Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ANA RESENDE | ||
Descritores: | EMPREITADA DESISTÊNCIA DEFEITO DA OBRA DIREITO DE ACÇÃO CADUCIDADE RESOLUÇÃO DO CONTRATO NULIDADE DE SENTENÇA EXCEPÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 01/29/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Parcial: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | 1. A desistência da empreitada configura-se como uma faculdade que a lei coloca ao livre arbítrio do dono da obra, não sendo passível de apreciação judicial, realizando-se a todo o tempo. 2. A pretensão deduzida pelos donos da obra, pedindo a resolução do contrato, contraria, de forma manifesta, a possível efetivação de uma desistência por parte daqueles. 3. A existência de defeitos da obra, mesmo que detetada antes do fim da obra não merece uma consideração autónoma, face à obrigação principal a que se encontra adstrito o empreiteiro, que se prende com a execução da obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela ou a sua aptidão para o uso ordinário ou fim previsto no contrato. 4. Visando-se o cumprimento da prestação por parte do empreiteiro, no âmbito de tal realização deve-se considerar a necessidade de suprir eventuais deficiências encontradas. 5. O fundamento para a resolução do contrato traduz-se no facto do não cumprimento, incluindo-se no mesmo o incumprimento temporário (mora), quando se converta num não cumprimento definitivo derivado da perda de interesse na prestação, ou da falta de realização no prazo razoável, fixado para o efeito pelo credor, bem como nos casos em que, sendo ainda possível a prestação com interesse para o credor, o devedor afirma o propósito de não querer cumprir. 6. A perda do interesse do credor deve ser apreciada de forma objetiva, no atendimento de um critério de razoabilidade comummente aceite, evitando-se que o devedor fique sujeito aos caprichos do credor. 7. Considerando o decurso de vários anos, estando demonstrado um aumento médio relevante dos preços de matérias e mão de obra, a perda de interesse pela empreiteira revela-se como objetivamente válida. (Sumário do Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | ACORDAM NA 7ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I - Relatório 1. A e marido B demandaram C SA, pedindo que a R. seja condenada a eliminar os defeitos e finalizar a obra no prazo de 5 meses, sob pena da obrigação se ter como definitivamente incumprida se não se verificar o seu cumprimento no prazo cominado, e consequentemente, em execução de sentença, recorrer a terceiros para a eliminação dos defeitos, cumprindo-se o restante regime legal aplicável. 2. Alegam para tanto que outorgaram com a R. em 29 de novembro de 1996 um contrato que denominaram de empreitada, destinada à construção de uma moradia, até ao dia 29 de novembro de 1997. Na sequência de ação judicial interposta, e decidido que a R. procedesse à eliminação dos defeitos da obra, reiniciou os trabalhos que suspendera em 22.07.2007, sendo que a mesma além de executada defeituosamente não se encontra concluída. 3. Citada, a R. veio contestar, pedindo que sejam julgadas procedentes as exceções do caso julgado, da desistência dos AA, da revogação ou resolução do contrato de empreitada, da caducidade do direito de denúncia de defeitos e do direito de ação, bem como a exceção do não cumprimento do contrato. 4. Os AA vieram responder. 5. Foi julgada procedente a exceção do caso julgado, tendo por Acórdão desta Relação sido a mesma revogada e ordenado o prosseguimento dos autos. 6. Em sede de despacho saneador foram julgadas improcedentes as exceções da desistência dos AA e da caducidade da denúncia dos defeitos e do direito de ação. 7. Inconformada veio a R. interpor recurso de apelação, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: à (…) 8. Nas contra-alegações apresentadas pelos AA, pronunciaram-se os mesmos no sentido de ser mantido o despacho recorrido, de forma a serem ressarcidos dos graves prejuízos consequentes à atividade danosa da R. 9. A R. veio deduzir o articulado superveniente de fls. 504 e seguintes, não admitido por despacho de fls. 592 e seguintes. 10. Inconformada veio a R. interpor recurso de agravo, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: · (…) 11. Nas contra-alegações produzidas pelos AA., pronunciaram-se os mesmos pela manutenção do despacho recorrido. 12.Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou procedentes as exceções invocadas pela R. de resolução do contrato de empreitada e de exceção do não cumprimento do contrato, julgando a ação improcedente, absolvendo a R. dos pedidos que contra ela formularam os AA. 13. Inconformados, vieram os AA interpor recurso de apelação, formulando nas suas alegações, as seguintes conclusões: ü (…) 14. Nas contra-alegações apresentadas a R. formulou as seguintes conclusões: I. (…) 15. Cumpre apreciar e decidir. * II – Os factos Na sentença sob recurso foram considerados como provados os seguintes factos: A)Por documento escrito datado de 29/11/1996, os AA. celebraram com a R. um acordo denominado “Contrato de Empreitada”, nos termos do qual esta declarou proceder à construção de uma moradia, sita …. e os AA. declararam proceder ao pagamento de 36.420.254$00 (trinta e seis milhões, quatrocentos e vinte mil, duzentos e cinquenta e quatro escudos) – al. A) dos factos assentes. B) Na cláusula 8. do referido acordo, ficou estipulado que “no final de 1 ano será feita entrega definitiva da obra” – al. B) dos factos assentes. C) Em 22/07/1997, a R. elaborou e enviou aos AA. um documento denominado “Auto de Suspensão de Trabalhos” do qual consta o seguinte teor: “(…)Tendo-se verificado discrepâncias entre o projeto, objeto do contrato e o projeto de execução, o dono da obra não concordou com este (…). Também o dono da obra não concorda com alguns dos pormenores de execução que já se encontram executados. Em reunião entre o dono da obra, o empreiteiro e o arquiteto autor e ainda o Sr. Advogado …, este por parte do dono da obra, no passado dia 11 do mês em curso, ficou deliberado que o empreiteiro iria executar um beirado conforme vontade expressa do dono da obra, afirmando o empreiteiro que tal não era o constante do projeto de execução, mas cedia no intuito de ultrapassar a crise de entendimento. Novas questões foram levantadas, as quais dizem respeito a peças do projeto de execução, as quais e enquanto não forem devidamente esclarecidas e aceites pelas partes, é impossível o prosseguimento da obra. Solicita o empreiteiro que: - Seja aprovado ou alterado de comum acordo o projeto de execução; -Seja nomeado um fiscal técnico para dialogar e resolver pormenorização da obra. Logo que se verifiquem satisfeitas estas questões, a obra será incrementada de acordo com o ritmo previsto para a obra.” – al. C) dos factos assentes. D) Após o que os AA. instauraram ação declarativa de condenação contra a ora R. e contra a sociedade “M. , Arq. e Eng., Lda.”, pedindo a declaração de resolução do contrato de empreitada e a condenação solidária das RR. a restituírem-lhes a quantia de 15.079.745$00, a indemnizarem os AA. dos prejuízos sofridos pelo atraso na conclusão da obra e a suportarem todos os custos na eliminação dos defeitos e na conclusão da obra; em alternativa, pediram os AA. a condenação das RR. a suprirem os defeitos elimináveis e a construírem de novo na parte não suprível – al. D) dos factos assentes. E) A referida ação correu seus termos sob o n.º 11/1998 no 4.º Juízo Cível do Tribunal Judicial – al. E) dos factos assentes. F) No âmbito da referida ação judicial, em 4/11/2002, foi proferida sentença a absolver os RR. do pedido de declaração de resolução do denominado contrato de empreitada e a condenar os AA. no pedido reconvencional deduzido pela 2.ª R – al. F) dos factos assentes. G) Tal decisão foi confirmada, em 4/3/2004, por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa – al. G) dos factos assentes. H) Na sentença proferida no processo n.º … do 4.º Juízo Cível do Tribunal Judicial, foram considerados provados, entre outros, os seguintes factos: “A) Por documento escrito a 29 de novembro de 1996, os AA. celebraram com a 1.ª R. um contrato de empreitada para construção de uma moradia no…., propriedade dos mesmos Autores. B) A moradia a construir foi projetada pela 2.ª R, a sociedade M. - Arquitetura e Engenharia constituída por amigos dos administradores da 1.ª R e que foi quem recomendou esta aos donos da obra. C) O processo de construção tem o n.º …. da CM tendo a licença de construção sido emitida em 23/10/1996, sob o n.º ../96. D) O valor da empreitada acabou por atingir 51.500.000$00 dos quais os autores pagaram à 1.ª R. a título de adiantamento 15.079.746$00. (…) G) A empreitada começou nos últimos dias de novembro de 1996. H) A implantação da moradia, prevista no projeto inicial, não foi respeitada. J) O edifício foi implantado de forma diferente, avançando cerca de 4 metros no terreno. L) Os autores concordaram com a feitura de um projeto de alteração a apresentar na CM na sequência do facto referido em J) elaborado pela segunda ré. M) Os autores efetuaram pagamento de duas situações de trabalho nos valores de 7.142.173$00 e 3.146.333$00 e deduzido 5% em cada uma despenderam 6.836.952$00 e 3.270.336$00. N) No fim de abril de 2007, a 1.ª ré já havia recebido mais de metade do valor real da empreitada (25.187.034$00 para 51.500.000$00). O) Os autores concordaram na eliminação do projetado aproveitamento do sótão. P) Dá-se por reproduzido o conteúdo do doc. n.º 8 junto com a PI. Q) O pilar P14 previsto no projeto inicial aprovado pela CM foi eliminado. R) No mesmo vão de janela do 1.º andar, o pilar P12 apresenta a armadura sem qualquer recolhimento em virtude de ter sido feito um roço com o único intuito de se poder fazer o assentamento da caixa de estores. S) O pilar P20 previsto no projeto inicial aprovado pela CM foi eliminado. T) O Pilar P19 mudou de posição em relação ao projeto inicial de estruturas aprovado pela CM. U) Foram detetadas zonas de betão com ferro à vista e em estado de oxidação. (…) 1.º O edifício foi implantado de forma diferente, avançando cerca de 4 metros no terreno, não alterando a sua funcionalidade, senão no acesso à garagem por alteração dos raios da curvatura. 3.º No fim de abril de 1997, há havia sido pago o total de 25.187.034$00, o qual representa 48,9% da empreitada mas a parcela de 15.079.746$00 era um adiantamento não tendo correspondência com os trabalhos efetuados, porque respeita a 30% com o início dos trabalhos. 4.º A 1.º Ré, descontando 1,5 a 3 cm para acabamentos, as diferenças nas medidas não ultrapassam os 6 cm, só na escada esta diferença é de 15 cm. 6.º Quando foi apresentada a 3.ª fatura, no valor de 2.274.749$00, incluindo trabalhos já realizados, os autores recusaram o seu pagamento. 7.º Os autores fizeram deslocar à obra técnicos da sua confiança para verificarem os trabalhos já realizados. 10.º Os alçados estão de acordo com o projeto alterado, os compartimentos não têm alterações de medidas consideráveis e as escadas têm uma diminuição de 15 cm, estando de acordo com o pórtico P4 do Projeto de Estrutura. 11.º As janelas estão implantadas de acordo com o projeto alterado. 12.º Existem alterações no telhado e no remate a nível da fachada, de acordo com o projeto alterado. 13.º A implantação dos pilares não obedece ao que é preconizado pelo projeto aprovado, mas está de acordo com o projeto alterado. 14.º Entre si os pilares não respeitam o enquadramento e distâncias preconizadas no projeto aprovado, mas consentâneo com o projeto alterado. 15.º Diversos vãos foram alterados, estando de acordo com o projeto alterado. 16.º O vão da janela previsto para ser implantado no 1.º andar, junto aos pilares P18, P19 e P20 do projeto aprovado não se vai poder implantar. 17.º O suporte de muretes é feito por estrutura de betão armado e a parede está engrossada em algumas zonas, para garantir o alinhamento da mesma. 18.º A dimensão da largura das escadas e do patamar não cumprem as dimensões mínimas de 0,80 m. 19.º A dimensão do patamar da escada é inferior ao aprovado. 23.º A passagem do corredor que deveria ser de 1,30m, ficar-se-á pelos 1,15m. 24.º Existe uma parede na qual se verifica um reboco com uma espessura de 8 cm. 25.º No lado norte da cobertura e piso do sótão, foi implantado um guarda-fogo de acordo com o projeto alterado. 26.º Os vãos das janelas terão alturas inferiores às das constantes do projeto aprovado. 27.º As cornijas exteriores têm geometria diferente das do projeto aprovado. 28.º As caixas de passagem da rede de esgotos não estão devidamente acabadas. 29.º As paredes de alvenaria do sótão são em tijolo 30x22x20 simples. 30.º Existem furos em vigas, deixadas por negativos na betonagem e duas passagens em lages abertas posteriormente à betonagem. 31.º O pilar P14 está parcialmente demolido, sendo que a função do mesmo seria a de sustentar o do sótão, não pondo a sua existência em perigo a capacidade de estrutura a nível de cobertura, por esta assentar diretamente na viga do teto do 1.º andar. 32.º O respondido em 30.º. 33.º Existe uma parede divisória e fundo de roupeiro, executada com tijolo de 0,07m. 37.º O pilar P13 teria a função de sustentar o cunhal do sótão não pondo a sua existência em perigo a capacidade de estrutura ao nível da cobertura, por esta assentar diretamente na viga do teto do 1.º andar. 38.º Os painéis aplicados no isolamento térmico são …de 0,03m enquanto o caderno de encargos previa Wallmate de …. 40.º Em zonas de dormir foram detetadas partes da estrutura sem qualquer correção térmica ou com correção não considerada pelos regulamentos. 41.º O caderno de encargos e os débitos ao cliente referem-se a fornecimentos e assentamentos de painéis de isolamento térmico da marca …, produzidos pela … reconhecidos no mercado como sendo de topo de gama, nas caixas de ar das paredes exteriores de alvenaria, mas não foi colocado qualquer painel desta marca. 42.º O que está previsto no projeto térmico para a cobertura em desvão ventilado é cortiça com 4 cm ou lã mineral colocada sobre a lage de esteira e …e de 3 cm entre o ripado e as lages das vertentes do telhado. 43.º O isolante aplicado – aglomerado negro de cortiça – da forma como foi assente não respeita o preconizado no projeto. 50.º A obra não necessita de eliminação de grandes defeitos. 51.º A implantação dos pilares foi efetuada de acordo com o projeto de alterações. 52.º O pilar P14 foi parcialmente demolido em cerca de 80% da sua secção transversal e ao longo do vão da janela do rés do chão, tendo a sua função estrutural deixado de se justificar quando os autores decidiram que não queriam o sótão. 53.º O pilar P20 foi suprimido e o pilar P19 mudou de posição em consequência de alterações de estrutura. 54.º A 2.ª R. efetuou alterações solicitadas e acordadas pelos autores, no desenrolar da obra. 55.º Os autores recusaram-se a pagar a fatura vencida em 23.01.98 referente aos projetos de alterações (arquitetura, correção do betão armado e correção do projeto de execução) e respetivas cópias num total de 169.650$00. 56.º Entre a data em que foi apresentada para pagamento aos autores a 3.ª fatura e datas em que os ditos relatórios foram elaborados foi trocada correspondência entre os autores e a 1.ª R e ocorreram diversas reuniões entre os mesmos. 57.º Devido a discrepâncias, o empreiteiro suspendeu a execução dos trabalhos, mediante a elaboração de um auto, do qual deu conhecimento aos autores. 58.º A 1.ª R limitou-se a executar o projeto de execução com as alterações que o dono da obra mandou introduzir-lhes. 59.º O empreiteiro solicitou a redução de 4 cm na altura dos vãos exteriores para utilização de caixas de estores. 61.º As alterações que se registam na cobertura constam do projeto de alteração ordenado pelos donos da obra em resultado de terem decidido eliminar o sótão. 62.º Os autores revelaram indecisões que impediram o regular andamento dos trabalhos. 63.º O projeto de alterações referido em F1) foi elaborado pela 2.ª R por ordem e interesse dos autores. 65.º O projeto inicial aprovado pela CM previa a existência de um sótão destinado a habitação. 66.º A eliminação do sótão enquanto parte do imóvel destinado a habitação implicou alteração do projeto.” – al. H) dos factos assentes. I) Em setembro de 2005, a solicitação dos AA., a sociedade “O Lda. ” efetuou uma fiscalização à construção do imóvel – al. I) dos factos assentes. J) Das conclusões do relatório final elaborado pela referida sociedade consta o seguinte teor: “(…) Em geral as anomalias e não conformidades detetadas devem-se ao facto do empreiteiro responsável pela obra ter incorrido em incumprimentos relativos ao disposto no projeto aprovado, incumprimento da regulamentação em vigor e incumprimento das boas regras de construção (…). De acordo com as verificações efetuadas, recomenda-se o reforço estrutural de pilares e vigas seccionados, a fim de lhes conferir a capacidade de carga para a qual foram dimensionados. Como alguns pilares foram incorretamente implantados recomenda-se, também, a avaliação da capacidade resistente da estrutura tal como construída.” – al. J) dos factos assentes L) Por carta datada de 27/07/2007, enviada pela R. aos AA. e por estes recebida, foi comunicado que “Decorridos 10 anos de mora de V. Exas., perante a injustificada ação que instauraram, a situação de perda de confiança que causaram, não temos mais condições de prosseguir agora com a obra. Não possui já qualquer justificação económica para nós o contrato de novembro de 1996. Passados mais de 10 anos sobre o plano do negócio de novembro de 1996, que V. Exas. impediram sem razão de ser executado em tempo normal e oportuno, não é agora possível realizá-lo, pois perdemos completamente o interesse nele. (…) Pretendem V. Exas. que a realizemos agora em 2007, mas nesta data aquele contrato não é já da nossa parte exequível, por motivo de no decurso da última década terem ocorrido grandes alterações de preços de materiais, regulamentos e técnicas, já não podendo também ser cumprido o caderno de encargos. (…) Pelo presente face ao reiterado, e prolongado por 10 anos, incumprimento de V. Exas.,declaramos resolvido o contrato de empreitada.” – al. L) dos factos assentes. M) No decurso da construção da moradia referida em A) da matéria de facto assente, os AA. pediram à R. alterações à execução da obra (resposta dada ao art. 1º da base instrutória). N) Limitando-se a R. a executar o projeto de acordo com as alterações que os AA. mandavam introduzir (resposta dada ao art. 3º da base instrutória). O) Posteriormente, AA. e R. acordaram na elaboração de um projeto de alteração ao projeto inicialmente aprovado relativamente à implantação da moradia (resposta dada ao art. 4º da base instrutória). P) Projeto esse que foi depois aprovado pela Câmara Municipal (resposta dada ao art. 5º da base instrutória). Q) Em 22/7/1997, os AA. não pagaram uma fatura vencida apresentada pela R. no valor de 2.274.749$00 (resposta dada ao art. 7º da base instrutória). R) A construção da moradia parou em 22/07/1997, na sequência do envio pela R. aos AA. da carta referida na alínea C) da matéria de facto assente (resposta dada ao art. 9º da base instrutória). S) Desde então, a R. nunca mais voltou à obra (resposta dada ao art. 11º da base instrutória). T) A obra de construção da moradia foi objeto de embargo, pela Câmara Municipal, em 15 de janeiro de 1998 (resposta dada ao art. 13º da base instrutória). U) Uma vez que a obra estava a ser executada em desconformidade com o projeto aprovado (resposta dada ao art. 14º da base instrutória). V) Tendo, em consequência, caducado a licença de construção (resposta dada ao art. 15º da base instrutória). W) Posteriormente os AA. conseguiram obter o levantamento do embargo (resposta dada ao art. 16º da base instrutória). X) E obter novo alvará de autorização de construção (resposta dada ao art. 17º da base instrutória). Y) No decurso da fiscalização da obra efetuada pela sociedade O Lda. , foi detetado que as sapatas dos pilares P27, P18 e P10 apresentam irregularidades na geometria da secção (resposta dada ao art. 18º da base instrutória). Z) Assim como as vigas de fundação entre os pilares P 27 e P 25 e P 18 e P4 (resposta dada ao art. 20º da base instrutória). AA) O que não respeita as medidas constantes do projeto aprovado (resposta dada ao art. 21º da base instrutória). BB) E que a sapata do pilar P10 tem na sua constituição fragmentos de rocha de grandes dimensões (resposta dada ao art. 22º da base instrutória). CC) Verificando-se a existência de uma lacuna com mais de 15 cm de largura e cerca de 20 cm de profundidade no topo da sapata do pilar P10 (resposta dada ao art. 23º da base instrutória). DD) E a viga de fundação entre os pilares P9 e P10 apresenta geometria irregular (resposta dada ao art. 24º da base instrutória). EE) A respetiva armadura já se encontra com indícios de corrosão (resposta dada ao art. 25º da base instrutória). FF) A sapata do pilar P28 encontra-se fundada a uma profundidade superior a 1,80m (resposta dada ao art. 26º da base instrutória). GG) A viga da fundação entre os Pilares P 28 e P 27 apresenta uma geometria irregular (resposta dada ao art. 27º da base instrutória). HH) A estrutura foi implantada cerca de 4 m a sul do previsto no projeto inicial aprovado (resposta dada ao art. 28º da base instrutória). II) Estando o pilar P 10 a 14,90 m do lancil do arruamento, em vez de a 18,90m (resposta dada ao art. 30º da base instrutória). JJ) A escada de acesso ao sótão prevista no projeto aprovado foi eliminada (resposta dada ao art. 31º da base instrutória). KK) Tal deve-se ao facto de o projetado aproveitamento do sótão para habitação ter sido eliminado do projeto de execução, a pedido dos autores (resposta dada ao art. 32º da base instrutória). LL) Os pilares de secção circular apresentam um acrescento com cerca de 30 cm no topo (resposta dada ao art. 35º da base instrutória). MM) Existem furos deixados por negativos na betonagem (resposta dada ao art. 36º da base instrutória). NN) As armaduras inferiores de alguns painéis da laje apresentam recobrimento reduzido (resposta dada ao art. 37º da base instrutória). OO) Foi detetada a exposição de armadura inferior e a apresentação de indícios de corrosão (resposta dada ao art. 38º da base instrutória). PP) O reboco foi executado com espessura excessiva (resposta dada ao art. 39º da base instrutória). QQ) Não foi introduzida a caixa de ar entre o isolamento térmico e o plano exterior de alvenaria (resposta dada ao art. 40º da base instrutória). RR) Existem eflorescências no paramento interior da fachada principal (resposta dada ao art. 41º da base instrutória). SS) Existe fissuração mapeada nos rebocos e escorrências no paramento exterior da parede da fachada principal (resposta dada ao art. 42º da base instrutória). TT) Existem fissuras de desligamento entre o murete da guarda da varanda virada a norte e a parede exterior (resposta dada ao art. 43º da base instrutória). UU) A zona da garagem do imóvel dista do troço do muro mais próximo cerca de 3,90 m e cerca de 6,50 m do troço mais distante junto do pilar P1 (resposta dada ao art. 44º da base instrutória). VV) A distância do edifício ao limite do lote do lado confinante com o lote 4 é de 4,82m (resposta dada ao art. 45º da base instrutória). WW) As vigas de fundação entre os pilares P 28 e P 27, P 18 e P14 e entre os pilares P9 e P 10 apresentam uma secção irregular com área inferior à definida no projeto (resposta dada ao art. 46º da base instrutória). XX) Tal implica uma capacidade de carga inferior à prevista pelas partes no projeto inicial aprovado (resposta dada ao art. 47º da base instrutória). YY) Os pilares da fachada lateral direita foram implantados cerca de 20 cm mais a nascente (resposta dada ao art. 51º da base instrutória). ZZ) E o pilar P19 sofreu uma mudança de posição de cerca de 75 cm (resposta dada ao art. 52º da base instrutória). AAA) Assim, em 3/11/2006, os AA. requereram junto do Tribunal Judicial a notificação judicial avulsa da R. a fim de a mesma “entregar o Alvará indispensável ao levantamento da autorização das obras e cumprir o disposto na cláusula 8.º do contrato de empreitada no prazo de 5 meses a contar da data da presente notificação entregando a obra aos notificantes depois de eliminados os defeitos apontados” (resposta dada ao art. 55º da base instrutória). BBB) As deficiências como a corrosão, eflorescências, fissuras e escorrências, descritas em 18.º a 52.º, resultam da paragem da obra e do natural decurso do tempo (resposta dada ao art. 56º da base instrutória). CCC) A R. executou os trabalhos de acordo com os elementos do projeto de execução (resposta dada ao art. 57º da base instrutória). DDD) E de acordo com as alterações solicitadas pelos AA. (resposta dada ao art. 58º da base instrutória). EEE) Sendo que a implantação dos pilares foi efetuada de acordo com o projeto alterado a pedido dos AA. (resposta dada ao art. 59º da base instrutória). FFF) E de acordo com o desenho de compatibilização entre projeto de arquitetura e o de estabilidade (resposta dada ao art. 60º da base instrutória). GGG) O desenho de compatibilização a que se refere o art. 60º foi elaborado pelo projetista a pedido do dono da obra (resposta dada ao art. 61º da base instrutória). HHH) E todas as alterações de vãos efetuadas pela R. resultam de alterações ordenadas pelo dono da obra e desenhadas pelo seu projetista (resposta dada ao art. 62º da base instrutória). III) À exceção da redução de 4 cm na altura dos vãos exteriores que foi solicitada pela R. (resposta dada ao art. 63º da base instrutória). JJJ) E que mereceu o acordo dos AA. (resposta dada ao art. 64º da base instrutória). KKK) As alterações na cobertura constam do projeto de alteração ordenado pelos AA. (resposta dada ao art. 65º da base instrutória). LLL) As cornijas exteriores são diferentes do projeto aprovado porquanto a A. escolheu a referência n.º S-03 do catálogo da … (resposta dada ao art. 66º da base instrutória). MMM) Os pilares P14 e P20 foram eliminados de acordo com o projeto de alteração da autoria do projetista dos AA. (resposta dada ao art. 67º da base instrutória). NNN) E o P… P19 mudou de posição de acordo com a alteração ao projeto de execução feita pelos AA. (resposta dada ao art. 68º da base instrutória). OOO) Desde 1997 até 2007 ocorreram aumentos médios de preços de mão de obra e de materiais superiores a 35% (resposta dada ao art. 71º da base instrutória). * III – O Direito Como se sabe o objeto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente, importando em conformidade decidir as questões nelas colocadas, bem como as que forem de conhecimento oficioso, com exceção daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, artigos 684.º, n.º 3, e 690.º, n.º 1, 660.º, n.º 2, e 713.º, todos do CPC. Por sua vez, como decorre do art.º 710, do CPC, os recursos interpostos, apelação e agravo, serão apreciados pela ordem da sua interposição, no entanto o agravo interposto pela Apelada, só será apreciado se a sentença não for confirmada, sem esquecer também no que respeita ao recurso de agravo, que este apenas será provido, se a infração cometida tiver influído no exame ou decisão da causa[1]. 1. Apelação da Ré (Despacho saneador) A R. veio interpor recurso do despacho saneador, na parte em que julgou improcedentes a exceções b) e d) do art.º 1.º da contestação, a saber, a desistência da empreitada, e a caducidade do direito de denúncia de defeitos e do direito da ação. Da desistência da empreitada. Em sede de contestação apresentada pela R., veio a mesma alegar a verificação de um conjunto de factos que configuram uma situação de desistência do contrato por parte dos AA, enquanto donos da obra. Na decisão agora sob recurso, no âmbito do despacho saneador, entendeu-se, no atendimentos de nos autos constarem já os elementos necessários para a apreciação da exceção perentória deduzida, “considerando a introdução da presente ação em juízo, bem assim como o respetivo pedido e causa de pedir, é manifesto que não existe qualquer desistência do dono da obra. Saliente-se que a possibilidade de desistência por parte do dono da obra, a qual é legalmente conferida através do artigo 1229.º do CC, só por este pode ser exercida. Ora os pedidos formulados pelos AA, são clara demonstração de que os mesmos não desistiram da completa execução da obra, deles ressaltando, pelo contrário, a vontade de verem cumprido integralmente o contrato que celebraram com a R.”, concluindo-se pela respetiva improcedência. Insurge-se a R. contra o decidido, alegando que da conjugação da matéria de facto articulada sob os artigos 9.º a 21.º e 36.º a 55.º da contestação decorre que os AA não queriam o cumprimento do contrato, e dele desistiram. Assim, e segundo invoca, ao considerarem a R. inidónea e incompetente, para além de terem abusado da sua boa fé, tem forçosamente de entender-se que desistiram da sua prestação. Pretendendo agora que elimine os defeitos e finalize a obra, configura-se uma revogação, que não podem levar a cabo, da sua posição expressamente manifestada de não quererem o cumprimento do contrato pela R, que tendo concordado com os AA que nada mais faria na obra, afasta o direito de estes últimos o requererem que o faça. A decisão sob recurso, conforme a Recorrente, ao considerar que do pedido atual dos AA decorre a vontade de a R. completar a execução da obra, não tem em conta a posição que eles anteriormente tomaram, eficaz e aceite pela R., de não quererem que os defeitos sejam corrigidos ou o que houver de ser construído de novo seja executado pela R., bem sabendo os AA que não têm o direito a que a R. seja condenada a “finalizar a obra”, ou pelo menos, seria abusivo o seu exercício. Apreciando. Como decorre do disposto no art.º 1229, do CC[2], o dono da obra pode desistir da empreitada, contanto que indemnize o empreiteiro dos seus gastos e trabalho e do proveito que poderia tirar da obra, traduzindo-se assim numa declaração negocial, que pode ser feita por qualquer meio, não correspondendo a uma revogação ou resolução unilateral, nem constituindo, rigorosamente, uma denúncia do contrato, dados os especiais efeitos prescritos (…) trata-se de uma situação sui generis, que não corresponde a nenhuma daquelas figuras e cujo objetivo é apenas o de dar ao dono da obra a possibilidade de não prosseguir a empreitada, interrompendo a sua execução para o futuro (….)[3]. Saliente-se que estando em causa um poder discricionário, não terá o dono da obra que fundamentar ou justificar a desistência, nem a mesma está dependente da existência de incumprimento contratual, sendo certo que caso este se configure, sempre poderá aquele em conformidade determinar-se. Assim, e relevantemente, a desistência da empreitada configura-se como uma faculdade que a lei coloca ao livre arbítrio do dono da obra, não sendo passível de apreciação judicial, realizando-se a todo o tempo, e se no atendimento que o fim visado é o de obstar à conclusão da obra, poderá configurar-se como precludida, a partir do momento em que, após a conclusão da obra, o empreiteiro coloca o dono da obra em condições de efetuar a sua verificação, na medida em que seria de nenhum efeito[4], ou mesmo entender-se que ainda poderia ocorrer, após tal momento, impondo contudo o pagamento integral do preço da empreitada[5]. Analisando os autos, naturalmente no que à conduta dos AA respeita, como donos da obra, pois só a estes assiste o direito de exercer a faculdade em causa, temos que celebrado o contrato de empreitada por documento de 29.11.1996, verificada que foi a suspensão dos trabalhos, conforme comunicado efetuado pela R, empreiteira, os AA interpuseram ação de condenação contra esta última, pedindo a declaração de resolução do contrato de empreitada, bem como, para além do mais, a condenação da mesma a indemnizá-los dos prejuízos sofridos pelo atraso na conclusão da obra e a suportarem todos os custos na eliminação dos defeitos e na conclusão da obra, em alternativa foi pedida a condenação da R. a suprir os defeitos elimináveis e a construírem de novo na parte não suprível. A pretensão dos AA não obteve merecimento, tendo sido consignado no Acórdão desta Relação de 4.03.2004[6], confirmando a sentença proferida, que não assistia aos AA o direito a resolverem o contrato, sendo que (…)por força do regime próprio da empreitada, não colhe nesta fase da execução da empreitada apelar ao disposto nos arts 1220 a 1223. É que, encontrando-se a obra inacabada, não se pondo a questão da sua aceitação, não cabe falar de denúncia de defeitos que pressupõem a entrega da obra, concluída ao seu dono (…) mais se referindo (…) O contrato de empreitada está em vigor, a empreitada não se mostra concluída, importará aos AA exigir o seu cumprimento e execução (…) Resulta também dos autos, que os AA pediram a notificação judicial da R., em 3.11.2006[7], para que, além do mais, ser cumprido o disposto na cláusula 8.ª do contrato de empreitada[8], no prazo de 5 meses a contar da data da notificação, entregando definitivamente a obra aos notificantes, depois de eliminados todos os defeitos apontados. Em maio de 2007, os AA vieram interpor os presentes autos, no qual formularam o pedido de a R. ser condenada a eliminar os defeitos e finalizar a obra, no prazo de 5 meses, sob pena de a obrigação se ter como definitivamente incumprida se se não verificar o seu cumprimento no prazo cominado, e consequentemente, em execução de sentença, recorrer a terceiros para a eliminação dos defeitos. Temos, assim do enunciado que, contrariamente ao invocado pela R., não se configura que os AA tenham de modo expresso ou de forma concludente, manifestado a vontade de desistir, nos termos e para os efeitos do dispositivo legal apontado. Na verdade, e sem prejuízo das inúmeras vicissitudes que têm pautado a relação contratual entre as partes, tal não se mostra patenteado, independentemente dos considerandos formulados, em sede da ação judicial que precedeu a presente, pelos AA, maxime no concerne à apreciação dos mesmos quanto à conduta da R. até então, e a vontade desta de não desejar trabalhar mais para os AA, sendo que a pretensão deduzida pelos mesmos ali, pedindo a resolução do contrato, contraria, de forma manifesta, a possível efetivação de uma desistência por parte daqueles, na inexistência querida de um vínculo contratual cuja extinção se pretendia ver declarada. Diga-se, ainda, tendo em conta o que foi decidido na anterior ação proposta, e o aqui solicitado pelos AA no concerne ao implemento do contrato celebrado, não se configura que a sua atuação, consubstanciada no ora peticionado, sem cuidar agora da sua bondade, evidencie um exercício de um direito, que tenha extravasado, amplamente, o contexto em que o direito podia ser exercido, contrariando os ditames da boa fé, entendida como uma das fundamentais exigências éticas do comércio jurídico, art.º 334. Improcede, nesta parte, o recurso deduzido. Da caducidade do direito de denúncia de defeitos e do direito de ação Veio a R. invocar, em sede da sua contestação, que os AA. não denunciaram os defeitos antes de decorrido um ano sobre o conhecimento que deles tiveram. Na decisão sob recurso afastou-se o regime de caducidade apontado, porquanto os AA pedem nos presentes autos o cumprimento do contrato de acordo com o estipulado pelas partes, pelo que decorrendo ainda a execução do contrato, a eliminação das verificadas discrepâncias relativamente ao projeto acordado, poderá ocorrer em conjunto com o respetivo desenvolvimento. Insurge-se a R. contra o decidido, alegando que os AA deixaram passar mais de 3 anos desde o trânsito em julgado da anterior da ação, pretendendo que elimine e finalize a obra, sendo que o sistema previsto nos artigos 1219 a 1225, não consente a delonga verificada na denúncia dos defeitos e no exercício da ação, devendo a denúncia ser efetuada na vigência do contrato, na aplicação do n.º1, do art.º 1220. Apreciando. No concerne ao regime dos “defeitos da obra”, previsto nos artigos 1218 a 1226, ressalta, desde logo, que incumbe ao dono da obra, antes de aceitar a obra, verificar se a mesma se encontra realizada nas condições acordadas e sem vícios, depois do empreiteiro colocar o dono em condições de o poder fazer, art.º 1218. Assim, no que respeita aos defeitos aparentes ou conhecidos do dono da obra, devem os mesmos ser denunciados na comunicação do resultado da verificação, conforme o n.º 4, do art.º 1218, devendo aquele recusar ou aceitar a obra com reserva, o que se traduz na denúncia dos defeitos, bem como enuncia a vontade do mesmo vir a exercer os direitos que a lei lhe confere, conforme resulta do disposto no art.º 1221, 1222 e 1223[9]. A aceitação da obra não exime, contudo, o empreiteiro, da responsabilidade dos defeitos ocultos, impendendo contudo sobre o dono da obra o ónus de efetuar a denúncia dos mesmos no prazo de 30 dias após o seu conhecimento, dispensando-se a denúncia se o empreiteiro reconhecer a existência do direito, sendo que se o reconhecimento do empreiteiro ocorrer antes da aceitação da obra, será um defeito conhecido do dono da obra, importando a aceitação efetuada a desresponsabilização do empreiteiro[10]. Realizada a denúncia, o dono da obra dispõe de um ano para instaurar a ação correspondente, sob pena de caducidade dos seus direitos, art.º 1224, n.º1, sendo que se tiver aceite a obra sem conhecimento da existência dos defeitos, a contagem do prazo faz-se a partir da denúncia. Estando em causa um imóvel, como no caso dos autos, decorre do disposto no art.º 1225, n.º3, que a responsabilidade do empreiteiro caduca se não for feita a denúncia respetiva dentro do prazo de um ano seguinte ao descobrimento dos defeitos, constituindo tal denúncia o pressuposto de que depende o exercício do direito do dono da obra, sendo certo que a reparação só será feita, se exigida, devendo, em conformidade ser intentada a ação judicial, no prazo de um ano, a contar da denúncia dos defeitos, sendo que independentemente deste último prazo, caducam os direitos do dono da obra se não forem exercidos dentro do prazo de cinco anos a contar da data da entrega da obra, art.º 1225, n.º 1. Reportando-nos aos presentes autos, importa ter presente que em causa está desde logo a finalização da obra, que não suscita dúvidas que não se mostra concluída, independentemente dos defeitos de que a mesma possa desde já enfermar, pedido que foi formulado pelos AA, enquanto donos da obra, ao encontro do que, como já vimos, fora entendido em decisão deste Tribunal. Deste modo, manifesto se torna que inexistem os pressupostos necessários para que se produza a aceitação da obra, com as consequências apontadas no regime legal enunciado no que diz respeito a possíveis defeitos da obra e respetiva sanação. Na verdade, a respetiva existência, mesmo que detetada antes do fim da obra não merece uma consideração autónoma, face à obrigação principal a que se encontra adstrito o empreiteiro, que se prende com a execução da obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela ou a sua aptidão para o uso ordinário ou fim previsto no contrato, art.º 1208, pelo que, visando-se ainda, como acontece nestes autos, o cumprimento da prestação por parte do empreiteiro, como foi solicitado pelos donos da obra, sem prejuízo do respetivo merecimento, no âmbito de tal realização se deve considerar a necessidade de suprir eventuais deficiências encontradas, independentemente das ocorrências entretanto advindas ao longo do tempo, carecidas assim da relevância pretendida. Em conformidade, e na concordância com o decidido, excluída fica a aplicação do regime de caducidade nos termos pretendidos pela R., improcedendo, também nesta parte, o recurso deduzido. 2. Apelação dos AA (sentença) Os AA vieram interpor recurso da sentença proferida nos autos, arguindo a nulidade da sentença, nos termos do art.º 668, n.º1, c) e d) do CPC, pugnando pela invalidade da resolução do contrato operada pela R., com a decorrente vigência do contrato de empreitada celebrado. Das nulidades No concerne à nulidade prevista na já mencionada alínea c) do n.º 1, do art.º 668, do CPC, esta existe quando os fundamentos invocados pelo juiz deveriam, logicamente, conduzir a resultado oposto ao que vem a ser expresso na sentença, evidenciando-se um manifesto e real vício de raciocínio do julgador, não se podendo confundir uma verdadeira desconformidade lógica entre as razões de facto e de direito que fundamentaram a decisão proferida, e esta última, com a discordância que a parte possa ter quanto às mesmas. Quanto à nulidade, nos termos do art.º 668, n.º1, d) do CPC, verifica-se a mesma, quando o juiz deixa de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, em violação do disposto no art.º 660, n.º 2, do CPC, isto é, do dever, por parte do juiz, de não ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, assim como de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Refira-se que as questões que o juiz deve conhecer se reportam às pretensões formuladas, não estando obrigado a apreciar todos os argumentos ou fundamentos que as partes indiquem para fazer valer o seu ponto de vista, sendo certo que, quanto ao enquadramento legal, não está o mesmo sujeito às razões jurídicas invocadas pelas partes, pois o julgador é livre na interpretação e aplicação do direito, art.º 664, do CPC. Por último saliente-se que as nulidades da sentença, como seus vícios intrínsecos, devem ser apreciados em função do texto e discurso lógico nela desenvolvida, não se confundindo com os erros na apreciação da matéria de facto, e possíveis ilações dela retirada, ou com a errada aplicação das normas jurídica aos factos dados como apurados, que constituem erros de julgamento, a sindicar noutro âmbito. Estabelecido o enquadramento legal, e na apreciação, dizem os AA, quanto ao fundamento invocado relativamente à nulidade da alínea c), que a conclusão que a R. resolveu com justa causa e de forma legítima o contrato de empreitada, para além do mais, é contraditória face à matéria de facto provada e o constante do aresto desta Relação de março de 2004, mais configurando tal nulidade, no equívoco em que labora a sentença, referindo que o que foi executado a mando dos AA, durante sete meses foi o projeto por estes alterado e não o licenciado junto da Câmara. Quanto à segunda nulidade, alínea d) invocam que a referência feita na sentença sob recurso que foram as indecisões e divergências do dono da obra não solucionadas – factualismo não constante da matéria de facto provada, nem dos autos – com os autores dos projetos – o que também não foi alegado pela R. – que impediram o regular andamento dos trabalhos e que levaram a sua suspensão em 22.07.2007, constitui questão que não podia conhecer, uma vez que não foi suscitada pelas partes. No conhecimento, no que respeita à primeira das nulidades, resulta essencialmente da pretensão formulada que os AA discordam do entendimento vertido na sentença sob recurso no atendimento que ali foi feito do factualismo dado como provado e a subsequente subsunção jurídica, e nessa medida, porque não se divisa uma verdadeira desconformidade lógica que importaria na apontada nulidade, antes podendo configurar-se um erro de julgamento, a sindicar em sede diversa, afastada fica a arguida nulidade. Relativamente à segunda nulidade, configurando-se na economia do processo que não se está fora do âmbito do questionado e a resolver no mesmo, na análise da sentença, no que à subsunção jurídica respeita, constata-se que a consideração em causa se consubstancia num juízo formulado no atendimento de tudo o que foi vertido nos autos, caso do decidido na anterior ação, maxime em termos de matéria de facto, como resulta do factualismo considerado provado na presente, e assim na apreciação das ocorrências tidas por atendíveis, ao longo do desenrolar da relação contratual estabelecida entre as aqui partes. Ademais, no que a tal conclusão respeita não é muito estranho o alegado em sede contestação, nos artigos 26.º, 29.º, 30.º, 31.º, 119.º, 120.º, 121.º, 141.º, 144.º, 145.º, 146.º, 147.º, 148.º, 171.º, 172.º, 173.º, 174.º, 251.º, 253.º, 255.º, 256.º, sendo certo que como resulta da explanação feita em sede da sentença, em causa está a suspensão dos trabalhos ocorrida em 22.07.1997, nesses termos devendo ser entendida a referência temporal efetuada. Assim sendo, sem prejuízo da discordância que assista aos AA, bem como da bondade do decidido, não se mostra que a sentença ora em crise enferme da nulidade arguida. Da eliminação dos defeitos e da finalização da obra. Formulando os AA o pedido de condenação da R para que esta elimine os defeitos, no conhecimento em sede da sentença, no concerne ao cumprimento defeituoso da obrigação invocado, fez-se constar: “o existente construído não pode ser confrontado, sem mais, com o projeto aprovado e licenciado, na medida em que o existente construído corresponde a desenhos assinados pela M. , Lda., tendo a empreiteira se limitado a executar o projeto de execução com as alterações que o dono da obra lhe mandou introduzir, termos em que o existente construído não pode estar de acordo com o projeto aprovado. Por outro lado, e ainda que assim não fosse, o pedido de eliminação de defeitos deduzidos pelos AA, não pode ser tido como autónomo relativamente ao pedido de cumprimento do contrato de empreitada por parte da R., uma vez que diz ainda respeito à integral execução do contrato”. Quanto a este matéria, e revertendo para o que já foi aqui expresso, no concerne à conclusão da obra que não se mostra realizada, na concordância com o decidido, a prorrogativa do dono da obra no que respeita à eliminação dos defeitos apenas se pode concretizar a partir do momento em que tal conclusão se deva considerar efetuada, com a entrega da obra pelo empreiteiro, realidade que não se verifica nos presentes autos. Prosseguindo, quanto ao pedido formulado pelos AA para a finalização da obra no prazo indicado, entendeu-se na sentença sob recurso, que tal pretensão não merecia acolhimento, porquanto procedia a exceção do não cumprimento, considerando válida a resolução do contrato de empreitada operada pela R. Fundou-se o decidido no entendimento que tinham sido os AA que determinaram a suspensão dos trabalhos em 22.07.1997, executando a R, enquanto empreiteira, aquilo que o dono da obra determinara, verificando-se também a falta de pagamento de uma fatura na pendência dos trabalhos, pelo que os donos da obra, os AA, ficaram então em mora, sendo justificada a recusa, por parte da R, de continuar os trabalhos. Considerando-se, também, que se verificava uma perda de interesse da R. no negócio, conclui-se que se mostrava objetivamente verificado o fundamento da válida resolução comunicada pela empreiteira aos donos da obra. Insurgem-se os AA contra tal entendimento, referindo que a suspensão dos trabalhos foi determinada unilateralmente pela R, que dispunha de todos os elementos necessários à conclusão da obra, bem como que a mesma, à data, já tinha recebido mais de metade do valor real da empreitada, pelo que a sua conduta excedeu manifestamente os princípios da boa fé, mais invocando que a perda do interesse da empreiteira, só seria válida, se não tivesse injustificadamente se recusado a continuar os trabalhos em 1997 e após o trânsito em julgado do acórdão da Relação, até porque a obra não carece da eliminação de grandes defeitos. Apreciando. Para o conhecimento a realizar, importa antes do mais, fazer uma breve enunciação do quadro jurídico a que nos temos de ater. Assim, quanto à exceção do não cumprimento do contrato, prevista no art.º 428, que consiste na recusa de efetuar a prestação por parte de um dos contraentes quando o outro a reclama, sem que este, por sua vez, efetue a respetiva contraprestação, encontra a mesma o seu campo de excelência nos designados contratos de bilaterais ou sinalagmáticos, nas quais as prestações são interdependentes, sendo uma o motivo determinante da outra, recusando o excipiens a sua prestação apenas até que a outra parte realize a prestação a que está adstrito. Compete a quem deduz a exceção o ónus da prova do nexo de reciprocidade, não podendo ser invocada pelo contraente que devia cumprir primeiro, no caso de prestações sujeitas a prazos diferentes, funcionando, deste modo, como um processo lógico de assegurar, mediante o cumprimento simultâneo, o equilíbrio em que assenta o esquema do contrato bilateral[11]. Para assegurar tal equilíbrio, não se configura que o incumprimento de uma obrigação secundária, meramente acessória relativamente à obrigação principal possa neutralizar a contraprestação principal[12]. Operando a exceção nos casos de incumprimento parcial ou cumprimento defeituoso, presente o princípio da boa fé, art.º 762, n.º2, necessário se torna a exigência da apreciação da gravidade da falta, que não poderá ser insignificante, para além de se impor a regra da adequação e proporcionalidade entre a ofensa do direito de quem a invoca e o exercício da exceção[13]. Por outro lado, como é sabido, por vontade de um dos contratantes, pode a relação contratual ser destruída, regressando as partes à situação em que se encontravam, caso não tivesse sido celebrado o contrato em causa, podendo a resolução[14] operar por acordo, por declaração à outra parte, nos termos do art.º 436, isto é, por declaração unilateral, receptícia, com efeitos a partir do momento em que entra na esfera do conhecimento do declaratário, ou a partir do momento em que o declaratário a podia conhecer, art.º 224[15] mas também poderá ser feita judicialmente, maxime, quando a declaração de resolução não seja aceite pela outra parte, configurando-se, desta forma, como um direito potestativo extintivo dependente de um fundamento[16], faltando legitimidade resolutiva, nos contratos bilaterais ao contraente faltoso ou em não cumprimento[17]. O fundamento para a resolução traduz-se no facto do não cumprimento, incluindo-se no mesmo o incumprimento temporário (mora), quando se converta num não cumprimento definitivo derivado da perda de interesse na prestação, ou da falta de realização no prazo razoável, fixado para o efeito pelo credor, bem como nos casos em que, sendo ainda possível a prestação com interesse para o credor, o devedor afirma o propósito de não querer cumprir, artigos 801, n.º 2, 802, n.º 2 e 808. Importa frisar, quanto à perda do interesse do credor, que a mesma deve ser apreciada objetivamente[18], no sentido de o valor da prestação ser aferido em função das utilidades que a prestação teria para aquele, tendo em conta, a justificá-lo, um critério de razoabilidade comummente aceite na devida correspondência com a realidade das coisas[19], isto é, tendo em atenção elementos capazes de serem valorados pela generalidade das pessoas, evitando-se que o devedor fique sujeito aos caprichos do credor[20]. Excluída fica assim a mera mudança de vontade do credor, ou a invocação de um motivo que embora o mesmo repute de fundado, não o é em termos de razoabilidade numa apreciação objetiva da situação[21], sempre se impondo o necessário atendimento das circunstâncias do caso concreto, nomeadamente da conduta do devedor até então, se conducente a uma fundamentada e razoável dúvida sobre a atuação futura do obrigado no respeitante ao cumprimento da prestação, conforme o acordado[22]. Saliente-se no concerne ao prazo, excluídos os casos em que possa ter sido acordado um fixo e perentório[23], e que possa assim ser alterado, a conversão da mora em incumprimento definitivo opera através de interpelação admonitória, a qual deverá conter uma intimação para o cumprimento, a fixação de um termo perentório para este último e a cominação que a obrigação se terá definitivamente por não cumprida se o cumprimento não se verificar dentro desse prazo[24], advertência esta que deverá ser expressa, como definidora de uma situação contratual, que funciona no interesse de ambas as partes[25]. Na verdade não deve ser esquecido que enquanto a simples mora do devedor, por causa que lhe é imputável, o constitui apenas na obrigação de reparar os danos moratórios, art.º 804, n.º 1, o não cumprimento da obrigação, por facto imputável ao mesmo, torna-o responsável pelos prejuízos causados ao credor, artigos 798, n.º 1 e 801, n.º 1, podendo este exigir uma indemnização pelos danos positivos resultantes do incumprimento do contrato, que se mantém, prejuízos que abrangem os danos emergentes e os lucros cessante, art.º 564. Nos contratos bilaterais, como o dos autos, em vez da indemnização compensatória pelo incumprimento, pode o credor preferir a resolução do contrato, pedindo a indemnização pelo interesse contratual negativo ou da confiança, isto é, pelo prejuízo que lhe adveio com a celebração do contrato, ou que não sofreria, se não tivesse celebrado o contrato[26]. Em termos de efeitos, a resolução tem, em princípio, eficácia retroativa, devendo assim ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente, artigos 433 e 434, ficando o credor que ainda não tiver efetuado a prestação dela desonerado, ou se a tiver prestado, poderá exigir a sua restituição, extinguindo-se igualmente, os deveres de prestação ainda não cumpridos[27], sem prejuízo de nos contratos de execução continuada ou periódica, a resolução não abranger as prestações efetuadas, exceto se entre estas e a causa da resolução existir um vínculo que legitime a resolução de todas elas, n.º 2, do art.º 434. Delineado, sumariamente o quadro legal, vejamos da bondade do decidido. Saliente-se, desde logo, que no conhecimento da pretensão dos AA consubstanciada no recurso formulado, nos deveremos ater ao factualismo dado como provado, na medida em que não se mostra efetuada a impugnação da decisão sobre a matéria de facto conforme o enunciado no art.º 690-A, do CPC, não relevando em tal âmbito as referências genéricas realizadas em sede das conclusões das alegações, até por sem correspondência ao vertido no corpo das alegações, sendo certo que constituindo aquelas conclusões a forma abreviada dos fundamentos e razões jurídicas à luz das quais se pretende obter o respetivo provimento, vedado fica, consequentemente, o alargamento do seu âmbito, para além do que se fez constar no corpo das alegações. Face aos factos dados como provados importa assim saber se a resolução do contrato operada pela R. foi validamente efetuada, por a mesma ter fundamento para tanto, compreendendo-se que para aferir da legitimidade da mesma releve saber se quando a operou era uma contraente faltosa ou em não cumprimento. Ora, não se questiona que entre as agora partes foi celebrado um contrato de empreitada, vinculando-se a R., enquanto empreiteira a construir uma moradia, enquanto os AA, como donos da obra satisfariam o pagamento da quantia de 36.420.254$00, decorrentemente, e por definição, art.º 1207, a obra deveria ser realizada nos termos convencionados. Apurou-se também que a construção da moradia parou em 22.07.1997, na sequência do envio pela R. aos AA duma carta na qual aquela dava notícia de divergências entre o que fora acordado e o que vinha sendo executado na sequência da intervenção dos donos da obra, sendo que apurado ficou que a empreiteira se limitou a executar o projeto de acordo com as alterações que os AA mandavam introduzir, verificando-se, subsequentemente divergências efetivas entre o que vinha a ser realizado e o projeto aprovado, vindo a obra a ser objeto de embargo uma vez que estava a ser construída em desconformidade com o projeto aprovado, caducando consequentemente a licença de construção, não tendo os AA efetuado o pagamento de uma fatura vencida apresentada pela R. no valor de 2.274.749$00. Na realidade, sem prejuízo das intenções dos AA, enquanto donos da obra, em relação ao destino ou aproveitamento do que estava a ser construído, como referem quanto ao sótão, não pode ser enjeitado que as alterações foram determinadas sobretudo por aqueles, existindo uma efetiva discrepância que tiveram as consequências enunciadas, sendo certo que não competia à R. efetuar as diligências com vista à adequação do que os donos da obra iam pretendendo com o que fora projetado e aprovado em sede própria, tendo os mesmos aliás, obtido o levantamento do embargo e novo alvará de autorização de construção. E se face ao desenrolar do que ia acontecendo poderia desde logo entender-se que a suspensão dos trabalhos pela Ré não se configurava como ilegítima, não se mostrando satisfeita por parte dos AA, independentemente do já pago, uma prestação vencida, que na economia do preço acordado não pode deixar de ter-se como significativa, no atendimento até das vicissitudes que iam afetando o desenvolvimento dos trabalhos por determinação dos AA, surge como justificada a recusa daquela em continuar a efetuar os trabalhos, isto é, a realizar a prestação a que se obrigara, até porque esta já não se mostrava coincidente com o que vinha prestando. Neste enquadramento os AA vieram interpor uma primeira ação pedindo, relevantemente, a resolução do contrato de empreitada, pretensão que não mereceu acolhimento, surgindo após os presentes autos, visando obter a finalização da obra, que como já se fez notar divergia do inicialmente acordado por sua vontade, verificando-se em conformidade uma delonga, de vários anos, a contar da paragem dos trabalhos. Ora, não se escamoteando tal situação, não deve a mesma ser imputada à R, não sendo alheia à mesma a conduta dos AA, tendo em conta os termos como se determinou e as finalidades visadas, sem que contudo tenha dado cabal cumprimento à obrigação a que se encontravam adstritos relativamente à R. Deste modo, configura-se que tendo os AA incorrido em mora, a mesma mantinha-se quando a R. veio resolver o contrato, invocando a perda de interesse, sendo que contrariamente ao referido por aqueles, verificada tal perda, opera-se a conversão em incumprimento definitivo, não se aplicando ao caso dos autos a necessidade de interpelação admonitória, reportada ao cumprimento em prazo, no caso em que não foi observado. Tendo em conta as vicissitudes que pautaram o desenrolar da relação contratual, face ao lapso de tempo decorrido, e demonstrado estando um aumento médio que pode considerar-se relevante dos preços de matérias e mão de obra, evidencia-se que a perda de interesse invocada pela R., revela-se como objetivamente válida, numa perspetiva de razoabilidade normalmente aceite e compreensível pela generalidade das pessoas, na necessária perceção da realidade, tal como surge delineada duma construção parada durante largos anos, sofrendo os correspondentes danos. Julgada válida a resolução do contrato de empreitada efetuada pela R., improcede em conformidade a apelação deduzida pelos AA, prejudicado ficando o pedido de ampliação do âmbito da apelação formulada por aquela para o caso da procedência do recurso em causa. 3. Recurso de Agravo da R. Resultando do exposto a confirmação da sentença proferida, fica prejudicado o conhecimento do agravo interposto pela R., enquanto apelada. * IV – DECISÃO Nestes termos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação, em julgar improcedentes as apelações, confirmando a decisão e sentença sob recurso. Custas pelos Apelantes, quanto ao recurso que cada um interpôs. Lisboa, 29 de janeiro de 2013 Ana Resende Dina Monteiro Luís Espírito Santo ----------------------------------------------------------------------------------------- [1] Para além dos casos, que independentemente da decisão do recurso, o provimento recurso tem interesse para o agravante. [2] Diploma em referência, se nada mais for dito. [3] Citando Ac. STJ de 8.9.2009, in www.dgsi.pt.. [4] Cfr. Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. III, Contratos em Especial, pag. 566. [5] Cfr. Romano Martinez, Direito das Obrigações, (Parte Especial) Contratos, pag. 450. [6] Cfr. certidão de fls. 120 e seguintes. [7] Documento de fls. 88 e seguintes e resposta ao quesito 55.º [8] No final de 1 ano será feita entrega definitiva da obra e anulada a respetiva garantia da obra. [9] Verificados os defeitos da coisa, prevê-se um regime de eliminação específico, que não pode ser afastado pelo regime geral do incumprimento obrigacional (o que não significa que não se possa verificar uma situação de incumprimento definitivo por parte do empreiteiro, nomeadamente verificando-se qualquer circunstância das previstas no art.º 808, n.º1, o que afastará o recurso ao disposto nos art.º 1220 e seguintes). Determina o art.º 1221 que o dono da obra têm o direito de exigir do empreiteiro a eliminação dos defeitos se puderem ser suprimidos, se não puderem ser eliminados, assiste-lhe o direito de exigir uma nova construção, sem prejuízo de solicitar o ressarcimento dos prejuízos sofridos, nos termos do art.º 1223, o que não significa que seja conferido ao dono da obra o direito de por si, ou por intermédio de terceiro, proceder à eliminação dos defeitos, efetuar a reconstrução da obra à custa do empreiteiro, obter a condenação do vendedor no valor correspondentes à antecipação das despesas previsíveis com as obras de reparação, pois o dispositivo legal constante do art.º 1221, exprime claramente a ideia que apenas do empreiteiro se pode exigir a eliminação dos defeitos ou à reconstrução da obra, pressupondo a lei uma condenação prévia do mesmo, na sequência da qual, em execução, poderá se exigir que a eliminação ou reconstrução seja feita por terceiro à sua custa, art.º 828. [10] Cfr. Menezes Leitão, obra citada, a fls. 559. [11] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, I, vol, pag. 356. [12] Cfr. Ac. STJ de 15.4.2010, in www.dgsi, citando José João Abrantes, in Exceção de Não Cumprimento do Contrato no Direito Civil Português, Conceito e Fundamento, quanto à exceptio só ser invocável no âmbito da relação principal e já não no das obrigações secundárias, pois estas não se encontram abrangidas pela relação sinalagmática. [13] Cfr. Almeida e Costa, Direito das Obrigações, pag. 364. [14] Por definição, não respeita a resolução do contrato a qualquer vício que possa ter ferido o negócio de onde emerge a obrigação, antes se reportando a factos ou circunstâncias supervenientes, distinguindo-se, assim, nomeadamente, da invalidade, quer em termos de nulidade, quer em termos de anulabilidade, casos em que são atingidos os próprios negócios jurídicos, de onde emerge a relação obrigacional. [15] Vejam-se, entre muitos, o Acórdão do STJ de 3.01.2000, in www.dgsi.pt, e Acórdão da RP de 5.12.96, in CJ, ano 96, t.5, pag. 208. [16] Cfr. Ac. STJ, de 21.5.98, in CJSTJ, ano 98, t.2, pag.91. [17] Cfr. Ac. STJ, de 21.5.98, acima referido. [18] Com exclusão dos casos de diminuta importância, cfr. Batista Machado, Dos Pressupostos da Resolução por Incumprimento, Obra Dispersa, Vol. I. [19] Cfr. Ac. STJ de 8.6.2006, in www.dgsi.pt, citando Pessoa Jorge in Ensaios sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, e Galvão Telles in Direito das Obrigações. [20] Cfr. Ac. STJ de 20.3.2004, in www.dgsi.pt. [21] Cfr. ac. STJ de 22.9.2005, in www.dgsi.pt. [22] Cfr Batista Machado, in obra referida, menciona que nos contratos de execução continuada, cada prestação ou inadimplemento não devem ser tomados isoladamente, sendo que um certo incumprimento, ainda que de menor importância, pode legitimar a resolução, se pela natureza e circunstâncias de que se rodeou for de molde a fazer desaparecer a confiança, justificando um justo receio quanto ao cumprimento futuro das obrigações contratuais. [23] Vaz Serra in RLJ, Ano 110, pag. 326, refere a negócios fixos absolutos, no caso de decorrido o prazo a finalidade da obrigação não pode ser já obtida com uma prestação ulterior, caducando o contrato, e o negócio fixo, relativo, em que o termo importa tão só na atribuição ao credor do direito a resolvê-lo. [24] Cfr. Ac. STJ de 2.11.06, in www.dgsi.pt. [25] Cfr. Antunes Varela, RLJ 128º, pag. 136 e segs. [26] Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, II, volume, 3ª edição, pag. 90, e entre outros o Acórdão do STJ de 6.02.96, in www.dgsi.pt.. [27] Cfr. Antunes Varela, obra acima referenciada, pag. 242 e seguintes. | ||
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