Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0241/13.0BEAVR |
Data do Acordão: | 05/12/2021 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | FRANCISCO ROTHES |
Descritores: | OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL REVERSÃO ACORDO |
Sumário: | I - O acordo entre particulares quanto ao pagamento dos tributos não vincula a AT (cf. art. 29.º, n.º 3, da LGT). II - Consequentemente, o facto de ter sido acordado entre o executado por reversão e um terceiro que este assumiria o pagamento das dívidas da sociedade originária devedora por que aquele respondia ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 24.º da LGT não serve para afastar essa responsabilidade. |
Nº Convencional: | JSTA000P27638 |
Nº do Documento: | SA2202105120241/13 |
Data de Entrada: | 04/26/2021 |
Recorrente: | INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL – DELEGAÇÃO DE AVEIRO |
Recorrido 1: | A................... |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de oposição à execução fiscal com o n.º 241/13.0BEAVR Recorrente: “Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P.” - Delegação de Aveiro Recorrido: A……………………. 1. RELATÓRIO 1.1 O “Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P.” interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro julgou procedente a oposição deduzida pelo acima identificado Recorrido contra a execução fiscal que, instaurada contra uma sociedade, reverteu contra ele, por ter sido considerado responsável subsidiário pelas dívidas exequendas, provenientes de contribuições para a Segurança Social, na parte em que estas respeitam aos meses de Outubro e Novembro de 2008 (No que respeita às dívidas por contribuições do mês de Dezembro de 2008, a sentença transitou em julgado.). 1.2 O Recorrente apresentou a motivação do recurso, com conclusões do seguinte teor: «1. A douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro nos autos supra referenciados, isentou de culpa o revertido/oponente na falta de pagamento das contribuições e cotizações à segurança social dos meses de Outubro e Novembro de 2008, enquanto gerente da sociedade “B………………., Unipessoal Lda.”. 2. A douta sentença recorrida decidiu pela ausência de culpa do revertido/oponente, uma vez que este cedeu a quota de que era titular na referida sociedade à sociedade “C……………., Lda.”, renunciando à gerência na mesma data, tendo deixando a sociedade em condições de solver as dívidas à segurança social, uma vez que a mesma detinha créditos sobre terceiros de valor suficiente para o efeito, e uma vez que a sociedade cessionária assumiu, por via contratual com o cedente, a responsabilidade pelo pagamento de tais dívidas. 3. Porém, a lei vigente à data dos factos e que se mantém até hoje (n.º 3 do art. 29.º da LGT), não permite a transmissão inter vivos das obrigações tributárias, pelo que a cessão de quotas e a assunção das dívidas tributárias por terceiros não é oponível ao credor, não desonerando o gerente/revertido da sua responsabilidade subsidiária, não podendo, por isso, ser motivo para afastar a sua culpa na falta de pagamento das dívidas tributárias cujo prazo de pagamento terminou no período de exercício do seu cargo. 4. Tendo a sociedade devedora originária meios para solver as dívidas em apreço, o acto de transmissão das dívidas pelo gerente/revertido aquando da cessão da quota, ao invés de o isentar de culpa e responsabilidade, antes consubstancia uma conduta culposa por parte do mesmo. 5. Assim, a sentença proferida pelo Tribunal a quo padece de ilegalidade, porquanto foi proferida ao arrepio do disposto na lei quanto à transmissão das obrigações tributárias. 6. Pelo que, caso assim não fosse, podia e devia o Tribunal a quo ter decidido pela improcedência da oposição no que respeita à invocada ausência de culpa do revertido/oponente na falta de pagamento das dívidas referentes a Outubro e Novembro de 2008. Nestes termos, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, na parte em que julga a oposição procedente por inexistir um dos pressupostos da responsabilidade subsidiária, a culpa do gerente na falta de pagamento das contribuições e cotizações à Segurança Social dos meses de Outubro e Novembro de 2008, com as legais consequências». 1.3 Não foram apresentadas contra-alegações. 1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal, a Procuradora-Geral-Adjunta emitiu parecer no sentido de que seja concedido provimento ao recurso, revogada a sentença e julgada a oposição improcedente. Isto, após enunciar o objecto do recurso e referir a fundamentação de facto e de direito da sentença, com a seguinte fundamentação: «[…] As dívidas em questão dizem respeito a contribuições e cotizações devidas à Segurança Social relativas aos meses de Outubro, Novembro de 2008, e o oponente deixou de ser gerente da sociedade “B………., Unipessoal Lda.”, a partir de 30.12.2008, na sequência da cessação de quotas que detinha sobre a devedora originária à sociedade C…………………. 1.5 Cumpre apreciar e decidir se a sentença fez correcto julgamento quando julgou a oposição procedente, o que passa por indagar se pode considerar-se afastada a responsabilidade do Opoente e ora Recorrido pelas dívidas exequendas. * * * 2. FUNDAMENTOS 2.1 DE FACTO Na sentença recorrida estabeleceram-se os seguintes factos provados: «1) Contra a sociedade “B………………. UNIPESSOAL, LDA.”, NIPC: ……………. foram, em 04-11-2009, instaurados e autuados os processos de execução fiscal n.º 0101200900249858 e 0101200900249866, este apenso ao primeiro, para cobrança coerciva de dívidas de cotizações e contribuições devidas à Segurança Social, atinentes ao período compreendido entre Outubro/2008 e Dezembro/2008, no montante global de € 7.376,06, que correm termos no IGFSS, IP - Aveiro – cfr. fls. 38 a 41 do suporte físico dos autos; 2) Em 18-11-2011 foi elaborado o projecto de reversão das dívidas mencionadas em 1) contra o ora oponente – cfr. fls. 43 e 44 do suporte físico dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; 3) Em 18-11-2011, sob o registo postal n.º RN155744981PT, o IGFSS, IP-Aveiro remeteu dirigido ao ora oponente, para a seguinte morada: “R ……….. ….. ……… … 4500-…… ESPINHO”, notificação contendo o projecto de reversão e para o exercício do direito de audição, tendo tal notificação vindo devolvida por não ter sido reclamada – cfr. fls. 42 e 47 do suporte físico dos autos; 4) Em 03-02-2012 o IGFSS, IP - Aveiro proferiu despacho de reversão das dívidas em causa contra o ora oponente – cfr. fls. 49 e 52 a 54 do suporte físico dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; 5) Por ofício datado de 03-02-2012, remetido sob registo postal com aviso de recepção, dirigido ao oponente para a seguinte morada: “R 35 n 489 3 O 4500-322 ESPINHO” foi aquele citado na qualidade de responsável subsidiário para as dívidas aludidas em 1) – cfr. fls. 50, 51 e 54 do suporte físico dos autos; 6) Em 08-03-2012 foi remetido ao IGFSS, IP – Aveiro, sob registo postal, a presente oposição – cfr. fls. 37 do suporte físico dos autos; 7) Em 02-03-2007 foi constituída a sociedade “B……………… UNIPESSOAL, LDA.”, NIPC: ………………., estando tal facto registado na Conservatória do Registo Comercial de Ovar, sob a AP. 10/20070302, dele constando, além do mais, o seguinte: 8) Em 30-12-2008 o ora oponente cedeu as quotas que detinha na sociedade “B…………………… UNIPESSOAL, LDA.” à sociedade “C…………….., LDA.”, pelo seu valor nominal [€ 5.000,00], renunciando o cedente à gerência da sociedade executada, nessa mesma data, estando registado na respectiva Conservatória do Registo Comercial sob a AP. 3/20090116, com efeitos reportados a 30-12-2008 – cfr. fls. 9, 10 e 19vº do suporte físico dos autos; 9) Aquando da celebração do contrato de cedência de quotas aludido no ponto anterior foi outorgada “Declaração Complementar” mediante a qual foi declarado, além do mais, o seguinte: 10) Antes mesmo da celebração do contrato de cessão de quotas foi elaborada uma relação de créditos e débitos da sociedade executada e foi a mesma entregue a E…………….., da C…………… – cfr. resulta do depoimento da testemunha F……………..; 11) Na sequência da cedência de quotas mencionada em 8) foi, em 30-12-2008, nomeado gerente E……………………., estando registado na respectiva Conservatória do Registo Comercial sob a AP. 4/20090203, com efeitos reportados a 02-01-2009 – cfr. fls. 15, 16 e 20 do suporte físico dos autos; 12) Quando o ora oponente deixou a sociedade executada, a empresa ainda mantinha empregados, veículos [2 camiões, um ligeiro e outro pesado], máquinas [uma caldeira; uma máquina de fabricar micro; uma máquina de cortar micro; dois empilhadores, um de garfo e outro para bobines de papel e uma embaladeira] e créditos sobre terceiros, sendo que tinha, ainda, alugados um escritório em Esmoriz e instalações fabris na Zona Industrial de ……. – cfr. depoimento das testemunhas inquiridas [sendo no que concerne a créditos sobre terceiros com base, em exclusivo, no depoimento da testemunha F…………………] e, ainda, fls. 28.º a 32.º do suporte físico dos autos [mais concretamente, fls. 30vº - pontos 10. e 11. da sentença proferida no âmbito do incidente de qualificação da insolvência]; 13) Dos créditos sobre terceiros detidos pela sociedade executada, no valor aproximado de € 60.000,00, o crédito detido sobre a empresa “D……………., LDA.” representava uma parte significativa, ascendendo, aproximadamente, a € 10.000,00 – cfr. depoimento da testemunha F…………………..; 14) Em 02-01-2009, E…………., da C……………., reuniu com os trabalhadores da sociedade executada e transmitiu-lhes que era o novo gerente da mesma e que a firma iria continuar a funcionar, que iria adquirir materiais [matérias-primas] para laborarem – cfr. depoimento das testemunhas inquiridas; 15) Em 12-01-2009 a sociedade executada, através do seu gerente E……………… despediu os trabalhadores daquela empresa, por extinção do posto de trabalho – cfr. fls. 27 do suporte físico dos autos, depoimento das testemunhas inquiridas [que disseram que este lhes emitiu a carta para o fundo de desemprego com data de 13-01-2009] e, ainda, fls. 28.º a 32.º do suporte físico dos autos [mais concretamente, fls. 30 e 30vº - pontos 6. e 11. da sentença proferida no âmbito do incidente de qualificação da insolvência]; 16) Por decisão judicial proferida em 20-03-2009, no âmbito do processo de insolvência n.º 273/09.3TBOVR, que correu termos no 3.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Ovar, foi a sociedade executada declarada insolvente – cfr. resulta de fls. 26 e, ainda, de fls. 28.º a 32.º do suporte físico dos autos [mais concretamente, fls. 28vº e 30, designadamente ponto 1. da sentença proferida no âmbito do incidente de qualificação da insolvência], todas do suporte físico dos autos; 17) A residência do ora oponente era, pelo menos no período compreendido entre 02-03-2007 e 06-03-2012, sita na “Rua ……, n.º ….. - ……, freguesia e concelho de Espinho” – cfr. fls. 9, 19vº, 21, 34, 36, 49, 50 e 52 do suporte físico dos autos». * 2.2 DE FACTO E DE DIREITO 2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR O ora Recorrente instaurou contra uma sociedade uma execução fiscal para cobrança de dívidas por contribuições para a Segurança Social dos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2008 e, ulteriormente, proferiu despacho de reversão contra o ora Recorrido. 2.2.2 DO ERRO DE JULGAMENTO NA DETERMINAÇÃO DA RESPONSABILIDADE PELAS CONTRIBUIÇÕES (DOS MESES DE OUTUBRO E NOVEMBRO) QUE DERAM ORIGEM ÀS DÍVIDAS EXEQUENDAS Como bem salientou o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, estamos perante uma situação subsumível na alínea b) do n.º 1 do art. 24.º da LGT, na qual compete ao revertido demonstrar que a falta de pagamento se não deve a culpa sua. 2.2.3 CONCLUSÕES O recurso será, pois, provido e, preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões: * * * 3. DECISÃO Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo, em conferência, acordam em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença na parte recorrida (respeitante às dívidas exequendas provenientes de contribuições dos meses de Outubro e Novembro de 2008) e, em consequência, determinar a baixa dos autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, a fim de aí ser conhecido o fundamento de oposição que deu por prejudicado. Custas pelo Recorrido, que não suporta taxa de justiça neste Supremo Tribunal, uma vez que não contra-alegou o recurso [cfr. art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi do art. 281.º do CPPT]. * Lisboa, 12 de Maio de 2021. – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) – Joaquim Manuel Charneca Condesso – Paulo José Rodrigues Antunes. |