Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0198/14
Data do Acordão:05/07/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
NULIDADE DE CITAÇÃO
PEDIDOS SUBSTANCIALMENTE INCOMPATIVEIS
Sumário:I - A nulidade da citação, porque não determina a extinção da execução fiscal, mas apenas a repetição do acto com cumprimento das formalidades omitidas, não constitui fundamento de oposição à execução fiscal, antes devendo ser arguida em primeira linha perante o órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial de eventual decisão desfavorável.
II - Invocada a nulidade da citação em processo de oposição à execução fiscal, há que ponderar a possibilidade de convolação da petição inicial em requerimento dirigido à execução fiscal (cf. art. 97.º, n.º 3, da LGT e art. 98.º, n.º 4, do CPPT), possibilidade que, porque não é cindível a petição inicial, não existe nos casos em que nesta tenham sido também invocados fundamentos próprios da oposição à execução fiscal.
III - Tendo o juiz julgado procedente a oposição à execução fiscal com fundamento na invocada nulidade da citação, é de revogar a sentença.
IV - A fundamentação da reversão, devendo ser comunicada ao revertido quando da citação (art. 23.º, n.º 4, da LGT), não tem que constar do título executivo (cf. art. 163.º, n.º 1, do CPPT), e a falta dessa comunicação apenas poderá constituir nulidade da citação.
Nº Convencional:JSTA00068682
Nº do Documento:SA2201405070198
Data de Entrada:02/17/2014
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF VISEU
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART204 N1 I ART276 ART153 N2 ART163 N1 ART165 N1 B ART94 N4
LGT ART23 N4 ART97 N3 ART24
CPC13 ART193 N4 ART199 ART191 N1 N2
Jurisprudência Nacional:AC STAPLENO PROC0803/04 DE 2007/02/28; AC STAPLENO PROC0923/08 DE 2010/02/24; AC STAPLENO PROC0632/08 DE 2009/05/06; AC STAPLENO PROC0364/08 DE 2008/12/17
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLIII PAG144-145 VOLII PAG92-93 VOLIII PAG135 PAG125
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de oposição à execução fiscal com o n.º 681/05.9BEVIS

1. RELATÓRIO

1.1 A…………. (adiante Executado por reversão, Oponente ou Recorrido) deduziu oposição a uma execução fiscal que, instaurada contra a sociedade denominada “B……………., Lda.” para cobrança coerciva de dívida proveniente de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) do ano de 2004, reverteu contra ele porque a Administração tributária (AT) o considerou responsável subsidiário pela dívida exequenda.
Invocando as alíneas b), g) e i) do art. 204.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), alegou o Oponente, em resumo, o seguinte:
· desde 2003 que já não era gerente de facto da sociedade originária devedora;
· a citação que lhe foi feita é nula, porque desacompanhada do despacho de reversão e respectiva fundamentação, o que o impede de conhecer as razões que presidiram à liquidação que deu origem à dívida exequenda ou os pressupostos quer serviram de fundamento para se chegar ao imposto liquidado;
· não está demonstrada a insuficiência do património da sociedade originária devedora, sendo que a mesma é detentora de diversos bens, designadamente veículos automóveis;
· as certidões de dívida são ilegais, porquanto o campo referente à fundamentação da reversão não está preenchido.
1.2 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu proferiu sentença na qual decidiu nos seguintes termos: «julgo parcialmente procedente a presente oposição e, consequentemente: a) anulo a citação do Oponente para a reversão; b) anulo os termos subsequentes do processo que dependam daquela citação».
Isto, em resumo e se bem interpretamos a sentença recorrida, porque, depois de ter considerado improcedente a ilegitimidade invocada pelo Oponente como fundamento de oposição, passou a conhecer da arguida nulidade da citação, que julgou verificada, motivo por que deu como «prejudicado o conhecimento dos demais vícios invocados».

1.3 A Fazenda Pública não se conformou com a sentença e dela interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, que foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

1.4 A Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «

A) Visa o presente recurso sentença do TAF de Viseu, datada de 31/10/2013, no segmento que considera reunidos os pressupostos para a declaração de nulidade da citação para a reversão dirigida ao oponente, bem assim, a consequente anulação dos termos subsequentes do processo que dependam da citação (segunda questão apreciada após concluir pela improcedência relativamente à questão da ilegitimidade do oponente);
B) decidindo, assim, julgar a oposição parcialmente procedente e prejudicado o conhecimento dos demais vícios invocados pelo oponente. Para tal, traz à colação o Acórdão do STA de 12/09/2012, processo n.º 0884/12, do qual transcreve o que reputa relevante para decisão da questão (nulidade da citação para a reversão).
C) Olvidou, contudo, o Meritíssimo Juiz [do Tribunal] a quo duas questões essenciais (e prévias): que não constitui fundamento de oposição à execução fiscal a nulidade/irregularidade da citação e que se não pode convolar a petição de oposição em requerimento de arguição de nulidade, a apreciar no processo de execução fiscal, quando para além da arguição de nulidade se invoca um fundamento típico de oposição à execução fiscal.
D) É posição unânime do Supremo Tribunal Administrativo (cfr., entre muitos outros, o Acórdão de 11 de Julho de 2012, rec. n.º 599/12) que a nulidade irregularidade da citação não constitui fundamento de oposição, antes deve ser arguida perante o órgão da execução fiscal, com eventual reclamação da decisão para o tribunal.
E) Ao qualificar como próprio o processo de oposição (cfr. II - SANEAMENTO, a fls. 1 da sentença do TAF de Viseu), deverá o Tribunal a quo ter presente que a procedência de fundamento legal de oposição deverá conduzir à extinção da execução fiscal, pois que em sede fiscal, não visa a oposição o suprimento de vícios formais do processo executivo, mas sim extinguir a execução pela eventual procedência de algum dos fundamentos taxativamente elencados no art. 204.º do CPPT, que implicam a extinção total ou parcial da dívida exequenda em relação ao executado, por ocorrência de factos externos à própria execução.
F) As nulidades de citação não podem ser arguidas em processo de oposição à execução fiscal porque o processo de oposição tem por finalidade a extinção da execução, enquanto a nulidade da citação importa apenas a repetição do acto, com observância das formalidades omitidas.
G) A decisão consubstanciada na sentença ora em apreço reconduz-se à anulação da citação do oponente para a execução e anulação dos termos subsequentes do processo que dependam daquela citação (o sublinhado é nosso).
H) E, ainda que se conceda que a omissão de notificação do despacho de reversão integra preterição de formalidades legais do acto de citação, não é aceitável a preterição de formalidades legais do acto de citação como fundamento admitido da oposição à execução fiscal, porquanto não se está perante um vício que afecte a execução em geral nem o despacho que ordena a reversão em particular, mas apenas um acto que lhe é posterior (o acto de citação) e que, por isso, não importa a extinção da execução mas a realização do acto omitido (sendo que a finalidade da oposição é justamente a de extinguir a execução).
I) A este propósito se pronunciou já o Ilustre Conselheiro Jorge Sousa, in CPPT Anotado, 4.ª ed., pág. 744, anotação 17 (citação supra, em 9.º), a cuja argumentação somos sensíveis e à qual aderimos.
J) Assim, havendo na petição indicação de pedido (que se extrai do conjunto dos articulados) e fundamentos de oposição atendíveis, o processo pode prosseguir para sua apreciação, ficando prejudicado o conhecimento do fundamento da nulidade da citação, por impróprio e em consequência, improcedente (cfr. acórdão do STA de 25/09/2013, processo 01493/12).
K) Não tendo assim procedido o Meritíssimo Juiz [do Tribunal] a quo, incorreu em manifesto erro de julgamento.

Termos em que deverá o presente recurso merecer provimento, dando-se por prejudicado o conhecimento do fundamento da nulidade da citação na oposição e ordenando-se, em consequência, o conhecimento dos demais vícios invocados pelo oponente (cujo conhecimento ficou prejudicado)» (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgem aqui em tipo normal.).

1.5 O Oponente contra alegou, resumindo a sua posição em conclusões do seguinte teor: «
a) Nos termos das disposições combinadas dos artigos 23.º, n.º 4, e 22.º, n.º 4, a citação dos responsáveis revertidos em execução fiscal deve incluir a declaração fundamentada dos pressupostos e extensão da reversão e conter os elementos essenciais da respectiva liquidação, incluindo a fundamentação nos termos legais, a fim de poderem reclamar ou impugnar a dívida cuja responsabilidade lhes for atribuída, nos mesmos termos do devedor principal.

b) os responsáveis fiscais têm os mesmos direitos, quanto à dívida cuja responsabilidade lhes for atribuída, do devedor principal. Pelo que, a notificação ou citação deve conter todos os elementos da notificação ou citação do devedor principal, acrescidos daqueles que sejam próprios do devedor subsidiário.

c) As nulidades processuais vêm previstas no artigo 165.º, do CPPT, especificando no seu n.º 1, alínea a) a falta de citação como sendo nulidade insanável e n.º 2 que as nulidades dos actos acarreta a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente,

d) As nulidades processuais são de conhecimento oficioso conforme estabelecido pelo art. 165.º, n.º 4, do CPPT.

e) Sendo nula a citação com preterição das formalidades legais também nos termos do artigo 191.º, do CPC.

f) A citação feita ao Oponente vem desacompanhada do despacho de reversão e respectiva fundamentação, sendo por isso nula, uma vez que o Oponente desconhece as razões que presidiram à liquidação ou os pressupostos que serviram de fundamento ao imposto liquidado.

g) Conforme resulta dos autos e que foi dado como provado pelo Tribunal a quo, foi, assim, omitido elemento essencial relevante para a defesa dos interesses do Oponente, qual seja a respeitante à origem da dívida exequenda e respectiva fundamentação.

h) “Perscrutando os elementos trazidos aos autos e a própria contestação a Fazenda Pública, em momento algum é feita qualquer referência ao cumprimento dos comandos previstos nos artigos 2.º. e 24.º da LGT, tão pouco a Fazenda Pública faz referência à inexistência de prejuízo para o oponente em face da ausência dessa informação no Despacho de reversão e consequente notificação”.

i) Seguindo a doutrina constante do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10/04/2002, foi dado como provado que o direito de defesa do Oponente ficou prejudicado, pois “o que releva para o efeito de saber se deve ser atendido a arguição da nulidade é a possibilidade de prejuízo para a defesa do executado e não a existência de um prejuízo efectivo”.

j) No caso em apreço estamos perante uma nulidade insanável – a falta de citação da reversão fiscal – com claro prejuízo dos direitos de defesa do ora Oponente no âmbito do processo de execução fiscal aqui em apreço.

k) Pelo exposto, estão reunidos os pressupostos para a declaração de nulidade da citação de reversão dirigida ao Oponente com todas as consequências legais que daí advêm.

l) Mais, a Oponente demonstrou exaustivamente na sua petição a falta de fundamentação do acto de citação para reversão e dos seus pressupostos e extensão da reversão e conter os elementos essenciais da respectiva liquidação, incluindo a fundamentação nos termos legais.

m) E tal foi não foi contestado pela Fazenda Publica, tendo sido dado como provado a falta de fundamentação do acto de citação de reversão e da respectiva liquidação ao Oponente.

n) Nos termos do artigo 268.º, n.º 3, da CRP, e artigo 77.º, da LGT, existe um direito à fundamentação expressa e acessível de todos os actos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos.

o)Exige-se que o acto de liquidação venha sempre acompanhado de fundamentação. E no caso de uma reversão à execução a fundamentação tem que ser ainda mais detalhada.

p) A jurisprudência tem vindo a certificar o entendimento de que no momento da citação da reversão deve este acto conter em primeiro lugar a liquidação (o que não aconteceu) e ainda a sua fundamentação (o que não ocorreu) (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26/06/2002, processo n.º 0832/02)

q) Assim, a citação devia ter incluído a fundamentação, pois ela faz parte integrante do acto e a notificação que se exige é de todo o acto e não somente de parte dele.

r) A eficácia do acto que afecte direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos está dependente da sua notificação com a respectiva fundamentação e, sem tal notificação integral, o acto não será eficaz em relação ao destinatário, pois o acto não terá sido validamente notificado, com exige o n.º 1, do artigo 36 do CPPT.

s)A única conclusão que se pode retirar dos elementos carreados para os autos é de que os actos tributários em apreço está ferido do vício da falta de fundamentação e consequentemente devem ser anulados.

Termos em que deverá ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo a decisão do Tribunal a quo na parte que declara a nulidade da citação da reversão do oponente e, consequentemente, a anulação dos termos subsequentes do processo que dependam daquela citação e deverão os actos tributários ser declarados feridos do vício de falta de fundamentação com todas as consequências legais que daí advêm».

1.6 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que deve ser concedido provimento ao recurso e revogada a sentença na parte recorrida, com a seguinte fundamentação:

«[…] depois de citar diversas normas do CPC sobre nulidades processuais e de transcrever parte do acórdão do STA de 12/09/2012 (processo n.º 0884/12), o Mmo. juiz [do Tribunal] “a quo” considerou que a omissão de elementos sobre a liquidação que deu origem à quantia exequenda no acto de citação do oponente e a falta de prova da inexistência de prejuízo para este ultimo decorrente dessa situação, implicava a verificação de nulidade do acto de citação. É o que resulta do acórdão do Pleno do STA de 19/09/2012 (recurso n.º 1075/11) e demais jurisprudência ali citada, no qual se exarou que «a citação dos responsáveis revertidos em execução fiscal deve incluir a declaração fundamentada dos pressupostos e extensão da reversão e conter os elementos essenciais da respectiva liquidação, de forma a possibilitar-lhes o uso de todos os direitos processuais que podem ser exercidos na sequência da citação (oposição à execução, impugnação graciosa ou contenciosa da liquidação donde emerge a dívida), e que se o acto de citação não contiver esses elementos padecerá de nulidade caso se verifique a possibilidade de prejuízo para a defesa do citado, em conformidade com o regime contido na norma do n.º 4 do art. 198.º do CPC».
Mas decorre igualmente da citada jurisprudência do STA que «a nulidade da citação decorrente da inobservância das formalidades previstas no n.º 4 do art. 22.º da LGT, configurando uma nulidade processual, deve ser arguida perante o órgão da execução, cabendo reclamação da decisão que a indefira».
Ora, sobre esta temática o Mmo. juiz [do Tribunal] “a quo” não se pronunciou, já que se limitou a reconhecer verificada a referida nulidade, sem atentar aos fundamentos da oposição taxativamente previstos no artigo 204.º do CPPT e nos quais não se compreende a nulidade da citação.
Como invoca a Recorrente é pacífico na jurisprudência do STA que a questão da nulidade da citação não é passível de conhecimento em sede de oposição, a qual deve ser arguida no processo de execução fiscal e apreciada pelo órgão de execução fiscal. E só da decisão que recair sobre essa arguição é que cabe reclamação para o tribunal tributário ao abrigo do disposto no artigo 276.º e segs. do CPPT.
É que em regra, a oposição à execução visa a extinção da execução fiscal, total ou parcial embora possa igualmente ter por objecto a suspensão da execução (cfr. a este propósito o comentário do senhor conselheiro Jorge Lopes de Sousa, in CPPT Anotado e Comentado, 6 edição, vol. 3, pág.502), desiderato que não é conseguido com a declaração de nulidade da citação, que apenas conduz à renovação do acto, expurgado dos vícios que afectavam a sua validade.
Tal é a doutrina consagrada no acórdão do Pleno do STA de 28/02/2007 (rec. n.º 803/04), no qual se deixou exarado o seguinte:
«A verificação da nulidade não conduz, portanto, à extinção da execução (que constitui, em regra, o escopo da oposição), nem, sequer, à sua suspensão (que, em casos raros, se admite possa ser o resultado visado pela oposição). Estas as razões por que a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo vem julgando, quase unanimemente, que a nulidade relativa à citação para a execução fiscal não serve de fundamento à oposição – entendimento que remonta, já, à vigência do Código de Processo Tributário».
No mesmo sentido se inclinou o acórdão do Pleno do STA de 24/04/2010 (rec. n.º 0923/08), em que se reafirmou que «a citação em processo de execução fiscal é um acto processual de comunicação ao executado, sendo que o conhecimento e sanação da nulidade por falta de citação se traduz na prática de acto ou actos processuais que ao órgão da execução fiscal cabe realizar, ao abrigo da 1.ª parte da alínea f) do n.º 1 do artigo 10.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário».
Daí que não figurando entre os fundamentos da oposição à execução taxativamente previstos nas diversas alíneas do artigo 204.º do CPPT, a arguida nulidade da citação não seja passível de conhecimento em sede de oposição.
De modo que tendo o oponente invocado outros fundamentos que sejam subsumíveis no referido preceito legal, designadamente a sua ilegitimidade, por não ter exercido de facto a gerência, subsumível na alínea b) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, o tribunal deve conhecer destes e abster-se de conhecer daquela nulidade.
Motivo pelo qual não constituindo a nulidade da citação fundamento da oposição, a sua invocação não pode conduzir à procedência da acção, tal como foi decidido na sentença recorrida, a qual padece do vício que lhe é apontado pela Recorrente Fazenda Pública e nessa medida deve ser revogada, determinando-se a baixa dos autos ao tribunal recorrido para conhecer das demais questões invocadas pelo oponente, se a tal nada mais obstar».
1.7 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.
1.8 A questão que cumpre apreciar e decidir, como procuraremos demonstrar, é a de saber se a sentença errou quando, conhecendo da nulidade da citação, julgou a oposição à execução fiscal parcialmente procedente. Dito de outro modo, há que indagar se a nulidade da citação constitui fundamento da oposição à execução fiscal.
* * *
2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

A sentença recorrida efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:
«
A) A sociedade B……………., foi matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Carregal do Sal com o n.º 00019, foi transformada em sociedade anónima, sendo a forma de a obrigar através da assinatura conjunta de dois administradores, a assinatura de um administrador, no qual o conselho de administração tenha delegado poderes ou com a assinatura de uma mandatário com poderes para o efeito em conjunto com um administrador – cfr. fls. 7 a 19 do PEF anexo aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas.

B) Pelo registo de 08/08/1995, a B……….. passou a ter o seu conselho de administração constituído por C……………, D…………….., A……….., E………………. e F………………. – cfr. fls. 16 a 19 do PEF anexo aos autos.

C) O Oponente renunciou às funções de Administrador da B………….. em 31 de Julho de 2004 – cfr. fls. 19 dos autos.

D) Contra a sociedade B…………………., S.A., foi instaurado no Serviço de Finanças de Carregal do Sal a execução fiscal n.º 2518200401002295 [(Permitimo-nos corrigir o número da execução fiscal, relativamente ao qual ocorreu manifesto lapso de escrita.)] para cobrança coerciva de dívida de IVA do exercício de 2004, tendo para o efeito sido citada em 21/07/2004 – cfr. fls. 2 e 3 verso do PEF anexo aos autos.

E) A dívida revertida contra o Oponente é consubstanciada nos seguintes elementos:

PEF
DOC. ORIGEM
TRIBUTO
PERÍODO
VALOR
CERTIDÃO DÍVIDA
DATA CERTIDÃO
251820401002295
04102100036004220943
IVA
2004-03
13.680,00
2004/161729
12/06/2004


– Cfr. fls. 26 e 2 e 3 verso do PEF
anexo aos autos.

F) Com data de 31 de Janeiro de 2005, o Serviço de Finanças de Carregal do Sal emitiu informação do seguinte teor:

[segue-se a transcrição da informação de fls. 5 e 6 do processo de execução fiscal]

– Cfr. fls. 5 e 6 do PEF anexo aos presentes autos;

G) Com data de 11 de Fevereiro de 2005, o Chefe de Serviço de Finanças de Carregal do Sal emitiu o seguinte Despacho com vista à reversão contra o Oponente da dívida exequenda:

[segue-se a transcrição do despacho de fls. 29 do processo de execução fiscal]

– Cfr. fls. 29 do PEF anexo aos presentes autos;

H) Por Despacho de 11/02/2005, o Chefe de Serviços de Finanças determinou a audição prévia do Oponente para a reversão, nos seguintes termos:

[segue-se a transcrição do despacho de fls. 33 do processo de execução fiscal]

– Cfr. fls. 33 do PEF anexo aos presentes autos;

I) Com data de 16/02/2005, foi o Oponente notificado para exercer o direito de audição prévia na reversão que contra si tinha sido determinada, nos seguintes termos:

[segue-se a transcrição do despacho de fls. 20 do processo de execução fiscal]

– Cfr. fls. 20 do PEF anexo aos presentes autos;

J) O Oponente foi citado para a reversão nos termos que seguem:
[segue-se a transcrição da nota de citação de fls. 40 do processo de execução fiscal]

– Cfr. fls. 40 do PEF anexo aos presentes autos».

2.2 DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

Numa execução fiscal que, instaurada contra uma sociedade para cobrança de dívida de IVA do ano de 2004, reverteu contra o ora Recorrente, que foi considerado pelo órgão da execução fiscal responsável subsidiário pela dívida exequenda, veio aquele deduzir oposição com diversos fundamentos, a saber: (i) não era gerente de facto da sociedade originária devedora desde 2003, (ii) a sua citação enferma de nulidade, uma vez que não foi acompanhada pelo despacho de reversão e pela fundamentação da liquidação que deu origem à dívida exequenda, (iii) não está demonstrada a insuficiência do património da sociedade originária devedora, sendo que a mesma é detentora de diversos bens, designadamente veículos automóveis e (iv) as certidões de dívida são ilegais, porquanto o campo referente à fundamentação da reversão não está preenchido.
O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu começou por apreciar a ilegitimidade substantiva do Oponente, quer pelo não exercício da gerência de facto, requisito da responsabilidade subsidiária pela dívida exequenda [cf. art. 24.º da Lei Geral Tributária (LGT)], quer pela não verificação da excussão do património da sociedade originária devedora como condição para a efectivação daquela responsabilidade (cf. art. 23.º, n.º 2, da LGT e art. 153.º, n.º 2, do CPPT), para considerar que não ocorria esse fundamento de oposição à execução fiscal subsumível à alínea b) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT. Nesse segmento a sentença transitou em julgado.
Depois, passou a conhecer da invocada nulidade da citação, concluindo pela sua verificação, uma vez que considerou que no acto por que foi citado não foi fornecido ao ora Recorrido o despacho de reversão e respectiva fundamentação, cerceando-lhe, para além do mais, o conhecimento sobre a origem da liquidação que deu origem à dívida exequenda.
Concluiu julgando a oposição à execução fiscal parcialmente (A aceitar-se a tese da sentença, mal se compreende que a procedência seja parcial. Na verdade, a aceitar-se que a nulidade da citação seja fundamento de oposição à execução fiscal, então não vemos por que não se julgaria a oposição procedente na íntegra.) procedente e «consequentemente», anulando a citação e, bem assim, «os termos subsequentes do processo que dependam daquela citação».

A Fazenda Pública não se conformou com a sentença na parte em declarou a nulidade da citação e anulou os ulteriores termos processuais dependentes do acto anulado. Por isso interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo. Sustenta, em síntese, se bem interpretamos as alegações de recurso e respectivas conclusões, que não podia o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu conhecer da nulidade da citação, que não constitui fundamento de oposição à execução fiscal; que deveria, ao invés, e porque não ocorre o erro na forma do processo, uma vez que se pode inferir da petição inicial o pedido de extinção da execução fiscal, e porque foram também invocados fundamentos válidos de oposição à execução fiscal, ter-se limitado a conhecer destes, ficando sem efeito o pedido de declaração da nulidade da citação, incompatível com a forma processual escolhida.
Daí termos enunciado a questão a apreciar e decidir como sendo a de saber se a sentença errou quando, conhecendo da nulidade da citação, julgou a oposição à execução fiscal procedente.

*

2.2.2 DA INTERPRETAÇÃO DO PEDIDO FORMULADO, DO ERRO NA FORMA DO PROCESSO E DOS FUNDAMENTOS DE OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL

Apesar de o Oponente não ter indicado expressamente qual o efeito jurídico pretendido com a oposição, antes tendo optado por uma fórmula vazia de conteúdo para formular o pedido («requer se digne receber a presente Oposição à Execução e, após a sua normal tramitação, julgada procedente, por provada, tudo com as legais consequências»), afigura-se possível inferir, em face da alegação aduzida na petição, que a sua pretensão é dupla e, como procuraremos demonstrar incompatível: a de que se extinga a execução fiscal, por um lado, e a de que se declare a nulidade da citação, por outro.
Para o pedido de extinção da execução, a forma processual escolhida pelo Executado é, inequivocamente, a ajustada (Note-se que a oposição, em regra, visa a extinção, total ou parcial, da execução fiscal, mas pode também ter por objecto a suspensão da execução. É o caso em que a exigibilidade da dívida seja determinada por motivo meramente temporário, como, v.g., concessão de uma moratória (como as que têm vindo a suceder nos diplomas que prevêem regimes especiais de regularização de dívidas), existência de processo de falência ou de insolvência ou recuperação de empresas, ter sido decidida, por via administrativa, a suspensão da eficácia do acto de liquidação ou a própria suspensão da execução. Neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume III, anotação 39 ao art. 204.º, pág. 502, de onde extraímos os exemplos referidos.); mas já não o é para o outro pedido, de declaração da nulidade da citação. Como este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar repetida e uniformemente, a nulidade da citação não consubstancia fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos do disposto no art. 204.º do CPPT, não sendo subsumível, designadamente, na previsão da alínea i) do n.º 1 daquele artigo e, como nulidade, deverá ser invocada perante o órgão da execução fiscal [cf. n.ºs 1 e 2 do art. 191.º do Código de Processo Civil (CPC), que corresponde ao art. 198.º na anterior versão do Código], com possibilidade de reclamação para o tribunal tributário de eventual decisão desfavorável (art. 276.º do CPPT) (Neste sentido, vide os seguintes acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
­ de 28 de Fevereiro de 2007, proferido no processo n.º 803/04 publicado no Apêndice ao Diário da República de 5 de Dezembro de 2007 http://dre.pt/pdfgratisac/2007/32410.pdf), págs. 36 a 44, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/29187a21aba2ec588025729d00551d75?OpenDocument;
­ de 24 de Fevereiro de 2010, proferido no processo n.º 923/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 3 de Março de 2011 (http://dre.pt/pdfgratisac/2010/32410.pdf), págs. 58 a 62, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/6603a143389bd257802576dd00504304?OpenDocument.
No mesmo sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, III volume, anotação 13 ao art. 165.º, págs. 144/145.).
Assim, o Juiz do Tribunal a quo, ao invés de afirmar, como afirmou, que o processo não enferma de nulidades, designadamente por erro na forma do processo (O erro na forma do processo é uma nulidade que consiste na utilização de meio processual impróprio. A sua verificação afere-se pela adequação do meio processual utilizado ao fim por ele visado: se o pedido, ou seja, a concreta pretensão de tutela solicitada pelo autor ao tribunal não se ajusta à finalidade abstractamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre o erro na forma do processo. Cfr. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, volume II, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, págs. 288/289. No mesmo sentido, RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, volume I, 3.ª edição, 1999, pág. 262, e ANTUNES VARELA, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 100.º, pág. 378.), deveria ter declarado o erro na forma do processo relativamente ao pedido de declaração de nulidade da citação.
Recordemos aqui os ensinamentos de JORGE LOPES DE SOUSA, sob a epígrafe «Erro parcial na forma de processo» (As referências que são feitas aos arts. 193.º e 199.º do CPC devem, em face do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 36/2013, de 12 de Agosto, considerar-se feitas para os actuais arts. 186.º e 193.º, respectivamente.):

«Nos casos em que tenha sido efectuada cumulação de pedidos e a forma do processo seja adequada à apreciação apenas de um deles, não poderá haver correcção da forma de processo quanto aos processos para os quais a forma de processo é inadequada, pois o processo tem de seguir a forma escolhida pelo interessado relativamente à apreciação do pedido para que essa forma de processo é adequada.
Nestes casos, a solução que se extrai do tratamento dado a uma questão paralela no n.º 4 do art. 193.º do CPC, é a de considerar sem efeito o pedido ou pedidos para o qual o processo não é adequada, seguindo o processo apenas para apreciação do pedido que deva ser apreciado em processo do tipo escolhido pelo interessado.
Essa consequência é uma aplicação da regra do art. 199.º do CPC, segunda a qual, no caso de erro na forma de processo, é nulo todo o processado que não puder aproveitar-se para a tramitação de acordo com a forma estabelecida na lei. Nesses casos de erro parcial da forma de processo, como este tem de prosseguir para apreciação do pedido para que é adequado, a consequência relativamente ao outro pedido será a de nulidade parcial do processo, na parte a ele respeitante, o que se reconduz a que o processo prossiga como se esse pedido não tivesse sido efectuado» (Ob. cit., volume II, anotação 10 e) ao art. 98.º, págs. 92/93.).
O mesmo Autor, renovando a doutrina acima exposta, mas agora referindo-se à hipótese aqui em causa – de cumulação da arguição de nulidade da citação em processo de oposição à execução fiscal com fundamento de oposição previsto no art. 204.º, n.º 1, do CPPT –, afirma:

«Se a arguição de nulidade por falta de citação ou qualquer nulidade secundária for feita em oposição à execução fiscal, nos casos em que não o pode ser, poderá haver possibilidade de convolação de petição de oposição em requerimento de arguição de nulidade com a consequente incorporação do mesmo no processo de execução fiscal, convolação essa que, quando possível, é obrigatória, nos termos dos arts. 97.º, n.º 3, da LGT, e 98.º, n.º 4, do CPPT.

Tal possibilidade, porém não existe quando a nulidade da citação não é o único fundamento de oposição invocado e entre os invocados se inclua algum que esteja previsto como tal no art. 204.º.

Em situações deste tipo, havendo uma cumulação de pedidos e ocorrendo erro na forma de processo quanto a um deles, a solução que se extrai do regime do processo civil é considerar sem efeito o pedido para o qual o processo não é adequado, como se infere da solução dada a uma questão paralela no n.º 4 do art. 193.º do C.P.C. Na verdade, refere-se nesta norma, para o caso de cumulação de pedidos substancialmente incompatíveis que «a nulidade subsiste, ainda que um dos pedidos fique sem efeito, por incompetência do tribunal ou por erro na forma de processo». Não se estará, decerto, perante um caso aqui directamente enquadrável, pois não haverá cumulação de pedidos substancialmente incompatíveis. No entanto, nesta norma pressupõe-se que a solução legal para a apresentação de um pedido para o qual o processo é inadequado é a de que ele «fique sem efeito», prosseguindo o processo para apreciação do pedido para o qual o processo é adequado. Por isso, nestes casos em que são invocados fundamentos de oposição juntamente com a arguição de nulidade, não haverá possibilidade de convolação, por esta pressupor que todo o processo passasse a seguir a tramitação adequada e, nestas situações, tal não poder determinar-se, por o processo de oposição ser o próprio para apreciação dos fundamentos invocados que devam ser apreciados em processo de oposição» (Ob. cit., volume III, anotação 14 ao art. 165.º, págs. 146/147.).
Ou seja e regressando ao caso sub judice, verificado que está que um dos pedidos formulados na petição inicial (de extinção da execução fiscal) é adequado à forma processual escolhida e outro (de declaração de nulidade da citação) não, deveria o processo ter prosseguido apenas para conhecimento daquele, considerando-se sem efeito este, relativamente ao qual deveria decretar-se a nulidade parcial do processo.
Não foi isso que foi feito na sentença recorrida, onde se entendeu conhecer de todos os pedidos formulados e, consequentemente, de todos os fundamentos invocados na petição inicial (à excepção do que se considerou prejudicado). Assim, o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, após ter apreciado um fundamento típico de oposição à execução fiscal – a ilegitimidade do Oponente –, passou a conhecer de um fundamento – a nulidade da citação – que, como vimos já, apenas poderia suportar o pedido de anulação desse acto, pedido para o qual a forma processual escolhida não é idónea.
Note-se que não está em causa apreciar a correcção do julgamento efectuado relativamente a esse fundamento, saber se o juiz decidiu bem ou mal a questão da nulidade da citação (motivo por que, salvo o devido respeito, não há sequer que apreciar a argumentação aduzida pelo Oponente nas contra alegações do recurso), mas a própria possibilidade de efectuar esse julgamento em sede de oposição à execução fiscal, isto é, saber se em sede de oposição à execução fiscal pode ou não decretar-se a nulidade da citação.
A resposta é inequívoca: não pode (Sem prejuízo de, excepcionalmente, se poder conhecer dessa nulidade em sede de oposição à execução fiscal, a fim de sindicar a tempestividade do exercício do direito de se opor.). A oposição, que tem a natureza de uma contestação, visa, em regra, a extinção da execução fiscal, enquanto a nulidade da citação apenas pode determinar a repetição do acto com suprimento das irregularidades que determinaram a anulação e a repetição dos actos subsequentes que, porque dependentes da citação anulada, tenham sido também anulados. Assim, porque a nulidade da citação não tem como efeito a extinção da execução fiscal não pode ser erigida, em circunstância alguma, em fundamento de oposição à execução fiscal.
Há, pois, que conceder provimento ao recurso e revogar a sentença na parte recorrida.
*
2.2.3 DO DESTINO DA OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL

Quer a Recorrente quer o Procurador-Geral adjunto, representante do Ministério Público junto deste Supremo Tribunal Administrativo, sustentam que, revogada que seja (como foi) a sentença na parte recorrida, deve ordenar-se ao tribunal de 1.ª instância que conheça das demais questões invocadas pelo Oponente. Vejamos:

Como dissemos já, o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, para além da nulidade da citação e previamente a esta, apreciou também a ilegitimidade do Oponente, enquanto fundamento de oposição à execução fiscal subsumível à alínea b) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, sob a dupla vertente assumida pela alegação aduzida na petição inicial: não exercício da gerência de facto, como requisito da responsabilidade subsidiária pela dívida exequenda (cf. art. 24.º da LGT) e não verificação da excussão do património da sociedade originária devedora, como condição para a efectivação daquela responsabilidade (cf. art. 23.º, n.º 2, da LGT e art. 153.º, n.º 2, do CPPT). Relativamente a ambas as questões, considerou o Juiz improcedente aquela alegação.
Nessa parte a sentença transitou em julgado.
Assim, compulsada a petição inicial, verificamos que resta para apreciar a invocada «ilegalidade» da certidão de dívida por nela ter ficado por preencher o campo respeitante à fundamentação da reversão, que o Oponente considera que deveria ter sido preenchido. Será essa a questão a que se refere o Juiz do Tribunal a quo como tendo ficado prejudicada.
A referida alegação reconduz-se à invocação da falta de requisitos do título executivo.
Acontece, porém, que a falta de requisitos do título executivo só poderá assumir relevância na medida em que se trate de requisitos essenciais, taxativamente enumerados no n.º 1 do art. 163.º do CPPT, e não for susceptível de suprimento por prova documental. É o que resulta do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 165.º do CPPT, que prevê como nulidade insanável (Insanável, como esclarece JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., volume III, anotação 2 ao art. 165.º, pág. 135, «não significa que não seja admissível a sanação de tais nulidades, se ela for possível, mas apenas que elas não ficam sanadas ou supridas pelo mero decurso do tempo sem arguição, podendo ser conhecidas oficiosamente o na sequência de arguição, até ao trânsito em julgado da decisão final».) «A falta de requisitos essenciais do título executivo, quando não puder ser suprida por prova documental».

Ora, no caso a irregularidade que o Oponente assaca ao título executivo não pode ser qualificada como falta de um requisito essencial, pois o n.º 1 do art. 163.º do CPPT não impõe que conste do título executivo a fundamentação do despacho de reversão. Sem prejuízo de esta dever ser comunicada ao revertido quando da citação (como decorre do disposto no art. 23.º, n.º 4, da LGT e sob pena de nulidade da citação), a lei não impõe que conste do título executivo.
Aliás, a dupla função que a doutrina assinala ao título executivo é, por um lado, a de «assegurar à entidade perante quem corre a execução, a possibilidade de verificar se estão reunidas as condições para prosseguir com o processo, em que se incluem as de se estar perante uma dívida certa, líquida e exigível» e, por outro lado, a de «informar o executado sobre a dívida que se executa e poder organizar a sua defesa, se assim o entender», sendo «à luz desta dupla função do título executivo que tem de ser apreciada a existência de nulidade insanável e a possibilidade da sua sanação através de prova documental, para efeitos do art. 165.º, n.º 1, alínea b), do CPPT» (Cf. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., volume III, anotação 2 ao art. 163.º, pág. 125.).
Ora, no caso, ainda que se considerasse que a indicação dos fundamentos da reversão constitui um requisito do título executivo – e não consideramos – sempre essa falta seria suprível pela apresentação do despacho de reversão.
Ainda que assim não fosse, é hoje jurisprudência uniforme que a nulidade da falta de requisitos essenciais do título executivo – nos termos do art. 165.º, n.º 1, alínea b), do CPPT – não é fundamento de oposição à execução fiscal por não enquadrável no seu artigo 204.º, n.º 1, alínea i) (Neste sentido, vide os seguintes acórdãos do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
­ de 23 de Fevereiro de 2005, proferido no processo n.º 574/04, publicado no Apêndice ao Diário da República de 10 de Novembro de 2005 (http://dre.pt/pdfgratisac/2005/32410.pdf), págs. 36 a 38, também disponível em também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/811cd756e9527e4b80256fbe0040a38e?OpenDocument;
­ de 19 de Novembro de 2008, proferido no processo n.º 430/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 27 de Janeiro de 2009 (http://dre.pt/pdfgratisac/2008/32440.pdf), págs. 141 a 145, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d13a3595a6c545e28025751b003a2873?OpenDocument;
­ de 17 de Dezembro de 2008, proferido no processo n.º 364/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 27 de Janeiro de 2009 (http://dre.pt/pdfgratisac/2008/32440.pdf), págs. 167 a 170, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d31aa8283a494f0080257538005173d9?OpenDocument;
­ de 6 de Maio de 2009, proferido no processo n.º 632/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 25 de Setembro de 2009 (http://dre.pt/pdfgratisac/2009/32420.pdf), págs. 105 a 109, também disponível em­http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d3a50cb2f056cb64802575bc00524098?OpenDocument.).
O que, sem necessidade de outros considerandos, nos leva à conclusão de que o único fundamento dos que foram invocados na petição inicial e que subsistia para apreciação judicial não é subsumível ao elenco do n.º 1 do art. 204.º do CPPT.
Poderá ainda questionar-se se não será caso de ordenar a convolação do processo para a forma processual adequada para a apreciação da nulidade da citação porque desacompanhada dos fundamentos da reversão (cf. art. 97.º, n.º 3, da LGT e art. 98.º, n.º 4, do CPPT), ou seja, em requerimento de arguição de nulidade, junto do respectivo órgão de execução fiscal.
Retomando argumentação já acima aduzida, diremos singelamente que a tal obsta o facto de o Oponente ter invocado fundamento próprio da oposição à execução fiscal, qual seja a referida ilegitimidade, devidamente conhecida na sentença recorrida, que nessa parte transitou em julgado.
O que, sem mais, nos permite concluir que a oposição à execução fiscal é de julgar totalmente improcedente, como decidiremos a final.
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2.2.4 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - A nulidade da citação, porque não determina a extinção da execução fiscal, mas apenas a repetição do acto com cumprimento das formalidades omitidas, não constitui fundamento de oposição à execução fiscal, antes devendo ser arguida em primeira linha perante o órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial de eventual decisão desfavorável.
II - Invocada a nulidade da citação em processo de oposição à execução fiscal, há que ponderar a possibilidade de convolação da petição inicial em requerimento dirigido à execução fiscal (cf. art. 97.º, n.º 3, da LGT e art. 98.º, n.º 4, do CPPT), possibilidade que, porque não é cindível a petição inicial, não existe nos casos em que nesta tenham sido também invocados fundamentos próprios da oposição à execução fiscal.
III - Tendo o juiz julgado procedente a oposição à execução fiscal com fundamento na invocada nulidade da citação, é de revogar a sentença.
IV - A fundamentação da reversão, devendo ser comunicada ao revertido quando da citação (art. 23.º, n.º 4, da LGT), não tem que constar do título executivo (cf. art. 163.º, n.º 1, do CPPT), e a falta dessa comunicação apenas poderá constituir nulidade da citação.
* * *
3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, conceder provimento ao recurso, revogar a sentença na parte recorrida e, em substituição, julgar a oposição à execução fiscal totalmente improcedente.

Custas pelo Recorrido.
*
Lisboa, 7 de Maio de 2014. – Francisco Rothes (relator) – Casimiro Gonçalves – Pedro Delgado.