Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:35/22.2BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:03/12/2025
Relator:LUÍSA SOARES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
FALTA DE INDICAÇÃO DO VALOR DA CAUSA
Sumário:I - A indicação do valor da causa na petição inicial é uma exigência legal que se impõe também ao oponente, nos termos do disposto no 552.º, n.º 1, alínea f), do CPC, aplicável subsidiariamente, ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT.
II- Em regra, o valor da oposição será o da dívida exequenda, sendo que o valor da causa corresponde à quantia exequenda em relação à qual se pretende a extinção da execução fiscal.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I – RELATÓRIO


Vem o MINISTÉRIO PÚBLICO interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que declarou extinta a instância, por falta de indicação do valor da causa, na oposição apresentada por J… aos processos de execução fiscal n.ºs 2224202101169050, 2224202101169599, 2224202101169637, 2224202101171046, 222420210117364, 2224202101171500, 2224202101215850 e 2224202001111990 e apensos, contra si instaurados pelo Serviço de Finanças de Seixal 1, para cobrança coerciva de dívidas relativas a taxas de portagem e coimas.

O Recorrente nas suas alegações, formulou conclusões nos seguinte termos:

“A. A douta sentença recorrida considerou que não tendo o oponente procedido à indicação do valor da causa, face ao estatuído no mencionado artigo 305.º, n.º 3, do CPC, tal omissão tem como consequência a extinção da instância.

B. Em sede de contestação, a AT havia suscitado a questão da falta de indicação do valor da causa, defendendo que o oponente deveria ser convidado a informar qual o valor que atribui à causa, com as legais cominações, caso não o faça.

C. Por douto despacho de fls. 407 foi determinada a notificação do oponente para, no prazo de 10 dias, indicar o valor do processo, com a advertência que, nos termos do disposto no artigo 305.º, n.º 3, do CPC, a falta de indicação do valor determinaria a extinção da instância.

D. Pelo que foi decidido que, não tendo o oponente procedido à indicação do valor da causa, face ao estatuído no mencionado artigo 305.º, n.º 3, do CPC (cfr. também artigos 278.º, alínea e) e 576.º, n.º 2, do mesmo diploma legal), tal omissão tem como consequência a extinção da instância.

E. O Mmo Juiz não terá atentado que a oposição configura uma verdadeira contestação à execução fiscal instaurada pela Fazenda Pública, na qual o oponente vem atacar os pressupostos da cobrança coerciva da dívida exequenda, tendo a sua procedência como consequência a extinção da execução fiscal.

F. Não se afigurando juridicamente acertado, aplicando o plasmado no n.º 3 do artigo 305.º do CPC, considerar que se trata da falta de indicação do valor da causa, em sede de petição inicial.

G. Não se questiona que a indicação do valor da causa na petição inicial é uma exigência legal que se impõe também ao oponente, nos termos do disposto no 552.º, n.º 1, alínea f), do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT.

H. Todavia, ao contrário do decidido, afigura-se que se deve entender que o oponente, ao não indicar o valor da causa, aceita o valor dado à causa como sendo correspondente ao valor da execução fiscal, ou seja, € 11.223,10.

I. A tal não obstando a circunstância de o oponente nada ter dito na sequência da notificação que lhe foi efectuada para indicar o valor da causa, sob a cominação da extinção da instância, nos termos do n.º 3 do artigo 305.º do CPC.

J. Tal foi o entendimento expresso no douto acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10.05.2017, proferido no processo n.º 0423/17, disponível em www.dgsi.pt, cuja doutrina não pode deixar de ser sustentada e seguida.

K. Por outro lado, como se observa no citado aresto, “[…] não podemos olvidar que os rigores formalistas na interpretação das peças processuais estão hoje vedados pelos princípios da lei processual e bem assim pelo princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva”.

L. A douta sentença recorrida violou, por errada interpretação, o disposto nos artigos 296.º, n.º 1 e 305.º, n.º 3 do CPC e o artigo 206.º do CPPT, pelo que deve ser revogada e, em consequência, ser determinado o prosseguimento do processo de oposição instaurado.

Dando provimento ao presente recurso Vossas Excelências farão a costumada
JUSTIÇA!”.
* *
A AT-Autoridade Tributária e Aduaneira e o Oponente não apresentaram contra-alegações.
* *
O Exmº. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

* *
Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II – DO OBJECTO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cfr. artigo 635°, n.° 4 e artigo 639°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações do Recorrente, a questão controvertida consiste em aferir se a sentença enferma de erro de julgamento ao ter decidido a extinção da instância por falta de indicação do valor da causa.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Pese embora o Tribunal recorrido não tenha autonomizado a matéria de facto, no entanto, da decisão recorrida consta factualidade relevante para a decisão, fixando-se nos termos do art. 662º, nº 1 do CPC o seguinte facto:

1) Em 12/12/2022 foi proferida sentença pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada com o seguinte teor:
J…, contribuinte fiscal n.º 1…, melhor identificado nos autos, veio deduzir oposição aos processos de execução fiscal n.ºs 2224202101169050, 2224202101169599, 2224202101169637, 2224202101171046, 222420210117364, 2224202101171500, 2224202101215850 e 2224202001111990 e apensos, contra si instaurados pelo Serviço de Finanças de Seixal 1, para cobrança coerciva de dívidas relativas a taxas de portagem e coimas.
Em sede de contestação, a Fazenda Pública suscitou a falta de indicação do valor
da causa, concluindo que Oponente deveria ser convidado a informar qual o valor que atribui à causa, com as legais cominações, caso não o faça.
Tendo-se verificado que o Oponente, efetivamente, na sua petição inicial, não procedeu à indicação do valor que atribui à causa, mesmo após ter sido notificado da contestação, pelo despacho de fls. 407 (dos autos na numeração do SITAF, tal como nas posteriores referências sem menção de origem), foi determinada a notificação do Oponente para, no prazo de 10 (dez) dias, indicar o valor do processo, advertindo-o que, nos termos do disposto no artigo 305.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (CPC), a falta de indicação do valor determinaria a extinção da instância.
Tendo o Oponente sido notificado do referido despacho, por ofício datado de 13.10.2022 (cfr. fls. 408), o mesmo não procedeu no prazo fixado, e até à presente
data, à indicação do valor da causa.
*
Nos termos do artigo 305.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º, alínea e), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), “a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”.
A indicação do valor do processo, embora não venha indicada no artigo 206.º do CPPT como requisito da petição de oposição, é imposta, como requisito da petição inicial, pelo artigo 552.º, n.º 1, alínea f), do CPC, aplicável subsidiariamente, por força do disposto no artigo 2.º, alínea e), daquele primeiro Código.
A indicação do valor nos processos de oposição releva, não só para efeito de custas, como para efeitos de determinar a exigência ou não de constituição de advogado (cfr. artigo 6.º, n.º 1, do CPPT, artigo 11.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e artigo 40.º, n.º 1, alínea a), do CPC), para além de ser decisivo para efeitos de determinar a recorribilidade das decisões dos tribunais tributários, em função da sua alçada.
Sendo necessária a indicação do valor na petição, ela deve ser feita por uma declaração explícita nesse sentido, como decorre do próprio texto daquela alínea f) do n.º 1 do artigo 552.º do CPC em que se refere que o autor deve “declarar o valor da causa” (cfr., neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, 6.ª edição, volume III, p. 541).
Como se conclui no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 24.06.2008, processo n.º 02425/08:
“A exigência de indicação do valor, sob cominação de efeito desfavorável, é, claramente, um ónus imposto à parte. (…)
Muito mais no actual sistema de autoliquidação de taxa de justiça inicial, em que
incumbe à secretaria aferir do seu acerto, para o que serve e se compreende, uma
inequívoca indicação”.
Não havendo na petição de oposição a declaração do valor que o Oponente lhe atribui, a petição deve ser recusada, nos termos do artigo 558.º, alínea e), e do referido artigo 552.º, n.º 1, alínea f), do CPC (cfr., neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, 6.ª edição, volume II, p. 211).
Não se desconhece já ter sido entendido que, embora a declaração do valor do processo deva ser explícita, pode admitir-se haver declaração implícita desse valor, importando é que se perceba do teor da petição inicial qual o valor que o oponente pretende atribuir à causa. No entanto, mesmo seguindo tal entendimento, in casu, não se pode considerar ter sido cumprida a exigência de indicação do valor do processo, dado que do teor da petição inicial não se consegue retirar qualquer declaração, ainda que implícita, sobre qual o valor que o Oponente atribui à presente causa.
No caso dos autos, não ocorreu a recusa da petição inicial.
Porém, determina o artigo 305.º, n.º 3, do CPC, aplicável ao abrigo a alínea e) do
artigo 2.º do CPPT, que “[q]uando a petição inicial não contenha a indicação do valor e, apesar disso, haja sido recebida, deve o autor ser convidado, logo que a falta seja notada e sob a cominação de a instância se extinguir, a declarar o valor”. Assim, logo que a falta seja notada, deverá o autor (aqui oponente) ser convidado a declarar o valor, sob a referida cominação [no sentido de que, se a falta de indicação do valor só for notada após o recebimento da petição, deverá fazer-se aplicação do preceituado no atual artigo 305.º, n.ºs 3 e 4, do CPC/2013, anterior artigo 314.º, n.ºs 3 e 4, do CPC/1961, ao abrigo a alínea e) do artigo 2.º do CPPT, veja-se Jorge Lopes de Sousa, ob. cit. pág. 211].
Nestes termos, foi ordenado nos presentes autos a notificação do Oponente para, em 10 (dez) dias, vir aos autos declarar o valor da causa, sob a cominação de a
instância se extinguir, tendo o mesmo, como supra já se mencionou, sido notificado eletronicamente desse despacho, por ofício datado de 13.10.2022.
Ora, devendo considerar-se o Oponente validamente notificado em 17.10.2022 (ou seja, no primeiro dia útil posterior ao terceiro dia posterior ao do envio da notificação – artigo 248.º, n.º 1, do CPC) para indicar o valor que atribui à presente causa, decorrido o prazo concedido para o efeito, e até à presente data, o Oponente não procedeu à indicação do valor da causa, nem sequer da forma de o determinar.
Pelo exposto, não tendo o Oponente procedido à indicação do valor da causa, face ao estatuído no mencionado artigo 305.º, n.º 3, do CPC (cfr. também artigos 278.º, alínea e) e 576.º, n.º 2, do mesmo diploma legal), tal omissão tem como consequência a extinção da instância.
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Face ao decidido, cabe ao Oponente a responsabilidade pelas custas do processo artigo 527.º, n.º 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT.
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Nos termos e com os fundamentos expostos, julga-se extinta a instância.
Custas a cargo do Oponente.
Registe e notifique.” (cfr. doc. nº 004864805 12-12-2022 10:10:04, numeração SITAF).
* *
IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Tendo sido deduzida oposição aos processos de execução fiscal n.ºs 2224202101169050, 2224202101169599, 2224202101169637, 2224202101171046, 222420210117364, 2224202101171500, 2224202101215850 e 2224202001111990 e apensos, referentes a cobrança coerciva de dívidas relativas a taxas de portagem e coimas, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada declarou extinta a instância, por falta de indicação do valor da causa nos termos do art. 305º, nº 3 do CPC, após notificação ao oponente para suprir tal falta, sem que este o tenha feito, como consta da decisão supra transcrita no ponto 1 do probatório.

Discordando do assim decidido veio o Ministério Público junto daquele Tribunal apresentar recurso jurisdicional não questionando que a indicação do valor da causa na petição inicial é uma exigência legal que se impõe também ao oponente, nos termos do disposto no 552.º, n.º 1, alínea f), do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT, mas que aquele, ao não ter indicado o valor da causa, deve entender-se que aceita o valor dado à causa, a saber, o valor da execução fiscal (€11.223,10), e a tal não obstando a circunstância de nada ter dito na sequência da notificação que lhe foi efetuada para indicar o valor da causa, sob a cominação da extinção da instância, nos termos do n.º 3 do artigo 305.º do CPC.

Em defesa da sua posição invoca o entendimento vertido no Acórdão do STA de 10/05/2017 no processo nº 0423/17 e conclui que a sentença recorrida violou, por errada interpretação, o disposto nos artigos 296.º, n.º 1 e 305.º, n.º 3 do CPC e o artigo 206.º do CPPT, pelo que deve ser revogada e, em consequência, ser determinado o prosseguimento do processo de oposição instaurado.

Vejamos.

De acordo com o disposto no artigo 296º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º, alínea e), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), “a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”, sendo que a indicação do valor da causa releva, não só para efeito de custas, como para efeitos de determinar a exigência ou não de constituição de mandatário (cfr. artigo 6.º, n.º 1, do CPPT, artigo 11.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e artigo 40.º, n.º 1, alínea a), do CPC), sendo ainda relevante para efeitos de recorribilidade das decisões dos tribunais tributários, em função da sua alçada.

Contudo, tal como se afirma expressamente no Acórdão do STA de 03/05/2017 – proc. 0142/17 “Não pode aplicar-se a cominação do n.º 3 do artigo 305.º do CPC à petição de oposição à execução fiscal em que não foi indicado o valor da causa, já que aquela petição assume a função de contestação à pretensão executiva.”. Acrescentando ainda aquele aresto que, “A questão controvertida, que importa apreciar, consiste em saber se podia a decisão recorrida declarar extinta a instância, depois de o oponente haver sido notificado, sob esta expressa cominação, sem que tivesse vindo aos autos indicar qualquer valor para a petição.
É certo que o recorrente não indica qualquer fundamento ou justificação para não reagir a tal notificação, nem à respetiva cominação.
A questão da indicação do valor da petição em processos em que se questionam, de forma direta ou indireta, valores em execução foi já apreciada neste STA.
Escreveu-se no sumário do acórdão de 30-11-2016, Proc. 01250/16, que:
“I - Não pode aplicar-se a cominação do n.º 3 do art. 305.º do CPC se a petição em que não foi indicado o valor da causa se refere, não a uma acção, mas a uma reclamação prevista nos arts. 276.º a 278.º do CPPT, forma processual que, sem prejuízo da identificação como acção de impugnação pelo art. 49.º, n.º 1, alínea a), subalínea iii), do ETAF, se configura como incidente do processo de execução fiscal.
II - Assim, prevendo o art. 307.º, n.º 1, do CPC, que “[s]e a parte que deduzir qualquer incidente não indicar o respectivo valor, entende-se que aceita o valor dado à causa» e havendo indícios de que o reclamante aceita que o valor da causa seja o valor da execução fiscal (declaração tácita), ainda que não tenha acedido ao convite para proceder à respectiva indicação, tem de entender-se que aceita o valor da causa principal, ou seja, o valor da execução fiscal a que se refere a reclamação.”.
Em sentido semelhante foi sumariado o acórdão de 27-01-2016, Proc. 0789/15, nos seguintes termos:
“I - Sendo necessária a indicação do valor da causa na petição inicial, ela deve ser feita por uma declaração explícita nesse sentido, como decorre do artigo 552.º do CPC.
II - Tratando-se de oposição à execução fiscal, uma vez que o valor da causa corresponde exactamente à quantia exequenda em relação à qual se pretende a extinção da execução fiscal, cujo montante é conhecido e foi expressamente alegado pelo oponente na petição apresentada, a utilização da fórmula “Valor do processo: o valor da quantia exequenda” satisfaz o requisito formal exigido por lei quanto à indicação do valor da causa na petição inicial.”.
(…)
Tem optado a jurisprudência deste Tribunal por uma visão contrária a um “rigorismo formulário inadmissível”, nas palavras de Alberto do Reis, permitindo que o tribunal possa extrair esses elementos da petição ou dos elementos que a acompanham.
Entende-se, por isso, acompanhar o entendimento de que a falta de indicação do valor, na petição inicial de oposição, falta não suprida dentro do prazo fixado para o efeito, não pode conduzir à aplicação da cominação do n.º 3 do artigo 305.º do CPC se a petição em que não foi indicado o valor da causa se refere, não a uma ação, mas a uma oposição a uma execução fiscal.
Como escreve Jorge de Sousa, CPPT, Anotado 6ª edição, em anotação ao artigo 203º, a propósito da utilização dos elementos do processo de execução fiscal:
“A oposição à execução fiscal, embora com tramitação autónoma em relação ao processo executivo, funciona na dependência deste, assumindo a função de contestação à pretensão do exequente, como vem entendendo o STA.
Por isso, os elementos que constam do processo de execução fiscal poderão ser utilizados no processo de oposição e terão mesmo de sê-lo para vários fins, como a fixação dos factos materiais da causa e a apreciação da tempestividade da oposição.”.
Não se descortinam motivos que inviabilizem a utilização, por exemplo, da citação da execução que o oponente juntou, com a petição, e da qual consta o valor da execução.
O artigo 307.º, n.º 1, do CPC, ao estabelecer que “[s]e a parte que deduzir qualquer incidente não indicar o respetivo valor, entende-se que aceita o valor dado à causa» não poderá deixar de nos levar a concluir que o valor da oposição será o da execução.
Como se escreveu no primeiro dos acórdãos citados “havendo indícios de que o reclamante aceita que o valor da causa seja o valor da execução fiscal (declaração tácita), ainda que não tenha acedido ao convite para proceder à respetiva indicação, tem de entender-se que aceita o valor da causa principal, ou seja, o valor da execução fiscal a que se refere a reclamação.”.
Com efeito a oposição à execução não pode ser entendida como a petição de uma ação civil a que se aplica o artigo 305º 3 do CPC pois que assume a natureza de uma contestação à pretensão executiva assemelhando-se mais a uma contestação do que a uma petição inicial de uma ação cível.
Acompanha-se o primeiro acórdão citado quando afirma a propósito da reclamação, lido como sendo aplicável á petição de oposição, com as necessárias adaptações, que:
«Porém, assumindo a reclamação, apesar da sua natureza de acção de impugnação, a função processual de incidente do processo de execução fiscal e sendo, pelo menos, uma situação análoga a um incidente, por ser uma ocorrência estranha ao desenvolvimento normal do processo, parece poder entender-se, aplicando analogicamente o art. 316.º [hoje 307.º] do CPC, que na falta de indicação expressa ou tácita do valor, o reclamante aceita o valor que tiver sido dado à execução em que ela é deduzida. Isto sem prejuízo de o valor da reclamação, mesmo considerada sob a perspectiva de incidente, dever ser o valor real à face dos critérios de determinação do valor, pois o valor dos incidentes só é o da causa a que respeitam quando ele não tiver realmente valor diverso do da causa (art. 313.º [hoje 304.º], n.º 1, do CPC) e a parte contrária poder impugnar o valor com fundamento em que ele deve ser diverso do da causa (art. 316.º [hoje 307.º], n.º 1, do mesmo Código). […]» ….
… sempre haveria que reconhecer-se uma declaração tácita por parte da Reclamante no sentido de que o valor da causa nesta reclamação corresponde ao valor da execução fiscal ou, pelo menos, que aceita o valor dado à causa principal, isto é, o valor da execução fiscal, em que corre esta reclamação.”.
Parece, por isso, ser de acrescentar que não sendo a petição de oposição à execução “subsumível à previsão do art. 305.º, n.º 3, do CPC, também não pode funcionar a cominação aí prevista.”. (fim de citação)

Também o Acórdão do STA de 10/05/2017 – proc. nº 0423/17 invocado pelo Recorrente considerou que “I - Sendo certo que a indicação do valor da causa na petição inicial é uma exigência legal que se impõe também ao oponente, nos termos do disposto no 552.º, n.º 1, alínea f), do CPC, aplicável subsidiariamente, ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT, a mesma deve considerar-se satisfeita se, não obstante a declaração do valor não se efectuar pelo modo tradicional, for perceptível, em face do teor da petição inicial – cuja interpretação está sujeita às regras do CC, designadamente as que decorrem dos arts. 217.º e 295.º do CC –, qual o valor que o oponente pretendeu atribuir à oposição.
II - Nesse caso, não se justifica a extinção da instância ao abrigo do disposto no n.º 3 do art. 303.º do CPC, ainda que o oponente nada diga na sequência da notificação que lhe foi efectuada para indicar o valor da causa, sob aquela cominação. E considerou ainda que, naquele processo, a decisão de extinção da instância por falta de indicação do valor da causa consubstanciava uma visão estritamente formal porquanto “(…) olvida que na interpretação das peças processuais são aplicáveis, por força do disposto no art. 295.º do Código Civil («Aos actos jurídicos que não sejam negócios jurídicos são aplicáveis, na medida em que a analogia das situações o justifique, as disposições do capítulo precedente».) (CC), os princípios da interpretação das declarações negociais (comuns à interpretação das leis), valendo, por isso, aquele sentido que, segundo o disposto no art. 236.º, n.º 1, do CC («A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele».), o declaratário normal ou razoável deva retirar das declarações escritas constantes do articulado (Por outro lado, vale também aqui o princípio aplicável aos negócios formais – denominado do mínimo de correspondência verbal –, de que «não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso» (art. 238.º, n.º 1 do CC).), bem como que a declaração pode deduzir-se de factos que, com toda a probabilidade, a revelem, nos termos do disposto no art. 217.º, também do CC («1. A declaração negocial pode ser expressa ou tácita: é expressa, quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação da vontade, e tácita, quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam.
2. O carácter formal da declaração não impede que ela seja emitida tacitamente, desde que a forma tenha sido observada quanto aos factos de que a declaração se deduz».). Para além disso, não podemos olvidar que os rigores formalistas na interpretação das peças processuais estão hoje vedados pelos princípios da lei processual e bem assim pelo princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva [cfr. arts. 20.º e 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP)] ( Vide, entre outros, os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 15 de Maio de 2013, proferido no processo n.º 154/13, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/9fd626d6071eab7780257b7f0054b163;
- de 8 de Janeiro de 2014, proferido no processo n.º 32/13,disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/05f925c2f9dbfb7e80257c62005ae50a;
- de 16 de Dezembro de 2015, proferido no processo n.º 1508/14, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3ae0c6a1a8e08d4380257f32004f8db4;
- de 27 de Abril de 2016, proferido no processo n.º 431/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/1aa45cb220ac208a80257fa7003c01f9.).
Há ainda que ter presente que a nossa lei adjectiva procura desde sempre evitar, sempre que possível, que a parte perca o pleito por motivos puramente formais – que a forma prevaleça sobre o fundo (Cf. MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág. 387, a propósito da flexibilidade que deve temperar o princípio da legalidade das formas processuais.) – e essa preocupação com o princípio da tutela jurisdicional efectiva dos direitos e interesses das partes tem vindo, cada vez mais, a encontrar expressão nas diversas leis processuais, que afastam o rigor formalista na interpretação das peças processuais (Cf. art. 7.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que dispõe: «Para efectivação do direito de acesso à justiça, as normas processuais devem ser interpretadas no sentido de promover a emissão de pronúncias sobre o mérito das pretensões formuladas».).”. (sublinhado nosso)

É certo que, compulsado o teor da oposição à execução apresentada nos presentes autos, constata-se que não é mencionado o valor da causa, contudo, perante o entendimento jurisprudencial acima transcrito, “tratando-se de oposição à execução fiscal, uma vez que o valor da causa corresponde exatamente à quantia exequenda em relação à qual se pretende a extinção da execução fiscal, cujo montante é conhecido” e considerando ainda que “não podemos olvidar que os rigores formalistas na interpretação das peças processuais estão hoje vedados pelos princípios da lei processual e bem assim pelo princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva [cfr. arts. 20.º e 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP)]”, deve entender-se que, tendo o oponente mencionado tratar-se de oposição aos processos executivos que expressamente identifica, o valor da causa corresponderá ao somatório das respetivas quantias exequendas.

Em face do exposto, entendemos que a decisão recorrida não pode manter-se, devendo ser revogada a fim de a oposição prosseguir, se a tal nada mais obstar.

V. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e determinar a baixa do processo à 1ª instância para prosseguir seus termos, se a tal nada mais obstar.

Sem Custas.
Lisboa, 12 de março de 2025
Luisa Soares
Isabel Vaz Fernandes (em substituição)
Susana Barreto