, a fim evitar a caducidade do direito à liquidação por parte da Fazenda Pública.
IV. A notificação efectuada em 22 de Janeiro de 2009 (Doc. 4 junto com a p. i.) é a liquidação adicional a que alude o n.º 10, do art.º 83º, do CIRC (à data em vigor).
V. À luz dos princípios estruturantes da nossa Constituição, o acto de liquidação impugnado é um acto totalmente novo e distinto da liquidação anterior (finais de 2004) que foi anulado por força do deferimento parcial da Reclamação Graciosa.
VI. Assim, essa notificação (efectuada em 22 de Janeiro de 2009) ocorreu muito para além do prazo de caducidade, atento ao prazo e termos do art.º 45º e art.º 46º, ambos da Lei Geral Tributária, ex vi art.º 93º do CIRC, determinando a inexigibilidade do imposto em causa por extinção do direito.
VII. O processo de reclamação graciosa esteve parado por mais de um ano por facto não imputável à ora recorrente.
VIII. Estando a correr o prazo prescricional, foi publicada a Lei 53-A/2006 que procedeu a alterações significativas ao regime da prescrição tributária.
IX. Revogando designadamente o nº 2 do art. 49º da LGT que dispunha “...a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação ...”.
X. A antedita revogação do n.º 2 do art. 49º da LGT significa em termos práticos, que a paragem do processo por efeito da interposição de reclamação ou impugnação, como é o caso, não faz cessar o efeito interruptivo da prescrição tributária.
XI. A Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2007.
XII. Ora, nessa data já tinha decorrido o prazo de um ano de paragem dos autos de reclamação graciosa que se iniciara em 10 de Março de 2005.
XIII. Por força da disposição transitória consignada no art. 91.º, da Lei n.º 53-A/2006, não se aplicam aos autos as alterações ao regime da prescrição, instituído pela citada Lei.
XIV. A prescrição da obrigação tributária constitui questão de natureza substantiva, de conhecimento oficioso em qualquer [de]grau de jurisdição, até ao trânsito em julgado da decisão final sobre o objecto em causa, conforme se lê no sumário do Acórdão proferido pelo STA, 2ª Secção, no processo 0702/07 de 3 de Outubro de 2007.
Termina a Recorrente pedindo que seja revogada a sentença recorrida.
A Recorrida (RFP) apesar de regularmente notificada para o efeito, não apresentou contra-alegações.
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Os autos foram com vista ao digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, tendo este emitido parecer no sentido da improcedência do presente recurso (cf. fls. 208 e segs. dos autos – paginação do SITAF).
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Com a concordância dos MMs. Juízes Desembargadores Adjuntos, dispensam-se os vistos nos termos do art.º 657.º, n. º 4, do Código de Processo Civil ex vi art.º 281.º do CPPT, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento.
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II - Matéria de facto indicada em 1.ª instância:
1.º – A Impugnante é uma sociedade que se encontra colectada pela actividade de “construção de edifícios” – CAE 45211 desde 1988/05/01.
2.º – Encontra-se enquadrada no regime normal mensal em IVA, e em IRC é tributada pelo regime geral.
3.º – A liquidação objecto da presente Impugnação Judicial resultou de uma acção inspectiva, cujo relatório se encontra junto ao processo de Reclamação Graciosa com o n.º ...72, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
4.º – O processo de Reclamação Graciosa foi objecto de deferimento parcial – cfr. teor de fls. 160 a 165 do processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos.
5.º – A ora Impugnante deduziu reclamação da liquidação alegando que na sequência da acção de fiscalização a que foi sujeita, tinham resultado correcções ao lucro tributável quer por aplicação de métodos indirectos quer por correcções meramente aritméticas, e que, relativamente às primeiras correcções tinha apresentado reclamação nos termos do art.91º da LGT.
Acrescentou que, pelo facto de não ser possível fragmentar o acto tributário em parte sujeita a métodos indirectos e parte sujeita às normas gerais de tributação, as correcções de natureza meramente aritmética deveriam ter sido, igualmente, apreciadas em sede de comissão de revisão, mas que, ainda assim, apresentava argumentação no sentido da anulação da correcção de 688 924,43 euros, valor que se encontrava registado na conta 2734 – Proveitos diferidos, e da liquidação de juros de mora.
6.º – Para efeitos de apreciação da reclamação a administração fiscal solicitou à Inspecção Tributária informação relativamente às correcções reclamadas – cfr. doc. de fls. 129 a 139 do processo de Reclamação Graciosa apenso aos presentes autos.
7.º – Com base no que foi elaborado o Projecto de Despacho – cfr. teor de fls.140 a 143 do processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos.
8.º – A ora Impugnante exerceu o seu direito de audição, alegando ter havido omissão de pronúncia no Projecto de Despacho e reiterando a sua observância do principio da especialização dos exercícios relativamente aos valores objecto de correcção – cfr.doc. de fls. 150 a 157 do processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos.
9.º – O referido projecto foi convertido em definitivo.
10.º – Do indeferimento da Reclamação Graciosa foi interposto em 09.10.2007 Recurso Hierárquico, nos termos do n.º2 do art. 6º do CPPT.
11.ºA liquidação relativa ao IRC ora impugnada foi notificada à Impugnante antes do ano de 2005 – cfr.doc. de fls. 67 a 68 A, do processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos.
12.º – Na sequência das alterações ao lucro tributável por aplicação de métodos indirectos, nos termos do art. 87º da LGT e correcções meramente aritméticas, a ora Impugnante reagiu nos termos do art. 91º da LGT, contra o excesso de quantificação do valor tributável.
11º [13]º – A Comissão de Revisão, apenas apreciou as correcções com natureza de presunção, ficando as correcções de natureza meramente aritmética no valor de 690 988,49 euros por apreciar.
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Ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 662.º do CPC ex vi art.º 281.º do CPPT, adita-se à matéria de facto o seguinte:
3.º A – Foi emitida em nome da Impugnante (Recorrente) uma liquidação adicional relativa ao IRC do exercício do ano de 2000, com data limite de pagamento a 15.12.2004, exibindo o montante a pagar de € 251.968,93, a que acresciam juros – cf. docs. a fls. 67 a 68A do PA (relativo ao processo de reclamação).
9.º A – Da decisão referida no ponto «9.º» consta que foi dada razão à Impugnante no que concerne à data inicial para computo dos juros de mora – cf. docs. a fls. 140 a 166 do PA (relativo ao processo de reclamação).
12.º A – Após o deferimento parcial a que se faz alusão no ponto 4.º, foi emitida «Demonstração de Reacerto Financeiro de liquidação de IRC», recebida pela Impugnante (Recorrente) a 22.01.2009, da qual se retira:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
- cf. doc. a fls. 17 dos autos – paginação do processo em suporte físico.
14.º A – Para cobrança da dívida de imposto resultante da demonstração referida no ponto 12.º A, foi instaurado em 30.09.2005 o processo de execução fiscal com o n.º ...50 – cf. doc. a fls. 72 do PA (relativo ao processo de reclamação).
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A matéria factual supra aditada por esta instância, está assente em prova documental de que as partes são conhecedoras e que se encontra junta aos autos, não tendo sido a mesma objeto de qualquer forma de impugnação.
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III – Questões a decidir.

No presente recurso, cabe analisar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, no que tange às questões concernentes com alegada falta de preterição de formalidade no âmbito do processo de reclamação graciosa, erro de julgamento no que diz respeito à caducidade do direito de liquidação e, ainda, a questão da prescrição da dívida tributária aqui em apreço.
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IV – Da apreciação do presente recurso.
Constitui objeto do presente recurso a sentença proferida nestes autos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel proferida nestes autos, pela qual se negou provimento à impugnação intentada pela ora Recorrente, intentada contra a decisão de indeferimento do recurso hierárquico interposto contra a decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa dirigida contra a liquidação de IRC do exercício do ano de 2000.
A liquidação de IRC supra referida assenta no relatório final proveniente de uma ação inspetiva promovida pelos serviços da AT, no qual se concluiu pela correção da matéria coletável no exercício de 2000, por aplicação de correções técnicas e com recurso a métodos indiretos.
Nessa sequência foi emitida liquidação de IRC supra referida, tendo a ora Recorrente apresentado reclamação graciosa, na qual veio a obter parcial provimento, tendo os serviços da AT emitido a notificação a que se faz alusão no n.º 12.ºA da matéria de facto aditada por esta instância. Entretanto, a ora Apelante havia apresentado recurso hierárquico direcionado contra a decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa que havia apresentado.
Vejamos, então.
IV.1 – Da questão da preterição de formalidade essencial no âmbito da reclamação graciosa.
No presente recurso, a Recorrente começa por invocar que os serviços da AT desconsideraram a prova que apresentou em sede do exercício do direito de audição no âmbito da reclamação graciosa a que se faz alusão nos presentes autos (cf. conclusão «I» da presente apelação).
Porém, sendo os recursos o meio processual para se insurgir contra o julgado, não irá este Tribunal deixar de ter unicamente presente que aqui só se conhecerá das questões suscitadas pela Recorrente contra o julgado em primeira instância. Dito isto, tal significa que fica de fora do objeto do presente recurso a questão que a Recorrente ora coloca e que, diga-se, não é sequer de conhecimento oficioso.
Com efeito, só as decisões judiciais podem ser impugnadas pela via do recurso, nos termos do n.º 1 do art.º 627.º do CPC, não podendo estes ter distinto objeto como seja a da invocada invalidade da decisão proferida no âmbito da reclamação graciosa apresentada, assim como do respetivo procedimento que a sustenta.
Por isso, quanto a esta questão terá que improceder o presente recurso.
IV.2 – Do erro de julgamento quanto à caducidade do direito de liquidar.
A Recorrente invoca que a decisão jurisdicional recorrida errou quando considerou que não se havia operado a caducidade do direito de agir (conforme consta das conclusões «II» a «VI» do presente recurso, que devem ser lidas em complemento com a motivação da presente apelação).
Assim, na sentença recorrida considerou-se que a liquidação de IRC havia sido notificada à Impugnante (Recorrente) antes do período previsto nos ns.º 1 e 4 do art.º 45.º da LGT.
Ora, a Recorrente invoca aqui que a liquidação adicional de IRC aqui em causa veio a ser objeto de anulação, sendo que a correção efetuada ao abrigo do então n.º 10 do art.º 83.º do CIRC é que constituiria a liquidação que se deve ter como relevante para efeitos da aplicação do prazo de caducidade à luz do disposto nos artigos 45.º e 46.º da LGT. Por isso, reafirma aqui a Recorrente a tese que invocou em sede de petição inicial, embora aqui a contrapondo contra o que foi decidido neste aspeto na sentença recorrida.
Posto isto, a primeira questão que se levanta é a de saber, afinal, se estamos perante duas liquidações independentes de IRC, em que a primeira foi revogada pela segunda, ou se, antes, estamos perante uma única liquidação que foi objeto de mera retificação quanto ao valor da matéria coletável.
Como resulta da matéria factual dos presentes autos foi efetuada uma liquidação adicional de IRC do exercício do ano de 2000, que terá sido notificada, segundo a sentença recorrida, algures antes de 31 de dezembro de 2004.
Contudo, há que ter presente que a ora Recorrente no seu articulado inicial apenas invocou a questão da caducidade do direito de liquidar no que tange à «Demonstração de Reacerto Financeiro de liquidação de IRC» a que se faz referência no n.º «12.º A» da factualidade aditada nesta instância (cf. artigos 40 a 58.º da p.i.). Assim, não foi invocada a caducidade do direito de liquidar no que concerne à liquidação adicional referida no n.º «3 A» dos factos adicionados por esta instância.
Posto isto, há que esclarecer que a supra denominada «Demonstração de Reacerto Financeiro de liquidação de IRC», não consubstancia um ato revogatório como pretende a Recorrente, mas antes traduz-se numa reforma que visou sanar um vício de violação de lei que afetava o ato reformado (na parte referente a juros de mora devidos pelo não pagamento atempado da liquidação de IRC referida no ponto «3.º A»). Efetivamente, como reconhece a Recorrente e resulta dos autos, o apontado reacerto ou recálculo resultou do deferimento parcial da pretensão do sujeito passivo no âmbito da reclamação graciosa que apresentou (mais concretamente quanto à questão de não serem legalmente devidos juros de mora nos termos em que foram calculados – cf. ponto «9.º A»). No entanto, tal reajustamento, com vimos, assume-se como uma mera reforma feita à luz do disposto no artigo 79.º da LGT e ao abrigo do que ia então disposto no art.º 173.º do CPA, este aplicável por força da remissão contida na alínea b) do art.º 2.º da LGT. Desde modo, dispunha então o n.º 4 do art.º 137.º do CPA que desde que não tivesse havido alteração do regime legal, os efeitos da reforma retroagiriam à data dos atos a que a mesma respeitava. Ora foi o que sucedeu no caso presente.
Por isso, terá que improceder o presente recurso no que diz respeito à apontada questão da caducidade do direito de liquidar.
IV.3 – Da questão da prescrição.
Nas conclusões «VII» a «XIV», a Apelante veio invocar que a dívida relativa ao tributo aqui em questão, estava prescrita.
A propósito da questão do conhecimento da prescrição em sede de impugnação judicial, com os fundamentos a que aderimos, relatou-se no acórdão do STA de 08.01.2020, proferido no proc. n.º 01/99.0BUPRT (in www.dgsi.pt) que:
“[…] 2.2.2.1 Como este Supremo Tribunal tem vindo a afirmar desde há muito, uniforme e reiteradamente, a prescrição da obrigação tributária não é fundamento de impugnação judicial, motivo porque nela não deve ser conhecida oficiosamente, sem prejuízo de aí poder ser conhecida a título incidental, enquanto pressuposto da utilidade da lide, este sim de conhecimento oficioso.
Sobre a questão, ficou dito no acórdão de 7 de Fevereiro de 2007, proferido no processo com o n.º 980/06 (Disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/cedd724eaaed289c80257295003cb2f6.): «Como é sabido, trata-se na impugnação judicial de um contencioso de anulação, que não de plena jurisdição – cfr. Alberto Xavier, Aspectos Fundamentais do Contencioso Tributário, p. 43 e ss. –, sendo o seu objecto o acto tributário, através de “qualquer ilegalidade” ou “vício”, em vista da sua “anulação total ou parcial”.
Assim, se o pedido impugnatório procede, o tribunal anula o acto, pela existência de qualquer ilegalidade.
Pelo que tem este tribunal entendido que a prescrição da obrigação tributária – “da dívida exequenda”, na expressão legal –, embora de conhecimento oficioso, não é fundamento de impugnação judicial mas de oposição à execução fiscal.
Na verdade, não pode confundir-se a validade do acto tributário com a sua eficácia.
[…]
O decurso do prazo de prescrição extingue o direito do Estado à “cobrança” do imposto e não tendo pois a ver com a sua validade ou existência do acto tributário e, em consequência, com a sua legalidade, não é fundamento de impugnação judicial mas de oposição à execução».
Prossegue o mesmo acórdão, ponderando a prescrição, não como fundamento de impugnação judicial, «mas apenas como sustentáculo da inutilidade da lide e consequente extinção da instância», com a afirmação de que, então, esse conhecimento se fará «plenamente dentro da legalidade» e porque, verificada a prescrição da obrigação tributária, «a lide impugnatória não tem qualquer utilidade». E explica porquê:
«Na verdade, a sua procedência não teria quaisquer consequências, uma vez que já não poderia, mercê da predita prescrição da dívida, ser instaurada execução fiscal, que se instaurada, logo soçobraria, mesmo sem oposição, dado o carácter oficioso do conhecimento da mesma.
Ou seja: a questão não radica na inclusão da prescrição da obrigação tributária em termos de ilegalidade da liquidação mas, em termos processuais, da utilidade da lide impugnatória que, assim, não pode ter qualquer reflexo na relação substancial respectiva, pelo que a sua continuação seria pura inutilidade».
É este entendimento que tem vindo a ser seguido na jurisprudência de que o citado acórdão é um exemplo entre muitos (Vide, entre outros, os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 2 de Dezembro de 2015, proferido no processo com o n.º 1364/14, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/235ab3098a7e831580257f1e005090e9;
- de 9 de Novembro de 2016, proferido no processo com o n.º 1118/15, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/0b84374a73dde81f8025806b0040bbbb;
- de 4 de Julho de 2018, proferido no processo com o n.º 1433/17, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/f1fc96dd1f2c333c802582cd004aac60.): a impugnação judicial não tem como objecto o conhecimento da prescrição da obrigação tributária, porque se trata de um processo que visa apreciar a legalidade ou ilegalidade do acto de liquidação (cfr. arts. 99.º e 24.º do CPPT) e a prescrição não contende com a legalidade da liquidação, mas apenas com a exigibilidade da obrigação tributária por ela criada, motivo por que em sede de impugnação judicial a prescrição não pode ser conhecida senão incidentalmente e como pressuposto da utilidade ou não do prosseguimento da lide, questão esta do conhecimento oficioso (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2.ª edição, 2010, págs. 23 a 25. ).[…]”.
Acresce que, também de forma uniforme e reiterada tem o colendo STA vindo a entender que o conhecimento da prescrição em sede impugnatória, em qualquer instância, só é devida enquanto pressuposto de conhecimento oficioso que é o da (in)utilidade da lide, quando dos autos resultem elementos factuais que permitam ao Tribunal tomar posição quanto à questão da prescrição, sem a necessidade de realização de mais iniciativas processuais (cf. entre outros, os acórdãos de 20.04.2020, proferido no processo n.º 0571/06.8BEPRT-0662/18 e de 04.07.2018, proferido no processo/recurso n.º 01433/17).
Ora, da prova aditada aos presentes autos por esta instância consta que existe um processo de execução fiscal que foi movido para a cobrança do crédito emergente da liquidação de IRC a que aqui se faz alusão (cf. a matéria de facto aditada nesta instância sob o n.º 14). Todavia, não se sabe quando se deu a citação da ora Recorrente para a referida execução, sendo que esta teria potenciais efeitos interruptivos (cf., entre outros, o n.º 1 do art.º 49.º da LGT). Igualmente não há notícia nos autos de outros atos processuais eventualmente promovidos no processo de execução fiscal que pudessem ser ou suspensivos ou interruptivos do decurso do prazo prescricional.
Assim sendo, não dispondo esta instância dos elementos necessários para aferir da invocada prescrição da dívida decorrente da liquidação aqui referida e suscitada nas supra citadas conclusões do presente recurso e não estando esta instância obrigada à realização de quaisquer diligências processuais para aferir de tal questão na presente forma processual, decide-se dela não conhecer, sem prejuízo de a questão referida poder vir a ser eventualmente suscitada noutros figurinos processuais.
Por isso, improcede o recurso também nesta parte.
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Assim, nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC, apresenta-se o seguinte sumário:
I – Como se refere o atual art.º 627.º nº 1 do CPC o âmbito do recurso é delimitado pela própria decisão recorrida, limitando assim, objeto do mesmo. Deste modo, em princípio e salvo as invalidades que sejam de conhecimento oficioso, não se pode em sede recursiva apreciar a validade dos atos impugnados em si mesma considerada.
II - A impugnação judicial não tem como objeto o conhecimento da prescrição da obrigação tributária, porque se trata de um processo que visa apreciar a legalidade ou ilegalidade do ato de liquidação e a prescrição não contende com a legalidade da liquidação, mas apenas com a exigibilidade da obrigação tributária por ela criada, razão pela qual em sede de impugnação judicial a prescrição não pode ser conhecida senão incidentalmente e como pressuposto da utilidade ou não do prosseguimento da lide, sendo esta questão do conhecimento oficioso.
III – Não se dispondo dos elementos necessários para aferir da prescrição da dívida decorrente da liquidação em causa e não existindo a obrigação da realização de quaisquer diligências processuais para aferir de tal questão na presente forma processual de impugnação, o Tribunal pode dela legitimamente não conhecer.
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V – Dispositivo
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso apresentado pela Recorrente, mantendo-se a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente (por vencida).

Porto, 02 de fevereiro de 2023
Carlos A. M. de Castro Fernandes
Tiago A. Lopes de Miranda
Cristina da Nova