Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01693/14.7BESNT
Data do Acordão:06/17/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:TAXA MUNICIPAL
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA
CONSTITUCIONALIDADE
Sumário:I - A taxa prevista no n.º 1.1 do art. 69.º da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra, vigente à data, quando aplicável a equipamentos de abastecimento de combustíveis líquidos inteiramente localizados em propriedade privada, não assenta em qualquer atribuição ou competência para licenciar o posto de abastecimento de combustíveis, mas antes no poder de tributar os particulares beneficiários de utilidades prestadas ou geradas pela actividade do município, designadamente pela prestação de serviços no domínio da prevenção de riscos e da protecção civil ou sobre a realização de actividades dos particulares que oneram permanentemente o ambiente do município, aspectos estes não valorados no quadro do licenciamento.
II - Essa taxa não padece de inconstitucionalidade por violação do princípio da legalidade tributária no sentido de reserva de lei formal, ínsito nos artigos 165.º, n.º 1, alínea i) e 103.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.
Nº Convencional:JSTA000P26070
Nº do Documento:SA22020061701693/14
Data de Entrada:07/17/2019
Recorrente:MUNICÍPIO DE SINTRA
Recorrido 1:REPSOL PORTUGUESA, S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da decisão proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 1693/14.7BESNT

1. RELATÓRIO

1.1 O Município acima identificado recorre para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, julgando procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade acima identificada, anulou as liquidações de taxas relativas a equipamentos de abastecimento de combustíveis e ao ano de 2014, que foram efectuadas ao abrigo do disposto no art. 69.º, n.º 1.1, da Tabela de Taxas e outras Receitas do Município de Sintra (TTORMS), em vigor à data.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações, com conclusões do seguinte teor:

«A. A sentença recorrida de 31.03.2019 proferida pelo tribunal a quo julgou totalmente procedente a impugnação judicial deduzida por Repsol Portuguesa, S.A, dos actos de liquidação da renovação das taxas por equipamentos de combustíveis líquidos, inteiramente instalados em propriedade privada, relativas ao ano de 2014, e, consequentemente anulou a liquidação impugnada condenando a ora recorrente a pagar indemnização à impugnante por prestação de garantia indevida.

B. A sentença recorrida conclui no sentido da anulação da liquidação das taxas impugnadas, por vício de violação de lei, e aderindo à fundamentação da Decisão do Tribunal Constitucional constante do Acórdão n.º 379/2018, conclui identicamente pela verificação do vício de inconstitucionalidade orgânica por violação dos arts. 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, al. i) da Constituição.

C. A recorrente não pode conformar-se com a sentença recorrida, padecendo a mesma, salvo o devido respeito, que é muito, de erro de julgamento ao considerar a norma do n.º 1 do art. 69.º da Tabela de Taxas e Licenças e Outras Receitas Municipais de Sintra idêntica à apreciada no Acórdão n.º 379/2018, e aplicar ao caso dos autos a orientação seguida no citado Acórdão.

D. O tributo apreciado nos presentes autos incide sobre o posto de abastecimento, não procedendo a uma tributação desagregada da «unidade de abastecimento de combustível», razão pela qual entende a recorrente ser inaplicável ao caso a orientação jurisprudencial adoptada no Acórdão n.º 379/2018.

E. A norma que prevê o tributo em causa nos presentes autos é absolutamente idêntica à norma da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra, apreciada no Acórdão n.º 316/2014.

F. A fundamentação vertida no citado Acórdão n.º 316/2014, que considerou a taxa prevista no art. 70.º, n.º 1, 1.1. da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra para 2008 legítima à luz do art. 3.º do RGTAL, tem inteira aplicação ao caso dos presentes autos.

G. O tributo criado no n.º 1, 1.1. do art. 69.º da TTORMS, para 2014, tem a natureza de taxa que assenta na remoção de um obstáculo jurídico à actividade do particular e simultaneamente na prestação de serviço público, reconduzindo-se ao art. 3.º e 6.º do RGTAL.

H. O tributo em causa nos autos assume a natureza de uma verdadeira taxa, em contrapartida do dever permanente e específico de fiscalização dos postos de abastecimento de combustíveis imposto pela lei ao recorrente.

I. Para além desta actividade de fiscalização e vigilância, a taxa em causa é a contrapartida pela obrigação de suportar uma actividade que interfere no gozo de determinados bens públicos designadamente, ambientais e urbanísticos.

J. Conforme resulta da «fundamentação económico-financeira» incluída na TTORMS, as taxas sobre actividades de impacto ambiental negativo, cujo valor é estabelecido para ressarcir a comunidade dos danos ambientais, reais ou potenciais, decorrentes do exercício da actividades que representam um risco para os bens jurídicos consagrados na Lei n.º 11/87, de 7 de Abril.

L. O tributo cobrado pela recorrente tem, a necessária comutatividade que é pressuposto necessário da taxa, o que determina a qualificação do tributo criado no n.º 1.1. do art. 69.º da TTORMS como uma taxa.

M. A norma criada pela recorrente no n.º 1.1 do art. 69.º da TTORMS traduz-se numa verdadeira taxa, na medida em que existe a contraprestação típica da taxa, razão pela qual outra solução não poderia ser adoptada pelo tribunal a quo senão a improcedência do alegado vício de violação de lei e a conformidade da norma com o disposto nos artigos 103.º, n.º 2 e art. 165.º, n.º 1 al. i) da CRP».

1.3 A Recorrida apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção da sentença, com conclusões do seguinte teor:

«a) À semelhança do que resulta da interpretação da norma contida no n.º 4 do artigo 21.º (juntamente com os demais números do mesmo artigo) da Tabela de Taxas e Licenças e Outras Receitas Municipais do Município de Oeiras, também a norma contida no n.º 1.1 do artigo 69.º da Tabela de Taxas e Licenças e Outras Receitas Municipais de Sintra remete para uma desagregação artificial das unidades de abastecimento para efeitos de tributação autónoma dos vários componentes.

b) Com efeito, os actos de liquidação impugnados resultaram da aplicação da taxa de € 87,07/ano, incidente sobre um número variável de “equipamentos de abastecimento de combustíveis líquidos” instalados nos postos de abastecimento em questão (cfr. artigo 70.º – e posterior artigo 69.º – da Tabela de Taxas e outras Receitas do Município de Sintra e, bem assim, ponto 1 da matéria de facto assente).

c) Ou seja, não se verifica uma tributação unitária por posto de abastecimento, mas antes a aplicação individualizada tendo em conta os seus diversos componentes equipamentos.

d) Ora, concluíram os MM Juízes Conselheiros no citado acórdão n.º 33/2018, interpretando o n.º 4 do artigo 21.º da Tabela de Taxas e Licenças e Outras Receitas Municipais do Município de Oeiras, em conjunto com os n.ºs 1 a 3 do mesmo artigo, que “a desagregação da “unidade de abastecimento de combustível” em diversos componentes, sobre os quais incidem tributos autónomos, torna inviável a transposição para este caso dos fundamentos do Acórdão n.º 316/2014. Com efeito, quer o dever de fiscalização municipal da actividade, quer a obrigação de suportar os respectivos inconvenientes, reportam-se necessariamente à unidade funcional constituída pelas diversas partes. O dever de fiscalização do município tem por pressuposto a instalação de um Posto de abastecimento de combustível e não qualquer parte específica do mesmo, como uma bomba, uma tomada ou um depósito” (sublinhado nosso).

e) Nestes termos, mostra-se acertada a transposição para os presentes autos dos considerandos vertidos no acórdão n.º 379/2018 do Tribunal Constitucional efectuada pelo MM Juiz a quo, sendo os mesmos absolutamente válidos e impondo uma decisão afirmativa quanto à verificação do vício de inconstitucionalidade orgânica assacado pela recorrida.

f) Sem conceder, sempre se dirá que, analisando o tributo em questão nos presentes autos, fácil se mostra concluir que o mesmo não apresenta a natureza de taxa, já que não se vislumbra qualquer “(...) prestação concreta de um serviço do domínio público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares”.

g) Da análise do citado preceito normativo resulta claro que este incide sobre os postos de abastecimento, independentemente da utilização ou não de bens do domínio público, um tributo de montante fixo e igual para todos, a que acresce uma taxação determinada em função da utilização da via pública.

h) Ora, os postos de abastecimento em questão encontram-se instalados inteiramente em terreno do domínio privado decorrendo também no seu interior todos os actos relativos ao abastecimento e actividades complementares de abastecimento das viaturas.

i) Por outro lado, a ora recorrida não beneficiou da utilização concreta dos serviços de repartição ou funcionários municipais, no domínio da segurança civil ou da prevenção de riscos ambientais.

j) As tarefas municipais de protecção civil e ambiental, ninguém o contesta, integram as necessidades colectivas assumidas pelo legislador e confiadas, parcialmente, aos municípios, mas nem por isso os municípios podem criar taxas para compensar os encargos com cada uma das suas atribuições.

k) É certo que entre o enunciado exemplificativo das taxas municipais, a Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, se deixa dito no artigo 6.º/2 que “as taxas municipais podem também incidir sobre a realização de actividades dos particulares geradores de impacto ambiental negativo”.

l) Mas não é menos certo que estes serviços têm de assentar na prestação concreta de um serviço (artigo 3.º). Ou seja, uma interpretação conforme ao disposto nos artigos 103.º, n.º 2 e 238.º, n.º 4 da Constituição, exige que o artigo 6.º/2 da Lei n.º 53-E/2006, seja aplicado restritivamente, com o sentido de ser subsidiário aos pressupostos objectivos das taxas (artigo 3.º do mesmo diploma local).

m) É que o serviço concreto exige utilidades divisíveis (artigo 5.º n.º 2). Ora, a protecção ambiental, em geral, é absolutamente indivisível, pois respeita a toda a população do concelho e a terceiros (podendo estes também vir a ser beneficiados com os serviços relativos à protecção ambiental).

n) E, nem se diga que a mera instalação dos postos de abastecimento no concelho permite defender a existência de uma presunção suficientemente forte quanto à verificação de uma actividade de fiscalização por parte dos serviços da câmara.

o) Conforme deixa dito Sérgio Vasques em anotação ao referido artigo 6.º/2 da Lei n.º 53- E/2006, «(...) a qualificação de um tributo local como taxa exige por princípio que este incida sobre prestações efectivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo e não apenas sobre prestações de que o sujeito passivo seja o presumível causador ou beneficiário. Sempre que um tributo local assente sobre prestações presumidas com um grau de força relativo, em termos tais que o aproveitamento da prestação pública não se possa dizer certo mas apenas provável, estaremos perante contribuições cuja criação está vedada às autarquias locais em virtude da reserva de lei parlamentar constante do artigo 165.º, n.º 1, alínea i) da Constituição da República. (...) A protecção do ambiente, a protecção civil ou a promoção do desenvolvimento local podem servir de base de incidência às taxas locais mas apenas quando essas actividades se materializem em prestações públicas concretas de que os respectivos sujeitos sejam os efectivos causadores ou beneficiários e nunca quando elas tomem a forma de prestações públicas difusas (…)”, sublinhado nosso (vide “Regime das Taxas Locais – Introdução e Comentário, pág. 116), sublinhado nosso.

p) Por outro lado, no caso em apreço, a ora Recorrida não beneficiou da remoção de qualquer obstáculo jurídico à actividade por si desenvolvida, bastando, para tanto, atentar na própria previsão do tributo.

q) Não se desconhece a jurisprudência vertida no acórdão n.º 316/2014, proferido pelo Tribunal Constitucional em 01104/2014. No entanto, não poderá deixar de se fazer ressaltar a existência de vários votos de vencido entre eles o da MM Conselheira Maria Lúcia Amaral, nos termos do qual se deixa dito o seguinte: “Os confins do autogoverno municipal estão constitucionalmente fixados e consubstanciam-se na prossecução dos interesses próprios das populações respectivas. Perante esses confins, parece-me difícil sustentar que a atribuição legal ao município de deveres especiais de protecção de um certo bem jurídico seja condição necessária e suficiente para que, após essa atribuição e por causa dela, o ente municipal se torne o único responsável (na acepção constitucional do termo) pela protecção desse bem perante as suas próprias populações, ao ponto de dispensar a intervenção do Estado e da sua lei na decisão de tributar. Sobretudo quando está em causa (como acontece no caso dos autos) uma afectação da propriedade privada, esta leitura do âmbito do autogoverno municipal parece-me excessivamente alargada porque sem fundamento constitucional que a sustente”.

r) É, ainda, pertinente referir que o específico conteúdo da justificação contida na norma – “impacto ambiental negativo da actividade” – poderia, quanto muito e conforme acima se deixou dito, ser susceptível de classificar o tributo como contribuição especial, designadamente na categoria de “contribuições para maiores despesas” (entendidas como aquelas em que a prestação devida pelos particulares encontraria a sua razão de ser no facto de estes ocasionarem com a sua actividade um acréscimo de despesas para as entidades públicas).

s) No entanto, esta situação acaba por não ter qualquer relevo prático, porquanto a criação deste tipo de contribuição fica igualmente de fora da competência das Câmaras Municipais, uma vez que tem a mesma exigência formal que os impostos (vide neste sentido acórdão do Tribunal Constitucional n.º 24/2009, de 14/01/09, in www.tribunalconstitucional.pt).

t) Temos em que deverá concluir-se que bem andou a douta sentença recorrida ao considerar verificado o vício de inconstitucionalidade orgânica, por violação do disposto nos artigos 103.º, 2 e 165.º, 1 alínea i) da Constituição».

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso merece provimento, com a seguinte fundamentação: «[…]

De acordo com o estatuído no artigo 238.º/4 da CRP e artigo 20.º da Lei 13/2013, de 3/9, as autarquias locais podem criar taxas, nos termos da Lei, RGTAL, Lei 53-E/2006, de 29/12.
Nos termos do estatuído nos artigos 4.º da LGT e 3.º do RGTAL, enquanto os impostos assentam essencialmente na capacidade produtiva, revelada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património, as taxas assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares.
Na primeira modalidade de taxas, denominadas de taxas administrativas, a prestação pública traduz-se na utilização pelo particular de um serviço público individualizável.
Será o caso clássico da taxa exigida pela recolha do lixo.
Na segunda modalidade referida, as taxas de utilização, a prestação pública traduz-se na utilização de um bem do domínio público. Para o enquadramento nesta categoria não releva se a utilização se traduz num serviço privativo ou num uso comum ou indiferenciado. 1 [1 Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, 1974, páginas 50/51.]
Na terceira modalidade, as chamadas taxas de licenciamento, a prestação pública traduz-se na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares.
Todavia, apenas serão de qualificar como taxas aquelas cujo pagamento dá lugar à remoção de obstáculo real ou substantivo e já não aquelas em que está em causa um obstáculo criado artificialmente, com o intuito de exigir do particular um pagamento pela sua remoção. 2 [2 Casalta Nabais, O dever Fundamental de Pagar Impostos, Coimbra 1998, páginas 261/263.]
Como é sabido ao conceito de sinalagma não importa a equivalência económica, mas a equivalência jurídica. 3 [3 Teixeira Ribeiro, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 117.º, página 294.]
Todavia, a taxa pressupõe uma ideia de proporcionalidade entre o montante cobrado e a prestação pública disponibilizada.
Efectivamente, o valor da taxa terá de aferir-se em razão do custo dos serviços ou actos da administração e não, como acontece nos impostos, em função da capacidade contributiva.
A verdade é que o acórdão 316/2014 do TC, tirado em plenário, com 5 votos de vencido e 1 declaração de voto (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), admitiu dois alargamentos significativos do conceito tradicional de taxa.
De facto, por um lado admitiu que a prestação de um serviço público possa ser presumida a partir de um dever legal específico e permanente de fiscalização da actividade tributada.
Por outro lado, o TC admitiu, na linha do decidido no Acórdão n.º 177/2010, que a mera inacção administrativa em face de uma actividade que interfere no gozo de determinados bens públicos, tais como o ambiente, o urbanismo, o ordenamento do território ou a gestão do tráfego, possa consubstanciar uma contrapartida da respectiva tributação, satisfazendo o requisito, essencial ao conceito de taxa da bilateralidade ou comutatividade.
Ora, como sustenta o Município recorrente, o caso em análise parece não ter a ver com a situação analisada no acórdão 379/18 do TC, antes sendo similar à apreciada no acórdão 316/2014 desse mesmo tribunal e cuja doutrina se afigura transponível para os presentes autos.
Assim sendo, o tributo é em causa será uma verdadeira taxa e não um imposto, não sofrendo a norma do artigo 69.º/1.1 da TTORMS de inconstitucionalidade orgânica, sendo a liquidação sindicada conforme com o ordenamento jurídico».

1.5 Cumpre apreciar e decidir.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

A sentença recorrida efectuou o julgamento de facto nos seguintes termos:

«1- Por ofícios datados de 07.02.2014, o Município de Sintra notificou a aqui Impugnante para proceder ao pagamento das seguintes quantias:
- € 1.435,20, referente ao processo 64/2007 - 16 equipamentos de abastecimentos de combustíveis situados na Estrada Nacional …., km 10, ………, ………;
- € 2.152,80, referente ao processo 458/2007 - 24 equipamentos de abastecimentos de combustíveis situados na Rotunda …….., Casal ………, ……..,……..;
- € 2.870,40, referente ao processo 457/2007 - 32 equipamentos de abastecimentos de combustíveis situados na Av ………..., lote …, ………..;
- € 2.242,050, referente ao processo 454/2007 - 25 equipamentos de abastecimentos de combustíveis situados na Rua ………, ……. (Rot ……..) Posto B;
- € 2.152,80, referente ao processo 452/2007 - 24 equipamentos de abastecimentos de combustíveis situados na Rua ……., ……… (Rot………) Posto A (cfr. doc. 1 a 5 juntos à p.i., fls. 11 a 30 dos autos);

2- Em 13.03.2014, a Impugnante apresentou na Câmara Municipal de Sintra reclamação graciosa contra as liquidações referidas na alínea anterior (cfr. doc. 7 junto à p.i., a fls. 37 a 44, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido);

3- Em 02.04.2014, o Banco …….., S.A., prestou a pedido da Impugnante, garantia bancária a favor do Município de Sintra, relativa às dívidas referidas em 1 supra, pelo valor total de € 13.544,63 (cfr. doc. fls. 52-53 dos autos)».


*

2.2 DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

A questão que se suscita no presente processo – qual seja a de saber se o acto impugnado padece de vício de violação de lei, por inconstitucionalidade orgânica da norma do n.º 1.1. do art. 69.º da TTORMS (() Para o ano de 2014 foi mantida em vigor, conforme consta do Aviso n.º 802/2014, publicado no Diário de República, 2.ª Série, de 17 de Janeiro de 2014, a TTORMS de 2013, publicada pelo Aviso n.º 6660/2013 no Diário da República, 2.ª Série, de 21 de Maio de 2013.), em violação do disposto nos arts. 103.º, n.º 2, e 165.º, n,º 1, alínea i), da Constituição da República Portuguesa (CRP) – tem sido objecto de julgamento uniforme e reiterado por esta Secção de Contencioso Tributário, relativamente a outros municípios e a taxas substancialmente semelhantes à ora em causa, de que são exemplos os acórdãos de 15 de Novembro de 2017, proferido no processo com o n.º 173/15 (952/12.8BEAVR) (() Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/4ade436839a1b4d9802581df003a97f8.), de 12 de Fevereiro de 2020, proferido no processo com o n.º 359/14.2BEAVR (() Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/0de21a5faf6fc6cb8025851f0050621a.) e de 3 de Junho de 2020, proferido no processo com o n.º 388/13.3BEAVR.
Por outro lado, essa jurisprudência, no que se refere ao juízo de conformidade constitucional de taxas municipais substancialmente idênticas à ora sob escrutínio (() Designadamente, a prevista no art. 70.º, n.º 1.1, do TTORMS na versão publicada pelo Aviso n.º 26235/2008 no Diário da República, 2.ª Série, de 31 de Outubro de 2008, a prevista nos pontos 7.1.2 e 7.2.2 da “Tabela de Taxas e Outras Receitas Municipais” anexa ao Regulamento Municipal de Taxas, Licenças e Outras Receitas do Município de Estarreja, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 26 de Março de 2010 e a prevista arts. 55.º, n.º 1, alínea b), e n.º 2, do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público de Vila Nova de Gaia e 25.º, n.º 3, da Tabela de Taxas do Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município de Vila Nova de Gaia.), devidas por equipamentos de abastecimento de carburantes líquidos, ar e água, inteiramente localizados em propriedade privada, tem vindo a ser confirmada pelo Tribunal Constitucional (() Vide os seguintes acórdãos do Tribunal Constitucional:
- n.º 623/2019, proferido em 23 de Outubro de 2019, no processo com o n.º 107/2019, disponível em
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20190623.html;
- n.º 204/2019, proferido em 27 de Março de 2019, no processo n.º 78/18, disponível em
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20190204.html;
- n.º 316/2014, proferido em 1 de Abril de 2014, no processo n.º 204/12, disponível em
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20140316.html;
- n.º 581/2012, proferido em 5 de Dezembro de 2012, no processo n.º 204/12, disponível em
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20120581.html.
).
Porque, em face do disposto no art. 8.º, n.º 3, do Código Civil, se nos impõe o respeito pela orientação jurisprudencial seguida por este Supremo Tribunal, e porque se nos impõe também acatar as decisões do Tribunal Constitucional quanto à interpretação constitucional das normas constitucionais, cumpre julgar procedente o recurso e revogar a sentença recorrida, remetendo, no essencial e também de acordo com o parecer do Procurador-Geral-Adjunto acima transcrito (em 1.4), para a fundamentação expendida no referido acórdão de 15 de Novembro de 2017, proferido no processo com o n.º 173/15 (952/12.8BEAVR), ao abrigo da faculdade que nos é concedida pelo n.º 5 do art. 663.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

2.2.2 CONCLUSÕES

Consequentemente, o recurso será provido, formulando-se as seguintes conclusões, decalcadas do referido acórdão de 15 de Novembro de 2017:

I - A taxa prevista no n.º 1.1 do art. 69.º da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra, em vigor à data, quando aplicável a equipamentos de abastecimento de combustíveis líquidos inteiramente localizados em propriedade privada, não assenta em qualquer atribuição ou competência para licenciar o posto de abastecimento de combustíveis, mas antes no poder de tributar os particulares beneficiários de utilidades prestadas ou geradas pela actividade do município, designadamente pela prestação de serviços no domínio da prevenção de riscos e da protecção civil ou sobre a realização de actividades dos particulares que oneram permanentemente o ambiente do município, aspectos estes não valorados no quadro do licenciamento.

II - Essa taxa não padece de inconstitucionalidade por violação do princípio da legalidade tributária no sentido de reserva de lei formal, ínsito nos arts. 165.º, n.º 1, alínea i) e 103.º, n.º 2, da CRP.


* * *

3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a impugnação judicial.


*

Custas pela Recorrida.

*

Dispensamos a junção de cópia do acórdão proferido em 15 de Novembro de 2019 no processo n.º 173/15 (952/12.8BEAVR), uma vez que indicamos onde está publicado.

*

Lisboa, 17 de Junho de 2020. - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos.