Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01803/13 |
Data do Acordão: | 02/05/2014 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | FRANCISCO ROTHES |
Descritores: | ERRO NA FORMA DE PROCESSO IMPUGNAÇÃO JUDICIAL OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL |
Sumário: | I - O erro na forma do processo, nulidade decorrente do uso de um meio processual inadequado à pretensão de tutela jurídica formulada em juízo, afere-se pelo pedido. II - Não obstante, este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a adoptar uma posição de grande flexibilidade na interpretação do pedido quando, em face das concretas causas de pedir invocadas, se possa intuir que a verdadeira pretensão de tutela jurídica é diversa da formulada. III - As questões da responsabilidade do revertido – quer se pretenda discutir a legalidade do despacho de reversão, ainda que por falta de fundamentação, violação do direito de audiência prévia e preterição de formalidade essencial, quer a ilegitimidade pelo não exercício da gerência de facto – e da prescrição da obrigação tributária correspondente à dívida exequenda devem ser discutidas no processo de oposição e não podem erigir-se em fundamentos do processo de impugnação judicial regulado nos arts. 99.º e segs. do CPPT. |
Nº Convencional: | JSTA00068581 |
Nº do Documento: | SA22014020501803 |
Data de Entrada: | 11/25/2013 |
Recorrente: | A............ |
Recorrido 1: | FAZENDA PÚBLICA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Meio Processual: | REC JURISDICIONAL |
Objecto: | SENT TAF LEIRIA |
Decisão: | NEGA PROVIMENTO |
Área Temática 1: | DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL |
Legislação Nacional: | CPPTRIB99 ART97 ART99 ART125 ART204 N1 B D I ART276 ART98 N4 ART203 N1 A CPC013 ART615 |
Jurisprudência Nacional: | AC STA PROC0705/11 DE 2011/10/19; AC STA PROC0332/10 DE 2010/05/26; AC STA PROC0814/09 DE 2010/01/20 |
Referência a Doutrina: | ALBERTO DOS REIS - CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO VOLII 3ED PAG288/289. JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLII PAG107-108 PAG274-276 PAG91-92. |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Recurso jurisdicional do despacho de indeferimento liminar proferido no processo de impugnação judicial com o n.º 47/13.7BELRA 1. RELATÓRIO 1.1 O Serviço de Finanças de Santarém fez prosseguir, mediante reversão, contra A………… (adiante Impugnante, Executado por reversão ou Recorrente), que considerou responsável subsidiário pelas dívidas exequendas, provenientes de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e de juros compensatórios do ano de 2003 uma execução fiscal instaurada contra uma sociedade. 1.2 Na sequência da citação que lhe foi efectuada, o Executada por reversão apresentou uma petição, endereçada ao Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, na qual, dizendo vir deduzir «IMPUGNAÇÃO JUDICIAL», concluiu formulando o pedido de que «deve a presente Impugnação Judicial ser recebida, julgada procedente por provada e, em consequência, julgar-se extinta a execução fiscal». 1.3 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, conhecendo do erro na forma do processo, julgou verificada esta nulidade e inviável o aproveitamento dos autos para prosseguirem sob a forma processual adequada – que considerou ser a oposição à execução fiscal –, por na data em que foi apresentada a petição inicial estar já ultrapassado o prazo para o efeito, motivo por que indeferiu liminarmente a impugnação judicial. 1.4 O Executado por reversão não se conformou com a sentença e dela interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, que foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. 1.5 O Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: B) O recorrente alegou diversas questões, nomeadamente a prescrição, que o Tribunal deveria obrigatoriamente que [sic] conhecer e pronunciar-se sobre as mesmas; C) Não decorre do artigo 99.º do CPPT nem do artigo 97.º do mesmo diploma que a impugnação judicial apenas tenha de versar sobre liquidação de tributos; D) Refere-se incompetência no mencionado artigo 99.º, que é uma excepção e nada tem a ver com liquidação de tributos, logo seguindo a mesma interpretação, a ausência ou vício da fundamentação legalmente exigida e a preterição de outras formalidades legais não podem apenas estar relacionadas com a liquidação dos tributos. E) A excepção da prescrição teria que ser sempre apreciada. F) Bem como, as ausências ou vícios da fundamentação legalmente exigida e a preterição de outras formalidades legais. G) Nomeadamente, a questão prévia referida na impugnação judicial, da falta de fundamentação do despacho de reversão e a inobservância do disposto no n.º 7 do artigo 60.º da LGT, dado que os elementos novos suscitados na audição do contribuinte não foram tidos em conta na referida fundamentação, que deveria ter sido apreciada tendo em conta o Princípio Pro Actione do Tribunal. H) Quanto à prescrição, consideramos que o Tribunal deveria ter conhecido oficiosamente da prescrição (Cfr. Artigo 175.º CPPT), sendo que aquela pode ser conhecida em qualquer momento do processo; I) As dívidas tributárias prescrevem no prazo de 8 anos contados, nos impostos de obrigação única (IVA), a partir da data em que o facto tributário ocorreu; J) No caso em apreço, poder-se-á constatar que os montantes de imposto (IVA) relativos aos períodos de tributação indicados, já prescreveram; K) Os efeitos da interrupção da prescrição em relação ao devedor principal não produzem efeitos relativamente ao responsável subsidiário, uma vez que o ora recorrente, só foi notificado após o 5.º ano posterior ao da liquidação, pelo que, a divida encontra-se prescrita na esfera do revertido, ora recorrente - Cfr. n.º 3 do artigo 48.º da LGT L) O Tribunal ao não apreciar e não pronunciar-se sobre diversas questões em sede de sentença, violou, salvo melhor opinião, o artigo 125.º, n.º 1 e artigo 124.º do CPPT, constituindo tal circunstância uma causa de nulidade da sentença; M) Questões relacionadas com a falta de requisitos essenciais do título executivo e diversos vícios da citação; N) Por todas estas razões, podia e devia o Tribunal recorrido ter decidido pela procedência da nulidade da citação e/ou prescrição do imposto, invocada pelo recorrente na Impugnação, com todas as legais consequências. Nestes termos e nos melhores de Direito, com o douto suprimento de V/ Ex.as, Sr. Juízes Conselheiros do Supremo Tribunal Administrativo, deve o presente Recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta sentença recorrida, substituindo-a por douto acórdão que julgue procedente a impugnação, declarando-se a prescrição do imposto e/ou Nulidade da citação e/ou nulidade da sentença». 1.6 Não foram apresentadas contra alegações. 1.7 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso com a seguinte fundamentação (Por razões de ordem prática, as notas de rodapé serão transcritas no próprio texto, entre parêntesis rectos. ). «Além do mais o recorrente sustenta a nulidade da decisão recorrida por alegada omissão de pronúncia. 1.7 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos. 1.8 As questões que cumpre apreciar e decidir são as de saber se a decisão recorrida 1) enferma de nulidade por omissão de pronúncia, por não ter conhecido das questões que foram suscitadas na petição inicial, designadamente a da prescrição [cfr. conclusões B) a E), H), L) e N)] – que o Recorrente entende estar verificada [cfr. conclusões I) a K)] –, a das «ausências ou vícios da fundamentação legalmente exigida e a preterição de outras formalidades legais», designadamente a decorrente da não consideração dos elementos novos suscitados em sede de audição prévia à reversão [cfr. conclusões F) e G)] e de «questões relacionadas com a falta de requisitos essenciais do título executivo e diversos vícios da citação» [cfr. conclusão M)]; 2) fez errado julgamento quando indeferiu liminarmente a petição inicial por considerar verificado o erro na forma do processo [cfr. conclusões C) e D)] o que, como procuraremos demonstrar, passa por indagar · se o pedido formulado é adequado à forma processual escolhida; · se a prescrição da dívida exequenda, a ilegalidade do acto de reversão e os vícios assacados à execução fiscal podem ser fundamento no processo de impugnação judicial. * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO Para proferir o despacho, a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria entendeu deixar consignado o circunstancialismo processual a considerar, nos seguintes termos: B) Por despacho de reversão, datado de 17 de Agosto de 2012, a dívida exequenda no processo de execução fiscal referido em A), reverteu contra o Impugnante – cf. despacho de reversão a fls. 16 e 17. C) O Impugnante foi citado da reversão referida na alínea antecedente, em 20 de Setembro de 2012 – facto confessado nos artigos 1.º e 37.º da PI. D) Do despacho de reversão a que se referem as duas alíneas precedentes consta, além do mais, o seguinte: “Pelo presente fica citado(a) (...) para, no prazo de 30 (trinta) dias a contar desta citação, pagar a quantia exequenda (...). E) A petição inicial que deu origem à presente impugnação judicial foi apresentada no dia 30 de Novembro de 2012, junto do Serviço de Finanças de Santarém – cf. carimbo aposto na PI, a fls. 5». 2.2 DE DIREITO 2.1.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, perante uma petição apresentada como impugnação judicial, considerou verificada a nulidade por erro na forma do processo, uma vez que o pedido formulado pelo Executado por reversão – de extinção da execução fiscal – não se adequa à forma processual escolhida, assim como os fundamentos invocados não são próprios da impugnação judicial, mas da oposição à execução fiscal, uma vez que o impetrante não questiona a legalidade das liquidações que estiveram na origem das dívidas exequendas, mas a reversão da execução contra ele e outras ilegalidades do processo executivo. Mais ponderou a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria a possibilidade de convolar a petição inicial para o meio processual adequado, que entendeu ser a oposição à execução fiscal, mas concluiu pela negativa, uma vez que na data em que a petição inicial foi apresentada estava já esgotado o prazo para deduzir oposição à execução fiscal. Por tudo isso, decidiu-se pelo indeferimento liminar da petição inicial. 2.2.2 DA NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA O Recorrente sustenta que na decisão recorrida não foram apreciadas as diversas questões que foram por ele suscitadas na petição inicial o que, a seu ver, inquina aquela decisão de nulidade por omissão de pronúncia (cfr. art. 125.º do CPPT e art. 615.º do novo Código de Processo Civil (Aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 36/2013, de 12 de Agosto.)). 2.2.3 DO ERRO NA FORMA DO PROCESSO A sentença decidiu no sentido da verificação do erro na forma do processo que, como é sabido, se afere pela adequação do meio processual utilizado ao fim por ele visado: se o pedido formulado pelo autor não se ajusta à finalidade abstractamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre o erro na forma do processo (Cfr. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, volume II, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, págs. 288/289. No mesmo sentido, RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, volume I, 3.ª edição, 1999, pág. 262, e ANTUNES VARELA, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 100.º, pág. 378.). 2.2.4 CONCLUSÕES Por tudo o que ficou dito, o recurso não merece provimento e, preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões: I - O erro na forma do processo, nulidade decorrente do uso de um meio processual inadequado à pretensão de tutela jurídica formulada em juízo, afere-se pelo pedido. II - Não obstante, este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a adoptar uma posição de grande flexibilidade na interpretação do pedido quando, em face das concretas causas de pedir invocadas, se possa intuir que a verdadeira pretensão de tutela jurídica é diversa da formulada. III - As questões da responsabilidade do revertido – quer se pretenda discutir a legalidade do despacho de reversão, ainda que por falta de fundamentação, violação do direito de audiência prévia e preterição de formalidade essencial, quer a ilegitimidade pelo não exercício da gerência de facto – e da prescrição da obrigação tributária correspondente à dívida exequenda devem ser discutidas no processo de oposição e não podem erigir-se em fundamentos do processo de impugnação judicial regulado nos arts. 99.º e segs. do CPPT. * * * 3. DECISÃO Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso. Custas pelo Recorrente. * Lisboa, 5 de Fevereiro de 2014. – Francisco Rothes (relator) – Casimiro Gonçalves – Pedro Delgado. |