Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0135/17
Data do Acordão:03/15/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO
EFEITO SUSPENSIVO
HOMOLOGAÇÃO
PLANO DE RECUPERAÇÃO
Sumário:I - Com o despacho judicial de nomeação do administrador provisório [cfr. art. 17.º-C, n.º 3, alínea a) do CIRE] determina-se o prosseguimento do PER e, simultaneamente, «durante todo o tempo em que perdurarem as negociações», obsta-se à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e suspendem-se, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, acções que se extinguem logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação (cfr. art. 17.º-E, n.º 1, do CIRE).
II - No caso de ter sido aprovado plano de recuperação, os referidos efeitos suspensivos só cessam com o trânsito em julgado da decisão judicial que homologar, ou não, esse plano.
III - Esta conclusão não só se harmoniza com a letra da lei – que não restringe aqueles efeitos suspensivos apenas ao período em que decorre ou podem decorrer as negociações entre o devedor e os credores –, como é a única que respeita a ratio legis que preside à concessão desses efeitos e que não a frustra.
Nº Convencional:JSTA00070070
Nº do Documento:SA2201703150135
Data de Entrada:02/07/2017
Recorrente:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A....., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF BRAGA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT.
Legislação Nacional:CIRE ART14 ART17-D ART17-E ART17-F ART17-G ART88.
CCIV66 ART9.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC043/16 DE 2015/01/20.; AC STA PROC01017/14 DE 2016/05/11.; AC STA PROC0278/15 DE 2015/03/25.; AC STA PROC0302/15 DE 2015/04/15.; AC STA PROC0371/15 DE 2015/04/22.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da decisão proferida no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º 1953/16.2BEBRG

1. RELATÓRIO
1.1 A Fazenda Pública (doravante Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, julgando procedente a reclamação deduzida por “A.………, S.A.” (a seguir Executada, Reclamante ou Recorrido) ao abrigo do disposto nos arts. 276.º e 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), anulou a decisão do órgão da execução fiscal de indeferimento do pedido da Executada, de que se mantivesse a suspensão do processo executivo até ao trânsito em julgado da decisão a proferir no recurso por ela interposto do despacho de não homologação do plano de recuperação apresentado em sede do respectivo processo especial de revitalização a correr termos pela 1.ª Secção da Instância Central de Comércio de Guimarães do Tribunal da Comarca de Braga.
1.2 Com o requerimento de interposição do recurso apresentou a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor:
«I. Vem o presente recurso interposto da decisão que julgou procedente a reclamação apresentada pela contribuinte, a qual determinou a anulação do despacho do órgão da execução fiscal que indeferiu o pedido de suspensão dos autos de execução fiscal enquanto estiver pendente o recurso interposto pela Reclamante (doravante RR) do despacho de não homologação do plano de revitalização no âmbito do Processo Especial de Revitalização (doravante PER).
II. Como se extrai da decisão, entendeu a M. Juíza que o encerramento do PER ainda não ocorreu, pois, o despacho [de] não homologação do plano de recuperação ainda não transitou em julgado, em virtude da apresentação de recurso do despacho pela RR.
III. Com a ressalva do devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com [o] assim decidido porquanto, no seu entender, a mesma fez uma errada interpretação do n.º 1 do artigo 17.º-E do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), como se procurará evidenciar.
IV. Atentos à factualidade cronológica dada como assente, podemos facilmente depreender que a Administração Tributária agiu em conformidade com os princípios básicos da legalidade fiscal, tendo em atenção a intangibilidade dos créditos tributários e a sua prevalência sobre qualquer legislação especial.
V. O PER visa permitir ao devedor que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja susceptível de recuperação, estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir com este acordo conducente à sua revitalização (cfr. artigo 17.º-A, n.º 1 do CIRE).
VI. De acordo como previsto no n.º 3 do artigo 17.º-A do CIRE, o PER trata-se de um processo de carácter urgente que se inicia com a manifestação de vontade do devedor e de pelo menos um credor de encetarem negociações conducentes à revitalização daquele por meio da aprovação de um plano de recuperação (cfr. artigo 17.º-C, n.º 1 CIRE).
VII. Obtida tal declaração, deverá o requerente comunicar ao juiz do tribunal competente para abertura do processo, que pretende dar início às negociações visando a sua recuperação, devendo então o juiz competente nomear administrador provisório (cfr. artigo 17.º-C, n.º 3 CIRE).
VIII. Com este despacho determina-se o prosseguimento do PER e simultaneamente obsta-se à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação (cfr. artigo 17.º-E, n.º 1 do CIRE).
IX. Porém, como resulta expressamente deste normativo, quer o obstáculo à instauração de acções para cobrança de dívidas contra o devedor, quer a suspensão de acções já instauradas com idêntica finalidade, apenas perdura enquanto se mantiverem as negociações entre o devedor e os credores.
X. O prazo para a conclusão das negociações é de dois meses, prorrogável uma só vez e por um mês, mediante acordo prévio entre o administrador provisório e o devedor (cfr. artigo 17.º-D, n.º 5 do CIRE).
XI. Na impossibilidade de alcançar acordo, ou sendo ultrapassado o prazo de negociações sem que se obtenha acordo, o processo negocial é encerrado (cfr. artigo 17.º-G do CIRE).
XI. Salvo melhor opinião, uma vez que o obstáculo à instauração de acções para cobrança de dívida ou a suspensão das que estiverem em curso apenas persiste durante as negociações, concluídas estas, o regime de impedimento ou de suspensão cessa.
XIII. Assim sendo, entende a Fazenda Pública que a sentença proferida nos presentes autos e ora recorrida fez uma interpretação errada e aplicação do Direito.
XIV. Entendeu o Tribunal a quo que “o despacho de não homologação do plano de recuperação ainda não transitou em julgado, o que significa que aqueles efeitos (suspensivos) se mantêm, pois o processo de revitalização ainda não foi encerrado”.
XV. Ora, com ressalva do sempre devido respeito, não se pode concordar com o entendimento sufragado na douta decisão ora em apreço, segundo o qual “a expressão “durante o tempo em que perdurarem as negociações” equivalerá à pendência do processo de revitalização, pois o processo de revitalização ainda não foi encerrado”.
XVI. No entender da Fazenda Pública, o processo especial de revitalização encontra-se findo e [o] processo negocial encerrado.
XVII. Na verdade, concluídas as negociações, o plano carece de homologação judicial como determina o n.º 1 e 2 do artigo 17.º-F do CIRE, homologação essa que se destina a aferir da conformidade legal das medidas aprovadas, com observância, designadamente, do disposto nos artigos 215.º e 216.º do diploma citado (por remissão do artigo 17.º- F, n.º 5 do CIRE).
XVIII. Destarte, face à oposição da Administração Tributária é manifesto que o acordo alcançado não podia ser homologado judicialmente, e tal despacho importa o encerramento do processo, tanto mais que neste tipo de processos, pelo seu carácter urgente, nem sequer pode voltar a ser apresentado qualquer outro acordo.
XIX. Assim, com a devida vénia, passamos a transcrever o sumário do Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 10.04.2014, proferido no processo n.º 1083/13.9TBBRG.G2, em que refere “No processo especial de revitalização, decorrido o prazo do n.º 5 do artigo 17.º-D CIRE e não sendo homologado o plano de revitalização que entretanto tinha sido aprovado, não é admissível que depois se apresente um segundo plano “para homologação ou recusa da mesma pelo juiz”.
XX. Deste modo, ou os credores chegam a acordo e o mesmo é homologado, ou na falta de acordo ou de homologação do mesmo, o processo é encerrado, e ultrapassada a fase negocial não se reabre a fase negocial, nem o processo volta a ser reaberto, impondo-se o seu encerramento com a cessação da suspensão dos processos de execução.
XXI. Efectivamente, o artigo 17.º-E, n.º 1 do CIRE estabelece que a “decisão a que se refere a alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-C obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação”. Ou seja, o período de suspensão das execuções inicia-se com a comunicação de que se pretende dar início às negociações, e mantém-se apenas durante o tempo em que perdurarem as negociações.
XXII. No caso sub judice o prosseguimento da execução fiscal só teve lugar muito depois das negociações, ou seja, depois de proferido e publicitado o despacho de recusa de homologação do acordo de revitalização.
XXIII. Nestas circunstâncias, mostrando-se concluídas as negociações referentes ao plano de revitalização, a Administração Tributária poderá instaurar ou fazer prosseguir as execuções contra o devedor, tanto mais que não subscreveu o plano de revitalização.
XXIV. Por outro lado, acolher argumentação do Tribunal a quo que a decisão de não homologação não transitou em julgado, pelo simples facto de ter sido interposto recurso pela RR, não poderá relevar para a suspensão dos autos do processo executivo, isto porque o referido recurso, conforme determina o artigo 14.º n.º 5 do CIRE, tem efeito meramente devolutivo, o que significa nos termos do n.º 1 artigo 704.º do Código Processo Civil (CPC) a atribuição de efeitos à decisão com a inerente possibilidade de execução do despacho.
XXV. Acresce, ainda, que, no entender da Fazenda Pública é o fim das negociações relativas ao PER que assinala a remoção das restrições referentes à instauração ou prossecução das acções, e não o despacho de (não) homologação.
XXVI. Com a devida vénia, passamos a transcrever parte do sumário do Acórdão proferido no Tribunal Central Administrativo Norte, no processo n.º 00956/14.6BEBRG, que entendemos ser bastante claro e elucidativo no sentido de esclarecer e suprimir qualquer dúvida à volta desta questão, acórdão que a Fazenda Pública adere e subscreve na íntegra, para todos os efeitos legais:
“(…)
5. Mas quer o obstáculo à instauração de acções para cobrança de dívidas contra o devedor, quer a suspensão de acções já instauradas com idêntica finalidade, apenas perdura enquanto se mantiverem as negociações entre o devedor e os credores.
6. As quais devem ser concluídas no prazo de dois meses, prorrogável uma só vez e por um mês (artigo 17.º-D/5 CIRE).
7. Uma vez que o obstáculo à instauração de acções para cobrança de dívida ou a suspensão das que estiverem em cursa apenas persiste durante as negociações, concluídas estas (por aprovação dos credores ou por impossibilidade de acordo – cfr. arts. 17.º-F/1, e 17.º-G do CIRE) aquele regime de impedimento ou de suspensão cessa.
8. E uma vez cessadas tais restrições, nada impede os credores de lançarem mão de tais acções, ou de as continuar.
9. Não é a decisão judicial de homologação ou não do acordo que marca o fim daquelas restrições, mas sim a conclusão das negociações” (Sublinhado nosso).
XXVII. A tudo quanto se referiu acresce que, como decorre do disposto no artigo 85.º, n.º 3 do CPPT a execução fiscal só pode ser suspensa nos casos expressamente previstos na lei.
XXVIII. Ora, do preceituado no n.º 1 do artigo 17.º do CIRE resulta que a suspensão dos processos executivos, maxime da execução fiscal ora em apreço, ocorre “durante todo o tempo em que perdurarem as negociações” previstas no n.º 5 do artigo 17.º-D do mesmo Código.
XXIX. Ora, no caso ora em apreço não restam dúvidas que aquele período negocial se encontrava concluído muito antes da prolação do despacho do órgão de execução fiscal [que] indeferiu o pedido de suspensão do processo executivo.
XXX. Donde se deve concluir que a suspensão determinada pelo CIRE há muito já havia deixado de produzir os seus efeitos na execução fiscal.
XXXI. E, por conseguinte, não poderia o processo executivo ver suspensa a sua normal tramitação com aquele fundamento previsto no citado n.º 1 do artigo 17.º do CIRE.
Destarte, decidindo como decidiu o Tribunal a quo, incorreu em erro de julgamento de direito, fez uma interpretação errada do n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE.
Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta decisão e substituindo-se por outra que julgue totalmente improcedente a Reclamação, assim se fazendo a costumada Justiça».
1.3 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
1.4 A Reclamante não contra alegou.
1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo e dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que deve ser concedido provimento ao recurso, revogada a sentença e julgada improcedente a reclamação, com a seguinte fundamentação:
«No âmbito do processo especial de revitalização, a prolação do despacho a que alude a al. a) do n.º 3 do art. 17.º-C, obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e suspende, quanto ao devedor, “durante todo o tempo em que perdurarem as negociações”, as acções em curso com idêntica finalidade (art. 17.º-E do CIRE).
Saber quando se concluem as negociações, ou seja, qual o momento em que cessam aquelas restrições, é o “nó górdio” da questão “sub judice”.
Essa questão encontra, no entanto, salvo melhor entendimento, inequívoca resposta no art. 17.º-F, n.º 1 do CIRE que remete a conclusão das negociações para o momento da aprovação do plano de recuperação, sendo o mesmo de imediato remetido ao processo, para homologação ou recusa desta pelo juiz. Encontra ainda resposta no n.º 1 do art. 17.º-G do CIRE que situa o encerramento do processo negocial no momento em que se conclua não ser possível chegar a um acordo ou quando seja ultrapassado o prazo previsto no n.º 5 do art. 17.º-D do CIRE (2 meses, prorrogável por uma só vez e por 1 mês).
A decisão de homologação ou recusa da mesma pelo juiz é, como decorre dos preceitos citados, acto posterior à conclusão das negociações, nelas não se integrando.
Ora, as restrições impostas pelo disposto no n.º 1 do art. 17.º-E do CIRE apenas vigoram “durante todo o tempo em que perdurarem as negociações”. Concluídas estas, com ou sem aprovação de plano de recuperação, cessam tais restrições. É o que claramente decorre do disposto no n.º 1 do art. 17.º-E do CIRE, havendo sempre o intérprete que presumir, na fixação do sentido e do alcance da lei, que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art. 9.º, n.º 3 do C. Civil). Se o legislador tivesse querido relegar para o encerramento do processo de revitalização o termo final das restrições impostas pelo n.º 1 do art. 17.º-E do CIRE ou que estas vigorassem durante a pendência de todo o processo de revitalização certamente que a fórmula que usaria seria bem diversa daquela que usou, na qual circunscreve tais restrições “a todo o tempo em que perdurarem as negociações”.
Assim, sem mais delongas, revendo-me no conjunto de argumentos vertidos na alegação da Fazenda Pública e na doutrina do douto Ac. do TCA Norte de 29.01.2015 - P. n.º 00956/14.6BEBRG, sou de parecer que deverá ser concedido provimento ao presente recurso e revogada a sentença recorrida, com a consequente improcedência da Reclamação».
1.6 Dispensaram-se os vistos dos Juízes adjuntos, atento o carácter urgente do processo.
1.7 A questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quando anulou o despacho que deferiu o pedido de suspensão da execução fiscal, o que passa por saber até quando se mantêm os efeitos suspensivos das acções para cobrança de dívida contra o devedor (designadamente a execução fiscal) decorrentes do art. 17.º-E, n.º 1, do CIRE, aditado pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, ao Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), que foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Maio.

* * *
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO
A sentença recorrida deu como assente a seguinte factualidade:
«1. Foram instaurados contra a aqui Reclamante, no Serviço de Finanças de Vizela, os processos de execução fiscal n.º 4200201501067648 e apensos, com vista à cobrança coerciva de dívidas tributárias, no montante global de € 142.193,60 – cfr. fls. 1 e ss. do PEF apenso aos autos.
2. Em 22.02.2016 foi publicitado o despacho inicial de aceitação do pedido de abertura de Processo especial de revitalização (doravante designado PER) apresentado pela aqui Reclamante que corre termos na 1.ª Secção de Comércio da Instância Central de Guimarães da Comarca de Braga no J2 sob o Proc. n.º 1051/16.9TBGMR – cfr. documento constante de fls. 14 verso ao PEF apenso aos presentes autos.
3. Na sequência da publicitação daquele despacho, os processos de execução fiscal foram suspensos, em 27.02.2016, por força do disposto no n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE – cfr. informação do OEF de fls. 58 do suporte físico dos autos e fls. 4 e ss. do PEF.
4. No âmbito do referido processo especial de revitalização, foi elaborado um plano de recuperação da empresa devedora que recolheu votos favoráveis de 77,41% e votos contra de 22,59%, num caso e noutro dos votos expressos, não se considerando como tal as abstenções – cfr. acta de 30.06.2016 e requerimento do administrador judicial provisório de fls. 47 a 54 do suporte físico dos autos.
5. A Autoridade Tributária e Aduaneira votou contra a aprovação daquele mencionado plano de recuperação – cfr. acta de fls. 53/54 do processo físico.
6. Em 13.07.2016, no âmbito do referido processo de revitalização, foi proferido despacho de recusa de homologação do plano de recuperação – cfr. fls. 28 do PEF.
7. Em 21.07.2016, como consequência da publicitação do despacho de não homologação do plano de recuperação, ocorreu a anulação da suspensão dos processos de execução fiscal, retomando estes a sua normal tramitação – cfr. informação do OEF de fls. 58 do suporte físico dos autos.
8. Por despacho de 27.09.2016, foi admitido o recurso do despacho de não homologação do plano de recuperação, com efeito devolutivo – cfr. fls. 18 do PEF.
9. Por requerimento remetido no dia 27.09.2016, via correio electrónico, ao Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Vizela, a Reclamante solicitou o cancelamento das diligências de penhora em curso, fazendo notar que o Processo Especial de Revitalização (PER) ainda não foi encerrado – cfr. fls. 30 do suporte físico dos autos.
10. Em 28.09.2016, o SF enviou resposta por e-mail ao mandatário da aqui Reclamante, informando-o de que as diligências de penhora haviam resultado do levantamento da suspensão da execução, que ocorreu em consequência do despacho de recusa de homologação do plano de revitalização – cfr. fls. 31 do processo físico;
11. No mesmo dia (28.09.2016) a Reclamante veio reiterar o seu pedido aludindo ao facto de no seu entendimento ser de aplicar o disposto no artigo 88.º do CIRE, por ter sido apresentado recurso do despacho de recusa de homologação do acordo de revitalização, o que obstaria a que o dito despacho transitasse em julgado – cfr. fls. 34 do suporte físico dos autos.
12. Em 29.09.2016, o Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças proferiu o seguinte despacho [decisão reclamada]:

13. Em 04.10.2016, a Reclamante foi notificada do despacho referido no ponto anterior – cfr. fls. 30/31 do PEF.
14. Em 13.10.2016 foi apresentada a presente Reclamação – fls. 5 do suporte físico dos autos».
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2.2 DE DIREITO
2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR
Foi instaurado contra a sociedade ora recorrida o processo de execução fiscal n.º 420020151067648 e apensos, que foi suspenso, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 17.º-E, do CIRE, na sequência da publicitação do despacho de que fora aceite, por despacho judicial, o pedido de abertura de processo especial de revitalização (PER) formulado por aquela sociedade e nomeado o administrador judicial provisório.
Este processo correu termos, com a negociação do plano de recuperação e sua aprovação pela maioria dos credores, com voto contra da Fazenda Pública, plano que, no entanto, não foi homologado judicialmente, tendo a requerente, ora Recorrida, deduzido recurso contra o despacho judicial de não homologação.
Porque o órgão da execução fiscal fez prosseguir a referida execução fiscal, a Executada veio pedir a suspensão do mesmo, invocando que o referido PER ainda não fora encerrado, pois tinha interposto recurso, ainda não decidido, do despacho de não homologação do plano de recuperação.
O órgão da execução fiscal recusou a pedida suspensão com o fundamento, em resumo, de que «o Plano Especial de Revitalização se encontra encerrado». Isto porque o período de suspensão das acções executivas «inicia-se com a comunicação de que se pretende dar início às negociações e mantém-se durante em que perdurarem» estas, nos termos do n.º 1 do art. 17.º-E, do CIRE; que o prazo para concluir as negociações encetadas é de dois meses, prorrogável, uma única vez, pelo período de um ano, nos termos do n.º 5 do art. 17.º-D, do CIRE; que, no caso, «o prosseguimento da execução fiscal só teve lugar depois das negociações, depois de proferido e publicitado o despacho de não homologação do plano de revitalização»; que, com o referido despacho, «o processo é encerrado e não se reabre a fase negocial, nem o processo volta a ser reaberto»; assim, e porque o recurso interposto do despacho que não homologou o acordo de revitalização tem mero efeito devolutivo, não há motivo para que a execução fiscal se mantenha suspensa.
A Executada, inconformada com essa decisão, dela reclamou judicialmente, ao abrigo do disposto nos arts. 276.º e 278.º do CPPT, pedindo à Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga a anulação da mesma. Isto, em síntese, com a seguinte argumentação: atento o disposto nos arts. 17.º-E, n.º 1, e 88.º, do CIRE, o processo de execução fiscal não pode prosseguir enquanto não houver decisão judicial definitiva sobre o plano de revitalização; assim, porque interpôs recurso do despacho judicial de não homologação do plano aprovado pelos credores, deverá aguardar-se a respectiva decisão, não podendo a execução fiscal prosseguir.
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, julgando a reclamação procedente, anulou a decisão reclamada. Em síntese, após enunciar a questão a dirimir como sendo a de «saber se em face da decisão de não homologação do plano de revitalização, a execução fiscal podia prosseguir para cobrança coerciva das dívidas em causa, não obstante ter sido deduzido recurso – com efeito devolutivo – da dita decisão» e de tecer diversos considerandos em torno do PER, referiu que «a prolação do despacho inicial do PER obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívida contra o devedor e durante todo o tempo de decurso das negociações tais acções suspendem-se, conforme prescreve o artigo 17.º-E, n.º 1 do CIRE» e que «[t]ais efeitos decorrem, pois, do referido despacho inicial e extinguem-se com o encerramento do processo de revitalização (cfr. artigo 17.º-G do CIRE)», para concluir que, «no caso em apreço, o despacho de não homologação do plano de recuperação ainda não transitou em julgado, o que significa que aqueles efeitos se mantêm, pois o processo de revitalização ainda não foi encerrado». Salientou ainda que «o facto de ao referido recurso [do despacho que não homologou o plano de recuperação] ter sido atribuído efeito meramente devolutivo não releva para o caso, dado que os efeitos suspensivos em causa constituem consequência do despacho inicial, mantendo-se até ao encerramento do processo, o que in casu ainda não aconteceu», que «a expressão “durante o tempo que durarem as negociações” equivalerá à pendência do processo de revitalização, na medida em que este se traduz precisamente num processo negocial entre o devedor e os credores com vista à aprovação de um plano de recuperação que reúna as condições para ser homologado» e, finalmente, que «não se verifica nos autos a situação de encerramento do processo de revitalização prevista no n.º 1 do artigo 17.º-G, decorrente da expiração do prazo para concluir as negociações fixado no n.º 5 do artigo 17.º-C, porquanto tal dependeria, além do mais, de comunicação do administrador judicial provisório ao processo e de publicação do portal Citius, o que não ocorreu».
A Fazenda Pública discorda da sentença e dela veio recorrer para este Supremo Tribunal Administrativo. Se bem interpretamos as alegações de recurso e respectivas conclusões, entende a Recorrente que a sentença fez errado julgamento quando considerou que a execução fiscal não podia prosseguir. Isto porque, como resulta expressamente do art. 17.º-E, n.º 1, do CIRE, a suspensão das acções já instauradas para cobrança de dívidas do devedor, determinada pelo despacho de nomeação do administrador provisório, apenas perdura enquanto se mantiverem as negociações entre o devedor e os credores, sendo que o prazo para a conclusão dessas negociações é de dois meses, prorrogável uma só vez e por um mês, como resulta do n.º 5 do artigo 17.º-D, do CIRE. Assim, porque o prosseguimento da execução fiscal foi ordenado já depois de terminadas as negociações, a respectiva decisão não enferma de ilegalidade alguma. Realça ainda que a AT não subscreveu o plano de revitalização e que o facto de ainda não ter transitado em julgado a decisão de não homologação, em virtude desta ter sido objecto de recurso, não releva, pois o referido recurso tem efeito meramente devolutivo, nos termos do n.º 5 do art. 14.º do CIRE.
A questão que cumpre apreciar e decidir é, pois, a de saber até quando se mantém a suspensão da execução fiscal determinada, nos termos do art. 17.º-E, n.º 1, do CIRE, pelo despacho liminar em sede de PER: se até ao termo da fase das negociações, como sustenta a Recorrente, se até ao trânsito da decisão que homologar ou não o plano de revitalização aprovado, como decidiu a sentença.
2.2.2 DO ERRO DE JULGAMENTO
Antes do mais, entendemos pertinente deixar registado que, como este Supremo Tribunal tem vindo a afirmar noutras circunstâncias, o processo de reclamação previsto no art. 276.º e seguintes do CPPT visa a apreciação da legalidade de actuação do órgão da execução fiscal à luz da fundamentação do acto que ele praticou. Assim, o controlo judicial «tem de ser feito pelo tribunal no contexto do pedido e da causa de pedir gizada na petição de reclamação, não podendo o tribunal apreciar se o acto deve ser validado ou censurado à luz de questões que não foram colocadas a esse órgão ou que nunca foram por ele equacionadas e decididas, já que o tribunal não pode substituir-se a tal órgão e sancionar o acto com a argumentação jurídica que julgue mais adequada.
Os poderes de cognição do tribunal não podem ir além dos fundamentos (factuais e jurídicos) de que o acto reclamado explicitamente partiu e das questões que nele foram apreciadas e decididas, cabendo-lhe unicamente uma função fiscalizadora da legalidade dos actos praticados pelo órgão administrativo incumbido de tramitar a execução, pelo que, no caso, o tribunal de 1.ª instância só podia aferir (como efectivamente aferiu) da legalidade do acto reclamado à luz da sua motivação factual e jurídica e à luz dos vícios invalidantes que o reclamante lhe imputa» (Vide, entre outros e por mais recentes, os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, sendo do último que se extraiu o trecho citado:
- de 20 de Janeiro de 2015, proferido no processo n.º 43/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/605684522d35f1b680257f4c005084c2;
- de 11 de Maio de 2016, proferido no processo n.º 1017/14, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/03886e69453d0b2f80257fb70047908c.).
Isto para dizer que a solução a proferir poderia eventualmente ser outra, caso o acto reclamado tivesse sido fundamentado na impossibilidade de a AT, mesmo no âmbito do processo especial de revitalização instituído pelos arts. 17.º-A a 17.º-I, aditados ao CIRE pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, conceder qualquer moratória na cobrança das dívidas tributárias para além das já previstas na lei (Vide a jurisprudência da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, iniciada com o seguinte acórdão:
- de 25 de Março de 2015, proferido no processo n.º 278/15, publicado no Apêndice ao Diário da República de 17 de Maio de 2016 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2015/32210.pdf), págs. 1079 a 1086, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/fd3edbc16b69387a80257e19003b8ae5, em cujo sumário ficou dito:
«I - Os n.ºs 2 e 3 do art. 36.º da LGT são peremptórios ao estabelecer que os elementos essenciais da relação jurídica tributária não podem ser alterados por vontade das partes e que a AT não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias (cfr. também o n.º 3 do art. 85.º do CPPT), salvo nos casos expressamente previstos na lei.
II - A indisponibilidade dos créditos tributários, consagrada no n.º 2 do art. 30.º da LGT («O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária»), foi reafirmada pelo n.º 3 aditado àquele artigo pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2011), que estipula: «O disposto no número anterior prevalece sobre qualquer legislação especial».
III - O processo especial de revitalização instituído pelos arts. 17.º-A a 17.º-I, aditados ao CIRE pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, não autoriza a AT a conceder qualquer moratória na cobrança das dívidas tributárias para além das já previstas na lei».
Na esteira do aí decidido, muitos outros acórdãos, entre os quais, os seguintes:
- de 15 de Abril de 2015, proferido no processo n.º 302/15, publicado no Apêndice ao Diário da República de 21 de Setembro de 2016 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2015/32220.pdf), págs. 1265 a 1271, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/23c107456dc0cdf880257e2a0033fa61;
- de 22 de Abril de 2015, proferido no processo n.º 371/15, publicado no Apêndice ao Diário da República de 21 de Setembro de 2016 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2015/32220.pdf), págs. 1347 a 1354, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/455fcf10296eebe380257e3100457761.). Mas não foi esse o fundamento invocado e, por isso e porque estamos em sede de contencioso de mera anulação, não podemos agora conhecer da legalidade do acto reclamado a essa luz. Tanto mais que nada sabemos relativamente aos termos do plano de recuperação aprovado.
Feito este considerando inicial, vejamos então até quando se mantém a suspensão da acção executiva determinada, nos termos do art. 17.º-E, n.º 1, do CIRE, pelo despacho liminar em sede de PER: se até ao termo da fase das negociações, como sustenta a Recorrente, se até ao trânsito da decisão que homologar ou não o plano de revitalização aprovado, como decidiu a sentença.
Aparentemente, a letra da lei daria apoio à tese da Recorrente, apoiada pelo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal Administrativo.
Mas, a nosso ver, só prima facie se poderá sustentar essa tese.
Diz o art. 17.º-E, n.º 1, do CIRE: «A decisão a que se refere a alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-C obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação».
Note-se que a decisão a que se refere o art. 17.º-C, n.º 3, alínea a), do CIRE, é o despacho liminar proferido no PER, com a nomeação do administrador judicial provisório.
É com base no trecho do citado n.º 1 do art. 17.º-E que refere «durante todo o tempo em que perdurarem as negociações» que a Recorrente sustenta que, estando já finda a fase das negociações, nada obsta ao prosseguimento das acções que se suspenderam nos termos daquele preceito legal.
Mas, salvo o devido respeito, contrariamente ao que sustentam a Recorrente e o Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo, a suspensão da execução determinada nos termos do n.º 1 do art. 17.º-E do CIRE – o efeito stand still – não se restringe à fase das negociações. Aliás, afastando desde já a argumentação que assenta exclusivamente no elemento literal e na presunção de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (cfr. art. 9.º, n.º 3, do Código Civil), diremos que, a ser essa a intenção do legislador (e, como vermos adiante, não é nem faria sentido que fosse), então por certo o texto da lei incluiria, antes da expressão «durante todo o tempo em que perdurarem as negociações» um advérbio (v.g., apenas, só, exclusivamente) em ordem a deixar claro, não só que a suspensão se mantinha enquanto durassem as negociações, mas também que cessava necessariamente com o termo das mesmas.
Vejamos:
Nenhuma dúvida existe de que o efeito suspensivo das acções executivas se manterá enquanto durarem as negociações. É o que resulta da letra da lei e da ratio legis, que é a de obviar a que durante essa fase de negociações entre o devedor e os credores as possibilidades de recuperação da empresa sejam comprometidas pela procedência de uma acção de cobrança de dívida.
Também se nos afigura que não haverá obstáculo à prossecução da execução contra o devedor quando o PER terminar sem que exista a aprovação do plano de recuperação. Tal acontece quer quando o devedor ou a maioria dos credores prevista no n.º 3 do art. 17.º-F concluírem antecipadamente não ser possível alcançar o acordo, quer quando seja ultrapassado o prazo para as negociações, previsto no art. 17.º-D, n.º 5 (Esse prazo é de dois meses, após o termo do prazo para as impugnações, prorrogável uma só vez e pelo período de um mês (cfr. art. 17.º-D, n.º 5, do CIRE).). A estas razões, previstas no n.º 1 do art. 17.º-G, acresce, ainda, a hipótese do n.º 5 do mesmo artigo, que prevê que o devedor pode pôr termo às negociações a todo o tempo, independentemente da causa, desde que comunique tal pretensão.
As dúvidas suscitam-se, a nosso ver, nos casos, como o sub judice, em que as negociações tenham concluído com a aprovação de plano de recuperação e quanto ao período que medeia entre o fim das negociações e o trânsito em julgado da decisão judicial de homologação ou não desse plano.
A seguir-se a tese da Recorrente, não haveria impedimento legal ao prosseguimento, durante esse período, das execuções que houvessem sido suspensas ao abrigo do n.º 1 do art. 17.º-F do CIRE. Esse resultado surge como manifestamente desajustado aos propósitos prosseguidos pelo PER e o legislador não o pode ter querido. É que, nos termos da mesma norma legal, as execuções extinguem-se «logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação», motivo por que a prossecução da execução nesse período não só não faria sentido, como poderia comprometer, até decisivamente, a possibilidade da recuperação.
Resulta, pois, evidente que a ratio que preside à suspensão das acções para cobrança de dívida no período correspondente «a todo o tempo em que perdurarem as negociações» impõe que se estenda esse período até ao trânsito em julgado da decisão que homologue ou não o plano de recuperação.
E também a letra da lei dá cobertura a esse entendimento. Não só porque, como deixámos já referidos, o art. 17.º-E, n.º 1, não restringe os referidos efeitos suspensivos a esse período – sendo abusiva, salvo o devido respeito, a conclusão constante da 2.ª parte da conclusão IX, de que «resulta expressamente deste normativo, quer o obstáculo à instauração de acções para cobrança de dívidas contra o devedor, quer a suspensão de acções já instauradas com idêntica finalidade, apenas perdura enquanto se mantiverem as negociações entre o devedor e os credores» (sublinhado nosso) –, mas também porque, como bem salientou a Juíza do Tribunal a quo, resulta do art. 17.º-G, n.º 2, que «o encerramento do processo especial de revitalização acarreta a extinção de todos os seus efeitos».
Concluímos, pois, que a sentença não enferma do erro de julgamento que lhe vem assacado.

2.2.3 CONCLUSÕES
Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - Com o despacho judicial de nomeação do administrador provisório [cfr. art. 17.º-C, n.º 3, alínea a) do CIRE] determina-se o prosseguimento do PER e, simultaneamente, «durante todo o tempo em que perdurarem as negociações», obsta-se à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e suspendem-se, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, acções que se extinguem logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação (cfr. art. 17.º-E, n.º 1, do CIRE).
II - No caso de ter sido aprovado plano de recuperação, os referidos efeitos suspensivos só cessam com o trânsito em julgado da decisão judicial que homologar, ou não, esse plano.
III - Esta conclusão não só se harmoniza com a letra da lei – que não restringe aqueles efeitos suspensivos apenas ao período em que decorre ou podem decorrer as negociações entre o devedor e os credores –, como é a única que respeita a ratio legis que preside à concessão desses efeitos e que não a frustra.
* * *
3. DECISÃO
Face ao exposto, os juízes deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.
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Lisboa, 15 de Março de 2017 – Francisco Rothes (relator) – Aragão Seia – Isabel Marques da Silva.