Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01944/13
Data do Acordão:07/09/2014
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:I - Embora a lei não refira a AAE no elenco dos meios processuais adequados a obter a suspensão do processo de execução fiscal, o certo é que o elenco dos meios processuais referidos nas normas citadas não é fechado, nele podendo ser incluídos outros meios procedimentais e processuais.
II - A eventual procedência da AAE produzirá relativamente à dívida tributária exequenda efeitos similares aos que produziria a eventual procedência de impugnação judicial que tivesse por objecto a apreciação da legalidade do acto de liquidação da dívida exequenda, ou seja: a anulação das liquidações de IMI em cobrança coerciva nos autos de execução fiscal, com a consequente devolução das quantias pagas.
III - Dada a natureza impugnatória da legalidade da dívida exequenda da acção administrativa especial esta deve ter-se como compreendida entre os meios processuais cuja dedução permite a suspensão da execução fiscal nos termos das leis tributárias, embora o n.º 1 do artigo 169.º do CPPT se lhe não refira expressamente.
Nº Convencional:JSTA00068849
Nº do Documento:SAP2014070901944
Data de Entrada:04/09/2014
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A............, SA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC OPOS JULGADOS
Objecto:AC STA PROC01944/13 AC STA PROC01724/13
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - OPOS JULGADOS.
Legislação Nacional:LGT98 ART52 N1.
CPPTRIB99 ART169 N1 ART284.
ETAF02 ART27 B ART17 N2.
CPTA02 ART152.
CIMI03 ART9.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01868/13 DE 2014/01/22.; AC STA PROC01075/11 DE 2012/09/19.; AC STA PROC0410/13 DE 20113/11/13.; AC STA PROC01331/13 DE 2013/12/11.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO 6ED 2011 PAG208.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO

A Fazenda Publica veio recorrer do Acórdão proferido por este Supremo Tribunal (Secção de Contencioso Tributário) em 29 de Janeiro de 2014, (cfr. fls. 114-122), por oposição com o Acórdão do STA, proferido em 18 de dezembro de 2013 – Processo nº 1724/13.

Admitido o recurso por despacho do relator a fls. 140, foram apresentadas alegações tendentes a demonstrar a oposição entre os citados acórdãos (cfr. fls.158 -162).

Por despacho de fls.164 foi determinado o prosseguimento do recurso, tendo sido ordenado a notificação das partes para apresentarem alegações, nos termos do artigo 282.º nº 3 do CPPT, aplicável por força do disposto no nº 5 do artigo 284.º do CPPT.

A recorrente apresentou a fls.198-205 alegação tendente a demonstrar alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões:

«1) Entre os doutos Acórdãos em causa, o fundamento e o recorrido, existe oposição susceptível de susceptível de determinar o prosseguimento do presente recurso, encontrando-se preenchido o condicionalismo previsto no art. 284.º do CPPT e art. 27°, n° 1, al. b) do ETAF.
2) Deve ser fixada como jurisprudência desse Venerando Tribunal, a constante do douto Acórdão fundamento, de que se o executado esgotou os meios procedimentais e processuais relativos à impugnação da legalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, a execução tem de prosseguir, não podendo constituir fundamento de suspensão da mesma, a acção administrativa especial em que requer a isenção do imposto que constitui objecto da liquidação.
3) Efectivamente, estando em causa nos processos subjacentes ao Acórdão recorrido e ao Acórdão fundamento acto administrativo que indeferiu pedido de não sujeição a IMI, pretendendo recorrer-se do mesmo, há que lançar mão da acção administrativa especial onde não está, sequer, em apreciação a legalidade da liquidação, quanto mais a da inexigibilidade da dívida exequenda.
4) E, esgotados os meios de reacção contra a legalidade ou exigibilidade da dívida exequenda, a acção administrativa especial para obtenção da isenção não contende com esta legalidade ou inexigibilidade já que as liquidações não foram atacadas com fundamento em qualquer ilegalidade.
5) É certo que se vier a ser dada razão à recorrente na acção administrativa especial, as liquidações poderão vir a ser anuladas. No entanto, essa anulação não terá a ver com a ilegalidade da liquidação, outrossim, a anulação do acto terá como fundamento a ilegalidade do acto administrativo, que até pode ser por o mesmo enfermar de vício de forma, que indeferiu o pedido de não sujeição a IMI e não directamente com a ilegalidade da liquidação.
6) E, no caso de os respectivos valores estarem pagos, poderão vir a ser devolvidos. Porém, a questão que se discute na acção administrativa especial, nada tem a ver com a legalidade ou inexigibilidade da dívida e, por isso, não pode constituir fundamento da execução fiscal.
Termos em que e, com o douto suprimento de V. Exas., deve decidir-se no sentido de que existe oposição de julgados e deve o presente recurso ser julgado procedente, de acordo com a jurisprudência constante do acórdão fundamento, revogando-se o acórdão recorrido, com todas as legais consequências.»


Não foram apresentadas contra alegações pela entidade recorrida – A…………, SA.

O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que se devia considerar verificada a oposição de acórdãos e, quanto ao mérito do recurso, que se devia negar provimento ao recurso e manter o acórdão recorrido, considerando no essencial que embora a lei não refira a AAE (Acção Administrativa Especial) no elenco dos meios processuais adequados a obter a suspensão do processo de execução fiscal e, em regra, não o será pois esse meio processual não tem por objecto imediato a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, o certo é que o elenco dos meios processuais referidos nas normas citadas não é fechado, nele podendo ser incluídos outros meios procedimentais e processuais, e destacando ainda que a eventual procedência da acção produzirá relativamente à dívida exequenda efeitos similares aos que produziria a eventual procedência de impugnação judicial que tivesse por objecto a apreciação da legalidade do acto de liquidação da dívida exequenda, ou seja: a anulação das liquidações de IMI em cobrança coerciva nos autos de execução fiscal, com a consequente devolução das quantias pagas.

2 – FUNDAMENTAÇÃO

Com interesse para a decisão foram dados como provados os seguintes factos:

A) Na decisão recorrida:
a) Corre termos contra a ora Reclamante, A…………, S.A., o processo executivo n° 3611201001087193, instaurado no Serviço de Finanças de Amadora 3, para cobrança de dívida de IMI do ano de 2009, no valor de € 4.236,05 e acrescido — Cfr. PEF apenso aos autos;
b) Em 2 de Julho de 2009 a ora Reclamante intentou, neste TAF de Sintra, Acção Administrativa Especial na qual pediu a anulação do acto administrativo que indeferiu o pedido de não sujeição a IMI efectuado em 24 de Abril de 2007, bem como a condenação da Administração Fiscal à prática do acto de deferimento do pedido de não sujeição a IMI — Cfr. cópia de p.i. constante do PEF, a qual se dá, aqui, por integralmente reproduzida;
e) Em 7 de Julho de 2009 a Reclamante, na sequência da interposição da acção administrativa especial referida na alínea antecedente, requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de Amadora 3 que fixasse o valor da caução a prestar com vista a suspender o processo de execução fiscal n° 3611201001087193 — Cfr. documento a fls. 4 e 5 do PEF, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
d) A Reclamante prestou garantia pelo valor fixado pelo Chefe do Serviço de Finanças, em 23 de Dezembro de 2010 — Cfr. documento a fls. 10 e 11 do PEF;
e) Em 11 de Janeiro de 2011 a Chefe do Serviço de Finanças de Amadora 3 determinou a suspensão do processo de execução fiscal n° 3611201001087193 — Cfr. documento a fls. 13 do PEF;
f) Em 24 de Junho de 2013 foi proferido despacho, pela Chefe do Serviço de Finanças de Amadora 3, com o seguinte teor: “ (…) Vistos os autos e analisado o motivo que deu origem à acção administrativa especial interposta pelo executado, verifica-se que não está em causa a liquidação do tributo subjacente ao PEF, pelo que não se encontram preenchidos os requisitos previstos nos arts. 169° do CPPT e art. 52.º da LGT.
Assim sendo e não existindo fundamento para que a acção administrativa especial constitua motivo de suspensão do PEF, determino o levantamento da mesma e a prossecução dos autos com vista à sua extinção por pagamento (tudo isto sem prejuízo de o executado vir a obter vencimento na acção e, consequentemente, ser-lhe reconhecido o beneficio fiscal implicando a anulação das liquidações de impostos subjacentes ao PEF. (…)”- Cfr. documento a fls. 13 dos autos.

B) No acórdão fundamento:
1°) A Reclamante requereu à Autoridade Tributária e Aduaneira, em 21.11.2008, a não sujeição a IMI, pelo período de três anos, de doze frações (frações autónomas A, B, O, D, E, E, G, H, I, J, L e M) de um prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito na Rua ………, …/… e Rua ………, …/…, na freguesia de Nevogilde, no Porto, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo 8 (atual 1709).
2°) O fundamento de tal requerimento de não sujeição a IMI sustentou-se na alínea e) do n° 1 do artigo 9° do IMI.
3°) Tal requerimento foi indeferido pelo Serviço de Finanças do Porto - 2, por oficio datado de 18.02.2009, remetido à Reclamante.
4°) Inconformada com a decisão acabada de referir, a Reclamante apresentou recurso hierárquico dessa decisão de indeferimento, o que fez em 25.03.2009.
5°) Por Despacho de 07.12.2010, a Subdiretora-Geral da, então, Direção Geral dos Impostos, indeferiu o recurso hierárquico em causa.
6°) Inconformada, a aqui reclamante apresentou Ação Administrativa Especial em matéria tributária, a qual deu entrada em 26.04.2011 no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, com o n° 1313/11. IBEPRT.
7°) A qual se encontra pendente.
8°) Em 31.10.2009, foi instaurado o processo de execução fiscal n° 1813200901050699 à ora reclamante, por falta de pagamento do IMI do ano de 2008, no montante de € 23.476,48, referente a onze frações autónomas do artigo 1709 urbano da freguesia de Nevogílde, concelho do Porto.
9°) Por requerimento datado de 22.12.2009, a ora reclamante solicitou a suspensão da execução, nos termos dos artigos 169° e 199°, do CPPT, até que fosse proferida decisão no âmbito de recurso hierárquico interposto da decisão de indeferimento do pedido de não sujeição de IMI - cfr. doc. de fls. 35 dos autos.
10°) Em tal requerimento ofereceu como garantia a penhora sobre o artigo 2119-FN, urbano da freguesia de Antas, concelho de Vila Nova de Famalicão.
11°) Por despacho do Chefe do serviço de finanças de Marco de Canaveses de 29.12.2009, foi ordenada a suspensão da execução - cf. doc. de fls.16 verso dos autos.
12°) Em 24.05.2010, foi instaurado o processo de execução fiscal n° 183201001022393, por dívidas de IMI do ano de 2009 (1 prestação), referentes a diversas frações autónomas do artigo urbano 1709 da freguesia de Nevogilde, concelho do Porto - cfr. doc, de fls. 28 verso e 30 dos autos.
13°) A ora reclamante prestou garantia e requereu a suspensão dos autos, com fundamento na pendência do referido recurso hierárquico (artigo 2°) e, no facto de ter deduzido reclamação graciosa da liquidação do IMI de 2009.
14°) Por despacho do Chefe do serviço de finanças de Marco de Canaveses de 25 de junho de 2010, foi determinada a suspensão dos autos. cfr. doc. de fls. 54 dos autos.
15°) - Por falta de pagamento da prestação de setembro de 2010 da liquidação de IMI referente a onze frações autónomas do artigo 1709 urbano da freguesia de Nevogilde, concelho do Porto, foi instaurado contra a ora reclamante o processo de execução fiscal n° 1813201001043641.
16°) O qual foi suspenso em 16.11.2010.
17°) Em 22.05.2011 foi instaurado contra a ora reclamante o processo de execução fiscal n° 1813201101025619, relativo à falta de pagamento, no mês de abril de 2011, da P’ prestação da liquidação de IMI do ano de 2010, referente a diversas frações do artigo 1709 urbano de Nevogilde.
18°) Por falta de pagamento da prestação de setembro da referida liquidação, foi instaurado contra a ora reclamante o processo de execução fiscal n° 1813201101053914 em 23.10.2011.
19°) Do processo de execução fiscal n° 1813201101053914 faz parte uma outra certidão de dívida, no montante de € 1.195,52, relativa ao artigo 4430 urbano, da freguesia da Madalena, concelho de Vila Nova de Gaia.
20°) Foi efetuada uma correção de liquidações de anos anteriores, relativamente ao artigo 4430 urbano da freguesia da Madalena, referente ao ano de 2010, cuja falta de pagamento deu origem à instauração em 25.06.2011 do processo de execução fiscal n° 3201101032348.
21°) Em 26.04.2011, a ora reclamante deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de Ação Administrativa Especial, na qual requereu a condenação da administração tributária (AT) a reconhecer que o IMI liquidado para os anos de 2008, 2009 e 2010, em relação às diversas frações do artigo 1109, urbano da freguesia de Nevogilde, concelho do Porto, não é válido.
22°) A ora reclamante deduziu Reclamação Graciosa no serviço de finanças de Vila Nova de Gaia, com o fundamento de que só em 04.03.2011 passou a ser proprietário do imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Madalena, concelho de Vila Nova de Gaia, sob o artigo 4430, pelo que, não sendo proprietária do imóvel nos anos de 2009 e 2010, as liquidações efetuadas para esses períodos de imposto deveriam ser anuladas.
23°) Em relação a todos os processos de execução fiscal supra referidos, a ora reclamante requereu a suspensão dos autos e apresentou garantia.
24°) Relativamente ao processo de execução fiscal n° 1813201101025619 foi determinada a suspensão dos autos por despacho de 13.06.2011 - cfr. doc. de fls. 62 verso dos autos.
25°) O processo de execução fiscal n° 1813201101032348 foi suspenso por despacho do OEF de 29 de julho de 2011 - cfr. doc. de fls. 85 dos autos.
26°) No processo de execução fiscal n.º 1813201101053914 foi determinada por despacho de 23.11.2011 a sua suspensão - cfr. doc. de fls. 104 verso dos autos.
27°) O recurso hierárquico que esteve na origem da suspensão dos referidos processos de execução fiscal n° 1813200901050699 e 183201001022393 foi indeferido.
28°) As reclamações graciosas referidas foram extintas por indeferimento ou arquivamento, não tendo delas resultado a anulação de qualquer das liquidações colocadas em crise.
29°) O despacho a ordenar a reativação dos processos de execução fiscal em causa foi notificado à ora reclamante pelo ofício 784/1813-30 de 13.03.2013.
30°) Despacho do qual vem a ora reclamante apresentar reclamação.
31°) A reclamante, nos termos do disposto no n° 1 do art° 79°, do CPPT, com vista a que a reclamação possa ser decidida conjuntamente em relação a todos os processos de execução fiscal em causa, solicitou a apensação das execuções fiscais.
32°) O OEF procedeu à referida apensação, tendo sido eleito processo principal o PEF n° 181320090105069.

3 – DO DIREITO
Cumpre apreciar e decidir em conferência no Pleno desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, sendo que, antes do mais, há que verificar se estão verificados os requisitos da admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência.
Só se concluirmos pela verificação desses requisitos, passaremos a conhecer do mérito do recurso.

A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR
Pretende a Recorrente, a uniformização da jurisprudência relativamente a uma questão fundamental de direito alegadamente decidida em sentido divergente nos acórdãos em confronto: saber se a pendência de acção administrativa especial em que é pedida a anulação do indeferimento de requerimento de não sujeição a IMl é meio idóneo, para efeitos de suspensão da execução fiscal referente às liquidações desse IMI nos termos do disposto no art. 52.º, n.º 1 da LGT e art 169.º n.º 1 do CPPT.
São substancialmente idênticas, nos seus contornos essenciais, as situações de facto em que assentam os arestos em cotejo. Por outro lado, em ambos os acórdãos foi tido em conta o mesmo quadro legal da regulamentação jurídica, sendo claramente antagónicas as decisões proferidas.
Porém, enquanto no douto Acórdão recorrido se considerou que, nas circunstâncias do caso, a AAE era meio idóneo para obter a suspensão da execução fiscal, nos termos das normas citadas, a essa questão deu resposta negativa já o douto Acórdão fundamento, ponderando circunstâncias substancialmente idênticas às apreciadas naquele aresto.
Ocorre, patentemente, oposição de julgados
Ainda assim cumpre afastar eventuais argumentos formais que obstem ao conhecimento de mérito.
Não havendo dúvidas quanto aos demais requisitos formais (legitimidade da Recorrente e tempestividade do recurso), há que passar a averiguar se estão verificados os requisitos substanciais da admissibilidade do recurso.
Só depois, se for caso disso, passaremos a conhecer do mérito do recurso.
DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
Ao presente processo, atenta a data da sua instauração, (ano de 2013) é já aplicável o regime legal resultante do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) de 2002, nos termos dos arts 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, da Lei n.º 13/2002 de 19 de Fevereiro, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 107-D/2003 de 31 de Dezembro, dos quais decorre que a data da entrada em vigor do novo Estatuto ocorreu em 1 de Janeiro de 2004.
Assim, a admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos arts. 27.º, alínea b) do ETAF, 284.º do CPPT e 152.º do CPTA, depende de (i) existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e (ii) a decisão impugnada não estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido inúmeras vezes explicitado pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da Lei de Processo dos Tribunais Administrativos, para detectar a existência da contradição já apontada tomaram-se em conta tais critérios:
i. identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, o que pressupõe uma identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais;
ii. que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica, a qual se verifica sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica;
iii. que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta e esta oposição decorra de decisões expressas, não bastando a simples oposição entre razões ou argumentos enformadores das decisões finais ou a invocação de decisões implícitas ou a pronúncia implícita ou consideração colateral tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.

Reitera-se que se verificam os requisitos da alegada contradição de julgados à luz dos supra referidos princípios.
E, o presente recurso pode prosseguir, pois que também se verifica o segundo requisito de que depende a admissibilidade do recurso por oposição de julgados, qual seja o de que o acórdão recorrido não esteja em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
Como este Supremo Tribunal tem vindo a entender (Cfr. os recentes acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
– de 19 de Setembro de 2012, proferido no recurso n.º 1075/11, publicado no Apêndice ao Diário da República de 8 de Maio de 2013 (https://dre.pt/pdfgratisac/2012/32430.pdf), págs. 187 a 193, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/94a5eb6a7d13630180257a8700375a1a?OpenDocument;
– de 13 de Novembro de 2013, proferido no processo n.º 410/13, ainda não publicado no jornal oficial, mas disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/a2c01d969ed0e5ef80257c2400415bdd?OpenDocument
– de 11 de Dezembro de 2013, proferido no processo n.º 1331/13, ainda não publicado no jornal oficial, mas disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/5e09aac22452feed80257c47004df608?OpenDocument.), a existência de uma jurisprudência consolidada deve transparecer ou do facto de a pronúncia respectiva constar de acórdão do Pleno assumido pela generalidade dos Conselheiros em exercício na Secção (consoante prevê o n.º 2 do art. 17.º do ETAF («O julgamento no pleno compete ao relator e aos demais juízes em exercício na secção».) ou do facto de existir uma sequência ininterrupta de várias decisões no mesmo sentido, obtidas por unanimidade em todas as formações da Secção.
Ora, quanto à aludida questão que determinou respostas distintas em diferentes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário deste STA, o Pleno desta Secção ainda não se pronunciou nem as diversas formações de julgamentos existentes na mesma Secção têm tido pronúncia reiterada e uniforme sobre a questão pelo que não se pode falar de jurisprudência consolidada.

Nada obsta à apreciação do mérito do recurso.
E, conhecendo:
No caso em apreço mostram-se verificados, conforme se reconhece no douto despacho de fls. 164 os requisitos da invocada oposição de julgados.
Como já se disse, quer no Acórdão recorrido quer no Acórdão fundamento face a um quadro fáctico e legal idênticos estava em causa saber se a pendência de acção administrativa especial em que é pedida a anulação do indeferimento de requerimento de não sujeição a IMl é meio idóneo, para efeitos de suspensão da execução fiscal referente às liquidações desse IMI nos termos do disposto no art. 52.º, n.º 1 da LGT e art 169.º n.º 1 do CPPT, mas ambos os arestos expressaram decisões antagónicas.
Assim, enquanto no douto Acórdão recorrido se considerou que, nas circunstâncias do caso, a AAE era meio idóneo para obter a suspensão da execução fiscal, a essa mesma questão deu resposta negativa o douto Acórdão fundamento.
Qual dos dois acórdãos deve ser agora acolhido? Cremos, convictamente, que a decisão do presente recurso deverá pender para a doutrina vertida no douto Acórdão recorrido.
O quadro legal:
Nos nºs. 1 e 2 do art. 52º da LGT dispõe-se:
«1. A cobrança da prestação tributária suspende-se no processo de execução fiscal em virtude de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação e oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem nº 90/436/CEE, de 23 de Julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados membros.
2. A suspensão da execução nos termos do número anterior depende da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias.»
Por sua vez, o nº 1 do art. 169º do CPPT, sob a epígrafe, «Suspensão da execução. Garantias» estabelece que «A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da divida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem nº 90/436/CEE, de 23 de Julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados membros, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195º ou prestada nos termos do artigo 199º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo funcionário competente.»

Desde logo, como destaca o Sr. Procurador-Geral-Adjunto no seu parecer, junto aos autos, se bem que nem o art. 169.º do CPPT nem o art. 52.º da LGT incluam a AAE no elenco dos meios processuais adequados a obter a suspensão do processo de execução fiscal e, em regra, não o será pois esse meio processual não tem por objecto imediato a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, o certo é que o elenco dos meios processuais referidos nas normas citadas não é fechado, nele podendo ser incluídos outros meios procedimentais e processuais que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda, “conceito mais lato do que o de «legalidade da liquidação da dívida exequenda» - como destaca o Sr. Conselheiro Jorge de Sousa, anot 3 ao art. 169.º do código de procedimento e processo tributário, 6ª edição, 2011. pág. 208.º e sgs..
Ora, a AAE apresentada pela reclamante, ora recorrida, A………… SA, tem por objecto imediato a anulação do acto que indeferiu o seu pedido de não sujeição a IMI e a condenação da AF à prática do acto de deferimento do pedido de não sujeição a esse imposto, pelo que, a eventual procedência desses pedidos produzirá relativamente à divida exequenda os mesmos efeitos ou efeitos similares aos que, por exemplo, produziria a eventual procedência de impugnação judicial que tivesse por objecto a apreciação da legalidade do actos de liquidação da dívida exequenda, ou seja, a anulação das liquidações de IMI em cobrança coerciva nos autos de execução fiscal, com a consequente devolução das quantias pagas.
Assim, como se refere no douto Acórdão recorrido (…) , independentemente da questão de saber se, no caso, o meio processual adequado é a AAE ou seria a impugnação judicial [com efeito no art. 9º do CIMI prevê-se um regime de não sujeição/não tributação e não um benefício fiscal (isenção) que esteja sujeita a reconhecimento por parte da AT, podendo, nesse caso, suscitar-se a questão de saber se há aqui qualquer acto autónomo de reconhecimento e se não teria que ser o próprio acto de liquidação que deveria ser impugnado (José Maria Fernandes Pires, in Lições de Impostos sobre o Património e o do Selo, Almedina, 2010, pp. 405 a 408, refere a este respeito: «relativamente a estes prédios para venda, o CIMI estabelece um regime de não sujeição durante o período que medeia entre a sua aquisição e a sua revenda e embora a afectação do imóvel ao activo circulante seja «a condição necessária para a constituição do direito», «não é condição suficiente para a sua eficácia. Após a aquisição do imóvel para revenda, as empresas que exercem essa actividade, devem comunicar a sua afectação ao activo circulante, no prazo máximo de 60 dias. Trata-se de uma mera comunicação e não de um requerimento que exija a produção de qualquer acto de reconhecimento do direito à não tributação. Esse direito deriva directamente da Lei e não depende de qualquer acto administrativo de reconhecimento ou outro. A comunicação é apenas condição de eficácia do exercício do direito. A razão de ser desta comunicação resulta apenas da necessidade de a administração fiscal conhecer dois factos importantes para o funcionamento da relação jurídica fiscal - a efectiva afectação do imóvel ao activo circulante da empresa e a data em que ela ocorreu. A primeira é indispensável à constituição do direito à não sujeição, e a segunda ao gozo do direito e à sua vigência. Esta comunicação é apenas uma condição de eficácia do exercício do direito à não tributação, não tendo efeitos constitutivos do direito, dado que, como antes referimos, esse deriva directamente da Lei. A entrega da comunicação corresponde ao exercício de um direito potestativo pela empresa proprietária do imóvel, não tendo que aguardar qualquer resposta da administração fiscal.») ] o que é verdade é que a citada AAE está pendente e nela (adequada ou inadequadamente) se discute a legalidade da dívida exequenda, ao menos na acepção mais lata atrás referida, já que, atendendo aos pedidos formulados, a eventual procedência da acção produzirá relativamente à dívida exequenda efeitos similares aos que produziria a eventual procedência de impugnação judicial que tivesse por objecto a apreciação da legalidade do acto de liquidação da dívida exequenda, ou seja, a anulação das liquidações de IMI em cobrança coerciva nos autos de execução fiscal, com a consequente devolução das quantias pagas(…).”

Destaca-se, pois, que o 9.º do CIMI prevê um regime de não sujeição/não tributação e não um benefício fiscal (isenção) que esteja sujeito a reconhecimento por parte da AT. “O direito deriva directamente da lei e não depende de qualquer acto administrativo de reconhecimento ou outro”, vide José Maria Fernandes Pires, in Lições de Impostos sobre o Património e o do Selo, Almedina, 2010, pp. 405 a 408 .
Acresce referir que este STA já em 22/01/2014 no recurso nº 1868/13 em que interveio como relator o mesmo relator do presente aresto decidiu no sentido do acórdão recorrido (alterando nesta altura, o ora relator, a posição de concordância expressa no citado acórdão fundamento em que foi relator o Sr. Conselheiro Valente Torrão, entretanto jubilado).
Ali se expressou o seguinte:
Sendo certo que nem o art. 169.º do CPPT nem o art. 52.º da LGT incluem a AAE no elenco dos meios processuais adequados a obter a suspensão do processo de execução fiscal (e, em regra, de facto, não o será pois esse meio processual, regulado pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos, não se destina a apreciar a legalidade dos actos de liquidação [art. 97.°, n.° 1, alínea p) e n.° 2 do CPPT]), tem vindo a considerar-se que tal elenco não é absolutamente fechado ocorrendo casos em que a AAE pode ter o alcance que aqui se discute nomeadamente quando esteja questionada a inexigibilidade da dívida.
Admite-o a doutrina pela pena de Jorge Lopes de Sousa, na anotação 3 ao art. 169.º do CPPT (Cfr, Código de Procedimento e Processo Tributário, 6ª Ed., 2011, págs. 208.º e sgs.), quando refere que o elenco dos meios processuais referidos nas normas citadas não é fechado, nele podendo ser incluídos outros meios procedimentais e processuais que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda. E, admite-o também a jurisprudência deste STA espelhada no Ac. de 06.02.2013, in Rec. nº 041/13 assim sumariado na parte que nos interessa:
(…)
III – Dada a natureza impugnatória da legalidade da dívida exequenda da acção administrativa especial esta deve ter-se como compreendida entre os meios processuais cuja dedução permite a suspensão da execução fiscal nos termos das leis tributárias, embora o n.º 1 do artigo 169.º do CPPT se lhe não refira expressamente.

Também importa destacar que embora o artigo 169º nº 1 do CPPT se refira apenas a meios processuais que tenham por tenham por
objecto a legalidade da dívida exequenda já o artigo 52.°, n.º 1 da LGT contém uma referência mais lata ao mencionar a expressão ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, conceitos que reconhecidamente são mais vastos do que o de simples ilegalidade da liquidação da dívida exequenda. Não pode olvidar-se a importância maior na hierarquia das leis tributárias da LGT pelo que havemos, também, de nos ater e considerar para a solução do presente recurso o conceito de inexigibilidade da dívida exequenda.
Ora, como resulta do probatório e destaca a sentença recorrida a AAE apresentada pela reclamante, ora recorrida, tem por objecto, a anulação do acto que indeferiu o pedido da ora recorrida de não sujeição a IMI e a condenação da AF à prática do acto de deferimento daquele mesmo pedido, pelo que, a eventual procedência dos pedidos formulados produzirá relativamente à divida exequenda os mesmos efeitos ou efeitos semelhantes aos que produziria a eventual procedência de impugnação judicial que tivesse por objecto a apreciação da legalidade do actos de liquidação da dívida exequenda, ou seja, a anulação das liquidações de IMI em cobrança coerciva, com a consequente devolução das quantias pagas, como impõe o artigo 133° do CPA.
Podemos pois concluir que sindicando-se na AAE a legalidade do acto de indeferimento da requerida isenção de IMI e derivando desse indeferimento as liquidações da dívida em cobrança na execução fiscal é a inexigibilidade desta dívida que, em última análise, está causa naquele meio impugnatório.(…)

Não se vê razão para alterar o entendimento expresso nos acórdãos citados, designadamente o último a que fizemos referência, sendo que a argumentação expendida no recurso consistente na afirmação de que a acção administrativa especial para obtenção da isenção não contende com a legalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda é rebatida nos termos supra expressos.
Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
1) Embora a lei não refira a AAE no elenco dos meios processuais adequados a obter a suspensão do processo de execução fiscal, o certo é que o elenco dos meios processuais referidos nas normas citadas não é fechado, nele podendo ser incluídos outros meios procedimentais e processuais.
2) A eventual procedência da AAE produzirá relativamente à dívida tributária exequenda efeitos similares aos que produziria a eventual procedência de impugnação judicial que tivesse por objecto a apreciação da legalidade do acto de liquidação da dívida exequenda, ou seja: a anulação das liquidações de IMI em cobrança coerciva nos autos de execução fiscal, com a consequente devolução das quantias pagas.
3) Dada a natureza impugnatória da legalidade da dívida exequenda da acção administrativa especial esta deve ter-se como compreendida entre os meios processuais cuja dedução permite a suspensão da execução fiscal nos termos das leis tributárias, embora o n.º 1 do artigo 169.º do CPPT se lhe não refira expressamente.

Assim sendo, o acórdão recorrido não merece a censura que lhe é dirigida, pelo que improcede o presente recurso por oposição de acórdãos.


4-DECISÃO:
Face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em, julgando verificada a invocada oposição de acórdãos, negar provimento ao recurso e confirmar o acórdão recorrido.

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 9 de Julho de 2014. – José da Ascensão Nunes Lopes (relator) - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Pedro Manuel Dias DelgadoAna Paula da Fonseca Lobo - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia José Maria da Fonseca Carvalho - Dulce Manuel da Conceição Neto - Joaquim Casimiro Gonçalves - Isabel Cristina Mota Marques da Silva.