Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0653/16
Data do Acordão:12/13/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:TAXA
PRESCRIÇÃO
ANULAÇÃO DE JULGAMENTO
Sumário:I - As denominadas tarifa de conservação de esgotos e tarifa de ligação de esgotos são taxas e, por isso, sujeitas ao regime da prescrição previsto na LGT, antes da entrada em vigor do RGTAL, aprovado pela Lei 53-E/2006, de 29 de Dezembro, e depois da entrada em vigor desta Lei, ao regime de prescrição consagrado no respectivo art. 15.º.
II - Porque nos termos do n.º 3 do art. 15.º do RGTAL, «[a] paragem dos processos de reclamação, impugnação e execução fiscal por prazo superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar a interrupção da prescrição, somando-se, neste caso, o tempo que decorreu após aquele período ao que tiver decorrido até à data da autuação», nos casos em que a eventual “degradação” do efeito interruptivo em efeito suspensivo possa relevar na decisão da questão da prescrição das dívidas exequendas, o tribunal deve fixar a factualidade pertinente.
III - Se o tribunal a quo não fixou essa factualidade, impõe-se ao tribunal ad quem que anule a sentença recorrida na parte afectada e ordene àquele que efectue novo julgamento, após aquisição dos elementos factuais em défice.
Nº Convencional:JSTA00070450
Nº do Documento:SA2201712130653
Data de Entrada:05/27/2016
Recorrente:MUNICÍPIO DE SINTRA
Recorrido 1:A........, LDA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF SINTRA
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR FISC - TAXA
Legislação Nacional:LGT ART48 ART49.
L 12/2008 ART1 ART4.
L 23/96 ART1 ART10.
CCIV66 ART297.
L 53-C/2006 ART15.
CPC ART682 ART683.
Jurisprudência Nacional:AC STAPLENO PROC015/12 DE 2013/04/10.; AC STA PROC0125/11 DE 2011/03/02.; AC STA PROC0244/16 DE 2016/03/31.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de oposição à execução fiscal com o n.º 2174/14.4BESNT

1. RELATÓRIO

1.1 O Município de Sintra (adiante Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, julgando procedente a oposição deduzida pela sociedade denominada “A…………, Lda.” (adiante Oponente ou Recorrida), julgou extinta por prescrição a execução a correr termos contra ela pelo Serviço de Execuções dos Serviços Municipalizados da Câmara Municipal de Sintra, por dívida por taxas de conservação de esgotos dos anos de 2005 a 2009 e taxas de ligação de esgotos dos anos de 2008 e 2010.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e o Recorrente apresentou as alegações, que sintetizou em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.):

«A) Conforme resulta dos Autos em epígrafe, a Recorrente instaurou um processo de execução fiscal (n.º 184/2013) contra a Recorrida A……… Lda. para cobrança coerciva duma dívida de € 17.800,85, resultante da falta de pagamento de tarifas anuais de conservação de esgotos, respeitante aos anos de 2005 a 2009, e de tarifas de ligação, relativas aos anos de 2008 a 2010. Cfr. Sentença Recorrida, Factos Provados, ponto 1.

B) Deduzida oposição pela Executada ora Recorrida, veio o Tribunal a quo considerar verificada a prescrição da dívida exequenda, por considerar que as taxas de ligação e de conservação das redes de saneamento público dos prédios urbanos se inserem indubitavelmente nos serviços de recolha e tratamento de águas residuais, estando, por conseguinte, sujeito aos prazos de prescrição da Lei 23/96, por força da alteração preconizada ao n.º 2 do art. 1 do citado diploma, pela Lei 18/2008, de 26 de Fevereiro.

Sucede que,

C) O Tribunal a quo efectuou uma errada interpelação [sic] e aplicação da lei, ao arrepio de jurisprudência pacífica e unânime, ao desconsiderar a natureza tributária, nomeadamente de taxas, das tarifas de ligação e de conservação de esgotos, não aplicando, assim, os prazos de prescrição previstos na Lei Geral Tributária.

D) As tarifas de ligação e de conservação das redes de saneamento público dos prédios urbanos não integram os serviços de recolha e tratamento de águas residuais, visados na Lei 23/96, mesmo com as alterações promovidas pela Lei 12/2008».

1.3 A Recorrida não contra-alegou.

1.4 Remetidos os autos a este Supremo Tribunal Administrativo e dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja concedido provimento ao recurso, anulada a sentença recorrida e devolvidos os autos à 1.ª instância, para novo julgamento após ampliação da matéria de facto, com a seguinte fundamentação:

«[…] Em consonância com o Município recorrente, a nosso ver o recurso merece provimento.
A taxa de conservação de esgotos, bem como a taxa de ligação de esgotos são verdadeiras taxas tributárias (Acórdãos do PLENO da SCT (reenvio prejudicial) do STA, de 2013.04.10 - Recurso n.º 015/12 e de 2016.03.31 - Recurso n.º 0244/16, ambos disponíveis no sítio da Internet www.dgsi.pt).
Como tal, aplicam-se as regras sobre a prescrição constantes da LGT e a partir da vigência da Lei 53-E/2006, de 29 de Dezembro (2007.01.01), que aprovou o regime geral das taxas das autarquias locais, as regras sobre prescrição constantes de tal diploma (artigo 15.º).
No caso em análise estão em causa taxas de conservação de esgotos dos anos de 2005 a 2009 e taxas de ligação de esgotos dos anos de 2008 e 2010.
Nos termos do disposto no artigo 15.º do RGTAL as dívidas por taxas às autarquias locais prescrevem no prazo de 8 anos a contar da data em que o facto tributário ocorreu, sendo certo que a citação, a reclamação e a impugnação judicial interrompem a prescrição e a paragem dos processos de reclamação, impugnação e execução fiscal por prazo não superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar a interrupção da prescrição, somando-se, nesse caso, o tempo que decorreu após aquele período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
Como resulta do probatório, a recorrida foi citada por ofício enviado em 26 de Setembro de 2013.
Operada a citação fica inutilizado, para feitos de prescrição, o tempo decorrido, obstando, ainda, ao decurso do prazo da prescrição até ao trânsito em julgado da decisão que venha a pôr termo ao processo.
Assim sendo, é manifesto que a dívida relativa às taxas de ligação de esgotos dos anos de 2008 e 2010, neste momento, não se mostra prescrita.
O mesmo se diga quanto à dívida relativa às taxas de conservação de esgotos dos anos de 2008 e 2009.
Quanto à taxa de conservação de esgotos de 2005 a 2007, para analisar a prescrição da obrigação exequenda, haverá que averiguar se o PEF esteve ou não parado por mais de um ano por facto não imputável ao sujeito, sendo certo que do probatório não consta factualidade atinente a tal aspecto.
Nos termos do disposto no artigo 682.º/3 do CPC, o STA pode e deve ordenar a ampliação e especificação da matéria de facto pertinente ao julgamento da causa (acórdão do STA, de 25 de Novembro de 2015, proferido no recurso n.º 0162/15).
A decisão recorrida merece, assim, censura.
Termos em que deve dar-se provimento ao presente recurso e revogar-se a sentença recorrida, baixando os autos à 1.ª instância para ampliação/especificação da factualidade pertinente ao julgamento da causa, nos termos referidos».

1.5 Colheram-se os vistos dos Conselheiros adjuntos.

1.6 Cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida fez correcto julgamento ao julgar extinta a execução fiscal por prescrição das dívidas exequendas.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

A sentença recorrida efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«1- O serviço de execuções fiscais do Município de Sintra instaurou processo de execução fiscal n.º 184/2013 e aps., contra a sociedade “A………., Lda.”, por dívida de tarifa anual de conservação de esgotos devidas no período de 2005 a 2009 e de tarifa de ligação de 2008 e 2010, tendo citado o executado para a execução e para efeitos de cobrança coerciva das quantias em dívida e respectivos juros de mora, no valor de € 17.800,85, por ofício enviado em 26.09.13 (cfr. rosto do proc. exe., Ofício de citação e certidão de dívidas, de fls. não numeradas do proc. exe. apenso).

2- A dívida exequenda teve por base as facturas n.ºs 0600184716, 07001810191, 08002506131, 200990004342, 201090004117, relativas às tarifas de conservação de esgotos emitidas pela exequente em 20.09.2006, em 07.09.2007, em 03.10.2008, em 15.10.2009 e em 07.09.2010, respectivamente, dirigidas ao interessado por via postal simples, e das facturas n.ºs 8001385044 e 201020019827 relativas à tarifa de ligação emitidas em 24.04.2008 e em 23.04.2010, respectivamente, e dirigidas ao interessado por carta registada com aviso de recepção, as quais foram recebidas em 07.05.08 e em 13.05.2010, respectivamente – cfr. cópias das facturas, de fls. 11 a 17 e ofícios e correspondência postal, de fls. 45 a 50, dos autos.

3- À data da liquidação das tarifas referidas supra, constava do respectivo registo predial dos prédios sobre que incidiam, como seus titulares, o oponente – cfr. “fotocópia não certificada” do registo predial de Sintra, de fls. 19 a 44 v. dos autos».


*

2.2 DE FACTO E DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

Em ordem à cobrança da “tarifa anual de conservação de esgotos” dos anos de 2005, 2006, 2007, 2008 e 2009 e a diversas fracções autónomas e da “tarifa de ligação de esgotos” respeitante a duas fracções autónomas e a facturas dos anos de 2008 e 2010, o Município de Sintra instaurou uma execução fiscal contra a sociedade ora Recorrida.
A sociedade Executada, ora Recorrida, deduziu oposição à execução fiscal, invocando, no que ora importa considerar (A Oponente invocou também outros fundamentos, quais sejam a falta de notificação para pagamento voluntário das dívidas exequendas e o não ser titular dos prédios a que se reportam as mesmas dívidas, que a sentença julgou improcedentes, sendo que, nessa parte, transitou em julgado.), a prescrição das obrigações tributárias (Não há dúvida quanto à natureza tributária das dívidas, pois desde há muito que a jurisprudência reconheceu que estas tarifas têm a natureza de taxas. Por todos, vide o seguinte acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 10 de Abril de 2013, proferido no processo n.º 15/12, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/2e3543370a405cd080257b5900343163.) correspondentes àquelas dívidas. Segundo alegou a Oponente, «[o] prazo de prescrição das referidas taxas relativas aos referidos serviços é de 6 (seis) meses após a prestação dos serviços a que respeitam, nos termos do n.º 1 do Artigo 10.º da Lei 23/96 de 26/07, com as alterações posteriormente introduzidas, sendo a última pela Lei 10/2013 de 28/01».
O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra julgou a oposição procedente com fundamento na prescrição das obrigações tributárias correspondentes às dívidas exequendas. Para tanto e em ordem à determinação do prazo prescricional aplicável, começou por referir que «importa determinar se aquele prazo é o que consta da referida Lei n.º 23/96, ou se será de considerar o prazo ínsito no art. 48.º da LGT».
Considerou, de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (Referiu o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 2 de Março de 2011, proferido no processo n.º 125/11, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/12f03bb550a3bf988025784f0051f18f.), que as tarifas em causa são tributos com natureza de taxas, motivo por que lhe são aplicáveis os prazos e o regime de prescrição dos arts. 48.º e 49.º da Lei Geral Tributária (LGT). Assim, porque os factos tributários mais antigo e mais recente se reportam aos anos de 2005 e de 2010, respectivamente, e tendo em conta a interrupção da prescrição decorrente da citação da Oponente em 2013 (cfr. n.º 1 dos factos provados), entendeu que não poderia considerar-se esgotado o prazo de oito anos fixado pelo art. 48.º da LGT.
No entanto, segundo a sentença, o quadro legislativo aplicável à situação alterou-se com a entrada em vigor da Lei n.º 12/2008, de 26 de Fevereiro, que veio «estabelecer regras próprias de prescrição de dívidas relativas a alguns serviços públicos essenciais, designadamente o serviço de recolha e tratamento de águas residuais (de acordo com a alteração efectuada ao n.º 2, do art. 1.º, da Lei n.º 23/96, de 26.07), nos quais se inserem indubitavelmente, as taxas de ligação e de conservação das redes de saneamento público dos prédios urbanos (cfr. Dec.-Lei n.º 31.674, de 22.11.1941), pelo que a partir da sua entrada em vigor aqueles serviços prestados após 26.05.2008, passaram a estar sujeitas àquela prazo de prescrição ínsito no n.º 1 do art. 10.º da Lei n.º 23/96, de 26.07, na redacção dada pelo art. 1.º daquela Lei n.º 12/2008».
De acordo com esse entendimento, o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, desde logo, deu como prescritas as dívidas respeitantes aos factos tributários ocorridos após 26 de Maio de 2008, data da entrada em vigor daquela Lei; ou seja, considerou prescritas as dívidas provenientes de taxa de conservação de esgotos dos anos 2008 e 2009, bem como a proveniente da taxa de ligação de esgotos efectuada em 2010, no entendimento de que, quando ocorreu o facto interruptivo decorrente da citação – em 2013 –, já há muito se tinha completado o prazo de prescrição (de seis meses após a prestação do serviço, nos termos do n.º 1 do art. 10.º da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 12/2008, de 26 de Fevereiro).
Quanto às demais dívidas (ou seja, quanto às dívidas por taxa de conservação de esgotos dos anos de 2005, 2006 e 2007, bem como à dívida por taxa de ligação de esgotos efectuada em 2008), entendeu colocar-se a questão de determinar qual o prazo aplicável: o do n.º 1 do art. 48.º da LGT (oito anos), que se encontrava a correr à data em que entrou em vigor a Lei n.º 12/2008, ou, por força desta Lei, o do n.º 1 do art. 10.º da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho (seis meses)?
Em resposta a esta questão, para a qual convocou o disposto no art. 297.º do Código Civil (CC) e o art. 3.º da Lei n.º 12/2008, de 26 de Fevereiro, entendeu que é aplicável o novo prazo (de seis meses), contado a partir da data em que entrou em vigor a nova lei. Assim, concluiu que em 26 de Novembro de 2008, data em que se perfizeram seis meses sobre a data da entrada em vigor da Lei n.º 12/2008, de 26 de Fevereiro (Nos termos do seu art. 4.º, a Lei n.º 12/2008, de 26 de Fevereiro, «entra em vigor 90 dias após a sua publicação».), se verificou a prescrição de todas essas dívidas.
Ou seja, deu como prescritas todas as dívidas exequendas.
O Município de Sintra discordou da sentença e dela recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo.
Se bem interpretamos as alegações e respectivas conclusões, a Recorrente entende que a sentença incorre em erro de julgamento, na medida em que considerou que as dívidas exequendas se referem a «serviços de recolha e tratamento de águas residuais» e, por isso, desde a alteração que lhe foi introduzida pela Lei n.º 18/2008, de 26 de Fevereiro, se integram na previsão legal da alínea f) do n.º 2 do art. 1.º da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, estando, por isso, sujeitas ao prazo de prescrição de seis meses previsto no n.º 1 do art. 10.º desta Lei.
Na tese que defende, as tarifas em causa são verdadeiras taxas e, assim sendo, sujeitas ao regime jurídico que a LGT prescreve relativamente à prescrição dos tributos.
O Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal partilha o entendimento de que as tarifas que estão na origem das dívidas exequendas são verdadeiros tributos, mais concretamente taxas. Quanto ao regime jurídico que lhes é aplicável em matéria de prescrição, distingue os períodos anterior e posterior à data em que entrou em vigor o Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais (RGTAL), aprovado pela Lei 53-E/2006, de 29 de Dezembro: no primeiro período, aplicava-se-lhes a LGT, maxime os seus arts. 48.º e 49.º, no segundo o disposto no art. 15.º do RGTAL.
Assim, a questão que cumpre apreciar e decidir, como adiantámos em 1.6, é a de saber se a sentença fez correcto julgamento ao considerar prescritas as dívidas exequendas.

2.2.2 DA PRESCRIÇÃO

Desde logo, como bem salientaram a Recorrente e o Procurador-Geral Adjunto nesse Supremo Tribunal, as denominadas tarifas de conservação dos esgotos e tarifas de ligação de impostos devem considerar-se verdadeiras taxas, como repetidamente tem vindo a afirmar a jurisprudência desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo (Para além da jurisprudência citada pelo Recorrente, vide, por mais recentes, os seguintes acórdãos:
- de 10 de Abril de 2013, do Pleno da Secção, proferido no processo n.º 15/12, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/2e3543370a405cd080257b5900343163
- de 31 de Março de 2016, proferido no processo n.º 244/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/7a443bff8ff2c41f80257f8d005203d6.) e do Tribunal Constitucional (Vide também a jurisprudência citada por JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, I volume, anotação 18 ao art. 16.º, págs. 235/236.).
Afigura-se-nos, pois, que o regime de prescrição das dívidas exequendas será, como bem salientou o Procurador-Geral Adjunto, o previsto na LGT até à entrada em vigor do RGTAL e, depois dessa data, o previsto neste Regime.
Assim, tendo em conta que o RGTAL entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2007, nos termos do art. 18.º da Lei que o aprovou, e tendo também em conta que as dívidas exequendas se referem aos anos de 2005 a 2009, no que se refere às tarifas de conservação de esgotos, e a ligações ocorridas nos anos de 2008 e 2010, no que se refere à tarifa de ligação de esgoto, deparamo-nos com um problema de sucessão de leis no tempo no que se refere ao único prazo de prescrição já em curso em 1 de Janeiro de 2007, ou seja, relativamente à tarifa de conservação de esgotos respeitante ao ano de 2005: na verdade, relativamente às dívidas que correspondem às tarifas de conservação de esgotos respeitantes a este ano, cujos prazos de prescrição se iniciou em 1 de Janeiro de 2006, o mesmo estava já em curso quando entrou em vigor o RGTAL.
A questão, como procuraremos demonstrar, não suscita dificuldade de maior, não convocando sequer a aplicação das regras consagradas no art. 297.º do CC, uma vez que o prazo se manteve inalterado. Assim, relativamente àquela taxa deve aplicar-se o prazo de 8 anos do n.º 1 do art. 48.º da LGT, contado desde 1 de Janeiro de 2006, pelo que, na ausência de causas de interrupção ou de suspensão, o mesmo terminaria em 1 de Janeiro de 2014.
Quanto às demais dívidas, o prazo de prescrição é o de 8 anos previsto no n.º 1 do art. 15.º do RGTAL, de 8 anos, a contar, relativamente às tarifas de conservação de esgotos dos anos de 2006, 2007, 2008 e 2009, desde 1 de Janeiro de 2007, 1 de Janeiro de 2008, 1 de Janeiro de 2009 e 1 de Janeiro de 2010, respectivamente, e a contar, no que se refere às tarifas por instalação de esgotos, no desconhecimento das datas efectivas em que foram efectuadas essas ligações, desde as datas em que foram emitidas as respectivas facturas, ou seja, desde 24 de Abril de 2008 e desde 23 de Abril de 2010, respectivamente.
O que tudo nos levar a concluir que em Setembro de 2013, data em que a sociedade ora Recorrida foi citada – citação que constitui causa de interrupção da citação, quer em face do n.º 1 do art. 49.º da LGT quer à luz do n.º 2 do art. 15.º do RGTAL – não se tinha completado o prazo de prescrição relativamente a nenhuma das dívidas.
Há, porém, que ter presente que, porque o regime de prescrição instituído pelo RGTAL (muito próximo do regime da LGT que vigorou até 1 de Janeiro de 2007) estabelece, no n.º 3 do seu art. 15.º, que «[a] paragem dos processos de reclamação, impugnação e execução fiscal por prazo superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar a interrupção da prescrição, somando-se, neste caso, o tempo que decorreu após aquele período ao que tiver decorrido até à data da autuação», o efeito interruptivo que se verificou com a citação se pode degradar em efeito interruptivo por efeito da paragem do processo de execução fiscal por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo.
Mas, como bem salientou o Procurador-Geral Adjunto, essa paragem, na presente data, só poderá eventualmente relevar relativamente às tarifas de conservação de esgotos respeitantes aos anos de 2005, 2006 e 2007, em que os prazos de prescrição se iniciaram, respectivamente, em 1 de Janeiro de 2006, 1 de Janeiro de 2007 e 1 de Janeiro de 2008. Só relativamente a estes o prazo de prescrição acrescido de um ano (9 anos no total) se situa em data anterior à presente.
Assim, se podemos dar como certo que não está verificada a prescrição relativamente às demais dívidas exequendas, no que se refere às dívidas provenientes de tarifas de conservação de esgotos respeitantes aos anos de 2005 a 2007 há a possibilidade de se ter já verificado a prescrição por força de uma eventual “degradação” do efeito interruptivo em efeito suspensivo ao abrigo do disposto no n.º 3 do art. 15.º do RGTAL.
Urge, pois, que os autos regressem à 1.ª instância, a fim de aí se indagar da factualidade pertinente (eventual paragem do processo de execução fiscal por mais de um ano por motivo não imputável à Executada) para avaliar da prescrição relativamente a essas dívidas.
Em conclusão, a sentença não pode manter-se i) no que se refere às dívidas provenientes de tarifas de conservação de esgotos dos anos de 2008 e 2009 e às tarifas de ligação de esgotos em cobrança coerciva, por relativamente a elas não ocorrer a prescrição que determinou a sua extinção e ii) quanto às dívidas provenientes de tarifas de conservação de esgotos respeitantes aos anos de 2005 a 2007, a sentença também não pode manter-se, mas não pode decidir-se a questão da prescrição sem que, antes, seja, adquirida para os autos a factualidade acima referida.
É nesse sentido que decidiremos, ao abrigo do disposto nos arts. 682.º, n.º 3, e 683.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - As denominadas tarifa de conservação de esgotos e tarifa de ligação de esgotos são taxas e, por isso, sujeitas ao regime da prescrição previsto na LGT, antes da entrada em vigor do RGTAL, aprovado pela Lei 53-E/2006, de 29 de Dezembro, e depois da entrada em vigor desta Lei, ao regime de prescrição consagrado no respectivo art. 15.º.

II - Porque nos termos do n.º 3 do art. 15.º do RGTAL, «[a] paragem dos processos de reclamação, impugnação e execução fiscal por prazo superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar a interrupção da prescrição, somando-se, neste caso, o tempo que decorreu após aquele período ao que tiver decorrido até à data da autuação», nos casos em que a eventual “degradação” do efeito interruptivo em efeito suspensivo possa relevar na decisão da questão da prescrição das dívidas exequendas, o tribunal deve fixar a factualidade pertinente.

III - Se o tribunal a quo não fixou essa factualidade, impõe-se ao tribunal ad quem que anule a sentença recorrida na parte afectada e ordene àquele que efectue novo julgamento, após aquisição dos elementos factuais em défice.


* * *

3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em conceder provimento ao recurso, anular a sentença recorrida e ordenar que os autos regressem à 1.ª instância a fim de aí, depois de fixada a factualidade pertinente, nos termos acima indicados, ser proferida nova decisão.

Custas pela Recorrida.

*

Lisboa, 13 de Dezembro de 2017. - Francisco Rothes (relator) – Isabel Marques da Silva – Pedro Delgado.