Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CRISTINA NEVES | ||
Descritores: | HERANÇA INDIVISA PENHORA FORMALIDADES NULIDADE REGISTO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/11/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: | I - A penhora do direito do executado a herança indivisa efectua-se mediante notificação do facto ao cabeça-de-casal e aos demais herdeiros, com a expressa advertência de que o direito do executado fica à ordem do agente de execução, desde a data da primeira notificação. II- Esta penhora não está sujeita a registo, ainda que na herança se integrem bens imóveis ou móveis sujeitos a registo, por não se concretizar em bens certos e determinados, integrando a exceção consagrada na al. c), do nº2, do artigo 5º do Código de Registo Predial. III- A partilha de herança indivisa representa um acto de disposição do direito penhorado, substituindo-o por bens certos e determinados que, nessa medida, é ineficaz perante a execução (art. 819.º do CC). IV- A falta de notificação dos co-herdeiros prevista no art. 862º nº 1 do Cód. de Proc. Civil (anterior à lei 41/2013), na penhora de um direito e acção à respectiva herança, tem de ser arguida, quando os co-herdeiros intervierem na acção, sob pena de se considerar a nulidade sanada. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO A, intentou acção declarativa de condenação com processo comum, contra B [….. – Pintura para Construção Civil, Lda. ] e C , peticionando que seja declarada proprietária da fracção autónoma C correspondente ao 1º andar do prédio urbano sito na Praça da República, .. a …, em Ericeira, Mafra, inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Ericeira sob o art. 1265 e descrito na CRP de Mafra sob o nº 4053/20020206-C, ordenando-se o levantamento da penhora registada sobre o mesmo e o cancelamento da respectiva inscrição Ap. 2671 de 19.03.2013 no registo. Para o efeito, alega que na sequência da partilha realizada em processo de inventário aberto por óbito de Maria ….. e de Fernando ……, no qual também foi interessado o 2.º R., foi-lhe adjudicada a referida fracção, por sentença transitada em 07/12/12, sendo a data da penhora posterior e não tendo o registo da propriedade em nome da A. efeitos constitutivos, mas meramente declarativos. * Citados que foram os RR., apenas a 1.ª R. apresentou contestação, na qual e, em síntese, alega que o registo da transmissão da propriedade a favor da ora A. apenas se efectuou em 12/12/2013, na sequência de rectificação da partilha efectuada por despacho proferido em 14/10/13. Mais alega que a penhora foi efectuada por auto de 26/11/12, pelo que, em todo o caso é esta anterior à conferência de interessados e à adjudicação do bem, sendo o registo da mesma anterior ao registo da propriedade do bem, pelo que esta partilha e subsequente registo, é inoponível ao exequente, ora R. * Realizada audiência prévia, foi após proferida sentença, na qual decidiu o tribunal “ad quo” julgar a acção “totalmente procedente e, consequentemente, declaro a A. proprietária da fracção C, correspondente ao 1.º andar do prédio urbano constituído em propriedade horizontal, sito na Praça da República, .. e …., inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Ericeira e descrito na Conservatória do Registo Predial de Mafra sob o n.º 4053, e ordeno o cancelamento da inscrição sobre esta fracção da penhora do direito e acção da quota do 2.º R. na herança aberta por óbito de João ….., realizada na sequência da Ap. 2671 de 19.03.2013.” * Não conformado com esta decisão, impetrou a 1º R.. recurso da mesma, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem: “III. CONCLUSÕES A douta sentença recorrida não fez uma correcta apreciação dos factos e do direito aplicável, o que levaria a que o Tribunal recorrido concluísse de forma diversa, considerando válida e eficaz a penhora porque, aquando do respectivo registo a favor da Ré do direito e acção da quota do 2º Réu na herança aberta por óbito de Fernando ……, esse direito ainda existia e, mesmo que assim não fosse entendido, sucede que os actos de disposição praticados pelo 2º Reú no âmbito da partilha são ineficazes relativamente à execução e, por maioria de razão, à penhora. Assim: 1. A penhora do direito e acção da quota do 2º Réu na herança aberta por óbito de Fernando ……, que incide sobre fracção “C”, correspondente ao 1º Andar do prédio urbano constituído em propriedade horizontal, sito na Praça da República, … e ….., inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Ericeira e descrito na Conservatória do Registo Predial de Mafra sob o nº 4053, foi concretizada em 26 de Novembro de 2012. 2. E registada pela Ap. 2671 de 19.03.2013 da ficha nº 4053 da Conservatória do Registo Predial de Mafra. 3. Esta matéria deveria constar da factualidade dada por provada pela sentença recorrida e aditada à decisão de facto, a saber: - a penhora do direito e acção da quota do 2ºRéu na herança aberta por óbito de Fernando …… efectivou-se em 26 de Novembro de 2012. 4. Daí resultando que, quando a penhora foi realizada, o 2º Réu era titular do direito penhorado e, quando procedeu à sua alienação pela partilha, o mesmo já se encontrava onerado com uma penhora a favor da 2ª Ré, Recorrente. 5. A partilha dos bens da herança aberta por óbito de Fernando ….., que incide sobre fracção “C”, correspondente ao 1º Andar do prédio urbano constituído em propriedade horizontal, sito na Praça da República, … e …., inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Ericeira e descrito na Conservatória do Registo Predial de Mafra sob o nº 4053, foi realizada em 7 de Dezembro de 2012 após a efectivação da penhora; 6. A decisão recorrida deveria ter considerado que o direito da ora Recorrente é anterior ao direito reclamado pela Autora e portanto com prioridade sobre a aquisição da A. constituída e registada posteriormente – art. 5ºdo CRP. 7. Logo, a alienação posterior efectuada pelo 2º Réu do seu quinhão na herança no âmbito do inventário não é susceptível de afectar a penhora a favor da 1ªRé, Recorrente (art. 819º do CC) e assim, quando a penhora foi efectuada a favor da Recorrente, o direito e acção da quota do 2ºRéu na herança aberta por óbito de Fernando ….. ainda permanecia na sua esfera jurídica. 8. Na conferência de interessados efectuada no âmbito do Proc. 214/11.8T2MFR, realizada em 7.12.2012, em que foi efectuada a partilha e adjudicada a totalidade da fracção “C” à A., quer a cabeça de casal, Emília ….., quer os Interessados Manuela …… e João ……, ora 2º Réu, tinham conhecimento da penhora do direito e acção da quota do 2ºRéu na herança aberta por óbito de Fernando ….. . 9. A 1ª Ré não pode por isso ser prejudicada pela circunstância da cabeça-de casal e demais interessados, onde se inclui a própria A. e o 2º Réu, de que existia uma penhora do direito e acção da quota deste na herança aberta por óbito de Fernando …… . 10. A A. foi notificada da penhora pelo Sr. Agente de Execução quando este constatou o registo de aquisição a seu favor, decorrente da partilha, em 31.01.2014. 11. Donde, mesmo que se considere que a A. apenas teve conhecimento da penhora do direito e acção da quota do 2ºRéu na herança aberta por óbito de Fernando …… quando, em 31.01.2014, foi notificada pelo Sr. Agente de Execução, em todo o caso, ao contrário do defendido pela decisão recorrida, a sua notificação não é constitutiva dos efeitos da penhora. 12. Com efeito, no caso de penhora de parte, quota ou quinhão em bem indiviso, móvel ou imóvel, sujeito a registo, a notificação dos interessados – administrador e contitulares – do registo da penhora não é constitutiva da sua eficácia. 13. Nestes casos, a notificação dos interessados impõe-se apenas para designação do depositário ou para se pronunciarem se a venda tem por objecto todo o património ou a totalidade do bem (art. 781º, nº 2). 14. Logo, nestes casos (penhora de parte, quota ou quinhão em bem indiviso), a notificação dos interessados não é constitutiva dos efeitos e eficácia da penhora. 15. Mesmo que se admitisse que a A. não foi notificada conjuntamente com os demais interessados mas apenas mais tarde, em todo o caso, não deixou de ser notificada antes da venda pelo que esta circunstância não colide com a eficácia da penhora uma vez que não ficou prejudicado o seu direito de se poder pronunciar, querendo, sobre se a venda terá por objecto todo o património ou a totalidade do bem (art. 781º, nº 2 do CPC). 16. Deste modo, não se encontra afectada a presunção resultante da inscrição registral de que a penhora teve lugar e se constituiu validamente a favor da Recorrente. 17. As disposições ou deliberações tomadas na partilha pelos interessados não podem afectar a execução – arts. 819º e 820º do CC. 18. Seguindo Lebre de Freitas, “com a penhora, o executado não fica privado do poder de dispor do seu direito, podendo, depois da penhora, continuar a praticar actos de disposição ou oneração. Os atos de disposição ou oneração dos bens penhorados comprometeriam, no entanto, a função da penhora se tivessem eficácia plena. Por isso, são inoponíveis à execução. Não se tratando de atos nulos, mas apenas relativamente ineficazes, eles readquirirão eficácia plena no caso de a penhora vir a ser levantada.”(Código Civil Anotado, Almedina, Volume I, pág. 1031). 19. Deverá assim ser mantida a inscrição da penhora a favor da Ré do direito e acção da quota do 2º Réu na herança aberta por óbito de Fernando ……., que incide sobre fracção “C”, correspondente ao 1º Andar do prédio urbano constituído em propriedade horizontal, sito na Praça da República, … e …., inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Ericeira e descrito na Conservatória do Registo Predial de Mafra sob o nº 4053. NESTES TERMOS e nos mais de Direito e com o sempre mui douto suprimento de VªExas. deve ser dado provimento ao presente recurso, alterada a decisão recorrida no sentido de que os actos de disposição tomados pelos interessados na partilha não são oponíveis à execução pelo que deverá assim ser mantida a inscrição da penhora sobre o direito e acção da quota do 2º. Réu C , na herança aberta por óbito de João Nobre Tornelli, correspondente à Ap. 2671 de 19.03.2013 da ficha nº 4053 da Conservatória do Registo Predial de Mafra, Fracção “C”, devendo, por conseguinte, beneficiar da prioridade do registo sobre a aquisição a favor da Autora. ASSIM DECIDINDO, FARÃO VOSSAS EXCELÊNCIAS A COSTUMADA JUSTIÇA!” * Pela A. foram interpostas contra alegações, das quais constam as seguintes conclusões: “1. Para que a penhora do direito e acção da quota do Réu C na herança aberta por óbito de Fernando …. seja dotada de eficácia será necessário, para além do acto (administrativo) de penhora realizada pelo Agente de Execução, o seu registo e notificação aos contitulares. 2. Tal eficácia apenas seria atingida na data de inscrição da penhora no Registo Predial – 19.03.2013 - acto posterior à realização da partilha em 07.12.2012, sendo que, por força do art. 2119º do Código Civil, a A. deve ser considerada como sucessora única dos bens que lhe foram atribuídos na referida partilha. 3. Não deve assim ser aditada à matéria de facto a matéria pretendida pela Recorrente. 4. Não tem o direito da Recorrente anterioridade em relação ao direito da A. sobre a fracção C do prédio urbano sito na Praça da República, 57/59, na Ericeira. 5. A aquisição da A. é anterior a tal penhora e ao seu registo. 6. E quando a penhora foi efectuada, o direito e acção da quota do 2º R. na herança aberta por óbito de Fernando ….. já não se inscrevia nem na esfera jurídica do mesmo, nem em qualquer outra. 7. Pelo que a penhora devedora e registada é nula (nº 1 do art. 280º do Código Civil). 8. Nenhuma prova existe nos autos no sentido de que os interessados Manuela …..e João …… tivessem conhecimento de que havia a penhora do direito e acção da quota deste último. 9. Para que a penhora pudesse ser válida impunha-se a notificação da A. enquanto contitular do direito. 10. Ao omitirem-se as notificações devidas, coarcta-se o direito dos contitulares procederem nos termos previstos nos nºs 2 a 4 do artigo 781º do CPC. 11. Ao omitir-se, no tempo oportuno, a notificação à A., a penhora em causa não se constitui validamente. 12. E tendo a mesma apenas ocorrido muito após a conferência de interessados, a partilha nesta ocorrida é perfeitamente válida. 13. E, em consequência, a A. é a legítima proprietária da fracção C correspondente ao 1º andar do prédio sito na Praça da República, ../.. na Ericeira, descrito na Conservatória do Registo Predial de Mafra sob o nº 4053. Nestes termos e nos melhores de Direito deve o Recurso interposto a Fls., ser julgado improcedente e confirmada a douta decisão de Fls., assim se fazendo JUSTIÇA!” * QUESTÕES A DECIDIR Nos termos do disposto nos Artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial. Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas. Nestes termos, as questões a decidir que delimitam o objecto deste recurso, consistem em apurar: a) Se se impõe o aditamento da matéria de facto adquirida pelo tribunal recorrido, no sentido propugnado pelo recorrente; b) Se a adjudicação de imóvel à A. em sede de inventário aberto para partilha da herança deixada por óbito de Fernando ……, é inoponível à execução na qual se efectuou a penhora do direito e acção do Réu C nessa herança; * Corridos que se mostram os vistos aos Srs. Juízes adjuntos, cumpre decidir. * FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO O tribunal recorrido considerou a seguinte: “A) Decisão de Facto: Com interesse para a decisão a proferir, encontra-se apurada a seguinte factualidade: 1. Sob o n.º 214/11.8T2MFR deste Juízo, correu termos processo de inventário por óbito de Maria …. e de Fernando …..; 2. A A. e o 2.º R. foram interessados naquele processo; 3. Os acervos hereditários das pessoas melhor identificadas em 1. eram integrados pela fracção autónoma “C” do prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito na Praça da República, n.ºs .. a …., inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Ericeira sob o artigo 1265 e descrito n Conservatória do Registo Predial de Mafra sob o n.º 4053, constituindo a verba n.º 2 das Relações de Bens; 4. Na descrição referida em 3., encontram-se as seguintes inscrições: a) Ap. 36 de 2002/02/06, aquisição de 2/18 a favor de Emília ., casada no regime de bens da comunhão geral com Fernando …., por partilha da herança aberta por óbito de João ……; b) Ap. 32 de 2003/04/29, aquisição de 2/18 a favor de Emília …., casada no regime de bens da comunhão geral com Fernando ……, por permuta com a aqui A.; c) Ap. 7 de 2007/09/21, aquisição de 1/18 em comum e sem determinação de partes a favor de Emília …. , casada no regime de bens da comunhão geral com Fernando ….., e da aqui A. por sucessão hereditária de Maria …. ; d) Ap. 9 de 2007/09/21, aquisição a favor de Emília …., viúva, do 2.º R. e de Manuela ……, por dissolução da Comunhão Conjugal e Sucessão por óbito de Fernando …. ; 5. Em conferência de interessados realizada a 07.12.2012 no âmbito do processo referido em 1., a fracção descrita nos autos foi adjudicada à aqui A., por transacção sobre a qual recaiu a sentença de fls. 8 verso; 6. Nessa mesma conferência, a interessada Manuela ….. pagou as tornas devidas à aqui A. através da dação em pagamento da sua quota no direito de propriedade da fracção dos autos; 7. Porém, na acta daquela diligência incorreu-se em erro material, tendo sido inscrito em 1.º da transacção alcançada entre os interessados que era adjudicado à A. o bem descrito no n.º 1 e não no n.º 2; 8. A rectificação do erro acima referido realizou-se por despacho proferido no processo de inventário a 18.09.2013; 9. Na descrição da fracção autónoma, foi inscrita, pela ap. 2671 de 2013/03/19 penhora sobre o direito e acção da quota do 2.º R. na herança aberta por óbito de Fernando terminada em processo executivo que corre termos sob o n.º 1608/08.1TATVD-A no extinto 2.º Juízo do Tribunal de Torres Vedras, para garantia de 37.887,26 €; 10. Previamente à inscrição registal referida em 9., o Sr. Agente de Execução notificou a Emília ….. e Manuela …… nos termos e para os efeitos do artigo 781.º do Cód. Proc. Civil, tendo C, executado na acção em apreço, sido citado após o registo da acção; 11. Todas as pessoas atrás identificadas eram interessadas no processos de inventário melhor descritos em 1.; 12. Na mesma descrição e pela ap. 1745 de 2013/12/12, encontra-se inscrita a favor da A. a aquisição da propriedade da fracção em apreço, por partilha judicial dos acervos hereditários das pessoas melhor identificadas em 1.” * REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO Insurge-se o recorrente contra a decisão que considerou a acção totalmente procedente, declarando a A. proprietária da fracção em apreço e determinou o cancelamento da penhora do direito e acção da quota do 2º R. na herança, impetrando a alteração da matéria de facto assente, discordando ainda dos fundamentos de direito da mesma, de acordo com as suas conclusões recursórias. Decidindo: a) Da reapreciação da matéria de facto; Nas suas alegações de recurso, alega o recorrente pretender o aditamento de um ponto à matéria de facto assente, que foi omitido pelo tribunal recorrido, a saber: - a penhora do direito e acção da quota do 2ºRéu na herança aberta por óbito de Fernando ….. efectivou-se em 26 de Novembro de 2012. A este respeito, defende a A. recorrida que não deve ser aditado este ponto, uma vez que, para que a penhora do direito e acção da quota do Réu C na herança aberta por óbito de Fernando …… seja dotada de eficácia, será necessário, para além do acto (administrativo) de penhora realizada pelo Agente de Execução, o seu registo e notificação aos contitulares, mais considerando que, tal eficácia apenas seria atingida na data de inscrição da penhora no Registo Predial – 19.03.2013 - acto posterior à realização da partilha em 07.12.2012, sendo que, por força do art. 2119º do Código Civil, a A. deve ser considerada como sucessora única dos bens que lhe foram atribuídos na referida partilha. Ora, quanto aos requisitos de reapreciação da matéria de facto, dispõe o artº 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, que: «Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.” No que respeita à observância dos requisitos constantes do artº 640, após posições divergentes na nossa jurisprudência, o Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a pronunciar-se no sentido de que «(…) enquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.»[1] Conforme refere o Ac. STJ. de 03.03.2016, Ana Luísa Geraldes, proc. nº 861/13.3TTVIS.C1.S, “O que verdadeiramente importa ao exercício do ónus de impugnação em sede de matéria de facto é que as alegações, na sua globalidade, e as conclusões, contenham todos os requisitos que constam do art. 640º do Novo CPC. A saber: - A concretização dos pontos de facto incorrectamente julgados; - A especificação dos meios probatórios que no entender do Recorrente impunham uma solução diversa; - E a decisão alternativa que é pretendida. Efectivamente, sendo as conclusões uma súmula e síntese da indicação dos fundamentos por que se deduz a impugnação relativa à matéria de facto, deixariam de ter esse cunho se a Recorrente tivesse que inserir e especificar detalhadamente, em sede conclusiva, todos os elementos que compõem a impugnação e que se mostram enunciados nas diversas alíneas do nº 1 do art. 640º do NCPC, com a repetição exaustiva da fundamentação desenvolvida ao longo do conteúdo das alegações.” Mais se considera que apenas deve ser dado provimento às reclamações da matéria de facto, quando os factos que se pretendem aditar ou alterar, tenham relevância para a decisão jurídica da causa, e não contenham conclusões, nem matéria de direito, impondo-se que o tribunal não pratique actos, nem promova actividades inúteis à sorte dos autos. Apreciando o recurso, peticiona a recorrente o aditamento de matéria respeitante à data em que foi feita a penhora pelo Sr. Agente de Execução, matéria que não é irrelevante, tendo em conta a solução jurídica da causa, sendo certo que a eficácia ou ineficácia desse acto, é matéria de direito que não dispensa a consideração dos factos relevantes para o enquadramento jurídico dos mesmos. Assim, a realização e data do auto de penhora, consta de documento junto aos autos a fls. 25 e não impugnado, pelo que se dá por assente o seguinte facto: -No âmbito da execução que correu termos sob o nº 1608/08.1TATVDA-A, foi pelo Agente de Execução lavrado auto em 26/11/12, dele constando a penhora “Do Direito e Acção da Quota do Executado na Herança Aberta por óbito de Fernando ….. .”. Mais se dá como assente, ao abrigo do disposto no artº 662 n1 do C.P.C. por resultarem dos docs. juntos como doc. 1 à p.i. e 43 a 45 (não impugnados), que: - Com data de 26/11/12, foi pelo Agente de Execução expedida comunicação à cabeça-de-casal, de que este direito fora penhorado; - Pela cabeça-de-casal Emília ….., foi expedida comunicação ao Agente de Execução, em 10/12/12, informando que “Os herdeiros do falecido Fernando ….. são o cônjuge sobrevivo, a aqui cabeça de casal Emília ……, com a morada constante dos autos e dois filhos: Manuela ….. (…) e o ora executado C, melhor identificado nos autos. 2 - Mais informa que foi entregue relação de bens por óbito de Fernando …. em 04/05/2007 no Serviço de Finanças de Mafra (…) a qual se encontra junta ao processo de inventário que correu termos na Comarca da Grande Lisboa – Noroeste, Mafra-Juízo de Média e Pequena Instância Cível, com o nº 214/11.8T2MFR.” -No âmbito do autos de inventário instaurados por óbito de Maria …., que correram termos sob o nº 214/11.8T2MFR, em sede de conferência de interessados realizada em 07/12/12, foi requerida a cumulação de inventários por óbito de Fernando ….., o que foi deferido. - Na mesma data efectuou-se a partilha de bens, acordando todos os interessados, incluindo a A. e o 2º R., na venda extra-judicial da verba nº1, repartindo os interessados o montante obtido na proporção dos seus quinhões, adjudicação da verba nº2 (aqui descrita) à ora A. e adjudicação de todos os bens e direitos do inventariado Fernando … à sua filha Maria ….., que por sua declarou pagar as tornas devidas, à ora A., mediante a dação em pagamento da sua parte na verba nº2, mais declarando todos os interessados que já tinham recebido tornas em mãos. - Com data de 28/01/13 por Maria …. foi remetida carta ao Agente de Execução, informando que “no âmbito de Inventário que correu termos na Comarca da Grande Lisboa – Noroeste, Mafra-Juízo de Média e Pequena Instância Cível, com o processo nº 214/11.8T2MFR, os bens pertencentes à herança por óbito do referido Fernando ….. lhe foram todos adjudicados, não existindo outros bens a partilhar.” * Assente a matéria fáctica a considerar, passemos à análise das considerações de direito elencadas pelo autor, ora recorrente. * FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Funda o recorrente a sua discordância relativamente à decisão objecto de recurso, por considerar que os actos de disposição (incluindo a partilha) posteriores à penhora do direito do executado à herança deixada por óbito de Fernando …….., são inoponíveis à execução. Considera assim que a decisão recorrida deveria ter considerado que o direito da ora Recorrente é anterior ao direito reclamado pela Autora e, portanto, com prioridade sobre a aquisição da A., constituída e registada posteriormente – art. 5ºdo CRP, pelo que, a alienação posterior efectuada pelo 2º Réu do seu quinhão na herança, no âmbito do inventário, não é susceptível de afectar a penhora a favor da 1ªRé, Recorrente (art. 819º do CC) e assim, quando a penhora foi efectuada a favor da Recorrente, o direito e acção da quota do 2ºRéu na herança aberta por óbito de Fernando …. ainda permanecia na sua esfera jurídica. Decidindo b) Se a adjudicação de imóvel à A., em sede de inventário aberto para partilha da herança deixada por óbito de Fernando …..é inoponível à execução na qual se efectuou a penhora do direito e acção da quota do Réu C nessa herança; A respeito da penhora do direito do executado a herança indivisa, dispõe o artº 862 do C.P.C. (na versão anterior à Lei 41/2013) que “1 - Se a penhora tiver por objecto quinhão em património autónomo ou direito a bem indiviso não sujeito a registo, a diligência consiste unicamente na notificação do facto ao administrador dos bens, se o houver, e aos contitulares, com a expressa advertência de que o direito do executado fica à ordem do agente de execução, desde a data da primeira notificação efectuada.” Por sua vez, dispõe o artº 819 do C.C. que, “Sem prejuízo das regras do registo, são inoponíveis em relação à execução os actos de disposição, oneração ou arrendamento dos bens penhorados.” Decorre do teor destes preceitos acima citados que, a penhora do direito do executado a herança indivisa, como penhora de um direito que é, não está sujeito a registo, ainda que nessa herança se integrem bens imóveis ou móveis sujeitos a registo e, que “são ineficazes (art. 819.º do CC) em relação ao exequente os atos de disposição, designadamente a partilha, pois, se assim não fosse, o exequente poderia ser prejudicado por partilha que atribuísse ao executado bens de fácil ocultação ou dissipação ou de valor inferior ao direito penhorado.” [2] Assim, a partilha de herança indivisa representa um acto de disposição do direito penhorado, substituindo-o por bens certos e determinados que, nessa medida, é ineficaz perante a execução. Como refere Vaz Serra, " se são ineficazes, em relação ao exequente, os atos de disposição ou oneração de bens materiais penhorados, são, pelo mesmo motivo, ineficazes, em relação ao exequente, os atos de disposição ou oneração de direitos penhorados" e " a divisão ou partilha de herança indivisa, da qual estiver penhorada uma quota-parte - uma quota hereditária - , representa um ato de disposição do direito penhorado, ato que tem por efeito a substituição desse direito por bens determinados ou a sua integração ou concretização em bens determinados: substituição, integração ou concretização que, podendo prejudicar o exequente, é ineficaz em relação a este, salvo se nela assentir ou nela intervier" (R.L.J., Ano 109.º, pág. 176). Posto isto, dos factos dados como assentes resultou que o direito do 2º R. na herança aberta por óbito de Fernando …. foi penhorado em 26/11/12, por auto elaborado pelo Agente de Execução, tendo nessa ocasião sido notificado desta penhora a cabeça-de-casal, que veio, mediante comunicação de 10/12/12, informar a identificação dos demais herdeiros (de Fernando ……), sendo estes após notificados conforme decorre dos factos dados como assentes, não se sabendo as datas destas notificações, porque não constantes dos autos. Posto isto, as notificações aos demais contitulares/herdeiros são efectuadas com a advertência de que o direito do executado fica à ordem do agente de execução, desde a data da primeira notificação efectuada, ou seja desde 26/11/12, data em que foi notificado o cabeça-de-casal (sendo irrelevante para este circunspecto a data em que operaram as demais notificações). Daqui decorre que: -a penhora do direito do executado à herança não está sujeita a registo e a sua validade e eficácia não depende da realização deste registo; -o direito do executado a esta herança indivisa fica à ordem do agente de execução, desde a data da primeira notificação expedida ao administrador dos bens/cabeça-de-casal; -a partilha subsequente a esta penhora é ineficaz perante o exequente, por constituir um acto de disposição do direito do executado. Recorde-se que a exequente adquiriu, pela penhora da quota hereditária, o direito de ser paga com preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior – artº 822º, do CC., mediante adjudicação do bem penhorado, pela consignação dos seus rendimentos ou pelo produto da respectiva venda – artº 872º, CPC, (actual 795º.) Não por qualquer outro, seu sucedâneo.[3] Nesta medida, não se acompanha a sentença recorrida quando refere que “desde 07.12.2012 a A. é a exclusiva proprietária do imóvel em referência, operando integralmente o que dispõe o artigo 2119.º do Cód. Civil, a saber, que a impetrante tem de se considerar sucessora única do bem em apreço desde a data da abertura das sucessões. E também se conclui, de forma mais determinante para a solução dos autos, que nessa data foi posto termo à comunhão hereditária em que se encontravam a A., e o 2.º R., bem como os demais interessados no inventário, por partilha dos acervos hereditários referidos, independentemente do conteúdo dessa partilha. Do que resulta que, quando foi inscrita registalmente a penhora a favor da 1.ª R. do direito e acção da quota do 2.º R. na herança aberta por óbito de Fernando ……., a saber, em 19.03.2013, esse direito já não se inscrevia nem esfera jurídica do demandado, nem em qualquer outra, tendo mesmo desaparecido do ordenamento jurídico, tornando assim a penhora decretada e registada nula e de nenhum efeito, nos termos do n.º 1 do artigo 280.º do Cód. Civil: por virtude da inexistência/impossibilidade legal do direito penhorado. Explicando, o direito em apreço extinguiu-se com a partilha realizada, não existindo assim na ordem jurídica de molde a poder sequer permitir aquilatar-se da aplicabilidade do artigo 291.º do Cód. Civil – que, naturalmente, se refere a direitos que existem por terem objecto (mediato), por conferirem uma permissão normativa de actuação sobre determinado quid relevante juridicamente, pese embora não pertençam ao transmitente do mesmo ao terceiro de Boa Fé que, pelo regime ali consignado é protegido dos efeitos da eventual anulação ou nulidade do negócio jurídico que fundou a aquisição do transmitente – promovendo assim a aquisição pelo referido terceiro da titularidade dessa permissão normativa, desse direito, pese embora a inexistência do mesmo na esfera de quem lho transmitiu. Sucede que na presente situação, o direito simplesmente deixou de ter existência na ordem jurídica por via do desaparecimento do quid que constituía o objecto imediato do mesmo, a saber, repisa-se, o quinhão hereditário da titularidade do aqui 2.º R..” A entender-se como refere a decisão recorrida que, com a partilha, o direito deixa de ter existência na ordem jurídica, sendo a A. sucessora única do bem desde a data da abertura da sucessão (ou sucessões à qual concorre), estaria sempre inviabilizada a penhora deste direito que, de acordo com a tese da sentença recorrida, se extinguiria com a partilha e sem que o exequente a tal pudesse obstar, sujeitando-se pelo contrário, a ver desaparecer todos os bens que integravam a herança indivisa, mediante a atribuição de tornas facilmente dissipáveis (ou bens de valor inferior) ao executado. Denote-se, que apenas em 07/12/12 foi requerido no Inventário inicialmente aberto por óbito de Maria ……, a cumulação de inventários, agora por óbito de Fernando ….., por coincidirem parcialmente os interessados e os bens a partilhar, o que foi deferido nesse acto, sendo cabeça-de-casal de ambos os inventários cumulados, Emília …… . Igualmente nessa data foi efectuada a partilha, da qual resultou a decisão de venda extra-judicial da verba nº1, repartindo os interessados o montante obtido na proporção dos seus quinhões, adjudicação da verba nº2 à ora A. e adjudicação de todos os bens e direitos do inventariado Fernando ….. à sua filha Maria ….., que por sua vez declarou pagar tornas à ora A. mediante a dação em pagamento da sua parte na verba nº2, mais declarando todos que tinham recebido tornas em mãos. Ora, como referem Pires de Lima e Antunes Varela[4], acerca da natureza jurídica da partilha, “ter a partilha eficácia retroactiva é uma coisa – que basta, aliás, para condenar a ideia (de raiz romanista) de que é só com a partilha que nasce o direito do herdeiro sobre a coisa hereditária. Outra coisa, muito diferente, é a partilha possuir um efeito puramente declarativo ou recognitivo, como se o direito exclusivo do herdeiro sobre a coisa certa e determinada da herança existisse desde o momento da morte do de cujus. E não é assim. Duas coisas são inegáveis a propósito da partilha. Por um lado, o direito do herdeiro sobre a herança existe desde o momento da abertura dela – não nasce apenas no momento da partilha. Por outro lado, se não é um negócio atributivo ou constitutivo, também é certo que a partilha não constitui um puro acto declarativo ou recognitivo, pois se trata de um verdadeiro acto modificativo ou de conversão. A partilha converte os vários direitos a uma simples quota (indeterminada) de um todo (determinado) em direito exclusivo a uma parcela determinada do todo.” Mediante esta partilha, o quinhão hereditário do executado 2º R., foi convertido em tornas alegadamente já recebidas, em montante que se desconhece e que de todo é ineficaz face à execução, porque constitui um acto de disposição do seu direito que lhe não era lícito realizar. Posto isto, invoca ainda a decisão sob recurso que esta penhora não se teria efectuado validamente porque “se se entendesse que a partilha se realizou em momento posterior à inscrição registal, o que só por hipótese se equaciona, não se pode deixar de considerar que foi ilidida a presunção de que aquela penhora foi realizada em conformidade com o que dispõe o artigo 781.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil. Na verdade, como afirma Rui Pinto, a penhora dos bens ali identificados, a saber, a que tiver por objecto quinhão em património autónomo ou direito a bem indiviso, é constituída não só pela inscrição no registo predial mas também pela sua notificação a todos os contitulares do direito ou quinhão. Sucede que o Sr. Agente de Execução somente procedeu à notificação dos sucessores Fernando ….., não tendo atentado que na certidão do registo predial, e por tal com o valor de presunção nos termos do artigo 7.º do Cód. Reg. Predial, a aqui A. constava como contitular do direito, nos termos da apresentação discriminada na alínea c) do ponto 4. do julgamento de facto. Donde, não bastando apenas o registo nem apenas a notificação, Em concreto a presunção resultante da inscrição registal de que a penhora teve lugar valerá enquanto não se demonstrar que houve falta daquela notificação2. O que, de resto faz todo o sentido, dado que, omitindo-se as notificações devidas, coarcta-se o direito dos contitulares procederem nos termos previstos nos n.ºs 2 a 4 do artigo 781.º do Cód. Proc. Civil.” Igualmente não se acompanha este entendimento, expresso na decisão recorrida. A penhora em apreço foi efectuada pelo Sr. Agente de Execução em 26/11/12, numa execução instaurada em 2008, pelo que se aplicam as disposições vigentes à data da penhora, sendo que nessa ocasião, ainda não estava em vigor o NCPC, introduzido pela Lei 41/2013. Assim, a esta execução aplicam-se as disposições constantes do anterior código de processo civil, com as alterações introduzidas pelo D.L. 226/2008 de 20/11, sem prejuízo da aplicabilidade da lei 41/2013, aos demais termos da acção executiva, que se verificaram, ou se venham a verificar na sua pendência, nos termos e com as excepções previstas no artº 6 nº 3 do seu regime transitório. Nessa ocasião, era pois aplicável o disposto no artº 863 e 862 do anterior C.P.C., conforme já acima referido, não se vislumbrando que o registo da penhora do direito, seja condição de eficácia desta penhora, nem resulta, quer da anterior disposição, quer do actual artº 781 do NCPC (que mantém a mesma redacção do artº 862), tal exigência. Nestes termos, a penhora efectiva-se mediante notificação ao administrador dos bens, se o houver (ou seja ao cabeça-de-casal) e aos demais contitulares do direito (à herança indivisa de Fernando João ……, ou seja os seus herdeiros), sendo certo que identificando o cabeça-de-casal os contitulares deste direito, nele não se incluindo a A. que intervinha no inventário por óbito de Maria ……, eram estes contitulares que teriam de ser notificados, ficando este direito à ordem do Agente de Execução, desde a data da primeira notificação (e não desde a data da última), que ocorreu em 26/11/12. Não é igualmente, conforme acima se referiu, o registo, condição de eficácia ou constitutivo desta penhora, pois que “ainda que do quinhão penhorado façam parte imóveis, móveis ou direitos, sujeitos a registo, tal penhora não se encontra sujeita a registo, no sentido em que tal registo não é necessário à sua oponibilidade perante terceiros, por não se concretizar em bens certos e determinados, integrando assim a exceção consagrada na al. c), do nº2, do artigo 5º do Código de Registo Predial.”[5] O que não significa, (cfr anotação ao Ac. acima referido) que, “não seja registável, nada obstando a que, uma vez penhorado o direito do executado a determinada herança indivisa ou a meação em comunhão conjugal dissolvida, se proceda à sua inscrição no registo relativamente a cada um dos bens imóveis que dela fazem parte. Tal registo encontra o seu fundamento no artigo 101º, nº1, al. e), do Código de Registo Predial. Ao prescrever que é por averbamento à respetiva inscrição que se faz “o registo da penhora que tenha por objeto o direito de algum ou alguns dos titulares da inscrição de bens integrados em herança indivisa”, está-se a contemplar a genérica registabilidade dos factos jurídicos atinentes à quota-parte que cada herdeiro possua na herança – neste sentido, Parecer do IRN, Pº nº R.P. 52/2010 SJC-CT.[6] Não é condição de eficácia pois que a penhora de um direito, não se confunde com a penhora de uma quota ou quinhão em bem certo e determinável, sendo os contitulares referidos, os contitulares do direito e não dos bens que se integrem neste direito (cfr. parece entender a decisão recorrida), uma vez que, o titular do direito a herança ilíquida e indivisa, antes de se realizar a partilha não tem qualquer “direito real sobre os bens em concreto da herança, nem sequer sobre uma quota parte em cada um deles”; o que tem é um “direito de quinhão hereditário, ou seja, à respectiva quota parte ideal da herança global em si mesma.”[7] Com efeito, “o quinhão hereditário – rectius, os factos ou situações jurídicas que o tomem por objeto (cfr. artigo 2124.º e seguintes do CC), incluindo a primitiva aquisição dele a favor do herdeiro, por aceitação da herança – não é, nem pode ser, “coisa” sujeita a registo, entendida a expressão no sentido de que precisem tais factos da sua publicidade para se tornarem oponíveis diante de terceiros, e é precisamente por isso que não se concretiza, o quinhão, em bens certos e determinados, de acordo com a alínea c) do n.º 2 do artigo 5.º do CRPredial. O quinhão é-o do património autónomo, correspondente à herança na complexa, dinâmica e fluida multiplicidade dos seus elementos. De acordo com MOTA PINTO: “o caso mais nítido e claro de património autónomo no direito privado português é a herança”. Prevê a alínea e) do n.º 1 do artigo 101.º do CRPredial, que é por averbamento à respetiva inscrição de aquisição em comum e sem determinação de parte ou direito (artigo 49.º do CRPredial), que se faz o registo da penhora que tenha por objeto o direito de algum ou alguns dos titulares da inscrição de bens integrados em herança indivisa, pelo que, está evidentemente, contemplada a genérica registabilidade dos factos jurídicos atinentes à quota-parte que cada herdeiro possua na herança. Ainda de acordo com o citado parecer Pº RP 148/2009 SJC-CT, que apesar desse registo poder ser feito, o mesmo não é condição de eficácia do facto perante terceiros. A publicidade daí resultante é meramente enunciativa: o registo informa, divulga, dá notícia do facto e nada mais.”[8] Neste sentido, os atos de disposição ou oneração dos bens penhorados não são oponíveis ao exequente mas, para além disso “nenhum motivo existe para que se lhes negue eficácia”, constituindo uma consequência meramente adjetiva derivada do registo, que não destrói (apenas condiciona) a essência substantiva do direito. A inequívoca opção pelo interesse prevalecente do exequente, permite que se conclua que, como ato quase liminar de tudo o mais, o registo da penhora é uma consequência da oponibilidade que resulta do disposto no supra referido artigo 819.º do CC.[9] De resto, não se está sequer a penhorar uma quota-parte de determinado bem da herança, nem de quota ou quinhão em bem indiviso. Conforme refere Rui Pinto[10] “uma coisa é a penhora de parte em património autónomo ou universalidade – bens comuns, herança – onde caibam bens imóveis, outra coisa é a penhora de bens imóveis em compropriedade. Na verdade, é só no primeiro caso que não há lugar a registo, porquanto o que é penhorado é a parte no direito à universalidade, e não as quotas-partes nos direitos que a compõem, não se conhecendo se virão a calhar ao executado imóveis ou móveis sujeitos a registo (…)” Prossegue ainda Rui Pinto “Sendo a (…) partilha pedida pelo executado decorrerá do art. 819º CC a ineficácia da (…) partilha: a extinção da quota ou quinhão, ainda que por novos bens, é um acto extintivo da posição real inicial, logo está-lhe vedado. Sendo pedido pelos demais contitulares, dir-se-ia ser oponível já que literalmente o artº 820º segunda parte CC (…) apenas se aplica aos créditos. Mas essa é uma resposta formal, pois toleraria a fraude entre executados e contitulares. Por isso, o preceito, também se lhes aplica, sendo ineficazes os actos dispositivos dos terceiros contitulares.” (obra cit., pág. 658). Assim, penhorado este direito em 26/11/12, não tendo sido invocada sequer a invalidade das notificações, ou anulada a penhora nos autos de execução, a requerimento de qualquer dos nele intervenientes ou interessados directos nessa arguição, não é lícito ao juiz “ad quo” considerar que tal penhora se não realizou ou que não foi feita em conformidade com o disposto no artº 781 do NCPC[11], por sanada a irregularidade cometida. De resto, recorde-se, a penhora incide sobre o direito e acção à herança indivisa e não sobre os bens que a compõem, caso em que se estaria a penhorar um bem de terceiro que, com esse fundamento poderia vir a deduzir embargos de terceiro. Nesta medida procede o recurso interposto pela 1ª R., sendo assim os actos de disposição tomados pelos interessados em 07/12/12, de partilha dos bens deixados por óbito de Fernando ….., inoponíveis à execução instaurada contra o 2ºRéu, C , mantendo-se assim a penhora e respectiva inscrição sobre o direito e acção da quota deste R. na herança aberta por óbito do referido Fernando …., absolvendo-se os RR. do pedido formulado pela A.[12] * DECISÃO Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente a apelação, pelo que: -alteram a matéria de facto adquirida pelo tribunal recorrido; -revogam a decisão recorrida, absolvendo os RR. dos pedidos formulados nos autos pela A. Custas pela apelada, por ter decaído totalmente na acção e no recurso (artº 527 do C.P.C.). Lisboa 11/04/19 Cristina Neves Manuel Rodrigues Ana Paula A.A. Carvalho [1] Ac. STJ de 01.10.2015, P. 824/11.3TTLRS.L1.S1, Ana Luísa Geraldes; Ac. STJ de 14.01.2016, P. n.º 326/14.6TTCBR.C1.S1, Mário Belo Morgado; Ac. STJ de 11.02.2016, P. n.º 157/12.8TUGMR.G1.S1, Mário Belo Morgado; Ac. STJ, datado de 19/2/2015, P. nº 299/05, Tomé Gomes; Ac. STJ de 22.09.2015, P. 29/12.6TBFAF.G1.S1, 6ª Secção, Pinto de Almeida; Ac. STJ, datado de 29/09/2015, P. nº 233/09, Lopes do Rego; Acórdão de 31.5.2016, Garcia Calejo, 1572/12; Acórdão de 11.4.2016, Ana Luísa Geraldes, 449/410; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27.1.2015, Clara Sottomayor, 1060/07. [2] Ac. do STJ de 29/05/12, relator Salazar Casanova, proferido no proc. nº 1718/03.1TBILH.C1.S1; no mesmo sentido vidé Ac. do STJ de 30/03/06, relator Pereira da Silva, proferido no Proc. nº 05B3646, ambos disponíveis para consulta in www.dgsi.pt e Acórdãos da R.P. de 13-05-2003, relator Cândido Pelágio Castro Lemos, proc. 0322275, e de 27-04-2004, relator Emídio Costa, proc. 0421355, igualmente disponíveis in www.dgsi.pt. [3] Neste sentido vidé A.R.P. de 29/01/15, relator José Amaral, Proc. nº 164/03.1TABGC-C.G1.P1, disponível para consulta in www.dgsi.pt [4] Código Civil Anotado, volume VI, página 196. [5] Ac. do TRC de 28/06/17, relatora Maria João Areias, proferido no Proc. nº 947/15.0T8CBR-B.C1, disponível para consulta in www.dgsi.pt ; [6] Vidé ainda parecer emitido no RP 148/2009 SJC/CT, e parecer no RP 21/2013 SJC/CC, todos disponíveis in site do Instituto de Registo e Notariado. Consta deste último parecer que “o acto de registo se fará com base na comprovação da referida notificação, ou, alternativamente, com base na declaração do agente de execução de que tal notificação ocorreu em certa data.” [7] R. Capelo de Sousa, in Lições de Direito das Sucessões, Vol. II, 2ª edição, pág. 90. [8] A penhora e os seus Efeitos Registais, mestrado de Ana Luísa Matos Morim da Silva, IPP/2003, págs. 48 e 49 [9] Pires de Lima e Antunes Varela, – Código Civil Anotado. 4ª Edição Reimpressão. Coimbra Editora, 2010, vol. II, comentário ao artigo 819.º [10] In Manual da Execução e Despejo, Coimbra Editora, págs. 656 (nota 1705). [11] Denote-se que, como se observa in Ac. R.L de 21/04/05, relator Moreira Camilo, Proc. nº 2152/2005-8 “A falta de notificação dos co-herdeiros prevista no art. 862º nº 1 do Cód. de Proc. Civil, na penhora de um direito e acção à respectiva herança, equipara-se à falta de citação que tem de ser arguida quando os co-herdeiros intervierem na acção, sob pena de se considerar a nulidade respectiva sanada, nos termos do art. 196º do citado código.” [12] Não estando afectada por este meio a sucessão e partilha dos bens deixados por óbito de Maria Vitória Baptista Neto. |