Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
10835/19.5T8LRS.L1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: MARIA JOÃO VAZ TOMÉ
Descritores: CONTRATO DE COMPRA E VENDA
EMPREITADA
IMÓVEL DESTINADO A LONGA DURAÇÃO
PERÍODO DE GARANTIA
DEFEITO DA OBRA
PRAZO DE CADUCIDADE
DENÚNCIA
PARTES COMUNS
CONDOMÍNIO
ADMINISTRAÇÃO
FRAÇÃO AUTÓNOMA
CONTAGEM DE PRAZOS
URGÊNCIA
REEMBOLSO DE DESPESAS
INTERPELAÇÃO ADMONITÓRIA
Data do Acordão: 11/16/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :
I. A formulação ou designação atribuída às questões a decidir pelo Tribunal a quo não é sindicável pelo STJ, ao qual compete apenas verificar se foi ou não respeitada a delimitação do objecto do recurso operada pelo Recorrente nas suas conclusões do recurso de apelação, com vista a determinar se aquele acórdão se encontra ou não ferido de nulidade por omissão ou excesso de pronúncia (art. 615.º do CPC).

II. O STJ não tem poderes para sindicar a decisão de facto ancorada em meios de prova sujeitos à livre apreciação do julgador, apenas podendo intervir na hipótese de erro de direito na reapreciação da prova pelo TR.

III. Conforme a jurisprudência do STJ, “(…) estando em causa defeito construtivo de um imóvel destinado a longa duração, construído pelo próprio vendedor, é aplicável o regime específico constante do art. 1225º do CC, e não o regime genérico da venda de coisas defeituosas, plasmado nos arts. 914º e 916º do CC, nomeadamente no que se refere aos prazos para o exercício dos direitos ali previstos (…)”.

IV. No caso de imóveis destinados a longa duração, o prazo de garantia supletivamente estabelecido é de cinco anos a contar da entrega: período de tempo durante o qual se deve manifestar a falta de conformidade e a denúncia deve ser feita.

V. Na hipótese de o empreiteiro ser simultaneamente vendedor das frações autónomas, o STJ tem reiteradamente afirmado que o prazo de garantia dos defeitos se deve contar a partir da data da entrega e que a data da entrega coincide com a data da constituição da administração do condomínio. Por conseguinte, em relação aos defeitos das partes comuns do edifício, o prazo deverá contar-se a partir da constituição da administração do condomínio.

VI. Apenas no caso de manifesta urgência, a fim de evitar um dano maior, pode o dono de obra agir por si ou através de terceiro com vista à eliminação dos defeitos, exigindo depois ao empreiteiro/vendedor o reembolso das despesas em que incorreu. O mesmo sucede na hipótese de incumprimento definitivo do dever de reparação por parte do devedor.

VII. A reparação pelo empreiteiro/vendedor traduz-se numa nova obrigação de prestação de facto que surge ex lege como consequência de não execução da obra nas condições convencionadas.

VIII. Para efeitos do art. 808.º, n.º 1, do CC, a interpelação deve intimar para o cumprimento, fixar um termo perentório para o cumprimento e conter a admonição ou a cominação de que a obrigação se terá por definitivamente não cumprida se não se verificar o cumprimento dentro do prazo estipulado.

IX. Não pode considerar-se definitivo o incumprimento do dever de reparação por parte da R. quando não houve interpelação admonitória e a R. reconheceu ulteriormente a existência de defeitos.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça,


I - Relatório

1. A 8 de novembro de 2019, Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ..., intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma comum, contra Mortaguense – Sociedade de Construções, Lda., pedindo a (i) o pagamento do montante de € 36.267,06 para a realização de obras ou, se assim não se entender, a eliminação/reparação dos danos e anomalias a expensas suas, nos termos dos orçamentos anexados; (ii) no caso de assim não se entender, a nomeação de cada uma das empresas que apresentou orçamento como responsável pela realização das obras, procedendo a Ré ao pagamento da obra; (iii) a fixação de prazo máximo não superior a trinta dias para o início dos trabalhos de reparação e de sessenta dias para a sua conclusão; (iv) uma indemnização, a fixar equitativamente pelo Tribunal, por abuso do direito; (v) a fixação de uma sanção pecuniária compulsória no valor diário de € 250,00 por cada dia de atraso no cumprimento, pela Ré, de todo o peticionado.

2. O Autor Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ..., alegou, em síntese, o seguinte: a Ré, cujo objeto é a construção civil, foi a construtora e vendedora do prédio sito na Rua ..., n.º 13, ..., que foi constituído em propriedade horizontal a 30 de maio de 2006, tendo o condomínio sido instituído na reunião da assembleia geral de 8 de novembro de 2018; a deficiente construção do prédio originou graves anomalias internas e externas, tendo a Ré solicitado a elaboração de um relatório que identifica as patologias verificadas; na sequência do referido relatório, a mandatária do Autor interpelou a Ré, a 8 de setembro de 2019, para que esta se responsabilizasse pela reparação dos danos causados, não tendo obtido resposta; foram apresentados à Ré quatro orçamentos, que esta não aceitou; a reparação dos danos ascende ao montante de € 36.267,06, que a Ré está obrigada a pagar ao Autor; nos termos do art. 914.º do CC, a Ré é responsável pela reparação dos defeitos indicados, tendo estes sido tempestivamente denunciados pelo Autor; a Ré atuou com abuso do direito, ao ter conhecimento das anomalias e ignorar as suas obrigações, devendo ser condenada a indemnizar o Autor.

3. Citada, a Ré Mortaguense – Sociedade de Construções, Lda., contestou por exceção, invocando a ilegitimidade do Autor, e por impugnação. Termina pedindo que o Autor seja considerada parte ilegítima, com a consequente absolvição da Ré da instância ou, caso assim não se entenda, seja considerada improcedente a ação, com a sua consequente absolvição dos pedidos.

4. O Autor Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ..., replicou, pugnando pela improcedência da exceção invocada, e pela condenação da Ré como litigante de má fé.

5. Dispensou-se a realização de audiência prévia e foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a exceção invocada, fixou o objeto do litígio1 e os temas da prova2.

6. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, a 11 de maio de.2022, que julgou a ação parcialmente procedente e, consequentemente, condenou a Ré Mortaguense -Sociedade de Construções, Lda., a pagar ao Autor Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., N.º 13, ..., a quantia de € 36.267,06 (trinta e seis mil, duzentos e sessenta e sete euros e seis cêntimos), absolvendo-a do demais peticionado.

7. Não conformada com a decisão, a Ré Mortaguense – Sociedade de Construções, Lda., interpôs recurso de apelação, pugnando pela revogação da sentença e, consequentemente, pela sua consequente absolvição dos pedidos.

8. O Autor Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ..., apresentou contra-alegações, sustentando a improcedência do recurso de apelação.

9. Por acórdão de 2 de maio de 2023, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu o seguinte:

Pelo exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação, e, em consequência, altera-se a sentença recorrida, condenando a R. a reparar os defeitos que se verificam nas partes comuns do edifício (no interior dos pisos 0, 1, 2, 3, 4, 5 e de acesso à cobertura o peitoril da janela apresenta humidades e a tinta desgastada; o sistema de segurança contra incêndios nos mencionados pisos, bem como nos pisos -1, -2 e -3, é inexistente; no piso -2 existem infiltrações em tubo de queda e na respetiva parede; e no piso -3 o pavimento está degradado, e existem infiltrações em tubo de queda e na respetiva parede, e, ainda, os referidos no ponto 20.a. e 20.d.), no prazo de 30 dias, absolvendo-a do demais peticionado.

Custas pela apelante e apelado, em partes iguais.

10. Não conformado, o Autor Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ..., interpôs recurso de revista, formulando as seguintes Conclusões:

Face a tudo o acima explanado, impõem-se as seguintes conclusões:

A) Por tudo o exposto, conclui-se pela total e absoluta falta de fundamento do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 02/06/2023, de que ora recorre, por, salvo o devido respeito, não ter apreciado bem a factualidade efectivamente provada, bem como por ser contraditória em si mesma, e, acima de tudo por não fazer JUSTIÇA!, devendo, outrossim, ser mantida na íntegra a sentença proferida pelo Tribunal da 1ª Instância, por justa, correcta e exaustivamente analisada, suportada e fundamentada.

B) Deverá, ainda, ser mantida e executada a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, por justa, correcta e exaustivamente analisada, suportada e fundamentada, atentos os prejuízos, que o Condomínio Recorrido já sofreu e continua a sofrer, como ficou provado à exaustão na douta sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância.

C) As “Questões a decidir” deverão passar a ser:

a) A construção e venda pela Recorrida do prédio descrito no artigo 1.º da petição inicial.

b) Levantamento efectuado pela Reclamante dos defeitos de construção e relatório efectuado.

c) Defeitos nos termos constantes do artigo 14.º da petição inicial. d) Data da conclusão das obras de construção.

e) Data em que os condóminos começaram a habitar as fracções.

f) Falta de manutenção do sistema de molas de segurança anti fogo e inspecção dos elevadores.

g) Interpelação da Recorrida e apresentação de orçamentos.

h) Custo de reparação dos defeitos/danos e orçamentos de reparação (artigos 26 a 30 da petição inicial).

i) Comportamento da Recorrida face ao conhecimento dos defeitos.

D) As “Questões a Decidir” fixadas pelo Tribunal da Relação não dão, salvo o devido respeito, cumprimento ao disposto no artigo 635º do CPC;

E) O recurso interposto pela ora Recorrida (ali Recorrente) para o Tribunal da Relação de Lisboa extravasou o âmbito da presente acção, “agarrando-se” a aspectos laterais e irrelevantes para o cerne desta 26 acção, o que não foi tido em consideração pelo Tribunal da relação de Lisboa.

F) Não deverá ser admitida a fundamentação para o Facto nº 13 e a nova redacção que o Tribunal da Relação lhe confere, por não ter apreciado bem a factualidade efectivamente provada, e se ter baseado em depoimento menos credível e pouco fiável.

G) Quanto ao Facto não provado A), o Tribunal da Relação de Lisboa, como acima referido à exaustão, fundamento tal Facto não provado com uma justificação que consubstancia em termos “dois pesos e duas medidas”.

H) Ou seja:

“(…), não se ter provado que “Todas as anomalias referidas em 10 se devem a deficiente construção do prédio pela Ré” não demonstra o contrário, ou seja, que todas as anomalias referidas em 10 não se devem a deficiente construção do prédio pela Ré.”

I) A ora Recorrente provou a culpa da Recorrida, e esta não logrou provar que os defeitos da obra não lhe eram imputáveis.

J) Andou mal Tribunal da Relação ao invocar uma “troca semântica”, que não tem fundamento ou aplicação ao concreto.

K) O prédio está dentro da garantia da obra e isto o Tribunal da Relação esqueceu, e não teve em consideração.

L) Mais, sem conceder, se falta de manutenção houve, essa falta é da total, exclusiva e inteira responsabilidade da Recorrida que olvidou que sempre se furtou a entregar o Condomínio e enquanto tinha a responsabilidade pela manutenção das partes comuns, nunca nada fez, como bem ficou provado na sentença do Tribunal da 1ª Instância.

M) Quanto aos Factos que resultaram provados para o Tribunal da Relação, com todo o respeito, compulsada toda a prova existente nos autos, não se poderão aceitar os novos factos 25 a 28.

N) Tanto assim que as considerações de fls. 23 e 24 do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação são tecidas, por um lado, esquecendo a garantia da obra em que o prédio se encontra, e, por outro lado, com todo o respeito, tecidas “por exclusão de partes”, esquecendo as obrigações legais a que a Recorrida estava, e está, vinculada.

O) Quanto aos Factos dados como não provados, e em especial no tocante ao Facto A), a verdade é que as anomalias existem, e a obra está dentro do prazo de garantia.

P) “O prazo de “garantia” previsto no art. 1225º do CC, começa a correr a partir da entrega do imóvel ao condomínio, o que ocorreu em 8.11.2018, data em que se constituiu a assembleia de condóminos 15, tendo o A. denunciado os referidos defeitos à R. tempestivamente como concluiu o tribunal recorrido.”, como bem deixou claro o Tribunal da Relação.

Q) O que aqui interessa para o fundo desta causa é “o momento a partir do qual se considera terem sido entregues pela R. [aqui Recorrida] as partes comuns do imóvel.”, como a sentença do Ilustre Tribunal da 1ª Instância bem explicita e o Tribunal da Relação tal entendimento acompanha.

R) Essa entrega ficou assente ter sido efectuada em 08/11/2018, “sem 28 que a R. [aqui Recorrida] tivesse entregue a qualquer um dos proprietários das fracções autónomas os contratos do edifício as chaves, as telas finais ou os contactos de fornecedores de materiais e equipamentos.”

S) Não se aceita o que o Tribunal da Relação dizer a fls. 33 de 38 do seu Acórdão diz:

“Ora, é ao condomínio (aos condóminos) que incumbe o dever de conservação das partes comuns do prédio 17, recaindo sobre eles o dever de suportar as correspondentes despesas (art. 1424º, nº 1, do CC).”

T) O “Condomínio” da ora Recorrente não podia actuar, porque não estava constituído e as partes comuns não tinham sido entregues pela ora Recorrida

U) Aliás, isto mesmo consta como Facto provado nº 8 a fls. 25 de 38 do Acórdão do Tribunal da Relação de que aqui se recorre.

V) Não foram entregues pela Recorrida as chaves das partes comuns, não foram pela Recorrida os contratos do edifício, nem os projectos, nem os contactos de fornecedores de materiais, de equipamentos, etc., etc., como bem consta do Facto provado nº 8 do Acórdão do Tribunal da Relação, a fls. 25 e 26.

W) Ora, em 08/11/2018, o Condomínio ora Recorrente nada tinha da Recorrida, como o próprio Tribunal da Relação deu como provado. Não tinha elementos nenhuns”! Nada!

X) Se nada tinha, porque a Recorrida nada entregou, e estando o prédio 29 dentro da garantia da obra, como também o Tribunal da Relação entendeu, então a Recorrente tinha toda a legitimidade para demandar a Recorrida nos exactos termos em que o fez logo após a constituição do Condomínio, e depois de interpelar a Recorrida para vir fazer as reparações que se mostravam necessárias, e como o Tribunal da 1ª Instância bem considerou.

Y) A existir um “administrador provisório”, sem conceder, a administração do prédio estava nas mãos, e era (mal) feita pela ora Recorrida (cfr. fls 34 de 38 do Acórdão de que ora se recorre), pelo que era a Recorrida quem tinha a responsabilidade legal de nomear convocar a Assembleia Geral e promover a eleição do alegado Administrador Provisório.

Z) Não deverá lograr sucesso, seja a que título for, o entendimento do Tribunal da Relação quando a fls. 34 de 38 diz:

“Nada foi alegado sobre esta questão, nem a R. foi demandada nessa qualidade.

Em conformidade, não pode a R. ser responsabilizada, na presente ação pelos vícios de que padece o edifício resultantes da falta de manutenção do mesmo ou dos respetivos bens móveis, ao contrário do que entendeu o tribunal recorrido, procedendo, nessa parte a apelação.”

AA) Ora, o Tribunal da Relação, neste particular, decidiu muito além do que a ora Recorrida (mas ali Recorrente) balizou nas suas conclusões.

BB) O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu muito além do que lhe era permitido, extravasou as baias do recurso a que estava adstrito.

CC) A questão do “Administrador Provisório” nunca, em momento algum, foi suscitada nos presentes Autos, pelo que não poderia o Tribunal da Relação dela se socorrer, fosse a que título fosse, mormente nos termos em que o fez, o que se refuta com toda a veemência!

DD) Não se acompanha, igualmente, o Tribunal da Relação que, com todo o respeito, não andou bem quando diz (a fls. 34 de 38 do Acórdão Recorrido):

“Por outro lado, e relativamente aos defeitos de que a R. é responsável e suprarreferidos, afigura-se-nos que não ocorreu o incumprimento definitivo daquela, como entendeu o tribunal recorrido, a determinar a condenação da R. no montante indemnizatório, mas cumprimento defeituoso que obriga à reparação dos defeitos, nos termos em que a lei permite (art. 1221º,nº 1doCC).”

EE) O incumprimento definitivo ou existe ou não existe.

FF) Não podem existir dúvidas, como as que o Tribunal da Relação deixou no ar: “afigura-se-nos que não ocorreu o incumprimento definitivo”.

GG) Ao a Recorrida não cumprir a reparação dos defeitos no prédio da Recorrente, depois de regular e legalmente interpelada para tal desiderato, a ora Recorrida entrou em mora no cumprimento da sua obrigação.

HH) Ao nunca estar disponível para tal desiderato, ao nunca comparecer nas Assembleias Gerais, ao, deliberada e conscientemente, se colocar na posição de não receptora da carta da mandatária da Recorrente, datada dec08/09/2019, enviada por correio registado com aviso de recepção e devolvida por não ter sido reclamada, em que lhe foi dado o prazo de 15 dias para reparação dos defeitos e danos reclamados, a Recorrida entrou em incumprimento definitivo, tendo a mora sido convertida em incumprimento definitivo.

II) A Recorrida foi devidamente notificada nos, e para os efeitos, do artigo 808º, nº 1 do Código Civil.

JJ) Nestes termos, e ao se colocar na posição de não receptora da carta, a mora da Recorrida converteu-se em incumprimento definitivo.

KK)A Recorrida não levantou a carta de interpelação porque não quis.

LL) Foram cumpridos todos os ditames legais por parte da Recorrente.

MM) A Recorrente não poderia ficar eternamente à espera que a Recorrida fosse levantar as cartas.

NN) A Jurisprudência dos Tribunais Portugueses é muito clara e objectiva quanto a este particular, não colhendo a fundamentação do Tribunal da Relação:

Meio Processual: Decisão: Indicações Eventuais: Sumário: APELAÇÃO IMPROCEDENTE 2ª SECÇÃO CÍVEL

I--O direito à resolução do contrato previsto no art. 432.º do C.Civil, direito potestativo com eficácia extintiva, depende do incumprimento definitivo e não da simples mora.

II--O devedor, segundo o art. 804.º, n.º 2 do C.Civil, considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido.

III--Verifica-se incumprimento definitivo na hipótese de o credor perder o interesse na prestação, em consequência da mora, ou se a prestação não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado por aquele-cfr. 808.º, n.º 1 do C.Civil.

IV--A mora pressupõe ter sido ultrapassado um termo essencial, estabelecido no contrato, ou posteriormente, e só se transforma em incumprimento definitivo se o devedor não cumpre no prazo suplementar e peremptório que o credor razoavelmente lhe concede, através da interpelação admonitória, consagrada no citado artigo 808.º, n.º 1 do C.Civil.

OO) Houve, pois, sem margem para qualquer dúvida, uma verdadeira interpelação admonitória e a mora da Recorrida convolou-se em incumprimento definitivo com a carta de interpelação da mandatária da Recorrente, datada de 08/09/2019, enviada por correio registado com aviso de recepção, que a Recorrida não quis receber, colocando-se, ela própria, deliberada e conscientemente, ao não proceder ao levantamento de tal carta, na posição de não receptora, cuja culpa só a si pode ser imputada.

PP)Não se acompanha, assim, o entendimento do Tribunal da Relação constante de fls. 35 e 36, devendo, outrossim, ser totalmente afastada tal fundamentação por contraditória entre si e contrária aos Factos Provados e documentação constante dos Autos.

QQ) Com todo o respeito, sempre se diga a jurisprudência apresentada pelo Tribunal da Relação não tem aqui qualquer aplicação (cfr. fls. 35 in fine e 36 do Acórdão proferido).

RR) Primeiro, a Recorrida teria que eliminar o defeito da coisa – o que a Recorrida não fez;

SS) Segundo, caso não se verificasse o referida na alínea QQ) supra, deveria “substituir a coisa vendida” – questionando-se como se substituiriam as partes comuns do prédio com defeito?

TT) Terceiro, se nem QQ) nem RR) supra se pudessem verificar, a Recorrente poderia “exigir a redução do preço” – como e de que forma poderia a Recorrente “exigir a redução do preço”, e de que preço estamos a falar? Qual o “preço” das partes comuns que deveria ser reduzido?

UU) Quarto, e nada conseguindo lograr sucesso, “cabe ao comprador pedir a resolução do contrato” – como se pediria a resolução do contrato relativamente aos defeitos/danos/ anomalias que urge reparar nas partes comuns?

VV) Estamos perante um bem imóvel, e não perante um bem móvel, pelo que não colhe, por não ser passível de aplicação, a fundamentação com suporte no Acórdão citado pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

WW) Em suma, a mora da Recorrente converteu-se em incumprimento definitivo, sem margem para qualquer dívida, porquanto:

a) A intimação para o cumprimento foi feita – carta de interpelação da mandatária de 08/09/2018 (Facto provado nº 14);

b) Carta essa que fixou um terminus ad quem objecto e perentório para que a Recorrida cumprisse;

c) E caso a Recorrente não cumprisse, como foi o caso, foi expressamente dita qual a cominação pelo facto de a obrigação não ser cumprida, que mais não era, como foi, o recurso aos Tribunais para resolver tal situação.

d) Em parte alguma da legislação aplicável é dito que tem que ser “seguida a lógica” do Acórdão citado pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

XX) O Tribunal da 1ª Instância, que acompanhamos, analisou e decidiu bem, decisão esta que deverá ser retomada:

“Analisados os factos provados, verifica-se que a R. não entregou de forma voluntária as partes comuns do edifício nem tomou a iniciativa de constituir administração de condomínio. Convocada para a reunião em que tal administração foi deliberada, não compareceu. Interpelada para proceder à reparação das anomalias verificadas nas partes comuns no prazo de 15 dias nada fez, apesar de reconhecer a responsabilidade de reparação de algumas delas. Tal comportamento leva a concluir, de forma clara, que a R. não cumpriu definitivamente a obrigação que sobre si impendia, na qualidade de empreiteira e vendedora das frações autónomas, já que nenhum ato praticou que denuncie intenção de cumprir.”. (realce e sublinhado nossos)

XX) A Recorrida não entregou de forma voluntária o Condomínio, aliás nunca a presença na Assembleia Geral de Novembro de 2018 foi sequer posta em causa, ou referida nas conclusões da Recorrida nas suas alegações de recurso para o Tribunal da Relação, ou em qualquer outra peça processual, pelo que, mais uma vez, o Tribunal da Relação exorbitou e extravasou o âmbito e objecto do recurso, tendo, inclusivamente, neste particular, inovado, o que não se admite seja feito, devendo, outrossim ser retomada a douta sentença do Tribunal de 1ª Instância que se acompanha.

YY) A sentença do douto Tribunal da 1ª Instância esteve muito bem, e a ora Recorrente acompanha tal decisão, quando disse:

“Analisados os factos provados, verifica-se que a R. não entregou de forma voluntária as partes comuns do edifício nem tomou a iniciativa de constituir administração de condomínio. Convocada para a reunião em que tal administração foi deliberada, não compareceu. Interpelada para proceder à reparação das anomalias verificadas nas partes comuns no prazo de 15 dias nada fez, apesar de reconhecer a responsabilidade de reparação de algumas delas.

Tal comportamento leva a concluir, de forma clara, que a R. não cumpriu definitivamente a obrigação que sobre si impendia, na qualidade de empreiteira e vendedora das frações autónomas, já que nenhum ato praticou que denuncie intenção de cumprir. Também não logrou provar que a falta de cumprimento não lhe era imputável, pelo que tornou-se responsável pelo prejuízo que causou ao A., nos termos do artigo 798.º do Código Civil.

Tal prejuízo foi orçamentado em € 36.267,06, valor que se encontra dentro dos praticados no mercado para este tipo de intervenções, resultando inclusivamente do julgamento que parte das reparações já terão sido realizadas as expensas do A.. Tendo em consideração que os orçamentos apresentados não incluem a reparação das anomalias constantes das alíneas “c”, “g” e “m” do facto 10, as únicas cuja reparação não é da responsabilidade da R., deve esta ser condenada no respetivo pagamento.”. (bold e sublinhado nossos)

ZZ) A Recorrente teve, e continua a ter um prejuízo causado pela actuação da Recorrida.

AAA) A Recorrente teve, e continua a ter um prejuízo, porque “… a R. [a aqui Recorrida] não cumpriu definitivamente a obrigação que sobre si impendia, na qualidade de empreiteira e vendedora das frações autónomas, já que nenhum ato praticou que denuncie intenção de cumprir.”, como bem analisou e decidiu o Tribunal da 1ª Instância.

BBB) E mais, “Também não logrou [a aqui Recorrida] provar que a falta de cumprimento não lhe era imputável, pelo que tornou-se responsável pelo prejuízo que causou ao A. [a aqui Recorrente], nos termos do artigo 798.º do Código Civil.”, como, igualmente, bem analisou e decidiu o Tribunal da 1ª Instância.

CCC) E por fim, “Tal prejuízo foi orçamentado em € 36.267,06, valor que se encontra dentro dos praticados no mercado para este tipo de intervenções, resultando inclusivamente do julgamento que parte das reparações já terão sido realizadas as expensas do A.”, como tão bem analisou e decidiu o Tribunal da 1ª Instância.

DDD) Não pode a Recorrente, por tudo o que ficou provado e decidido pelo Tribunal da 1ª Instância, ser prejudicado pelo comportamento gravemente despudorado da Recorrida.

EEE) A sentença do Tribunal da 1ª Instância é clara e objectiva, pelo que, salvo o devido respeito, cai por terra toda a fundamentação do Tribunal da Relação, devendo manter-se na íntegra a decisão proferida pelo Tribunal da 1ª Instância.

FFF) Deverão, assim, e em consequência, ser apreciadas as demais questões suscitadas, que o Tribunal da Relação considerou não analisar, entendimento que a Recorrente refuta e que não se acompanha, seja a que título for.

GGG) Por tudo o acima explanado à exaustão, jamais a conclusão e decisão proferidas pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (a fls. 36 e 37 do Acórdão proferido) poderiam ter sido as que foram proferidas:

“Em conclusão, procede, parcialmente, a apelação, devendo alterar-se a sentença recorrida, condenando a R. a reparar os defeitos supra identificados que se verificam nas partes comuns do edifício, no prazo de 30 dias, absolvendo-a do demais peticionado.”

“DECISÃO

Pelo exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação, e, em consequência, altera-se a sentença recorrida, condenando a R. a reparar os defeitos que se verificam nas partes comuns do edifício (no interior dos pisos 0, 1, 2, 3, 4, 5 e de acesso à cobertura o peitoril da janela apresenta humidades e a tinta desgastada; o sistema de segurança contra incêndios nos mencionados pisos, bem como nos pisos -1, -2 e -3, é inexistente; no piso -2 existem infiltrações em tubo de queda e na respetiva parede; e no piso - 3 o pavimento está degradado, e existem infiltrações em tubo de queda e na respetiva parede, e, ainda, os referidos no ponto 20.a. e 20.d.), no prazo de 30 dias, absolvendo-a do demais peticionado.”

HHH) A decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, plasmada no seu Acórdão datado de 02/05/2023, deverá, assim, ser revogada, por por olvidar a análise de aspectos essenciais e de imperiosa importância, bem como por ser contraditória em si mesma, e, acima de tudo por não fazer JUSTIÇA!, devendo, outrossim, ser mantida na íntegra a sentença proferida pelo Tribunal da 1ª Instância, por justa, correcta e exaustivamente analisada, suportada e fundamentada, que, muito bem, considerou a acção totalmente procedente, condenando a Recorrida (Ré da acção) em todo o peticionado.

Termos em que, e nos mais que Vossas Excelências,

Colendos Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça, doutamente suprirão, deve ser dado total provimento ao presente Recurso, revogando-se o Acórdão do Tribunal da Relação ora recorrido, devendo ser retomada e mantida, na íntegra, a douta Sentença do Tribunal da 1ª Instância, nos seus exactos e precisos termos, com o que, uma vez mais, se fará a costumada JUSTIÇA“.

11. Por seu turno, a Ré Mortaguense – Sociedade de Construções, Lda., apresentou contra-alegações com as seguintes Conclusões:

a) Nas suas doutas alegações de recurso a recorrente – conforme resulta das conclusões constantes das alíneas A), F), G), I), J), M), O) e U) – pretende que V. Exas. procedam a alteração da matéria de facto dada como provada e como não provada. Ora, resulta do disposto no artigo 674.º n.º 3 do CPC que o Supremo Tribunal de Justiça, salvo em casos muitos restritos na lei, os quais são inaplicáveis in casu, não pode, nem deve, interferir na decisão de facto. Assim sendo, salvo melhor e mais douto entendimento, não tendo a recorrente invocado qualquer erro de direito na apreciação da decisão de facto, conclui-se que o Tribunal ad quem não pode sindicar o modo como o Tribunal da Relação decidiu a matéria de facto que foi sujeita à sua livre apreciação, pelo que, assim sendo, terão de improceder as conclusões da recorrente constantes das alíneas A), F), G), I), J), M), O) e U) e, consequentemente, deverá ser considerada fixada a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo

b) A recorrente insurge-se, nas suas doutas alegações – conclusões constantes das alíneas C), D) e E) – contra a forma como o Tribunal a quo formulou o seu douto acórdão, inclusivamente fá-lo de forma deselegante. Contrariamente ao referido pela recorrente, na nossa modesta ótica, o Tribunal a quo formulou, claramente, o seu douto acórdão com total respeito pelo artigo 635.º do CPC, já que este Tribunal balizou as questões a decidir nos termos constantes do recurso apresentado pela, aqui, recorrida, sendo esta, simplesmente, a sua obrigação.

c) Nas conclusões constantes das alíneas L), S), T), X), Y), Z), AA), BB), CC), XX) a recorrente insurge-se quanto ao facto do Tribunal a quo ter decidido não condenar a recorrida pelos problemas decorrentes da falta de manutenção. Ora, salvo melhor e mais douto entendimento, a recorrida, tal como sobejamente resulta, dos autos, foi demandada pela recorrente por, alegados, defeitos de construção, pelo que, salvo melhor e mais douto entendimento, a mesma nunca poderia ser condenada por problemas derivados da falta de manutenção. In casu a ação apresentada pela recorrente foi uma ação de defeitos de obra, a qual tem uma causa de pedir específica, claramente conexionada com a existência ou não de defeitos de obra, tal como resulta do douto despacho saneador com a referência CITIUS n.º ...89. Por esta mesma razão, salvo melhor e mais douto entendimento, nunca poderia tal causa de pedir vir a ser, agora, alterada, em violação do princípio do contraditório previsto no artigo 4.º CPC e do princípio constitucional do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva a que alude o artigo 20.º da CRP. O mesmo é dizer que, contrariamente ao que acontece com a recorrente, não podemos ser tentados a confundir responsabilidade civil – que tem uma causa de pedir específica e requisitos específicos que se têm de preencher – com a existência de defeitos de obra, isto é de problemas inerentes a conceção e execução da obra. A falta de manutenção de um edifício por parte um condomínio não cai, certamente, no campo relativo a defeitos de obra, já que é algo que é externo à obra e à sua execução, sendo que tal situação é responsabilidade do condomínio constituído em propriedade horizontal, seja este representado por quem quer que seja. Como nos parece ser uniforme na nossa jurisprudência a falta de manutenção de um edifício de um condomínio cai no âmbito da responsabilidade civil e no disposto no artigo 493.º n.º 1 do Código Civil, sendo certo que, como supra já se teve oportunidade de referir, o próprio Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, no seu artigo 89.º impõe o dever geral de conservação das edificações de, pelo menos, uma vez em cada período de 8 anos. Pelo exposto, conclui-se que inexistindo qualquer defeito de obra no edifício construído pela recorrida – salvo aqueles que esta, expressamente, se comprometeu a resolver e que resultam da matéria de facto dada como provado – bem andou o Tribunal a quo ao decidir como decidiu, pelo que deverão improceder as conclusões da recorrente constantes das alíneas L), S), T), X), Y), Z), AA), BB), CC), XX) e U) das doutas conclusões apresentadas.

d) A recorrente insurge-se, ainda, nas alíneas EE), FF), GG), HH), II), JJ), KK), LL), MM), NN), OO), PP), QQ), RR), SS), TT), UU), VV), WW), ZZ) e DDD) pelo facto do Tribunal a quo ter considerado que estamos perante um situação de mora e a recorrente entender que, na sua ótica, existe incumprimento definitivo. Ora,resulta, cristalinamente, da contestação apresentada que a recorrida sempre esteve disponível para reparar os defeitos de construção logo que deles teve conhecimento – com a sua citação – sendo certo que a recorrida nunca de opôs à sua reparação, sendo certo que esta nunca tomou conhecimento de qualquer interpelação para proceder à reparação dos defeitos elencados na douta petição inicial.

Veja-se, inclusivamente, que a própria recorrente, no pedido efetuada na sua douta petição inicial, pede que a recorrida seja condenada a reparar os aludidos defeitos, sendo que, o pedido da condenação no pagamento dos mesmos é efetuado de forma alternativa, pelo que, como bem se compreenderá, até deste mesmo douto articulado resulta que a recorrente entendia que não existia qualquer incumprimento definitivo.

Assim sendo, tal como doutamente foi decidido pelo Tribunal a quo a recorrida não incumpriu, definitivamente, a sua obrigação como empreiteira de reparar quaisquer defeitos que existissem, razão pela qual, tal como resulta do disposto no artigo 1221.º do Código Civil e não tendo a recorrida incumprido definitivamente a sua obrigação, tem esta o direito de proceder à reparação dos defeitos existentes, às suas expensas, pelo que bem andou o Tribunal a quo ao decidir como decidiu. Pelo exposto deverão improceder as conclusões da recorrente constantes das alíneas EE), FF), GG), HH), II), JJ), KK), LL), MM), NN), OO), PP), QQ), RR), SS), TT), UU), VV), WW), ZZ) e DDD) das doutas conclusões apresentadas.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o recurso apresentado pela recorrente ser considerado totalmente improcedente

Assim se fazendo a habitual JUSTIÇA.

II – Questões a decidir

Atendendo às conclusões do recurso, que, segundo os arts. 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, do CPC, delimitam o seu objeto, e não podendo o Supremo Tribunal de Justiça conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser em situações excecionais de conhecimento oficioso, estão em causa as seguintes questões:

- (in)observância do art. 635.º do CPC na definição das questões a decidir no acórdão recorrido (conclusões C a E);

- (in)existência de erro na reapreciação da matéria de facto (Conclusões F a O);

- (in)existência do erro de direito na apreciação dos vícios no prédio decorrentes da falta de manutenção (Conclusões P a CC);

- (in)existência de erro de direito na apreciação do incumprimento definitivo por parte da Ré (Conclusões DD a EEE).

III - Fundamentação

A. De Facto

Após as alterações introduzidas pelo Tribunal da Relação de Lisboa, foram considerados como provados os seguintes factos:

1. O imóvel sito na Rua ..., n.º 13, ..., encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de ... com o n.º ...05 e inscrito na matriz sob o artigo 12197, tendo sido adquirido por compra pela R. em 04.06.1998.

2. Foi constituído em regime de propriedade horizontal em 30.05.2006, com 19 frações autónomas, constando da sua descrição que os pisos menos três e menos dois são destinados a estacionamento, o piso menos um é destinado a habitação e arrecadações, os pisos zero, um, dois, três, quatro e cinco são destinados a habitação, sendo partes comuns os terraços, ainda que afetos ao uso exclusivo das frações “A”, “B”, e “C”.

3. A Câmara Municipal de ... emitiu em 17.08.2006 o alvará de utilização n.º ...94que titula os fogos do prédio mencionado.

4. Pela Ap. ...20 de 2009/10/23 foi registada a autorização de utilização emitida pela Câmara Municipal.

5. A R. tem como objeto social a construção civil e obras públicas, compra e venda de propriedades e bens adquiridos para esse fim.

6. A R. construiu o imóvel identificado nos pontos 1 e 2, tendo vendido as suas frações autónomas.

7. Em 15.12.2000 a R. apresentou junto da Câmara Municipal de ... um Projeto de Segurança contra Riscos de Incêndio para o prédio referido em 1.

8. No dia 8.11.2018 reuniram-se os proprietários das frações autónomas A, B, C, D, F, I, J, M, N, P, S e T e fizeram constar o seguinte da ata da reunião:

«Os presentes foram informados que a partir do momento em que o imóvel passou a estar em propriedade horizontal e tendo mais do que um proprietário passou a estar em condomínio.

Face ao exposto, foi submetida à votação a proposta de entrega do condomínio aos proprietários presentes e a organização do mesmo; a proposta foi aprovada com um voto contra da fração R/c Esq. e com os restante votos favoráveis.

Ainda no âmbito deste ponto, os condóminos presentes informaram a representante da empresa gestora, que não houve qualquer tipo de passagem do condomínio, não houve entrega de chaves, bem como dos contratos do edifício, das telas finais e dos contactos de fornecedores de materiais e equipamentos, da certidão de registo predial do edifício, assim como as chaves do mesmo, tendo a administração ficado de enviar uma carta regista a solicitar estes documentos.

(…)

Os condóminos presentes fizeram questão de deixar escrito em ata, que o edifício não foi devidamente entregue pelo construtor, existindo várias anomalias, que não foram solucionadas por este. Estando há mais de três anos um dos elevadores parado. Existindo vários problemas a nível de partes comuns bem como em frações autónomas.»

9. A R. não esteve presente em tal reunião.

10. Em 5.06.2019 e em 6.05.2021 o edifício referido em 1 apresentava as seguintes anomalias:

a. As fachadas principal, lateral e posterior apresentavam zonas de reboco e de pedra de revestimentos sujas pelo escorrimento de águas pluviais;

b. A fachada lateral apresentava um fraco isolamento/impermeabilização, o que permite identificar a zona de estrutura do edifício em contraposição com as paredes de tijolo;

c. A fachada posterior tinha uma zona de pintura grafite;

d. A cobertura apresentava telhas partidas, sujas e fungos nas telhas e pedras de capeamento;

e. O interior dos pisos 1, 2 3, 4, 5 e de acesso à cobertura apresentava rachas em paredes, sistema de iluminação de emergência queimado, peitoril de janela com humidades e tinta desgastada e sistema de segurança contra incêndios inexistente;

f. O piso de acesso à cobertura apresentava ainda rachas no teto;

g. O sistema de molas de portas de segurança antifogo do piso 3 precisava de manutenção;

h. O piso zero apresentava sistema de iluminação de emergência queimado, peitoril de janela com humidades e tinta desgastada e sistema de segurança contra incêndios inexistente;

i. O piso -1 apresentava rachas em paredes, sistema de iluminação de emergência queimado e sistema de segurança contra incêndios deficiente/inexistente;

j. O piso -2 apresentava rachas em paredes, infiltrações em tubo de queda e respetiva parede, paredes exteriores com infiltrações, sistema de iluminação de emergência queimado e sistema de segurança contra incêndios deficiente/inexistente;

k. O piso -3 apresentava rachas em paredes, pavimento muito sujo e degradado, infiltrações em tubo de queda e respetiva abertura de parede, paredes exteriores com infiltrações, sistema de iluminação de emergência queimado, sistema de segurança contra incêndios deficiente/inexistente, revestimento de parede de caixa de elevador removido e portas corta fogo abertas;

l. Um elevador encontrava-se parado;

m. Os elevadores não tinham sido sujeitos a inspeção obrigatória;

n. O sistema de iluminação e sinalética de emergência necessitava de manutenção; o. O sistema de segurança contra incêndios era defeituoso ou inexistente.

11. O verificado em 10.a deve-se, na fachada frontal, à inexistência de capeamento e à pedra de topo não ter pingadeira, e, nas fachadas lateral direita e posterior, à pedra de capeamento não ter pingadeira.

12. O projeto de arquitetura e especialidades do prédio em causa não prevê a existência de capeamento na fachada frontal, nem de pingadeiras na pedra de topo (na fachada frontal) ou nas pedras de capeamento (nas fachadas lateral direita e posterior).

13. A edificação do prédio identificado em 1 cumpriu, no geral, as boas práticas de construção.

14. A mandatária do A. remeteu à R., para a morada onde esta foi citada nos presentes autos, uma carta datada de 8.09.2019 na qual solicitou a reparação das anomalias descritas em 103 no prazo máximo de 15 dias.

15. A R. não recebeu a missiva, tendo sido devolvida com a indicação de objeto não reclamado.

16. O A. solicitou orçamento para a reparação de elevador, o qual tem o valor global de €3.868,35.

17. O A. solicitou orçamento para reparação de sistema de segurança contra incêndios, o qual tem o valor de € 936,65.

18. O A. solicitou orçamento para limpeza, reparação de fissuras, aplicação de betume em juntas, pinturas e impermeabilização das fachadas, e bem assim pintura de chaminés, muretes e núcleo de elevadores e de escadas situado na cobertura, o qual tem o valor de € 31.462,06.

19. Os orçamentos obtidos pelo A. encontram-se dentro dos valores praticados no mercado para o tipo de intervenções em causa.

20. A R. visitou o imóvel descrito em 1 e assumiu responsabilidade relativamente às seguintes anomalias:

a. existência de um buraco na parede no piso -3 (estacionamento) que tem de ser tapado e pintado;

b. tubo de queda de águas pluviais no piso -2 (estacionamento) que tem de ser corrigido e reparado;

c. peitoris que estão por baixo da janela na zona das escadas entre os pisos 0 e 1, 1 e 2, 4 e 5, que têm de ser novamente pintados; e

d. reparação e pintura de rachas existentes na parede oposta aos elevadores nos pisos 3 e 4.

21. Em Março de 2011 a R. vendeu a fração autónoma designada pela letra “I”, correspondente ao 2.º Frente, e que constitui a décima primeira fração autónoma do imóvel a ser vendida.

22. O elevador referido em 10.l4 deixou de funcionar em 2015.

23. Nunca foram colocados extintores no edifício.

24. Em 2016 não havia sinalética de emergência.

25. O verificado em 10.b. e 10.d. resulta da falta de manutenção do edifício.

26. O verificado em 10.e., 10.f., 10.i., 10.j., e 10.k quanto às rachas em paredes, resulta da falta de manutenção do edifício.

27. O verificado em 10.j. e 10.k, quanto às paredes exteriores com infiltrações, resulta da falta de manutenção do edifício.

28. O verificado em 10.l resulta de falta de manutenção dos elevadores.


*


E resultam não provados:

A. Todas as anomalias referidas em 105 se devem a deficiente construção do prédio pela R.

B. A construção do prédio foi concluída em Maio de 2006.

C. A R. não aceitou os orçamentos descritos em 16, 17 e 186”.

B. De Direito

Tipo e objecto de recurso

1. Por sentença de 11 de maio de 2022, na presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, que Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ..., intentou contra Mortaguense – Sociedade de Construções, Lda., foi decidido condenar esta a pagar àquele a quantia de € 36 267,06 (trinta e seis mil, duzentos e sessenta e sete euros e seis cêntimos), absolvendo-a do demais peticionado.

2. Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 2 de maio de 2023, na sequência de recurso de apelação interposto pela Ré, foi “deliberado julgar parcialmente procedente a apelação, e, em consequência, altera-se a sentença recorrida, condenando a R. a reparar os defeitos que se verificam nas partes comuns do edifício (no interior dos pisos 0, 1, 2, 3, 4, 5 e de acesso à cobertura o peitoril da janela apresenta humidades e a tinta desgastada; o sistema de segurança contra incêndios nos mencionados pisos, bem como nos pisos -1, -2 e -3, é inexistente; no piso -2 existem infiltrações em tubo de queda e na respetiva parede; e no piso -3 o pavimento está degradado, e existem infiltrações em tubo de queda e na respetiva parede, e, ainda, os referidos no ponto 20.a. e 20.d.), no prazo de 30 dias, absolvendo-a do demais peticionado”.

3. É deste acórdão que o Autor Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ..., interpõe recurso de revista.

4. A Ré Mortaguense – Sociedade de Construções, Lda., apresentou contra-alegações, pugnando pela inadmissibilidade do recurso da matéria de facto e pela manutenção do decidido no acórdão recorrido.

5. O recurso foi admitido pela Senhora Juíza Desembargadora Relatora do Tribunal da Relação de Lisboa.

(In)admissibilidade do recurso

Atendendo ao valor da causa e da sucumbência (superior a € 15 000,00), à legitimidade do Recorrente e ao teor do acórdão recorrido, o recurso de revista é admissível, nos termos dos arts. 671.º, n.º 1, e 674.º, n.º 1, als. a) e b), do CPC.

(In)observância do art. 635.º do CPC na definição das questões a decidir no acórdão recorrido (conclusões C a E)

1. O Autor/Recorrente Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ..., impugna a formulação das questões a decidir no acórdão recorrido, considerando que este não observou o disposto no art. 635.º, n.º 4, do CPC. Por isso, enuncia as questões que, em seu entender, deveriam ter sido analisadas pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

2. De acordo com o art. 635.º do CPC, “1 - Sendo vários os vencedores, todos eles devem ser notificados do despacho que admite o recurso; mas é lícito ao recorrente, salvo no caso de litisconsórcio necessário, excluir do recurso, no requerimento de interposição, algum ou alguns dos vencedores. 2 - Se a parte dispositiva da sentença contiver decisões distintas, é igualmente lícito ao recorrente restringir o recurso a qualquer delas, uma vez que especifique no requerimento a decisão de que recorre. 3 - Na falta de especificação, o recurso abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente. 4 - Nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objeto inicial do recurso. 5 - Os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo.”

3. Importa, nesta sede, levar em linha de conta que “Independentemente do âmbito definido pelo recorrente no requerimento de interposição, é-lhe ainda legítimo restringir o objeto do recurso nas alegações ou, mais corretamente, nas respetivas conclusões, indicando qual a decisão (ou parte da decisão) visada pela impugnação. Em resultado do que consta do art. 639.º, n.º 1, as conclusões delimitam a área de intervenção do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido, na petição inicial, ou à das exceções, na contestação. Salvo quando se trate de matéria de conhecimento oficioso, (…) as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal. (…). O recorrente pode restringir expressamente o recurso nas conclusões, identificando os segmentos decisórios sobre os quais demonstra o seu inconformismo.7.

4. Além disso, as questões constitutivas do objecto de recurso não podem ser confundidas com os argumentos apresentados para fundamentar este requerimento, pois “argumentos” não são sinónimo de “questões”, e é a estas que essencialmente se deve dirigir a atividade judicativa.

5. Atendendo ao alegado pelo Autor/Recorrente, importa apurar se o acórdão recorrido se ateve ao objecto do recurso definido nas conclusões da apelação ou se, muito diferentemente, não respeitou o seu âmbito, excedendo-o.

6. Refira-se, desde logo, que a formulação ou designação atribuída às questões a decidir pelo Tribunal a quo não é sindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça, ao qual compete apenas verificar se foi ou não respeitada a delimitação do objecto do recurso operada pelo Recorrente nas suas conclusões do recurso de apelação, com vista a determinar se aquele acórdão se encontra ou não ferido de nulidade por omissão ou excesso de pronúncia (art. 615.º do CPC).

7. No acórdão recorrido, foram identificadas e decididas as seguintes questões:

“a) impugnação da decisão sobre a matéria de facto;

b) da inexistência de defeitos de construção;

c) da eliminação dos defeitos ou pagamento da sua reparação;

c) do valor da indemnização arbitrada; nulidade da sentença.

d) da alteração da causa de pedir.”

8. Compulsadas as alegações do recurso de apelação apresentadas pela Ré, pode dizer-se que foram identificadas como temas do recurso exatamente as questões que a Recorrente enuncia na respetiva motivação. Apesar de as conclusões do recurso de apelação da Ré não conterem temas, da sua leitura decorre que são essas as questões por si suscitadas.

9. Com efeito, nas suas conclusões do recurso de apelação, a Ré impugna a matéria de facto nas als. a) a m); a questão da (in)existência de defeitos de construção encontra-se referida nas als. n) e o); a questão da eliminação dos defeitos ou o pagamento da reparação é mencionada na al. p); a questão do valor da indemnização arbitrada e da nulidade da sentença são referenciadas nas als. q) a s); e, por último, a questão da alteração da causa de pedir está formulada na al. t).

10. Verifica-se, por conseguinte, que, no acórdão recorrido, o Tribunal da Relação de Lisboa analisou detidamente as questões invocadas pela Ré nas conclusões das alegações do seu recurso de apelação, conforme resulta da correspondente motivação.

11. Não ocorreu qualquer omissão ou excesso de pronúncia por parte do Tribunal da Relação de Lisboa que, efetivamente, apreciou o objecto do recurso tal como foi delimitado pela Ré, nos termos do art. 635.º do CPC.

12. Assim, improcede, nesta parte, o recurso interposto pelo Autor/Recorrente Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ....

(In)existência de erro na reapreciação da matéria de facto (conclusões F a O)

1. O Autor/Recorrente Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ..., invoca que o acórdão recorrido incorreu em erro na reapreciação da matéria de facto, concretamente na análise do facto dado como provado sob o n.º 13, do facto dado como não provado sob a letra A) e no aditamento dos factos considerados como provados sob os n.os 25 a 28.

2. Na reapreciação da matéria de facto, o acórdão recorrido:

- no que respeita ao facto dado como provado sob o n.º 13, atendeu a prova documental e a prova pericial para alterar a sua redação;

- manteve o facto dado como não provado sob a letra A, por considerar, tal como a sentença, que o mesmo foi contrariado pela prova pericial. Entendeu ainda que a circunstância de ter sido dado como não provado que «“Todas as anomalias referidas em 10 se devem a deficiente construção do prédio pela R.” não demonstra o contrário, ou seja, que todas as anomalias referidas em 10 não se devem a deficiente construção do prédio pela R.»;

- com base na prova testemunhal e pericial, considerou como provados os factos indicados sob os n.os 25 a 28, a cujo aditamento procedeu.

3. Por força do disposto nos arts. 674.º, n.º 3, e 682.º, n.º 2, do CPC, no recurso de revista, o Supremo Tribunal de Justiça encontra-se limitado à reapreciação da matéria de direito e apenas pode debruçar-se sobre a matéria de facto nos casos em que ocorra ofensa de disposição expressa de lei que exija certo tipo de prova para a existência de um facto ou atribua a determinado meio de prova força probatória plena.

4. Assim, “… o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa escapa ao âmbito dos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça (artigos 674º nº 3 e 682º nº 2 do Código de Processo Civil), estando-lhe interdito sindicar a convicção das instâncias pautada pelas regras da experiência e resultante de um processo intelectual e racional sobre as provas submetidas à apreciação do julgador. Só relativamente à designada prova vinculada, ou seja, aos casos em que a lei exige certa espécie de prova para a demonstração do facto ou fixa a força de determinado meio de prova, poderá exercer os seus poderes de controlo em sede de recurso de revista8.

5. Com efeito, o Supremo Tribunal de Justiça não tem poderes para sindicar a decisão de facto ancorada em meios de prova sujeitos à livre apreciação do julgador, apenas podendo intervir na hipótese de erro de direito na referida reapreciação da prova9. Efetivamente, os poderes do Supremo Tribunal de Justiça, apesar de abrangerem o controlo da aplicação da lei adjetiva em qualquer das dimensões destinadas à fixação da matéria de facto provada e não provada – art. 674.º, n.º 1, al. b), do CPC –, sofrem a restrição estabelecida no art. 662.º, n.º 4, do CPC, que exclui a sindicabilidade do juízo de apreciação da prova efetuado pelo Tribunal da Relação e a aferição da formação da convicção desse Tribunal com base em meios de prova sujeitos ao princípio da livre apreciação.

6. Os factos agora impugnados pelo Autor/Recorrente foram apreciados com base em prova testemunhal e pericial, que se traduzem em meios de prova sujeitos à livre apreciação do julgador. Por isso, conforme mencionado supra, essa matéria não é sindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça10.

7. Pode ainda dizer-se, no que concerne à prova pericial, que, segundo o art. 674.º, n.º 3, do CPC, os poderes de apreciação do Supremo Tribunal de Justiça se encontram reduzidos aos casos de manifesta desadequação ou ilogicidade da sua fundamentação11. In casu, não se verifica qualquer ilogicidade ou desadequação na fundamentação respeitante à prova pericial, pois o acórdão recorrido acompanhou o teor do relatório pericial que, além do mais, foi também corroborado pelas declarações do perito e por prova testemunhal devidamente referida na respetiva fundamentação.

8. Improcede, também nesta parte, o recurso interposto pelo Autor/Recorrente Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ....

(In)existência de erro de direito na apreciação dos defeitos do prédio decorrentes da falta de manutenção (conclusões P a CC)

1. O Autor/Recorrente Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ..., alega igualmente que, uma vez que o condomínio não se encontrava constituído e que não lhe haviam sido entregues as partes comuns do edifício (pois não foram cedidas pela Ré as respetivas chaves, os contratos do edifício, os projetos e os contactos de fornecedores de materiais e de equipamentos), não poderia agir enquanto e na qualidade de condomínio, procedendo, designadamente, à manutenção do edifício (cf. facto provado sob o n.º 8). Após a constituição do condomínio, o Autor demandou judicialmente a Ré. Ainda que se considere que existia previamente um administrador provisório, a administração era efetuada – e mal efetuada - pela Ré, incumbindo-lhe providenciar pela eleição do administrador provisório. Em sua opinião, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu para além daquilo que foi delimitado pela Ré/Recorrente no seu recurso de apelação, pois nunca nos autos foi suscitada qualquer questão relativa ao administrador provisório.

2. Nesta sede, o acórdão recorrido distinguiu entre os defeitos decorrentes da construção e os defeitos resultantes da falta de manutenção do edifício (e dos elevadores) por parte do condomínio e/ou dos condóminos, imputando a responsabilidade pela reparação dos primeiros à Ré e responsabilizando o Autor pelos restantes. Em virtude da ausência de administrador provisório nomeado (art. 1435.º-A do CC), ao qual incumbiria a prática de atos de conservação, a Ré não poderia arcar com a responsabilidade pelos defeitos derivados da falta de manutenção do edifício (e dos elevadores), uma vez que nada foi alegado sobre a sua qualidade de administradora provisória do condomínio, nem tão pouco foi demandada nessa qualidade.

3. A Ré, enquanto construtora do edifício, constituiu-o em propriedade horizontal e procedeu à venda das respetivas frações autónomas, mediante a qual os compradores passaram a ser comproprietários das partes comuns do edifício (art. 1420.º do CC).

4. O Autor/Recorrente pede a condenação da Ré, enquanto construtora/vendedora do edifício (art. 1225.º, n.º 4, do CC), no pagamento das despesas implicadas pela reparação das anomalias/defeitos de que o edifício padece, em virtude de a obra não ter sido corretamente executada ou, no caso de assim não se entender, na realização dessa reparação. Na verdade, o vendedor do imóvel que o tenha construído, modificado ou reparado é equiparado ao empreiteiro (art. 1225.º, n.º 4, do CC).

5. Por seu turno, no art. 913.º do CC, o legislador traçou o âmbito do instituto da venda de coisas defeituosas por referência a quatro categorias de defeitos. Contempla-se aí o vício que desvaloriza a coisa ou que impede a realização do fim a que é destinada e a falta das qualidades asseguradas pelo vendedor ou necessárias à realização daquele fim, esclarecendo-se também que, na determinação do fim e sempre que o contrato seja omisso, se deve atender à função normal das coisas da mesma categoria. Resulta dessa enumeração a parificação entre os vícios e a falta de qualidades quanto ao regime instituído. Pode dizer-se que o vício da coisa se traduz numa imperfeição material, que afeta a sua utilizabilidade ou valor para o comprador. Está fundamentalmente em causa um problema de incumprimento, porquanto o acordo de vontades engloba a determinação das qualidades da coisa a prestar. Se o objeto entregue não as possui, há inexatidão da prestação. É pois a vontade das partes que fornece, em último recurso, o critério dos defeitos. O regime jurídico da venda de coisas defeituosas visa essencialmente definir os termos e a medida em que o comprador pode alijar de si o risco do desvalor da coisa que lhe excluiu ou diminuiu a utilizabilidade. Segundo os arts. 913.º a 915.º do CC, o comprador de coisa defeituosa pode exigir do vendedor a reparação da coisa ou, se for necessário e esta tiver natureza fungível, a sua substituição. Trata-se de um meio de defesa baseado no contrato e destinado à correção de uma prestação inexata perante o conteúdo do acordo contratual. É a inexatidão da prestação que confere ao credor este direito à "retificação". Pode ainda exigir a redução do preço e requerer a anulação do contrato. Em qualquer caso, poderão ainda existir pretensões indemnizatórias.

6. Conforme a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal de Justiça, “[procedendo] a uma clara definição do quadro normativo aplicável ao presente litígio, dir-se-á liminarmente que: -estando em causa defeito construtivo de um imóvel destinado a longa duração, construído pelo próprio vendedor, é aplicável o regime específico constante do art. 1225º do CC, e não o regime genérico da venda de coisas defeituosas, plasmado nos arts. 914º e 916º do CC, nomeadamente no que se refere aos prazos para o exercício dos direitos ali previstos; - o limite temporal para o exercício de tais direitos, necessariamente actuados dentro de certo prazo, configura um problema de caducidade, e não de prescrição; -o «iter» estabelecido em tal preceito legal para o exercício dos direitos outorgados ao comprador do imóvel defeituoso implica a clara distinção entre os planos da garantia legal de 5 anos que lhe é conferida, a contar da entrega do imóvel, consequente à celebração do contrato de compra e venda; do exercício do direito potestativo à denúncia dos defeitos, com vista a obter a consequente indemnização ou a respectiva eliminação pelo vendedor – construtor, a exercitar no prazo de 1 ano a contar do conhecimento do vício construtivo da coisa; e, finalmente, do exercício em juízo do direito de indemnização ou eliminação dos defeitos denunciados, no prazo de 1 ano subsequente à denúncia; - de tal distinção decorre que – ao contrário do que pretende o recorrente – o exercício da acção não tem que ocorrer necessariamente dentro dos 5 anos subsequentes à venda do imóvel, bastando que o vício construtivo se revele no decurso do referido prazo de garantia: tal ocorreu manifestamente no caso dos autos, já que os defeitos ocorreram e foram denunciados dentro dos 5 anos posteriores à outorga na escritura e consequente entrega da coisa; - o regime específico que consta do art. 1225º tem de ser articulado e conjugado com as normas gerais que definem o regime da caducidade, em particular com o disposto nos arts. 331º, nº 2, e 329º do CC.12.

7. Por seu turno, de acordo com o art. 1208.º do CC, “O empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato”, cabendo ao dono da obra o ónus de verificar, antes de a aceitar, se a obra se encontra nas condições convencionadas e sem vícios (art. 1218.º, n.º 1, do CC).

8. Segundo o art. 1225.º do CC, “Sem prejuízo do disposto nos artigos 1219.º e seguintes, se a empreitada tiver por objeto a construção, modificação ou reparação de edifícios ou outros imóveis destinados por sua natureza a longa duração e, no prazo de cinco anos a contar da entrega, ou no decurso do prazo de garantia convencionado, a obra, por vício do solo ou da construção, modificação ou reparação, por erros na execução dos trabalhos, ruir total ou parcialmente, ou apresentar defeitos, o empreiteiro é responsável pelo prejuízo causado ao dono da obra ou a terceiro adquirente”.

9. No caso de imóveis destinados a longa duração, o prazo de garantia supletivamente estabelecido na lei é de cinco anos a contar da entrega: período de tempo durante o qual se deve manifestar a falta de conformidade e a denúncia deve ser feita.

10. De acordo com as Instâncias, o prazo de garantia das partes comuns do edifício começou a correr a 8 de novembro de 2018, i.e., aquando da constituição da administração do condomínio, data esta considerada como a da entrega do edifício (facto provado sob o n.º 8). Ponderou-se, por isso, que o Autor/Recorrente denunciou tempestivamente os defeitos à Ré/Recorrida. Na verdade, no caso de o empreiteiro ser simultaneamente vendedor das frações autónomas, o Supremo Tribunal de Justiça tem reiteradamente afirmado que o prazo de garantia dos defeitos se deve contar a partir da data da entrega e que a data da entrega coincide com a data da constituição da administração do condomínio13.

11. Efetivamente, conforme a jurisprudência dominante do Supremo Tribunal de Justiça, nos imóveis de longa duração, a data relevante é a da transmissão dos poderes de administração das partes comuns para o condomínio. Via de regra, tal ocorre aquando da constituição da sua estrutura organizativa, reunida em assembleia de condóminos com a eleição do seu administrador (art. 329.º do CC), para que possam ser exercidos os direitos decorrentes da existência de defeitos na obra. Esta asserção resulta da conjugação do disposto no art. 1225.º do CC com o regime da defesa do consumidor, previsto no DL n.º 67/2003, de 8 de abril, alterado pelo DL n.º 84/2008, de 21 de maio14 - entretanto revogado pelo DL n.º 84/2021, de 18 de outubro, aplicável aos contratos concluídos a partir de 1 de janeiro de 2022 (arts. 53.º, n.º 1, e 55.º). Assim, “A entrega considera-se feita no momento em que o vendedor deixa de ter poder para determinar ou influir sobre o curso das decisões dos condóminos constituídos em assembleia de interesses autónomos, correspondendo, assim, o dies a quo a partir do qual se conta o início do prazo dos cinco anos à transmissão dos poderes de administração das partes comuns para os condóminos, através da sua estrutura organizativa, reunindo em assembleia de condóminos e com plena autonomia para denunciar os eventuais defeitos existentes na obra.15.

12. Por conseguinte, em relação aos defeitos das partes comuns do edifício, o prazo deverá contar-se a partir da constituição da administração do condomínio.

13. O administrador, com poderes representativos e processualmente a título próprio [de acordo com os arts. 1430.º, n.º 1, 1436.º als. f) e h)) e 1437.º, n.º 1, do CC, e 12.º, al. e), do CPC], tem, assim, o poder de exigir ao empreiteiro/vendedor a eliminação dos defeitos e dos vícios de construção, sem prejuízo do direito à indemnização pelos prejuízos sofridos16.

14. Todavia, perante a alteração da matéria de facto operada no acórdão recorrido, as Instâncias divergiram sobre os defeitos a reparar pela Ré/Recorrida. De um lado, o Tribunal de 1.ª Instância considerou que a Ré era responsável pelos defeitos enunciados sob o n.º 10 dos factos provados, com exceção das alíneas c), g) e m). Não tendo havido recurso quanto a esta parte das alíneas ressalvadas, não houve sobre elas pronúncia pelo Tribunal da Relação de Lisboa. De outro lado, no acórdão recorrido, apesar da redação do n.º 10 dos factos provados, foram acrescentados os seguintes factos, de acordo com os quais determinadas patologias são devidas a falta de manutenção e não a defeito da construção: “25. O verificado em 10.b. e 10.d. resulta da falta de manutenção do edifício. 26. O verificado em 10.e., 10.f., 10.i., 10.j., e 10.k quanto às rachas em paredes resulta da falta de manutenção do edifício. 27. O verificado em 10.j. e 10.k, quanto às paredes exteriores com infiltrações resulta da falta de manutenção do edifício. 28. O verificado em 10.l resulta de falta de manutenção dos elevadores.” Deste modo, o Tribunal da Relação de Lisboa concluiu que à Ré/Recorrida apenas compete a reparação dos defeitos constantes das alíneas a), h), n) e o) do n.º 10 dos factos provados.

15. Na verdade, o acórdão recorrido entendeu que apenas as anomalias constantes das alíneas a), h), n) e o) dos factos provados sob o n.º 10 se consubstanciam em defeitos de construção e, como tal, são imputáveis à Ré/Recorrida, nos termos da responsabilidade civil contratual do empreiteiro/vendedor. Na medida em que as restantes anomalias derivam de falta de manutenção do edifício (ou dos elevadores), não pode ser assacada qualquer responsabilidade à Ré/Recorrida enquanto empreiteira/vendedora, nem mesmo enquanto administradora provisória do condomínio, pois não foram alegados factos que o permitissem nem esta foi tão pouco demandada nessa qualidade.

16. Ao contrário do que o Autor/Recorrente sustenta, ainda que não o mencione expressamente, o acórdão recorrido não enferma de qualquer nulidade por excesso de pronúncia [art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC) - conclusões AA) a CC)] – em virtude da referência que faz à figura do administrador provisório. Com efeito, o Tribunal da Relação de Lisboa limita-se a dizer que, tratando-se de defeitos oriundos da falta de manutenção das partes comuns do edifício, a responsabilidade pela sua reparação não é do empreiteiro/vendedor, mas antes do condomínio (dos condóminos), nos termos do art. 1436.º, al. f), do CC. É sobre este que recai o dever de conservação das partes comuns do prédio17, impendendo sobre ele também o dever de suportar as despesas correspondentes (art. 1424.º, n.º 1, do CC). Os atos de conservação são praticados com o objetivo de evitar a deterioração ou destruição dos bens comuns.

17. Em conformidade com o acórdão recorrido, o DL. N.º 555/99, de 16 de dezembro, que estabelece o regime jurídico da urbanização e edificação (RJUE), impõe aos proprietários o dever de conservação dos edifícios, consagrando no art. 89.º, n.º 1, que “As edificações devem ser objeto de obras de conservação pelo menos uma vez em cada período de oito anos, devendo o proprietário, independentemente desse prazo, realizar todas as obras necessárias à manutenção da sua segurança, salubridade e arranjo estético.”. Também o DL n.º 320/2002, de 28 de dezembro (que estabelece o regime de manutenção e inspeção de ascensores, monta-cargas, escadas mecânicas e rolantes, após a sua entrada em serviço, bem como as condições de acesso às atividades de manutenção e de inspeção), prevê a manutenção obrigatória dos elevadores, ao determinar que os ascensores estão sujeitos a manutenção regular, que é assegurada por uma empresa de manutenção de ascensores (EMA), incumbindo ao proprietário a obrigação de celebrar com essa empresa o respetivo contrato de manutenção (art. 4.º), sob pena de o condomínio incorrer em responsabilidade contraordenacional, enquanto proprietário dessas instalações, se permitir o funcionamento do ascensor “sem existência de contrato de manutenção” [art. 13.º, n.º 1, al. c)].

18. Os atos de conservação são, em regra, praticados pelo administrador do condomínio (art. 1436º, al. f), do CC), sem prejuízo de alguns deles, nomeadamente os que configurarem atos de administração extraordinária, só poderem ser praticados pelo administrador após deliberação da assembleia de condóminos.

19. A ausência de administrador nomeado pela assembleia de condóminos (art. 1435.º, n.º 1, do CC) implica a existência de um administrador provisório, nos termos do art. 1435º-A do CC.

20. Como os defeitos em apreço remontam ao período em que não havia administrador nomeado, e não tendo a Ré/Recorrida sido demandada na qualidade de administrador provisório, não há factos nos autos que consintam na sua condenação nesses moldes – pois que esses factos não foram alegados e nem provados. O acórdão recorrido fundamenta devidamente a impossibilidade de condenação da Ré/Recorrida na reparação das referidas anomalias, que foram consideradas provenientes da falta de manutenção do edifício (e dos elevadores) e não enquanto defeitos de obra. A inexistência de administrador nomeado pela assembleia de condóminos (art. 1435º, nº 1, do CC) implica a existência de um administrador provisório, nos termos do art. 1435º-A do CC.

21. Efetivamente, “o enquadramento jurídico diverso do pugnado pela parte não integra excesso de pronúncia, antes decorre no princípio ínsito no n.º 3 do art. 5.º do CPC: oficiosidade do julgador quanto à matéria de direito” 18.

22. Pode, por conseguinte, dizer-se que o Tribunal da Relação de Lisboa não extravasou, excedeu ou ultrapassou o âmbito do recurso, não tendo incorrido em qualquer excesso de pronúncia.

23. De resto, considerando a alteração da matéria de facto operada no acórdão recorrido, que introduziu os factos sob os n.os 25 a 28 no elenco dos factos provados, afigura-se correto o silogismo judiciário efetuado, que entendeu que a Ré/Recorrida não era responsável pela reparação das anomalias aí referidas, por não integrarem a categoria dos defeitos da obra.

24. Também nesta parte improcede o recurso interposto pelo Autor Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ....

(In)existência de erro de direito na apreciação do incumprimento definitivo por parte da Ré (conclusões DD a EEE)

1. Por fim, o Autor/Recorrente Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ..., invoca que o acórdão recorrido padece de erro de direito por considerar que não ocorreu incumprimento definitivo por parte da Ré/Recorrida, mas apenas cumprimento inexato ou defeituoso que obriga à reparação dos defeitos, nos termos do art. 1221.º, n.º 1, do CC.

2. Segundo o art. 1221.º do CC, “1. Se os defeitos puderem ser suprimidos, o dono da obra tem o direito de exigir do empreiteiro a sua eliminação; se não puderem ser eliminados, o dono pode exigir nova construção. 2. Cessam os direitos conferidos no número anterior, se as despesas forem desproporcionadas em relação ao proveito.

3. O Supremo Tribunal de Justiça tem reiteradamente considerado que os direitos orientados para o cumprimento, enunciados no art. 1221.º do CC, têm precedência sobre os direitos dirigidos à extinção total ou parcial do contrato de empreitada, mencionados no art. 1222.º do mesmo corpo de normas.

4. Segundo o acórdão recorrido:

Salvo o devido respeito por opinião contrária, da factualidade provada não resulta que “a R. não entregou de forma voluntária as partes comuns do edifício nem tomou a iniciativa de constituir administração de condomínio” nem que foi “Convocada para a reunião em que tal administração foi deliberada”.

O que resulta provado é que, da ata da reunião do dia 8.11.2018, consta que “os condóminos presentes informaram a representante da empresa gestora, que não houve qualquer tipo de passagem do condomínio, não houve entrega de chaves, bem como dos contratos do condomínio, não houve entrega de chaves, bem como dos contratos do edifício, das telas finais e dos contratos de fornecedores de materiais e equipamentos, da certidão de registo predial do edifício, assim como as chaves do mesmo, tendo a administração ficado de enviar uma carta registada a solicitar estes documentos”.

Bem como apenas resulta provado que “a R. não esteve presente em tal reunião”, não se sabendo, por não ter sido alegado, se foi convocada para a mesma.

Por outro lado, é certo que a R. foi interpelada para proceder à reparação das anomalias verificadas nas partes comuns no prazo de 15 dias e nada fez.

Não menos certo é, porém, que tal interpelação ocorreu por carta datada de 8.9.2019 (que foi devolvida por não ter sido reclamada) e a presente ação foi intentada em novembro de 2019, sem que tivesse sido feita qualquer interpelação admonitória à R., não resultando dos autos elementos que permitam concluir pela sua recusa em resolver a situação, tanto mais que reconheceu a sua responsabilidade de reparação de algumas das anomalias verificadas, como resulta provado.

(…)

Não se verificando recusa no cumprimento, ao contrário do que entendeu o tribunal recorrido, deve a R. ser condenada a reparar os defeitos que se verificam nas partes comuns do edifício (no interior dos pisos 0, 1, 2, 3, 4, 5 e de acesso à cobertura o peitoril da janela apresenta humidades e a tinta desgastada; o sistema de segurança contra incêndios nos mencionados pisos, bem como nos pisos -1, -2 e -3, é inexistente; no piso -2 existem infiltrações em tubo de queda e na respetiva parede; e no piso -3 o pavimento está degradado, e existem infiltrações em tubo de queda e na respetiva parede, e, ainda, os referidos no ponto 20.a. e 20.d.), afigurando-se-nos suficiente para tal o prazo de 30 dias, atento o volume de trabalhos a efetuar, e o lapso de tempo já decorrido”.

5. De acordo com a doutrina19 e com a jurisprudência20 do Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito do contrato de empreitada, em caso de cumprimento defeituoso do empreiteiro, o dono de obra pode exercer sucessivamente os seguintes direitos:

- de exigir a reparação dos defeitos, se puderem ser eliminados, ou exigir a realização de obra nova (salvo o caso de desproporcionalidade) (arts. 1221.º, n.os 1 e 2, do CC);

- de exigir a redução do preço ou de resolução do contrato (art. 1222.º, n.º 1, do CC);

- de exigir o pagamento de indemnização (arts. 562.º e ss. e 1223.º do CC).

6. Apenas no caso de manifesta urgência, a fim de evitar um dano maior, pode o dono de obra agir por si ou através de terceiro com vista à eliminação dos defeitos, exigindo subsequentemente ao empreiteiro/vendedor o reembolso das despesas em que incorreu. O mesmo sucede na hipótese de incumprimento definitivo do dever de reparação por parte do devedor – i.e., do empreiteiro/vendedor.

7. A reparação pelo empreiteiro/vendedor traduz-se numa nova obrigação de prestação de facto que surge ex lege como consequência da não execução da obra nas condições convencionadas. Pressupõe uma condenação prévia do empreiteiro/vendedor, na sequência da qual o dono da obra pode exigir a eliminação do defeito por terceiro, à custa do devedor, ou a indemnização pelos danos sofridos.

8. Importa, porém, salientar que, nas empreitadas de consumo, “o direito à indemnização escapa (…) às regras de articulação dos direitos conferidos ao dono da obra pelo CC, ou seja, o direito à indemnização não deve ser encarado, nas empreitadas de consumo, com a configuração subsidiária e residual prevista no art. 1223.º do CC, podendo, ao invés, o direito de indemnização ser “livremente” exercido pelo dono da obra que seja consumidor, desde que sejam observadas as exigências da boa-fé, dos bons costumes e da sua finalidade sócio-económica (desde que sejam respeitados os limites impostos pela figura do abuso de direito - art. 334.º do CC)21.

9. No caso em apreço, não se aplicou o regime jurídico da empreitada de consumo, nem os autos tão pouco contêm elementos suficientes para se ponderar se o Autor Condomínio pode é suscetível de ser considerado como consumidor: não ficou provado o destino das diversas frações autónomas: uso profissional ou não profissional (privado)22. Com efeito, o art. 2.º da Lei n.º 24/96, de 31 de julho, estabelece uma definição de consumidor de alcance geral, segundo a qual é consumidor “todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios” (n.º 1). Por seu turno, o art. 1.º-B do DL n.º 67/2003, alterado pelo DL n.º 84/2008, de 21 de maio, remete para a definição de consumidor plasmada no art. 2.º da Lei n.º 24/96, de 31 de julho. Apesar de o vocábulo “aquele” - ou “todo aquele” – usado pelo legislador naquela definição dever ser interpretado no sentido de abranger associações ou comissões sem personalidade jurídica, abarcando também o condomínio, os autos não integram elementos que consintam a qualificação do condomínio como consumidor: não se sabe se a totalidade, a maioria, a minoria ou até apenas uma das frações se destinam a uso não profissional.

10. Importa, assim, determinar, de acordo com a factualidade dada como provada, se ocorreu ou não incumprimento definitivo do dever de reparação por parte da Ré/Recorrida que permita ao Autor/Recorrente optar pelo pagamento da indemnização correspondente ao valor da reparação dos defeitos.

11. Dos autos resultou provado que o Autor/Recorrente, a 8 de setembro de 2019, remeteu uma missiva à Ré/Recorrida solicitando a reparação dos defeitos no prazo de quinze dias e que esta não efetuou a reparação (factos provados sob os n.os 14 e 15). Em geral, o dono da obra arca com o ónus de fixar um prazo adicional ou suplementar, de duração razoável, para que o empreiteiro elimine os defeitos da obra - e só na hipótese de o empreiteiro não eliminar os defeitos da obra dentro desse prazo, fixado nos termos do art. 808.º, n.º 1, do CC, poderá o dono da obra resolver o contrato de empreitada. Contudo, no caso sub judice, a interpelação efetuada pelo Autor/Recorrente não se reveste de caráter admonitório, pois este não advertiu a Ré/Recorrida de que o incumprimento se consideraria definitivo no caso de esta não proceder à reparação dentro daquele prazo. É que essa interpelação deve intimar para o cumprimento, fixar um termo perentório para o cumprimento e conter a admonição ou a cominação de que a obrigação se terá por definitivamente não cumprida se não se verificar o cumprimento dentro do prazo estipulado.

12. Foi igualmente dado como provado que a Ré/Recorrida reconheceu junto do Autor/Recorrente a sua responsabilidade pela existência de defeitos e o seu dever de reparação dos defeitos (facto provado sob o n.º 20).

13. Deste modo, não pode considerar-se definitivo o incumprimento do dever de reparação por parte da Ré/Recorrida, pois não houve interpelação admonitória e a Ré/Recorrida reconheceu ulteriormente a existência de defeitos. Acresce que a referida interpelação – que não admonitória – foi efetuada de 8 de setembro de 2019 (de resto, devolvida ao remetente por não ter sido reclamada) e a presente ação foi intentada em novembro do mesmo ano.

14. Aliás, tendo o direito à eliminação ou reparação dos defeitos sido estabelecido no interesse de ambas as partes, o dono da obra não pode impedir o cumprimento da correspondente obrigação do empreiteiro, efetuando-a ele próprio ou contratando terceiro para o fazer, sem antes dar àquele essa oportunidade. Naturalmente que o mesmo não acontece na hipótese de incumprimento definitivo dessa obrigação, imputável ao empreiteiro, nomeadamente quando este se recusa perentoriamente a cumprir, ou quando não observa o prazo admonitório, nos termos do art. 808.º, n.º 1 do CC, ou quanto ocorre uma tentativa frustrada de reparação. Nestas hipóteses, já não se revela necessário o recurso à via judicial para o dono da obra poder efetuar as obras de reparação, sem que perca o direito de reclamar do empreiteiro o pagamento do respetivo custo.

15. Consequentemente, não se verificando nem inadimplemento de qualquer prazo admonitório e nem recusa no cumprimento por parte do empreiteiro/vendedor, este deve ser condenado a reparar os defeitos existentes nas partes comuns do edifício.

16. Improcede, também nesta parte, o recurso interposto pelo Autor Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ....

IV - Decisão

Nos termos expostos, acorda-se em julgar improcedente o recurso de revista interposto pelo Autor Condomínio do Prédio Sito Na Rua ..., n.º 13, ..., confirmando-se, consequentemente, o acórdão recorrido.

Custas pelo Autor/Recorrente.


Lisboa, 16 de novembro de 2023

Maria João Vaz Tomé (Relatora)

Manuel Aguiar Pereira

António Magalhães

_____________________________________________


1. Com efeito, “… importa decidir se a Ré tem a obrigação de proceder à realização dos trabalhos indicados na petição inicial e/ou ao pagamento das quantias peticionadas pelo Autor decorrente de ser construtora/vendedora do prédio do Autor, apreciando os alegados incumprimentos e defeitos na obra.”.↩︎

2. Ou seja, “1. A construção e venda pela Ré do prédio descrito no artigo 1.º da petição inicial. 2. Levantamento efetuado pelo Autor dos defeitos de construção e relatório efetuado. 3. Defeitos (artigo 14.º da petição inicial). 4. Data da conclusão das obras de construção. 5. Data em que os condóminos começaram a habitar as frações. 6. Falta de manutenção do sistema de molas de segurança anti fogo e inspeção dos elevadores. 7. Interpelação da Ré e apresentação de orçamentos. 8. Custo de reparação dos defeitos/danos e orçamentos de reparação (artigos 26 a 30 da petição inicial). 9. Comportamento da Ré face ao conhecimento dos defeitos.”.↩︎

3. Conforme despacho de 15.2.2023 (refª ...30) que retificou lapsos de escrita da sentença.↩︎

4. Conforme despacho de 15.2.2023 (refª ...30) que retificou lapsos de escrita da sentença.↩︎

5. Conforme despacho de 15.2.2023 (refª ...30) que retificou lapsos de escrita da sentença.↩︎

6. Conforme despacho de 15.2.2023 (refª ...30) que retificou lapsos de escrita da sentença.↩︎

7. Cf. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2020, pp. 135 e ss..↩︎

8. Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de dezembro de 2016 (Fernanda Isabel Pereira), Proc. n.º 2604/13.2TBBCL.G1.S1; de 12 de julho de 2018 (Maria do Rosário Morgado), Proc. n.º 701/14.6TVLSB.L1.S1; de 12 de fevereiro de 2019 (José Rainho), Proc. n.º 882/14.9TJVNF-H.G1.A1.↩︎

9. Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de abril de 2023 (Maria João Vaz Tomé), Proc. n.º 1515/18.0T8VFR.P1.S1; de 21 de março de 2023 (Tibério Nunes da Silva), Proc. n.º 549/21.1T8VCT-B.G1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/0537e7ae6cd20f0f8025897900707148?OpenDocument; de 28 de março de 2023 (Isaías Pádua), Proc. n.º 729/19.0T8CHV.G1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/1aead63443d8bd90802589830030d26c?OpenDocument; e de 30 de março de 2023 (Luís Espírito Santo), Proc. n.º 9755/17.2T8PRT.P1.S1 – disponível para consulta in http://www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/a938ff1e61b9afcc80258982004f9f26?OpenDocument.↩︎

10. Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de junho de 2023 (Ferreira Lopes), Proc. n.º 1060/20.3T8BRG.G1.S1- disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/80643f0a103750ea802589c7003453f9?OpenDocument; de 21 de março de 2023 (Tibério Nunes da Silva), Proc. n.º 549/21.1T8VCT-B.G1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/0537e7ae6cd20f0f8025897900707148?OpenDocument; e de 29 de março 2022 (Maria Clara Sottomayor), Proc. n.º 640/13.8TVPRT.P2.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/cd6ac2db5aa0e71a8025881500399d5f?OpenDocument&Highlight=0,640%2F13.8TVPRT.P2.S1.↩︎

11. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31 de março de 2022 (Rijo Ferreira), Proc. n.º 812/06.1TBAMT.P1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/0bcb9f5ede9038fa8025881600564a22?OpenDocument&Highlight=0,812%2F06.1TBAMT.P1.S1.↩︎

12. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de setembro de 2009 (Lopes do Rego), Proc. n.º 2210/06.8TVPRT.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e95fb794404dce898025763f00489a5b?OpenDocument.↩︎

13. Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de janeiro de 2022 (Nuno Pinto Oliveira), Proc. n.º 1451/16.4T8MTS.P1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/2bcdddb450012857802587d1005ffe99?OpenDocument&ExpandSection=1; de 17 de outubro de 2019 (Oliveira Abreu), Proc. n.º 1066/14.1T8PDL.L1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/3e2a2bc59fa9b83f80258496005c5518?OpenDocument; de 10 de dezembro de 2019 (Nuno Pinto Oliveira), Proc. n.º 4288/16.7T8FNC.L1.S2 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/2ee84c911d0934f3802584cd003bc766?OpenDocument; de 31 de maio de 2016 (Maria Clara Sottomayor), Proc. n.º 721/12.5TCFUN.L1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bfaea47b2f1146b780257fc4004a1ead?OpenDocument&Highlight=0,721%2F12.5TCFUN.L1.S1; de 14 de janeiro de 2014 (Moreira Alves), Proc. n.º 378/07.5TBLNH.L1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/c4dae5978249c87b80257c61005a1b78?OpenDocument&Highlight=0,378%2F07.5TBLNH.L1.S1; de 6 de junho de 2013 (Granja da Fonseca), Proc. n.º 8473/07.4TBCSC.L1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/abe33e1fe4c862e380257b830038ba18?OpenDocument&Highlight=0,8473%2F07.4TBCSC.L1.S1; de 15 de novembro de 2012 (Granja da Fonseca), Proc. n.º 25106/10.4T2SNT.L1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/c0daad9d2556ed1a80257ab800437fb2?OpenDocument&Highlight=0,25106%2F10.4T2SNT.L1.S1. Vide também João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Coimbra, Almedina, 2020, pp. 212 e ss.↩︎

14. Cf. João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Coimbra, Almedina, 2020, pp. 212 e ss.↩︎

15. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31 de maio de 2016 (Maria Clara Sottomayor), Proc. n.º 721/12.5TCFUN.L1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bfaea47b2f1146b780257fc4004a1ead?OpenDocument.↩︎

16. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de outubro de 2020 (Ricardo Costa), Proc. n.º 5281/16.5T8MTS.P1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/a66bd523844f3ebf8025862b007b53e9?OpenDocument.↩︎

17. Embora, conforme refere o Tribunal da Relação de Lisboa, não exista norma legal expressa com tal conteúdo – cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de outubro de 2017 (Maria dos Prazeres Pizarro Beleza), Proc. n.º 1989/09.0TVPRT.P2.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/38f33c44b0c8358280256879006bc013?CreateDocument.↩︎

18. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de fevereiro de 2022 (Maria Clara Sottomayor), Proc. n.º 11243/14.0T2SNT.L2.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/fab7bcd14484aada802587e3003dfcb6?OpenDocument&Highlight=0,11243%2F14.0T2SNT.L2.S1. Vide também o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31 de janeiro de 2023 (Maria João Vaz Tomé), Proc. n.º 43/07.3TBVRS.E1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/a2d9dc5da160fcf48025894a003c036e?OpenDocument.↩︎

19. Cf. Pedro Romano Martinez, Cumprimento Defeituoso em Especial na Compra e Venda e na Empreitada, Coimbra, Almedina, 1994, p. 393; João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Coimbra, Almedina, 2020, pp. 157 e ss..↩︎

20. Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de janeiro de 2022 (Vieira e Cunha), Proc. n.º 27863/18.0T8LSB.L1.S1, http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/8ab67b642ebdbe2f802587c900540b75?OpenDocument&ExpandSection=1; de 20 de janeiro de 2022 (Nuno Pinto Oliveira), Proc. n.º 18575/17.3T8LSB.L1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/d06ee352079877b6802587d1007f866b?OpenDocument; de 7 de maio de 2020 (Nuno Pinto Oliveira), Proc. n.º 119262/16.9YIPRT.E1.S1 – disponível para consulta in https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:119262.16.9YIPRT.E1.S1; de 13 de outubro de 2020 (Ricardo Costa), Proc. n.º 5281/16.5T8MTS.P1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/a66bd523844f3ebf8025862b007b53e9?OpenDocument.↩︎

21. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de dezembro de 2022 (Manuel Augusto de Matos), Proc. n.º 497/19.5T8TVD.L1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/92490dc391716682802589190037a800?OpenDocument.↩︎

22. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de janeiro de 2022 (Nuno Pinto Oliveira), Proc. n.º 1451/16.4T8MTS.P1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/2bcdddb450012857802587d1005ffe99?OpenDocument&ExpandSection=1.↩︎