Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ANTÓNIO SANTOS | ||
Descritores: | CONTRATO DE ARRENDAMENTO PAGAMENTO DE RENDAS CONSIGNAÇÃO EM DEPÓSITO MOEDA CORRENTE | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/08/2020 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | .1 – A consignação em depósito, com vista à extinção da obrigação , é facultativa, pressupondo porém enquanto expediente capaz de liberar de forma definitiva, o devedor, da verificação de uma situação prevista nas alíneas a) e b), do artº 841º, do CC .2. - Na dúvida, a consignação em depósito funciona em favor debitoris, ou seja, “ Basta que a situação de impossibilidade ou de incerteza seja plausível, em termos objectivos ou sempre que, dadas as circunstâncias, ela não possa deixar de se impor ao espírito do devedor, para que a consignação seja possível”; .3. – Apesar de constar de contrato de arrendamento outorgado em 1939 que a renda é paga “em casa da senhoria, ou de quem a representar, em moeda corrente e sempre antecipadamente no primeiro dia útil do mês anterior àquela a que disser respeito, é de admitir a consignação em depósito pelo inquilino de rendas e indemnização quando em causa está uma quantia total superior a 8.000,00€ e ,em tempo útil, não fornece a senhoria ao inquilino o NIB para efeitos de transferência bancária/depósito ; .4. – A justificar o referido em .3., recorda-se ainda que com a Lei nº 92/2017, de 22/8, passou o artº 63º-E, da Lei Geral Tributária, a dispor no seu nº 1, que “ É proibido pagar ou receber em numerário em transações de qualquer natureza que envolvam montantes iguais ou superiores a (euro) 3 000, ou o seu equivalente. em moeda estrangeira”. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na 6ª Secção CÍVEL do Tribunal da Relação de LISBOA 1. - Relatório A [ ….& FILHOS,S.A] . instaurou – em 8/2/2019 - a presente acção especial de consignação de depósito contra B [ ANA …..] , peticionando que sendo a mesma julgada provada e procedente, seja admitida a consignação que efectuada junto da Caixa Geral de Depósitos no valor de €8.325,00, referente às rendas de Janeiro de 2013 a Fevereiro de 2019 acrescido de 50% de indemnização da quantia devida. 1.1 - Para tanto aduziu a requente, em síntese, que : - Em 27 de Setembro de 1939 foi celebrado um contrato de arrendamento referente à loja sita nos números 115 e 117 ( Loja 1) da Rua da Prata a números .. e … da Rua de São Nicolau, com entrada pelo número … da Rua da Prata e a 26 de Novembro de 1954 um contrato de arrendamento referente à loja sita no número …. ( Loja 2 ), do prédio urbano inscrito na matriz da freguesia de São Nicolau sob o artigo XX; - Já em 4 de Julho de 1983 foi celebrado entre a Autora e Mário …. e mulher, Maria …., um contrato de trespasse, que teve como objecto as Lojas 1 e 2, transmitindo-se então para a autora a posição contratual do arrendamento , passando consequentemente a ser a arrendatária das Lojas identificadas supra; - Por sua vez, desde 5 de Junho de 2018 que a Ré é dona e legitima proprietária da fracção autónoma onde se mostram instaladas as Lojas 1 e 2, , situação que apenas chegou ao conhecimento da autora a 10 de Janeiro de 2019 ; - Sendo o montante da renda mensal das Lojas 1 e 2 do valor de € 75,00, ocorre que apenas liquidou a Autora as rendas até Dezembro de 2012, e isto porque perante as sucessivas aquisições do imóvel das lojas locadas nunca logrou apurar quem era o respectivo proprietário e, consequentemente, a quem deveria pagar as rendas; - O aludido desconhecimento apenas cessou quando a 10 de Janeiro de 2019, veio a Autora a tomar conhecimento de Notificação Judicial Avulsa apresentada pela ora Ré e que lhe comunicava a resolução dos contratos de arrendamento referentes à Loja 1 e 2 , por falta de pagamento da renda, e que a dívida resultante da falta de pagamento das rendas vencidas, acrescidas de juros de mora à taxa legal em vigor, correspondia ao montante total de € 6.638,58 , sendo € 4.500,00 referente às rendas vencidas e não pagas e € 2.138,58 aos juros de mora vencidos; - Ocorre que, pretendendo a Autora fazer cessar a mora e obstar aos efeitos da resolução [ mediante o pagamento das rendas vencidas acrescido de indemnização igual a 50% da quantia devida ], solicitou à Ré que informasse o IBAN para o qual deveria ser transferida a quantia de € 6.975,00, respeitantes às rendas em dívida relativas a Janeiro de 2013 a Janeiro de 2019, acrescido de indemnização igual a 50% da quantia devida, mas, não obstante as diversas tentativas efectuadas para que a Ré informasse o IBAN para onde deveria ser transferida a quantia em causa, não veio a Ré, até à data, a fornecer tal informação. - Perante o exposto, e na qualidade de arrendatária, não tem assim a autora outra opção senão avançar com a consignação em depósito, em conformidade com os preceitos previstos no n.º 2 do art. 1042.º e n.º 1 do art. 1048.º do C.C., libertando-se, deste modo, das consequências prejudiciais que possam advir da circunstância de ainda não ter cumprido a prestação e , porque se encontram verificados os pressupostos para a consignação em depósito, deve a mesma ser aceite. 1.2 – Citada a Ré [ nos termos do artº 917º, do CPC ], veio a mesma apresentar contestação, deduzindo oposição no essencial por impugnação [ alem de deduzir concomitantemente um pedido reconvencional ] , alegando estar-se perante uma consignação em depósito que (i) não foi efectuada nos termos do artigo 916.º do C.P.C., (ii) assenta em motivos inexactos e (iii) a não foi comunicada pela Autora à Ré em clara violação do disposto nos artigos 1084.º, n.º 3, do C.C. e artigo 19.º do Novo Regime do Arrendamento Urbano (“NRAU”) , logo, pugna para que a final seja ; (i) a acção julgada improcedente por preterição dos pressupostos estabelecidos no artigo 916.º do C.P.C. ; caso assim não se entenda, (ii) a acção julgada improcedente, por não provada, declarando-se que a consignação efectuada pelo Autora não tem o efeito liberatório previsto no artigo 1084.º, n.º 3 do C.C. in fine ; Caso assim não se entenda e se admita a consignação realizada pela Autora como regularmente efectuada ao abrigo do artigo 916.º do C.P.C. e eficaz nos termos e para os efeitos do artigo 1084.º, n.º 3 do C.C. e artigo 19.º do NRAU , subsidiariamente, (iii) Seja declarada a caducidade dos contratos de arrendamento que servem de fundamento à presente acção, julgando-se improcedente a presente acção por falta de objecto. 1.3. – Após resposta da Autora à matéria de excepção pela ré invocada e indeferido liminarmente o pedido reconvencional, porque não admissível, foram de seguida as partes informadas que tencionava o tribunal conhecer de imediato do mérito da causa, razão porque se lhes facultou o prazo de 20 dias para a discussão de facto e de direito, nos termos do disposto no artigo 597.º do Código do Processo Civil em conjugação com o disposto no artigo 595.º, n.º 1, alínea b) do mesmo diploma, aplicável por força do disposto no artigo 920.º, n.º 1, do mesmo diploma. 1.4. – Conclusos de seguida os autos para eventual decisão , foi então proferido Saneador-Sentença, sendo o respectivo segmento decisório do seguinte Teor: Decisão: Pelo exposto, julga-se totalmente procedente esta acção e julgam-se validamente depositadas as rendas e indemnização devidas. Custas da acção pela ré. Notifique-se e Registe-se. Lisboa, 14 de Fevereiro de 2020. 1.5. - Notificada da decisão referida em 1.4. , atravessou de seguida nos autos de consignação em Depósito a requerida B instrumento de interposição da competente Apelação, acompanhado das devidas alegações, e aduzindo então as seguintes conclusões : A. A Sentença recorrida padece do vício de nulidade, por omissão de pronúncia e falta de fundamentação nos termos dos artigos 197.º, 615.º, n.º 1, alínea b) e d) e n.º 4, e 617.º, todos do CPC e artigo 205.º, n.º 1 da CRP. B. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre a (i) o uso dado pela Autora à acção especial de consignação judicial de depósito/erro na forma de processo, (ii) a verificação dos pressupostos para a consignação, amplamente discutida pelas Partes ao longo de todo o processo, para além de não ter concretizado a verificação dos mesmos no que respeita ao caso concreto, (iii) quanto à verificação dos pressupostos da consignação em depósito (mora do credor), (iv) o modo e lugar de cumprimento do pagamento das rendas, (v) sobre o dever de comunicação da consignação plasmado no artigo 19.º do NRAU e especificadamente não se pronunciou de o mesmo não ter sido assegurado no prazo de 1 (um) mês – prazo previsto para se pôr termo à mora, cfr. disposto no artigo 1084.º, n.º 3 do C.C. e artigo 19.º do NRAU, (vi) sobre o efeito liberatório da consignação efectuada pela Autora, ora Recorrida, assim como (vii) não se pronunciou sobre única questão que identificou como questão a resolver: “A questão a resolver pelo Tribunal consiste na verificação dos pressupostos para a atribuição da indemnização peticionada”, sendo que estes factos constituem questões essenciais controversas face ao objecto dos presentes autos. C. Com efeito, o Tribunal a quo limitou-se por iniciar a sua bastante escassa e praticamente inexistente fundamentação de direito quanto aos pressupostos da consignação em depósito referindo simplesmente que “A circunstância de o pagamento dever ser feito na residência do locador não é de molde a tornar irregular o depósito da renda, salvo o devido respeito por opinião diversa”. D. De uma forma muito genérica e vaga, pouco centrada no caso concreto e nos factos que resultam do processo, o Tribunal a quo limitou-se por iniciar a sua bastante escassa e praticamente inexistente fundamentação de direito quanto ao dever de comunicação do depósito efectuado referindo simplesmente que “Quando a ré pretendeu efectivar a resolução do contrato de arrendamento, no procedimento especial de despejo n.º 1111/19.4YLPRT, na contestação, a ora Autora alega no artigo18.º e 19.º que instaurou esta acção e que tem estado a depositar as rendas, tendo junto cópia de guias de depósito, cumprindo desta forma o disposto no n.º 2, do artigo 19.º do RNAU. Por outro lado, anteriormente, a autora informou a ré da intenção de fazer cessar a mora, solicitando IBAN. Assim, inexiste qualquer falta de informação da ré”. E. O Tribunal desconsiderou por completo o facto de a presente acção especial de consignação judicial em depósito ter sido proposta apenas no dia 8 de Fevereiro, de a Autora não ter requerido a citação prévia da Ré, desta ter sido citada da presente acção apenas no dia 3 de maio de 2019, de a Autora não ter alegado ou feito prova que comunicou no prazo de 1 (um) mês o depósito efectuado, bem como o facto de a acção especial de despejo proposta pela Ré ter sido requerida no dia 29 de Abril de 2019 ( i.e. antes de a Ré ter conhecimento do depósito efectuado pela Autora junto da CGD ), os referidos factos não foram apreciados ou valorados na decisão tomada. F. Em conformidade, sem prejuízo da aplicação do disposto no artigo 617.º do CPC, não tendo tido estes factos sido apreciados, nem tomados em conta na decisão proferida, sendo que os mesmos constituem questões essenciais controversas face ao objecto dos presentes autos, a sentença padece do vício de nulidade, por omissão de pronúncia, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos197.º, 615.º, n.º 1, alínea d) e n.º 4, e 617.º do CPC, que expressamente se argui, devendo, com este fundamento, ser julgada verificada a invocada nulidade e, em consequência, deve a Sentença recorrida ser revogada G. O Tribunal a quo limitou-se a fazer uma síntese sobre (i) a qualificação dos contratos de locação, qualificando os contratos dos autos como contratos de arrendamento, (ii) o modo como os contratos de arrendamento de modo geral podem cessar, para depois referir e concluir, sem mais que “Em conformidade com o legalmente estabelecido, a autora depositou as rendas devidas, acrescidas da indemnização igual a 50% para fazer cessar a mora e tem depositado as rendas subsequentes, cf. Artigo 20.º NRAU”, H. No que à fundamentação diz respeito, optou o Tribunal a quo por se limitar e indicar em 5 (cinco) linhas a que o “ Tribunal fundou a sua convicção no conjunto da prova produzida nos autos, analisada conjugada e criticamente, segundo as regras da experiência comum e juízos de normalidade, designadamente: - No acordo obtido pelas partes nos articulados ([sem referir a que acordo se refere]) – Nos documentos juntos aos autos ([sem se referir a que documentos se refere])”. I. Para além de não analisar criticamente todas as provas produzidas, nem expor e explicar as ilações que tira dos factos instrumentais e/ou as razões que revelaram para a formação da sua convicção quanto aos factos que deu como provados. J. O Tribunal a quo não sustenta ou explica as regras da experiência comum e juízos de normalidade que terá aplicado ao caso concreto, sendo certo que é omisso quanto ao escrutínio do caso concreto, assim como é omisso quanto aos alegados factos obtidos por acordo e ou quanto à identificação dos documentos que motivaram a sua decisão. K. O Tribunal a quo limitou-se a apresentar uma motivação vaga e genérica do julgamento quanto à matéria de facto. L. Acresce que, afigura-se flagrante a ausência total de fundamentação, uma vez que a Sentença é de todo omissa relativamente aos factos que julgou não provados e à fundamentação de facto e de direito. M. A Sentença apenas lista os factos que foram julgados provados, e nenhum facto como não provado, apresentando uma inexistente motivação do julgamento quanto à matéria de facto, uma vez que não refere todos os factos controvertidos em discussão nos presentes autos e qual a sua motivação quanto às respostas de provados que deu àqueles poucos factos por si considerados. N. O Tribunal a quo não especificou, na Sentença, os fundamentos, quer de facto, quer de direito, que foram decisivos para a sua convicção e em que decidiu assentar a decisão que proferiu. O. Pelo exposto, a Sentença não podia ter sido proferida nos termos em que o foi. P. Face à ausência de fundamentação nos termos invocados da Sentença a mesma padece do vício de nulidade por omissão do dever de fundamentar em conformidade com o disposto nos artigos 197.º, 615.º, n.º 1, alínea b) e n.º 4, e 617.º do CPC e do artigo 205.º, n.º 1 da CRP, nulidade que expressamente se argui. Q. Em conformidade, sem prejuízo da aplicação do disposto no artigo 617.º do CPC, deve, com este fundamento, ser julgada verificada a invocada nulidade e, em consequência, deve a Sentença recorrida ser revogada. R. O Tribunal optou por dispensar a realização da audiência de julgamento, porquanto entendeu que “o estado do processo permite, sem necessidade de mais provas, conhecer do mérito da causa”. S. Sucede que, da motivação e/ou ausência dela, nomeadamente quanto aos factos não provados, resulta que afinal o estado do processo não permitia, sem necessidade de mais provas, conhecer do mérito da causa. T. Ao preterir a realização da audiência de julgamento, o Tribunal a quo coarctou o direito de defesa da Ré, direito fundamental reconhecido e expressamente previsto no artigo 20.º da CRP e no artigo 595.º, n.º 1 alínea b) do CPC. U. A Sentença não refere todos os factos controvertidos em discussão nos presentes autos. Face à factualidade vertida nos autos e à prova que foi permita carrear para a presente acção, o Tribunal a quo deveria ter incluído na decisão sobre a matéria de factos os seguintes: V. FACTOS PROVADOS os seguintes: Facto provado n.º 13: A renda mensal das Lojas 1 e 2 é de € 75,00 (setenta e cinco euros), facto assente por acordo; Facto provado n.º 14: A Autora liquidou as rendas apenas até Dezembro de 2012, facto assente por acordo; Facto provado n.º 15: Os contratos de arrendamento juntos aos autos, quanto ao modo de pagamento das rendas, dispõem que as mesmas deverão ser pagas “[…] nesta cidade, em casa da senhoria, ou de quem a representar, em moeda corrente, e sempre antecipadamente no primeiro dia útil do mês anterior aquele a que disser respeito”, conforme documento número 1 e 2 e confissão da Autora. A Autora não pôs em causa o teor e/ou a vigência da referida cláusula. Facto provado n.º 16: “ O pagamento da renda deveria, em cumprimento do mandato em vigor, ser feito junto do seu representante, neste caso concreto, junto dos seus advogados – facto provado por confissão da Autora, cfr. artigo cfr. artigo 22.º do requerimento apresentado a fls. […], com a referência do Citius n.º 33666908 e texto do contrato de arrendamento, também aceite por acordo pela Autora; Facto provado n.º 17: Entre 3 de Setembro 2010 e 25 de Julho de 2018 não ocorreu nenhuma venda sobre a fracção dos autos. No referido período a fracção esteve registada a favor da PRAINSA, conforme certidão do registo predial e caderneta predial juntas como documento números 4 e 5; Facto provado n.º 18: Após a Recepção da notificação judicial avulsa a Autora foi informada das moradas/contactos da Ré e dos seus legais representantes, conforme notificação judicial avulsa e missiva juntas como documentos números 7 e 8; Facto provado n.º 19: A Autora abandonou as lojas dos autos, tendo inclusive anunciado por meio de aviso o encerramento dos estabelecimentos comerciais que haviam sido objecto de trespasse, ou seja, a “FARMÁCIA ….” e da “PERFUMARIA ……” – facto admitido por acordo. Facto provado n.º 20: Em Julho de 2018, as lojas voltaram a ser ocupadas não para desenvolvimento da actividade dos referidos estabelecimentos comerciais, mas antes de uma parafarmácia – facto admitido por acordo. W. FACTOS NÃO PROVADOS [ sobre os quais a Sentença é totalmente omissa] os seguintes: Facto não provado n.º 1: “ Não obstante as diversas tentativas da Autora para que a Ré informasse o IBAN para onde deveria ser transferida a quantia em causa, a mesma, até à data não logrou fornecer essa informação”. Facto não provado n.º 2: “ A Ré recusou-se a receber as rendas em atraso e a indemnização igual a 50% do que for devido”. X. Com efeito, a Autora não logrou juntar qualquer documento do qual resultasse que a Ré tenha recusado receber as rendas nos termos e conforme disposto nos contratos de arrendamento. Para além do documento 7, a Autora não logrou juntar qualquer outro documento do qual conste a referida matéria. Y. Daqui resulta, que os contratos dos autos quanto ao modo e local de pagamento das rendas não foram considerados pelo Tribunal a quo. Z. Nem foi proferida qualquer decisão a este respeito, já que em lugar algum da Sentença se refere este tema. AA. Não tendo de igual modo sido proferida qualquer decisão quanto à não verificação dos pressupostos da consignação de depósito e consequente efeito liberatório. BB. Todos esses factos constituíram matéria controvertida nos autos. No entanto, e apesar de alguns deles terem resultado, sem qualquer dúvida, provados, foram totalmente ignorados pelo Tribunal a quo na Sentença. CC. Face a todo o exposto, deveria o Tribunal a quo ter tomado posição sobre a verificação dos pressupostos da consignação em depósito e a alegada mora do credor, merecendo o referido tema de prova ter uma resposta de não provado. DD. Sem conceder, e tendo o Tribunal constatado que afinal não estava em condições de conhecer de imediato do mérito da causa deveriam os presentes autos ter prosseguido para a fase de audiência de discussão e julgamento, como é de direito e da mais elementar justiça! EE. Não se compreende por isso, nem se pode admitir, que o Tribunal a quo tenha, como é referido em sede de motivação, que “ fundou a sua convicção no conjunto da prova produzida nos autos, analisada conjuntamente e criticamente, segundo as regras da experiência comum e juízos de normalidade, designadamente: no acordo obtido pelas partes nos articulados e nos documentos juntos aos autos”. FF. O Tribunal a quo proferiu a Sentença sem qualquer justificação ou base factual para os factos não provados – os quais foram total e grosseiramente preteridos! GG. Ainda quanto á decisão sobre a matéria de facto, a resposta dada ao ponto 12 dos factos provados também não está correta/precisa, devendo, por isso, ser alterada, devendo se especificar as datas em que o procedimento especial de despejo foi requerido pela Ré e a contestação/oposição nele deduzida apresentada, respectivamente os dias 29 de Abril de 2019, e 3 de Junho de 2019. HH. Desta forma o ponto n.º 12 dos factos provados deverá passar a ter a seguinte redacção: Facto provado n.º 12: No procedimento especial de despejo n.º 1111/19.4YLPRT, requerido pela Ré no dia 29 de Abril de 2019, é referido pela Autora, na oposição apresentada a 3 de Junho de 2019, no art. 18 e 19.º a instauração desta acção e que tem estado a depositar as rendas, juntando cópia de guias de depósito, a fls. 53 e ss. II. Assim, pelas razões expendidas ao longo das presentes alegações e, sobretudo, conforme resultou claro dos factos constantes dos autos, deve, assim, ser alterada a decisão recorrida, nos termos e com os fundamentos referidos. JJ. Acresce que, a Sentença enferma igualmente de erro na aplicação do direito aos factos. KK. As cláusulas contratuais dos contratos de arrendamento dos autos [modo e local de pagamento da renda], bem como as normas legais relativas à consignação em depósito, nomeadamente, os artigos 916.º e seguintes do CPC, artigos 841.º e 1084.º, n.º 3 do CC e artigo 19.º do NRAU foram erradamente aplicadas, dando origem a uma Sentença ilegal e contrária à lei. LL. Com a presente consignação em depósito a Ré pretende demonstrar que cumpriu atempadamente a obrigação a que estava adstrita – pagamento das rendas e penalização devida no âmbito dos contratos de arrendamento dos autos – e, consequentemente, beneficiar do efeito liberatório subjacente à consignação em depósito, pondo termo à respectiva mora e à obrigação de entregar a fracção locada na sequência da resolução do contrato efectivada pela Autora por meio da notificação judicial avulsa junta aos autos. MM. Sucede que, a Recorrida lançou mão da acção de consignação de depósito judicial, sem, contudo, ter procedido em conformidade com o disposto nos artigos 916.º e seguintes do CPC. A Recorrida lançou mão da acção de consignação de depósito judicial quando na verdade pretendia obter o reconhecimento judicial/ declaração de existência de um depósito autónomo que efectuou junto da CGD e consequente direito. NN. O erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz, determinando que se sigam os termos processuais adequados, cfr. artigo 193.º do CPC. A falta de pronúncia do Tribunal sobre a referida nulidade, viola consequentemente, o disposto nos artigos 10.º, n.º 3, alínea a), 916.º e seguintes e 193.º, todos do CPC, enfermando a Sentença do vício de nulidade, por omissão de pronúncia, em conformidade com o disposto nos artigos 197.º, 615.º, n.º 1, alínea b) e d) e n.º 4, e 617.º, todos do CPC e artigo 205.º, n.º 1 da CRP. OO. Sem conceder, a Recorrida fundamenta o seu alegado direito alegando que a Ré está em mora – i.e. não quis receber a prestação reclamada em sede de notificação judicial avulsa, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 841.º, n.º 1, alínea b) e 813.º do CC. PP. De acordo com o disposto no número 1 do artigo 841.º do C.C.: “O devedor pode livrar-se da obrigação mediante depósito da coisa devida, nos seguintes casos: Quando, sem culpa sua, não puder efectuar a prestação ou não puder fazê-lo com segurança, por qualquer motivo relacionado à pessoa do credor; Quando o credor estiver em mora” (negrito, itálico e sublinhado nossos). QQ. No caso sub judice, especificadamente, a Recorrida fundamenta a alegada recusa da Recorrente em receber as rendas no facto desta última alegadamente não ter disponibilizado o seu IBAN. Sucede que, não tem razão a Recorrida. RR. Não só não é verdade que a Recorrente se tenha recusado a receber as rendas como a prestar o IBAN (nenhuma prova foi feita nesse sentido), como com base na prova carreada para os autos e da confissão da Recorrida resulta que a mesma não carecia do IBAN para cumprir a obrigação a que estava adstrita. SS. Com efeito, conforme resulta do contratualmente estabelecido e aceite pela Recorrida, as rendas seriam pagas “[…] nesta cidade, em casa da senhoria, ou de quem a representar, em moeda corrente, e sempre antecipadamente no primeiro dia útil do mês anterior aquele a que disser respeito”. Não resulta dos contratos que o pagamento devesse ser efectuado por transferência bancária e/ou tal facto foi alegado pela Recorrida. Nos termos contratualizados, a recorrida deveria ter pago as rendas na casa da senhoria e/ou no escritório dos seus legais representantes, o que não fez. TT. Após ter recebido a notificação judicial avulsa dos autos – na qual consta a morada da Recorrente e dos seus legais representantes – a Recorrida ficou habilitada a pagar as rendas devidas nos termos contratualizados. UU. Acresce que, como confessado pela Recorrida: (i) “Corresponde à verdade que na sequência da recepção da notificação judicial avulsa foi remetida carta pela mandatária da Autora (a qual tinha os devidos poderes), à mandatária da Ré, no dia 01.02.2019, a qual também estava munida dos devidos poderes, conforme procuração forense junta à aludida notificação judicial avulsa, com o objectivo de pôr termo à resolução do contrato, mediante o pagamento das rendas pedidas e respectiva indemnização e (ii) tendo a Ré constituído mandatária judicial para que esta tratasse do assunto atinente ao arrendamento do imóvel que havia adquirido e nos termos do disposto no artigo 1157.º do CC, seria esta que estaria encarregado do assunto. VV. Em conformidade, prevendo-se nos contratos dos autos que as rendas seriam pagas “[…] nesta cidade, em casa da senhoria, ou de quem a representar, em moeda corrente, e sempre antecipadamente no primeiro dia útil do mês anterior aquele a que disser respeito” e a penalidade a aplicar é a que resulta da Lei, especificadamente no artigo 1042.º do CC, resulta claro que a Recorrida estava em condições de proceder à obrigação de pagamento das rendas devidas, acrescida da penalização devida, quer na casa da Recorrida, quer nos escritórios dos legais representantes da Ré, não o tendo feito. WW. A Recorrida incumpriu a obrigação a que estava vinculada nos termos dos contratos de arrendamento e ao abrigo dos artigos 1041, n.º 1 e 1084.º, nº 3 do CC por facto alheio à Ré. XX. Não tendo a Recorrida oferecido a prestação, no tempo e lugar devidos, não pode a mesma socorrer- se da alegada mora do credor – não há mora do credor no caso sub judice, nos termos do artigo 813.º do Código Civil, cfr. Acórdão prolatado pelo Supremo Tribunal de Justiça, de 28.05.1987, o qual se encontra disponível para consulta através do site da DGSI em www.dgsi.pt . YY. Termos em que se dá por demonstrado que a Recorrente não impediu a Recorrida de cumprir a obrigação a que estava vinculada – ou seja, que a Recorrente não estava em mora nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 841.º, n.º 1, alínea b) e 813.º do CC. ZZ. Do que se conclui que a Recorrida carece de causa justificativa que fundamente o recurso à consignação em depósito e, consequentemente, a consignação em depósito em apreço não tem eficácia liberatória. AAA. Ademais, o referido depósito não poderá ser declarado como tendo eficácia liberatória por violação do disposto no artigo 1084.º, n.º 3 do C.C. e 19.º do NRAU, porquanto a consignação efectuada pela Recorrida não foi comunicada à Recorrente após decorrido o prazo de 1 (um) mês estipulado no artigo 1084.º, n.º 3 do CC e no artigo 19.º do NRAU, nesse sentido veja-se o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, de 14.07.2011 e acórdão prolatado pelo Tribunal da Relação do Porto de 1999.05.13, os quais se encontram disponíveis para consulta através do site da DGSI em www.dgsi.pt. BBB. Desta forma, o depósito efectuado pela Recorrida não deverá ser admitido como meio eficaz de extinção da obrigação de pagamento das rendas e respectiva penalização a que estava adstrita, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 1041.º, n.º 1 e 1084.º, n.º 3 do CC. CCC. O escrutínio sobre o incumprimento dos Contratos pela Recorrente, nomeadamente quanto ao lugar e modo de pagamento das rendas, bem como os pressupostos da consignação em depósito não foi feito pelo Tribunal a quo. DDD. Com base no exposto, a Sentença viola o disposto nos artigos 916.º, 10.º, n.º 3, alínea), 193.º, 595.º,n.º 1, alínea b), 197.º, 615.º, n.º 1, alínea b) e d) e n.º 4, e 617.º, todos do CPC, artigo 20.º e 205.º da CRP, artigo 19.º do NRAU, artigos, 813.º, artigos 841.º, 1041.º e 1084.º, n.º 3 todos do CC e, como tal, deverá a mesma ser revogada e substituída por outra, o que se requer. Nestes termos e nos demais de Direito deverão ser julgadas verificadas as nulidades da Sentença arguidas, bem proceder as conclusões de facto e de direito invocadas pela Recorrente, revogando-se a decisão recorrida quer quanto à matéria de facto, quer quanto à matéria de direito e, em consequência, substituindo-a por outra, o que se requer . Assim farão V. Exas., Venerandos Juízes Desembargadores, o que é de inteira JUSTIÇA! 1.6.- Com referência à apelação identificada em 1.5., veio a requerente A apresentar contra-alegações , pugnando pela improcedência daquela, e para tanto deduzindo as seguintes conclusões : A. O presente recurso versa sobre os seguintes pontos: (i) nulidade da sentença por omissão de pronúncia e por falta de fundamentação, nos termos do disposto nos artigos 197.º, 615.º, n.º 1, al. b) e d) e n.º 4 e artigo 617.º, todos do CPC e artigo 205.º, n.º 1, da CRP; (ii) alteração à matéria de facto: aditamento de determinados factos aos factos provados e alteração dos factos considerados não provados 1 e 2 e 3) (iii) Erro da aplicação do Direito pelo Tribunal a quo. B. As alegações da Recorrente não têm qualquer sustentação, razão pela qual o recurso interposto deverá improceder na sua totalidade, mantendo-se, na íntegra, a douta sentença recorrida. C. A sentença recorrida não viola os artigos 615.º, n.º 1, alíneas. b) e d), do artigo 607.º,ambos do CPC e artigo 205.º, n.º 1, da CRP, não se vislumbrando qualquer omissão na sentença. D. A sentença recorrida especificou quais os fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão, bem como os factos que julgou provados e não provados, atendendo aos meios de prova careados para os autos, mormente o acordo obtido pelas partes nos articulados e a demais prova documental junta. E. A prova produzida foi valorada pelo Tribunal à luz das regras comuns da experiência e juízos de normalidade social e de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, ínsito no artigo 607.º, n.º 5, do CPC. F. O Tribunal a quo demonstrou a razão para dar como provados os factos 1 a 12, alicerçando a sua convicção na prova documental junta, mormente (i) na notificação judicial avulsa n.º 26553/18.9T8LSB de 10.01.2019 remetida pela Recorrente à Recorrida para comunicação da resolução do arrendamento; (ii) na carta enviada pela mandatária da Recorrida à mandatária da Recorrente, a 04.02.2019, para pôr termo à mora com o pedido do IBAN; (iii) no depósito de €8.325,00 para pagamento das rendas em dívida e indemnização pela mora e (iv) guias de depósito das rendas que se venceram após a entrada da acção de consignação de depósito a 08.02.2019. G. O Tribunal a quo, na sentença recorrida faz, cabalmente, uma análise detalhada das normas legais concretamente aplicáveis ao processo em crise, ao mesmo tempo que analisa a prova documental junta aos autos. H. Atendendo ao objecto do litígio, ao pedido e à causa de pedir, verifica-se que o mérito da causa era de natureza eminentemente jurídica e de verificação da obrigação da Recorrida, através da consignação em depósito por si realizada, não carecendo de produção de prova adicional, isto é, de prova testemunhal. I. A produção de prova adicional além daquela que se encontrava junta aos autos nos articulados violaria, de forma patente, o princípio da economia processual, de acordo com o disposto no artigo 195.º, número 2, do CPC. J. O Tribunal a quo não coarctou o direito de defesa da Recorrente, nos termos do disposto no artigo 20.º da CRP e no artigo 595.º, n.º 1, al. b), do CPC, uma vez que este foi amplamente exercido aquando da apresentação da sua contestação e no requerimento com as conclusões de facto e de Direito, antes da prolação da sentença recorrida. K. A sentença recorrida nunca poderá ser julgada nula por especificar os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. b), do CPC. L. O Tribunal a quo pronunciou-se sobre todas as questões relevantes à análise do mérito da causa, analisando e verificando que os pressupostos da consignação em depósito estavam verificados. M. A Recorrida recorreu à acção de consignação em depósito, nos termos do disposto nos artigos 916.º e seguintes do CPC pela verificação de mora do credor da ora Recorrente, a qual se recusou, ilegitimamente, a receber o valor das rendas devidas e a indemnização devida, razão pela qual inexiste erro na forma de processo. N. A Recorrente está adstrita a deveres acessórios de lealdade e informação, previstos no artigo 762.º, n.º 2, do CC, que lhe impunham que ela própria ou os seus mandatários, disponibilizassem o IBAN à Recorrida, para que esta pudesse cumprir com as obrigações a que estava adstrita para pôr termo à mora. O. Encontram-se integralmente verificados os pressupostos da consignação em depósito. P. O fundamento da consignação em depósito encontra respaldo na alínea a), do número 1, do artigo 841.º, do Código Civil, uma vez que a Recorrente se recusou a receber as rendas em atraso e a indemnização igual a 50% do que for devido, inviabilizando a possibilidade de concretização do disposto no artigo 1084.º, número 3, do Código Civil, isto é, que a resolução do contrato de arrendamento deixasse de operar, direito de que a Recorrida era titular. Q. A Recorrida realizou a consignação em depósito junto da Caixa Geral de Depósitos do valor de € 8.325,00, referente às rendas de janeiro de 2013 a Fevereiro de 2019 acrescido de 50% de indemnização da quantia devida R. Após a apresentação da acção de consignação em depósito, a Autora tem vindo a consignar em depósito, junto da Caixa Geral de Depósitos, os valores das rendas relativas aos meses de Março de 2019 e Janeiro a Agosto de 2020. S. A Recorrida cumpriu a obrigação prevista no artigo 19.º, número 2, do NRAU, tendo o Tribunal a quo referido, expressamente: “() inexiste qualquer falta de informação da ré ()”, tendo também dito que que a junção do duplicado ou duplicados das guias de depósito à contestação, ou figura processual a ela equivalente, de acção baseada na falta de pagamento produz os efeitos da comunicação. T. Ao contrário do que alega a Recorrente, os factos 15, 16, 17, 18, 19 e 20 nunca poderão ser julgados como provados. U. A Recorrente pretende demonstrar que dando-se como provados os factos 15 e 16, a Recorrida tinha tido a possibilidade de pôr termo à mora nos termos legalmente expostos, razão pela qual os pressupostos da consignação em depósito não estariam verificados. V. Acontece, porém, que a Recorrente não praticou os actos de colaboração necessária para que a Recorrida pudesse pagar o valor das rendas em divida e indemnização pela mora. W. O facto 17 não tem qualquer relevância para o objecto da acção, não tendo a Recorrente juntado aos autos, prova bastante para demonstrar a alienação da fracção arrendada, no período de tempo referenciado. X. Relativamente ao facto 18, apesar de a Recorrida ter sido informada das moradas/contactos da Recorrida, após o envio da notificação judicial avulsa, e a propósito do que se disse a propósito dos factos 15 e 16 que a Recorrente quer ver dados como provados, nunca esta nem os seus legais representantes, reitere-se, praticaram os actos materiais que permitissem que a Recorrida pudesse pagar as rendas em dívida e a indemnização legalmente prevista. Y. Os factos 19 e 20 não pode ser dado como provado, uma vez que a Recorrida não abandonou os locados, tendo as lojas sempre estado em funcionamento, sendo certo que estes factos não têm qualquer relevância para o objecto da acção. Z. Os factos 1 e 2 devem manter-se como provados, uma vez que a Recorrida demonstrou que tudo fez, junto da Recorrente e dos seus mandatários, para pôr termo à mora, não tendo feito a Recorrente contraprova do contrário, ou seja, que praticou os actos de colaboração necessários a que a Recorrida pudesse liquidar a sua obrigação e que não recusou o pagamento em causa. AA. O Tribunal a quo não errou na aplicação do Direito. BB. Perante a conduta inadimplente da Recorrente, a Recorrida, na qualidade de arrendatária, não teve outra alternativa que não avançar com a consignação em depósito, em conformidade com os preceitos previstos nos artigos 841.º e ss., do Código Civil e artigos 916.º e ss., do CPC. CC. O fundamento da consignação em depósito feita pela Recorrida encontra respaldo na alínea a), do número 1, do artigo 841.º, do Código Civil, uma vez que a Recorrente recusou-se a receber as rendas em atraso e a indemnização igual a 50% do que for devido, inviabilizando a possibilidade de concretização do disposto no artigo 1084.º, número 3, do Código Civil, isto é que a resolução do contrato de arrendamento deixasse de operar. DD. Perante o quadro legal acima exposto, a Recorrida procedeu à consignação, junto da Caixa Geral de Depósitos, do valor de € 8.325,00, referente às rendas de Janeiro de 2013 a Fevereiro de 2019 acrescido de 50% de indemnização da quantia devida. EE. Após a apresentação da presente acção de consignação em depósito, a Recorrida tem vindo a consignar em depósito, junto da Caixa Geral de Depósitos, os valores das rendas subsequente, até à presente data, conforme documentos comprovativos juntos aos autos. FF. Conclui-se, sem margem para dúvidas que os fundamentos legais para que a consignação em depósito pudesse operar, verificam-se no presente processo. GG. A Recorrente não tem razão ao afirmar que a consignação em depósito não foi efectuada nos termos do artigo 916.º do CPC e que a mesma não foi comunicada pela Autora à Ré em clara violação do disposto nos artigos 1084.º, número 3, do Código Civil e artigo 19.º do NRAU. HH. A consignação operada pela Recorrida tinha fundamento legal, produzindo o seu efeito liberatório, deixando a Recorrida de se encontrar em mora relativamente ao pagamento das rendas. II. O artigo 18.º, número 1, do NRAU, - secção VI do diploma relativo à consignação em depósito, dispõe que o depósito é feito em qualquer agência de instituição de crédito, perante um documento em dois exemplares, assinado pelo arrendatário, ou por outrem em seu nome, e do qual constem: a) A identidade do senhorio e do arrendatário; b) A identificação do locado; c) O quantitativo da renda, encargo ou despesa; d) O período de tempo a que ela respeita; e) O motivo por que se pede o depósito. JJ. O artigo 18.º, número 3, do NRAU, dispõe que o depósito fica à ordem do tribunal da situação do prédio ou, quando efectuado na pendência de processo judicial, do respectivo tribunal. KK. A Recorrida cumpriu assim, integralmente, com a legalidade a que estava adstrita nos termos do NRAU. LL. A referência a “depósito condicionado”, em vez de “depósito definitivo”, no depósito inicial da Recorrida, junto da CGD, deve-se ao facto de a Recorrente apenas ser credora de rendas e da indemnização pela mora desde 05.062018 (data de aquisição da fracção arrendada), sendo certo que o valor de €8.325,00 por si exigido diz respeito ao pagamento da renda devidas desde o mês de Dezembro de 2012 e respectiva indemnização de 50% pela mora, valor esse pago, única e exclusivamente, para obviar a resolução do contrato de arrendamento. MM. O valor das rendas entre o mês de Dezembro de 2012 e o dia 05 de Junho de 2018, não é devido pela Recorrida a Recorrente, pelo que terá de lhe ser devolvido, com o trânsito em julgado da decisão desta acção, sob pena de enriquecimento sem causa, razão pela qual o depósito foi feito de forma condicionada. NN. O artigo 19.º, número 1, do NRAU, determina que o arrendatário deve comunicar ao senhorio o depósito da renda. OO. O artigo 19.º, número 2, do NRAU dispõe que a junção do duplicado ou duplicados das guias de depósito à contestação, ou figura processual a ela equivalente, de acção baseada na falta de pagamento produz os efeitos da comunicação PP. A Recorrida, tendo sido notificada judicialmente no 10 de Janeiro de 2019 da resolução do contrato de arrendamento pretendido pela Recorrida, e tendo consignado em depósito o valor exigido (por recusa desta na aceitação da sua prestação), em 08 de Fevereiro de 2019, colocou termo à mora, em cumprimento integral do preceituado no artigo 1084.º, número 3, do Código Civil. QQ. A Recorrida deu pleno cumprimento a tal norma, uma vez que juntou os duplicados de todos os depósitos feitos na presente acção, assim como, na oposição ao despejo que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juiz 6 do Juízo Local Cível de Lisboa, sob o n.º de processo 1111/19.4YLPRT, enquanto figura equivalente à contestação, o que, nos termos de tal preceito legal, produz os efeitos da comunicação ao senhorio. Nestes termos e nos demais de Direito que V.Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente e, em consequência, ser mantida, na íntegra, a decisão recorrida, por não merecer qualquer censura ou reparo, só assim se fazendo acostumada Justiça! * Thema decidendum 2. - Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem ] das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho ), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, as questões a apreciar e a resolver na apelação de [ ANA …] resumem-se às seguintes : I - Aferir se, tal como o defende a recorrente, padece a Sentença recorrida do vício de nulidade e isto porque : a) Incorre no vício de falta de fundamentação , violando a al.b), do nº1, do artº 615.º, do CPC ; b) Incorre no vício de omissão de pronúncia, violando a al. d), primeira parte, do nº1, do artº 615.º, do CPC; c) Se padece a Sentença do vício de nulidade, por omissão de pronúncia - em conformidade com o disposto nos artigos 197.º, 615.º, n.º 1, alínea b) e d) e n.º 4, e 617.º, todos do CPC e artigo 205.º, n.º 1 da CRP – quanto ao erro da recorrida na qualificação do meio processual utilizado. II - Aferir se a decisão de facto proferida pelo tribunal a quo carece de ser modificada, e isto porque; a) É deficiente, não constando do elenco dos factos PROVADOS alguns outros que, porque alegados e provados, daquele rol devem também fazer parte; b) É deficiente, não existindo a indicação dos factos NÃO PROVADOS , sendo que, alguns existem que, apesar de alegados , não se provaram ; c) Importa conferir uma diferente redacção a concreto ponto de facto julgado provado – o ponto 2.12 ; III – Aferir se a sentença recorrida incorre em error in judicando, merecendo ser REVOGADA, e isto porque ; a) Aquando da sua prolação não estava o tribunal em condições de conhecer de imediato do mérito da causa, devendo os autos ter prosseguido para a fase de audiência de discussão e julgamento; b) foi a Recorrida que incumpriu a obrigação a que estava vinculada nos termos dos contratos de arrendamento e ao abrigo dos artigos 1041, n.º 1 e 1084.º, nº 3 do CC, por facto alheio à Ré [ em suma, não há mora do credor/apelante ]; c) O depósito não foi comunicado à Recorrente após decorrido o prazo de 1 (um) mês estipulado no artigo 1084.º, n.º 3 do CC e no artigo 19.º do NRAU, logo, não poderá ele ser declarado como tendo eficácia liberatória por violação do disposto no artigo 1084.º, n.º 3 do C.C. e 19.º do NRAU; * 3. – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO. O tribunal a quo, em sede de observância do disposto no artº 607º,nº4, primeira parte, do CPC, fixou a seguinte factualidade ; A) PROVADA 3.1. - A fls. 5 e ss. encontra-se cópia de contrato de arrendamento celebrado em 27.9.1939, referente a loja sita no número … da Rua da Prata, sendo a renda paga “em casa da senhoria, ou de quem a representar, em moeda corrente e sempre antecipadamente no primeiro dia útil do mês anterior àquela a que disser respeito.” 3.2. - A fls. 8 e ss. encontra-se cópia de contrato de arrendamento celebrado em 26.9.1954 referente à loja sita no número … e . da Rua da Prata e a números .. a …. da Rua de São Nicolau, com entrada pelo número …..da Rua da Prata. 3.3 - A fls. 10 verso e ss. encontra-se cópia de contrato de trespasse das 2 lojas para a autora, de 4.7.1983. 3.4. - Em 7.4.2008, o prédio foi constituído em propriedade horizontal, passando as 2 lojas a constituir a fracção autónoma B, cf. certidão de fls. 13 verso e ss. 3.5. - Em 3.9.2010, a fracção foi adquirida por PRAINSA PREFABRICADOS, UNIPESSOAL, LDA. 3.6. - Em 25.7.2018, a fracção B foi adquirida pela autora. 3.7. - No âmbito da notificação judicial avulsa com o n.º 26553/18.9T8LSB, a fls. 38 verso encontra-se auto de notificação pessoal da ora autora de 10.1.2019, relativamente ao requerimento apresentado pela ora ré de fls. 40 e ss., no qual a ora ré comunicou à ora autora a resolução dos contratos de arrendamento dos autos e a dívida resultante da falta de pagamento de rendas desde Janeiro de 2013, no valor de €6.638,58; 3.8. - Por carta registada com aviso de recepção assinado em 4.2.2019, a Ilustre Mandatária da Autora informou a Ilustre Mandatária da ré que a autora “ pretende fazer cessar a mora através do pagamento das rendas vencidas acrescido de indemnização igual a 50% da quantia devida, nos termos e para os efeitos da primeira parte do n.º 1, do 1041.º, e 1042.º do Código Civil. Como tal, solicitamos que nos informe o respectivo IBAN para o qual deverá ser transferida a quantia de € 6.795,00 (…), respeitante às rendas em dívida relativas a Janeiro de 2013 a Janeiro de 2019, acrescido de indemnização igual a 50% da quantia devida.”, cf. fls. 80-82. 3.9. - Em 8.2.2019, a autora depositou a quantia de €8.325,00 na CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, cf. fls. 82 e posteriormente as rendas vencidas subsequentemente. 3.10. - Em 8.2.2019, a autora instaurou esta acção, cf. fls. 1 e ss.. 3.11. - A ré foi citada em 3.5.2019, cf. fls. 92. 3.12. - No procedimento especial de despejo n.º 1111/19.4 YLPRT, que a ora ré instaurou contra a ora autora, na contestação, a ré alega no artigo 18.º e 19.º a instauração desta acção e que tem estado a depositar as rendas, juntando cópia de guias de depósito, a fls. 53 e ss.. *** 4. – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO 4.1.- DOS VÍCIOS DE NULIDADE – DE SENTENÇA – PELA APELANTE INVOCADOS. 4.1.1. – Da falta de fundamentação , vício a que alude al.b), do nº1, do artº 615.º, do CPC. Invocando no essencial que da decisão apelada apenas resulta em sede de fundamentação que a requerente/locatária A procedeu ao depósito das rendas devidas, acrescidas da indemnização igual a 50% para fazer cessar a mora, e tem depositado as frendas subsequentes, mas, da mesma fundamentação, já nada resulta a propósito da “preterição e aplicação do disposto nos artigos 916.º e seguintes do CPC (depósito judicial), bem como da verificação dos pressupostos da consignação em depósito (mora do credor) [ quanto ao modo e lugar de cumprimento do pagamento das rendas ] e, bem assim, nada se alude também quanto e/ou efeito liberatório do depósito efectuado pela Autora junto da Caixa Geral de Depósitos, invoca a apelante a NULIDADE da sentença por verificação do fundamento a que se refere o artº 615º, nº1, alínea b), do CPC. Cumprindo o tribunal a quo, apenas formal e laconicamente [ “ Salvo melhor opinião, inexiste qualquer nulidade da sentença“,sic], o disposto no artº 617º,nº1, do CPC, importa de seguida apreciar se justifica considerar que a sentença apelada padece do vício do artº 615º, nº1, alínea b), do CPC. Ora bem. A disposição legal pela apelante invocada [artº 615º, nº1, alínea b), do CPC. ], ao dispor que é nula a sentença quando “Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”, como é por todos consabido, tem por objecto um error in procedendo, ou seja, um mero erro/vício formal , isto por um lado, e , por outro, e para que se verifique, exige como é igualmente entendimento uniforme e há muito consolidado, quer na jurisprudência (1, quer na doutrina (2), que seja a parte confrontada com uma falta absoluta de motivação ( quando a mesma não existe de todo) , que não com uma decisão cuja fundamentação , existindo, é porém exígua, escassa, ou até mesmo pobre/telegráfica. Ou seja, para que efectivamente ocorra o vício de nulidade a que se refere o artº 615º, nº.1, al. b), do Código de Processo Civil, seja de facto e/ou de direito, necessário é que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão – em termos de facto e de direito – seja deficiente, apoucada, ou incompleta, vício este último que, podendo é verdade afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, não a fulmina de nulidade. (3) “Alinhando” pelo referido entendimento, praticamente consensual, também TEIXEIRA de SOUSA (4) considera que “o dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (...) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível”. Por outra banda, dispondo a sentença recorrida de alguma fundamentação, mas da mesma discordando a parte recorrente, exige-se e espera-se que o impugnante consiga destrinçar [ o que recorrentemente não se verifica no âmbito de instâncias recursórias, amiúde e confrangedoramente confundindo as partes o erro material ou erro no julgar – vg. em sede de interpretação da lei e/ou de subsunção dos factos ao plano abstracto da norma aplicável ] o “error in procedendo” do “error in judicando”, pois que , este último e manifestamente ,não integra a previsão do artº 615º, do Código de Processo Civil. Isto dito, e mais não se justifica acrescentar, é por demais evidente que não padece a sentença apelada do erro formal a que se refere o artº 615º, nº 1, al. b), do Código de Processo Civil, pois que integra a mesma, quer a pertinente fundamentação de facto [ de resto objecto de impugnação pela recorrente ], quer a consequente fundamentação de direito, ainda que não exaustiva . Dir-se-á que, sendo lícito à parte recorrente da aludida fundamentação discordar, considerando-a eventualmente apoucada e até errada, já não lhe é todavia “permitido” invocar o vício formal de omissão de fundamentação, porque o mesmo não se verifica. A propósito ainda do também invocado cumprimento “telegráfico” [ mais exactamente uma motivação vaga e genérica do julgamento quanto à matéria de facto ] pelo tribunal a quo do disposto na II parte do nº4, do artº 607º, do CPC [ a especificação e explicação detalhada e pormenorizada dos fundamentos que para o Exmº Juiz foram decisivos em sede de formação da convicção ] , critica que in casu faz algum sentido, sendo justificada [ tudo apontando para que se deva – no entender da apelante - equiparar-se a ausência de um exame crítico das provas a uma verdadeira e própria falta de fundamentação, para o efeito do disposto no art. 615.º, alínea b) do CPC ] , importa considerar tal vicio como não integrando de todo a previsão do no art. 615.º, alínea b) do CPC . É que, se analisarmos conjugadamente o disposto nos artºs 607º, nº 3, 615º, nº1, alínea b), e 662º,nº2, alínea d), todos do CPC, difícil não é concluir que a não indicação e efectiva e cabal explicitação em sede de sentença dos reais fundamentos que foram decisivos para a formação da convicção do julgador no âmbito do julgamento de facto de determinados pontos de facto controvertidos, está longe de integrar vício adjectivo subsumível à previsão do artº 615º, do CPC, ou seja, não conduz de todo à nulidade da sentença apelada. Ao invés, a verificar-se a referida patologia [ a não indicação em sede de sentença dos reais fundamentos que conduziram a concreto julgamento de facto ] , e desde que incida ele sobre algum facto essencial para o julgamento da causa ( cfr. artº 662º,nº2, alínea d), do CPC ), apenas obriga a lei adjectiva que o Tribunal da Relação determine à primeira instância que supra tal déficit, fundamentando o julgamento efectuado, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados. De resto, já no âmbito do pretérito CPC ( cfr. artºs 653º, nºs 4 e 5, 668º e 712º, nº 5 ), era clara a diferenciação dos procedimentos a adoptar em sede de deficiente ou falta de motivação do julgamento da matéria de facto, e de falta de especificação – na sentença - dos fundamentos de facto e de direito, sendo então claramente distintos os vícios adjectivos susceptíveis de atingir o primeiro despacho e a sentença, pois que, também a falta de fundamentação da decisão da matéria de facto não conduzia de todo à nulidade da sentença , podendo, quando muito ( havendo requerimento da parte nesse sentido – cfr. artº 712º, nº5 ), determinar a repetição da fundamentação pelo tribunal a quo. Em suma, e como assim o decidiu o Tribunal da Relação de Coimbra (5) “Apesar de actualmente o julgamento da matéria de facto se conter na sentença final, há que fazer um distinguo entre os vícios da decisão da matéria de facto e os vícios da sentença, distinção de que decorre esta consequência : os vícios da decisão da matéria de facto não constituem, em caso algum, causa de nulidade da sentença, considerado além do mais o carácter taxativo da enumeração das situações de nulidade deste último acto decisório”. Dito de uma outra forma, é precisamente porque o legislador considera expressis verbis que a falta de um exame crítico das provas obriga a segunda instância em determinadas situações que determine ao tribunal a quo que proceda a competente fundamentação [ art. 662.º, n.º 2, d) ], que tal vício escapa à previsão do artº 615º, do CPC. O mesmo raciocínio se aplica à invocada não indicação de quais os factos não provados. É que, ainda que tal crítica se justifique, não apenas não se descortina que o vício em causa implique necessariamente qualquer dificuldade para o Recorrido em cumprir o ónus legal imposto pelo nº 1 do artigo 640º do Código de Processo Civil, como, sobretudo, porque é o próprio artº 662º, nº1, alínea c), do CPC, que prevê a possibilidade de a modificabilidade da decisão de facto poder justificar-se precisamente com fundamento na respectiva deficiência em relação a pontos determinados da matéria de facto [ porque não julgados provados ou não provados ] . Acresce que, a existir o referido vício, e não integrando o mesmo a previsão do artº 615º,nº1, alínea b), do CPC [nulidade da sentença], a verdade é que também a respectiva sanação não obriga forçosa e inevitavelmente à anulação da sentença, pois que, como decorre do artº 662º,nº2, alínea c), do mesmo diploma legal, a anulação da decisão proferida na 1.ª instância apenas se impõe quando não constam do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto. Em suma, não existe o vício de NULIDADE pela apelante apontado , e atinente à não indicação da factualidade “Não Provada”. Perante tudo o acabado de expor, e sem necessidade de mais considerações, improcede portanto a apelação no tocante à arguição do vício a que alude o artº 615º, nº1, alínea b), do CPC. * 4.1.2. – Da omissão – na sentença - de pronúncia sobre questões, vício a que alude al. d), primeira parte, do nº1, do artº 615.º, do CPC. Considera a apelante B que no caso em apreço e de uma simples leitura da sentença proferida, resulta que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre todos os temas a decidir [ vg e desde logo sobre a “ verificação dos pressupostos para a consignação” ] , e/ou sequer pela única questão que identificou como questão a resolver: “A questão a resolver pelo Tribunal consiste na verificação dos pressupostos para a atribuição da indemnização peticionada”. Na verdade, pormenoriza a apelante, não se pronunciou – na sentença - designadamente o tribunal a quo sobre o dever de comunicação plasmado no artigo 19.º do NRAU e especificadamente não se pronunciou de o mesmo não ter sido assegurado no prazo de 1 (um) mês – prazo previsto para se pôr termo à mora [ cfr. disposto no artigo 1084.º, n.º 3 do C.C. e artigo 19.º do NRAU ] , e , bem assim, sobre o efeito liberatório do depósito efectuado na CGD pela Autora, ora Recorrida, e, de resto, nem sequer se pronunciou sobre única questão que identificou expressis verbis como sendo a questão a resolver. Em suma, conclui assim a apelante que manifesto é que padece a sentença recorrida do vício a que alude al. d), primeira parte, do nº1, do artº 615.º, do CPC. Quid júris ? Antes de mais, pertinente é começar por não olvidar que as causas de nulidade da sentença são de previsão/enumeração taxativa (6), estando as mesmas [ quais nulidades especiais (7) ] discriminadas no nº1, do artº 615º, do actual CPC, razão porque forçoso é que qualquer vício invocado como consubstanciando uma nulidade da sentença, para efectivamente o ser, deve necessariamente integrar o tatbestand de qualquer uma das alíneas do nº1, da citada disposição legal. Depois, e insiste-se mais uma vez, importante é outrossim ter sempre em atenção que, como é consabido, não faz de todo qualquer sentido incluir-se no âmbito das nulidades de sentença um qualquer erro de julgamento ( de facto e/ou de direito) . Isto dito, reza a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, que a sentença é nula quando o “ juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento “. O vício/nulidade referida, mostra-se em consonância com o dever que recai sobre o Juiz de, em sede de sentença , resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, servindo de cominação ao seu desrespeito (8). Sobre o Juiz recai , portanto, no dizer de José Lebre de Freitas e outros (9) , a obrigação de apreciar/conhecer “ todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (…), sendo que, a ocorrer uma tal omissão de apreciação/conhecimento, e , não estando em causa a mera desconsideração tão só de eventuais “(…) linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença e que as partes hajam invocado (…)“, então o “ não conhecimento do pedido , causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outras questões, constitui nulidade”. Porém, importa não olvidar que, como há muito”advertia” José Alberto dos Reis (10), não se devem confundir factos (fundamentos ou argumentos) com questões (a que se reportam os artigos 608.º, n.º 2, e 615º, n.º 1, alínea d), do CPC) a resolver, pois que uma coisa é não tomar conhecimento de determinado facto invocado pela parte, e , outra completamente distinta, é não tomar conhecimento de determinada questão submetida à apreciação do tribunal. Em rigor, para nós e em termos conclusivos, dir-se-á que as questões a que alude a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, mais não são do que as que alude o nº 2, do artº 607º, e artº 608º, ambos do mesmo diploma legal, e que ao Tribunal cumpre solucionar, delimitando-se e emergindo as mesmas da análise da causa de pedir apresentada pelo demandante e do seu confronto/articulação com o pedido que na acção é formulado. Ou seja, e dito de um outro modo, não se confundindo é certo as questões a resolver pelo juiz em sede de sentença com quaisquer argumentos e razões que as partes invoquem em defesa das suas posições, o correcto/adequado será em rigor considerar-se que o vocábulo “questões” a que alude a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, mostra-se empregado na lei adjectiva com o sentido equivalente a “questões jurídicas” ainda carecidas de resolução, impondo-se que no âmbito das mesmas seja dada prioridade às questões de natureza processual que ainda estejam por resolver (nulidades, excepções dilatórias ainda por apreciar ou outras questões de natureza processual que interfiram no resultado), e , sem embargo da apreciação das questões que sejam de conhecimento oficioso, deve o juiz limitar-se a apreciar as que foram invocadas, evitando, deste modo, a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, nos temos do art. 615º, nº 1, al. d), in fine. (11) Postas estas breves considerações, e agora sim, dirigindo especificamente a nossa atenção sobre o objecto da acção especial da consignação em depósito, e da qual emerge a instância recursória pela apelante despoletada, e , tal como decorre do disposto nos artºs 916º a 924º, do Código de Processo Civil, pode a mesma apresentar-se sob três aspectos distintos, a saber (12): a) Como objecto de processo autónomo ( artºs 916º a 922º, do CPC); Como incidente ( artº 924º, do CPC) ; Como acto preparatório ( artº 923º, do CPC). Em rigor, nos artºs 916º a 924º, do Código de Processo Civil, mostram-se regulados três processos especiais distintos, tendo o processo autónomo acima referido o carácter de processo especial geral e, os outros dois, a natureza de processos especialíssimos, sendo que, a consignação em depósito, e a existir contestação, pode seguir dois rumos diversos, consoante o fundamento da impugnação, ou seja : I) ou a impugnação se baseia nalgum dos fundamentos apontados nas alíneas a) e c) do artº 919º, ou quando ocorre a citação no processo de consignação, já se mostra proposta a acção ou a execução respeitante à obrigação; II) a impugnação baseia-se no fundamento apontado na alínea b), do artº 919º. Mais se esclarece que a consignação em depósito, como é consabido, consubstanciando uma causa de extinção das obrigações, de instituto se trata que pode pelo devedor ( sendo facultativo ) ser utilizado - para se livrar da obrigação e mediante o depósito da coisa devida – nas seguintes situações ( cfr. artº 841º, do CC ) : a) Quando, sem culpa sua, não puder efectuar a prestação ou não puder fazê-lo com segurança, por qualquer motivo relativo à pessoa do credor ; b) Quando o credor estiver em mora. E, desde que aceite pelo credor ou declarada válida por decisão judicial, a consignação libera o devedor, como se ele tivesse feito a prestação directamente ao credor na data do depósito ( cfr. artº 846º, do Código Civil ). Em termos conclusivos, e socorrendo-nos novamente de José ALBERTO DOS REIS (13), porque sempre actual, dir-se-á que, em geral, na base da consignação em depósito está esta ocorrência : “ o devedor quer livrar-se da dívida, quer exonerar-se da obrigação, e não tem meio de o fazer particularmente. O processo judicial da consignação surge, pois, como meio extremo para o devedor efectuar o pagamento “. Mais ensina José ALBERTO DOS REIS, que “ O devedor tem não só o dever jurídico, mas até o direito, de pagar a dívida. O processo de consignação em depósito destina-se a permitir ao devedor que exerça o direito de se libertar da dívida mediante o pagamento, quando encontre obstáculos para se exonerar extrajudicialmente”. Isto dito, e já em sede de contestação/impugnação do credor, articulado este que é apresentado uma vez efectuado o depósito e após citação do referido credor, pode aquele – o depósito – ser impugnado : a) Por ser inexacto o motivo invocado ; b) Por ser maior ou diversa a quantia ou coisa devida; c) Por ter o credor qualquer outro fundamento legítimo para recusar o pagamento ( cfr artº 919º, do CPC ). Em suma, perante tudo o supra exposto, pacifico é que no processo de consignação em depósito podem em tese suscitar-se diversas questões a resolver, e devendo todas elas por regra [ a não ser que se verifique vg a situação a que alude a alínea b), do nº2, do artº 917º, do CPC – quando o credor , quando citado, houver já proposto a acção e a quantia depositada for diversa da que é pedida na acção ] ser dirimidas na referida acção especial e com força de caso julgado material. Aqui chegados e “Apetrechados” de todos os contributos legislativos e doutrinas supra aduzidos, certo é que , in casu, e perante as alegações de facto e de direito pela requerente e requerida carreadas para os respectivos articulados, as efectivas questões jurídicas que ao tribunal a quo importava dirimir/resolver eram apenas as seguintes : A primeira : aferir se dispunha a requerente de fundamento substantivo [ previsto no artº 841º, do CC e/ou em face do disposto no nº 3, do artº 1084º, outrossim do CC , rezando o último que “ A resolução pelo senhorio, quando opere por comunicação à contraparte e se funde na falta de pagamento da renda, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário, nos termos do n.º 3 do artigo anterior, fica sem efeito se o arrendatário puser fim à mora no prazo de um mês ] a justificar a acção de consignação em depósito ; A segunda : e sendo positiva a resposta à questão anterior, aferir se a consignação em depósito foi efectuada com observância do disposto no nº 1, do artº 916º, do CPC e, bem assim, se foi comunicado ao senhorio o depósito em apreço [ cfr. artº 19º,nº1, do NRAU ] e, A terceira : e sendo positivas as respostas às duas questões anteriores, aferir se inevitavelmente deve – porque ademais efectuado no prazo de um mês a que alude o artº 1084º,nº3, do CC - o depósito pela requerente efectuado ser declarado como válido e eficaz como meio efectivo de extinção da obrigação da requerente, tendo em suma efeito liberatório. Ora, analisada a decisão recorrida, temos para nós que todas as verdadeiras questões supra enunciadas foram objecto de apreciação e resolução, e isto independentemente do acerto da decisão em termos do mérito. Na verdade, e relativamente à primeira questão, decorre sem dificuldade da sentença apelada que foi a mesma objecto de resolução pela positiva, considerando o Exmº Juiz a quo que, pretendendo a requerente/arrendatária por termo à mora – através de depósito da quantia devida - nos termos e para efeitos do disposto no artº 1084º,nº3, do CC, certo é que não dispunha a requerente do competente NIB de uma conta da Ré/senhoria para o fazer – apesar de o ter solicitado à Ré - e, para todos os efeitos, “ A circunstância de o pagamento dever ser feito na residência do locador não é de molde a tornar irregular o depósito da renda, salvo o devido respeito por opinião diversa “. Ou seja, para o tribunal a quo, lícito era considerar que pretendendo a autora/devedora livrar-se da obrigação mediante o depósito da coisa devida, em rigor estava impedida de o fazer, sem culpa sua. Já a segunda questão mostra-se igualmente pelo tribunal apreciada e resolvida na sentença apelada, tudo apontando reconhecer implicitamente o Exmº Juiz a quo na sentença recorrida que [ em face do que consta do relatório da sentença apelada ] cumpriu a requerente no essencial o disposto no nº 1, do artº 916º, do CPC - declarando o motivo por que pede o depósito - e, bem assim, que importava considerar efectuada a comunicação à senhorio do depósito em apreço, e isto porque “ Quando a ré pretendeu efectivar a resolução do contrato de arrendamento, no procedimento especial de despejo n.º 1111/19.4YLPRT, na contestação, a ora autora alega no artigo 18.º e 19.º que instaurou esta acção e que tem estado a depositar as rendas, tendo junto cópia de guias de depósito, cumprindo desta forma o disposto no n.º 2, do artigo 19.º do NRAU. Por outro lado, anteriormente, a autora informou a ré da intenção de fazer cessar a mora, solicitando IBAN.” Por último, resulta outrossim da sentença recorrida que “ menos de 1 mês após a notificação da resolução do contrato, a autora depositou a quantia cujo montante não foi impugnado pela ré, no seguimento de carta interpelando-a a informar o IBAN para proceder à respectiva transferência “, e que, não tendo a ré impugnado o montante depositado mas apenas a sua eficácia liberatória, certo é que “ a autora depositou validamente as rendas, acrescida de indemnização igual a 50% “ , logo, constituindo a consignação em depósito facto extintivo das obrigações - cf. artigo 841.º do Código Civil – importava “ pois julgar procedente esta acção “. Ou seja, em rigor, também a terceira questão jurídica supra referida deve considerar-se como tendo sido pelo tribunal a quo resolvida no âmbito da sentença apelada. Destarte, e porque no essencial resolveu [ bem ou mal é indagação que para efeitos do disposto no artº 615º, nº1, alínea d), primeira parte, do CPC, é de todo indiferente ] na sentença o Exmº Juiz a quo todas as questões jurídicas a que se refere o artº 608º,nºs 1 e 2, do CPC, importa desatender todas as conclusões em contrário aduzidas pela recorrente na sua apelação. Uma última observação também se impõe aduzir no tocante à invocada – pela apelante - omissão de apreciação/julgamento pelo tribunal a quo de concretos pontos de facto que integram prima facie a causa petendi e caindo – no entender da apelante – tal vicio igualmente na previsão da alínea d), primeira parte , do nº1, do artº 615º, do CPC. É que, prevendo expressamente o CPC a obrigatoriedade de o Tribunal da Relação alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto - e ademais sem necessidade de a mesma ter sido sequer requerida por uma qualquer das partes ( cfr. nºs 1 e 2, do artº 662º, do CPC ) - quando a mesma se revele deficiente [ o que sucede quando determinado ponto da matéria de facto ou algum seu segmento não tenha sido objecto de resposta positiva ou negativa ] , inevitável é concluir-se que também o vício invocado pela apelante e ora em análise não pode de todo implicar a nulidade da sentença, antes deve caber na previsão do artº 662º, nº2, alínea c), do CPC, podendo a questão ser suscitada pela parte recorrente em sede de impugnação da decisão relativa à matéria de facto ( cfr. artº 640º, do CPC ). Em suma, não padece a sentença apelada de qualquer vicio adjectivo susceptível de integrar a previsão do artº 615º, nº1, do CPC, * 4.1.3. – Se padece a Sentença do vício de nulidade, por omissão de pronúncia - em conformidade com o disposto nos artigos 197.º, 615.º, n.º 1, alínea b) e d) e n.º 4, e 617.º, todos do CPC e artigo 205.º, n.º 1 da CRP – quanto ao erro da recorrida na qualificação do meio processual utilizado. Invocando que a Recorrida lançou mão da acção de consignação de depósito judicial quando na verdade pretendia obter o reconhecimento judicial/ declaração de existência de um depósito autónomo que efectuou junto da CGD e consequente direito, diz a recorrente que a Recorrida fez um uso indevido da referida acção. Consequentemente, conclui a recorrente que, porque o erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz, determinando que se sigam os termos processuais adequados, cfr. artigo 193.º do CPC, então a falta de pronúncia do Tribunal sobre a referida nulidade, viola consequentemente, o disposto nos artigos 10.º, n.º 3, alínea a), 916.º e seguintes e 193.º, todos do CPC, enfermando a Sentença do vício de nulidade, por omissão de pronúncia, em conformidade com o disposto nos artigos 197.º, 615.º, n.º 1, alínea b) e d) e n.º 4, e 617.º, todos do CPC e artigo 205.º, n.º 1 da CRP, nos termos já supra expostos. Ora, com fundamento nas considerações por nós já tecidas no presente acórdão ( no item 4.1.2.) , e porque de questão se trata que não foi sequer pela parte suscitada ( na sua contestação) perante o tribunal a quo, manifesto é que não incorreu a primeira instância em incumprimento do disposto no nº 2, do artº 608º, do CPC, logo, não deixou de pronunciar-se –na sentença – de questão jurídica que a parte tenha submetido à apreciação do julgador. Consequentemente, não existe assim NULIDADE de Sentença em conformidade com o disposto nos artigos 615.º, n.º 1, alínea d) , do CPC e, ademais, porque a forma de processo é aferível em função do tipo de pretensão formulada pelo autor e não em referência à pretensão que devia ser por ele deduzida (14), ostensivo é que in casu não se verifica a excepção dilatória a que se refere o artº 193º, nºs 1 a 3 . É que, como bem se decidiu em acórdão proferido pelo tribunal da Relação do Porto (15), “ Pretendendo o Autor exonerar-se de uma invocada obrigação do pagamento de certa quantia, que, segundo ele, os Réus credores se recusam a receber, tal pretensão pode e deve ser deduzida através do processo especial de consignação em depósito; se o Autor podia ou não pedir essa consignação é uma questão de fundo que tem a ver com a procedência ou improcedência da acção, não dizendo respeito à forma processual” Improcede, portanto a apelação no tocante à questão recursória acabada de analisar. * 5.- Da impugnação pela apelante/autora da decisão sobre a matéria de facto provada proferida pelo tribunal a quo. Considerando que : - A apelante B, em obediência ao disposto no artº 640º, nº1, alíneas a) e c), do CPC, não apenas especificou quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, como outrossim indicou quais as diversas decisões a proferir no tocante aos pontos de facto impugnados; - A apelante, em obediência ao disposto no artº 640º,nº1, alínea b) do CPC, especificou a ratio da alteração – na decisão de facto – almejada, e, relacionando-se a mesma no essencial com a violação de regras vinculativas do direito probatório, não se aplica in casu o ónus exigido pelo legislador com referência à prova gravada ( alínea b) , do nº1, do artº 640º, do CPC ); Verificam-se portanto in casu os pressupostos exigidos pelo legislador adjectivo para que possa/deva este tribunal de recurso esmiuçar da pertinência da requerida - pela apelante - modificabilidade da decisão proferida pelo tribunal a quo sobre matéria de facto. Vejamos, pois, quais as alterações que in casu se justificam sejam efectuadas e atendidas . 5.1.- Se ao elenco dos factos PROVADOS outros devem ser adicionados, porque alegados e provados. São os seguintes os pontos de facto que, no entender da apelante, devem também fazer parte do ROL dos factos PROVADOS : Facto n.º 13: “ A renda mensal das Lojas 1 e 2 é de € 75,00”; Facto n.º 14: “ A Autora liquidou as rendas apenas até Dezembro de 2012”; Facto n.º 15: “ Os contratos de arrendamento juntos aos autos, quanto ao modo de pagamento das rendas, dispõem que as mesmas deverão ser pagas “[…] nesta cidade, em casa da senhoria, ou de quem a representar, em moeda corrente, e sempre antecipadamente no primeiro dia útil do mês anterior aquele a que disser respeito”; Facto n.º 16: “ O pagamento da renda deveria, em cumprimento do mandato em vigor, ser feito junto do seu representante, neste caso concreto, junto dos seus advogados”; Facto n.º 17: “ Entre 3 de Setembro 2010 e 25 de Julho de 2018 não ocorreu nenhuma venda sobre a fracção dos autos. No referido período a fracção esteve registada a favor da PRAINSA, conforme certidão do registo predial e caderneta predial juntas como documento números 4 e 5; Facto n.º 18: Após a Recepção da notificação judicial avulsa a Autora foi informada das moradas/contactos da Ré e dos seus legais representantes, conforme notificação judicial avulsa e missiva juntas como documentos números 7 e 8; Facto n.º 19: A Autora abandonou as lojas dos autos, tendo inclusive anunciado por meio de aviso o encerramento dos estabelecimentos comerciais que haviam sido objecto de trespasse, ou seja, a “FARMÁCIA ….” e da “PERFUMARIA …..” – facto admitido por acordo. Facto n.º 20 : Em Julho de 2018, as lojas voltaram a ser ocupadas não para desenvolvimento da actividade dos referidos estabelecimentos comerciais, mas antes de uma parafarmácia . Justificando a apelante, no essencial, que o grosso dos factos acabados de transcrever, devem outrossim fazer parte do elenco dos factos provados porque admitidos por acordo das partes no processo, vejamos pois se a pretensão da recorrente merece ser acolhida. Ora bem. Antes de mais, e tendo presente o disposto no artº 5º, nº1, do CPC, importa deixar claro que o objecto da instrução deve prima facie circunscrever-se aos factos que integram a causa de pedir, não fazendo muito sentido que incida aquela sobre factos instrumentais e/ou apenas integradores de mera impugnação motivada, ou seja, para a prova da versão da Ré . Explicando melhor, o que se exige é que a instrução da causa se direccione para a prova ( cujo ónus de alegação e prova incide sobre o autor ) dos factos integrantes da causa pedendi , que não para a versão do Réu , devendo portanto a decisão de facto - em boa técnica jurídica - apenas integrar os factos essenciais/relevantes ( os referidos no artº 5º,nº1, do CPC) , quer os provados , quer os não provados . O acabado de aduzir vem a propósito da constatação de que, ao integrar-se na decisão de facto a versão da Autora e outrossim a da Ré, em consequência acaba por regra também o apelante por direccionar a sua impugnação para factos irrelevantes para a boa decisão da causa ( segundo as mais variadas e plausíveis soluções de direito ) e , por arrastamento, vem também o tribunal de recurso a enveredar por uma tarefa cognitiva acrescida , mas de todo inútil. As considerações acabadas de aduzir justificam-se pela circunstância de, ainda que o recorrente/impugnante cumpra todos os diversos ónus contemplados no artº 640º, do CPC, em sede de impugnação da decisão de facto, ainda assim, tal nada obsta a que o tribunal ad quem não conheça do mérito da referida impugnação dirigida para determinados e concretos pontos de facto quando, em rigor, tal tarefa venha a revelar-se como de todo inútil, postulando em última análise a realização pelo tribunal de recurso de uma concreta actividade cognitiva judicial de todo dispensável, porque inócua e irrelevante, logo não exigível. É que, em obediência ao princípio da limitação dos actos, e porque não é lícito realizarem-se no processo actos inúteis (cfr. artº 130º, do CPC), também em sede de impugnação de decisão proferida pela primeira instância e relativa à matéria de facto, hão-de os concretos pontos de facto impugnados poderem - segundo as diversas soluções plausíveis das variadas questões de direito suscitadas - contribuir para a boa decisão da causa, maxime a respectiva e solicitada modificação há-de minimamente relevar para uma almejada alteração do julgado. Com efeito , como bem se decidiu em Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa (16) “ Não há que conhecer da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, por desnecessidade, mesmo que verificados os requisitos legais, se a alteração pedida for meramente instrumental em relação à solução jurídica pretendida por via do recurso“, razão porque , ainda que ao ad quem incumba apreciar todas as questões que lhe sejam colocadas pelo respectivo recorrente ( cfr. artº 608º,nº2, ex vi artº 663º,nº2, ambos do CPC ) , devem porém tais questões estar “numa relação directa com o aquilo que se pretende obter com o provimento do recurso, pelo que tudo o que seja espúrio e desnecessário ao efeito pretendido não pode, nem deve, ser apreciado. Alinhando por igual entendimento, também o TRP (17) decidiu ( e bem ) que “ Se os factos cuja reapreciação é pretendida não têm a virtualidade de influir na possível solução jurídica do caso, o tribunal ad quem, em estrita observância da regra legal de que são proibidos os actos inúteis (artigo 130º do Código de Processo Civil), deve recusar-se a conhecer dessa matéria juridicamente inócua”. É que, diz-se na douta decisão indicada em último lugar, se a matéria de facto impugnada é inócua , então “não tem aptidão para constituir objecto de uma impugnação da decisão da matéria de facto, já que do que se trata em qualquer caso, não é do apuramento de uma qualquer verdade absoluta ou ontológica, mas sim e de modo mais modesto, de uma verdade factual prática apta a desencadear ou suportar certas consequências jurídicas”. E, ainda o mesmo Tribunal da Relação do Porto, em nova e posterior decisão (18) , refere, “ se a reapreciação de concreta matéria de facto é inócua, à luz das diversas soluções plausíveis das várias questões de direito, e atento o carácter instrumental da reapreciação da decisão da matéria de facto, no sentido de que a reapreciação pretendida visa sustentar uma certa solução para uma dada questão de direito, a inocuidade da aludida matéria de facto justifica que este tribunal indefira essa pretensão, em homenagem à proibição da prática no processo de actos inúteis”. Este entendimento, recorda-se, foi já considerado de “lícito” por parte do STJ, em Ac. de 17/5/2017 (19), nele se decidindo que o princípio da limitação dos actos, consagrado, no artigo 130.º do CPC, para os actos processuais em geral, pode/deve igualmente ser observado no âmbito do conhecimento da impugnação da matéria de facto se a análise da situação concreta evidenciar, ponderadas as várias soluções plausíveis da questão de direito, que desse conhecimento não advirá qualquer elemento factual cuja relevância se projecte na decisão de mérito a proferir” Dito isto, e sendo portanto exigível que subjacente a uma qualquer impugnação de decisão de facto há-de estar sempre a viabilidade e a pertinência de a pretendida modificação da decisão - de facto - proferida pela primeira instância poder contribuir ( claro está, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito ) com relevância para a alteração do julgado, importa de imediato excluir da nossa análise/sindicância os pontos de facto nºs 17, 19 e 20 pela apelante indicados, porque não tem todos eles qualquer relevância para a decisão da causa. O mesmo “desfecho” deve verificar-se com o pretenso ponto de facto nº 16 [ “ O pagamento da renda deveria, em cumprimento do mandato em vigor, ser feito junto do seu representante, neste caso concreto, junto dos seus advogados” ] , porque encerra ele, ostensivamente, mero juízo conclusivo e de natureza jurídica . Neste conspecto , recorda-se que ainda que o actual CPC não inclua uma disposição legal com o conteúdo do artº 646º ,n.º 4 , do pretérito CPC ( o qual considerava não escritas as respostas sobre matéria de direito ), é todavia nossa convicção que tal não permite concluir que pode agora o juiz incluir no elenco dos factos provados meros conceitos de direito e/ou conclusões normativas, e as quais, a priori e comodamente [ porque têm a virtualidade de, por si só, resolverem questões de direito a que se dirigem (20) ], acabem por condicionar e traçar desde logo o desfecho da acção ou incidente, contribuindo – no todo ou em parte - para resolver de imediato o thema decidendum. Seguindo-se agora os pontos de facto nºs 13 e 14, e estando ambos relacionados com os pretensos [ porque remetem ambos para o teor de documentos, prática que consubstancia um hábito ou uso incorrecto (21) e totalmente inútil em sede de resposta a matéria de facto, pois que o documento, por si só, mais não configura do que um mero meio de prova de factos , não sendo ele e a se um facto ] pontos de facto nºs 3.1 e 3.2 - ambos do presente acórdão, pacifico é que integram ambos matéria de facto não controvertida – com relevância para o objecto do processo - e que, ademas, mostra-se amparada em prova documental junta aos autos. Consequentemente, ao elenco dos factos provados e procedendo nesta parte a impugnação, são acrescentados – o que se determina – os seguintes pontos de facto : 3.13 - “ A renda mensal das Lojas 1 e 2 , e identificadas em 3.1 e 3.2, é de € 75,00”; 3.14 - A Autora liquidou as rendas devidas até Dezembro de 2012”. Sendo agora a vez do ponto de facto nº 15 [ “ Os contratos de arrendamento juntos aos autos, quanto ao modo de pagamento das rendas, dispõem que as mesmas deverão ser pagas “ […] nesta cidade, em casa da senhoria, ou de quem a representar, em moeda corrente, e sempre antecipadamente no primeiro dia útil do mês anterior aquele a que disser respeito” ], e mostrando-se parte do mesmo já objecto do ponto de facto nº 3.1. [ “ A fls. 5 e ss. encontra-se cópia de contrato de arrendamento celebrado em 27.9.1939, referente a loja sita no número … da Rua da Prata, sendo a renda paga “em casa da senhoria, ou de quem a representar, em moeda corrente e sempre antecipadamente no primeiro dia útil do mês anterior àquela a que disser respeito.” ], importa tão só aferir se ao ponto de facto nº 3.2. se justifica/impõe conferir uma diversa redacção, passando do seu conteúdo a constar outrossim a forma do pagamento da renda alusiva à loja sita no número 115 e 117. Ora, porque do teor do documento junto a fls. 8 e ss. da pi [ cópia de contrato de arrendamento celebrado em 26.9.1954 referente à loja sita no número … e … da Rua da Prata e a números 34 a 36 da Rua de São Nicolau, com entrada pelo número … da Rua da Prata ] não decorre existir qualquer referência à forma, local e timing para o pagamento da renda, improcede necessariamente a impugnação nesta parte . Por último, sendo finalmente a vez do ponto de facto n.º 18 [ “Após a Recepção da notificação judicial avulsa a Autora foi informada das moradas/contactos da Ré e dos seus legais representantes, conforme notificação judicial avulsa e missiva juntas como documentos números 7 e 8 “ ], e porque de factualidade se trata que encontra respaldo na prova documental junta aos autos [ doc. junto com os articulados ], procedendo nesta parte a impugnação, determina-se que ao elenco dos factos provados seja adicionado o seguinte : 3.15. – “ Com a Recepção da notificação judicial avulsa pela Autora a 10 de janeiro de 2019, passou a mesma a ter conhecimento das moradas/contactos da Ré B “. * 5.2.- Se da decisão de facto proferida pelo tribunal a quo devem fazer parte dois novos factos “ Não provados”. Impetra a apelante que da decisão de facto proferida pelo tribunal a quo devem passar a constar, como NÃO PROVADOS, os seguintes : “ Facto não provado n.º 1: “ Não obstante as diversas tentativas da Autora para que a Ré informasse o IBAN para onde deveria ser transferida a quantia em causa, a mesma, até à data não logrou fornecer essa informação”. Facto não provado n.º 2: “A Ré recusou-se a receber as rendas em atraso e a indemnização igual a 50% do que for devido”. A justificar a alteração pretendida diz a apelante que não logrou a autora juntar qualquer documento do qual resultasse que a Ré tenha recusado receber as rendas nos termos e conforme disposto nos contratos de arrendamento, sendo que , para todos os efeitos, certo é que “contratos dos autos quanto ao modo e local de pagamento das rendas não foram considerados pelo Tribunal a quo “. Ora, porque a factualidade supra aduzida não foi objecto de instrução e, para todos os efeitos, deve considerar-se como permanecendo controvertida [ ainda que susceptível de vir a ser provada ], é óbvio que nenhum sentido faz em reconduzir a mesma ao elenco dos factos Não Provados. Quando muito, e estando em causa factualidade relevante e carecida/necessitada de prova [ cfr. artº 410º do CPC ], sendo o respectivo julgamento imprescindível para a decisão de mérito, então o que importará aferir [ o que nesta sede de impugnação da decisão de facto não cabe apreciar ] é se em rigor não consubstancia o saneador-sentença uma decisão de mérito precipitada , porque proferida em violação do disposto no nº1, alínea b), do artº 595º, do CPC. Sem necessidade de mais considerações, improcede portanto a impugnação dirigida para a decisão de facto proferida pelo tribunal a quo. * 5.3.- Se o ponto n.º 2.12 dos factos provados deverá passar a ter uma diferente redacção. Considera a apelante que a resposta dada ao ponto 2.12 dos factos provados [ “No procedimento especial de despejo n.º 1111/19.4 YLPRT, que a ora ré instaurou contra a ora autora, na contestação, a ré alega no artigo 18.º e 19.º a instauração desta acção e que tem estado a depositar as rendas, juntando cópia de guias de depósito, a fls. 53 e ss.” ], não está correta/precisa, devendo, por isso, ser alterada, impondo-se especificar as datas em que o procedimento especial de despejo foi requerido pela Ré e a contestação/oposição nele deduzida apresentada, respectivamente os dias 29 de Abril de 2019, e 3 de Junho de 2019. Assim, impetra a apelante que o ponto n.º 2.12 dos factos provados deva passar a ter a seguinte redacção: “ No procedimento especial de despejo n.º 1111/19.4YLPRT, requerido pela Ré no dia 29 de Abril de 2019, é referido pela Autora, na oposição apresentada a 3 de Junho de 2019, no art. 18 e 19.º a instauração desta acção e que tem estado a depositar as rendas, juntando cópia de guias de depósito, a fls. 53 e ss. “. Ora, porque a factualidade que pretende a apelante seja integrada no item de facto nº 2.12 e no tocante às datas apenas é susceptível de prova documental, e , porque a atinente prova apenas se mostra feita [ perante o teor do documento nº 2, junto com a contestação ] com referência à data da propositura do procedimento especial de despejo n.º 1111/19.4YLPRT, requerido pela Ré, deve proceder apenas em parte a impugnação da apelante. Destarte, determina-se que o ponto n.º 2.12 dos factos provados passe a ter a seguinte redacção: “ No procedimento especial de despejo n.º 1111/19.4YLPRT, requerido pela Ré no dia 29 de Abril de 2019, é referido pela Autora, na sua oposição e nos seus art. 18 e 19.º a instauração desta acção e que tem estado a depositar as rendas, juntando cópia de guias de depósito, a fls. 53 e ss. “. *** 6. – MOTIVAÇÃO DE DIREITO. 6.1. – Se a sentença recorrida incorre em error in judicando, merecendo ser REVOGADA. Tratando-se a presente acção de uma acção especial de consignação em depósito, regulada nos artºs 916º a 924, do Código de processo civil, recorda-se que foi a mesma julgada procedente logo em sede de Saneador-Sentença, o que equivale a dizer que considerou o Exmº Juiz a quo que , à data da sua prolação, permitia já o estado dos autos e sem necessidade de mais provas conhecer de imediato do mérito da causa. Já em sede de fundamentação de direito, e a justificar a procedência da acção, discorreu o Exmº Juiz a quo, na sentença apelada e em parte nos seguintes temos : “ (…) No caso, a ré comunicou à autora a resolução do contrato de arrendamento e as rendas em dívida, através de notificação judicial avulsa. Todavia, nos termos do disposto no n.º 3, do artigo 1084.º do Código Civil: 3 - A resolução pelo senhorio, quando opere por comunicação à contraparte e se funde na falta de pagamento da renda, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário, nos termos do n.º 3 do artigo anterior, fica sem efeito se o arrendatário puser fim à mora no prazo de um mês. No caso: A autora foi notificada da resolução do contrato em 10.1.2019, no âmbito da notificação judicial avulsa com o n.º 26553/18.9T8LSB, cf. fls. 38 verso. Por carta registada com aviso de recepção assinado em 4.2.2019, a Ilustre Mandatária da Autora informou a Ilustre Mandatária da Ré que a Autora “pretende fazer cessar a mora através do pagamento das rendas vencidas acrescido de indemnização igual a 50% da quantia devida, nos termos e para os efeitos da primeira parte do n.º 1, do 1041.º, e 1042.º do Código Civil. Como tal, solicitamos que nos informe o respectivo IBAN para o qual deverá ser transferida a quantia de €6.795,00 (…), respeitante às rendas em dívida relativas a Janeiro de 2013 a Janeiro de 2019, acrescido de indemnização igual a 50% da quantia devida.”, cf. fls. 80-82. Em 8.2.2019, a autora depositou a quantia de €8.325,00 na Caixa Geral de Depósitos, cf. fls. 82. Em 8.2.2019, a autora instaurou esta acção. Assim, menos de 1 mês após a notificação da resolução do contrato, a autora depositou a quantia cujo montante não foi impugnado pela ré, no seguimento de carta interpelando-a a informar o IBAN para proceder à respectiva transferência. Nos termos do disposto no n.º 1, do artigo 17.º do NRAU, “ O arrendatário pode proceder ao depósito da renda quando ocorram os pressupostos da consignação em depósito, quando lhe seja permitido fazer cessar a mora e ainda quando esteja pendente acção de despejo.” Assim, o arrendatário pode proceder ao depósito da renda quando lhe seja permitido cessar a mora, nomeadamente no prazo de 1 mês após a notificação da resolução do contrato, cf. artigo 1084.º, n.º 3, e artigo 17.º do NRAU. Em conformidade com o legalmente estabelecido, a autora depositou as rendas devidas, acrescidas da indemnização igual a 50% para fazer cessar a mora e tem depositado as rendas subsequentes, cf. artigo 20.º do NRAU. Os termos do depósito respeitam o previsto no artigo 18.º do NRAU. No que respeita à comunicação. Nos termos do disposto no artigo 19.º do NRAU: “1. O arrendatário deve comunicar ao senhorio o depósito da renda. 2. A junção do duplicado ou duplicados das guias de depósito à contestação, ou figura processual a ela equivalente, de acção baseada na falta de pagamento produz os efeitos da comunicação.” Quando a ré pretendeu efectivar a resolução do contrato de arrendamento, no procedimento especial de despejo n.º 1111/19.4YLPRT, na contestação, a ora autora alega no artigo 18.º e 19.º que instaurou esta acção e que tem estado a depositar as rendas, tendo junto cópia de guias de depósito, cumprindo desta forma o disposto no n.º 2, do artigo 19.º do NRAU. Por outro lado, anteriormente, a autora informou a ré da intenção de fazer cessar a mora, solicitando IBAN. Assim, inexiste qualquer falta de informação da ré. Pelo acima exposto, julga-se validamente prestado o depósito das rendas e indemnização destinada a fazer cessar a mora. A circunstância de o pagamento dever ser feito na residência do locador não é de molde a tornar irregular o depósito da renda, salvo o devido respeito por opinião diversa. *** Nos termos do disposto no artigo 846.º do Código Civil, a consignação declarada válida por decisão judicial libera o devedor como se ele tivesse feito a prestação ao credor na data do depósito. A ré não impugnou o montante depositado, antes a sua eficácia liberatória. Todavia, como supra referido, a autora depositou validamente as rendas, acrescida de indemnização igual a 50%. Esta consignação em depósito constituiu facto extintivo das obrigações, cf. artigo 841.º do Código Civil. Importa pois julgar procedente esta acção”. Ora, dissentindo a Ré/apelante do sentenciado [ para tanto considerando vg que : a) Aquando da sua prolação não estava o tribunal em condições de conhecer de imediato do mérito da causa , devendo os autos ter prosseguido para a fase de audiência de discussão e julgamento ; b) que foi a Recorrida que incumpriu a obrigação a que estava vinculada nos termos dos contratos de arrendamento e ao abrigo dos artigos 1041, n.º 1 e 1084.º, nº 3 do CC, por facto alheio à Ré e c), que o depósito não foi comunicado à Recorrente após decorrido o prazo de 1 (um) mês estipulado no artigo 1084.º, n.º 3 do CC e no artigo 19.º do NRAU, logo, não poderá ele ser declarado como tendo eficácia liberatória por violação do disposto no artigo 1084.º, n.º 3 do C.C. e 19.º do NRAU ], vejamos de seguida se tem a mesma razão nas críticas de fundo dirigidas à sentença recorrida. Ora Bem. É consabido que, em face do disposto nos artºs 1022º e 1038º, alínea a), ambos do Código Civil, a renda corresponde à contrapartida paga pelo arrendatário pela cessão do gozo do prédio, sendo um dos elementos essenciais do contrato de arrendamento, sendo o seu pagamento uma das principais obrigações do locatário, a ponto de, “ Constituindo-se o locatário em mora, o locador tem o direito de exigir, além das rendas ou alugueres em atraso, uma indemnização igual a 20 /prct. do que for devido, salvo se o contrato for resolvido com base na falta de pagamento”.[ artº 1041º,nº1, do CC ]. A aludida obrigação, como o refere o artº1039, nº1, do CC [ com a epígrafe de Tempo e ligar do pagamento ] , deve ser efectuado no último dia de vigência do contrato ou do período a que respeita, e no domicílio do locatário à data do vencimento, se as partes ou os usos não fixarem outro regime. Sucede que, como é igualmente consabido, o cumprimento de uma obrigação [ vg a do pagamento da renda ] demanda outrossim a cooperação do credor [ in casu o locador ] , pois que, como o refere expressamente o nº 2, do artº 762º, do CC, “ No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé” e, ademais, diz-nos mais adiante o mesmo diploma ( no artº 813º ), que “ O credor incorre em mora quando, sem motivo justificado, não aceita a prestação que lhe é oferecida nos termos legais ou não pratica os actos necessários ao cumprimento da obrigação”. Ora, é precisamente quando surge uma situação como a referida por último e porque nada justifica que fique o devedor ad aeternum adstrito a uma obrigação fora do seu controlo (22), que surge o remédio da extinção da obrigação através do instituto da CONSIGNAÇÃO EM DEPÓSITO , o qual possibilita a extinção da obrigação , não por via da sua realização ao credor ( cfr. artº 769º do CC ), mas pela sua realização ao consignatário, adquirindo o credor o direito de lhe exigir a respectiva entrega ( cfr. artº 844º, do CC).(23) Ou seja, o instituto da CONSIGNAÇÃO EM DEPÓSITO e em sede de cumprimento pelo locatário da sua obrigação de pagar a renda, não se mostra de todo disponível para o arrendatário sempre que o entender, antes de expediente se trata que apenas lhe lícito usar ( com relevância/eficácia ) em situações legalmente fixadas. É assim que, v.g. no artº 841º do CC [ da Secção II com o titulo de “ Consignação em Depósito “, e sob a epígrafe de “ Quando Tem lugar “ ], consta que : 1. O devedor pode livrar-se da obrigação mediante o depósito da coisa devida, nos casos seguintes: a) Quando, sem culpa sua, não puder efectuar a prestação ou não puder fazê-lo com segurança, por qualquer motivo relativo à pessoa do credor; b) Quando o credor estiver em mora. 2. A consignação em depósito é facultativo”. É assim também que, do disposto no artº 17º, nº1 do NRAU [ Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro - NOVO REGIME DO ARRENDAMENTO URBANO ], consta que : “ O arrendatário pode proceder ao depósito da renda quando ocorram os pressupostos da consignação em depósito, quando lhe seja permitido fazer cessar a mora e ainda quando esteja pendente acção de despejo.”. É ainda assim que do disposto nos artºs 1041, nºs 1 e 2 e, artº 1042º, ambos do CC, decorre, respectivamente, que : Artº 1041º Mora do locatário 1 .Constituindo-se o locatário em mora, o locador tem o direito de exigir, além das rendas ou alugueres em atraso, uma indemnização igual a 20 /prct. do que for devido, salvo se o contrato for resolvido com base na falta de pagamento. 2. Cessa o direito à indemnização ou à resolução do contrato, se o locatário fizer cessar a mora no prazo de oito dias a contar do seu começo. (…) Artº 1042º Cessação da mora 1 - O locatário pode pôr fim à mora oferecendo ao locador o pagamento das rendas ou alugueres em atraso, bem como a indemnização fixada no n.º 1 do artigo anterior. 2 - Perante a recusa do locador em receber as correspondentes importâncias, pode o locatário recorrer à consignação em depósito. Por último, relevante é também o disposto no artº 1048º, do CC, sob a epígrafe de “Falta de pagamento da renda ou aluguer “, e segundo o qual : “ 1 - O direito à resolução do contrato por falta de pagamento da renda ou aluguer, quando for exercido judicialmente, caduca logo que o locatário, até ao termo do prazo para a contestação da acção declarativa, pague, deposite ou consigne em depósito as somas devidas e a indemnização referida no n.º 1 do artigo 1041º . 2- O locatário só pode fazer uso da faculdade referida no número anterior uma única vez, com referência a cada contrato. 3- O regime previsto nos números anteriores aplica-se ainda à falta de pagamento de encargos e despesas que corram por conta do locatário. 4 - Ao direito à resolução do contrato por falta de pagamento da renda ou aluguer, quando for exercido extrajudicialmente, é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 1084. Em termos conclusivos, e como bem se resume em douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto (24) , dir-se-á que ao inquilino é permitido proceder, unilateralmente, ao depósito da renda nas seguintes situações: a) Quando ocorram os pressupostos da consignação em depósito, referido no artº 841º do Código Civil, ou seja: 1) quando, sem culpa sua, o arrendatário não puder efectuar a prestação ou não puder fazê-lo com segurança, por qualquer motivo relativo á pessoa do senhorio; 2) quando o senhorio estiver em mora. b) Quando lhe seja permitido fazer cessar a mora por falta de pagamento de renda, nos termos do artº 1041º ,nº 2 do Código Civil; c) Quando lhe seja permitido fazer cessar o direito à resolução do contrato por falta de pagamento de renda, nos termos do artº 1048º do C.Civil, e ; d) Quando esteja pendente acção de despejo. No essencial, e tal como bem se explica – porque de forma bastante acessível e inteligível – em douto acórdão proferido por este Tribunal da Relação e de 29-03-2007, relatado por GRANJA DA FONSECA (25) -, arrendatário tem, pois, primeiro, que pagar e pagar no tempo e lugar próprios, de tal sorte que não corresponde a cumprimento, se não for conciliatoriamente aceite pelo senhorio, oferecer o arrendatário a prestação em outro lugar, ou em outro tempo. E acrescenta, É isto, aliás, o que decorre já do princípio geral contido no artigo 762º, n.º 1 CC. Se o arrendatário estiver em mora, há-de oferecer ainda, além das rendas em atraso, uma indemnização correspondente a 50% das rendas devidas, nos termos do preceituado no artigo 1041º, n.º 1 CC. O arrendatário não poderá, por conseguinte, depositar, sem previamente ter tentado em vão pagar, no tempo e lugar próprios, integralmente o montante exigível. Se depositar fora deste condicionalismo, arrisca-se a ver impugnado o depósito e a ser declarado ineficaz como meio de extinção da obrigação, tendo de arcar com as custas e as despesas feitas com o depósito (artigo 1028º, n. º 2 CPC). Se , porém, tiver oferecido o pagamento e este tiver sido recusado pelo senhorio, o arrendatário não será obrigado a depositar a renda recusada, mas terá geralmente vantagem em lançar mão da consignação em depósito . É que, com ela e só com ela, extingue a sua obrigação de pagamento (artigo 841º CC) e liberta-se, deste modo, de consequências prejudiciais que possam advir da circunstância de ainda não ter cumprido embora sem culpa sua ou por mora creditoris. Aqui chegados , temos assim que, sendo a consignação em depósito um remédio [ com o desiderato de extinguir a sua obrigação ] à disposição do devedor/locatário, mas facultativo, certo é que apenas pode ele pelo devedor/locatário ser “tomado” quando para tanto dispõe de competente fundamento legal, a saber, verificar-se uma qualquer situação das que se mostram previstas no artº 841º do CC [ acima transcrito ]. Daí que, uma vez efectuada a consignação em depósito, pode este último pelo credor/locador ser impugnado, podendo no âmbito da oposição/impugnação socorrer-se de uma de três razões [ cfr. artº 919º, do CPC ], a saber: a) Por ser inexacto o motivo invocado; b) Por ser maior ou diversa a quantia ou coisa devida; c) Por ter o credor qualquer outro fundamento legítimo para recusar o pagamento. Em suma, e socorrendo-nos das doutas conclusões plasmadas em acórdão já “vetusto” mas não desactualizado do tribunal da Relação do Porto (26) , temos assim que “ A consignação em depósito consiste num modo de extinção das obrigações que se apresenta normalmente numa dupla fase: substantiva e processual. Substantiva, nos termos do artigo 841 do Código Civil, quando o devedor efectua o depósito judicial da coisa devida, feito à ordem do credor. Processual, nos termos dos artigos 1024 e seguintes do Código de Processo Civil e que se destina a averiguar da verificação dos pressupostos que permitem a consignação e que são os seguintes: a existência de uma obrigação; a impossibilidade do devedor, sem culpa sua, efectuar a prestação por qualquer motivo relativo à pessoa do credor; e a existência de mora do credor.” Por outra banda, e no que ao ónus de alegação e prova da verificação dos pressupostos que permitem a consignação concerne, pacífico é o entendimento da nossa jurisprudência (27) que recai/incide ele no devedor/depositante, a ponto de, não logrando ele levar a bom porto a sua obrigação, a improcedência da acção mostra-se inevitável. Ou seja, e tal como se discorre no acórdão proferido por este tribunal da Relação em 29/3/2007 e já nosso conhecido, “ é ao inquilino que incumbe provar a existência de qualquer dos casos em que lhe é permitido depositar as rendas, não dependendo o depósito do livre arbítrio do inquilino em escolher o fundamento”. Perante o acabado de expor, e descendo agora ao concreto, constata-se que a justificar o depósito alegou a arrendatária que o seu desconhecimento relativamente à pessoa do senhorio apenas cessou quando a 10 de Janeiro de 2019 veio a tomar conhecimento de uma Notificação Judicial Avulsa apresentada pela ora Ré e que lhe comunicava a resolução dos contratos de arrendamento referentes à Loja 1 e 2, por falta de pagamento da renda, e que a dívida resultante da falta de pagamento das rendas vencidas, acrescidas de juros de mora à taxa legal em vigor, correspondia ao montante total de € 6.638,58 , sendo € 4.500,00 referente às rendas vencidas e não pagas e € 2.138,58 aos juros de mora vencidos. Confrontada com a referida notificação, e pretendendo fazer cessar a mora e obstar aos efeitos da resolução do contrato, alega a autora/inquilina que de pronto solicitou à Ré que informasse o IBAN para o qual deveria ser transferida a quantia de € 6.975,00, respeitantes às rendas em dívida relativas a Janeiro de 2013 a Janeiro de 2019, acrescido de indemnização igual a 50% da quantia devida. Porém, remata a autora, a verdade é que não obstante as diversas tentativas efectuadas para que fosse informada – pela ré - do IBAN para onde deveria ser transferida a quantia em causa, não veio a Ré, até à data, a fornecer tal informação e, consequentemente, outra opção não teve senão avançar com a consignação em depósito, em conformidade com os preceitos previstos no n.º 2 do art. 1042.º e n.º 1 do art. 1048.º do C.C. Em rigor, a versão da autora, a provar-se, integra fattispecie susceptível de preencher o Tatbestand do artº 813º, in fine do CC [ o qual reza que “ O credor incorre em mora quando, sem motivo justificado, não aceita a prestação que lhe é oferecida nos termos legais ou não pratica os actos necessários ao cumprimento da obrigação " ] , e , consequentemente , confere à autora o direito de lançar mão da consignação em depósito nos termos do artº 841º, nº1, alínea b), do CC. Já a Ré, confrontada com a versão da autora, vem no essencial e na sua contestação, dizer o seguinte: 19º A Autora fundamenta a alegada recusa da Ré em receber as rendas no facto de não ter disponibilizado o IBAN. 20.º Não tem razão a Autora. 21.º Pois, não só não é verdade que a Ré se tenha recusado a prestar o IBAN, 22.º como na verdade a Autora não carecia do NIB para cumprir a obrigação a que estava adstrita. 23.º Pois, conforme supra se evidenciou e resulta do contratualmente estabelecido, as rendas seriam pagas “[…] nesta cidade, em casa da senhoria, ou de quem a representar, em moeda corrente, e sempre antecipadamente no primeiro dia útil do mês anterior aquele a que disser respeito”. 24.º A verdade é que, após ter recebido a notificação judicial avulsa junta aos autos – na qual consta a morada da Ré – a Autora ficou habilitada para pagar as rendas devidas nos termos contratualizados. 25.º Nos termos contratualizados, a Autora deveria ter pago as rendas na casa da senhoria, ora Ré, o que não fez. 26.º A Autora nunca se deslocou a casa da Ré para proceder ao pagamento das rendas devidas. 27.º Do que resulta que a Ré não impediu a Autora de cumprir a obrigação a que estava vinculada. 28.º Contrariamente ao que pretende fazer crer a Autora, não resulta dos contratos que o pagamento devesse ser efectuado por transferência bancária “. Conhecidas as versões da autora e da ré – acabadas de elucidar -, prima facie e à primeira vista tudo aponta para que a da autora tenha sido objecto de efectiva impugnação pela Ré e, consequentemente, permanecendo controvertida a versão da primeira e da mora accipiendi, não estava o Juiz findos os articulados em condições de conhecer de imediato do mérito da causa, antes se impunha o prosseguimento dos autos – nos termos do disposto no artº 920º,nº1, in fine, do CPC – com vista a possibilitar a instrução da causa direccionada para a prova da exactidão do motivo invocado para o depósito e consequente eficácia liberatória do mesmo [ artºs 919º, alínea a) e 920º,nº1, ambos do CPC ]. A nosso ver, porém, uma melhor e mais atenta/rigorosa análise da versão da ré, obriga/justifica a concluir que em rigor não contaria/impugna a Ré a versão apresentada pela autora a justificar a alegada inevitabilidade de lançar mão da consignação em depósito. Vejamos. É sabido que para a formação da convicção do tribunal importa que o juiz tenha em atenção também a valoração do comportamento processual da parte, maxime a forma e o modo como o réu, ao contestar, toma [ ou não ] posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor - cfr. artº 574º, nº1, do CPC. Neste conspecto, recorda-se que, dos nºs 1 e 2, do artº 574º, do CPC, decorre que “ o contestar, deve o réu tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor”, sendo que, “Consideram-se admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, salvo se estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto, se não for admissível confissão sobre eles ou se só puderem ser provados por documento escrito; a admissão de factos instrumentais pode ser afastada por prova posterior”. Em face do referido, e não obstante se reconhecer que, paulatinamente [ v.g. desde a redacção do artº 490º, do pretérito CPC, com as alterações introduzidas pelo DL nº 329-A/95,de 12/12, cujos nºs 3 e 5, proibiam a contestação por negação, mas admitiam já a impugnação, total ou parcial, por simples menção dos números dos artºs da petição inicial ], tem o legislador vindo a introduzir alguma maleabilização em sede de cumprimento do ónus da impugnação, de forma a aproximar a verdade processual da verdade material subjacente, o certo é que, actualmente, como vimos, está ainda o réu sujeito à obrigação de tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada na petição, o que equivale a dizer que, para valer como tal – como efectiva impugnação – , “obrigado” está o impugnante a revelar de forma clara e sem ambiguidades ou meias palavras qual a sua posição relativamente aos factos que pretende impugnar. Servindo-nos de seguida das pertinentes e sábias considerações tecidas pelo STJ em douto Ac. proferido (28), ao utilizar o legislador um conceito indeterminado – “tomar posição definida” -, só caso a caso, perante as particularidades de cada hipótese concreta, é possível ajuizar acerca da efectiva observância pela parte desta norma adjectiva, ou seja, “A posição definida a que a lei alude pode assumir os contornos, a intensidade, a "cor" mais diversa, tudo dependendo, desde logo, quer da estruturação da acção em termos de facto, quer da própria estratégia de defesa delineada pelo réu”, sendo que, “se pode reconhecer-se que em dada situação uma contestação por negação ou de todo em todo genérica não envolve infracção do ónus estabelecido na lei, terá também de admitir-se que noutras situações se imporá uma resposta diametralmente oposta”. O acabado de expor , vem bem a propósito da alegação da autora de que, quando confrontada com a notificação avulsa da Ré identificada em 3.7., e pretendendo fazer cessar a mora e obstar aos efeitos da resolução do contrato, solicitou à Ré que informasse o IBAN [ para o qual deveria ser transferida a quantia de € 6.975,00, respeitantes às rendas em dívida relativas a Janeiro de 2013 a Janeiro de 2019, acrescido de indemnização igual a 50% da quantia devida ], informação que porém não lhe foi prestada até à data em que procedeu à consignação em depósito. Ora, tal alegação ,em rigor, não se mostra contrariada pela Ré, antes se impõe considerar como PROVADA. Desde logo, mostra-se efectivamente provado que [ item de facto nº 3.8. ] “ Por carta registada com aviso de recepção assinado em 4.2.2019, a Ilustre Mandatária da Autora informou a Ilustre Mandatária da ré que a autora “ pretende fazer cessar a mora através do pagamento das rendas vencidas acrescido de indemnização igual a 50% da quantia devida, nos termos e para os efeitos da primeira parte do n.º 1, do 1041.º, e 1042.º do Código Civil. Como tal, solicitamos que nos informe o respectivo IBAN para o qual deverá ser transferida a quantia de € 6.795,00 (…), respeitante às rendas em dívida relativas a Janeiro de 2013 a Janeiro de 2019, acrescido de indemnização igual a 50% da quantia devida”. Depois, dizendo a Ré que a autora fundamenta a alegada recusa da Ré em receber as rendas no facto de não ter disponibilizado o IBAN, vem refutar um tal comportamento, invocando que “não é verdade que a Ré se tenha recusado a prestar o IBAN. Ocorre que, em rigor, a autora não invoca no requerimento inicial uma qualquer recusa [ rectius comportamento activo e/ou omissão dolosa manifestada/comunicada pela Ré á autora ], antes limita-se a invocar um comportamento passivo da Ré [ mera inactividade ou omissão da conduta adequada ], o que são coisas diversas. E, invocando a autora um mero comportamento passivo da Ré [ uma mera “não resposta” ], então uma impugnação relevante exigia – como posição definida – que a Ré, negando-a, logo motivasse tal afirmação, esclarecendo [ o que não fez ] v.g. que respondeu à carta da autora . Ora, não apenas a Ré não alega que prestou tal informação á autora, como, ademais – o que igualmente confere credibilidade/verosimilhança à afirmação da autora de que a Ré não lhe deu a informação solicitada – vem justificar-se que a Autora não carecia do NIB para cumprir a obrigação a que estava adstrita. Em face do acabado de expor, considerando que se é certo que não é pelo facto de estarmos perante um ‘facto negativo’ [ o de que a Ré não prestou a informação solicitada pela autora na carta identificada em 3.8. ] que se inverte o ónus da prova, nem tão pouco pela dificuldade que isso naturalmente representa, justifica-se ainda assim uma menor exigência do julgador quanto à prova dos mesmos (29), tudo conjugado e não olvidando outrossim a pertinência de utilização das presunções judiciais e as máximas da experiência em sede de julgamento de facto, temos por adequado considerar [ nos termos do nº1, do artº 662º, do CPC ] como facto provado/não impugnado o de que “a Ré não respondeu à comunicação da autora identificada em 3.8., fornecendo-lhe o IBAN para onde deveria ser transferida a quantia”. Aqui chegados, e incidindo agora nossa atenção sobre o fundamento essencial pela ré/apelante invocado na sua impugnação e a corroborar a alegada “ inexactidão do motivo invocado” , vejamos de seguida se é ele idóneo para os efeitos pretendidos. Em rigor, diz a ré que não carecia a autora do NIB para cumprir a obrigação a que estava adstrita, e isto porque mostra-se acordado contratualmente que as rendas seriam pagas “[…] nesta cidade, em casa da senhoria, ou de quem a representar, em moeda corrente, e sempre antecipadamente no primeiro dia útil do mês anterior aquele a que disser respeito”. Efectivamente, provado se mostra que [ item 3.1.] no tocante ao contrato de arrendamento celebrado em 27.9.1939, referente a loja sita no número 119 da Rua da Prata, a renda é paga “em casa da senhoria, ou de quem a representar, em moeda corrente e sempre antecipadamente no primeiro dia útil do mês anterior àquela a que disser respeito. Ocorre que [ apesar de não resultar da factualidade assente que a forma de pagamento da renda seria semelhante em relação ao contrato de 26.9.1954 , admite-se que a ré o poderia provar, prosseguindo dos autos para a instrução ], prima facie, a cláusula contratual pela ré invocada apenas diz respeito ao pagamento da renda stricto sensu, que não ao pagamento de uma qualquer indemnização devida “nos termos e para os efeitos da primeira parte do n.º 1, do 1041.º, e 1042.º do Código Civil”. Logo, por si só, não é o teor da cláusula contratual pela ré invocada categórica e suficiente para afastar in limine o motivo pela autora invocado para a consignação. Mais decisivo, todavia, para desvalorizar a cláusula contratual [ aposta em contrato de 27.9.1939 ! ] pela ré invocada em sede de observância do disposto a alínea a), do artº 919º, do CPC, é o facto de, a mesma, dispor que a renda é paga “em casa da senhoria, ou de quem a representar, em moeda corrente . Ora, se atentarmos ao valor total a pagar pela autora à Ré [ a €8.325,00 ] e, se não olvidarmos que, com a Lei nº 92/2017 , de 22/8, passou o artº 63º-E, da Lei Geral Tributária, a dispor nos seus nº 1, que : 1 - É proibido pagar ou receber em numerário em transações de qualquer natureza que envolvam montantes iguais ou superiores a (euro) 3 000, ou o seu equivalente em moeda estrangeira. 2 - Os pagamentos realizados pelos sujeitos passivos a que se refere o n.º 1 do artigo 63.º-C respeitantes a facturas ou documentos equivalentes de valor igual ou superior a (euro) 1 000, ou o seu equivalente em moeda estrangeira, devem ser efetuados através de meio de pagamento que permita a identificação do respectivo destinatário, designadamente transferência bancária, cheque nominativo ou débito directo. (…)”, Convenhamos que o fundamento pela ré invocado para afastar/impugnar o motivo do depósito pela autora efectuado não faz muito sentido. Ademais, e como com total pertinência chama à atenção DIOGO CASTANHEIRA PEREIRA (30), justifica-se que, na dúvida, a consignação em depósito funciona em favor debitoris, ou seja, “ Basta que a situação de impossibilidade ou de incerteza seja plausível, em termos objectivos ou sempre que, dadas as circunstância, ela não possa deixar de se impor ao espírito do devedor, para que a consignação seja possível”. Sem necessidades de mais considerações, importa pois considerar que dispunha a autora de fundamento substantivo válido para proceder à consignação em depósito, sendo que, como bem avisa PINTO FURTADO (31), tem precisamente o referido instituto por finalidade específica querer o devedor livrar-se da obrigação de pagamento das rendas cujo recebimento foi recusado, nos termos em que as deposita “. * 6.2. - Se ao depósito pela autora efectuado não poderá ser conferida eficácia liberatória. A justificar a não atribuição de eficácia liberatória ao depósito da autora , invoca a Ré que incorreu a primeira em violação do disposto no artigo 1084.º, n.º 3 do C.C. e 19.º do NRAU, porquanto a consignação efectuada não lhe foi comunicada após decorrido o prazo de 1 (um) mês estipulado no artigo 1084.º, n.º 3 do CC e no artigo 19.º do NRAU. Consequentemente, esgrime a apelante que mal andou a primeira instância em admitir o depósito em causa como consubstanciando meio eficaz de extinção da obrigação de pagamento das rendas e respectiva penalização a que estava adstrita a autora, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 1041.º, n.º 1 e 1084.º, n.º 3 do CC. Quid júris? Diz-nos o artº 1084.º, n.º 3 do CC, que “ A resolução pelo senhorio, quando opere por comunicação à contraparte e se funde na falta de pagamento da renda, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário, nos termos do n.º 3 do artigo anterior, fica sem efeito se o arrendatário puser fim à mora no prazo de um mês”. Por sua vez, decorre dos artºs 17º e 19º, ambos do NRAU, que “ O arrendatário pode proceder ao depósito da renda quando ocorram os pressupostos da consignação em depósito, quando lhe seja permitido fazer cessar a mora e ainda quando esteja pendente acção de despejo” [ artº 17º,nº1, do NRAU ] e que “ O arrendatário deve comunicar ao senhorio o depósito da renda” [ artº 19º,nº1, do NRAU ], sendo que “ A junção do duplicado ou duplicados das guias de depósito à contestação, ou figura processual a ela equivalente, de acção baseada na falta de pagamento produz os efeitos da comunicação” [ artº 19º,nº2, do NRAU ]. A propósito da comunicação a que alude o artº 19º,nº1, do NRAU , certo é que não prevê a lei qualquer prazo para o efeito [ cfr PINTO FURTADO (32) ], e ,consequentemente, e no entender de SOARES MACHADO e REGINA SANTOS PEREIRA (33), “parece ter-se tornado facultativa a comunicação enviada por carta, permitindo um comportamento omissivo que não abona a boa fé dos comportamentos conflituais”. Isto dito, e tendo presente a factualidade provada, pacífico nos parece que aponta a mesma [ itens de facto nºs 3.7.,3.8.e 3.9. ] para que tenha a arrendatária/apelada posto fim à mora [ debendi ] no prazo de um mês” após a comunicação da resolução do contrato pela senhoria e, para todos os efeitos, deu também a conhecer à mesma senhoria a efectivação da consignação/depósito [ como refere o tribunal a quo na decisão apelada, “quando a ré pretendeu efectivar a resolução do contrato de arrendamento, no procedimento especial de despejo n.º 1111/19.4YLPRT, na contestação, a ora autora alega no artigo 18.º e 19.º que instaurou esta acção e que tem estado a depositar as rendas, tendo junto cópia de guias de depósito, cumprindo desta forma o disposto no n.º 2, do artigo 19.º do NRAU” ] , a apelação só pode improceder, impondo-se a confirmação do julgado. Em suma, o recurso interposto por B improcede. *** 5.- Sumariando ( cfr. nº 7, do artº 663º, do CPC)-acima transcrito. em moeda estrangeira”. *** 6. - Decisão. Em face de tudo o supra exposto, acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa , em , julgando improcedente a apelação interposta pela Ré B: 6.1. - Alterar parcialmente a decisão de facto proferida pelo tribunal a quo; 6.2. – Confirmar ainda assim a Sentença recorrida *** Custas pela recorrente/apelante. *** (1) Cfr. o Ac. do STJ de 5/5/2005, in www.dgsi.pt. (2) Cfr. o Prof. José Alberto dos Reis, in C. Proc. Civil anotado, V , Coimbra Editora, 1984, pág.139 a 141; Prof. Antunes Varela e Outros, in Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág. 687 a 689 e Luís Filipe Brites Lameiras, in Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36. (3) Prof. José Alberto dos Reis, ibidem, pág.140. (4) In Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Editora Lex, 1997, pág. 221. (5) In Acórdão de 20-01-2015, proferido no Processo nº 2996/12.0TBFIG.C1, sendo Relator HENRIQUE ANTUNES e acessível em www.dgsi.pt. (6) Cfr. Antunes Varela e outros, in Manual de Processo Civil, 1984 , Coimbra Editora, págs. 668 e segs.. (7) Cfr. Luís Filipe Brites Lameiras, in Notas Práticas Ao Regime dos Recursos Em Processo Civil, 2ª Edição, Almedina, pág. 33. (8) Cfr. v.g. o Ac. do STJ de 6/5/2004, disponível in www.dgsi.pt. (9) In Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, pág. 670. (10) In Código do Processo Civil Anotado, vol.V, Coimbra Editora, págs. 143-145. (11) Cfr. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, Juiz-Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, in sentença Cível, texto-base da intervenção efectuada nas “Jornadas de Processo Civil” organizadas pelo CEJ, em 23 e 24 de Janeiro de 2014.). (12) Cfr. Prof. José Alberto dos Reis, in Processos Especiais, Vol I, Coimbra, 1982, pág. 340. (13) Ibidem, pág. 341. (14) Cfr. Acórdão de 22-02-2007 do Tribunal da Relação de Lisboa , proferido no Processo nº 8592/2006-2, e acessível em www.dgsi.pt (15) De 20-06-1996, proferido no Proc. nº 9630380, e disponível in www.dgsi.pt. (16) Ac. de 14/3/2013, Proc. nº 933/11.9TVLSB-A.L1-2, e disponível in www.dgsi.pt. (17) Ac. de 17/3/2014, Proc. nº 7037/11.2TBMTS-A.P1, e disponível in www.dgsi.pt. (18) Ac. de 19/5/2014, Proc. nº 2344/12.0TBVNG-A.P1, e disponível in www.dgsi.pt. (19) In Proc. nº 4111/13.4TBBRG.G1.S1, sendo Relatora a Exmª Juiz Conselheira FERNANDA ISABEL PEREIRA, e , no mesmo sentido, também os Acs. do STJ de 23/1/2020 [ Proc. nº 4172/16.4T8FNC.S1, sendo Relator o Exmº Juiz Conselheiro TOMÉ GOMES ] e de 28/1/2020 [ Proc. nº 287/11.3TYVNG.G.P1.S1, sendo Relator o Exmº Juiz Conselheiro PINTO DE ALMEIDA ], todos eles disponíveis em www.dgsi.pt. (20) Cfr. Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, vol. 2°, 605, e ,de entre muitos outros, os Acs. do STJ de 9/9/2014 ( Proc. nº 5146/10.4TBCSC.L1.S1), de 14/1/2015 ( Proc. nº 488/11.4TTVFR.P1.S1), de 29/4/2015 ( Proc. nº 306/12.6TTCVL.C1.S1) e de 14/1/2016 ( Proc. Nº 1391/13.9TTCBR.C1.S1), todos eles disponíveis in www.dgsi.pt. (21) Vide v.g. A. Santos Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, Almedina , 2010 , 3ª Edição, pág.334, e Acórdão do STJ de 10/7/2008, proferido no Processo nº 08A1939 e relatado por Urbano Dias , estando ele disponível in www.dgsi.pt. (22) Cfr. DIOGO CASTANHEIRA PEREIRA, em PROCESSOS ESPECIAIS, VOL. I 2020, AADL, pág.142. (23) Cfr. DIOGO CASTANHEIRA PEREIRA , ibidem pág.142. (24) Ac. de 28-04-2009, Proc. nº 418/08.0TJPRT.P1, e disponível in www.dgsi.pt. (25) Proferido no Processo nº 9630380, e disponível in www.dgsi.pt. (26) Ac. de 20-06-1996, Proc. nº 9630380, e disponível in www.dgsi.pt. (27) Cfr., de entre muitos outros, os Acs. do Tribunal da Relação do Porto de 28-04-2009 [ proferido no Proc. nº 418/08.0TJPRT.P1 ]e de 13-05-1999 [ proferido no Proc. nº 418/08.0TJPRT.P1 ], ambos disponíveis in www.dgsi.pt. (28) Ac. de 14/12/2004, Proc. nº 04A4044, sendo Relator o Exmº Cons. Nuno Cameira, e in www.dgsi.pt. (29) Vide Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 26/10/2010, proferido no Processo nº 107/08.6TBAMR-A.G1 e in www.dgsi.pt. (30) ibidem pág.144. (31) Em Manual de Arrendamento Urbano, Almedina, Vol. I, 5 ª Edição, págs. 548. (32) Ibidem, págs. 546/547. (33) Em Arrendamento Urbano – Novo Regime do Arrendamento Urbano Comentado e Anotado, Livraria Petrony Editores, 2006, pág. 6. *** Lisboa, 8/10/2020 António Manuel Fernandes dos Santos Ana de Azeredo Coelho Eduardo Petersen Silva |