Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01271/13
Data do Acordão:03/04/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
NULIDADE DE CITAÇÃO
CONVOLAÇÃO
Sumário:I - A nulidade da citação não constitui fundamento de oposição à execução fiscal, antes devendo ser arguida em primeira linha perante o órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial de eventual decisão desfavorável.
II - Invocada a nulidade da citação em processo de oposição à execução fiscal, há que ponderar se é possível a convolação da petição inicial em requerimento dirigido à execução fiscal (cf. art. 97.º, n.º 3, da LGT e art. 98.º, n.º 4, do CPPT), possibilidade a que não obsta o facto de o pedido formulado ter sido o de anulação do despacho de reversão, se o mesmo puder ser interpretado como de declaração de nulidade da citação, sendo que este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a adoptar uma posição de grande flexibilidade na interpretação do pedido quando, em face da concreta causa de pedir invocada, se possa intuir que a verdadeira pretensão de tutela jurídica é diversa da formulada.
III - Se a tal nada mais obstar, assumindo a referida interpretação do pedido e, assim, concluindo pela verificação do erro na forma do processo, deverá a petição inicial ser convolada em requerimento dirigido à execução fiscal.
Nº Convencional:JSTA000P18668
Nº do Documento:SA22015030401271
Data de Entrada:07/17/2013
Recorrente:A..., S.A.
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de oposição à execução fiscal com o n.º 836/10.4BELLE

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade denominada “A………….., S.A.” (adiante Executada por reversão, Oponente ou Recorrente) recorre para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé julgou improcedente a oposição por ela deduzida à execução fiscal que, instaurada contra uma outra sociedade para cobrança coerciva de dívida proveniente de Imposto Municipal sobre Imóveis e Imposto de Selo, reverteu contra ela porque a Administração tributária (AT) a considerou responsável subsidiária pela dívida exequenda.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgem aqui em tipo normal.):

«I. A sentença ora recorrida resulta de erro de julgamento, por violação do disposto nos artigos 97.º, n.º 3 da LGT e 98.º, n.º 4 CPPT, ao não ter convolado a petição inicial de oposição à execução em requerimento de arguição de nulidade. Senão vejamos.

II. A Recorrente na sua petição inicial de oposição à execução invocou que a sua citação padecia de nulidade por inobservância das respectivas formalidades legais e solicitou ao Tribunal que declarasse a mesma (cfr. artigo 20.º da petição inicial da oposição à execução).

III. O que significa que a oposição à execução deduzida pela Recorrente tinha como pedido a declaração de nulidade da citação.

IV. De acordo com o disposto no artigo 2.º, n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2.º, alínea d) da Lei Geral Tributaria (LGT) e artigo 2.º, alínea e) do CPPT “a todo o direito, excepto quando a lei determine o contrário, corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente, bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da acção”.

V. A jurisprudência dos Tribunais Superiores tem entendido de forma unânime que “No regime do Código de Procedimento e de Processo Tributário a nulidade da citação para a execução fiscal não serve de fundamento à respectiva oposição, devendo, antes, ser arguida no processo executivo, que prosseguirá depois de suprida a nulidade” (Neste sentido veja-se entre outros o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 28/02/2007, proferido no âmbito do processo n.º 0803/04).

VI. No caso em preço, tendo a Recorrente utilizado a oposição à execução para invocar a nulidade da sua citação, é por demais evidente que utilizou um meio processual impróprio, verificando-se, assim, a existência de erro na forma de processo.

VII. O n.º 4 do artigo 98.º do CPPT dispõe que “Em caso de erro na forma de processo, este será convolado na forma do processo adequada, nos termos da lei”.

VIII. Por seu turno o n.º 3 do artigo 97.º da LGT estabelece que “Ordenar-se-á a correcção do processo quando o meio usado não for o adequado segundo a lei”.

IX. O Supremo Tribunal Administrativo, no seu Acórdão de 25/03/2009, proferido no âmbito do processo n.º 074/09, refere que “A convolação deverá ser admitida sempre que não seja manifesta a improcedência ou intempestividade do meio processual para que se convola, para além da idoneidade da petição para o efeito”.

X. No caso em apreço, encontravam-se verificados todos os pressupostos de que dependia a convolação da oposição à execução em requerimento de arguição de nulidade.

XI. Quanto ao prazo de arguição da nulidade em causa, dispõe a primeira parte do artigo 198.º, n.º 2, CPC, que “o prazo para a arguição da nulidade é o que tiver sido indicado para a contestação”, devendo, pois, entender-se tal prazo como o de trinta dias, indicado para a dedução da oposição.

XII. Ora tendo a Recorrente apresentado tempestivamente a sua oposição à execução, naturalmente que não poderá deixar de se considerar tempestivo, também, o requerimento de arguição da nulidade da citação.

XIII. Acresce que, a petição de oposição à execução não colide com qualquer exigência formal ou substancial do aludido requerimento.

XIV. Face ao exposto, dúvidas não subsistem que deveria, nos termos do disposto nos artigos 97.º, n.º 3 da LGT e 98.º, n.º 4 do CPPT, ter sido determinada a convolação da oposição à execução em requerimento de arguição nulidade, pelo que deverá a sentença ora recorrida ser anulada por violação das disposições legais supra citadas.

Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência anulada a douta sentença recorrida, com as demais consequências legais».

1.3 A Fazenda Pública não contra alegou.

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que deve ser concedido provimento ao recurso, revogada a sentença e proferida decisão a «mandar convolar o requerimento apresentado em requerimento de arguição de nulidade citação efectuada», com a seguinte fundamentação:

«[…] É certo que a oposição à execução fiscal apresentada a 22/11/10 só pode ter por fundamento facto ou factos susceptíveis de serem integrados em algumas das previsões do n.º 1 do art. 204 do C.P.P.T., em que não se integrava o invocado pela recorrente.
No entanto, duma leitura atenta da petição de oposição verifica-se que a oponente pretendeu pôr em causa o despacho de reversão e bem assim arguir a nulidade da citação efectuada, com vista a poder impugnar as liquidações efectuadas.
Ora, justifica-se a convolação em arguição de nulidade, nos termos dos arts. 97.º n.º 3 da L.G.T. e 98.º n.º 4 do C.P.P.T., a qual só não seria de determinar caso existisse obstáculo ao prosseguimento da petição ainda nessa forma processual tida por adequada para o pretendido efeito, designadamente, em termos de tempestividade.
A convolação impõe-se em nome do direito à tutela judicial efectiva, em face da fundamentação acrescida que se constata constar de decisão proferida em reclamação graciosa (fls. 70 e 71).
É certo que à data da apresentação da oposição ainda não se tinha formado a presunção de indeferimento prevista no art. 106.º do C.P.P.T.
No entanto, o acto expresso que foi proferido refere-se a reclamação graciosa que tinha sido apresentada a 14/6/2010 pela devedora originária B……………, S.A., e que foi praticado com data de 21/10/2010 (fls. 70 e 71), encontrava-se à data da apresentação da oposição pendente de notificação à dita reclamante, constando do mesmo acrescida fundamentação.
Parece não ser de obstar à arguição de nulidade pela ora recorrente, sendo de lhe reconhecer o direito de acesso aos tribunais para obter tutela de direitos ou interesses que se configuram ainda como legítimos».

1.5 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.

1.6 A única questão que cumpre apreciar e decidir, como procuraremos demonstrar, é a de saber se a sentença errou quando não ordenou a convolação da petição inicial de oposição à execução fiscal em requerimento de arguição da nulidade da citação dirigido ao órgão da execução fiscal.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

A sentença recorrida efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«Dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, julgo provada, a seguinte factualidade:

A) Em 2010-03-01, foi instaurado neste Serviço de Finanças o processo de execução fiscal n.º 1074201001006649, pela quantia exequenda de € 17.546,36, em nome de B………….. S.A., referente a IMT liquidado relativamente ao imóvel U-080703-1725 (cfr. fls. 50 a 54 dos autos);

B) Em 2010-04-05, foi eleito processo principal tendo-lhe sido apensado o, processo executivo n.º 1074201001006657, da quantia exequenda de € 877,70, referente a Imposto Selo (cfr. fls. 55 a 58 dos autos);

C) Em 2010-09-30, foi prestada informação no processo executivo, onde consta, nomeadamente que “a executada cessou a actividade em sede IVA em 2009-08-05 e que não tem bens penhoráveis para assegurar os créditos da Fazenda Nacional e que proprietário do imóvel é a firma A…………..” (cfr. fls. 59 a 60 dos autos);

D) Em 2010-09-30, foi emitido o despacho para audição (reversão) da Oponente (cfr. fls. 61 e 62 dos autos);

E) Em 2010-10-04, foi a Oponente citada para exercer o direito de audição prévia (Notificação Audição-Prévia Reversão) (cfr. fls. 63 a 65 dos autos);

F) Em 2010-10-20 apresentou o direito de audição escrito, que foi objecto de despacho da T.A.T. ………. onde consta “(...) tendo o requerimento dado entrada no dia 20 do corrente, considera-se o pedido extemporâneo”. (cfr. fls. 66 dos autos);

G) Em 2010-10-21 foi preferido despacho de reversão contra a Oponente, tendo sido citada do mesmo (cfr. fls. 48);

H) Em 2010-11-22, deu entrada neste Tribunal a presente Oposição (cfr. fls. 2 dos autos);

I) A executada, B………………, S.A., apresentou reclamação graciosa contra a liquidação do IMT e IS (proc. n.º 1074201004000854), que obteve despacho de indeferimento, ainda não notificado à Oponente ao tempo da apresentação da contestação (cfr. fls. 48, 70 e 71 dos autos)».


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2.2 DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

Numa execução fiscal que, instaurada contra uma sociedade para cobrança de dívida de IMI e de IS, reverteu contra a ora Recorrente, que foi considerada pelo órgão da execução fiscal responsável subsidiária pela dívida exequenda, veio a revertida deduzir oposição, pedindo ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que anulasse o despacho de reversão.
A Juíza desse Tribunal considerou que, apesar do pedido formulado, «todos os fundamentos que usa são relativos à citação do despacho em si, ou seja, não apresenta vícios próprios do despacho de reversão», ou seja, considerou não só que a Oponente não invocou quaisquer vícios próprios do despacho de reversão, mas que a única causa de pedir aduzida é a nulidade da citação por inobservância das formalidades legais, sendo que esta deveria ter sido arguida mediante requerimento dirigido ao órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial do eventual indeferimento; assim, pese embora o meio processual de que a Executada por reversão se socorreu ser adequado ao pedido que formulou – anulação do despacho de reversão – a oposição improcede porque não foram invocados fundamentos de oposição à execução fiscal.
A Oponente não se conformou com a sentença e dela interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo. Se bem interpretamos as alegações de recurso e respectivas conclusões, não discorda do entendimento da Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, de que não foram alegados fundamentos que possam suportar o pedido de anulação do despacho de reversão e de que os fundamentos invocados se referem à nulidade da citação, a qual deverá ser arguida mediante requerimento dirigido ao órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial de eventual decisão desfavorável (Trata-se, aliás, de jurisprudência hoje incontroversa desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, como o revelam, entre outros, os seguintes acórdãos do Pleno:
- de 28 de Fevereiro de 2007, proferido no processo n.º 803/04, publicado no Apêndice ao Diário da República de 5 de Dezembro de 2007 (http://dre.pt/pdfgratisac/2007/32410.pdf), págs. 36 a 44, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/29187a21aba2ec588025729d00551d75?OpenDocument;
- de 24 de Fevereiro de 2010, proferido no processo n.º 923/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 3 de Março de 2011 (http://dre.pt/pdfgratisac/2010/32410.pdf), págs. 58 a 62, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/6603a143389bd257802576dd00504304?OpenDocument.
Na doutrina, JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, III volume, anotações 13 e 14 ao art. 165.º, págs. 144 a 147 e anotação 8 b) ao art. 190.º, págs. 369/371.); a Recorrente discorda da sentença apenas por esta não ter ordenado «a convolação da oposição à execução em requerimento de arguição nulidade», no pressuposto de «é por demais evidente que utilizou um meio processual impróprio, verificando-se, assim, a existência de erro na forma do processo».
Daí termos enunciado a questão a apreciar e decidir como sendo a de saber se a sentença errou quando não determinou que se convolasse a petição inicial de oposição à execução fiscal em requerimento de arguição da nulidade da citação dirigido ao órgão da execução fiscal, o que, como procuraremos demonstrar, passa por saber se podemos ou não considerar verificado o erro na forma do processo, eventualidade que a Juíza do Tribunal a quo afastou expressamente, enquanto a Recorrente sustenta que se verifica essa nulidade.

2.2.2 DA INTERPRETAÇÃO DO PEDIDO FORMULADO, DO ERRO NA FORMA DO PROCESSO E DOS FUNDAMENTOS DE OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL

A Oponente indicou como efeito jurídico pretendido com a oposição a «anulação do despacho de reversão proferido no âmbito do processo de execução fiscal n.º 1074201001006649».
Atento exclusivamente o teor literal do pedido formulado, a forma processual escolhida pela Executada por reversão é, inequivocamente, a ajustada, como salientou a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que, correctamente, afirmou que o erro na forma do processo se deve aferir pelo pedido formulado na acção (O erro na forma do processo é uma nulidade que consiste na utilização de meio processual impróprio. A sua verificação afere-se pela adequação do meio processual utilizado ao fim por ele visado: se o pedido, ou seja, a concreta pretensão de tutela solicitada pelo autor ao tribunal não se ajusta à finalidade abstractamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre o erro na forma do processo. Cfr. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, volume II, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, págs. 288/289. No mesmo sentido, RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, volume I, 3.ª edição, 1999, pág. 262, e ANTUNES VARELA, Revista de Legislação e Jurisprudência,ano 100.º, pág. 378.).
Há, no entanto, a nosso ver e na senda do entendimento que tem vindo a ser adoptado por este Supremo Tribunal Administrativo (Vide, entre muitos outros, os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 26 de Setembro de 2012, proferido no processo n.º 678/12, publicado no Apêndice ao Diário da República de 17 de Outubro de 2013 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2012/32230.pdf), págs. 2773 a 2775, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/03fe08548fccacfb80257a8c004a7afb?OpenDocument;
- de 5 de Fevereiro de 2014, proferido no processo n.º 1803/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 15 de Setembro de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2014/32220.pdf), págs. 490 a 495, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/dfd44cc00100a3f480257c7b005c72ed?OpenDocument.), que ir um pouco mais longe na interpretação do pedido, não olvidando que nesta tarefa não podem ignorar-se as concretas causas de pedir invocadas, na medida em que permitam descortinar a verdadeira pretensão de tutela jurídica, ainda que com recurso à figura do pedido implícito (Dando conta desta posição e subscrevendo-a, JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., II volume, últimos três parágrafo da anotação 10 d) ao art. 98.º, pág. 92. ).
Na verdade, nossa lei processual procura desde sempre evitar, sempre que possível, que a parte perca o pleito por motivos puramente formais – que a forma prevaleça sobre o fundo (Cf. MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 387, a propósito da flexibilidade que deve temperar o princípio da legalidade das formas processuais.) – e essa preocupação com o princípio da tutela jurisdicional efectiva dos direitos e interesses das partes tem vindo, cada vez mais, a encontrar expressão na lei adjectiva, que procura afastar o rigor formalista na interpretação das peças processuais (Cfr. art. 7.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que dispõe: «Para efectivação do direito de acesso à justiça, as normas processuais devem ser interpretadas no sentido de promover a emissão de pronúncias sobre o mérito das pretensões formuladas».).
Assim, podemos concluir que o pedido formulado – de anulação do despacho de reversão – pode interpretar-se como contendo um pedido implícito no sentido da anulação da citação, pois é com base na ilegalidade deste acto que se considera haver motivo para anular aquele. Nesta interpretação flexível do pedido formulado, deixa de verificar-se o impedimento com base no qual a Juíza do Tribunal a quo considerou inviável a convolação.
Concluímos, pois, que o recurso merece provimento, que a sentença deverá ser revogada e que, na ausência de outros impedimentos, é de ordenar, em substituição, que se convole a petição de oposição em requerimento de arguição de nulidade, com a consequente incorporação do mesmo no processo de execução fiscal, nos termos dos arts. 97.º, n.º 3, da LGT, e 98.º, n.º 4, do CPPT.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - A nulidade da citação não constitui fundamento de oposição à execução fiscal, antes devendo ser arguida em primeira linha perante o órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial de eventual decisão desfavorável.
II - Invocada a nulidade da citação em processo de oposição à execução fiscal, há que ponderar se é possível a convolação da petição inicial em requerimento dirigido à execução fiscal (cf. art. 97.º, n.º 3, da LGT e art. 98.º, n.º 4, do CPPT), possibilidade a que não obsta o facto de o pedido formulado ter sido o de anulação do despacho de reversão, se o mesmo puder ser interpretado como de declaração de nulidade da citação, sendo que este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a adoptar uma posição de grande flexibilidade na interpretação do pedido quando, em face da concreta causa de pedir invocada, se possa intuir que a verdadeira pretensão de tutela jurídica é diversa da formulada.
III - Se a tal nada mais obstar, assumindo a referida interpretação do pedido e, assim, concluindo pela verificação do erro na forma do processo, deverá a petição inicial ser convolada em requerimento dirigido à execução fiscal.


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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, conceder provimento ao recurso, revogar a sentença e, em substituição, anular todo o processado ulterior à petição inicial, que se aproveita, determinando-se a convolação dessa petição em requerimento dirigido à execução fiscal.

Sem custas.

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Lisboa, 4 de Março de 2015. - Francisco Rothes (relator) - Aragão Seia - Ascensão Lopes.