Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | RICARDO MIRANDA PEIXOTO | ||
Descritores: | DOCUMENTO PARTICULAR DOCUMENTO AUTENTICADO VALIDADE TÍTULO CONSTITUTIVO TÍTULO TRANSLATIVO DE PROPRIEDADE | ||
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Data do Acordão: | 12/19/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | I. É condição de validade do acto de autenticação do documento particular, o respectivo depósito no sítio www.predialonline.mj.pt, no momento da celebração do negócio ou, em caso de dificuldade técnica da plataforma, nas 48 horas subsequentes (cfr. artigo 24.º, n.ºs 2 e 3, do D-L n.º 116/2008 de 04.08 e artigos 4.º, n.º 3, 6.º, n.º 1 e 7.º, n.ºs 1 e 2, da Portaria n.º 1535/2008, de 30.12). II. A omissão do depósito determina a invalidade da autenticação e, consequentemente, o respectivo negócio será havido como celebrado por documento particular não autenticado. III. Impendendo sobre o Autor que peticiona a declaração da nulidade do negócio de compra e venda por violação da forma legal, o ónus de alegação e prova dos factos constitutivos do seu direito, terá de alegar a omissão de depósito do documento particular autenticado no sítio www.predialonline.mj.pt, se pretender valer-se deste facto como fundamento do seu pedido. IV. A mera invocação, pelo Autor, do desconhecimento do referido depósito, desacompanhada de justificação para essa falta de conhecimento, não cumpre o ónus de alegação de que foi omitido o cumprimento daquela condição de validade. V. As declarações apresentadas junto da Autoridade Tributária para efeito de liquidação de IMI e IS, ou Modelo 11, não são título constitutivo ou translativo do direito de propriedade. VI. A errada identificação de bens da herança nas declarações aludidas no ponto anterior, não afecta a validade do título de compra e venda que identifica o respectivo objecto como o quinhão hereditário pertencente ao executado na herança, ilíquida e indivisa, aberta por óbito de familiar deste, sem referência aos concretos bens ou direitos que a compõem. VII. Tratando-se de uma venda executiva, as questões relativas à existência e pertença do direito penhorado ao ali executado, bem como às suas implicações na compra e venda realizada pelo encarregado da venda, têm de ser suscitadas em sede de oposição à penhora / embargos de terceiro ou através do incidente de anulação da venda (cfr. artigos 784.º, 342.º e 838.º, todos do Código de Processo Civil). (Sumário do Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | Apelação n.º 1480/23.1T8PTG.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre, Juízo Central Cível e Criminal de Portalegre - Juiz 3 * SUMÁRIO (artigo 663.º, n.º 7, do CPC): (…)*** Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora, sendo Relator: Ricardo Miranda Peixoto; 1º Adjunto: Filipe César Osório; 2º Adjunto: Filipe Aveiro Marques. * I. RELATÓRIO*** * A.(…) e (…) propuseram a presente acção declarativa com processo comum contra Banco (…), S.A., (…) e (…), pedindo que se declare nulo, na sua totalidade, o contrato de compra e venda do quinhão hereditário do Autor, (…), referido no artigo 2º da p.i. e, em consequência: a) Se declare nula a venda de ½ do prédio urbano inscrito sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas, venda que o Autor (…) alegadamente haveria realizado a favor dos Réus (…) e (…); b) Se declare nula a venda judicial do quinhão hereditário na herança aberta por óbito da falecida (…); c) Se declare nula a venda do quinhão hereditário nas heranças abertas por óbito de (…) e (…). Para tanto, alegaram que no dia 28 de Janeiro de 2022, (…), agente de execução, encarregado de venda no processo executivo 4801/18.5T8OER, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Oeiras – Juízo de Execução – Juiz 2, no qual é Executado o aqui Autor (…) e Exequente o aqui Réu Banco (…), vendeu aos aqui Réus (…) e (…), por documento particular com termo de autenticação, o quinhão hereditário do qual era titular o Autor (…) na herança aberta por óbito de (…), que havia sido penhorado naqueles autos. No DUC relativo ao IMT da venda, por declaração prestada perante a AT, foram discriminados os bens a que respeita o quinhão hereditário em apreço, nos quais foi incluído como “Bem-1” o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas, do mesmo constando que o alienante é (…), aqui Autor, que não outorgou a escritura. Em declaração Modelo 11 apresentada pela advogada (…) junto do Serviço de Finanças de Elvas, foi declarado que (…), aqui Autor, vendeu ½ do mencionado prédio, passando, por isso, a constar inscrito a favor de (…) e de (…), aqui Réu, na proporção de ½ para cada um, como se de uma compropriedade se tratasse. Uma vez que o Autor (…), em resultado da referida declaração Modelo 11, figura como vendedor de um bem imóvel no ano de 2022, passou a apresentar uma situação fiscal irregular, sendo convidado pela AT a apresentar o respectivo modelo G do IRS, no qual especifique o preço pelo qual alienou o prédio, o que é impossível porque o Autor não procedeu à venda. * B.Contestou o Réu Banco (…). Impugnou de direito, considerando que: - a argumentação dos Autores não aponta qualquer vício ao título de venda impugnado, no qual apenas foi vendido o quinhão hereditário do executado (…) na herança, ilíquida e indivisa, aberta por óbito de (…). Não foram vendidos bens em concreto, partes indivisas em imóveis, outras heranças ou direito de terceiros em outras heranças. O título impugnado não procedeu à transmissão dos bens identificados nas alíneas a), b) e c) dos pedidos verificando-se, pelo contrário, uma correspondência exacta entre o bem apreendido no processo executivo e o objecto da venda; e - a questão colocada pelos Autores reconduz-se a um vício de liquidação tributária do imposto – IMI devido pela venda –, com a inclusão na declaração de imóveis porventura não incluídos no quinhão adquirido, à qual o banco contestante é alheio. A reacção contra esta situação deve ser efectuada junto da AT e, eventualmente, junto da respectiva jurisdição. Excepcionou a preclusão do eventual direito dos Autores porque a anulação da venda teria de ser suscitada no processo executivo, ao abrigo dos artigos 838.º e 839.º do CPC, em prazo que se mostra já decorrido. * C.No seguimento de convite do tribunal, os Autores responderam. Invocaram que o Autor (…) não foi parte no processo de execução não havendo como ter tido conhecimento da venda que, para além do mais, é sindicável nos termos gerais do direito previstos pelos artigos 294.º do CC e 839.º, alínea d), do CPC. * D.Foi proferida sentença no despacho-saneador, com o teor que, pela sua brevidade, se reproduz: “(…) Da excepção dilatória inominada atinente à violação das regras previstas nos artigos 838.º e 839.º do Código de Processo Civil. Com a presente acção, os autores pugnam pela declaração da nulidade da venda judicial realizada no âmbito do processo executivo n.º 4801/18.5T8OER, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste – Oeiras Juízo de Execução – Juiz 2, em 28 de Janeiro de 2022, mais concretamente de um quinhão hereditário que o autor … (executado naqueles autos) era anteriormente titular, da herança ilíquida e indivisa, aberta por óbito de (…). Ora, de acordo com a lei adjectiva, só se verifica a invalidade da venda ou falta de eficácia da mesma nas situações elencadas nos artigos 838.º e 839.º do C.P.C.. Assim, de modo a tutelar o direito de que se arrogam, os autores (na qualidade de executado e eventual interessado), deveriam ter deduzido o competente incidente no âmbito do referido processo executivo – cfr. artigo 2.º, n.º 2, do C.P.C.. Tal não sucederia se o comprador já tivesse alienado o bem a um terceiro, devendo, nesse caso, ser deduzida por via de uma acção declarativa própria – cfr. douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20-12-17, 3018/14, disponível in www.dgsi.pt. Por conseguinte, a circunstância de os autores não terem recorrido ao incidente próprio seria suficiente para fazer improceder a sua pretensão. Em todo o caso, face aos elementos disponíveis no processo, nomeadamente o acervo de prova documental, que permitiria conhecer do mérito da causa sempre se dirá que, do ponto de vista substancial, a razão também não assiste aos autores. Senão, vejamos. Os autores peticionam a declaração da nulidade da venda de ½ do prédio urbano inscrito sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas, bem como a venda do quinhão hereditário nas heranças abertas por óbito de (…) e (…). Todavia, conforme já se avançou, a venda em causa diz respeito a um quinhão hereditário da herança ilíquida e indivisa, aberta por óbito de (…). Veja-se, a este propósito, o documento n.º 1, junto com a petição inicial, que constitui precisamente o contrato de compra e venda de quinhão hereditário, colocado em crise nos presentes autos. Assim, por manifesta ausência de fundamento legal, os pedidos em causa terão de necessariamente improceder, uma vez que a venda operada na acção executiva não teve como objecto ½ do direito de propriedade do prédio urbano inscrito sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas, nem a venda do quinhão hereditário nas heranças abertas por óbito de (…) e (…). Por outro lado, no que concerne ao pedido de declaração de nulidade da venda judicial do quinhão hereditário transmitido no processo executivo, não ressalta do arrazoado aduzido pelos autores qualquer fundamento susceptível de conferir respaldo à sua pretensão. Até porque, as vicissitudes decorrentes das obrigações fiscais alegadas em nada poderão influir no efeito translativo da propriedade decorrente da celebração do contrato de compra e venda – cfr. artigo 879.º do Código Civil, neste sentido veja-se o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14-11-2013, 156/09.7TBCNT.C1.S1, disponível in www.dgsi.pt. No que concerne à matéria referente à aceitação da herança, note-se que o autor (ali executado) não alega que não aceitou a herança em causa, sendo, pois despicienda esta matéria para aferir da validade desta venda judicial. Na matéria atinente à demonstração do óbito, cabe notar que o mesmo resulta demonstrado em virtude da escritura de habilitação de herdeiros da referida (…), apresentada pelos próprios autores, acompanhando a petição inicial. Por último, no que concerne à eventual falta de depósito (os autores apenas alegam que desconhecem tal facto), deverá aludir-se ao disposto no art. 371.º do Código Civil, quanto à prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade pública ou oficial respectivo – o documento particular autenticado em causa faz referência expressa ao facto referente ao depósito electrónica. Face ao exposto, julga-se totalmente improcedente a presente acção, absolvendo-se os réus do pedido. (…)” * E.Inconformados com o decidido, os Autores interpuseram o presente recurso de apelação. Concluíram as suas alegações nos seguintes termos (transcrição parcial sem itálico, negrito e sublinhado da origem): “(…) 1- Os Autores questionaram a validade da DPA impugnada por ausência de depósito do mesmo em www.predialonline.pt. 2- A falta de depósito do DPA violou o disposto no artigo 24.º do Decreto Lei n.º 116/2008, de 4 de julho, provocou a nulidade do mesmo; 3- A nulidade, havendo sido invocada, é obrigatoriamente conhecida pelo Tribunal. 4- Ao não haver conhecido de tal nulidade, violou a decisão recorrida o disposto nos artigos 286.º e 294.º do Código Civil e, ainda, o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil. 5- Deverá a decisão recorrida ser declarada nula. 6- Refere o Tribunal a quo que (…) a venda operada na ação executiva não teve como objeto 1/2 do direito de propriedade do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas (…). 7- Porém, a mesma venda deu origem ao averbamento do ½ daquele prédio a favor do Réu (…) na matriz predial. 8- Todavia o Tribunal a quo, contrariando a conclusão a que chegou, não considerou nula a inscrição de ½ do prédio a favor do Réu (…), por falta de título ou nulidade deste. 9- Tal decisão é nula por violação da primeira parte da alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC – os fundamentos estão em oposição com a decisão. 10- Deverá tal nulidade ser declarada. 11- A ausência de depósito da compra e venda e respetivo termo de autenticação – Documento Particular Autenticado – em www.predialonline.pt , por versar a compra e venda sobre atos sujeitos a registo predial, levou à violação do disposto no artigo 24.º do Decreto Lei n.º 116/2008, de 4 de agosto. 12- Tal preceito contém uma norma imperativa, cuja violação leva à nulidade, pois não prevê o mesmo preceito diferente consequência (artigo 294.º do CC). 13- A expressa invocação por parte dos Autores da violação do referido preceito, levaria o Tribunal a quo a conhecer obrigatoriamente da nulidade (artigo 296.º do CC). 14- Ao não haver declarado nulo a compra e venda impugnada, o tribunal a quo violou os referidos preceitos legais. 15- Deverá a decisão recorrida ser revogada por outra que declare nula a compra e venda impugnada. 16- A compra e venda impugnada versou sobre a compra e venda de um quinhão hereditário. 17- O Autor (…) não interveio na compra e venda do quinhão hereditário. 18- Na venda do quinhão hereditário vende-se direitos que incidirão sobre bens; não se vendem partes especificadas desses bens, nem os próprios bens. 19- No entanto, a entidade autenticadora da compra e venda, inclui na venda do quinhão ½ do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas, havendo apresentado junto do Serviço de Finanças de Elvas, Modelo 11, no qual declarou a venda desse ½. 20- O prédio passou a constar na matriz inscrito a favor do Réu (…) e do Autor (…), na proporção de ½ para cada um. 21- A inscrição de ½ do prédio a favor do Réu (…) na matriz é nula por falta de título ou por nulidade desse título. 22- Deverá por este motivo a decisão recorrida ser revogada por outra que declare nula a inscrição de ½ do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas a favor do Réu (…). 23- A compra e venda impugnada não contem os elementos dos quais depende a existência do quinhão transmitido e da titularidade do mesmo. 24- Não comprova o DPA impugnado a morte da autora de herança e, deveria havê-lo feito através da consulta do assento de óbito daquela. 25- Tampouco comprova o DPA a qualidade de herdeiro do vendedor/executado (…). 26- E ainda que comprovada a qualidade de herdeiro do vendedor, ipso facto daí não resultaria que o quinhão existisse. 27- Só com a aceitação tal quinhão hereditário passaria a existir. 28- As supra referidas omissões, levam à nulidade da compra e venda do quinhão hereditário impugnado. 29- Nulidade que aqui deverá ser decretada (…)”. * G.O Recorrido (…) respondeu. Concluiu as suas contra-alegações em discordância com os argumentos dos Recorrentes e sustentando o acerto da decisão recorrida. * H.Também o Recorrido Banco (…), S.A. respondeu às alegações de recurso, pugnando pela manutenção da decisão recorrida. * I.Colheram-se os vistos dos Ex.mos Sr. e Sr.ª Juízes Desembargadores Adjuntos. * J. Questões a decidir São as seguintes as questões em apreciação no presente recurso:[1] 1. Se a sentença proferida é nula por omissão de pronúncia ou por contradição entre os fundamentos e a decisão; 2. Se, em caso de resposta negativa à questão precedente, deve acolhida a matéria de facto provada proposta pelos Recorrentes; e / ou 3. Se, no caso de resposta afirmativa à questão 3, é inválida a compra e venda impugnada pelos Autores da presente acção. * Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia / contradição entre os fundamentos e a decisão* Invocam os Recorrentes a nulidade da sentença recorrida, sustentando para o efeito que: i. Omitiu (cfr. alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC) o conhecimento da invocada invalidade do documento particular autenticado (DPA) decorrente da falta de depósito em www.predialonline.pt que, por violar o disposto no artigo 24.º do Decreto Lei n.º 116/2008, de 4 de Julho, provoca a nulidade daquele título; ii. Encerra em si contradição (cfr. alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC) entre a conclusão constante da sua fundamentação – no sentido de que “(…) a venda operada na ação executiva não teve como objeto 1/2 do direito de propriedade do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas (…)” – e a decisão de não considerar nula por falta de título ou nulidade deste, a inscrição de ½ do prédio a favor do Réu (…) na matriz, a que a mesma venda deu origem. * Prevê o n.º 1 do artigo 615.º do CPC que “é nula a sentença quando:a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido. As nulidades da sentença taxativamente previstas no artigo 615.º, n.º 1, alíneas a) a e), do CPC, são vícios formais e intrínsecos, designados como error in procedendo, respeitando apenas à estrutura ou aos limites da decisão. Como refere José Lebre de Freitas, “os casos das alíneas b) a e) do n.º 1 constituem, rigorosamente, situações de anulabilidade da sentença, e não de verdadeira nulidade. Respeitam eles à estrutura ou aos limites da sentença. Respeitam à estrutura da sentença os fundamentos das alíneas b) (falta de fundamentação) e c) (oposição entre os fundamentos e a decisão). Respeitam aos seus limites os das alíneas d) (omissão ou excesso de pronúncia) e e) (pronúncia ultra petitum).” [2] São vícios a apreciar em função do texto da sentença, do discurso lógico nele desenvolvido, não se confundindo com erros de julgamento (error in judicando – que são erros quanto à decisão de mérito constante da sentença), decorrentes de errada consideração da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do Direito (error juris) à matéria de facto, levando a que o decidido não corresponda à realidade ôntica ou normativa, com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos. i. Começando por apreciar a alegada nulidade prevista pela supracitada alínea d) do n.º 1 do artigo 615. º do CPC, dir-se-á que a omissão de pronúncia ocorre perante a ausência de posição ou de decisão do tribunal sobre matérias em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa. A norma em apreço conjuga-se com o n.º 2 do artigo 608.º do CPC que impõe ao juiz o dever de “resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”. A omissão de pronúncia só se verifica quando o juiz deixa de se pronunciar sobre questões que lhe foram submetidas pelas partes e que, por isso, tem de abordar e resolver, ou de que deve conhecer oficiosamente, entendendo-se por questões os dissídios ou problemas concretos a decidir e não as razões, no sentido de simples argumentos, opiniões, motivos, ou doutrinas expendidos pelos interessados na apresentação das respectivas posições, na defesa das teses em presença. O que se compreende porque, por um lado, através da prova, foi feita a triagem entre as soluções que deixaram de poder ser consideradas e aquelas a que a discussão jurídica ficou reduzida; por outro lado, o juiz não está sujeito às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas e, uma vez motivadamente tomada determinada orientação, as restantes que as partes hajam defendido, nomeadamente nas suas alegações de direito, não têm de ser separadamente analisadas. Como ensina Alberto dos Reis, não enferma da nulidade em apreço, a decisão “que não se ocupou de todas as considerações feitas pelas partes, por o tribunal as reputar desnecessárias para a decisão do pleito. (…) São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer do seu ponto de vista: o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.” [3] A este propósito, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11.10.2022, relatado pelo Juiz Conselheiro Isaías Pádua no processo n.º 602/15.0T8AGH.L1-A.S1[4], dá conta de que “constitui communis opinio, o conceito de ‘questões’, a que ali se refere o legislador, deve somente ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência / improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, ou seja, abrange tão somente as pretensões deduzidas em termos do pedido ou da causa de pedir ou as exceções aduzidas capazes de levar à improcedência desse pedido, delas sendo excluídos, como já acima deixámos referido, os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos / aduzidos pelas partes (…)”. Sobre a questão também Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Filipe Pires de Sousa referem ser “pacífica a jurisprudência que o dever de decidir tem por referência as questões suscitadas e bem assim as questões de conhecimento oficioso, mas que não obriga a que se incida sobre todos os argumentos, pois que estes não se confundem com questões (STJ 23-1-19, 4568/13)”.[5] No caso em apreço, consideram os Recorrentes que a decisão recorrida não conheceu a questão da falta de depósito em www.predialonline.pt, do título de compra e venda: o documento particular autenticado (DPA). A este respeito pode ler-se na decisão recorrida que: “por último, no que concerne à eventual falta de depósito (os autores apenas alegam que desconhecem tal facto), deverá aludir-se ao disposto no artigo 371.º do C.C, quanto à prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade pública ou oficial respectivo – o documento particular autenticado em causa faz referência expressa ao facto referente ao depósito electrónica”. Assim, como decorre do texto citado, afigura-se incontornável que os fundamentos da decisão recorrida se debruçaram sobre a específica questão do depósito do título em apreço, o que afasta o alegado vício da omissão de pronúncia. A tomada de posição é, em termos sintéticos, perfeitamente clara sobre o entendimento do Sr. Juiz de 1ª instância, dela resultando que: - por um lado, os Autores não alegaram o facto do qual estaria dependente o reconhecimento do vício formal, pois que a mera alegação do desconhecimento do depósito não equivale à afirmação de que o depósito foi omitido; e, cumulativamente - consta do título de compra e venda – documento particular autenticado –, referência expressa ao depósito electrónico, sendo que o documento autêntico em apreço faz, de acordo com o n.º 1 do artigo 371.º do CPC, prova plena dos factos que refere como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que nele são atestados com base nas percepções da entidade documentadora. Deste modo, o texto da sentença debruça-se, em termos completos, com referência ao facto e ao direito, sobre a questão da alegada invalidade do título resultante do desconhecimento do depósito invocado pelos Autores / aqui Recorrentes, dela resultando que os Autores não cumpriram os ónus de alegação e de prova que sobre eles impendia para colocarem em crise declaração constante de documento autenticado, quando é sabido que a força probatória de documentos autênticos só pode ser ilidida com base na sua falsidade, a suscitar de forma expressa por via incidental, ainda que nos próprios autos (cfr. artigos 372.º, n.º 1, do CC e 446.º a 450.º do CPC). É, assim, manifesta a falta de fundamento do alegado vício de omissão de pronúncia da decisão recorrida. Determinar se as considerações vertidas em 1ª instância sobre a questão do depósito do documento particular autenticado são, ou não, certeiras, quer por referência à insuficiente alegação do facto pelos Autores, quer no que concerne à inexistente impugnação da autenticidade da declaração constante do documento autenticado, é já matéria que se inscreve no conhecimento do mérito da causa, ou seja, de eventual erro de julgamento (error in judicando) decorrente de errada consideração da realidade factual (error facti) e/ou da aplicação do direito (error juris) à matéria de facto, o que se confunde com o vício intrínseco da sentença decorrente da omissão de pronúncia sobre questão suscitada pela parte. ii. Analisemos agora a nulidade suportada na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, consistente na oposição entre os fundamentos e a decisão. Para J. Lebre de Freitas, “entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; (…)” (sublinhados nossos). [6] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Filipe Pires de ousa dão-nos conta de que a incompatibilidade em apreço é entre os fundamentos de direito e a decisão e ocorre quando “a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado. Situação que, sendo violadora do chamado silogismo judiciário, em que as premissas devem condizer com a conclusão, também não se confunde com o eventual erro de julgamento que se verifica quanto o juiz decide contrariamente aos factos apurados ou contra norma jurídica que lhe impõe solução jurídica diferente (STJ 8-9-21, 1592/19, STJ 3-3-21, 3157/17, STJ 29-10-20, 1872/18).” [7] [8] Avaliemos, por isso, se assiste razão à alegação dos Recorrentes que sugerem a contradição entre os fundamentos – na parte, “(…) a venda operada na ação executiva não teve como objeto 1/2 do direito de propriedade do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia (…), concelho de Elvas (…)” – e a decisão recorrida – ao não considerar nula por falta de título ou nulidade deste, a inscrição de ½ do prédio a favor do Réu (…) na matriz, a que a mesma venda deu origem. Contextualizado a transcrição apresentada dos fundamentos da sentença, convém, antes do mais, ter presente que: Os Autores peticionam, em primeira linha, que se declare nulo, na sua totalidade, o contrato de compra e venda outorgado no dia 28 de Janeiro de 2022 por documento particular com termo de autenticação, por (…), agente de execução e encarregado de venda no processo executivo 4801/18.5T8OER do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Oeiras – Juízo de Execução – Juiz 2, no qual era Executado o aqui Recorrente (…) e Exequente o Recorrido Banco (…), do quinhão hereditário que havia sido penhorado naqueles autos, de que o Autor (…) era titular na herança aberta por óbito de (…). Mais pedem que, em consequência da supramencionada declaração de nulidade, sejam declaradas nulas: a) a venda de ½ do prédio urbano inscrito sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas, que o Autor (…) alegadamente haveria realizado a favor dos Réus (…) e (…); b) a venda judicial do quinhão hereditário na herança aberta por óbito da falecida (…); e c) a venda do quinhão hereditário nas heranças abertas por óbito de (…) e (…). Como a decisão da 1ª instância destaca, o título de compra a venda celebrado no âmbito do processo de execução (aliás, o único título de compra e venda nos autos comprovadamente celebrado, através da junção do respectivo documento autêntico) tem por objecto “…o quinhão hereditário do executado … (…), da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de … (…)”, sem referência a qualquer dos bens ou direitos que a compõem. Resultando da fundamentação da decisão recorrida que não há, no entendimento aí professado, fundamento para declarar nula a referida venda do quinhão hereditário, soçobram, necessariamente, as alíneas a) a c) da parte restante do pedido que, de acordo com a tese dos próprios Autores, dependeriam da nulidade da venda do quinhão hereditário celebrada no dia 28.01.2022, no processo de execução. Porque os próprios Autores / Recorrentes fazem decorrer a nulidade dos actos descritos nas alíneas a) a c) do pedido, da nulidade do título de compra e venda outorgado no dia 28.01.2022, encontra-se, desde logo, afastada a alegada contradição entre a decisão final e a parte da fundamentação da decisão recorrida transcrita pelos Recorrentes onde apenas se enfatiza que a venda do quinhão hereditário impugnada em primeira linha, não faz qualquer referência à ½ parte do direito de propriedade do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas. Por outro lado, os Autores não alegam na presente acção qualquer acto de transmissão da propriedade da totalidade ou parte do direito de propriedade do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas, razão pela qual não existe evidência ou alegação da “…venda de ½…” deste prédio urbano, a que o pedido da alínea a) se reporta. O que terá ocorrido, na versão carreada aos autos pelos Autores, é a apresentação de declarações junto da A.T. que erradamente incluíram no quinhão hereditário objecto da venda executiva por título do dia 28.01.2022, direitos sobre bens (entre os quais ½ do prédio 113º da matriz da freguesia de …) que, na realidade, não compunham a herança. Porém, este(s) acto(s) declarativos alegadamente praticados junto da A.T. não são constitutivos ou translativos do direito de propriedade. Como resulta do disposto no artigo 1316.º do Código Civil, o direito de propriedade adquire-se por contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, acessão e demais modos previstos na lei, entre os quais não se inclui qualquer tipo de procedimento junto da administração fiscal. Entre as formas contratuais que permitem a transferência do direito de propriedade, contam-se a doação e a compra e venda que para além de pressuporem a declaração de transmissão do bem ou direito pelo respectivo proprietário, a favor do adquirente, estão sujeitas a forma legal quando incidam sobre bens ou direitos indivisos referentes a imóveis (cfr. artigos 874.º, 875.º, 940.º, n.º 1 e 947.º, n.º 1, do Código Civil). Como as declarações apresentadas junto da A.T. não se enquadram em nenhuma das figuras negociais que operam a transmissão da propriedade, nomeadamente a compra e venda a que os Autores fazem referência na alínea a) do pedido, afigura-se incontornável a conclusão de que a situação descrita na matéria de facto alegada pelos Autores não permite alcançar o efeito visado pela referida alínea a) do pedido. Para além dos meios de impugnação hierárquica ou em sede de justiça tributária, colocados à disposição do A. (…) para reagir contra os actos declarativos alegadamente errados, praticado(s) junto da A.T., estamos em crer que a matéria de facto alegada, na medida em que possa ser enquadrada como um acto lesivo do seu direito de propriedade sobre ½ do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas, com danos patrimoniais traduzidos na cobrança indevida de IMT ou IMI, será passível de fundar lide dirigida contra os declarantes / subscritores dos mesmos actos, destinada a obter o reconhecimento do arrogado direito de propriedade do Autor Manuel e a reparação patrimonial dos prejuízos sofridos com tal situação (acção de reivindicação e/ou de indemnização). O que não permite é, pelas razões expostas, obter a declaração de nulidade de um negócio de compra e venda cuja existência jurídica não vem sequer alegada, mas apenas peticionada. * Em face do exposto, conclui-se que não assiste fundamento à alegada nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia ou por contradição entre os fundamentos e a decisão, ao abrigo das alíneas d) e c), respectivamente, do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.* II. FUNDAMENTAÇÃO*** * A. De facto*** * Do recurso da decisão da matéria de facto* Vem o presente recurso interposto também da matéria de facto da decisão de primeira instância, considerando os Recorrentes que, “…por falta de oposição dos Réus e, bem assim, com fundamento nos documentos juntos como com a p.i. e não impugnados (…)”, deveriam ter sido declarados provados os seguintes factos:“(…) 1º Os ora réus, (…) e (…) são casados, um com o outro, no regime da comunhão de adquiridos. 2º No dia 28 de janeiro de 2022, (…), agente de execução, titular da cédula (…), com escritório na Rua (…), 72, 1.º-Dto., em Viseu, como encarregado de venda, no processo executivo 4801/18.5T8OER do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Oeiras – Juízo de Execução – Juiz 2, no qual é executado o aqui autor (…) e exequente, o aqui réu, Banco (…), vendeu aos aqui réus (…) e (…), o quinhão hereditário do qual era titular o autor (…) na herança aberta por óbito de (…), que havia sido penhorado naqueles autos. 2º O quinhão hereditário foi vendido pelo preço de € 4.800,00. 3º A compra e venda foi celebrada por escrito, em documento particular, sob a epígrafe, Contrato de Compra e Venda de Quinhão Hereditário. 4º Tal contrato não foi instruído com qualquer outro documento. 5º No mesmo dia 28 de janeiro de 2022, os ali contratantes, apresentaram o referido contrato, para fins de autenticação, perante (…), advogada titular da cédula n.º (…), com escritório na Praça (…), n.º 2, 2º-Dto., em Viseu, que o mesmo autenticou. 6º Instruíram o termo de autenticação, certidão emitida pelo agente de execução, de 25.01.2022; DUC relativo a Imposto de Selo, com a referência (…) e DUC relativo a IMT, com a referência 160522023173035, ambos de 19.01.2022 ( docs. 2 e 3). 7º Desconhece-se o depósito do contrato e termo em www.predialonline.pt. 8º No DUC relativo a IMT, por declaração prestada perante a AT, pelo agente de execução ou pelos compradores do quinhão, discrimina-se os bens em relação aos quais o mesmo se refere, da seguinte forma: a) O Bem-1: prédio urbano inscrito sob a o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas. Diz-se que o alienante do bem é (…), com o NIF (…), aqui autor. b) O Bem-2: prédio rústico, inscrito na matriz sob o artigo (…), da Secção (…), da freguesia e concelho de Monforte, denominado (…). Diz-se que a alienante foi (…), NIF (…). c) O Bem-3: prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo (…), da Secção (…), freguesia de (…), concelho de Elvas, designado (…). Diz-se que o alienante do prédio foi (…), NIF (…). d) O Bem-4: prédio rústico, inscrito na matriz sob o artigo (…), da Secção (…), freguesia de (…), concelho de Elvas, denominado Herdade da (…). Refere-se que a alienante foi (…), NIF (…). 9º No dia 28.01.2022, a advogada (…) preencheu o Modelo 11, que apresentou perante a Autoridade Tributária. 10º Neste documento a entidade autenticadora referiu expressamente que (…) vendeu a favor do réu (…) ½ do prédio urbano inscrito sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas, não obstante a venda ter por objeto um quinhão hereditário… 11º O prédio passou a constar inscrito na matriz a favor do autor (…) e do réu (…), na proporção de ½ para cada um, como se de uma compropriedade se tratasse. 12º O agente de execução encarregado da venda teve acesso ao processo de imposto de selo apresentado por óbito de (…), no qual foi participante o autor (…), que no mesmo apos a sua assinatura. 13º Deste processo retirou aquele, designadamente e, como expressamente referiu na decisão da venda, o preço pelo qual o quinhão foi colocado à venda. 14º No processo de imposto de selo constam a identificação dos herdeiros; a relação dos bens que constituem a herança e os legados que tiveram lugar. A configuração de tal processo, nesta parte – à qual o agente de execução teve acesso – é igual à que aqui se junta. 15º Na relação de bens consta como um dos bens que fazem parte da herança, o prédio inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas; Verba n.º 1 (página 2 de 4). 16º Segue-se a referência à quota ideal a que cada herdeiro tem direito nos bens que compõem a herança – ¼ a favor do autor (…), e 3/16 a favor de cada um dos quatro filhos da autora da herança (página 3 de 4 ). 17º Por último, faz-se referencia ao legado que a autora da herança fez a favor do aqui autor (…); Verba 1, o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas (página 4 de 4 ). 18º O autor (…) aceitou o legado que a dona da herança, em testamento, a seu favor fez. O prédio constitui a residência do Autor desde o ano de 1989. 19º Surgindo o A. (…) como vendedor de um bem imóvel no ano de 2022, a AT vem convidando este a apresentar o respetivo modelo G do IRS, no qual especifique, designadamente, o preço pelo qual alienou o prédio. 20º O Autor (…) está impossibilitado de satisfazer a pretensão da AT pelos motivos expostos e, passou a apresentar, por este motivo, uma situação irregular perante a AT. 21º E esta, a AT, argumenta que perante o Modelo 11 apresentado pela advogada (…), instruído com os referidos documentos, a discrepância, a existir, só poderá resolver-se pela via judicial. (…)”. * Prevê o artigo 640.º do C.P.C.:“1 – Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) – Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) – Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) – A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) – Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição, do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) – Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes”. * Os Recorrentes incidiram o seu recurso da matéria de facto, concretizando os factos provados que desejam ver discriminados, apontando ainda quais os meios de prova que, em seu entendimento, imporiam decisão distinta daquela matéria, pelo que se consideram cumpridos os supra referidos pressupostos da impugnação da matéria de facto.Nos termos do disposto no artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, cuja epígrafe é “modificabilidade da decisão de facto”, “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”. Neste particular, o tribunal de recurso, “…sem embargo da atendibilidade da prova plena que resulte dos autos, (…) deve verter o que emergir da apreciação livre e crítica dos demais elementos probatórios e usar, se for o caso, as presunções judiciais que as circunstâncias justificarem, designadamente a partir dos factos instrumentais…”, como decorre do n.º 4 do artigo 607.º e da alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º, ambos do C.P.C.[9], tanto mais que a anulação de uma sentença deve confinar-se aos casos em que, como previsto na alínea c) do n.º 2 do artigo 662.º do C.P.C., não constem “…do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto”. Como se refere no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10.07.2024, relatado polo Juiz Desembargador Jorge Martins Ribeiro no proc. n.º 99/22.9T8GDM.P1 [10], para reapreciar a decisão de facto impugnada, o Tribunal da Relação “…tem de, por um lado, analisar os fundamentos da motivação que conduziu a primeira instância a julgar um facto como provado ou como não provado e, por outro, averiguar, em função da sua própria e autónoma convicção, formada através da análise crítica dos meios de prova disponíveis e à luz das mesmas regras de direito probatório, se na elaboração dessa decisão e na sua motivação ocorre, por exemplo, alguma contradição, uma desconsideração de qualquer um dos meios de prova ou uma violação das regras da experiência comum, da lógica ou da ciência – elaboração, diga-se, que deve ser feita à luz de um cidadão de normal formação e capacidade intelectual, de um cidadão comum na sociedade em questão – sem prejuízo de, independentemente do antes dito, poder chegar a uma decisão de facto diferente em função da valoração concretamente efetuada em sede de recurso”. Ainda sobre a intervenção da Relação na decisão da matéria de facto decidida em 1ª instância, será pertinente invocar a fundamentação clara do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 02.11.2017, relatado pela Juíza Desembargadora Maria João Matos no processo n.º 212/16.5T8MNC.G1,[11] “…quando os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insuscetível de ser destruída por quaisquer outras provas, a dita modificação da matéria de facto - que a ela conduza - constitui um dever do Tribunal de Recurso, e não uma faculdade do mesmo (o que, de algum modo, também já se retiraria do artigo 607.º, n.º 4, do C.P.C., aqui aplicável ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma). Estarão, nomeadamente, aqui em causa, situações de aplicação de regras vinculativas extraídas do direito probatório material (regulado, grosso modo, no C.C.), onde se inserem as regras relativas ao ónus de prova, à admissibilidade dos meios de prova, e à força probatória de cada um deles, sendo que qualquer um destes aspetos não respeita apenas às provas a produzir em juízo. Quando tais normas sejam ignoradas (deixadas de aplicar), ou violadas (mal aplicadas), pelo Tribunal a quo, deverá o Tribunal da Relação, em sede de recurso, sanar esse vício; e de forma oficiosa. Será, nomeadamente, o caso em que, para prova de determinado facto tenha sido apresentado documento autêntico - com força probatória plena - cuja falsidade não tenha sido suscitada (artigos 371.º, n.º 1 e 376.º, n.º 1, ambos do C.P.C.), ou quando exista acordo das partes (artigo 574.º, n.º 2, do C.P.C.), ou quando tenha ocorrido confissão relevante cuja força vinculada tenha sido desrespeitada (artigo 358.º do Código Civil e artigos 484.º, n.º 1 e 463.º, ambos do CPC), ou quando tenha sido considerado provado certo facto com base em meio de prova legalmente insuficiente (v. g. presunção judicial ou depoimentos de testemunhas, nos termos dos artigos 351.º e 393.º, ambos do Código de Processo Civil). Ao fazê-lo, tanto poderá afirmar novos factos, como desconsiderar outros (que antes tinham sido afirmados)”. * Tendo presentes estes considerandos, analisemos, agora, os pontos da matéria de facto que os Recorrentes pretendem ver provados.* Facto número 1:“1º Os ora réus, (…) e (…) são casados, um com o outro, no regime da comunhão de adquiridos.” Trata-se de facto cuja prova depende da junção da certidão de assento de casamento ou de nascimento dos consortes, que não está nos autos, razão pela qual não deve ser atendida esta parte da impugnação. * Factos números 2, 3, 5 e 6:“2º No dia 28 de janeiro de 2022, (…), agente de execução, titular da cédula (…), com escritório na Rua (…), 72, 1º-Dto., Viseu, como encarregado de venda, no processo executivo n.º 4801/18.5T8OER do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Oeiras – Juízo de Execução – Juiz 2, no qual é executado o aqui autor (…) e exequente, o aqui réu, Banco (…), vendeu aos aqui réus (…) e (…), o quinhão hereditário do qual era titular o autor (…)na herança aberta por óbito de (…), que havia sido penhorado naqueles autos. 2º O quinhão hereditário foi vendido pelo preço de € 4.800,00. 3º A compra e venda foi celebrada por escrito, em documento particular, sob a epígrafe Contrato de Compra e Venda de Quinhão Hereditário. (…) 5º No mesmo dia 28 de janeiro de 2022, os ali contratantes, apresentaram o referido contrato, para fins de autenticação, perante (…), advogada titular da cédula n.º (…), com escritório na Praça (…), n.º 2, 2º-Dto., em Viseu, que o mesmo autenticou. 6º Instruíram o termo de autenticação, certidão emitida pelo agente de execução, de 25.01.2022; DUC relativo a Imposto de Selo, com a referência (…) e, DUC relativo a IMT, com a referência (…), ambos de 19.01.2022 ( docs. 2 e 3). Por traduzirem o conteúdo da cópia certificada de documento particular autenticado e respectivo termo de autenticação, junta como documento 1 da p.i., relevante à decisão da lide, deverá a impugnação ser parcialmente acolhida, nos precisos termos constantes de tais documentos com o seguinte conteúdo: “1. Por “documento particular autenticado de compra e venda” outorgado no dia 28 de Janeiro de 2022, no escritório da advogada (…), contribuinte n.º (…), inscrita na Ordem dos Advogados com a cédula n.º (…), arquivado sob o n.º (…), folhas 100 a 105 do Maço de 2022, (…), agente de execução com a cédula n.º (…) e domicílio profissional na Rua (…), 72, 1º-Dto., em Viseu, intervindo na qualidade de agente de execução e encarregado no processo executivo nº 4801/18.5T8OER do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Oeiras – Juízo de Execução – Juiz 2, investido de poderes para outorgar a venda por negociação particular no processo em que exequente o Banco (…), S.A., declarou vender pelo preço de € 4.800,00, a (…) e (…), casados no regime da comunhão de adquiridos que declararam aceitar, “…o quinhão hereditário que pertence ao executado … (…) na herança ilíquida e indivisa, aberta por óbito de … (…)” (cfr. cópia certificada de documento particular autenticado de compra e venda, junta como documento 1 da p.i. com o requerimento de 04.12.2023). 2. No dia 28 de Janeiro de 2022, no escritório da advogada (…), inscrita na Ordem dos Advogados com a cédula n.º (…), foi lavrado “termo de autenticação” pelo qual a Dra. (…) declarou, entre outras coisas: “Verifiquei as identidades dos outorgantes através da apresentação dos respectivos cartões de cidadão que me foram exibidos. Foi lido e explicado aos outorgantes o documento particular anexo, o qual se refere a Compra e Venda de Quinhão hereditário, cujo conteúdo declararam perante mim, ser a expressão das suas vontades (…). Verifiquei: A qualidade e poderes do Primeiro Outorgante e a decisão do Agente de Execução de aceitação da proposta de aquisição, constantes da certidão de elementos do processo executivo, emitida a 25-01-2022 pelo referido Agente de Execução, que fica arquivada; Ficam arquivados: a) 1 certidão emitida pelo Agente de Execução, no dia 25/01/2022, com a referência (…). b) Documento Único de Cobrança de Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis n.º (…), de 19/01/2022, no valor de € 170,17. c) Documento Único de Cobrança de Imposto de Selo n.º (…), de 19/01/2022, no valor de € 38,40. A leitura e explicação do Documento Particular que aqui se autentica e do presente termo, foram efectuadas em voz alta e na presença simultânea dos Outorgantes, com a advertência de que em seguida, e nesta mesma data, o mesmo vai ser depositado electronicamente, para sua plena validade em www.predialonline.pt (…)” (cfr. cópia certificada de documento particular autenticado de compra e venda, junta como documento 1 da p.i. com o requerimento de 04.12.2023).” * Facto número 4:“4º Tal contrato não foi instruído com qualquer outro documento.” A redacção proposta contraria o conteúdo do termo de autenticação que é parte integrante do acto de celebração do documento particular autenticado (reproduzido no documento 1 da p.i., junto com o requerimento de 04.12.2023), do qual resulta que foi verificada e arquivada a seguinte documentação: a) 1 certidão emitida pelo Agente de Execução, no dia 25/01/2022, com a referência (…); b) Documento Único de Cobrança de Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis n.º (…), de 19/01/2022, no valor de € 170,17; e c) Documento Único de Cobrança de Imposto de Selo n.º (…), de 19/01/2022, no valor de € 38,40. Não tendo sido contrariada a autenticidade do documento em apreço, é manifesto que não merece acolhimento a afirmação constante da redacção proposta do facto n.º 4. * Facto provado número 7:“7º Desconhece-se o depósito do contrato e termo em www.predialonline.pt.”. Cumpre, antes do mais, dar nota de que a manifestação de desconhecimento do depósito por parte dos Autores, não equivale à afirmação, quer de que foi feito o depósito, quer de que não foi feito. Não se trata, por isso, de um facto relevante para a decisão – nomeadamente para aferir do cumprimento da obrigação legal de depósito – mas alusiva ao estado de ciência dos Autores sobre o eventual facto, razão pela qual não deve ser acolhida a redacção proposta como facto n.º 7. * Facto número 8:“8º No DUC relativo a IMT, por declaração prestada perante a AT, pelo agente de execução ou pelos compradores do quinhão, discrimina-se os bens em relação aos quais o mesmo se refere, da seguinte forma: a) O Bem – 1: prédio urbano inscrito sob a o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas. Diz-se que o alienante do bem é (…), com o NIF (…), aqui autor. b) O Bem – 2: prédio rústico, inscrito na matriz sob o artigo (…), da Secção (…), da freguesia e concelho de Monforte, denominado (…). Diz-se que a alienante foi (…), NIF (…). c) O Bem – 3: prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo (…), da Secção (…), freguesia de (…), concelho de Elvas, designado (…). Diz-se que o alienante do prédio foi (…), NIF (…). d) O Bem – 4: prédio rústico, inscrito na matriz sob o artigo (…), da Secção (…), freguesia de (…), concelho de Elvas, denominado Herdade da (…). Refere-se que a alienante foi (…), NIF (…)”. Por traduzir parte do conteúdo de documentos juntos aos autos, não impugnados (cfr. documentos 2 e 3 da p.i., juntos com o requerimento do dia 04.12.2023) e apresentar relevância para compreender cabalmente a causa de pedir, deverá a impugnação ser parcialmente acolhida, nos precisos termos constantes do documento em apreço com o seguinte conteúdo: “3. Constam discriminados nos documentos de cobrança relativos a IMT e Imposto de Selo, referentes ao sujeito passivo (…), NIF (…), no seguimento de declaração prestada a 19.01.2022 perante a AT, referente ao facto tributário descrito como “31 – Aquisição de Imóveis do Estado, Regiões Autónomas e Autarquias Locais; aquisição de imóveis por arrematação judicial ou administrativa ou ao abrigo de regimes legais de apoio financeiro à habitação”, os seguintes bens: Bem – 1: Prédio: (…); Concelho: Elvas; Freguesia: (…). Alienante do Bem – 1: Identificação Fiscal: (…); Nome: (…); Parte ½; Benefícios: Parte Indivisa de Bem para habitação. Bem – 2: Prédio (…); Concelho: Monforte; Freguesia: (…); Localização: (…) – Monforte. Alienante do Bem – 2: Identificação Fiscal: (…); Nome: (…) – Cabeça de Casal da Herança de; Parte 1/2. Bem – 3: Prédio (…); Concelho: Elvas; Freguesia: (…); Localização: (…) – (…). Alienante do Bem – 3: Identificação Fiscal: (…); Nome: (…) – Cabeça de Casal da Herança de; Parte 1/6. Bem – 4: Prédio (…); Concelho: Elvas; Freguesia: (…); Localização: Herdade da (…). Alienante do Bem – 4: Identificação Fiscal: (…); Nome: (…) – Cabeça de Casal da Herança de; Parte: 1/6 (cfr. documentos de cobrança identificados como 2 e 3 da p.i., juntos com o requerimento de 04.12.2023).” * Factos números 9 e 10:“9º No dia 28.01.2022, a advogada (…) preencheu o Modelo 11, que apresentou perante a Autoridade Tributária. 10º Neste documento a entidade autenticadora referiu expressamente que (…) vendeu a favor do réu (…) ½ do prédio urbano inscrito sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas, não obstante a venda ter por objeto um quinhão hereditário…” Por traduzir parte do conteúdo de documento autêntico junto aos autos (cfr. certidão fiscal junta com o requerimento de 05.12.2023) e apresentar relevância para compreender cabalmente a causa de pedir, deverá a impugnação ser parcialmente acolhida, nos precisos termos constantes do documento em apreço com o seguinte conteúdo: “4. Em Janeiro de 2022, pela advogada (…), contribuinte n.º (…), na qualidade de declarante, foi apresentada declaração Modelo 11 perante a Autoridade Tributária, comunicando o acto de compra e venda com o n.º (…), celebrado a 28.01.2022, pelo preço de € 4.800,00, identificando como bem o (…), freguesia (…), artigo (…), tendo como 1º Outorgante (…), contribuinte n.º (…), titular de ½, e como 2º Outorgante (…), contribuinte n.º (…), titular de ½ (cfr. certidão junta com o requerimento de 05.12.2023)”. * Facto número 11:“11º O prédio passou a constar inscrito na matriz a favor do autor (…) e do réu (…), na proporção de ½ para cada um, como se de uma compropriedade se tratasse.” Por traduzir elementos que constam de documento autêntico, constituído pela caderneta predial identificada como documento 4 da p.i. junta com o requerimento de 04.12.2023, aplicam-se aqui, mutatis mutandis, as considerações apresentadas a propósito dos factos anteriores, devendo ser reproduzidos os elementos constantes da caderneta predial nos seguintes termos: “5. Consta inscrito no Serviço de Finanças de Elvas como artigo matricial urbano n.º (…), da freguesia de (…), o prédio sito na Rua do (…), lugar de (…), com área total de terreno e de implantação de edifício de 139 m2, tendo por titulares (…), contribuinte n.º (…), como proprietário de ½, e (…), contribuinte n.º (…), como proprietário de ½ (cfr. caderneta predial identificada como documento 4 da p.i. junta com o requerimento de 04.12.2023).” * Factos números 12 e 13:“12º O agente de execução encarregado da venda teve acesso ao processo de imposto de selo apresentado por óbito de (…), no qual foi participante o autor (…), que no mesmo após a sua assinatura. 13º Deste processo retirou aquele, designadamente e, como expressamente referiu na decisão da venda, o preço pelo qual o quinhão foi colocado à venda.” Estamos perante matéria que: - por um lado, dizendo respeito a comunicação realizada pelo encarregado da venda no âmbito do processo de execução, está dependente da junção de certidão judicial, o que não foi feito; - por outro lado, em tudo quanto não constitua elemento integrante do processo executivo, não tem relevância para a decisão da questão jurídica da ausência de fundamento dos pedidos de declaração de nulidade formulados pelos Autores que está na origem do saneador-sentença recorrido. Termos em que não merece acolhimento esta parte do recurso. * Factos números 14 a 17:“14º No processo de imposto de selo constam a identificação dos herdeiros; a relação dos bens que constituem a herança e os legados que tiveram lugar. A configuração de tal processo, nesta parte – à qual o agente de execução teve acesso – é igual à que aqui se junta. 15º Na relação de bens consta como um dos bens que fazem parte da herança, o prédio inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas; Verba n.º 1 (página 2 de 4). 16º Segue-se a referência à quota ideal a que cada herdeiro tem direito nos bens que compõem a herança – ¼ a favor do autor (…), e 3/16 a favor de cada um dos quatro filhos da autora da herança (página 3 de 4). 17º Por último, faz-se referência ao legado que a autora da herança fez a favor do aqui autor (…); Verba 1, o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas (página 4 de 4). Embora da matéria de facto proposta pelos Recorrentes não conste claramente, o processo de imposto de selo a que respeitam os factos 14 a 17 em apreço, não diz respeito à alienação do quinhão hereditário titulado pelo Autor (…), objecto do acto de venda outorgado a 28.01.2022, mas sim à participação de bens para efeito de pagamento do imposto de selo devido pela herança deixada por … (como consta do teor dos artigo 13º da p.i. e do documento 5 da p.i., constituído pelo comprovativo de participação do imposto de selo). Trata-se, por isso, de factualidade sem relevância para a decisão da questão da ausência de fundamento jurídico dos pedidos de declaração de nulidade formulados pelos Autores, conhecida no saneador-sentença recorrido e, consequentemente, objecto do presente recurso, razão pela qual não merece acolhimento nesta parte. * Factos números 18 a 21:“18º O autor (…) aceitou o legado que a dona da herança, em testamento, a seu favor fez. O prédio constitui a residência do autor desde o ano de 1989. 19º Surgindo o autor (…) como vendedor de um bem imóvel no ano de 2022, a AT vem convidando este a apresentar o respetivo modelo G do IRS, no qual especifique, designadamente, o preço pelo qual alienou o prédio. 20º O Autor (…) está impossibilitado de satisfazer a pretensão da AT pelos motivos expostos e, passou a apresentar, por este motivo, uma situação irregular perante a AT. 21º E esta, a AT, argumenta que perante o Modelo 11 apresentado pela advogada (…), instruído com os referidos documentos, a discrepância, a existir, só poderá resolver-se pela via judicial (…)”. Por respeitarem à situação tributária do Autor (…), sobre a qual a decisão recorrida se não debruça, também esta factualidade alegada pelos Autores na p.i. se mostra sem interesse para a solução jurídica ali adoptada, objecto do presente recurso. * Por constar de documento autêntico junto aos autos (cfr. certidão de escritura pública de habilitação de herdeiros de (…) identificada como documento 6 da p.i., junto com o requerimento de 04.12.2023), adita-se à matéria de facto provada o seguinte:“6. Por escritura pública de habilitação de herdeiros outorgada a 17.10.2018 no Cartório do Notário (…), sito em Elvas, foram habilitados herdeiros de (…), falecida a 08.10.2018, no estado civil de casada com (…) no regime da comunhão geral de bens, com testamento público lavrado a 11.01.2017: - (…), viúvo da falecida; - (…); - (…); - (…); e - (…), estes últimos quatro filhos da falecida. (cfr. certidão de escritura pública de habilitação de herdeiros de … identificada como documento 6 da p.i., junto com o requerimento de 04.12.2023).” * Matéria de facto provada:* Em consequência da apreciação vinda de expor, é a seguinte a matéria de facto provada a considerar:1. Por “documento particular autenticado de compra e venda” outorgado no dia 28 de Janeiro de 2022, no escritório da advogada (…), contribuinte n.º (…), inscrita na Ordem dos Advogados com a cédula n.º (…), arquivado sob o n.º (…), folhas 100 a 105 do Maço de 2022, (…), agente de execução com a cédula n.º (…) e domicílio profissional na Rua (…), 72, 1º-Dto., em Viseu, intervindo na qualidade de agente de execução e encarregado no processo executivo n.º 4801/18.5T8OER do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Oeiras – Juízo de Execução – Juiz 2, investido de poderes para outorgar a venda por negociação particular no processo em que exequente o Banco (…), S.A., declarou vender pelo preço de € 4.800,00, a (…) e (…), casados no regime da comunhão de adquiridos que declararam aceitar, “…o quinhão hereditário que pertence ao executado (…) na herança ilíquida e indivisa, aberta por óbito de (…)” (cfr. cópia certificada de documento particular autenticado de compra e venda, junta como documento 1 da p.i. com o requerimento de 04.12.2023). 2. No dia 28 de Janeiro de 2022, no escritório da advogada (…), inscrita na Ordem dos Advogados com a cédula n.º (…), foi lavrado “termo de autenticação” pelo qual a Dra. (…) declarou, entre outras coisas: “Verifiquei as identidades dos outorgantes através da apresentação dos respectivos cartões de cidadão que me foram exibidos. Foi lido e explicado aos outorgantes o documento particular anexo, o qual se refere a Compra e Venda de Quinhão hereditário, cujo conteúdo declararam perante mim, ser a expressão das suas vontades (…). Verifiquei: A qualidade e poderes do Primeiro Outorgante e a decisão do Agente de Execução de aceitação da proposta de aquisição, constantes da certidão de elementos do processo executivo, emitida a 25-01-2022 pelo referido Agente de Execução, que fica arquivada; Ficam arquivados: a) 1 certidão emitida pelo Agente de Execução, no dia 25/01/2022, com a referência (…). b) Documento Único de Cobrança de Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis n.º (…), de 19/01/2022, no valor de € 170,17. c) Documento Único de Cobrança de Imposto de Selo n.º (…), de 19/01/2022, no valor de € 38,40. A leitura e explicação do Documento Particular que aqui se autentica e do presente termo, foram efectuadas em voz alta e na presença simultânea dos Outorgantes, com a advertência de que em seguida, e nesta mesma data, o mesmo vai ser depositado electronicamente, para sua plena validade em www.predialonline.pt (…)” (cfr. cópia certificada de documento particular autenticado de compra e venda, junta como documento 1 da p.i. com o requerimento de 04.12.2023). 3. Constam discriminados nos documentos de cobrança relativos a IMT e Imposto de Selo, referentes ao sujeito passivo (…), NIF (…), no seguimento de declaração prestada a 19.01.2022 perante a AT, referente ao facto tributário descrito como “31 – Aquisição de Imóveis do Estado, Regiões Autónomas e Autarquias Locais; aquisição de imóveis por arrematação judicial ou administrativa ou ao abrigo de regimes legais de apoio financeiro à habitação”, os seguintes bens: Bem 1: Prédio: …; Concelho: Elvas; Freguesia: …. Alienante do Bem -1: Identificação Fiscal: …; Nome: …; Parte ½; Benefícios: Parte Indivisa de Bem para habitação. Bem 2: Prédio (…); Concelho: Monforte; Freguesia: (…); Localização: (…) – Monforte. Alienante do Bem 2: Identificação Fiscal: (…); Nome: (…) – Cabeça de Casal da Herança de (…); Parte 1/2. Bem 3: Prédio (…); Concelho: Elvas; Freguesia: (…); Localização: (…) – (…). Alienante do Bem 3: Identificação Fiscal: (…); Nome: (…) – Cabeça de Casal da Herança de (…); Parte 1/6. Bem 4: Prédio (…); Concelho: Elvas; Freguesia: (…); Localização: Herdade da (…). Alienante do Bem 4: Identificação Fiscal: (…); Nome: (…) – Cabeça de Casal da Herança de (…); Parte: 1/6 (cfr. documentos de cobrança identificados como 2 e 3 da p.i., juntos com o requerimento de 04.12.2023)”. “4. Em Janeiro de 2022, pela advogada (…), contribuinte n.º (…), na qualidade de declarante, foi apresentada declaração Modelo 11 perante a Autoridade Tributária, comunicando o acto de compra e venda com o n.º (…), celebrado a 28.01.2022, pelo preço de € 4.800,00, identificando como bem o U-Urbano, freguesia (…), artigo (…), tendo como 1º Outorgante (…), contribuinte n.º (…), titular de ½, e como 2º Outorgante (…), contribuinte n.º (…), titular de ½ (cfr. certidão junta com o requerimento de 05.12.2023). 5. Consta inscrito no Serviço de Finanças de Elvas como artigo matricial urbano n.º (…), da freguesia de (…), o prédio sito na Rua do (…), lugar de (…), com área total de terreno e de implantação de edifício de 139 m2, tendo por titulares (…), contribuinte n.º (…), como proprietário de ½, e (…), contribuinte n.º (…), como proprietário de ½ (cfr. caderneta predial identificada como documento 4 da p.i. junta com o requerimento de 04.12.2023). 6. Por escritura pública de habilitação de herdeiros outorgada a 17.10.2018 no Cartório do Notário (…), sito em Elvas, foram habilitados herdeiros de (…), falecida a 08.10.2018, no estado civil de casada com (…) no regime da comunhão geral de bens, com testamento público lavrado a 11.01.2017: - (…), viúvo da falecida; - (…); - (…); - (…); e - (…), estes últimos quatro filhos da falecida. (cfr. certidão de escritura pública de habilitação de herdeiros de … identificada como documento 6 da p.i., junto com o requerimento de 04.12.2023). * B. De direito *** * Da ausência de fundamento legal dos pedidos* Sustentam os Autores / Recorrentes que mal andou a decisão recorrida ao julgar improcedente o pedido de declaração de nulidade da compra e venda de quinhão hereditário celebrada por documento particular autenticado de compra e venda, outorgado no dia 28 de Janeiro de 2022, no escritório da advogada (…).Em síntese, são os seguintes os seus argumentos: i. Os Autores questionaram a validade do documento particular autenticado de compra e venda por falta de depósito em www.predialonline.pt, sendo que a falta de depósito gera, nos termos previstos pelas disposições conjugadas dos artigos 24.º do Decreto Lei n.º 116/2008, de 4 de Agosto e 294.º do CC, a nulidade do negócio por violar disposição imperativa. ii. O título de compra e venda impugnado versa sobre o quinhão hereditário do Autor (…) na herança aberta por óbito de (…) e não sobre os bens, ou partes especificadas dos mesmos, que compõem a herança. Assim, contrariamente ao que declarou a entidade autenticadora perante a Autoridade Tributária – Modelo 11 –, não inclui ½ do prédio urbano inscrito sob o artigo (…), de (…), pertencente a (…) que nem no negócio interveio. iii. O contrato de compra e venda não foi instruído com outros documentos, não comprova a morte da autora da herança, nem as razões pelas quais o executado (…) é herdeiro de (…), sendo que só com a aceitação surge o quinhão hereditário. Alega ainda que o documento particular autenticado não justifica porque razão inclui na venda do quinhão hereditário de (…) os prédios designados (…) e (…), prédios integrantes das heranças de (…) e (…). * Vejamos, de seguida, se assiste fundamento às objecções colocadas à sentença pelos Recorrentes.i. Sobre a questão da falta de depósito do título de compra e venda em www.predialonline.pt, pronunciou-se a sentença recorrida no sentido de que “por último, no que concerne à eventual falta de depósito (os autores apenas alegam que desconhecem tal facto), deverá aludir-se ao disposto no artigo 371.º do C.C., quanto à prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade pública ou oficial respectivo – o documento particular autenticado em causa faz referência expressa ao facto referente ao depósito electrónica”. Como se referiu em sede de conhecimento da alegada nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia, foi entendimento da 1ª instância que: - por um lado, os Autores não alegaram o facto do qual estaria dependente o reconhecimento do vício formal, pois que a mera alegação do desconhecimento do depósito não equivale à afirmação de que o depósito foi omitido; e, cumulativamente - consta do título de compra e venda – documento particular autenticado –, referência expressa ao depósito electrónico, sendo que o documento autêntico em apreço faz, de acordo com o n.º 1 do artigo 371.º do CPC, prova plena dos factos que refere como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que nele são atestados com base nas percepções da entidade documentadora. Em causa está o cumprimento do disposto nos n.º 1 a 3 do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 116/2008, de 4 de Agosto que, sob a epígrafe “Documento particular autenticado”, tem o seguinte teor: “1 - Os documentos particulares que titulem actos sujeitos a registo predial devem conter os requisitos legais a que estão sujeitos os negócios jurídicos sobre imóveis, aplicando-se subsidiariamente o Código aprovado pelo Decreto-Lei n.º 207/95, de 14 de Agosto. 2 - A validade da autenticação dos documentos particulares, referidos no número anterior, está dependente de depósito electrónico desses documentos, bem como de todos os documentos que os instruam. 3 - O funcionamento, os termos e os custos associados ao depósito electrónico referido no número anterior são definidos por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça (…)” (sublinhados nossos). Os termos em que se processa o depósito electrónico de documentos particulares autenticados previsto nos n.º 2 e 3 do artigo 24.º do D-L n.º 116/2008, encontram-se regulamentados na Portaria n.º 1535/2008, de 30 de Dezembro, sob os artigos 4.º a 17.º. Nesta Portaria: - o n.º 3 do artigo 4.º dispõe que “o depósito electrónico dos documentos particulares autenticados pode ser efectuado no momento do pedido online de actos de registo predial através do sítio www.predialonline.mj.pt.”; - o n.º 1 do artigo 6.º que “compete à entidade que procede à autenticação do documento particular realizar o depósito electrónico”; e - os n.ºs 1 e 2 do artigo 7.º determinam que o depósito deve ser efectuado na data da realização da autenticação do documento particular ou, se ocorrerem dificuldades de carácter técnico respeitantes ao funcionamento da plataforma electrónica, nas quarenta e oito horas seguintes. Assim, de acordo com as disposições conjugadas vindas de elencar, compete à entidade autenticadora realizar o depósito do documento particular autenticado no momento da celebração do negócio (ou nas 48 horas subsequentes em caso de dificuldade técnica da plataforma), no sítio www.predialonline.mj.pt, como condição de validade do acto de autenticação do documento particular. Deste modo, a omissão de depósito determina a invalidade da autenticação e, consequentemente, o respectivo negócio será havido como celebrado por documento particular não autenticado. No caso vertente, os Autores pretendem obter a declaração da nulidade do negócio de compra e venda de quinhão hereditário pertencente ao Autor (…), celebrado por documento particular autenticado, alegando, entre outras coisas, o seu desconhecimento de que tenha sido depositado em www.predialonline.mj.pt. Como refere o artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, é sobre os Autores que recai o ónus de alegação e de prova dos pressupostos da declaração de nulidade do acto impugnado. Tem que se tratar de uma alegação inequívoca do facto constitutivo do seu direito, no sentido de que não foi cumprida aquela formalidade legal. Tal não se compadece com a referência ao desconhecimento desse (não) cumprimento que é um expediente processual para impugnar factos constitutivos de direito da parte contrária (cfr. artigo 574.º, n.º 3, do CPC). É também certo que a causa de pedir e o pedido da presente acção se não enquadram em qualquer dos casos previstos pelo artigo 343.º do Código Civil que prevê situações especiais (como as acções de simples apreciação ou declaração negativa) em que as regras do ónus da prova não seguem o princípio geral do artigo 342.º do mesmo diploma legal. Os Autores tampouco alegaram dificuldade em obter, por sua iniciativa, a confirmação do depósito (ou da falta dele) do acto jurídico impugnado, nem solicitaram qualquer diligência probatória com vista a superar o seu desconhecimento, como seria de esperar de quem pretendesse valer-se do facto constituído pela omissão do depósito para obter a declaração de nulidade da venda. O conjunto de razões apresentadas leva-nos a concordar com a sentença recorrida quando considera que não foi cumprido o ónus de alegação do facto de que dependia a eventual procedência do seu direito. Assim, sem necessidade de outras considerações, nomeadamente quanto à referência expressa contida no termo de autenticação do título de compra e venda do quinhão hereditário em apreço – “…de que em seguida, e nesta mesma data, o mesmo vai ser depositado electronicamente, para sua plena validade em www.predialonline.pt (…)” –, conclui-se que não assiste, nesta parte, razão aos Recorrentes. ii. Relativamente ao argumento de que, contrariamente ao que a entidade autenticadora declarou perante a Autoridade Tributária – Modelo 11 –, o negócio de compra e venda do quinhão hereditário pertencente ao Autor (…) não inclui ½ do prédio urbano inscrito sob o artigo (…), de (…), pertencente a (…) que nem no negócio interveio, afigura-se evidente os Recorrentes sustentam uma desconformidade da declaração Modelo 11 relativamente ao quinhão hereditário vendido. Como se disse em sede de apreciação da alegada nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão, o que terá ocorrido, na versão carreada aos autos pelos Autores, é a apresentação de declarações junto da A.T. que erradamente incluíram no quinhão hereditário objecto da venda executiva por título do dia 28.01.2022, direitos sobre bens (entre os quais ½ do prédio … da matriz da freguesia de …) que, na realidade, não compunham a herança. Não se trata de um vício do negócio de compra e venda celebrado em 28.01.2022, o qual tem por objecto “…o quinhão hereditário que pertence ao executado (…) na herança ilíquida e indivisa, aberta por óbito de (…) …”, sem qualquer referência aos concretos bens da herança de (…) ou a outros quinhões hereditários. A desconformidade, na versão dos próprios Autores / Recorrentes, encontra-se nas declarações apresentadas junto da AT e, como também tivemos já o ensejo de evidenciar, os actos declarativos praticados junto da A.T. não são constitutivos ou translativos do direito de propriedade que, como resulta do disposto no artigo 1316.º do Código Civil, se adquire por contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, acessão e demais modos previstos na lei. Deste modo, a desconformidade que é o núcleo central dos fundamentos da presente acção, não só não constitui um vício do negócio de compra e venda executiva celebrado no dia 28.01.2022, como não há, na matéria de facto alegada pelos Recorrentes, qualquer outro acto de compra e venda que suporte os pedidos das alíneas a) e c) visando, expressa e respectivamente, a declaração de nulidade: - da “…venda de ½ do prédio urbano inscrito sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Elvas, venda que o autor (…) alegadamente haveria realizado a favor dos réus (…) e (…).”; - da “…venda do quinhão hereditário nas heranças abertas por óbito de (…) e (…).” (sublinhados nossos). Deste modo, por evidente falta de fundamento substantivo, não é a acção declarativa da nulidade do negócio de compra e venda do quinhão hereditário do Autor Francisco realizada em processo de execução e, ainda menos, da nulidade de inexistentes negócios de transmissão de outros quinhões hereditários, que permite assegurar as posições jurídicas decorrentes da descrição factual feita pelos Autores na petição inicial. Na verdade, para além da impugnação, em sede própria, dos actos declarativos desconformes realizados junto da A.T., os titulares de direito de propriedade ilicitamente visado por condutas de terceiros dispõem das acções de reivindicação e de indemnização fundada em responsabilidade civil como meios de reposição dos direitos alegadamente lesados. Fenece também este fundamento do recurso. iii. Atentemos, por fim, no terceiro destaque das alegações de recurso que consiste num conjunto de alegadas insuficiências do título particular autenticado de compra e venda. A saber: a) não ter sido instruído com qualquer outro documento; b) não comprovar a morte da autora da herança, as razões pelas quais o ali executado é herdeiro da mesma, ou a aceitação da herança de que depende o quinhão hereditário; c) não justifica a razão de incluir na venda do quinhão hereditário de (…) os prédios designados (…) e (…), prédios integrantes das heranças de (…) e (…). a) e b) Relativamente à alegada ausência de documentos na instrução do documento particular autenticado, este título está sujeito: - à verificação do pagamento do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis e o imposto do selo liquidados, devendo constar do termo de autenticação o valor dos impostos e a data da liquidação, ou a disposição legal que prevê a sua isenção (cfr. artigo 25.º do D-L n.º 116/2008); - aos requisitos legais a que estão sujeitos os negócios jurídicos sobre imóveis, aplicando-se subsidiariamente o Código do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 207/95, de 14 de Agosto (cfr. n.º 1 do artigo 24.º do D-L n.º 116/2008). Para os documentos particulares autenticados, regulados nos artigos 150.º e ss. do Código do Notariado, prevê o n.º 1 do artigo 151.º do Código do Notariado, que “o termo de autenticação, além de satisfazer, na parte aplicável e com as necessárias adaptações, o disposto nas alíneas a) a n) do n.º 1 do artigo 46.º, deve conter ainda os seguintes elementos: a) A declaração das partes de que já leram o documento ou estão perfeitamente inteiradas do seu conteúdo e que este exprime a sua vontade; b) A ressalva das emendas, entrelinhas, rasuras ou traços contidos no documento e que neste não estejam devidamente ressalvados.”[12] Compulsado o teor documento particular autenticado de compra e venda, descrito nos factos provados números 1 e 2, constata-se que foram cumpridas todas as obrigações resultantes das suprarreferidas normas, figurando como arquivados os seguintes documentos: a) certidão emitida pelo Agente de Execução, no dia 25/01/2022, com a referência (…); b) Documento Único de Cobrança de Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis n.º (…), de 19/01/2022, no valor de € 170,17; e c) Documento Único de Cobrança de Imposto de Selo n.º (…), de 19/01/2022, no valor de € 38,40. Não há, por isso, fundamento legal para reclamar, como pretendem os Recorrentes, a inclusão de outros elementos no título em apreço, nomeadamente a demonstração da existência do direito na pessoa do transmitente ou da condição de herdeiro da pessoa falecida, condição essa que, para além do mais, se encontra provada nos autos através da junção da certidão de habilitação dos herdeiros de (…), reportada no facto provado n.º 6. A este respeito, dir-se-á ainda que: - se, por um lado, é em sede de registo predial do negócio que se impõe a demonstração do trato sucessivo (cfr. artigo 34.º do Código de Registo Predial) estando, aliás, dispensada de inscrição intermédia o registo em nome dos titulares de bens ou direitos que façam parte de herança indivisa (cfr. artigo 35.º do Código Registo Predial); - por outro, tratando-se de uma venda executiva, as questões relativas à existência e pertença do direito penhorado ao ali Executado / aqui Autor (…), enquanto herdeiro de (…), bem como às suas implicações na compra e venda realizada pelo agente de execução / encarregado da venda naqueles autos, teriam que ser suscitadas em sede de oposição à penhora / embargos de terceiro ou através do incidente de anulação da venda, previstos nos artigos 784.º, 342.º e 838.º, todos do Código de Processo Civil. c) No que toca à omissão da razão da alegada inclusão dos prédios designados (…) e (…), integrantes das heranças de (…) e (…), na venda do quinhão hereditário de (…), limitar-nos-emos a remeter para o teor do documento particular autenticado que nenhuma referência faz a bens concretos ou às heranças de (…) e (…). Incidindo a venda executiva, tão simplesmente, sobre o “…quinhão hereditário que pertence ao executado … (…) na herança ilíquida e indivisa, aberta por óbito de (…) …”, nenhuma razão haveria para justificar algo (a suposta venda dos prédios designados … e …, integrantes das heranças de … e …) que dele não consta. Tanto basta para se concluir que não tem qualquer cabimento o fundamento de recurso em apreço. * Em face do exposto, deverá manter-se, com os fundamentos aqui expendidos, o sentido da decisão recorrida que, por falta de fundamento jurídico, julgou improcedente a presente acção no despacho-saneador.* Custas *** Não havendo norma que preveja isenção (artigo 4.º, n.º 2, do RCP), o presente recurso está sujeito a custas (artigo 607.º, n.º 6, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do CPC). No critério definido pelos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2 e 607.º, n.º 6, ambos do CPC, a responsabilidade pelo pagamento dos encargos e das custas de parte assenta no critério do vencimento ou decaimento na causa, ou, não havendo vencimento, no critério do proveito. No caso, os Recorrentes não obtiveram vencimento no recurso, pelo que devem suportar as respectivas custas. * III. DECISÃO*** * Nestes termos, acordam os Juízes Desembargadores que compõem o coletivo da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora em:1. Julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar a sentença recorrida. 2. Condenar em custas os Recorrentes. Notifique. Évora, 19 de Dezembro de 2024 Relator: Ricardo Miranda Peixoto 1º Adjunto: Filipe César Osório 2º Adjunto: Filipe Aveiro Marques __________________________________________________ [1] O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do Recorrente, sem prejuízo da possibilidade da sua ampliação a requerimento dos Recorridos (artigos 635.º, n.º 4, 636.º e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC). Não é, assim, possível conhecer de questões nelas não contidas, salvo se forem do conhecimento oficioso (artigo 608.º, n.º 2, parte final, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, parte final, ambos do CPC). Também está vedado o conhecimento de questões novas (que não tenham sido objeto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de questões prévias judiciais, destinando-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente confirmação, anulação, alteração e/ou revogação. [2] In “Código de Processo Civil Anotado”, volume 2º, Coimbra Editora, 2001, anotação 3 ao então artigo 668.º, pág. 669. [3] In “Código de Processo Civil Anotado”, volume V, reimpressão, Coimbra Editora, 1984, anotação 5 ao artigo 668.º, pág. 143. [4] Disponível na ligação: https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/952807c78e863705802588d9004df1b1?OpenDocument No mesmo sentido, entre outros, ver os acórdãos do STJ de 15.12.2011, relatado pelo Juiz Conselheiro Raúl Borges no processo n.º 17/09.0TELSB.L1.S1, e do TRE de 11.02.2021, relatado pela Juíza Desembargadora Emília Ramos Costa no processo n.º 487/20.5T8TMR.E1. Disponíveis, respectivamente, nas ligações: https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/716b1b216836db4c802579980057452c?OpenDocument https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/749cacb56fc5b1868025868800764267?OpenDocument [5] In “Código de Processo Civil”, volume I, Almedina, 3ª edição, anotação 13 ao artigo 615.º, pág. 794. [6] In Op. Cit., anotação 3 ao então artigo 668.º, pág. 670. [7] In Op. Cit., anotação 11 ao artigo 615.º, págs. 793 e 794. [8] No mesmo sentido, ainda na jurisprudência, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 08.10.2020, relatado por Maria do Rosário Morgado no processo n.º 361/14.4T8VLG.P1.S1, de 20.05.2021, relatado por Nuno Pinto de Oliveira no processo n.º 69/11.2TBPPS.C1.S1 e de 16.11.2021, relatado por Isaías Pádua no processo n.º 2534/17.9T8STR.E2.S1. Respectivamente, disponíveis nas ligações: https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/675bdc9cf32c674080258634006f0510?OpenDocument https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/d1a0adf9145c4996802586e0004e2877?OpenDocument https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/31eb0407bb3bea628025879000593c0b?OpenDocument [9] Neste sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, in “Op. Cit.”, volume I, na alínea h) da anotação 9 ao artigo 5.º, pág. 30. [10] Disponível na ligação: https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/5c62d7680bfd396180258b8500342396?OpenDocument [11] Disponível na ligação: https://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/60b3c297e4f932ed8025820f0051557d?OpenDocument [12] São as seguintes, as “formalidades comuns” previstas pelo n.º 1 do artigo 46.º do Código do Notariado: “a) A designação do dia, mês, ano e lugar em que for lavrado ou assinado e, quando solicitado pelas partes, a indicação da hora em que se realizou; b) O nome completo do funcionário que nele interveio, a menção da respectiva qualidade e a designação do cartório a que pertence; c) O nome completo, estado, naturalidade e residência habitual dos outorgantes, bem como das pessoas singulares por estes representadas, a identificação das sociedades, nos termos da lei comercial, e das demais pessoas colectivas que os outorgantes representem, com menção, quanto a estas últimas, das suas denominações, sedes e números de identificação de pessoa colectiva; d) A referência à forma como foi verificada a identidade dos outorgantes, das testemunhas instrumentárias e dos abonadores; e) A menção das procurações e dos documentos relativos ao instrumento que justifiquem a qualidade de procurador e de representante, mencionando-se, nos casos de representação legal e orgânica, terem sido verificados os poderes necessários para o acto; f) A menção de todos os documentos que fiquem arquivados, mediante a referência a esta circunstância, acompanhada da indicação da natureza do documento, e, ainda, tratando-se de conhecimento do imposto municipal de sisa, a indicação do respectivo número, data e repartição emitente; g) A menção dos documentos apenas exibidos com indicação da sua natureza, data de emissão e entidade emitente e, ainda, tratando-se de certidões de registo, a indicação do respetivo número de ordem ou, no caso de certidão permanente, do respetivo código de acesso; h) O nome completo, estado e residência habitual das pessoas que devam intervir como abonadores, intérpretes, peritos médicos, testemunhas e leitores; i) A referência ao juramento ou compromisso de honra dos intérpretes, peritos ou leitores, quando os houver, com a indicação dos motivos que determinaram a sua intervenção; j) As declarações correspondentes ao cumprimento das demais formalidades exigidas pela verificação dos casos previstos nos artigos 65.º e 66.º; l) A menção de haver sido feita a leitura do instrumento lavrado, ou de ter sido dispensada a leitura pelos intervenientes, bem como a menção da explicação do seu conteúdo; m) A indicação dos outorgantes que não assinem e a declaração, que cada um deles faça, de que não assina por não saber ou por não poder fazê-lo; n) As assinaturas, em seguida ao contexto, dos outorgantes que possam e saibam assinar, bem como de todos os outros intervenientes, e a assinatura do funcionário, que será a última do instrumento”. |