Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0867/14
Data do Acordão:10/08/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA
IMPOSSIBILIDADE SUPERVENIENTE
CUSTAS
Sumário:Decretada a extinção da instância em oposição à execução fiscal por impossibilidade superveniente decorrente da extinção da execução fiscal por prescrição das dívidas exequendas, e considerando a lei que a prescrição constitui alteração superveniente das circunstâncias não imputável nem ao exequente nem ao executado/oponente, as custas devem ser suportadas por ambos em partes iguais, tudo nos termos dos arts. 287.º, alínea e) e 536.º, n.ºs 1 e 2, alínea c), do CPC, aplicável subsidiariamente.
Nº Convencional:JSTA000P18028
Nº do Documento:SA2201410080867
Data de Entrada:07/10/2014
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional do despacho de extinção da instância proferido no processo de oposição à execução fiscal com o n.º 709/08.0BECBR

1. RELATÓRIO

1.1 A………….. (a seguir Oponente ou Recorrido) deduziu oposição à execução fiscal que, instaurada contra uma sociedade para cobrança de dívidas provenientes de Imposto sobre o Valor Acrescentado, reverteu contra ele por ter sido considerado responsável subsidiário.

1.2 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, em face do documento comprovativo da extinção da execução por prescrição das dívidas exequendas, julgou extinta a instância de oposição por inutilidade superveniente da lide e condenou a Fazenda Pública nas custas.

1.3 Inconformada com a decisão quanto à condenação em custas, a Fazenda Pública (a seguir Recorrente) dela interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, recurso que foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

1.4 A Recorrente apresentou as respectivas alegações, que sintetizou em conclusões do seguinte teor: «

1- A douta sentença de que ora se recorre julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide e condenou em exclusivo a RFP nas custas do processo.

2- Com todo o respeito, que é muito, não pode esta RFP concordar com a condenação no pagamento da totalidade das custas por entender que a responsabilidade é repartida em partes iguais pelo oponente e a Fazenda Pública.

3- O oponente na qualidade de revertido deduziu oposição judicial ao processo executivo n.º 0779200701001850, por dívidas da originária devedora “B………… Ld.ª”, respeitantes a IVA de 2003.

4- No decurso do processo de oposição foi pelo Chefe do Órgão da Execução Fiscal declarada a prescrição da dívida, e comunicado aos autos.

5- Por tal facto, as custas deveriam ter sido repartidas em partes iguais, de acordo com o disposto na al. c) do n.º 2 do art. 536.º do Código de Processo Civil, aplicável aos autos por força do estatuído no art. 2.º al. e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

6- Nesse sentido já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão n.º 01471/12 de 30-01-2013, e mais recentemente, no Acórdão n.º 89/14 de 26/03.

7- Pelo que, concluímos que a decisão proferida incorreu em erro de julgamento de Direito, porquanto fez uma errónea interpretação do disposto no citado normativo do Código de Processo Civil.

Pelo exposto e com muito douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença na parte em que condena unicamente a F.P. em custas, com as legais consequências».

1.5 O Oponente não contra alegou.

1.6 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso deve ser provido, «sendo de revogar o decidido quanto a custas e proferir quanto a tal nova decisão, imputando as custas em partes iguais aos exequente e oponente, nos termos dos arts. 287.º, alínea e) e 450.º, n.ºs 1 e 2, alínea c), do CPC (actuais artigos 277.º e 536.º), aplicáveis subsidiariamente».

1.7 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.

1.8 A questão que cumpre apreciar e decidir são as de saber se a decisão que julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da oposição à execução fiscal fez correcto julgamento ao condenar a Fazenda Pública na totalidade das custas, o que, como procuraremos demonstrar, impõe que se indague dos motivos da extinção da execução fiscal.


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2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

A decisão recorrida efectuou o julgamento de facto nos seguintes termos:

«Com interesse para a decisão da presente questão, dão-se como provados os seguintes factos:

A - A Exequente moveu o processo de execução fiscal n.º 0779200809000062 contra a C…………, Lda., tendo nela sido proferido despacho de reversão contra o ora Oposição (cf. fls. 3 a 14 dos autos).

B - Em 25.06.2008, o Oponente apresentou junto dos serviços de Finanças de Mira a presente oposição à execução referida na alínea anterior (cf. fls. 15 a 46 dos autos).

C - Por informação do SEF de Mira, foi dado conhecimento a este Tribunal que as dívidas do processo de execução fiscal supra referido haviam sido declaradas prescritas, tendo sido extinta a execução contra o ora Oponente (cf. fls. 175 dos autos)».


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2.2 DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

Comprovada que foi a extinção da execução fiscal pela prescrição das dívidas exequendas em data ulterior àquela em que foi deduzida a presente oposição, foi julgada extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide e condenada a Fazenda Pública na totalidade das custas devidas.
A Fazenda Pública insurgiu-se contra essa condenação mediante recurso interposto para este Supremo Tribunal Administrativo. Sustenta, em síntese, que, resultando a impossibilidade superveniente da lide da extinção da execução fiscal por prescrição das dívidas exequendas, circunstância superveniente não imputável nem à Fazenda Pública nem ao Oponente, as custas devem ser repartidas por ambos em partes iguais, nos termos do disposto no art. 536.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Atentas as alegações da Recorrente, a questões a apreciar e decidir é a que enunciámos em 1.8.


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2.2.2 DA CONDENAÇÃO EM CUSTAS PELA EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA

2.2.2.1 DA RESPONSABILIDADE PELAS CUSTAS

Como é sabido, a regra geral em matéria de custas assenta no princípio da causalidade, ou seja, paga as custas a parte que lhes deu causa, a parte cuja pretensão não foi atendida, a parte que não tem razão no pedido que deduziu; subsidiariamente, deve atender-se ao princípio do proveito, segundo o qual, não havendo vencimento, paga as custas quem do processo tirar proveito [cfr. art. 527 do CPC («1 - A decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.
2 - Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
[…]».), que corresponde ao anterior art. 446.º].
Nos casos de extinção da instância por inutilidade/impossibilidade da lide, o art. 536.º do CPC («1 - Quando a demanda do autor ou requerente ou a oposição do réu ou requerido eram fundadas no momento em que foram intentadas ou deduzidas e deixaram de o ser por circunstâncias supervenientes a estes não imputáveis, as custas são repartidas entre aqueles em partes iguais.
2 - Considera-se que ocorreu uma alteração das circunstâncias não imputável às partes quando:
[…]
c) Quando ocorra, no decurso do processo, prescrição ou amnistia;
[…]
3 - Nos restantes casos de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, caso em que é este o responsável pela totalidade das custas.
[…]».), que corresponde ao anterior art. 450.º, estabelece as regras a observar:

· de acordo com o n.º 1, nos casos em que a pretensão ou oposição deduzidas fossem fundadas no momento em que foram deduzidas e o deixaram de ser por circunstâncias supervenientes a estes não imputáveis, ou seja, a inutilidade ou impossibilidade resulte de circunstâncias não imputáveis ao autor ou ao réu, considerando-se que integram essa categoria as situações enumeradas no n.º 2, entre as quais a prescrição, as custas serão repartidas por ambos em partes iguais;

· nos termos do n.º 3, nos casos em que a inutilidade superveniente da lide resulte de circunstâncias que não as referidas nos dois primeiros números do artigo, paga as custas o autor, a menos que a impossibilidade ou inutilidade seja imputável ao réu, caso em que este responde pelas custas; ou seja, nesses casos, o autor é sempre responsável pelas custas quando não o for o réu, sendo que este só o é quando o facto de que resulta a inutilidade lhe for imputável (Naquela que se nos afigura a melhor interpretação, a responsabilidade do réu pelas custas depende exclusivamente da imputabilidade objectiva do facto que determine a inutilidade superveniente, não se exigindo uma imputação subjectiva, traduzida na eventual censura ético-jurídica (culpa) pela verificação desse facto.).

Estas regra são aplicáveis ao processo tributário ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT, uma vez que a matéria da responsabilidade por custas não é regulada expressamente na lei processual administrativa e fiscal.

2.2.2.2 APLICAÇÃO DAS REGRAS AO CASO SUB JUDICE

Subsumindo a situação sub judice às regras que ficaram expostas, conclui-se que as custas devem ser suportadas pela Exequente e pelo Oponente, em partes iguais.
Na verdade, sendo que a extinção da execução fiscal teve origem na prescrição, que a lei considera integrar «uma alteração das circunstâncias não imputável às partes» (cfr. citado art. 536.º, n.º 2, alínea c), do CPC), a regra é a da repartição das custas em partes iguais, como bem sustenta a Recorrente e tem vindo a decidir este Supremo Tribunal Administrativo em jurisprudência que foi citada pela Recorrente e pelo Procurador-Geral Adjunto (Cfr. os acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 30 de Janeiro de 2013, proferido no processo n.º 1472/12, publicado no Apêndice ao Diário da República de 11 de Março de 2014 (http://dre.pt/pdfgratisac/2013/32210.pdf), págs. 523 a 525, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/7eb22625b183b3cc80257b1d00429c0f?OpenDocument;
- de 26 de Março de 2014, proferido no processo n.º 89/14, publicado no Apêndice ao Diário da República de 15 de Setembro de 2014 (http://dre.pt/pdfgratisac/2014/32210.pdf), págs. 1200 a 1204, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/2087f865036e31e480257cac00523226?OpenDocument.).
Há, pois, que revogar a decisão na parte recorrida, que entendeu que as custas da extinção da instância deviam ser suportadas exclusivamente pela Exequente, e substituí-la, de acordo com o que ficou exposto, pela condenação da Fazenda Pública e do Oponente, em partes iguais, como decidiremos a final.


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2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos a seguinte conclusão:

Decretada a extinção da instância em oposição à execução fiscal por impossibilidade superveniente decorrente da extinção da execução fiscal por prescrição das dívidas exequendas, e considerando a lei que a prescrição constitui alteração superveniente das circunstâncias não imputável nem ao exequente nem ao executado/oponente, as custas devem ser suportadas por ambos em partes iguais, tudo nos termos dos arts. 287.º, alínea e) e 536.º, n.ºs 1 e 2, alínea c), do CPC, aplicável subsidiariamente.


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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, conceder provimento ao recurso, revogar a decisão na parte recorrida e, em substituição, condenar a Fazenda Pública e o Oponente nas custas, em partes iguais.

Sem custas neste Supremo Tribunal Administrativo, uma vez que o Oponente não contra alegou.

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Lisboa, 8 de Outubro de 2014. - Francisco Rothes (relator) – Aragão Seia - Casimiro Gonçalves.