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Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01167/18.7BELRA
Data do Acordão:06/09/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:SOCIEDADE EXTINTA
LIQUIDAÇÃO
CITAÇÃO
EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:Nada obsta a que as liquidações (ou demonstração de acertos de contas) de dívidas fiscais anteriores à extinção de sociedade sejam emitidas em nome da sociedade extinta, por ser a devedora originária, e notificadas ao ex-sócio seu representante, bem como nada obsta que a subsequente execução fiscal seja instaurada contra a mesma dita sociedade por ser ela que figura no título executivo.
Nº Convencional:JSTA000P27822
Nº do Documento:SA22021060901167/18
Data de Entrada:11/18/2020
Recorrente:A............
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A…………, na qualidade de ex-sócio da sociedade B…………, LDA., oponente nos autos em epígrafe, inconformado interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (TAF de Leiria), datada de 26 de Agosto de 2020, que julgou improcedente a oposição deduzida contra a execução fiscal n.º 1384201801137646, instaurada pelo Serviço de Finanças de Leiria -1.

Alegou, tendo apresentado as seguintes conclusões:
“A) O ora recorrente discorda da douta sentença recorrida, entendendo que, face ao direito aplicável, incorreu o M.ma Juíza “a quo” em errónea interpretação e aplicação do Direito.
B) Estando a sociedade notificanda extinta à data da emissão das demonstrações das liquidações e demonstrações de acerto de contas, as notificações destes atos deveriam ter sido emitidas em nome do ex-sócio e não dirigidas/emitidas à sociedade extinta.
C) A extinção do registo de pessoa coletiva determina o fim da personalidade jurídica (artigo 5º do CSC a contrário) e, consequentemente, o fim da personalidade tributária.
D) Nos termos do artigo 16º, n.º 3 da LGT, os direitos e os deveres das entidades sem personalidade jurídica são exercidos pelos seus representantes, ao caso o ex-sócio da sociedade extinta, aqui recorrente.
E) Sucede que, tal como consta dos autos, as demonstrações das liquidações e de acertos de contas foram emitidas em nome da sociedade dissolvida da seguinte forma “B…………, LDA. representada por A…………” e não em nome do aqui recorrente.
F) Na verdade, não é indiferente a liquidação ser emitida em nome de “B…………, LDA. representada por A………… ou ser emitida em nome de “A………… ex-sócio da sociedade B…………, LDA.”.
G) De acordo com a primeira forma, a liquidação é emitida em nome da sociedade, sendo esta a visada na mesma, já na segunda forma quem é visado na liquidação é o ex-sócio, e só neste último caso se pode, realmente, considerar que a liquidação foi emitida em nome do ex-sócio e não em nome da sociedade dissolvida.
H) No caso em apreço, a liquidação não foi emitida em nome do ex-sócio, mas sim da sociedade, pelo que não pode considerar-se que o ex-sócio tenha sido notificado dos atos tributários.
I) Por outro lado, a instauração da execução contra a executada “B…………, LDA. representada por A………… .”, e não contra o aqui recorrente, reconduz-se à cobrança coerciva contra quem não tem legitimidade para ser executada, uma vez que se extinguiu a personalidade jurídica da sociedade aquando do cancelamento da matrícula, pelo que, a sociedade dissolvida e cancelada que foi citada para a execução sempre terá de ser considerada parte ilegítima.
J) A douta sentença recorrida padece de errónea interpretação da lei, ao determinar que a dívida é exigível ao aqui recorrente, com fundamento no artigo 147º, n.º 2 do Código das Sociedade Comerciais, e com fundamento numa interpretação extensiva do disposto no n.º 3 do artigo 155º do CPPT.
L) Porque não consta dos factos provados que as demonstrações das liquidações de imposto tenham sido notificadas ao ora recorrente ao abrigo de tal normativo, nem consta que a citação para a execução fiscal se encontra fundamentada no n.º 2 do artigo 147º do CSC.
M) Depois, a douta sentença recorrida não pode determinar a improcedência do pedido alicerçada numa norma legal que não consta dos atos da AT para determinar a exigibilidade da dívida ao aqui recorrente.
N) Ademais, na douta sentença recorrida nada consta quanto à partilha, de que forma foi efetuada, se houve bens partilhados ou adjudicados à aqui recorrente e qual o seu valor, pelo que a omissão desta factualidade não permite determinar a responsabilidade tributária solidária e ilimitada da aqui recorrente.
O) Acresce que, imputar ao aqui recorrente a responsabilidade da dívida apurada pela AT após a extinção da sociedade, com base no n.º 2 do artigo 147º do CSC, no sentido de estabelecer uma responsabilidade tributária solidária e ilimitada do ex-sócio é inconstitucional, material e organicamente, por violação do princípio da igualdade e por violação do princípio da legalidade tributária na vertente de reserva de lei e da tipicidade, nos termos do disposto nos artigos 103º n.º 2 e 165º, n.º 1 alínea i) da Constituição da República Portuguesa.
P) A douta sentença recorrida não pode manter-se na ordem jurídica, por errónea aplicação e interpretação do disposto nos artigos 16º, n.º 3 da LGT e 147º n.º 2 do CSC, norma esta que padece de inconstitucionalidade material e orgânica, por violar o princípio da igualdade e por não ter sido precedida de autorização legislativa.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, julgando procedente a oposição.”.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público notificado pronunciou-se emitindo parecer no sentido da improcedência do recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

Cumpre decidir.

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
“1. Em 14-06-2006, através da AP n.º 5/20060614, foi averbado na Conservatória do Registo Comercial a constituição da sociedade «B…………, LDA.» tendo como sócios o Oponente A………… e C…………, e sido designado gerente o Oponente (cfr. certidão de fls. 14 a 16 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
2. Em 03-04-2014 foi exarada acta da assembleia geral da sociedade «B…………, LDA.» através da qual foi aprovada a dissolução da sociedade (cfr. fls. 18/frente e verso dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
3. Em 08-05-2014, através da AP n.º 1/20140508, foi averbado na Conservatória do Registo Comercial a dissolução, encerramento da liquidação e cancelamento da matrícula da sociedade «B…………, LDA.» (cfr. certidão de fls. 14 a 16 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
4. Em 12-06-2018 foi emitida em nome de «B…………, LDA. representada por A…………», a liquidação n.º 2018 023962924, referente a IVA do período de Janeiro de 2014, no valor de € 17.244,00 (cfr. fls. 4 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
5. O documento identificado no número antecedente foi expedido e depositado na caixa postal electrónica Via CTT do Oponente A………… em 16-06-2018, constando como data de abertura do documento o dia 18-06-2018 (cfr. fls. 4, 5 e 65 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
6. Em 15-06-2018 foi emitida em nome de «B…………, LDA. representada por A…………», a demonstração de acerto de contas n.º 2018 00024343761, referente a IVA do período de Janeiro de 2014, no valor de € 17.244,00, com data limite de pagamento a 25-07-2018 (cfr. fls. 6 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
7. O documento identificado no número antecedente foi expedido e depositado na caixa postal electrónica Via CTT do Oponente A………… em 16-06-2018, constando como data de abertura do documento o dia 18-06-2018 (cfr. fls. 6, 7 e 66 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
8. Em 01-08-2018, foi extraída em nome da sociedade «B…………, LDA.» a certidão de dívida n.º 2018/1387080 (cfr. fls. 9/frente e verso dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
9. Na mesma, data – 01-08-2018 – foi instaurado no Serviço de Finanças de Leiria – 1, em nome da sociedade «B…………, LDA.» o processo de execução fiscal n.º 1384201801137646, para cobrança de dívida de IVA do ano de 2014, no valor de € 17.244,00 (cfr. fls. 8 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); 10. Em 02-08-2018 foi emitida nome da sociedade «B…………, LDA.» citação para o processo de execução fiscal identificado no número antecedente, no valor de 17.387,43 (cfr. fls. 10 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
11. A presente Oposição foi apresentada no Serviço de Finanças de Leiria – 1 em 06-09-2018, tendo dado entrada neste Tribunal em 26-09-2018 (cfr. fls. 1 e 11 dos autos).”.
Nada mais se deu como provado.

Há que conhecer do recurso que nos vem dirigido.
O recorrente suscita diversas questões que cumpre apreciar e que são as seguintes, tal como identificadas nas conclusões do seu recurso:
1-estando a sociedade notificanda extinta à data da emissão das demonstrações das liquidações e demonstrações de acerto de contas, as notificações destes atos deveriam ter sido emitidas em nome do ex-sócio e não dirigidas/emitidas à sociedade extinta;
2-a instauração da execução contra a executada “B…………, LDA. representada por A………… .”, e não contra o aqui recorrente, reconduz-se à cobrança coerciva contra quem não tem legitimidade para ser executada, uma vez que se extinguiu a personalidade jurídica da sociedade aquando do cancelamento da matrícula, pelo que, a sociedade dissolvida e cancelada que foi citada para a execução sempre terá de ser considerada parte ilegítima;
3-a sentença recorrida padece de errónea interpretação da lei, ao determinar que a dívida é exigível ao aqui recorrente, com fundamento no artigo 147º, n.º 2 do Código das Sociedade Comerciais, e com fundamento numa interpretação extensiva do disposto no n.º 3 do artigo 155º do CPPT, porque não consta dos factos provados que as demonstrações das liquidações de imposto tenham sido notificadas ao ora recorrente ao abrigo de tal normativo, nem consta que a citação para a execução fiscal se encontra fundamentada no n.º 2 do artigo 147º do CSC;
4-a sentença recorrida não pode determinar a improcedência do pedido alicerçada numa norma legal que não consta dos atos da AT para determinar a exigibilidade da dívida ao aqui recorrente;
5-na sentença recorrida nada consta quanto à partilha, de que forma foi efetuada, se houve bens partilhados ou adjudicados à aqui recorrente e qual o seu valor, pelo que a omissão desta factualidade não permite determinar a responsabilidade tributária solidária e ilimitada da aqui recorrente;
6-imputar ao aqui recorrente a responsabilidade da dívida apurada pela AT após a extinção da sociedade, com base no n.º 2 do artigo 147º do CSC, no sentido de estabelecer uma responsabilidade tributária solidária e ilimitada do ex-sócio é inconstitucional, material e organicamente, por violação do princípio da igualdade e por violação do princípio da legalidade tributária na vertente de reserva de lei e da tipicidade, nos termos do disposto nos artigos 103º n.º 2 e 165º, n.º 1 alínea i) da Constituição da República Portuguesa;
7-a sentença recorrida não pode manter-se na ordem jurídica, por errónea aplicação e interpretação do disposto nos artigos 16º, n.º 3 da LGT e 147º n.º 2 do CSC, norma esta que padece de inconstitucionalidade material e orgânica, por violar o princípio da igualdade e por não ter sido precedida de autorização legislativa.

As diversas questões suscitadas pelo aqui recorrente já mereceram resposta deste Supremo Tribunal em anteriores acórdãos, cuja doutrina se seguirá agora de perto.
No acórdão datado de 17-12-2014, recurso n.º 01433/13, escreveu-se quanto às primeiras questões suscitadas pelo recorrente:
“…nada obsta à citação dos ex-sócios para responderem pela dívida exequenda liquidada à sociedade que tenha sido extinta mediante liquidação (Acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 12 de Abril de 2000, proferido no processo n.º 24.558, publicado no Apêndice ao Diário da República de 23 de Dezembro de 2002 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2000/32221.pdf), págs. 1488 a 1493, com sumário também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/03b4fa0c5931b75b8025696500447251?OpenDocument.).
Correlativamente, note-se também que «não há obstáculo a que uma execução seja instaurada contra pessoa colectiva extinta, desde que seja a devedora original que conste do título executivo, pois este tipo de situações enquadra-se na previsão do n.º 3 do art. 155.º do CPPT, por interpretação extensiva. A situação será idêntica à de instauração contra uma pessoa singular que já tenha falecido, pelo que se justificará a habilitação sumária prevista no art. 155.º, n.º 3, do CPPT» (JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, III volume, anotação 11 ao art. 155.º, pág. 86.).
Assim, nada impede que a AT instaure a execução fiscal contra pessoa que, figurando no título executivo, tenha sido extinta. Não se vê, mesmo, como pode a Administração instaurar a execução, inicialmente, contra outrem que não seja a pessoa que consta do título, pessoa essa que é o sujeito passivo da obrigação, determinado de acordo com a lei. É o que sucede com as pessoas singulares, perante a morte das quais a lei tem solução, como se vê no art. 155.º do CPPT; e é o que sucede também com as pessoas colectivas, cujo termo da personalidade jurídica não implica a extinção das respectivas dívidas, nem priva o credor de as exigir coercivamente (Vide o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 12 de Março de 2003, proferido no processo n.º 1975/02, publicado no Apêndice ao Diário da República de 25 de Março de 2004 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2003/32210.pdf), págs. 536 a 541, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/80b27086856ee5de80256cee00516a72?OpenDocument.).
A dívida exequenda foi liquidada à sociedade devedora após a dissolução desta. Mas, como resulta do n.º 2 do art. 147.º («As dívidas de natureza fiscal ainda não exigíveis à data da dissolução não obstam à partilha nos termos do número anterior, mas por essas dívidas ficam ilimitada e solidariamente responsáveis todos os sócios, embora reservem, por qualquer forma, as importâncias que estimarem para o seu pagamento».) do Código das Sociedades Comerciais, pelas “dívidas de natureza fiscal ainda não exigíveis à data da dissolução”, “ficam ilimitada e solidariamente responsáveis todos os sócios”.
Assim, a sociedade extinta continua a ser o sujeito da relação jurídica tributária, mesmo que a lei designe outros responsáveis pelo respectivo pagamento.
Nada na lei impede a AT de efectuar um acto tributário de liquidação de imposto já depois de extinta a pessoa (singular ou colectiva) sujeito passivo da obrigação jurídica tributária, ainda que o seu pagamento haja de ser exigido a outrem, que a lei designe como responsáveis pelo pagamento, designadamente os sócios…”.
Também no recurso n.º 0321/19.9BELRA, decidiu por acórdão datado de 12-05-2021 que, Sendo as notificações a que se referem os pontos 9 e seguintes da matéria de facto, relativas às dívidas tributárias em causa, todas anteriores à referida data de extinção, …podiam ter sido efetuadas na pessoa daquela que se manteve como sua representante, nos termos do artigo 16.º n.º 3 da L.G.T..
Não colhe, por isso, o fundamento de inexigibilidade invocado a respeito da questão em epígrafe.
Quanto à execução ter sido movida à dita sociedade e não à ex-sócia e ao fundamento de ilegitimidade:
Quanto à sociedade executada, encontra-se prevista a sua extinção, com o registo do encerramento da liquidação, nos termos do art. 160.º, n.º 2, do C.S.C..
Ainda que de tal decorra normalmente a extinção da sua personalidade jurídica, e judiciária também, tal não invalida que a execução fiscal não possa ainda ser instaurada contra a mesma, tal como consta do título executivo, nos termos do art. 155.º n.º 1 do C.P.P.T, ainda que para prosseguir contra a oponente, sua ex-sócia e liquidatária.
Conforme Jorge Lopes de Sousa defende em Código de Procedimento e Processo Tributário Anotado e Comentado, 6.ª ed., 2011, Áreas, vol. III, pág. 86, a execução fiscal é instaurada contra a “pessoa que no título figurar como devedor”- a pessoa colectiva extinta -, mas no caso de tal suceder devem ainda ser alegados os factos integradores da sucessão que no caso se verificar, nos termos do art. 155.º n.º 3 do C.P.P.T., a aplicar por interpretação extensiva…
Mesmo a admitir-se que, segundo a regra geral constante do art. 163.º n.º 1 do C.S.C. no caso de passivo superveniente, como o em causa, bem como com o anterior art. 162.º n.º 1 do C.S.C., em que se prevê quanto a ações pendentes, fosse possível fazer prosseguir, em substituição, a execução contra a dita ex-sócia, tratando-se de dívidas fiscais que foram subsumidas ao art. 147.º, n.º 2 do C.S.C., conforme invocado pelo sr. representante da Fazenda Pública, e foi acolhido na sentença recorrida, importava que resultasse que a dita ex-sócia e liquidatária tinha procedido à partilha imediata dos haveres sociais, tal como previsto no anterior n.º 1.
Ou seja, resulta da jurisprudência deste Supremo Tribunal que nada obsta a que as liquidações (ou demonstração de acertos de contas) de dívidas fiscais anteriores à extinção de sociedade sejam emitidas em nome da sociedade extinta, por ser a devedora originária, e notificadas ao ex-sócio seu representante, bem como nada obsta que a subsequente execução fiscal seja instaurada contra a mesma dita sociedade por ser ela que figura no título executivo.
Só no caso de ter ocorrido a partilha de bens, nos termos do disposto no artigo 147º, n.º 2 do CSC, é que poderiam ser demandados directamente em sede executiva os ex-sócios da sociedade extinta, cfr. acórdão datado de 02.12.2020, recurso n.º 0890/14.0BEVIS, onde se escreveu:
Em primeiro lugar, a questão de saber se constitui pressuposto da atribuição da responsabilidade (solidária) dos sócios pelas dívidas de natureza fiscal ainda não exigíveis à data da dissolução que os haveres sociais tenham sido imediatamente partilhados nos termos do n.º 1 daquele artigo 147.º.
À primeira questão respondemos positivamente: a partilha imediata dos bens e haveres sociais constitui pressuposto da atribuição da responsabilidade solidária dos sócios pelas dívidas fiscais constituídas antes da dissolução mas ainda não exigíveis a essa data.
O que significa que, não tendo existido partilha imediata, os sócios não podem ser solidariamente responsabilizados por essas dívidas da sociedade e a coberto daquele dispositivo legal.
No caso de não ter existido partilha de bens da sociedade extinta, por os mesmos inexistirem, falta um dos pressupostos da atribuição da responsabilidade (solidária) dos sócios pelas dívidas de natureza fiscal, ainda não exigíveis à data da dissolução, cfr. artigo 147º, n.º 2 do CSC, não podendo, por isso, ser a execução fiscal imediatamente instaurada contra os mesmos, impondo-se antes que seja instaurada contra a sociedade extinta e citada na pessoa do seu representante.

Ou seja, caso tenha havido partilha de bens em decorrência da extinção da sociedade, tendo-se como assente que a liquidação dos impostos em dívida deve ser emitida em nome da mesma sociedade e dirigida ao seu representante, deve a execução ser instaurada contra os ex-sócios que receberam bens em decorrência dessa mesma partilha, caso não tenha havido partilha de bens deve a execução ser instaurada contra a sociedade extinta e citado o representante legal e no decurso da execução ser, se necessário, operada a substituição tributária ou a tramitação constante do artigo 155º do CPPT de modo a ser apurado quem devem ser os responsáveis pelo pagamento das dívidas em execução.

Concluindo-se, nestes termos podemos responder às questões resolvidas na sentença recorrida, (i) a ilegitimidade da executada decorrente da respectiva extinção e (ii) a inexigibilidade da dívida exequenda por falta de notificação da liquidação na pessoa do ex-sócio da sociedade extinta, no mesmo sentido em que foram ali decididas, ainda que com diferentes fundamentos.
Na verdade, ao aqui recorrente ainda não foi pessoalmente exigido, em sede de execução fiscal, o pagamento das quantias em falta, como anteriormente se assinalou, pelo que, de momento, não se revela essencial apreciar as questões (3 a 7) identificadas nas conclusões das alegações respeitantes à responsabilidade do próprio ex-sócio da executada.

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem esta secção tributária do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso, ainda que com fundamentos parcialmente diferentes.
Custas pelo recorrente.
D.n.
Lisboa, 9 de Junho de 2021. – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia (relator) - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos (com declaração de voto em anexo)

Voto a decisão.
Constituiu fundamento do recurso o erro de julgamento quanto à questão da ilegitimidade da executada e quanto à questão da falta de notificação para pagamento voluntário.
Quanto à primeira, porque as demonstrações das liquidações e de acertos de contas não deviam ter sido emitidas em nome da sociedade dissolvida.
Quanto à segunda, porque as notificações daqueles atos deveriam ter sido emitidas em nome do ex-sócio e não dirigidas/emitidas à sociedade extinta.
Quanto a esta segunda questão acompanho, na essência, a fundamentação do acórdão.
Mas entendo que a primeira não é uma questão e legitimidade processual. Porque não tem por base o facto de a sociedade não ser a devedora que vem identificada no título, nem sequer o facto de a dívida dever ser exigida a pessoa diferente daquela que figura como devedora no título.
Tem por base o facto de a própria liquidação não ter sido emitida em nome daquela sociedade. Por aquela já se encontrar extinta a essa data.
E quando se opõe à execução o facto de a dívida nunca dever ter sido liquidada à executada, não se lhe está a opor nenhum vício da execução: está a apontar-se um vício à própria liquidação.
E como o tribunal não está condicionado pelas alegações das partes no enquadramento jurídico das questões que lhe são colocadas, deve entender-se que foi esta a questão colocada e não a identificada questão de legitimidade.
E como a questão de saber se administração tributária poderia ter liquidado um determinado tributo a uma sociedade extinta não constitui fundamento válido de oposição (porque equivale à discussão da ilegalidade concreta da liquidação), concluiria pela ilegalidade da oposição, na parte correspondente.
Nuno Bastos