Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2791/07.9TBFIG.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: TELES PEREIRA
Descritores: DANOS PATRIMONIAIS PUROS
ACIDENTE DE VIAÇÃO
HONORÁRIOS
MANDATÁRIO
Data do Acordão: 02/25/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA FIGUEIRA DA FOZ – 3º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 483º, Nº 1 DO C. CIVIL; 25º E 26º REGUL. CUSTAS PROC.
Sumário: I – Num quadro em que é feita actuar uma situação de responsabilidade civil extracontratual, decorrente de um acidente de viação, não tem cabimento legal, por extravasar da cobertura do artigo 483º, nº 1 do CC, a formulação de um pedido indemnizatório por parte da entidade patronal da vítima desse acidente relativamente ao responsável (ao culpado desse acidente), em função da privação da utilização da força laboral desse trabalhador, em resultado da incapacidade gerada pelo acidente.

II – Tal indemnização à entidade patronal, referindo-se ela ao custo acrescido representado pela contratação cumulativa de um outro trabalhador para a mesma função, configura-se como um prejuízo reflexo, que não tem na sua base a violação de um direito subjectivo absolutamente protegido dessa entidade patronal, correspondendo ao que habitualmente se qualifica como danos patrimoniais puros.

III – Estes, como regra geral, não encontram guarida ou ressarcibilidade no nosso ordenamento em sede de imputação delitual.

IV – Os honorários do mandatário da parte que obtém ganho de causa são recuperados (total ou parcialmente) através das custas de parte (artigos 533º, nº 2, alínea d) do Novo Código de Processo Civil e 25º e 26º do Regulamento das Custas Processuais), não sendo atendível a consideração desse valor através da formulação de um pedido indemnizatório específico dirigido a esse valor.

Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra

I – A Causa

            1. Em 21/11/2007[1], A… e as sociedades F… – Serviço de Táxi, Lda. e Agência Funerária F…, Lda. (AA., aqui designados, respectivamente, 1º, 2ª e 3ª AA., todos são Apelantes nesta instância de recurso) demandaram a seguradora B… – Companhia de Seguros, S.A. (R. e aqui Apelada).

Invocam os três AA. a ocorrência, em 28/11/2004, na cidade da Figueira da Foz, de um acidente de viação consistente no embate, pelo veículo …-OC, cuja circulação era segurada pela R. (atribuindo os AA. a culpa do sinistro inteiramente ao segurado da R.), na traseira do veículo …-AF, conduzido pelo 1º A., propriedade da 2ª A., sendo que decorreram deste sinistro incidências danosas que abrangeram, além destes dois demandantes, a 3ª A. É de todos esses danos que aqui pretendem ser ressarcidos os três AA., formulando a tal respeito os seguintes pedidos:
“[…]
[D]eve a presente acção ser considerada procedente e provada e, em consequência  ser a R. condenada a pagar aos AA. a quantia de €92.615,14, sendo €61.552,01 para o 1º A., €19.063,13 para a 2ª A. e €12.000,00 para a 3ª A., acrescidas de juros de mora à taxa legal, desde a citação até efectivo embolso, bem como a pagar o montante correspondente aos honorários do mandatário dos AA., a liquidar ulteriormente, e ainda custas e procuradoria.
[…]”.

            1.1. A seguradora R. contestou por impugnação, fundamentalmente alegando desconhecimento, os pressupostos da imputação delitual pretendida fazer valer pelos AA.

            1.2. Foi o processo julgado pela Sentença de fls. 182/197corresponde esta à decisão objecto do presente recurso – no sentido da procedência parcial, através do seguinte pronunciamento decisório:
“[…]
1) Condenar a R. ‘B… – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.’ a pagar ao A. A…:
1.1) A quantia de €13.552,01, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros, desde a citação até integral pagamento, à taxa legal, determinada nos termos do artigo 559.º, n.º 1, do Código Civil;
1.2) A quantia de €15.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros, desde a condenação até integral pagamento, à taxa legal, determinada nos termos do artigo 559.º, n.º 1, do Código Civil.
2) Condenar a R. ‘B… – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.’ a pagar à A. ‘F… – SERVIÇO DE TÁXI, Lda.’:
2.1) A quantia de €8.563,13, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros, desde a citação até integral pagamento, à taxa legal, determinada nos termos do artigo 559.º, n.º 1, do Código Civil;
2.2) O montante que se vier a liquidar em execução de sentença, dentro do limite do pedido (€2.000,00), quanto ao dano emergente resultante de quantias pagas pela A. a terceiros, pelo desempenho de funções de motorista em substituição do A., impossibilitado por força da incapacidade parcial permanente resultante do acidente, no período compreendido entre Abril de 2005 e 21-11-2007; acrescido de juros, desde a citação até integral pagamento, à taxa legal, determinada nos termos do artigo 559.º, n.º 1, do Código Civil.
3) Condenar a R. ‘B… – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.’ a pagar à A. ‘AGÊNCIA FUNERÁRIA F…, Lda.’ o montante que se vier a liquidar em execução de sentença, dentro do limite do pedido (€2.000,00), quanto: ao dano emergente resultante de quantias pagas pela A. a terceiros, pelo desempenho de funções em substituição do A., impossibilitado por força da incapacidade parcial permanente resultante do acidente, no período compreendido entre Abril de 2005 e 21-11-2007; e/ou ao lucro cessante resultante de perda de receitas por não prestação de serviços em consequência da incapacidade parcial permanente resultante do acidente para o A. e por impossibilidade de assegurar a sua substituição, no período compreendido entre Abril de 2005 e 21-11-2007; acrescido de juros, desde a citação até integral pagamento, à taxa legal, determinada nos termos do artigo 559.º, n.º 1, do Código Civil.
4) Absolver a R. ‘B… – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.’ do demais peticionado pelos A.
[…]”.

            1.3. Inconformados com os montantes fixados e com a não consideração de algumas das indemnizações pedidas, apelaram os AA. – todos os AA. –, concluindo o seguinte na motivação do recurso que adrede apresentaram:
“[…]

II – Fundamentação

2. Na apreciação do recurso ter-se-á presente que o respectivo âmbito temático foi delimitado pelos Apelantes através das conclusões transcritas no antecedente item 1.3. [v. os artigos 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do Código de Processo Civil (CPC)[2]]. Com efeito, fora das conclusões só valem, nesta sede, questões que se configurem como de conhecimento oficioso (di-lo o trecho final do artigo 660º, nº 2 do CPC). Paralelamente, mesmo integrando as conclusões, não há que tomar posição sobre questões prejudicadas, na sua concreta incidência no processo, por outras antecedentemente apreciadas e decididas. E, enfim – esgotando o modelo de construção do objecto de um recurso –, distinguem-se os fundamentos deste (do recurso) dos simples argumentos esgrimidos por quem recorre ao longo da motivação, sendo certo que a obrigação de pronúncia do Tribunal ad quem se refere àqueles (às questões-fundamento) e não propriamente aos diversos argumentos jurídicos convocados ao longo das alegações.

Visa o recurso a discussão de praticamente todos os itens indemnizatórios fixados na Sentença recorrida, relativamente a cada um dos três AA., pretendendo estes aumentar os valores fixados, quanto a tipos de dano atendidos, torná-los já líquidos, quando na decisão recorrida foram remetidos para ulterior liquidação, e, no caso dos danos futuros das AA. sociedades e dos honorários do mandatário dos AA. (que nesta acção foram apresentados como dano indemnizável e incluídos no pedido), pretendem os AA. ver estes elementos reconhecidos no recurso, contra o entendimento da Sentença.

2.1. Importa assim particularizar os elementos de discussão da decisão da primeira instância introduzidos pela apelação.

(a) Quanto ao 1º A., o interveniente no acidente e directo lesado em função deste [3], pretende-se no recurso ampliar o montante dos danos não patrimoniais que lhe foram arbitrados em primeira instância, bem como o montante do dano patrimonial futuro referente à afectação da respectiva capacidade de ganho (dito na Sentença “dano biológico”). No caso dos danos não patrimoniais, fixou-os o Tribunal a quo em €15.000,00, pretendendo aqui o Apelante a atribuição de €30.000,00. No caso do “dano biológico” foi-lhe atribuída a indemnização de €10.000,00 e pretende ele a ampliação desta para €20.000,00. Referem-se a estes fundamentos as conclusões A) a D) (dano não patrimonial) e E) a G) (dano patrimonial futuro).

(b) Quanto às 2ª e 3ª AA. expressa o recurso – e trata-se do segundo fundamento deste – a pretensão de ver já liquidado (e liquidado nos termos por eles indicados na acção, através da equidade) o dano patrimonial correspondente à privação do serviço prestado pelo 1º A. em função do acidente, referindo-se a este fundamento as conclusões H) a M) no elenco acima transcrito, estando em causa uma parte em que a Sentença apelada condenou a R. (relegando o montante para ulterior liquidação) e uma parte em que essa decisão absolveu a R. (os danos ditos futuros dessa privação). Note-se que a seguradora R. – e trata-se de um elemento importante na economia decisória deste recurso – não recorreu da parte em que a este respeito foi condenada, não recorreu a R., aliás, da Sentença que a condenou.

(c) Finalmente, colocam os AA. à apreciação desta instância (conclusões N) e O)) o não atendimento, como item indemnizatório a fixar na Sentença, no quadro da imputação delitual aqui adjectivada, o montante dos honorários do mandatário respectivo.

2.1.1. Como ponto de partida, sublinhamos não contestarem os Apelantes os factos fixados na primeira instância, sendo eles – e considera-os esta instância fixados – os seguintes:
“[…]

            2.2. (a) Entrando na apreciação de cada um dos fundamentos da apelação, interessa-nos aqui, sempre relativamente ao 1º A., a fixação do dano não patrimonial referente aos padecimentos introduzidos pelas lesões decorrentes do acidente e a quantificação do dano futuro correspondente à diminuição da capacidade de ganho em função da desvalorização funcional parcial permanente (incapacidade permanente geral) decorrente das sequelas físicas do acidente (acidente cuja imputação delitual ao segurado da R. é aqui assumida como dado assente).

            2.2.1. (a) Com acima dissemos, o valor indemnizatório fixado na Sentença para o dano não patrimonial do 1º A. foi de €15.000,00, pretendendo este a ampliação de tal valor para €30.000,00, hipervalorizando os padecimentos físicos que sofreu e projecta no futuro.

            Estão em causa, como elementos relativos a este tipo de dano no caso concreto, fundamentalmente, dores e padecimentos induzidos por lesões traumáticas na zona da coluna, com uma expressão mais intensa contemporaneamente ao acidente, mas que se projectaram, e projectarão no futuro, em dores e incomodidades funcionais normalmente associadas (mesmo sem acidentes de viação) a este tipo de patologias ligadas a rectificações traumáticas da coluna e a hérnias discais. Falamos fundamentalmente – é isso o que encontramos na matéria de facto (v. os pontos 23, 25, 32, 35, 36 e 41) – de persistentes e incomodativas dores nas costas que de alguma forma afectam o dia a dia de uma pessoa, tornando-o variavelmente mais penoso.

            Sem querer desvalorizar o problema do 1º A., que é um problema real de muita gente, mesmo sem a origem exterior aqui em causa, não nos parece que o Apelante forneça elementos que confiram à sua situação, avaliada nesta perspectiva, uma expressividade que torne desadequado, por diminuto – miserabilista, como lhe chama –, o valor de €15.000,00. Com efeito, percorrendo a argumentação do Apelante, apenas encontramos a subjectividade, desapoiada de dados concretos, de quem pretende receber mais, porque entende que deve receber mais, sem fornecer premissas a esta conclusão/desejo.

            Vale aqui – não pode deixar de valer – uma dose considerável de subjectividade do julgador na atribuição de um valor, sendo que esta Relação – e não vemos bem o que dizer de diferente disto, quando o que diz o Apelante também não é muito diferente disto… – não considera desadequada, bem pelo contrário, uma indemnização de €15.000,00 por danos não patrimoniais, em vista das incidências conhecidas do caso concreto[4].

            Improcede, assim, este fundamento do recurso.

            2.2.2. (a) E também improcede a pretensão de alterar o valor indemnizatório atribuído, enquanto dano futuro, à desvalorização funcional permanente parcial (incapacidade permanente geral) do 1º A., desvalorização que aqui apresenta como base de cálculo a projecção futura de uma afectação negativa da capacidade com incidência laboral, sendo que esta foi pericialmente fixada (como adequadamente se reflectiu no elenco dos factos, v. o item 34) em 9% (v. fls. 145).

A respeito deste tipo de dano o artigo 564º do Código Civil (CC) manda “[…] atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis […]”, sendo essa a consideração que preside à fixação da indemnização aqui discutida. Esta, concretizada, como o considerou a Sentença apelada, na entrega de uma quantia única, antecipando a projecção futura do dano a que se refere, corresponde a uma técnica de cálculo muito comum na prática dos nossos tribunais e assenta numa racionalidade que esta Relação, numa decisão proferida pelo ora relator na apelação nº 1408/03.5TBILH.C1 (Acórdão de 16/10/2007), caracterizou nos seguintes termos (transcrevemos conservando as notas do original):
“[…]
Estamos, assim, no domínio da avaliação do dano que se projecta para o futuro sobre a capacidade de trabalho do lesado, de forma não transitória, e que tende a ser valorado, enquanto perda patrimonial passível de uma determinação aproximativa, por referência às seguintes três variáveis: (1) rédito laboral do lesado; (2) gravidade da lesão expressa numa determinada percentagem de invalidade laboral permanente; (3) idade do lesado[5]. […]
 [O] ressarcimento indemnizatório que se pretende determinar através destas fórmulas de cálculo (emprega-se o plural porque, assentando num princípio comum, são várias as fórmulas possíveis), tem por objecto, não só uma perda patrimonial concreta, expressa numa diminuição percentual da remuneração laboral (ganhava-se 100 e passou-se a ganhar 70), mas a realidade muito mais ampla da modificação negativa da capacidade activa futura, e muito particularmente da capacidade laboral, nas suas múltiplas facetas: não só a que se traduz numa perda determinada ou determinável da remuneração laboral percebida antes e depois do evento infortunístico, mas também aquela que, mantendo incólume essa remuneração, modifica negativamente a ulterior prestação de trabalho, tornando-a – repete-se, mesmo no quadro da permanência de um mesmo montante remuneratório – mais difícil e penosa, menos adaptada de um ponto de vista ergonómico, menos passível de progressão, mais incerta, etc.[6]. Ou seja, este dano (o referido à Incapacidade Parcial Permanente), como sugestivamente o caracteriza um autor italiano, corresponde a toda a ‘modificação pejorativa’ da capacidade de trabalho do sujeito[7]. Assim, a diminuição percentual atribuída a essa capacidade laboral pela Medicina Legal, expressa essencialmente uma quantificação, por equivalência ideal – ou, até mesmo, por ficção –, dessa ‘modificação pejorativa’.
Todavia, tenha-se presente que a circunstância da incapacidade laboral acarretar, ou não, como efeito directo, uma diminuição mensurável da remuneração, não deixa de constituir um elemento relevante, que, como tal, deve ser pesquisado e atendido na determinação do quantum indemnizatório. Sublinha-se, porém, que a não existência desse efeito concreto não exclui a consideração indemnizatória de uma incapacidade parcial permanente percentualmente expressa. E não exclui, sublinha-se também, que a indemnização neste caso possa ter como ponto de referência um cálculo assente nas três variáveis mencionadas.
Pretende-se, através da conjugação matemática destas variáveis – crédito laboral do lesado; percentagem de invalidade laboral permanente; idade do lesado –, determinar um valor de capitalização apto a servir de referência à fixação de um montante indemnizatório global[8], ‘[…] no sentido [e citamos um Acórdão desta Relação] de se atingir uma verba que permita ressarcir, durante a vida laboralmente útil do lesado, a perda sofrida, devendo tal quantia mostrar-se esgotada no fim do período considerado’[9]. Daí que este sistema, expresso em diversas fórmulas de cálculo, seja genericamente conhecido por ‘sistema da capitalização’[10], por referência ao princípio geral comum no qual se baseia: ‘[c]omo diriam os economistas [e voltamos a citar o mesmo Acórdão desta Relação], as fórmulas normalmente utilizadas permitem calcular qual o capital (C) que será necessário deter no ano inicial para obter em cada um dos N anos seguintes uma prestação constante (P), considerando que é possível fazer uma aplicação financeira à taxa anual líquida (I). Nessas condições, o capital C será o estritamente necessário para permitir o levantamento de P ao longo de cada um dos N anos, esgotando-se totalmente no final’. Na prática assenta este método de cálculo nos mesmos pressupostos da figura da remição de pensões própria do Direito infortunístico laboral (v. artigo 33º da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro), ou seja, na determinação de um valor (capital) de que o lesado terá de dispor para, procedendo ele próprio às aplicações financeiras, delas extrair o rendimento de que necessita no futuro. E diz-se isto – procedendo ele próprio, lesado, às aplicações financeiras –, pois a racionalidade económica de um seguro, quando este pressupõe o pagamento periódico de uma renda ou pensão, consiste grosso modo em a seguradora aplicar uma parte do capital dos prémios (determinada através do chamado cálculo actuarial), em termos de gerar um rendimento que lhe permita satisfazer as pensões no futuro. A remição ficciona a transferência dessa racionalidade para o lesado, através da entrega de um determinado capital. Note-se que a determinação actuarial dessa parte do capital dos prémios a afectar, assenta em tabelas contendo as chamadas ‘provisões matemáticas’ (o capital de que a seguradora tem de dispor no presente para poder pagar no futuro as pensões a que está obrigada por todos os anos de vida espectáveis do pensionista), sendo que os coeficientes dessas tabelas variam na razão directa da esperança de vida, e na razão inversa da taxa de juro (no jargão dos actuários: a ‘taxa técnica’ usada no cálculo do valor presente de uma renda vitalícia). É neste mesmo princípio que assentam as tabelas, respeitantes ao cálculo do capital de remição das pensões de acidente de trabalho, anexas à Portaria nº 11/2000, de 13 de Janeiro.
[…]”[11]

Ora, tendo sido com base neste método de quantificação que a decisão apelada encontrou o valor de €10.000,00 (o Apelante pretende o dobro), sendo inquestionáveis as premissas em que assentou essa quantificação e tendo sido correctamente aplicado o cálculo induzido por esses dados, não encontramos qualquer base factual que coloque em causa o valor fixado na primeira instância, dentro da lógica própria do modelo aí empregue (modelo que este Tribunal aceita). Aliás, numa ponderação geral da situação, não cremos muito sinceramente que o Apelante indique dados distintos dos aqui considerados (para além da especulação, sem uma base racional sólida, com a projecção da sua vida activa como empresário[12]), dados que, objectivamente, demonstrem ser inadequado o montante de €10.000,00 e adequado (com base numa incapacidade de 9 pontos obtidos por majoração no quadro de uma fixação pericial) o dobro deste valor.

Não se atende, pois, esta pretensão do 1º A., mantendo-se o valor fixado na Sentença.

2.3. (b) Interessa-nos agora, como segundo fundamento do recurso, a parte da decisão apelada que considerou como dano material das 2ª e 3ª AA. os custos inerentes à privação (privação para estas duas empresas) circunstancial do trabalho do 1º A., em função da indisponibilidade laboral deste, como incidência já ocorrida e que ocorrerá (futura), como elemento mediatamente induzido pelas consequências directas (directas para o 1º A.) do acidente de viação.

Existe neste aspecto da Sentença apelada, salvo melhor opinião, um erro de concepção quanto aos danos indemnizáveis de terceiros, em função do princípio geral da imputação delitual decorrente do artigo 483º, nº 1 do CC.

Com efeito, estaríamos – estamos – quanto à 2º e 3ª RR., no quadro da indemnização desta incidência (a privação da força laboral de uma pessoa em virtude de acidente que a esta afectou e foi causado por terceiro), perante consequências indirectas, sendo que estas, quando pretendidas erigir à classe de dano indemnizável em sede de responsabilidade civil extracontratual, configuram danos reflexos puramente económicos, correspondendo àquilo que doutrinariamente é usual qualificar-se, com base numa adaptação da terminologia alemã, como “danos patrimoniais puros”.

Nestes – e seguimos a caracterização de Manuel Carneiro da Frada[13] – ocorre um prejuízo (frequentemente através da indução de um gasto acrescido) que não resulta da ofensa de uma posição jurídica absolutamente protegida[14], no sentido em que podemos ilustrar a situação com o exemplo que aqui, precisamente, se configura quanto aos dois tipos de danos indemnizatoriamente considerados na Sentença quanto à 2ª A. (F… – Serviço de Táxi, Lda.).

Com efeito, foi esta 2ª A. indemnizada em primeira instância, como danos materiais, pelos estragos causados no veículo sua propriedade (…-AF) embatido pelo segurado da R. (foi indemnizada nesta parte com o valor correspondente à reparação deste veículo: €7.063,13). E, cumulativamente com esta indemnização – que temos por absolutamente correcta –, foi atribuída à mesma 2ª A. uma outra indemnização a liquidar ulteriormente, nos termos do artigo 661º, nº 2 do CPC, reportada ao custo acrescido que para esta A. representou a privação, por algumas vezes, no período compreendido entre Abril de 2005 a 21/11/2007, da prestação de trabalho pelo 1º R. (incapacitado pelo acidente) através da necessidade que esta empresa teve de contratar (pagar a) outra pessoa para substituir essa prestação de trabalho. Ora, no primeiro caso (no valor da reparação do veículo propriedade da 2ª A.) estamos perante o ressarcimento da violação directa do direito de propriedade desta A. sobre o veículo sinistrado, sendo que se configura aqui esse direito de propriedade, por referência ao princípio geral da imputação delitual (artigo 483º, nº 1 do CC), como direito de outrem ilicitamente violado.

Contrariamente, na indemnização por despesas acrescidas pela – chamemos-lhe assim – “privação do trabalho do 1º A.”, configura-se uma consequência indirecta do próprio acidente, referida à afectação de uma situação com incidência patrimonial para a 2ª A. (porventura um custo acrescido ou prejuízo), mas que não passou por uma violação de um direito subjectivo desta, pois não existe um direito subjectivo geral à incolumidade do património, que referencie um dever geral de indemnizar as situações que desvaliosamente o afectem. Existem, isso sim, situações especiais, decorrentes de relações especiais que afectam círculos específicos de sujeitos, que impõem a sujeitos específicos o dever de concretizar, ou de não afectar, determinadas posições creditícias referidas a um determinado património.

É com este sentido que se fala de danos patrimoniais puros e se entende que a responsabilidade delitual – a responsabilidade aqui feita valer por todos os AA. – não abrange, em geral, esse tipo de danos.

Como sugestivamente refere a este propósito Manuel Carneiro da Frada:
“[…]
[O] artigo 483º, nº 1 do CC, a norma central da responsabilidade aquiliana, é explícito ao requerer como pressuposto da responsabilidade – descontada agora a situação, por natureza particular, do desrespeito de uma (específica) disposição de protecção –, que a perda patrimonial sofrida pelo sujeito tenha sido consequência da violação de um direito subjectivo que lhe assistia: estão em causa direitos absolutos; ocorrendo a lesão de posições creditícias segue-se o regime da responsabilidade obrigacional dos artigos 798º e seguintes.
[…]”[15].

            E, no mesmo sentido, refere Maria João Pestana de Vasconcelos:
“[…]
[O] dano patrimonial puro, embora se repercuta necessariamente na situação patrimonial global de uma pessoa, não se identifica com o conceito de dano patrimonial relevante em matéria de responsabilidade civil delitual.
[…]
Com efeito, no artigo 483º o legislador não prescreve uma obrigação de indemnizar prejuízos, mas tão-só a obrigação de os indemnizar quando, em determinadas circunstâncias, tenha sido violado o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios. O dano patrimonial puro não será em princípio ressarcível em sede de responsabilidade civil delitual já que a sua especificidade reside precisamente na inexistência de uma prévia violação de um direito subjectivo absolutamente protegido do lesado.
Assim, a ressarcibilidade dos danos patrimoniais puros parece ter a sua sede própria no âmbito da responsabilidade civil obrigacional já que, neste tipo de responsabilidade, os danos causados em consequência do incumprimento de uma obrigação se repercutem no património do credor, não dependendo o direito de indemnização da violação de um direito subjectivo absolutamente protegido.
São inúmeros os exemplos que poderíamos invocar para ilustrar esta categoria de prejuízos. Nela estão compreendidos, desde logo, os danos patrimoniais reflexamente sofridos por terceiros em consequência de um facto ilícito gerador de responsabilidade. Assim, por exemplo, se A, cantora de ópera, é atropelada por B e sofre ferimentos, será este obrigado a indemnizá-la pelo dano que lhe causou. Porém, B já não será obrigado a indemnizar C, dono da sala de espectáculos onde A deveria actuar, nem os detentores dos bilhetes, já que os danos sofridos por estes, em consequência da violação do direito à integridade física de A. são danos patrimoniais puros.
[…]
[O] certo é que […] o nosso sistema de responsabilidade civil não permite a ressarcibilidade delitual de danos patrimoniais puros, salvo quando exista uma disposição de protecção que tenha por objecto a tutela de interesses primariamente patrimoniais; onde esta não exista, a regra da irressarcibilidade delitual deste tipo de prejuízos deverá manter-se.  
[…]”[16].

            2.3.1. (b) Revertendo estas considerações ao caso concreto, encarando a situação especial em que a Sentença atribuiu às 2ª e 3ª AA. indemnizações pela privação da utilização da força laboral do 1º A. – pelos custos acrescidos induzidos por essa privação –, entendemos que tais indemnizações, delitualmente imputadas ao segurado da R. (já que é este o fundamento da atribuição dessas indemnizações à R.), se integram inegavelmente à categoria de danos patrimoniais puros (danos reflexos não resultantes da violação pelo segurado da R. de um direito subjectivo dessas duas AA.) e, em função dessa natureza, contrariamente ao que foi entendido, não recebem a cobertura geral do artigo 483º, nº 1 do CC, mesmo reportada à segunda parte deste nº 1 (“[…] disposição legal destinada a proteger interesses alheios […]”[17]), e não deveriam ter sido (essas indemnizações) atribuídas.

            Todavia, porque o foram, e porque a seguradora R. não recorreu da decisão que nessas indemnizações a condenou, são tais itens indemnizatórios – referimo-nos aqueles que o Tribunal fixou pela incapacidade do 1º A. prestar trabalho às 2ª e 3ª AA. no período de Abril de 2005 a 21/11/2007 com o limite de €2.000,00[18] –, são estes itens indemnizatórios, dizíamos, intangíveis a este Tribunal de recurso, dada a proibição de reformatio in pejus. Será este elemento da condenação, pois, mantido neste recurso, designadamente quanto à remessa para ulterior liquidação, já que a pretendida fixação por recurso à equidade pressupõe, nos termos do nº 3 do artigo 566º do CC, que não possa ser fixado o montante correspondente ao valor do prejuízo, que se contenha nos limites do pedido [19]. Aqui, tratando-se fundamentalmente de fixar o que as 2ª e 3ª AA. pagaram a outros motoristas para substituir o trabalho que deveria ser prestado pelo 1º A. num determinado período, pode ser determinado – queremos dizer que pode ainda ser determinado – esse valor, obviamente através de uma ulterior liquidação incidental nos termos do artigo 661º, nº 2 do CPC.

2.3.2. (b) Esta proibição de reformatio in pejus não vale, todavia, quanto ao chamado dano patrimonial futuro das 2ª e 3ª AA., correspondente à projecção do custo para estas AA. da (futura) privação do trabalho do 1º A., já que este item indemnizatório não foi considerado na Sentença apelada, não estando esta Relação ao manter essa não consideração a reformar em prejuízo um pronunciamento favorável não recorrido, mesmo que o fundamento dessa não alteração no recurso seja distinta – porventura diametralmente distinta – da da primeira instância.

Ora, quanto ao não atendimento deste elemento indemnizatório pretendido pelas 2ª e 3ª AA., vale o que acima se disse sobre a natureza de danos patrimoniais puros dos custos induzidos para estas AA. pela privação da força laboral do 1º A., valendo aqui o que se disse, e que ora se reafirma, quanto à exclusão da ressarcibilidade desse tipo de danos no quadro de imputação delitual aqui em causa.

Não há, pois, que alterar esse elemento absolutório da R.

2.4. (C) Interessa apreciar, finalmente, a questão dos honorários do mandatário das AA. como pedido indemnizatório decorrente da imputação delitual aqui desencadeada.

Concordamos neste ponto com a Sentença apelada, correspondendo o entendimento que nela se expressa a este respeito, precisamente, ao ponto de vista do ora relator, como resulta do Acórdão desta Relação de 13/03/2007[20]. A este respeito importa apenas sublinhar, adaptando a argumentação ao exacto enquadramento legal que aqui se aplica em matéria de custas (que é o resultante do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei nº 34/2008, de 26 de Fevereiro, alterado pela Lei nº 7/2012, de 13 de Fevereiro, valendo a respeito desta aplicação o artigo 8º desta). Sublinha-se assim, que a função aqui relevante da “procuradoria” no quadro do anterior Código das Custas Judiciais passou a corresponder a um dos elementos das custas de parte (v. artigo 447º-D, nº 2, alínea d) e 454º, nº 1 do CPC[21]) previstas nos artigos 25º e 26º do Regulamento (v. o artigo 26º, nº 3, alínea c) do Regulamento).

Tal como sucedia de antanho com a procuradoria[22], vale para as custas de parte uma função supressora ou de ressarcimento do gasto com honorários do vencedor. Note-se que este aspecto (o possível reembolso ao vencedor dos honorários do seu advogado) recebe um tratamento distinto em diversas ordens jurídicas. Com efeito, em Direito Comparado, reconhecem-se nesta matéria, fundamentalmente, duas orientações: o chamado “Sistema Americano” (American rule) e o chamado “Sistema Inglês” (English rule)[23]. No primeiro destes, os honorários do advogado são considerados (fora do quadro equivalente ao nosso apoio judiciário) um custo económico tolerável para a generalidade das pessoas e, como tal, não recuperável através da indemnização em que for condenada a parte vencida, salvo em situações nas quais uma Lei (ou um contrato) mande imputar esse custo à parte vencida[24]. Na segunda situação – English rule, também referida como regra “o vencido paga” (loser pays) – a parte vencida na lide é responsável pelo valor dos honorários do advogado da parte que vence. Este sistema, que é o do Direito inglês e o prevalecente nos Sistemas Continentais, como é o caso do nosso, divide-se por sua vez no grupo em que a “recuperação” desse custo se faz directamente através do pedido indemnizatório (é o que sucede em Inglaterra[25], fora do quadro da chamada “legal aid”) ou é incluído na compensação que (“oficialmente”[26]) é devida à parte vencedora. O sistema português, através figura da procuradoria, hoje em dia das custas de parte, integra-se neste último grupo: inclusão desse custo na tributação da acção e imputação desse custo à parte vencida, sendo que fora do valor legalmente estipulado, o encargo de honorários, assentando numa relação contratual entre o mandante e o mandatário, constitui um custo daquele.

Estão, assim, os honorários do Advogado dos Apelantes, fora do alcance indemnizatório configurado por estes nesta acção.

2.5. Chegados a este ponto, flui do exposto que a Sentença proferida em primeira instância se manterá integralmente, não obstante a aberta divergência com ela que, quanto à consideração dos chamados danos patrimoniais puros, expressámos neste Acórdão (item 2.3. (b) e 2.3.1. (b), supra). Tal divergência, como se disse, é aqui inoperante quanto à parte da indemnização fixada que consideramos corresponder a danos patrimoniais puros, dada a falta de impugnação da parte afectada.

Resta-nos, assim, confirmá-la aqui, sumariando os elementos essenciais (os julgados com maior interesse pelo ora relator) da economia argumentativa deste Acórdão:
I – Num quadro em que é feita actuar uma situação de responsabilidade civil extracontratual, decorrente de um acidente de viação, não tem cabimento legal, por extravasar da cobertura do artigo 483º, nº 1 do CC, a formulação de um pedido indemnizatório por parte da entidade patronal da vítima desse acidente relativamente ao responsável (ao culpado desse acidente), em função da privação da utilização da força laboral desse trabalhador, em resultado da incapacidade gerada pelo acidente;
II – Tal indemnização à entidade patronal, referindo-se ela ao custo acrescido representado pela contratação cumulativa de um outro trabalhador para a mesma função, configura-se como um prejuízo reflexo, que não tem na sua base a violação de um direito subjectivo absolutamente protegido dessa entidade patronal, correspondendo ao que habitualmente se qualifica como danos patrimoniais puros;
III – Estes, como regra geral, não encontram guarida ou ressarcibilidade no nosso ordenamento em sede de imputação delitual;
IV – Os honorários do mandatário da parte que obtém ganho de causa são recuperados (total ou parcialmente) através das custas de parte (artigos 533º, nº 2, alínea d) do Novo Código de Processo Civil e 25º e 26º do Regulamento das Custas Processuais), não sendo atendível a consideração desse valor através da formulação de um pedido indemnizatório específico dirigido a esse valor.

III – Decisão

            3. Assim, na improcedência do recurso, aqui se confirma a Sentença apelada.

            Custas da apelação a cargo dos AA./Apelantes.

Tribunal da Relação de Coimbra, recurso decidido em audiência na sessão desta 3ª Secção Cível realizada no dia 25/02/2014.

(J. A. Teles Pereira)

(Manuel Capelo)

(Jacinto Meca)


[1] Trata-se da data da propositura da presente acção, marcando ela a aplicação à presente instância de recurso do regime anterior ao introduzido pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto (v. os respectivos artigos 11º, nº 1 e 12º, nº 1), não se aplicando – estamos a referir-nos à instância de recurso – o Novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, por não estar integrada a previsão do nº 1 do artigo 7º da referida Lei preambular (a decisão recorrida, que é a Sentença de fls. 182/197, é anterior a 01/09/2013, v. o artigo 8º do mesmo Diploma; cfr. ainda, António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, 2013. p. 15). 
[2] V. o Acórdão do STJ de 03/06/2011 (Pereira da Silva), proferido no processo nº 527/05.8TBVNO.C1.S1, cujo sumário está disponível na base do ITIJ, directamente, no seguinte endereço:
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/f9dd7bb05e5140b1802578bf00470473:
Sumário:
“[…]
[O] que baliza o âmbito do recurso, tal sendo, afora as de conhecimento oficioso, as questões levadas às conclusões da alegação do recorrente, extraídas da respectiva motivação (artigos 684.º n.º 3 e 690.º n.º 1 do CPC), defeso é o conhecimento de questão não aflorada naquelas, ainda que versada no corpo alegatório.
[…]”.
[3] O sublinhado enfatiza um elemento central da fixação indemnizatória aqui operada pela primeira instância, na sequência do pedido das 2ª e 3ª AA. Referimo-nos à circunstância destas, no que se refere aos valores indemnizatórios decorrentes da incapacidade do 1º A. lhes prestar trabalho (às 2ª e 3ª AA.), se apresentarem como lesadas indirectas que pretendem – e que, de alguma forma, conseguiram (quanto mais não seja porque a R. B… não recorreu…) – ver ressarcidos, num quadro de responsabilidade civil extracontratual, danos patrimoniais puros, quando o ressarcimento destes, ao abrigo do artigo 483º, nº 1 do Código Civil, nos parece estar excluída. Adiante no texto retornaremos a esta questão.
[4] Também são convocáveis aqui argumentos que envolvem alguma comparação de situações, nem que seja por contraste, e sem querer estabelecer comparações com o que não tem comparação possível, não deixam os três subscritores deste Acórdão, que também o foram do Acórdão desta Relação de 25/09/2012 (http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/71873d6bb9f1eb1680257aa1003976), de constatar, comparativamente, os valores em causa nas duas situações, face à incomparável magnitude dos danos não patrimoniais envolvidos em ambos os casos. Deste argumento – desta impressão subjectiva obtida ponderando as duas situações – extraímos aqui a asserção de não ser “miserabilista” o valor fixado na decisão recorrida.    
[[5]] Vd. Massimo Franzoni, “La Liquidazioni Del Danno Alla Persona”, Vol. XIV do Trattato di Diritto Comérciale e di Diritto Pubblico Dell’Economia (direc. Francesco Galgano), Pádua, 1990, p. 8.
[[6]] Constitui este entendimento, jurisprudência constante do Supremo Tribunal de Justiça [v., por todos, o Acórdão de 02/10/2003 (Moitinho de Almeida; Proc. nº 03B2524), disponível em www.dgsi.pt/jstj.nsf].
[[7]] Fulvio Mastropaolo, Il risarcimento del danno alla salute, Nápoles, 1983, p. 322.
[[8]] Global, no sentido de constituir uma prestação única, operando-se através desta como que uma remição de uma prestação que, na sua essência, deveria ser periódica.
[[9]] Acórdão da Relação de Coimbra de 04/04/1995 (Silva Graça), publicado na Colectânea de Jurisprudência, Tomo II/1995, pp. 23/26 (25).
[[10]] Massimo Franzoni, “La Liquidazioni Del Danno…”, cit. pp. 63/66.
[11] Trata-se de decisão inédita proferida nesta Secção na sessão do dia 16 de Outubro de 2007.
[12] Esquecendo que para essa actividade até será pouco relevante o tipo de desvalorização funcional aqui em causa.
[13] Teoria da Confiança e Responsabilidade Civil, Coimbra, 2004, pp. 238/239.
[14] Estes são definidos por Maria João Pestana de Vasconcelos, “[…] como um tipo de dano em que há uma perda patrimonial sem que tenha existido prévia violação de um direito subjectivo absolutamente protegido” (“Algumas questões sobre a ressarcibilidade delitual de danos patrimoniais puros no ordenamento jurídico português”, in Novas Tendências da Responsabilidade Civil, Coimbra, 2007, p. 149) 
[15] Teoria da Confiança…, cit. pp. 238/239.
[16] “Algumas questões sobre a ressarcibilidade delitual de danos patrimoniais puros…”, cit., pp. 149/152 e 200/201.
[17] Que aqui também não existe referida a um “direito geral” das 2ª e 3ª AA. a não terem de suportar custos laborais adicionais por indisponibilidade de trabalhadores concretos. Maria João Pestana de Vasconcelos aponta como disposições de protecção para o efeito da segunda parte do nº 1 do artigo 483º, nº 1 do CC a cláusula geral de proibição de concorrência desleal e o abuso de direito (“Algumas questões sobre a ressarcibilidade delitual de danos patrimoniais puros…”, cit., pp. 183/191 e 191/199).
[18] Que correspondem na Sentença, na parte contendo as condenações, ao ponto 2.2. quanto à 2ª A. e ao ponto 3 quanto à 3ª A.
[19]Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados”.

[20] Também subscrito pelo ora 2º Adjunto, no processo nº 667/05.3TBGRD.C1, disponível em:

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/67f61d7cbcd20acb802572a5003faa33.

Sumário (no trecho aqui relevante):

“[…]
III – Os honorários forenses, enquanto espécie indemnizatória específica, estão contemplados na chamada procuradoria, prevista nos artºs 40º e segs. do C.C.J.
IV – Há mais de um século que a nossa lei utiliza o conceito procuradoria com o significado de compensação pelo vencido ao vencedor do litígio em razão do dispêndio com o patrocínio judicial.
V – Só assim não sucede, ou seja, só se procede a uma ponderação indemnizatória específica de tais despesas em termos da sua atribuição a quem as desembolsou, no quadro excepcional da condenação por litigância de má fé – artº 457º, nº 1, al. a), do CPC.

[…]”.
[21] Actualmente, no Novo Código de Processo Civil, artigo 533º, nº 2, alínea d).
[22] “Há mais de um século que a nossa lei utiliza o conceito procuradoria com o significado de compensação pelo vencido ao vencedor do litígio em razão do dispêndio com o patrocínio judicial (artigo 75º da Tabela de Emolumentos e Salários Judiciais de 1896).
A procuradoria tem sido entendida como o reembolso à parte vencedora do dispêndio com o mandato judicial […]” (Salvador da Costa, Código das Custas Judiciais anotado e comentado, 3ª ed., Coimbra, 2000, p. 238, em anotação ao artigo 40º).
Daí que, na pureza original do nosso sistema de custas, referência esta que vale, segundo Eduardo Arala Chaves (Código das Custas Judiciais anotações e comentários, Coimbra, 1962, p. 114), para a redacção original do artigo 67º, § 2º do CCJ de 1940, “[…] não h[ouvesse] lugar a procuradoria se a parte não est[ivesse] representada por advogado ou solicitador”. Não obstante esta pureza original ter sido algo desvirtuada desde a reforma que, subsequentemente ao Decreto-Lei nº 36551, de 22 de Outubro de 1947, previa a contagem da procuradoria, quando inexistisse patrocínio do vencedor, em favor de entidades públicas (v. o nº 6 do artigo 40º do CCJ), a procuradoria nunca perdeu essa original natureza intrínseca, agora transposta para as custas de parte, reintroduzindo-se a regra de só serem devidas existindo constituição de mandatário (artigo 26º, nº 5 do Regulamento, v. Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais anotado, 5ª ed., Coimbra, 2013, pp. 322/323, sublinhando essa comum funcionalidade das custas de parte relativamente à procuradoria na lei anterior).
[23] V., na Wikipedia, as entradas “Attorney’s fee”, “American rule (legal term)” e “English rule (legal term)”, respectivamente nos endereços da Wikipedia em http://en.wikipedia.org/wiki/Attornys%27_fees; http://en.wikipedia.org/wiki/American_rule e http://en.wikipedia.org/wiki/English_rule.
[24] Como sucede nos Estados Unidos no caso das acções propostas contra o Estado, nos termos da Lei de 1980 denominada Equal Acess to Justice Act (v. Black’s Law Dictionary, 6ª ed., St. Paul Minnesota, 1990, p. 536). Note-se que a prática dos Tribunais americanos, admite excepções a este sistema: “[t]he traditional «American rule» is that attorney fees are not awardable to the winning party (i.e. each litigant must pay his own attorney fees) unless statutorily or contractually authorized; however exceptions exist in that award may be made to successful party if the opponent has acted in bad faith […]” (Black’s Law…, cit. p. 82; cfr. o texto de Walter Olson, “Loser Pays”, disponível no sítio www.pointoflaw.com/loserpays/overview.php). Note-se que a racionalidade da American rule tende a ser explicada, recorrendo à Análise Económica do Direito, com base na ideia de que a regra contrária desincentivaria as pessoas de recorrerem ao tribunal, por antecipação desse acrescido “custo de transacção” consistente no pagamento dos honorários do advogado da parte contrária (v. o estudo comparativo do funcionamento dos dois sistemas de Peter J. Coughlan e Charles R. Plott, An Experimental Analysis of the Structure of Legal Fees: Amerivan Rule vs. English Rule, disponível em http://ideas.repec.org/p/cct/sswopa/1025.html).
[25] Cfr. Walter Olson, “Loser…”, cit.
[26] Expressando-se de diversas formas nos vários sistemas que a prevêem, assume essa “oficialidade” entre nós a característica consistente no seu tratamento em sede de custas, entendidas estas em sentido amplo, como correspondendo a toda a tributação respeitante à actividade judiciária.