Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
5573/21.1T8PRT-A.G1
Relator: JOSÉ FLORES
Descritores: EMBARGOS DE EXECUTADO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
OMISSÃO DE FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
ANULAÇÃO (OFICIOSA) DA DECISÃO JUDICIAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/16/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
- De acordo o princípio da proporcionalidade, quando o conjunto de alegações/conclusões seja reduzido, a formulação de conclusões através de cópia quase integral das alegações que deveriam sintetizar, não pode ser considerada como factor determinante da rejeição do recurso à luz da previsão do art. 641º, nº 2, al. b), do C.P.C..
- Cumpre o disposto no art. 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, o apelante que identifica de forma perceptível o objecto da impugnação, o sentido da decisão que pretende e, de modo crítico, a prova que haverá de ser considerada para esse efeito.
- As regras do ónus da prova contidas no art. 342º, do Código Civil, têm feição marcadamente objectiva, significando que ao exercício da actividade jurisdicional interessa saber se determinado facto, está ou não demonstrado, uma vez concluída a instrução, e não averiguar qual das partes estava onerada com o respectivo ónus da prova.
- Estando colocada em causa a assinatura de livrança, documento particular, para os efeitos do art. 374º, do Código Civil, título executivo, o que deve ser inscrito no rol dos factos a julgar é a positiva atribuição dessa assinatura ao alegado subscritor e não, pela negativa, a negação da sua pertença ao mesmo.
- Quando o executado nega ter assinado a livrança, sem mais explicações, e o exequente faz prova de que existiu um negócio subjacente, reduzido a escrito e assinado pelo executado, que prevê a assinatura e entrega de uma livrança naquelas condições e circunstâncias, a livre apreciação da prova permite e até obriga que se considere provado que foi o executado quem assinou pelo seu punho a livrança dada à execução.
- A possibilidade de alteração oficiosa da decisão proferida sobre a matéria de facto, consagrada no art. 662.º, n.º 2, do C.P.C., não pode ser feita de forma tão ampla que pretira a garantia, legal e constitucional, do duplo grau de jurisdição na apreciação, julgamento e decisão da matéria de facto; e, assim, será inaplicável quando tenha ocorrido omissão da maioria de fundamentação de facto que seria pertinente para o julgado.
Decisão Texto Integral:
Recorrente(s): EMP01... - ..., S.A.;

Recorrido(s): AA.
*
Acordam os Juízes na 3ª Secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

1. RELATÓRIO

AA intentou a presente oposição à execução mediante embargos de executado, alegando, sumariamente e além do mais em sua defesa, que a assinatura aposta na livrança dada à execução não é do seu punho e, ainda, que a embargada procedeu ao preenchimento do título executivo ora dado à execução em manifesta violação das regras da boa-fé.
Regularmente citada, a Exequente/Embargada veio impugnar a factualidade alegada pelo Embargante, pugnando pela improcedência dos respectivos embargos.
 
A final foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
“Em conformidade com o exposto, julga o Tribunal os presentes embargos de executado totalmente procedentes, absolvendo-se o embargante executado AA da execução contra si instaurada por EMP01... ..., S.A..
Custas a cargo da exequente embargada.”


Inconformada com esta decisão, a Exequente recorreu, formulando as seguintes

Conclusões

1. Tribunal de Primeira Instância julgou “os presentes embargos de executado totalmente procedentes, absolvendo-se o embargante executado AA da execução contra si instaurada por EMP01... ..., S.A.”
2. Como fundamento dessa decisão foram considerados como provados os seguintes factos:
“- A exequente apresentou-se à execução como portadora do título denominado “Livrança”, com o montante inscrito de €€ 111.838,70, data de emissão de 15/01/2010, e de vencimento 26/04/2014.
- Na frente da livrança em sujeito, no local destinado aos subscritores, encontram-se duas assinaturas.
- Nenhuma das assinaturas ids. em 3.2. pertence ao punho do executado embargante.”
3. Crê contudo a aqui Recorrente que a decisão assenta numa errónea apreciação dos factos trazidos aos autos, e que culminaram numa apreciação da prova e conclusão dos factos provados que culminam na Sentença proferida.
4. O pressuposto que o Embargante não subscreveu a Livrança não é verdadeiro.
5. Foi elaborado um relatório pericial cuja conclusão aqui se transcreve “Considera-se que não é possível formular qualquer conclusão relativamente à verificação da hipótese de a escrita da assinatura contestadas de AA, aposta no documento identificado como C1, ser ou não do seu punho, uma vez que o exame não é exequível”.
6. Assim a perícia em causa não poderia ser valorada para obter qualquer juízo para determinar como provado que a assinatura aposta no título Executivo não pertence ao Executado/Embargante.
7. Compulsada a Sentença ora recorrida verificamos que para esta conclusão foi tido em consideração o seguinte,
“(…) o Tribunal teve em consideração o teor do requerimento executivo junto aos autos principais e do documento anexo (livrança), cujo original foi oportunamente junto, assim como dos documentos juntos com os embargos, no confronto com a alegação das partes nas suas peças processuais e as declarações de parte do embargante prestadas em sede de audiência de julgamento.”
“Ora, analisadas as declarações em sujeito, no confronto com os documentos supra referidos, não resulta apurado que pertença ao executado embargante a assinatura aposta naquela livrança, designadamente não tendo sido apresentada nenhuma testemunha que afirmasse ter presenciado tal acto.”
“De facto, impugnada a genuinidade da assinatura aposta numa livrança, é ao exequente que cabe convencer da verdade da mesma, produzindo designadamente prova que possibilite a conclusão da genuinidade da assinatura, o que não foi o caso, atendendo ao facto não só de a realização da perícia oportunamente solicitada e determinada ter ficado prejudicada, como ainda por nenhuma qualquer outra prova ter sido produzida nesse sentido.”
8. Resumidamente o Executado disse que a assinatura não era sua e o Tribunal teve em consideração apenas a palavra do Embargante ignorando a documentação junta aos autos.
9. No autos principais e conforme requerimento Executivo, não foi junto apenas um livrança, mas também um contrato, em que ocorreu um reconhecimento de assinaturas.
10. Não é um documento particular simples, houve reconhecimento de assinaturas.
11. Este facto foi totalmente descurado e ignorado pelo Tribunal de Primeira Instância.
12. Aliás o Tribunal nem sequer se dignou a indicar quais as declarações de parte em concreto que foram valoradas para obter a conclusão de que o contrato e livrança não foram assinados pelo Embargado que deitaram abaixo um reconhecimento de assinaturas.
13. Não se podendo apenas reduzir a um simples arguição que tomou em consideração as declarações de parte.
14. Considerando um sistema jurídico em que perante um documento com reconhecimento de assinaturas é ignorado porque alguém apenas alegou, com o devido respeito, não podemos concluir que está aqui in casu a prevalecer ou a ser salvaguarda a segurança jurídica.
15. Aliás desconhece-se o fundamento legal em que prevalece a palavra de alguém sobre um documento com reconhecimento de assinaturas.
16. Atento os documentos juntos no Requerimento Executivo, não era à Exequente Embargante que cabia fazer prova da veracidade, mas sim ao Embargante que a assinatura era falsa.
17. Por este elementos desde logo a conclusão que o Embargante não assinou os documentos em causa apresenta-se como e com o devido respeito errada.
18. Repare-se que a assinatura que consta da Livrança é exatamente igual à que consta do contrato em que ocorreu reconhecimento de assinaturas..
19. Este facto foi igualmente ignorado e desvalorizado pelo Tribunal.
20. Mas considerando a palavra do Embargante tão valorizada pelo Tribunal, sempre se dirá que este nunca em momento algum negou a celebração do contrato.
21. Foi igualmente feita prova que o Embargante foi inclusivamente interpelado.
22. Assim não se compreende como, e atenta a prova produzida, ter o Tribunal de Primeira Instância concluído que o Embargante não subscreveu a Livrança dada à Execução, quando consta do Requerimento Executivo o contrato subjacente à sua emissão e com reconhecimento de assinaturas.
23. Atento o supra exposto e considerando a prova produzida o Tribunal de Primeira Instância nunca podia ter decido como decidiu, porquanto as provas (documentos) apresentados pela Exequente Embargada eram suficientes para demonstrar que o Embargante assinou a Livrança bem como o contrato subjacente à sua emissão, e nem através de uma perícia foi possível e este fazer demonstração sequer que havia dúvidas que tinha sido este assinar.
24. Pelo que se deverá este Venerando Tribunal reverter a decisão que considerou como provado que o Executado Embargante não assinou a Livrança bem como o Contrato subjacente e determinar que seja proferida nova Sentença com fundamento no facto provado de que o Embargante assinou a Livrança bem como o Contrato subjacente.
Requerimento para instruir o Recurso:
a) Relatório Pericial, referência citius  n.º ...30 de 25/11/2022;
b) Requerimento Executivo, referência citius  n.º ...30 de 09/04/2021;
c) Requerimento (Início de Processo), referência citius n.º 30384342 de 02/11/2021;
d) Contestação, referência citius n.º 30654684 de 28/11/2021.

NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO, E COM O SEMPRE MUI DOUTO SUPRIMENTO DE V. EXAS., DEVERÃO V.EXAS. JULGAR PROCEDENTE O PRESENTE RECURSO.
SUBSTITUINDO-SE A DECISÃO AGORA PROFERIDA E QUE AQUI SE RECORRE, POR DECISÃO QUE CONSIDERE COMO PROVADO QUE O EXECUTADO EMBARGANTE ASSINOU A LIVRANÇA DADO À EXECUÇÃO.

O Recorrido respondeu ao recurso pedindo a sua improcedência.

2. QUESTÕES A DECIDIR

Nos termos dos Artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de actuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial.[1] Esta limitação objectiva da actividade do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas[2] que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.[3]
As questões enunciadas pelo/a(s) recorrente(s) podem sintetizar-se da seguinte forma: saber se ocorreu erro no julgamento dos factos mencionados no ponto 2 das conclusões deste recurso.
Previamente, haverá que apreciar as questões prévias suscitadas pelo Recorrido, nomeadamente as que se prendem com a pretendida rejeição do recurso por incumprimento do disposto nos arts. 641º, nº 2, al. b), e 640º, nº 1, do Código de Processo Civil.

Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir.

3. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. FACTOS CONSIDERADOS

a) Factos provados. 

3.1. A exequente apresentou-se à execução como portadora do título denominado “Livrança”, com o montante inscrito de € € 111.838,70, data de emissão de 15/01/2010, e de vencimento 26/04/2014.
3.3. Na frente da livrança em sujeito, no local destinado aos subscritores, encontram-se duas assinaturas.
3.3. Nenhuma das assinaturas ids. em 3.2. pertence ao punho do executado embargante.

b) Factos não provados.

Não foi julgado algum.

3.2. QUESTÃO PRÉVIA

Em resposta ao recurso em apreço, o Recorrido alega que este deve ser rejeitado porque não foram formuladas verdadeiras conclusões, antes copiado o acervo de alegações que as precedem, em desrespeito do que prescreve o art. 641º, nº 2, al. b), do Código de Processo Civil.
Todavia, seguindo entendimento que vimos aplicando, julgamos que esta exigência não pode deixar de ter em conta o princípio da proporcionalidade e, portanto, quando o conjunto de alegações/conclusões seja reduzido, como é o caso, essa falta não pode ser considerada como factor determinante da rejeição do recurso, razão pela qual não se atende a essa excepção invocada pelo Recorrido.

3.3. REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO JULGADA

Nos termos do Artigo 640º, nº 1, do Código de Processo Civil,
«Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”
No que toca à especificação dos meios probatórios - «Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (Artigo 640º, nº 2, al. a) do Código de Processo Civil).

Como refere Abrantes Geraldes[4], sendo certo que actualmente a possibilidade de alteração da matéria de facto é agora assumida como função normal da Relação, verificados que sejam os requisitos que a lei consagra, certo é que nessa operação “foram recusadas soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição do julgamento, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, tendo o legislado optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente.
De acordo com este mesmo autor e Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, em síntese, o sistema actual de apelação que envolva a impugnação sobre a matéria de facto exige ao impugnante, o seguinte:
a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenha sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos[5];
c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considera oportunos; (…)
e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos[6], exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos e pendor genérico e inconsequente;(…).

Sublinha ainda o mesmo autor que não existe, quanto ao recurso da matéria de facto despacho de aperfeiçoamento.
Tendo em mente esta exigência do dispositivo do citado art. 640º, entende ainda Abrantes Geraldes que, mediante uma apreciação rigorosa, decorrente do princípio da auto-responsabilidade das partes[7], sempre com respeito do princípio da proporcionalidade, da letra e espírito da lei, “a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se em alguma das seguintes situações: A falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (cf. arts. 635º, nº 4, e 641º, nº 2, al. b)); Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados (art. 640º, nº 1, al. a)); Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g., documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc); Falta de indicação exacta, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente cada segmento da impugnação.”
Sobre esta última exigência temos seguido posição, em consonância com o que tem sido a evolução da jurisprudência deste Tribunal da Relação de Guimarães e de outros tribunais de recurso, que, como ficou dito em Ac. de 19.11.2020[8], por nós subscrito, é a seguinte: “Em síntese, as conclusões têm a importante função de definir e delimitar o objecto do recurso e, desta forma, circunscrever o campo de intervenção do tribunal superior encarregado do julgamento.
Deste modo, sendo a impugnação de matéria de facto uma autêntica questão fundamental, susceptível de conduzir a decisão diferente, deve ela ser incluída nas conclusões das alegações, de forma sintética mas obviamente com indicação expressa e precisa dos pontos de facto impugnados e com as correspondentes conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio.[9]
Essa leitura veio entretanto a ser mitigada com o Ac. uniformizador de jurisprudência proferido pelo S.T.J., em , no qual ficou dito que, sic: “O recorrente que impugne a decisão sobre a matéria de facto, cumpre o ónus constante do nº 1, c), do art. 640º, se a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, constar das conclusões, mas também da leitura articulada destas últimas com a motivação do vertido na globalidade das alegações, e mesmo na sequência do aludido, apenas do corpo das alegações, desde que, do modo realizado, não se suscitem quaisquer dúvidas.
Ficou por isso expressa uniformização de jurisprudência nos seguintes termos: Nos termos da alínea c), do nº 1, do artigo 640º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações.
Com refere Abrantes Geraldes[10] - As referidas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor. Trata-se a final, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo.

Tendo em mente a interpretação do art. 640º, que acima enunciamos, analisemos a pretensa impugnação da Apelante.

Descendo ao caso, haverá que, em primeiro lugar, avaliar o cumprimento por parte do Recorrente desses ónus estabelecidos pelo art. 640º, do Código de Processo Civil, que no entender do Recorrido não foram aqui respeitados.
Analisado o requerimento em apreço, julgamos que está suficientemente identificado nas respectivas conclusões (que, poderiam, é certo, ser mais assertivas e sumárias), maxime nos seus pontos 2., 4., 17., 23., 24., o objecto da impugnação.
Em suma, o que a Apelante pretende é a reversão da decisão do facto negativo inscrito no ponto 3.3. da matéria de facto considerada pela sentença em crise, pelo que julgamos estarem assim preenchidos os ónus previstos nas als. a) e c), do citado art. 640º, nº 1, do C.P.C..
No que contende com ónus da sua al. b) também consideramos que as alegações da Apelante o satisfazem, com a indicação da prova, nomeadamente a documental, que considera pertinente para a revisão dessa decisão.
Em conclusão, julga-se improcedente esta outra objecção das alegações do Recorrido.

Passando à análise da decisão impugnada, está em causa saber se foi acertado o julgamento da seguinte matéria: Nenhuma das assinaturas ids. em 3.2. pertence ao punho do executado embargante.
Sobre esta matéria a sentença assinalou a seguinte motivação:
“(…) Deste modo, o Tribunal teve em consideração o teor do requerimento executivo junto aos autos principais e do documento anexo (livrança), cujo original foi oportunamente junto, assim como dos documentos juntos com os embargos, no confronto com a alegação das partes nas suas peças processuais e as declarações de parte do embargante prestadas em sede de audiência de julgamento.
Ora, analisadas as declarações em sujeito, no confronto com os documentos supra-referidos, não resulta apurado que pertença ao executado embargante a assinatura aposta naquela livrança, designadamente não tendo sido apresentada nenhuma testemunha que afirmasse ter presenciado tal acto.
De facto, impugnada a genuinidade da assinatura aposta numa livrança, é ao exequente que cabe convencer da verdade da mesma, produzindo designadamente prova que possibilite a conclusão da genuinidade da assinatura, o que não foi o caso, atendendo ao facto não só de a realização da perícia oportunamente solicitada e determinada ter ficado prejudicada, como ainda por nenhuma qualquer outra prova ter sido produzida nesse sentido.[11]
Assim, sendo esta a prova reunida nos autos, diferente não podia ser a reflexão a estabelecer sobre a mesma, não podendo ser diversas as conclusões de facto daquelas que acima se discriminaram.”

Em sentido oposto, a Apelante defende, em suma: que a perícia realizada não poderia ter sido considerada, atenta a sua conclusão; que o Tribunal preferiu a “palavra” do executado, que se limitou a impugnar a assinatura; que foi desconsiderado o documento junto com o requerimento executivo que consubstancia o contrato subjacente à emissão da livrança em causa, perante o qual era ao embargante que cabia o ónus da prova da veracidade da assinatura.

Apreciando…
Antes de mais, haverá que salientar o seguinte aspecto, respeitante à apreciação das provas submetidas a juízo, que foi ignorado quer pela decisão recorrida, quer pelo Recorrente nas suas alegações: decorre do disposto no art. 413º, do Código de Processo Civil, o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las, sem prejuízo das disposições que declarem irrelevante a alegação de um facto, quando não seja feita por certo interessado.
Conforme salienta Abrantes Geraldes e outros[12], citando Antunes Varela, as regras do ónus da prova contidas no art. 342º, do Código Civil, têm feição marcadamente objectiva, significando que ao exercício da actividade jurisdicional interessa acima de tudo saber se determinado facto, está ou não demonstrado, uma vez concluída a instrução, e não tanto averiguar qual das partes estava onerada com o respectivo ónus da prova.
 Portanto, no julgamento da matéria de facto, o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, nos termos expressos no citado art. 413º, de acordo com o princípio da aquisição processual, que é absoluto no que respeita aos meios de prova.
É, por isso, despiciendo, invocar no plano do julgamento dos factos submetidos a instrução, as regras do ónus da prova e/ou produzir qualquer julgamento dos mesmos com base no (in)cumprimento desse ónus ou sequer a sua imputação.
Contudo, antes disso e ainda relacionado com o objecto do julgamento em apreço, existe uma outra regra que não foi aqui atendida pelo Tribunal a quo, dado que não se teve em conta que o que tinha de ser levado a julgamento neste caso era, não o facto negativo inscrito em 3.3., mas sim a alegada positiva imputação da assinatura do executado (cf. arts. 5º e 724º, nº 1, al. e), do C.P.C.), articulada no item 4. do requerimento executivo: A livrança foi subscrita pelo Executado AA.
É este o facto constitutivo essencial à procedência da causa de pedir invocada pela Exequente que importa julgar (art. 5º, nº 1, do C.P.C.).
Se não, vejamos, em termos pragmáticos, em caso de julgamento negativo, do facto negativo inscrito em 3.3., com o que fica a decisão em apreço para julgar a pretensão da Exequente?
Perante isto, julgamos ser de ampliar a matéria de facto a julgar nesta matéria, tendo em conta o disposto no art. 662º, nºs 1 e 2, al. c), do C.P.C., a contrario, aditando aos factos a seguinte factualidade: A livrança foi subscrita pelo Executado AA.
Acresce que, o que releva para o julgamento destes embargos é apenas e só o julgamento da execução movida contra o aqui embargante AA, sendo impertinente e potencial motivo de confusão incluir no julgamento a imputação feita à co-executada BB, cujos embargos foram, aliás, indeferidos por extemporaneidade.

Posto isto, em face de toda a prova produzida poderemos ou não concluir que a assinatura aposta na livrança em causa foi aposta pelo Recorrente?
Tendo em mente, desde logo, a perícia referenciada pela decisão recorrida, tendemos a concordar com a Apelante quando afirma que estamos perante um dado probatório irrelevante, na medida em que se concluiu pura e simplesmente que era inviável o pretendido juízo pericial e ninguém questionou esse non liquet.
Estamos, por isso, perante uma conclusão irrelevante ou que não podemos considerar à luz do preceituado no art. 388º, do Código Civil.
Além disso, o que resta nos autos sobre essa temática é um conjunto de documentos onde se encontra inscrita a assinatura do nome do Executado, alguns deles juntos para a realização da dita perícia, nos quais se nota sem necessidade de conhecimentos especiais, aliás tal como salientou o seu relatório, a inconsistência da assinatura do mesmo, aposta em escritos em que se encontra a sua genuína firma (cf., v.g., docs. de fls. 42 e ss.).
Mais, como alega a Embargada, foi junto com o requerimento executivo, o contrato que alegadamente subjaz à livrança em apreço, do qual consta, na sua cláusula 10.1., o seguinte: em anexo ao presente contrato o locatário e cônjuge subscreveram e entregaram à locadora uma livrança em branco, que a locadora fica, desde já,[13] e se assim o entender, autorizada a preencher (…).
Nesse contrato de 15.1.2010, o Locatário subscritor é precisamente o aqui Embargante.
Essa assinatura nesse contrato, que o Recorrente não impugnou (e que exigia a arguição de falsidade nos termos dos arts. 375º, do C.C., e 446º, do C.P.C.), foi reconhecida perante notário, conforme anexo que se encontra junto com o mesmo documento e requerimento executivo.
Existe, assim, uma evidente contradição entre o que é a titubeante alegação do Executado agora em sede de embargos – “não se recordam os Embargantes de terem procedido à assinatura de qualquer livrança” – e o que reconheceram no referido escrito de 15.1.2010, sem qualquer explicação adicional e sem que nos autos exista algo que permita duvidar da veracidade do que aí ficou acordado ou dito por escrito.
Ora, não havendo qualquer limitação quanto à prova da veracidade da referida assinatura nos termos do art. 374º, nº 2, do C.C., e, à semelhança do que se considerou no Ac. deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 29.9.2022[14], estando demonstrada a relação subjacente, e a ligação do embargante (e já agora da outra executada) a essa relação subjacente, na qual declarou (declararam) obrigar-se numa livrança, e perante uma livrança com uma assinatura que lhe é imputada, temos que todas as regras da experiência e da normalidade da vida e do senso comum apontam para que foi ele quem assinou pelo seu punho a dita livrança (cf. art. 349º, do Código Civil).
A circunstância de, neste caso concreto, termos um resultado pericial inoperante ou que não corrobora positivamente essa conclusão não deve obstar a essa convicção.
Estando nós no plano da livre apreciação dos dados coligidos em instrução, julgamos que essa prova é bastante para demonstrar essa factualidade, sendo inoperante para a contrariar as declarações interessadas do executado e/ou as ligeiras diferenças que se podem assinalar entre as assinaturas que constam do escrito com a assinatura reconhecida e da livrança em execução, na medida em que, por sinal, como acima se notou, a constante a atender nos dados probatórios coligidos e acima citados é a habitual inconsistência da firma ou assinatura do Executado.
Neste conspecto, dando razão à Apelante, decidimos revogar a decisão positiva do impugnado facto 3.3. e, em sua substituição, de acordo com o que acima ficou dito, julgar provado que: A livrança mencionada 3.1. e junta como documento ..., do requerimento executivo (que qui se dá por reproduzido) foi subscrita pelos Executados AA no espaço destinado aos seus “subscritores”.

Aqui chegados, impõe-se, de acordo com o disposto no citado art. 662º, do C.P.C., escrutinar o âmbito da decisão da matéria de facto proferida pela primeira instância, tendo em mente, por um lado, o objecto do processo, e, por outro, aquilo que efectivamente ficou a constar da mesma, dado que, perante a decisão positiva do facto 3.3., nos termos acima julgados, impõe-se o conhecimento das restantes excepções invocadas pelo Apelante nos seus embargos.
Sucede que, essa decisão pura e simplesmente não existe, neste caso concreto.
O Tribunal a quo, ressalvado o devido respeito, esqueceu porventura que não é a última instância na decisão desta demanda cujo valor ascende a mais de 140000 euros, e depois de ter inscrito diversos outros temas de prova no seu despacho saneador de 25.4.2022, acabou por se pronunciar apenas sobre aquele que inscreveu em último lugar desse registo, omitindo o conhecimento da factualidade respeitante: à prescrição; à alegada inexistência do título; ao seu preenchimento abusivo e á falta de interpelação do exequente
Estamos, assim, perante uma decisão que deixou de se pronunciar ou omite o conhecimento da maior parte da matéria de facto que as partes consideraram interessante e que o próprio Tribunal considerou, em grande parte, relevante para o julgamento da causa, numa fase em que lhe estava vedado recorrer à regra do art. 608º, nº 2 (relativa às questões prejudicadas), do Código de Processo Civil, que é o do julgamento da matéria de facto respeitante às diversas soluções plausíveis para o desfecho da lide.
Neste caso, embora não tenha sido arguida a nulidade da decisão, certo é que essa questão é de conhecimento oficioso deste Tribunal, atendendo ao disposto no citado art. 662º, do C.P.C..
Com efeito, pedindo aqui emprestadas as doutas palavras do Ac. deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 7.6.2023[15], e a doutrina e jurisprudência que nele se citam e para a qual remetemos para o mais completa análise da questão: “se a lei, no art. 662.º, n.º 2, al. c), do CPC, permite a anulação oficiosa da decisão proferida na 1.ª Instância quando a decisão de facto respectiva seja deficiente, por maioria de razão tê-lo-á que permitir quando a mesma seja absolutamente omissa, por esta omissão total ser o grau máximo daquela deficiência.
Assim, na expressão «deficiência» caberá necessariamente, não só a falta de decisão sobre um facto essencial, como a falta absoluta de decisão sobre todos os factos essenciais.
Compreende-se que assim seja, já que «se houver uma total ausência de decisão sobre a matéria de facto, não pode este Tribunal exercer o poder censório, não só quanto à matéria de facto provada, como também sobre o direito aplicado e aplicável».
Dir-se-á mesmo que não será só o Tribunal de Recurso que ficará impedido de exercer a sua função de sindicância, outro tanto sucedendo relativamente a pretendido recorrente, já que «tal procedimento também impede as partes» de cumprirem o ónus de impugnação que lhes está cometido pelo art. 640.º, n.º 1, als. a) e b) do CPC, incluindo «de cabalmente argumentarem na defesa das suas posições (…) porquanto desconhecem a convicção do Mmº Juiz a quo, restando-lhes supor que factos terá considerado como provados para concluir como o fez» (Ac. da RL, de 27.10.2009, Maria José Simões, Processo n.º 3084/08.0YXLSB-A.L1-1, com bold apócrifo).”
No nosso caso, embora estejamos perante uma decisão que se pronunciou sobre uma parte desse acervo fáctico, constatamos que deixou de lado a maior parte daquela, restante, que foi articulada e seria pertinente para a discussão do direito aplicável.
Deste modo, julgamos que também neste caso se aplicam as razões expressas nessa jurisprudência para se determinar a anulação da sentença, tendo em vista a salvaguarda da dupla jurisdição em matéria de facto e do contraditório relativo à respectiva decisão em primeira instância, que julgamos não estar assegurado ou sequer ter sido desejado pelo legislador nestes casos em que a falta ou deficiência da daquela é tão profunda.
Por conseguinte, impõe-se anular oficiosamente a decisão proferida pelo Tribunal a quo, para que ele, face nomeadamente à prova produzida nos autos ou a outra que entenda pertinente, a fundamente de facto (conforme imposto pelo art. 607.º, n.º 3, n.º 4 e n.º 5, e 608º, nº 2, do C.P..C), já que, como se afirma no citado Ac. deste Tribunal da Relação de Guimarães, cabe a este Tribunal da Relação sindicar esse juízo de facto que realize, e não substituir-se-lhe no mesmo (produzindo-o de forma inédita e integral).
Deverá, assim, à semelhança do que ficou decidido nesse Acórdão (art. 8º, nº 3, do C.C.), determinar-se em conformidade, a anulação desta sentença do Tribunal a quo, por forma a que seja colmatada a sua actual e extensa falta de fundamentação de facto (que, em sentido amplo, inclui quer a falta de discriminação dos factos provados e não provados, quer a falta de qualquer apreciação crítica da respectiva prova) respeitante aos temas acima assinalados, possibilitando assim a sua completa apreciação no plano do direito.
É o que, por agora, se decide, como prejuízo para o conhecimento do restante objecto do recurso interposto, nos termos do citado art. 608.º, n.º 2.         
                       
4. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em anular a sentença recorrida a fim de que seja ampliada a fundamentação de facto nos termos acima expostos, ou seja, no que respeita aos demais factos alegados pelas partes que são pertinentes para a discussão e julgamento de todas as questões por essas suscitadas (além da arguida falsidade da assinatura da livrança), considerando as regras previstas no nº 3, do art. 662º, do C.P.C., tendo mente que, em relação à matéria do facto 3.3., acima julgada, não há lugar a essa renovação do julgamento dado que já se operou a pronúncia deste Tribunal de segunda instância.

Custas pelo Recorrido art. 527º, n.º 1, do C. P. Civil).  
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Sumário[16]:
- De acordo o princípio da proporcionalidade, quando o conjunto de alegações/conclusões seja reduzido, a formulação de conclusões através de cópia quase integral das alegações que deveriam sintetizar, não pode ser considerada como factor determinante da rejeição do recurso à luz da previsão do art. 641º, nº 2, al. b), do C.P.C..
- Cumpre o disposto no art. 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, o apelante que identifica de forma perceptível o objecto da impugnação, o sentido da decisão que pretende e, de modo crítico, a prova que haverá de ser considerada para esse efeito.
- As regras do ónus da prova contidas no art. 342º, do Código Civil, têm feição marcadamente objectiva, significando que ao exercício da actividade jurisdicional interessa saber se determinado facto, está ou não demonstrado, uma vez concluída a instrução, e não averiguar qual das partes estava onerada com o respectivo ónus da prova.
- Estando colocada em causa a assinatura de livrança, documento particular, para os efeitos do art. 374º, do Código Civil, título executivo, o que deve ser inscrito no rol dos factos a julgar é a positiva atribuição dessa assinatura ao alegado subscritor e não, pela negativa, a negação da sua pertença ao mesmo.
- Quando o executado nega ter assinado a livrança, sem mais explicações, e o exequente faz prova de que existiu um negócio subjacente, reduzido a escrito e assinado pelo executado, que prevê a assinatura e entrega de uma livrança naquelas condições e circunstâncias, a livre apreciação da prova permite e até obriga que se considere provado que foi o executado quem assinou pelo seu punho a livrança dada à execução.
- A possibilidade de alteração oficiosa da decisão proferida sobre a matéria de facto, consagrada no art. 662.º, n.º 2, do C.P.C., não pode ser feita de forma tão ampla que pretira a garantia, legal e constitucional, do duplo grau de jurisdição na apreciação, julgamento e decisão da matéria de facto; e, assim, será inaplicável quando tenha ocorrido omissão da maioria de fundamentação de facto que seria pertinente para o julgado.
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Guimarães, 16-05-2024



[1] Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2017, pp. 106.
[2] Conforme se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.7.2016, Gonçalves Rocha, 156/12, «Efectivamente, e como é entendimento pacífico e consolidado na doutrina e na Jurisprudência, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objecto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação». No mesmo sentido, cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4.10.2007, Simas Santos, 07P2433, de 9.4.2015, Silva Miguel, 353/13.
[3] Abrantes Geraldes, Op. Cit., p. 107.
[4] In Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª Ed., p. 155 e ss.
[5] Cf. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 19.2.2015, relatado por Maria dos Prazeres Pizarro Beleza :II - A impugnação da decisão de facto, feita perante a Relação, não se destina a que este tribunal reaprecie global e genericamente a prova valorada em 1.ª instância, razão pela qual se impõe ao recorrente um especial ónus de alegação, no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação. III - Não observa tal ónus o recorrente que identifica os pontos de facto que considera mal julgados, mas se limita a indicar os depoimentos prestados e a listar documentos, sem fazer a indispensável referência àqueles pontos de facto, especificando os concretos meios de prova que impunham que cada um desses pontos fosse julgado provado ou não provado. IV - A apresentação das transcrições globais dos depoimentos das testemunhas não satisfaz a exigência determinada pela al. a) do n.º 2 do art. 640.º do NCPC (2013). V - O incumprimento de tais ónus – prescritos para a delimitação e fundamentação do objecto do recurso de facto – impedem a Relação de exercer os poderes-deveres que lhe são atribuídos para o respectivo conhecimento. – in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/83d97510a180fd5f80257df1005b598c?OpenDocument
[6] Com se refere no Ac. do Supremo Tribunal de Justiçam, de 27.9.2018, infra citado: “Por outro lado, não basta transcrever os depoimentos que se invocam para alterar as respostas dadas. É necessário dizer porquê. Qual a razão pela qual deve ser num sentido e não noutro. Essa análise crítica também não foi feita pela Recorrente”.
[7] E, como acentua o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça infra citado, do princípio da cooperação, pretendendo-se que, por essa via, a 2ª instância facilmente aceda à informação tida pelo recorrente como interessante, em lugar de despender tempo nessa actividade – “há um mínimo de exigência e rigor a impor ao recorrente que impugna a matéria de facto, sob pena de, perante a ambiguidade, inconcludência e prolixidade na elaboração da peça recursória, transferir para a 2ª instância tarefas funcionais desmesuradas, exorbitantes e desproporcionadas que, nos termos legais, àquele cabem.
[8] In http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/9484dd49e64d74d28025863a00574f6a?OpenDocument 
[9] No mesmo sentido vide Ac. STJ de 01.10.2015, proc. 824/11.3TTLSB.L1.S1, relatora Ana Luísa Geraldes; Ac. 07.07.2016, proc. 220/13.8TTBCL.G1.S1, relator Gonçalves Rocha; Ac. STJ de 16.05.2018, proc. 2833/16.7T8VFX.L1.S1, relator Ribeiro Cardoso; Ac. STJ de 06.06.2018, proc. 552/13.5TTVIS.C1.S1, relator Pinto Hespanhol; Ac. STJ de 31.10.2018, proc. 2820/15.2T8LRS.L1.S1 e Ac. STJ de 06.11.2019, proc. 1092/08.0TTBRG.G1.S1, ambos relatados por Chambel Mourisco, todos acessíveis em www.dgsi.pt.
[10] Ob.cit., p. 159
[11] O sublinhado é nosso…
[12] In Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2ª Ed., p. 505
[13] O sublinhado é nosso
[14] In https://diariodarepublica.pt/dr/detalhe/acordao/549-2022-209669275
[15] In https://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/d286fe45c7d7423c802589d4004ce829?OpenDocument
[16] Da responsabilidade do relator – cf. art. 663º, nº 7, do Código de Processo Civil.