Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0118/09.4BEVIS 01293/17
Data do Acordão:10/06/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS
VALOR PATRIMONIAL TRIBUTÁRIO
TERRENO PARA CONSTRUÇÃO
AMPLIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
DISPENSA DO PAGAMENTO
REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA
Sumário:I - O método de determinação do valor patrimonial (VPT) dos terrenos para construção adoptado pelo CIMI, e que constava do art. 45.º, na redacção anterior à que lhe foi introduzida pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2012), era muito semelhante ao dos edifícios construídos, partindo-se da avaliação das edificações autorizadas ou previstas.
II - No entanto, na fórmula final de cálculo do VPT dos terrenos para construção, era de afastar, para além do mais, a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse factor já está contemplado na percentagem prevista no n.º 3 do art. 45.º do CIMI.
III - O tribunal ad quem só pode conhecer da ampliação do objecto do recurso requerida pelo recorrido nos termos do art. 636.º do CPC caso o recurso interposto pelo recorrente deva ser julgado procedente.
IV - Nos casos em que o valor da causa excede € 275.000,00, justifica-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida em 1.ª instância e no recurso jurisdicional (cf. art. 6.º, n.º 7, do RCP) se a conduta processual das partes não obstar a essa dispensa e se, não obstante a questão aí decidida ser de complexidade inferior à comum, o montante da taxa de justiça devida se afigurar manifestamente desproporcionado em face do concreto serviço prestado, pondo em causa a relação sinalagmática que a taxa pressupõe.
Nº Convencional:JSTA000P28208
Nº do Documento:SA2202110060118/09
Data de Entrada:11/22/2017
Recorrente:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A..............., LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 118/09.4BEVIS
Recorrente: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT)
Recorrida: “A……………, Lda.”

1. RELATÓRIO

1.1 A Representante da Fazenda Pública junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que aquele Tribunal, julgando procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade acima identificada, anulou o acto que, em sede de 2.ª avaliação e em 2008, fixou o valor patrimonial tributário (VPT) a diversos terrenos para construção.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«1) Conforme resulta dos factos provados sob os pontos 1 a 6, as avaliações impugnadas referem-se às segundas avaliações que foram efectuadas aos terrenos para construção, inscritos na matriz predial urbana sob os artigos ….., ……, …., …., …., …., …., …., ….., ….., ….., ….., ….., …. e ….. da freguesia de Vera Cruz, e que foram efectuadas ao abrigo do art. 45.º do CIMI.

2) Na sentença sob recurso defende-se que a liquidação é ilegal porque a AT na avaliação dos terrenos em causa, inclui na operação de cálculo o coeficiente de localização que não decorre do regime previsto no artigo 45.º do CIMI, aplicável aos terrenos para construção.

3) Posição com a qual não concordamos uma vez que, esse coeficiente resulta da lei para a determinação do VPT do terreno para construção.

4) O regime de avaliação do valor patrimonial tributário (VPT) dos terrenos para construção está previsto no artigo 45.º do CIMI.

5) O modelo de avaliação dos terrenos para construção é igual ao dos edifícios construídos, mas partindo-se da avaliação do edifício a construir, com base no respectivo projecto.

6) Conforme resulta do art. 45.º n.º 1 do CIMI, o VPT dos terrenos para construção resulta do somatório do valor de duas áreas: 1) o valor da área de implantação do edifício a construir; 2) o valor do terreno adjacente à implantação.

7) Para determinar o valor da área de implantação do edifício a construir, é necessário proceder-se à avaliação do edifício a construir, como se já estivesse construído, e para tal utiliza-se o projecto de construção aprovado e na área não se considera, naturalmente a área do terreno livre nem a área do terreno excedente.

8) Uma vez que o legislador concebeu o modelo de avaliação dos terrenos para construção, partindo-se do edifício a construir, a fórmula de cálculo do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção tem de conter os elementos considerados determinantes na avaliação dos prédios urbanos edificados prevista no art. 38.º do CIMI, para determinar o valor dos prédios a construir.

9) Só não é relevado o coeficiente de vetustez (Cv), por razões óbvias, já que o prédio a edificar no terreno não foi concluído, por isso, não decorreu quaisquer anos desde a conclusão das obras de edificação.

10) Apurado o valor das edificações autorizadas ou previstas para o terreno para construção, tendo por base os vários factores da expressão constantes no art. 38.º do CIMI, reduz-se o valor apurado a uma percentagem entre 15% e 45%, como prevê o n.º 2 do art. 45.º do Código do IMI.

11) E quanto à razão de ser para tal redução, a mesma assenta no facto de o prédio não estar ainda construído.

12) Ora uma vez que o valor da área de implantação pode variar entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas, então aquele valor só pode ser o que resulta da aplicação do sistema geral de avaliações dos prédios urbanos (artigo 38.º e seguintes do CIMI) ao projecto de construção em causa na avaliação do VPT dos terrenos para construção.

13) Na fixação dessa percentagem diz-nos os n.ºs 2 e 3 do art. 45.º do CIMI, que se tem em consideração as características referidas no n.º 3 do art. 42.º do CIMI.

14) Por sua vez, o valor da área adjacente à construção (a outra parcela do somatório que determina o VPT dos terrenos para construção nos termos do n.º 1 do art. 45.º do CIMI) é calculado nos termos do art. 40.º n.º 4 do CIMI.

15) O douto Tribunal a quo entende que não é de considerar o coeficiente de localização na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção.

16) Vejamos qual é a origem do coeficiente de localização.

17) O Código do IMI estabelece 4 factores determinantes do coeficiente de localização no n.º 3 do art. 42.º do CIMI, acessibilidades, considerando-se como tais a qualidade e a variedade das vias rodoviárias, ferroviárias, fluviais e marítimas, proximidade de equipamentos sociais, designadamente escolas, serviços públicos e comércio, serviços de transporte públicos, localização em zonas de elevado valor de mercado imobiliário.

18) A lei estabelece que por cada Serviço de Finanças existe, pelo menos, um perito local, cuja função é avaliar os imóveis da respectiva área de competência, bem como elaborar a proposta de zoneamento da área territorial de cada serviço de Finanças. (art. 64.º n.º 1 do CIMI)

19) São portanto os peritos locais que devem recolher no mercado imobiliário a informação necessária à determinação da zona e ao apuramento do coeficiente de localização específico de cada uma delas.

20) O coeficiente de localização previsto no art. 42.º CIMI constitui um valor aprovado por Portaria do Ministro das Finanças sob proposta do CNAPU, nos termos do artigo 62.º do CIMI.

21) Analisada a Portaria 982/2004 de 4/8 que foi utilizada no caso dos autos, verifica-se que atribui a Aveiro-1 um coeficiente de localização, para habitação, que se situa entre o valor mínimo de 0.35 e o máximo de 2.25.

22) O procedimento adoptado em sede de avaliação, os critérios seguidos foram aqueles que se encontram definidos no CIMI.

23) A impugnante veio por em causa o coeficiente de localização, mas tal coeficiente encontra-se fixado em portaria não podendo a comissão de avaliação deixar de aplicar o que se encontrava em vigor, de 1,95.

24) Os critérios estabelecidos quanto aos coeficientes de localização que afectam o valor dos prédios edificados de harmonia com o previsto no n.º 3 do artigo 42.º do CIMI e que se encontram estipulados na Portaria n.º 982/04 de 4 de Agosto são de aplicação cumulativa, e não alternativa, com a percentagem prevista no n.º 2 do art. 45.º no referente ao valor da área de implantação dos terrenos para construção.

25) Assim foi decidido no Acórdão do STA de 14/07/2010 in processo 0377/10, relator Miranda Pacheco.

26) O douto tribunal a quo entende que não é de considerar o coeficiente de localização na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção. Mas a aplicação desse factor resulta da lei, quando estabelece que o valor da área da implantação é determinado em função do valor das edificações autorizadas ou previstas, e esse só pode ser o que resulta da aplicação do sistema de avaliações ao projecto de construção.

27) Daqui resulta que, na avaliação dos terrenos para construção (cfr. art. 45.º CIMI), o legislador quis que fosse aplicada a metodologia de avaliação dos prédios urbanos em geral, assim se devendo levar em consideração todos os coeficientes constantes na expressão prevista no art. 38.º do CIMI, nomeadamente, o coeficiente de localização (Cl) previsto no art. 42.º do CIMI, mais resultando tal imposição legal do n.º 3 do art. 45.º do CIMI, ao remeter para o valor das edificações autorizadas ou previstas. (Vide Jurisprudência do TCA Sul de 28/02/2012, proc. 05290/12, de 11/06/2013, proc. 05929/12 e TCA Norte de 26/04/2012, proc. 01250/07.4BEBRG).

28) Igual entendimento é aplicável ao coeficiente de qualidade e conforto (Cq), dado que essa utilização deriva da própria lei. (Vide Jurisprudência do TCA Sul de 14/02/2012, proc. 04950/11 e de 08/05/2012, proc. 05402/12).

29) E o mesmo entendimento se aplica ao coeficiente de localização.

30) No presente caso, conforme resulta do probatório (pontos 1 a 6) na avaliação efectuada aos imóveis foi ponderado que os prédios em causa consistem em terrenos destinados à construção, cuja capacidade construtiva foi obtida através de um alvará de loteamento, conforme resulta das fichas de avaliação.

31) Daqui ser forçoso concluir que, o valor patrimonial tributário fixado para os terrenos para construção, aqui em causa, não padece de qualquer ilegalidade por ter cumprido os trâmites legais constantes dos arts. 45.º, 41.º, 43.º, 38.º, 42.º n.º 3 todos do CIMI.

32) Em suma, a Administração tributária não incorreu em vício de violação de lei, porque utilizou as fórmulas e os coeficientes na lei para a determinação do VPT dos terrenos para construção, logo a avaliação ora impugnada apresenta-se correta por respeitar os requisitos legais e não padece de qualquer vício de lei que possa conduzir à sua anulação.

33) A douta sentença recorrida, ao decidir como decidiu, violou o disposto nos arts. 45.º, 41.º, 43.º e 38.º todos do CIMI.

34) A recorrente pede ainda a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do artigo 616.º n.º 3 do CPC.

35) Em 27-04-2017, a Fazenda Pública foi notificada da sentença proferida, bem como para efectuar o pagamento da taxa de justiça inicial no valor de € 1.632.00, nos termos do disposto no artigo 15.º, n.º 2, do Regulamento de Custas Processuais (RCP).

36) Em matéria de custas, como estamos perante um processo instaurado depois da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26/02, que aprovou o novo Regulamento das Custas Processuais (RCP) logo é este Regulamento que se aplica.

37) A propósito da base de cálculo da taxa de justiça, o artigo 11.º do RCP estabelece que a taxa de justiça é, para cada parte, a constante da tabela do anexo I, sendo calculada sobre o valor das acções.

38) O artigo 13.º n.º 1 do RCP, dispõe que a taxa de justiça é paga nos termos fixados no CPC, aplicando-se as respectivas normas, subsidiariamente, aos processos criminais e contra-ordenacionais, administrativos e fiscais.

39) O artigo 6.º n.º 7 RCP, estipula que nas causas de valor superior a € 275.000,00 o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, sem prejuízo de, se a especificidade da situação o justificar, o juiz, de forma fundamentada e atendendo, designadamente, à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento do remanescente.

40) A base tributável, para efeitos de pagamento de taxa de justiça, corresponde ao valor da acção, o qual foi fixado na sentença proferida em € 3.383.670.00.

41) O valor da UC passou a ser de € 102.00, a partir de 20/04/2009, com a entrada em vigor do DL 34/2008 de 26/02.

42) Ora, a taxa de justiça inicial devida, prevista para acções de valor igual a € 250.000,01 a € 275.000,00, na tabela do anexo I ao CCJ, nos termos do disposto no n.º 1 dos artigos 13.º e 23.º do mesmo Código, ascende a 16 UC, o que corresponde a € 1.632.00.

43) Para além de € 275.000.00, à taxa de justiça do processo acrescia, por cada € 25.000,00 ou fracção, ….. UC de harmonia com o previsto no rodapé da tabela do anexo I ao RCP. Assim sendo, a taxa de justiça devida pela Fazenda Pública ascenda a € 1.632.00.

44) O cálculo do remanescente conforme corpo das presentes alegações ascende a € 39.576.00.

45) Sucede, que, in casu, deve ser dada aplicação ao preceituado artigo 6.º n.º 7 do RCP, que permite ao julgador dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça verificadas que seja as excepcionais circunstâncias aí previstas ou outras que devam ser relevadas.

46) Como o Supremo Tribunal Administrativo (STA) tem vindo a afirmar, a dispensa do remanescente da taxa de justiça, tem natureza excepcional, pressupõe uma menor complexidade da causa e uma simplificação da tramitação processual aferida pela especificidade da situação processual e pela conduta das partes.

47) O que, salvo melhor opinião, se verificou no caso sub judice, conforme o invocado no corpo das presentes alegações.

48) Assim sendo, atenta a menor complexidade da causa e a conduta processual das partes, que não pode considerar-se num nível reprovável, tendo-se limitado à discussão da questão jurídica e fornecendo os elementos necessários à boa decisão da causa, afigura-se justo, salvo o devido respeito, que seja dispensado o pagamento do remanescente da taxa de justiça, quer porque a especificidade da situação o justificar, quer por assim o imporem os princípios da proporcionalidade e de promoção e garantia de acesso à justiça previstos nos artigos 16.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa (CRP).

49) Com efeito, só a actuação moderadora do Meritíssimo Juiz, no caso vertente, conduzirá a que as taxas de justiça sejam as adequadas, necessárias e se fixem contrapartida justa do serviço de justiça prestado pelo Estado, desta forma, se assegurando as condições imprescindíveis ao efectivo exercício do direito de acesso ao Direito e aos Tribunais, isto é, a uma tutela jurisdicional efectiva enquanto pilar fundamental de um Estado de Direito.

50) Caso contrário, o valor a pagar a título de remanescente de taxa de justiça, salvo o devido respeito, afigura-se-nos elevado em face do serviço prestado, pelo que, se justifica que seja determinada a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça na sentença, como modo de obviar à violação dos princípios constitucionais do acesso ao direito e da tutela jurisdicional efectiva, da proporcionalidade e da necessidade

51) Considerando a tramitação ocorrida nos autos, afigura-se que o montante da taxa de justiça já paga pela parte vencida (€ 1.632.00) é proporcional ao serviço prestado, sendo que o valor pago de remanescente (mais € 39.576.00) é manifestamente exagerado face à tramitação do processo, ao grau de complexidade do mesmo e às questões jurídicas suscitadas.

52) Este exagero de remanescente de taxa de justiça no montante de € 39.576.00 resultou directamente do elevado valor da acção (€ 3.383.670.00) e sem qualquer tradução na complexidade do processo, sendo por isso de notar a desproporção entre o serviço público envolvido e o valor total cobrado, desse modo tendo sido violado o princípio estruturante constitucional da proibição do excesso, como também o direito de acesso aos tribunais, previsto no artigo 20.º, nº.1, da CRP.

53) Nessa conformidade, salvo melhor opinião, deverá desconsiderar-se o remanescente, por existirem razões objectivas para a dispensa do seu pagamento, designadamente atendendo à falta de complexidade da causa e à conduta processual das partes.

TERMOS EM QUE, deve ordenar-se a revogação da douta sentença recorrida, como é de LEI E JUSTIÇA».

1.3 A Impugnante contra-alegou, tendo formulado conclusões do seguinte teor:

«1.ª- O recurso da AT deve ser julgado improcedente por mérito do julgamento de direito vertido na sentença, em conformidade com a jurisprudência nela citada, designadamente os acórdãos deste STA, todos publicados em dgsi.pt, de 21-09-2016 (Pleno), no Processo 01083/13, de 15-03-2017, no Processo 0127/15, e de 20.04.2016, no Processo 0824/15, mas especialmente no Ac. também deste STA de 05-04-2017, no Processo 01107/16 (máxime em 13 e 18 supra).

2.ª- Mas (sem prejuízo do desfecho da reclamação por não admissão do recurso principal que visa a arguição da nulidade), subsidiariamente, o recurso também deve ser julgado improcedente por ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido para conhecimento subsidiário e suprimento da nulidade por falta de pronúncia sobre os demais fundamentos invocados na PI para anulação dos actos de fixação dos VPT (art. 636.º do CPC, ex-vi do disposto no art. 2.º e) do CPPT e arts. 615.º 4 do CPC e 280.º 1 do CPPT), declarando-se a anulação dos actos de fixação dos VPT em causa com fundamento em manifesto excesso face ao efectivo valor dos imóveis no mercado, excesso que a própria sentença julgou na conjugação dos FP 5 e 10 e que resulta agravado se for seguido, como deve, o julgado por este STA em 05-04-2017, no Processo 01107/16, como tudo se evidencia nas colunas D, E e H do mapa copiado em 5 supra, concluindo-se, se necessário, pela desaplicação das Portarias 982/2004 e 1426/2004, se e na medida em que resultem desconformes com os princípios constitucionais».

1.4 Recebidos neste Supremo Tribunal Administrativo, os autos foram com vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parece no sentido de que seja negado provimento ao recurso e mantida a sentença recorrida, com a seguinte fundamentação: «[…]

Nos termos do disposto no artigo 6.º/3 do CIMI são terrenos para construção aqueles relativamente aos quais tenha sido concedida licença para operação de loteamento; licença de construção; autorização para operação de loteamento; autorização de construção; admitida comunicação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção e aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, devendo ter- se em atenção que, também, para este efeito, apenas deve relevar o título aquisitivo com a forma estatuída na lei civil, ou seja, a escritura pública ou o documento particular autenticado referidos no artigo 875.º do CC, sendo certo que quanto a estes últimos se as autoridades que superintendem na organização do território neles vedarem quaisquer operações de loteamento ou construção serão, por isso, excepcionados do conceito de terreno para construção.
Do disposto no artigo 45.º do CIMI, que regula a determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção, resulta que o VPT desses terrenos é o resultado ponderado de três elementos essenciais, a saber:
1. O valor da área de construção autorizada ou prevista;
2. A localização geográfica do próprio terreno;
3. A parte sobrante do terreno, ou seja, a área não ocupada pela futura construção.
No que diz respeito ao cálculo do valor da área de implantação, determinado em função da área bruta de construção autorizada ou prevista para o edifício, porque se está em presença de prédios urbanos em relação aos quais apenas há a intenção de edificação, poderá variar num intervalo compreendido entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas (artigo 45.º/2 do CIMI).
O PLENO da SCT do STA (Acórdão de 21/09/2016 – P. 01083/13, disponível em www.dgsi.pt) já se pronunciou no sentido de a fórmula de cálculo do VPT dos prédios urbanos, para habitação, comércio, indústria e serviços, estatuída no artigo 38.º do CIMI não ter aplicação integral no cálculo do VPT dos terrenos para construção, sendo que no caso estava em causa a aplicação, na avaliação de terrenos para construção, do coeficiente de qualidade e conforto (cq).
Na verdade, na avaliação dos terrenos para construção há que observar o estatuído no artigo 45.º do CIMI, norma específica que regula a determinação do VPT dessa espécie de prédios urbanos.
Ora, nos termos do artigo 45.º/2 do CIMI a fixação da percentagem correspondente à área de implantação prevista ou autorizada leva em consideração as acessibilidades existentes, a proximidade de equipamentos sociais, a existência, ou não, de transportes, bem como a eventual localização em zona de elevado valor de mercado imobiliário, elementos estes que determinam a variação do coeficiente de localização.
Assim sendo, sob pena de uma dupla incidência sobre a localização do terreno, na fórmula final de cálculo do VPT de um terreno para construção não há que aplicar o coeficiente de localização, como bem decidiu a sentença recorrida.
Neste sentido aponta a jurisprudência do STA plasmada nos acórdãos de 05/04/2017-P. 01107/16 e de 28/06/2017-P. 0987/16 (disponíveis no sítio da internet www.dgsi.pt).
A sentença recorrida não merece censura».

1.5 Os Juízes Conselheiros adjuntos tiveram vista dos autos.

1.6 Cumpre apreciar e decidir se a sentença fez correcto julgamento i) quando considerou que na avaliação dos terrenos para construção, a efectuar de acordo com o n.º 2 do art. 45.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), não há lugar à aplicação do coeficiente de localização e ii) quando não determinou a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
Atento o teor das contra-alegações, cumpre também decidir da admissibilidade da ampliação do objecto do recurso aí requerida.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«1. A Impugnante é proprietária dos prédios urbanos sitos na ……………, freguesia de Vera Cruz, concelho de Aveiro, que se encontram inscritos na matriz predial urbana sob os artigos ….., ….., …., ….., ….., ….., ….., …., ….., ….., …, …, …., …. e …..

2. Em 17.06.2008, a Administração Tributária (AT) enviou à Impugnante 15 notificações com o resultado apurado dos valores patrimoniais tributários dos prédios referidos em 1 (cfr. 53, 71, 81, 91, 101, 111, 121, 131, 141, 151, 161, 171, 181, 191 e 201 do p.a.).

3. Em 25.07.2008, a Impugnante apresentou, junto do Serviço de Finanças de Aveiro – 1, um pedido de segunda avaliação dos prédios referidos em 1 (cfr. requerimento a fls. 50 e ss do p.a.).

4. Em 15.09.2008, uma comissão de avaliação, composta por dois peritos regionais e um representante do sujeito passivo, procedeu à segunda avaliação dos prédios referidos em 1, tendo sido lavrados os respectivos termos de avaliação (cfr. ofício a fls. 63 e termos de avaliação a fls. 58, 73, 83, 93, 103, 113, 123, 133, 143, 153, 163, 173, 183, 193 e 204 do p.a.).

5. Na sequência da avaliação referida em 4, foram atribuídos aos prédios referidos em 1, com os seguintes artigos matriciais, os seguintes valores patrimoniais tributários, que foram notificados à Impugnante através de vários ofícios datados de 23.09.2008:
a) ….. – 103.060 EUR;
b) ….. – 103.060 EUR;
c) ….. – 103.060 EUR;
d) ….. – 103.060 EUR;
e) …… – 103.060 EUR;
f) …… – 103.060 EUR;
g) ….. – 113.030 EUR;
h) ……. – 113.030 EUR;
i) …… – 438.190 EUR;
j) ….. – 603.970 EUR;
k) ….. – 808.740 EUR;
l) …. – 2.455.580 EUR;
m) …. – 2.455.580 EUR;
n) …. – 2.483.660 EUR;
o) …. – 1.189.090 EUR.
(cfr. notificações de fls. 15 a 28 do processo físico e ficha de avaliação a fls. 175 e 176 do p.a.).

6. Os valores patrimoniais tributários referidos em 5 foram fixados com base na seguinte fórmula, tendo sido para tanto considerados, entre outros, um coeficiente de localização de 1,95 e uma percentagem de 33%:
Vt = Vc x [A x % + ( Ac + Ad)] x Cl x Ca x Cq
Em que, conforme consta das respectivas fichas de avaliação, “Vt = valor patrimonial tributário, Vc = valor base dos prédios edificados, A = área bruta de construção mais a área excedente à área de implantação, Ca = coeficiente de afectação, Cl = coeficiente de localização, Cq = coeficiente de qualidade e conforto, Cv = coeficiente de vetustez, sendo A = Aa + Ab + Ac + Ad, em que Aa representa a área bruta privativa, Ab representa as áreas brutas dependentes, Ac representa a área do terreno livre até ao limite de duas vezes a área de implantação, Ad representa a área do terreno livre que excede o limite de duas vezes a área de implantação. Tratando-se de terrenos para construção, A = Área bruta de construção integrada de Ab”.
(cfr. fichas de avaliação a fls. 60, 61, 75, 76, 85, 86, 95, 96, 105, 106, 115, 116, 125, 127, 135, 136, 145, 146, 155, 156, 165, 166, 175, 176, 185, 186, 195, 196, 206 e 207 do p.a.).

7. O valor de mercado unitário da área de construção de um terreno de construção é, em regra, tanto menor quanto maior for a densidade de construção prevista para o lote.

8. O preço de mercado unitário de uma habitação unifamiliar é, em regra, superior ao de um edifício multifamiliar, quando ambos os edifícios disponham de igual área de implantação e logradouro.

9. Os prédios referidos em 1 situam-se fora do núcleo central da cidade de Aveiro.

10. No ano de 2008, o valor de mercado dos prédios referidos em 1, com os seguintes artigos matriciais, aproximava-se dos seguintes valores:
a) ….. – 89.103,57 EUR;
b) ….. – 89.103,57 EUR;
c) …… – 89.103,57 EUR;
d) ….. – 89.103,57 EUR;
e) ….. – 89.103,57 EUR;
f) ….. – 89.103,57 EUR;
g) ….. – 96.672,80 EUR;
h) …… – 96.672,80 EUR;
i) …. – 344.135,01 EUR;
j) ….. – 470.392,16 EUR;
k) ….. – 625.874,11 EUR;
l) …... – 1.877.369,42 EUR;
m) ….. – 1.877.369,42 EUR;
n) ….. – 1.899.279,07 EUR;
o) ….. – 733.287,25 EUR.


*

Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa e inexistem factos não provados com tal relevo, atenta a causa de pedir».

*

2.2 DE FACTO E DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

A Fazenda Pública recorre da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, julgando procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade ora Recorrida, anulou os actos de fixação, em segunda avaliação, do VPT de vários terrenos para construção por considerar verificado o vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito, decorrente da utilização nas avaliações do coeficiente de localização (Cl).
Sustenta a Recorrente que «[u]ma vez que o legislador concebeu o modelo de avaliação dos terrenos para construção, partindo-se do edifício a construir, a fórmula de cálculo do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção tem de conter os elementos considerados determinantes na avaliação dos prédios urbanos edificados prevista no art. 38.º do CIMI, para determinar o valor dos prédios a construir», por força do n.º 2 do art. 45.º do CIMI – sendo a única excepção o coeficiente de vetustez –, motivo porque também o coeficiente de localização previsto no art. 42.º do CIMI deve ser aplicado quando da avaliação do VPT dos terrenos para construção.
A questão a apreciar e decidir é, pois, a de saber se a sentença recorrida fez correcto julgamento quando considerou que o art. 45.º, n.º 2, do CIMI, na redacção anterior à que lhe foi introduzida pelo art. 392.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2021), ao remeter para «o valor das edificações autorizadas ou previstas», está a remeter para o valor que resulta da aplicação de todo o sistema de avaliações dos prédios edificados ou, como sustentou a sentença recorrida, exclui alguns dos coeficientes usados na avaliação destes, designadamente – e no que ora importa – o coeficiente de localização (Cl).
Se for caso disso – ou seja, se o recurso for provido – haverá ainda que verificar da admissibilidade da ampliação do objecto do recurso e, na afirmativa, das questões nela suscitadas.
Finalmente, teremos de verificar se a sentença fez, ou não, correcto julgamento quando não dispensou o pagamento do remanescente da taxa de justiça.

2.2.2 DA ILEGALIDADE DA AVALIAÇÃO POR APLICAÇÃO DO COEFICIENTE Cl

Como bem salientou a sentença recorrida, o Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou por diversas vezes sobre a questão.
É certo que a jurisprudência citada na sentença se refere aos coeficientes de afectação e de qualidade e conforto. Por isso e porque o acórdão de 5 de Abril de 2017, proferido no processo com o n.º 1107/16 (Disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/4f60dc5dbfb5b42680258106003ada95.), se refere expressamente à questão da aplicação do coeficiente de localização na fórmula final do cálculo do VPT dos terrenos para construção – que é a que está em causa nos autos –, vamos limitar-nos a reproduzir a fundamentação aduzida nesse aresto (Permitimo-nos expurgar do texto a numeração dos parágrafos.) e que tem vindo a ser seguida pela jurisprudência deste Supremo Tribunal que se reporta a esse coeficiente (Cf. os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 28 de Junho de 2017, proferido no processo com o n.º 897/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/0acc98158b1bd89f802581520049e94b;
- de 14 de Novembro de 2018, proferido no processo com o n.º 398/08.2BECTB (133/18), disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/34853efd5455e3ff8025834c00394e9b;
- de 23 de Outubro de 2019, proferido no processo com o n.º 170/16.6BELRS (684/17), disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/8d04e2c58d876fa4802584a2003928cc.-(Existe muita outra jurisprudência sobre a inaplicabilidade dos coeficientes de qualidade e conforto (Cq) e de afectação (Ca) na determinação do VPT dos terrenos para construção, que foi citada na sentença.):

«A questão a decidir resume-se, pois, à de saber se na avaliação e fixação do valor patrimonial do terreno para construção aqui em causa foram observadas as regras que, para o efeito, estão definidas no Código do IMI (CIMI), atendendo à forma em que tal avaliação considerou o coeficiente de coeficiente de localização na fixação do valor patrimonial tributário (VPT).
Vejamos.
Sob a epígrafe «Determinação do valor patrimonial tributário», o art. 38.º do CIMI dispunha (à data):
«1- A determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação, comércio, indústria e serviços resulta da seguinte expressão:
Vt = Vc x A x Ca x Cl x Cq x Cv
em que:
Vt = valor patrimonial tributário;
Vc = valor base dos prédios edificados;
A = área bruta de construção mais a área excedente à área de implantação;
Ca = coeficiente de afectação;
Cl = coeficiente de localização
Cq = coeficiente de qualidade e conforto;
Cv = coeficiente de vetustez.
2- O valor patrimonial tributário dos prédios urbanos apurado é arredondado para a dezena de euros imediatamente superior».
Por seu lado, o art. 45.º do mesmo CIMI dispunha o seguinte (na redacção em vigor à data dos factos, ou seja, na redacção anterior à Lei n.º 64-B/2011, de 30/12):
«1- O valor patrimonial tributário dos terrenos para construção é o somatório do valor da área de implantação do edifício a construir, que é a situada dentro do perímetro de fixação do edifício ao solo, medida pela parte exterior, adicionado do valor do terreno adjacente à implantação.
2- O valor da área de implantação varia entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas.
3- Na fixação da percentagem do valor do terreno de implantação têm-se em consideração as características referidas no n.º 3 do artigo 42.º.
4- O valor da área adjacente à construção é calculado nos termos do n.º 4 do artigo 40.º.
E no mencionado n.º 3 do art. 42.º dispõe-se:
«3- Na fixação do coeficiente de localização têm-se em consideração, nomeadamente, as seguintes características:
a) Acessibilidades, considerando-se como tais a qualidade e variedade das vias rodoviárias, ferroviárias, fluviais e marítimas;
b) Proximidade de equipamentos sociais, designadamente escolas, serviços públicos e comércio;
c) Serviços de transportes públicos;
d) Localização em zonas de elevado valor de mercado imobiliário».
Já no também mencionado n.º 4 do art. 40.º dispõe-se que:
«4- A área do terreno livre do edifício ou da fracção ou a sua quota-parte resulta da diferença entre a área total do terreno e a área de implantação da construção ou construções e integra jardins, parques, campos de jogos, piscinas, quintais e outros logradouros, aplicando-se-lhe, até ao limite de duas vezes a área de implantação (Ac), o coeficiente de 0,025 e na área excedente ao limite de duas vezes a área de implantação (Ad) o de 0,005».

Da conjugação dos transcritos normativos resulta, assim, que a determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação, comércio, indústria e serviços é operada nos termos do n.º 1 do art. 38.º do CIMI e a dos terrenos para construção é operada nos termos do n.º 1 do art. 45.º do CIMI (o respectivo valor patrimonial resulta da soma de dois outros valores: do valor da área de implantação do edifício a construir e do valor do terreno adjacente à implantação). E cada um destes valores é assim encontrado:
- O valor da área de implantação (sendo que a área de implantação do edifício a construir é a que se situa dentro do perímetro de fixação do edifício ao solo) varia entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas, tendo-se em conta, na fixação dessa percentagem, as características referidas no n.º 3 do art. 42.º do CIMI, ou seja, as características atendíveis para a fixação do coeficiente de localização aplicável na determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos destinados a habitação, comércio, indústria e serviços, nomeadamente acessibilidades, proximidade de equipamentos sociais, serviços de transportes públicos e localização em zonas de elevado valor de mercado imobiliário (arts. 42.º, n.ºs 2 e 3 e 45.º, n.º 3, do CIMI).
- O valor do terreno adjacente à área de construção é calculado nos termos do n.º 4 do art. 40.º do CIMI (cfr. n.º 4 do art. 45.º do CIMI).
É em relação ao coeficiente de localização, previsto naquele citado art. 42.º do CIMI, que a sentença recorrida conclui ter ocorrido ilegal aplicação do critério, na medida em que se utilizou o coeficiente individualmente.
E com razão.

O coeficiente de localização interliga-se com o zonamento (cfr. os n.ºs 2 e 4 do art. 42.º do CIMI) estabelecendo-se neste n.º 2 que os coeficientes a aplicar em cada zona homogénea do município podem variar conforme se trate de edifícios destinados à habitação, comércio, indústria ou serviços, aqui relevando, certamente, a consideração de que uma zona onde o valor do mercado imobiliário habitacional é elevado, não é necessariamente uma zona de elevado valor de mercado comercial, industrial ou de serviços. E daí que também na própria lei se refiram vários tipos de zonamento, em conformidade com as tipologias de afectação dos imóveis.
Ora, como salienta Fernandes Pires 1 (1 Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 2010, pp. 53 e 103 e ss.), considerando-se um zonamento por cada uma dessas afectações relativas aos imóveis urbanos 2 (2 O que significa que existem, relativamente aos imóveis urbanos, quatro tipos de zonamento.) e mais dois relativamente a outros tipos de prédios (relativamente a moradias unifamiliares o coeficiente qualidade e conforto varia consoante a localização do imóvel e essa variação está associada ao tipo de zonamento e também na determinação do valor de avaliação dos terrenos para construção, um dos factores importantes é o valor da área de implantação, e esse depende também sempre da localização do terreno), então, no caso dos terrenos para construção, mandando o n.º 3 do art. 45.º do CIMI utilizar esses mesmos critérios para determinar as percentagens de apuramento do valor da área de implantação, teríamos uma aplicação duplicada daqueles quatro factores que estão na base do coeficiente de localização, pois que estas características são também as mesmas que determinam a construção do coeficiente de localização: tais características determinam, primeiro, a construção do coeficiente de localização e em seguida, também a construção da percentagem do apuramento do valor da área de implantação, pelo que «dada a coincidência de serem os mesmos factores que estão na base da construção do coeficiente de localização e das percentagens, parece também ser defensável a ideia de que não seria aplicável na fórmula de avaliação dos terrenos para construção o coeficiente de localização» 3 (3Autor e ob. cit.). Sob pena de termos a mesma realidade a influenciar duplamente o respectivo VPT.
[…], a lei manda ter em consideração, na fixação da percentagem do valor do terreno de implantação, as mesmas características que se têm em consideração na fixação do coeficiente de localização, mas não o manda aplicar de novo à fórmula daí resultante: caso se aplicasse, resultaria que o mesmo foi considerado duas vezes (na obtenção da percentagem prevista no n.º 2 e na fórmula final). […], atendendo às regras próprias de determinação do VPT dos terrenos para construção, constantes do art. 45.º do CIMI, considerar individualmente o coeficiente de localização é atender a um elemento estranho ao cálculo, tal como fixado naquele normativo legal.
Aliás, já no acórdão do Pleno desta Secção, de 21/9/2016, proc. n.º 01083/13 [(Este citado na sentença recorrida e disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/5150fecd6e9ad85b8025803b003e371a.)], se acentuou (embora a propósito de um outro factor: o coeficiente de qualidade e conforto) que a regra específica constante do art. 45.º do CIMI, onde «se tem em conta o valor da área de implantação do edifício a construir e o valor do terreno adjacente à implantação bem como as características de acessibilidade, proximidade, serviços e localização descritas no n.º 3 do artigo 42.º, tendo em conta o projecto de construção aprovado, quando exista, e o disposto no n.º 2 do artigo 45.º do C.I.M.I, mas não outras características ou coeficientes», só pode significar «que na determinação do seu valor patrimonial tributário dos terrenos para construção não tem aplicação integral a fórmula matemática consagrada no artigo 38.º do CIMI ...».
Em suma, na fórmula final de cálculo do VPT dos terrenos para construção é de afastar a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse factor de localização do terreno já está contemplado na percentagem prevista no n.º 3 do art. 45.º do CIMI».

Perante o exposto, considerando que também na sentença recorrida se decidiu neste sentido, havemos de concluir pela improcedência do recurso na parte em questionou o julgamento quanto à legalidade dos actos impugnados.
Note-se, finalmente, que não releva na decisão o facto de o art. 45.º do CIMI, após a redacção que lhe foi dada pelo Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2021), ter vindo a consagrar expressamente a aplicação do coeficiente de localização na fórmula para determinação do VPT dos terrenos para construção: é que essa nova redacção não tem, manifestamente, carácter interpretativo, antes constituindo uma clara alteração das regras até então vigentes, com o estabelecimento expresso da fórmula de cálculo do VPT dos terrenos para construção.

2.2.3 DAS CONTRA-ALEGAÇÕES E DO PEDIDO DE AMPLIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Apesar de as contra-alegações, salvo o devido respeito, não serem muito claras a este respeito, a Recorrida pede a ampliação do objecto do recurso, ao abrigo do disposto no art. 636.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi do art. 281.º do CPPT – aliás na sequência da não admissão do recurso que, com o mesmo objecto da “ampliação” ora requerida, interpôs da sentença (Cf. o despacho proferido pelo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro nestes autos, em 22 de Setembro de 2019, e o acórdão por que este Supremo Tribunal Administrativo, de 31 de Janeiro de 2018, no processo 1461/17 (118/09.4BEVIS-A), que indeferiu a reclamação interposta daquele despacho ao abrigo do disposto no art. 643.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, e o confirmou, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/6f40f0b5420ca5ba8025822b0043d10d.), o que até suscita a questão da violação do caso julgado formal – relativamente a questões que foram por ela invocadas na petição inicial e não foram apreciadas por terem sido dadas como prejudicadas (se bem ou mal, é questão que ora não cumpre apreciar).
Seja como for, a ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido, constitui uma possibilidade prevista no art. 636.º do CPC, que visa, como a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a dizer (Vide, por mais recente e distinguindo claramente entre recurso subordinado e ampliação do objecto do recurso, o acórdão da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo de 11 de Março de 2021, proferido no processo com o n.º 2505/10.6BEPRT (458/17), disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/94d1b1a8e56680688025869e00369efc.), permitir ao recorrido a reabertura da discussão sobre determinados pontos (fundamentos) que foram por si invocados na acção e julgados improcedentes (n.º 1) ou arguir nulidades da sentença (n.º 2), mas só e apenas se o recurso interposto, sem essa apreciação, for de procedência. Ou seja, a possibilidade de apreciar o pedido de ampliação do objecto do recurso fica dependente da procedência do recurso interposto pelo recorrente.
Assim, no caso não há que conhecer da ampliação do recurso solicitada pela Recorrida, uma vez que o recurso da AT, como deixámos dito, não logrará provimento.

2.2.4 DA DISPENSA DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA

Dispõe o n.º 7 do art. 6.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP) que «[n]as causas de valor superior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento».
Trata-se, portanto, de uma dispensa excepcional que, à semelhança do que ocorre com o agravamento previsto no n.º 7 do art. 7.º do mesmo Regulamento, depende de concreta e casuística avaliação pelo juiz e deve ter lugar aquando da fixação das custas ou, no caso de aí ser omitida, mediante requerimento de reforma da decisão ( Neste sentido, o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 15 de Outubro de 2014, proferido no processo com o n.º 1435/12, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/a3b252eae83b18a580257d780045a663.).
No caso, a questão decidida não pode considerar-se de complexidade inferior à comum, mas foi fixado à impugnação judicial o valor de € 3.383.670, o que significaria que os montantes a pagar a título de remanescente da taxa de justiça, quer na impugnação judicial quer no presente recurso, se afiguram manifestamente desproporcionais ao serviço judiciário prestado.
Na verdade, não podemos perder de vista que a taxa de justiça, como todas as taxas, assume natureza bilateral ou correspectiva (cf. arts. 3.º, n.º 2, e 4.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária), constituindo a contrapartida devida pela utilização do serviço público da justiça por parte do sujeito passivo.
Assim, e porque a tal não obsta a conduta processual das partes, que não se afastou do padrão de normalidade, entende-se estar justificada a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida na impugnação judicial, conforme o pedido formulado pela Recorrente, pelo que o recurso, nesta parte, será provido.
Os mesmos considerandos valem quanto à dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo presente recurso, que se determinará a final.

2.2.4 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - O método de determinação do valor patrimonial (VPT) dos terrenos para construção adoptado pelo CIMI, e que constava do art. 45.º, na redacção anterior à que lhe foi introduzida pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2012), era muito semelhante ao dos edifícios construídos, partindo-se da avaliação das edificações autorizadas ou previstas.
II - No entanto, na fórmula final de cálculo do VPT dos terrenos para construção, era de afastar, para além do mais, a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse factor já está contemplado na percentagem prevista no n.º 3 do art. 45.º do CIMI.
III - O tribunal ad quem só pode conhecer da ampliação do objecto do recurso requerida pelo recorrido nos termos do art. 636.º do CPC caso o recurso interposto pelo recorrente deva ser julgado procedente.
IV - Nos casos em que o valor da causa excede € 275.000,00, justifica-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida em 1.ª instância e no recurso jurisdicional (cf. art. 6.º, n.º 7, do RCP) se a conduta processual das partes não obstar a essa dispensa e se, não obstante a questão aí decidida ser de complexidade inferior à comum, o montante da taxa de justiça devida se afigurar manifestamente desproporcionado em face do concreto serviço prestado, pondo em causa a relação sinalagmática que a taxa pressupõe.


* * *

3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em

i) conceder parcial provimento ao recurso e em consequência, i).1 manter a sentença recorrida na parte em que anulou os actos impugnados e i).2 revogar a sentença na parte respeitante à condenação em custas, que ora se substitui por decisão do seguinte teor: Custas pela Fazenda Pública, com dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

ii) não conhecer do pedido de ampliação do objecto do recurso.

Custas pela Recorrente e pela Recorrida, na proporção de 2/3 e 1/3, respectivamente, com dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça (cf. art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi do art. 281.º do CPPT e art. 6.º, n.º 7, do RCP).

*
Assinado digitalmente pelo relator, que consigna e atesta que, nos termos do disposto no art. 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo art. 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente acórdão os Conselheiros que integram a formação de julgamento como adjuntos.
*
Lisboa, 6 de Outubro de 2021. - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – Gustavo André Simões Lopes Courinha.