Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
| ||
| Nº Convencional: | 4ª SECÇÃO | ||
| Relator: | JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO | ||
| Descritores: | CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO TRANSPORTE RODOVIÁRIO PRESTAÇÃO COMPLEMENTAR | ||
| Data do Acordão: | 02/26/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | CONCEDIDA A REVISTA | ||
| Sumário : | Os motoristas afetos ao transporte nacional rodoviário, que conduzam veículos pesados com mais de 7,5 toneladas, têm direito a receber as prestações pecuniárias previstas e reguladas nos termos das Cláusulas 61.ª dos Contratos Coletivos de Trabalho Verticais, publicados nos BTE n.º 34 de 15/9/2018 e BTE n.º 45 de 18/12/2019. | ||
| Decisão Texto Integral: | RECURSO DE REVISTA N.º 1466/22.3T8LRA.C1.S1 (4.ª Secção) Recorrente: AA Recorrida: VIDRALA LOGISTICS UNIPESSOAL LDA (Processo n.º 1466/22.3T8LRA – Tribunal Judicial da Comarca de Leiria -Juízo do Trabalho de ... - Juiz ...) ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: I – RELATÓRIO 1. AA, com os sinais constantes dos autos, intentou, no dia no dia 8/4/2022, a presente ação declarativa de condenação com processo comum laboral contra VIDRALA LOGISTICS UNIPESSOAL LDA, igualmente identificada nos autos, pedindo, na respetiva procedência da ação, a condenação desta a pagar ao Autor, a título de créditos laborais já vencidos, a importância de € 33.128,52 €, desdobrando-se os mesmos nas seguintes prestações e valores: a) Diuturnidades não pagas de julho de 2018 a setembro de 2018: 38,76 €. b) 875,57 € de diferenças salariais de outubro a dezembro de 2018. c) 4.588,74 € de diferenças salariais de janeiro a dezembro de 2019. d) 10.167,28 € de diferenças salariais de janeiro a dezembro de 2020. f) 2.257,26 € de diferenças salariais de janeiro e fevereiro de 2022. 2) A pagar as prestações pecuniárias que se vencerem até final, incluindo as diferenças salariais e 3) A pagar os juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento. * 2. Alegou, muito em síntese, que foi admitido ao serviço da Ré em 1 de julho de 2015, e à luz do que se encontra estabelecido na cláusula 39.ª do CCTV publicado no BTE, 1ª série, n.º 30 de 15/8/1997, por ter então completado 3 anos de vínculo ganhou direito a uma diuturnidade a partir de julho de 2018 no valor mensal de € 12,92. Nada tendo a Ré pagado a este título ao Autor de julho de 2018 a setembro de 2018, deve a este último o montante de 38,76 €. Por outro lado, os montantes pagos pela Ré ao Autor violam o que vem consignado no CCTV publicado no BTE n.º 34 de 15/09/2018 aplicável tendo o Autor direito a uma retribuição mensal por um mês completo de serviço prestado, que contemple a remuneração base prevista na Cl.ª 44.ª, uma diuturnidade prevista na Cl.ª 47.ª, o complemento salarial previsto na Cl.ª 45.ª, a retribuição especifica prevista na Cl.ª 61.ª, e o subsídio noturno previsto na Cl.ª 48.ª pelo que lhe são devidas as diferenças salariais peticionadas. * 3. Frustrada a conciliação em sede de Audiência de Partes, contestou a Ré alegando, em síntese, que o Autor pertence aos chamados “motoristas internos” da Ré, que apenas procedem a transportes de mercadorias dentro da área do concelho da ... e que, nessa medida, não têm autonomia na prestação de trabalho, dormindo todos os dias em casa e trabalhando 8 horas diárias em turnos rotativos, sendo o trabalho suplementar e em dia de feriado pago sempre que é prestado. Tais “motoristas internos” recebem prémio de função e subsídio de turno. Pelo que atendendo a que o trabalho do Autor não é caracterizado pela penosidade nem pela autonomia não tem direito ao pagamento da denominada Cláusula 61.ª do CCTV em vigor. * 4. Por Sentença de 31/01/2023 o Tribunal de 1.ª Instância decidiu o seguinte: “Pelo exposto julgamos parcialmente procedente a presente ação pelo que condenamos a Ré a pagar ao Autor, a título de diferenças salariais por diuturnidades, a quantia total já vencida de € 854,73 (oitocentos e cinquenta e quatro euros e setenta e três cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento. Mais condeno a Ré a pagar ao Autor as diuturnidades de acordo com o estabelecido no CCTV aplicável ao setor, tendo o Autor, no momento, direito a 2 diuturnidades no valor total de € 34,00/mês. No mais vai a Ré absolvida. Custas por Autor e Ré na proporção dos decaimentos. Valor da ação: € 33.128,52 (trinta e três mil euros cento e vinte e oito euros e cinquenta e dois cêntimos) Registe e notifique.” * 5. O Autor interpôs recurso de Apelação. Por Acórdão de 24/11/2023, o Tribunal da Relação de Coimbra julgou improcedente o recurso e confirmou a decisão recorrida [1]. * 6. O Autor apresentou requerimento em 14/12/2023 a arguir nulidade por omissão de pronúncia. Por Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra tirado na Conferência realizada em 15.03.2024 foi considerada improcedente a nulidade arguida através do requerimento autónomo de 14.12.2023. * 7. O Autor AA interpôs recurso de revista excecional, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC/2013, aplicável por força do disposto no número 1 do artigo 87.º do CPT. * 8. Foi determinada a subida do presente recurso de revista excecional, por despacho judicial, de 07.05.2024, que tendo chegado a este Supremo Tribunal de Justiça, foi objeto de um despacho liminar onde foi entendido se mostrarem reunidos os pressupostos formais de cariz especial e geral que se mostram legalmente previstos para o Recurso de Revista Excecional e, por tal motivo se justificar o envio destes autos recursórios à formação prevista no número 3 do artigo 672.º do NCPC. * 9. A formação prevista no número 3 do artigo 672.º do NCPC prolatou acórdão datado de 25 de setembro de 2024, que decidiu, em síontyesse, o seguinte: «Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.º, número 1, do Código do Processo do Trabalho e 672.º, números 1, alínea a) e 3 do Novo Código de Processo Civil, acorda-se, neste Supremo Tribunal de Justiça em admitir o presente recurso de Revista excecional interposto pelo Autor AA, pelos fundamentos invocados e analisados em sede da fundamentação deste Acórdão. Custas do presente recurso a cargo da recorrente - artigo 527.º, número 1 do Novo Código de Processo Civil. Registe e notifique.» 10. O recorrente AA apresentou alegações de recurso e formulou as seguintes conclusões: «1 - Resulta do douto acórdão sob censura que o recorrente não tem direito à retribuição prevista na cl.ª 61.ª do CCTV de 2018 e na Cl.ª 61.ª do CCTV de 2019, publicado no BTE n.º 34 de 15 de setembro e no BTE n.º 45 de 8 de dezembro de 2019 respetivamente, quando tal desiderato está em contradição frontal com o Acórdão proferido no processo n.º 176/22.6T8LRA.C1 da mesma secção do Tribunal da Relação de Coimbra, cuja certidão se junta e se dá por reproduzida. 2 – […] 12 - Do acórdão sob censura dizem os meritíssimos juízes desembargadores que o ora Recorrente não tem direito a receber a cl.ª 61.ª, porquanto, pese embora, passa-se a citar: “Esta Relação teve já oportunidade de se pronunciar sobre esta questão no acórdão 176/22.6T8LRA.C1 de 28.04.2023, consultável em www.dgsi.pt/jtrc” e “(...) Após melhor reflexão sobre a questão que se controverte, propendemos agora que da ata interpretativa não resulta a conclusão a que havíamos chegado no citado aresto. (…) Ou seja: exige-se a prova por parte do trabalhador (o respetivo ónus sobre ele recai) dos factos donde se possa extrair que o desempenho da sua atividade como motoristas apresenta uma maior penosidade, um esforço acrescido e um maior isolamento. E, ponderando melhor sobre a ata interpretativa, não vemos agora que da mesma resulte a interpretação de que a atribuição da prestação prevista na Cl.ª 61.ª do CCTV de 2018 prescinda da demonstração da maior penosidade no desempenho das funções por parte do motorista. (…) Com a redação dada à Cl.ª 61.ª do CCT de 2019 houve, no entendimento que agora perfilhamos, uma clara intenção das partes outorgantes em precisar o que havia sido estipulado na mesma Cl.ª do CCT de 2018 no sentido de a retribuição especial ser devida para compensar os trabalhadores motoristas de pesados da maior penosidade esforço acrescido inerentes à sua atividade, partindo do pressuposto que essa atividade impõe, normalmente, a prestação de trabalho suplementar de difícil controlo. (…) Ou seja, não está provado que inerente a atividade de motorista do autor revista uma maior penosidade ou um esforço acrescido e, designadamente, que a prestação de trabalho, dadas as suas características seja de difícil controlo para efeitos de contabilização do trabalho suplementar prestado. Por tudo isto, entendemos agora que, após melhor ponderação e estudo, ao contrário do decidido no aresto desta Relação acima referido, o autor não tem direito a receber a quantia a que se referem as Cl.ªs 61.ª dos CCTVS de 2028 e 2019 do CCTVS entre a ANTRAM e a FECTRANS. Termos em que se delibera julgar a apelação totalmente improcedente com integrar confirmação da sentença impugnada.” 13 - Contudo, tais fundamentos no acórdão que penaliza o ora recorrente não são bastantes para afastar os fundamentos que motivaram em sentido contrário e vertidos no acórdão fundamento do processo n.º 176/22.6T8LRA.C1 transitado em julgado e antes de proferida a presente decisão cuja reapreciação se pretende por este Venerando Tribunal, Supremo Tribunal de Justiça, Vejamos, 14 - Diz o Acórdão de fundamento o seguinte: «Do direito à quantia pecuniária prevista nas Cl.ªs 61.ª dos CCTs de 2018 e 2019. Também se encontrava consolidado o entendimento de que a referida retribuição especial não pressupõe uma efetiva prestação de trabalho suplementar, revestindo carácter regular e permanente e, como tal, integra o conceito de retribuição, sendo devida em relação a todos os dias do mês, independentemente da prestação efetiva de qualquer trabalho, acrescendo à retribuição de base. Contudo, no que concerne à Clª 61ª do CCTV de 2018 não se pode olvidar o que as partes outorgantes fizeram consignar na ata interpretativa de 09.01.2019, que (ponto 13): “A presente cláusula, apesar de ter como epigrafe “Regime de trabalho para os trabalhadores deslocados”, não é por esta que resulta o seu âmbito de aplicação; efetivamente tal é fixado pelo disposto no seu nº 1. A opção por esta redação, no que à epígrafe diz respeito, visou apenas tornar mais claro que esta cláusula visa substituir a anterior cláusula 74.ª/7 do anterior CCTV – embora com algumas alterações - adotando-se por isso parte da epígrafe desta última. Assim, todo e qualquer trabalhador com a categoria de motorista de pesados e ligeiros – com exceção dos motoristas ligeiros afetos ao transporte nacional -, têm direito a receber estas prestações pecuniárias, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estão afetos. Em suma para a aplicação desta cláusula é indiferente se a distância percorrida pelo veículo que o trabalhador está afeto, é de 2 km, 10 km, 20 km ou mais.” 15 - É perentório o acórdão fundamento ao evidenciar que “em face na vontade das partes outorgantes, que é de respeitar, feita consignar na ata interpretativa, a prestação prevista na Cl.ª 61.ª do CCT de 2018 é devida sem que haja necessidade de demonstrar ser a condução penosa para o motorista, exigindo-se-lhe um esforço acrescido, sendo indiferente, para o efeito, as distâncias que o mesmo percorre com o veículo que lhe está atribuído.” 16 - De igual forma resulta do acórdão fundamento o seguinte: “Mas se a ata interpretativa é de ter em conta na interpretação da Cl.ª 61.ª do CCT de 2018, já o mesmo não acontece com o CCT de 2019. Desde logo porque a ata foi elaborada para o CCT de 2018 e ainda pelo facto da Cl.ª 61.ª do CCT de 2019 ter uma redação diferente da mesma cláusula do CCT de 2018. É na cláusula do CCT de 2019 que se alude à situação da prestação de uma atividade que implique regularmente um elevado grau de autonomia e a possível realização de trabalho suplementar de difícil controlo e verificação pela empresa, decorrente da imprevisibilidade da duração concreta dos serviços a serem realizados encontrando-se deslocados das instalações dos empregadores e sem controlo hierárquico direto. Esta redação transporta-nos para as razões da atribuição da prestação pecuniária prevista na Cl.ª 74.ª, n.º 7 do antigo CCTV de 1980.” 17 – Segundo o ponto de vista do acórdão fundamento dizem os Juízes desembargadores que “Com a redação dada à Cl.ª 61.ª do CCT de 2019 houve, no nosso entendimento, uma clara intenção das partes em alterar o que havia sido estipulado na mesma Cl.ª do CCT de 2018 no sentido da retribuição especial apenas ser devida para compensar os trabalhadores motoristas de pesados da maior penosidade e esforço acrescido inerentes à sua atividade, partindo do pressuposto que essa atividade impõe, normalmente, a prestação de trabalho suplementar de difícil controlo.” 18 - Contudo segundo o acórdão fundamento, pese embora este entendimento no que à redação da Cl.ª 61.ª do CCTV de 2019 diz respeito, acaba por concluir que “Na nossa interpretação o Autor beneficia da aplicação da Cl.ª 61.ª do CCT de 2018 e, em princípio, não beneficiará da Cl.ª 61.ª do CCT de 2019. E dizemos em princípio porque há que atentar no que dispõe a Cl.ª 89.ª do CCT de 2019. Sob a epígrafe “manutenção de regalias anteriores e prevalência de normas” preceitua a citada cláusula que “1 - Da aplicação do presente CCTV não poderão resultar quaisquer prejuízos, designadamente baixa ou mudança de categoria ou classe, diminuição de retribuição e outras regalias de carácter regular ou permanentes, não contempladas neste CCTV e, bem assim, diminuição da retribuição líquida do trabalhador. 2 - (..); 3 - (..) 4 - A presente norma tem natureza imperativa.” 19 - E resulta de forma clarividente no acórdão fundamento o seguinte: “Desta norma decorre que, embora o trabalhador não reúna as condições para que possa beneficiar do regime da Cl.ª 61ª do CCT de 2019, nem por isso deixará de ter direito à quantia pecuniária nela prevista pois, de contrário, tal traduzir-se-ia numa diminuição de uma regalia de carácter regular e permanente com influência na retribuição líquida do trabalhador. Ou seja, o recorrente tem direito à retribuição especial calculada de acordo com a Cl.ª 61.ª do CCT de 2018 que não lhe foi paga pela ré nos anos de 2019, 2020 e 2021.” (realce nosso). 20 – Acrescenta o douto acórdão fundamento que “Tal retribuição, à semelhança do que acontecia com a Cl.ª 74.ª, nº 7 que pretendeu substituir, não pressupõe uma efetiva prestação de trabalho extraordinário, revestindo carácter regular e permanente e, como tal, integra o conceito de retribuição. Integrando a retribuição, o seu valor deve ser computado no cálculo do subsídio de férias,(…) Assim, por cada ano é devida a título de Clª 61ª a quantia de € 5.462,86 que somando os anos de 2019, 2020 e 2021 ascende ao total de € 16.388,58.” Apreciando, 21 - Donde resulta, que estamos assim manifestamente perante contradição de julgados da qual resulta que o ora recorrente tem de exercer a mesma função que o seu colega de trabalho que é o único que beneficia de um acréscimo mensal retributivo consignado na Cl.ª 61.ª e por determinação do Acórdão fundamento transitado em julgado. 22 - Manter-se esta realidade tal choca com a máxima que deve presidir nas relações laborais entre todos os intervenientes produtivos - Trabalho igual, salário igual. 23 - Para apreciação do CCTV de 2018, publicado no BTE n.º 34 de 15 de setembro há que evidenciar algo de elevada essencialidade e que é omitido desde a sentença proferida passando pelos dois acórdãos ora em confronto. 24 - Na verdade, antes da publicação do referido CCTV de 2018 o que vigorava para a atividade de motorista de pesados era a antiga Cl.ª 74.ª/7 e cuja sua abrangência só relevava o motorista de pesados que não estivesse afeto ao serviço nacional, ao trabalhador móvel que prestasse serviço fora do território nacional (não havendo sequer distinção entre o serviço ibérico e internacional). 25 - Com a entrada em vigor do CCTV de 2018 publicado no BTE n.º 34 de 15 de setembro de 2018, os motoristas de pesados afetos ao serviço nacional passaram assim beneficiar de tal acréscimo retributivo, em face de sucessivas reivindicações. 26 - No caso em apreço, não há dúvidas que, quer na sentença em primeira instância, quer no acórdão recorrido o recorrente é considerado motorista de pesados afeto ao serviço nacional. 27 - Na verdade, a atividade de motorista de pesados, constitui uma atividade qualificada, pois não é qualquer um que conduz um transporte de mercadorias e para mais com capacidade igual, até ou superior a 44 toneladas, como sucede com o recorrente e é confirmado pela sentença na 1.ª instância ao reconhecer o pagamento do complemento salarial tendo como referência o serviço nacional e por circular com viatura entre 7,5 t e 44 t, em obediência ao estabelecido no anexo III, quer da Cl.ª 59.ª do CCTV de 2019, quer da Cl.ª 45.ª do CCTV de 2018. 28 - Todavia, para ser motorista de pesados profissional tem de ter habilitação especifica, tem de proceder à obtenção licença de condução profissional designada de Certificado de Aptidão para Motorista (CAM) e manter ativa a sua renovação de cinco em cinco anos. 29 - Um motorista de pesados profissional está mais predisposto a infrações e acidentes estradais que outros trabalhadores ocasionais e qualquer vicissitude de que seja alvo pode ser conducente à inviabilização de renovações do CAM e consequentemente a comprometer a manutenção do seu posto de trabalho. 30 - Donde resulta que, a atividade de motorista de pesados, só por si, tem na sua essência o exercício de uma atividade que reveste penosidade, risco e autonomia. 31 - Neste seguimento, a penosidade, o risco e a autonomia, são conceitos indeterminados, mas que caracterizam a atividade em si de um motorista de pesados, faça este 2Km, 10Km, 100 Km ou 500Kms ou mais. 32 - Tanto mais que com a entrada em vigor do CCTV de 2018, visou precisamente clarificar a atividade do motorista de pesados, distinguindo apenas os motoristas afetos ao serviço do nacional, ibérico e internacional. 33 - Tal distinção implica necessariamente que um motorista afeto ao serviço internacional tenha outras contrapartidas financeiras que um motorista afeto ao serviço ibérico ou nacional não tem, tal como sucede com as ajudas de custo TIR prevista na alínea a) da Cl.ª 60.ª, no complemento salarial previsto na Cl.ª 45.º, as ajudas de custo previstas na alínea c) da Cl.ª 59.ª e o valor mais elevado da Cl.ª 61.ª, todas do CCTV de 2018 e o mesmo se dirá quanto à aplicação imperativa das Cl.ªs 58.ª (Ajudas de custo Diárias), 59.ª (Complemento Salarial), 61.ª (Retribuição do regime especifico do trabalho de motorista) e 64.ª (Ajudas de Custo TIR) todas do CCTV de 2019, 34 - De igual sorte um motorista afeto ao serviço ibérico tem necessariamente outras contrapartidas financeiras que um motorista afeto ao serviço do nacional também não tem cfr. decorre do conteúdo definido nas cláusulas anteriormente referenciadas, que se dão por reproduzidas nesta sede. 35 - E por último dentro do próprio serviço internacional, ibérico e nacional, atento ao tipo de serviço que tenha sido destinado a cada trabalhador, há certamente manifesta diferenciação remuneratória entre os mesmos em sede de apuramento de ajudas de custo diárias, vide cláusula 59.ª do CCTV de 2018 e Cl.ª 58.º do CCTV de 2019. 36 - Evidência ultima remuneratória, ajudas de custo diárias, que distingue o tipo de serviço praticado pelo recorrente dos demais colegas afetos ao serviço do nacional que se deslocam ou não para fora do concelho da ..., tanto mais que o recorrente recebe ajudas de custo diárias ao abrigo do disposto na Cl.ª 56.ª do CCTV de 2018 e na Cl.ª 55.º do CCTV de 2019, enquanto que os demais motoristas afetos também ao nacional já recebem ajudas de custo mas ao abrigo das Cl.ªs 57.ª e 59.ª ambas do CCTV de 2018 e das Cl.ªs 56.ª e 58.ª ambas do CCTV de 2019. 37 - Na verdade a Cl.ª 61.ª veio assim inserir uma inovação não prevista na Cl.ª 74.º, n. º 7, ao considerar que os motoristas afetos ao serviço nacional a partir de outubro de 2018 tinham direito também a tal retribuição, assim como se passou a fazer distinção do serviço ibérico do internacional. 38 - Com isto não significa que a atividade do serviço internacional não seja mais penosa do que o serviço ibérico e este que o serviço afeto ao nacional, mas tão só, visa o CCTV em apreciação ver plasmado e reconhecida a existência de uma retribuição em qualquer um dos tipos de serviços afetos à função de motorista de pesados. 39 - Aliás, o próprio teor da redação atual da cláusula 61.ª é perentório, numa interpretação a contrario, ao estatuir a obrigatoriedade da mesma para todos os motoristas que conduzem veículos com mais de 7,5 toneladas, sejam eles do nacional, ibérico ou internacional. 40 - A faculdade de pagar ou não a referida cláusula apenas se reporta aos motoristas de veículos com menos de 7,5 toneladas. 41 - As concretas características de pesados de mercadorias e atividades à respetiva condução inerentes, tais como definidas na categoria profissional de motorista de pesados, adensam-se quando a tonelagem possível ultrapassa as 7.5t (que é o critério de distinção entre a obrigatoriedade ou não de pagamento da referida cláusula): “(…) acondicionamento, incluindo amarração das mercadorias, zelar pelo cumprimento dos tempos de carga e descarga das mercadorias, adotar os trajetos que lhe forem ordenados e aqueles que se revelem mais benéficos para a empresa, pugnar pela boa conservação do veículo, realizar diariamente a verificação dos principais indicadores do estado aparente de funcionamento das viaturas tripuladas, reportando, de imediato, toda e qualquer anomalia detetada, verificar a existência e conformidade de toda a documentação relativa ao veículo e à carga transportada, pugnar pela manutenção em segurança, do veículo, carga e demais instrumentos de trabalho, cabendo-lhe, ainda, a tarefa de mudar pneus e realizar outras pequenas operações de reparação ou diagnóstico quando em trânsito” 42 - A corroborar este entendimento, temos a ata interpretativa outorgada em 9 de janeiro de 2019, entre a ANTRAN e a FESTRAN e que vem de forma clarividente esclarecer a abrangência e a aplicação, ao caso em apreço, da Cl.ª 61.ª do CCTV publicado no BTE n.º 34 de 15 de setembro de 2018, 43 - A saber, compulsado o ponto 13.º da ata interpretativa diz: “Cl.ª 61.ª n.º 1 e 3 (Regime de trabalho para trabalhadores deslocados) - A presente cláusula, apesar de ter como epigrafe “Regime de trabalho para os trabalhadores deslocados”, não é por esta que resulta o seu âmbito de aplicação; efetivamente tal é fixado pelo disposto no seu n.º 1. A opção por esta redação, no que à epígrafe diz respeito, visou apenas tornar mais claro que esta cláusula visa substituir a anterior cláusula 74.ª/7 do anterior CCTV – embora com algumas alterações - adotando-se por isso parte da epígrafe desta última. Assim, todo e qualquer trabalhador com a categoria de motorista de pesados e ligeiros – com exceção dos motoristas ligeiros afetos ao transporte nacional -, têm direito a receber estas prestações pecuniárias, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estão afetos. Em suma para a aplicação desta cláusula é indiferente se a distância percorrida pelo veículo que o trabalhador está afeto, é de 2km, 10 km, 20 km ou mais. Face ao exposto , verifica-se e que, o âmbito da aplicação desta cláusula resulta do definido no seu n.º 1: ”…trabalhadores móveis afetos ao transporte internacional, ibérico e nacional, excecionando-se destes últimos os trabalhadores móveis que conduzem veículos com menos de 7,5 ton (…)”. Contudo, importa esclarecer que, quando se utilizou o conceito de trabalhador móvel pretendia-se apenas abranger os trabalhadores móveis cuja atividade está afeta à condução, ou seja, apenas os trabalhadores com categoria de motorista. Exclui-se por isso do âmbito desta cláusula todos os outros trabalhadores móveis cuja categoria profissional não seja motorista, Mais se diga que, dentro da categoria profissional de motorista, ficam apenas e só, excluídos os motoristas afetos ao transporte nacional que conduzem veículos com menos de 7,5 ton, (..)” Daqui resulta que, 44 - A ata interpretativa constitui para a matéria de direito em apreço um verdadeiro mecanismo de resolução de conflitos e como tal a mesma vem de forma clarividente esclarecer quem tem direito à aplicação da Cl.ª 61.ª do CCTV de 2018 e à consequente retribuição nela prevista. 45 - Resulta da mesma a seguinte concretização no que à Cl.ª 61.ª diz respeito: “todo e qualquer trabalhador com a categoria de motorista de pesados e ligeiros (…) têm direito a receber estas prestações pecuniárias, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estão afetos. (…), dentro da categoria profissional de motorista, ficam apenas e só, excluídos os motoristas afetos ao transporte nacional que conduzem veículos com menos de 7,5 ton.” 46 - A ata interpretativa é contundente e objetiva na sua redação pois não suscita qualquer dúvida interpretativa, e se dúvidas na interpretação havia da Cl.ª 61.ª do CCTV de 2018 com a sua outorga tal dissipouse, atenta a sua concretização e objetividade. 47 - Tanto mais quando a ata interpretativa faz alusão à antiga Cl.ª 74.ª, n.º 7 , apenas se limita a dizer que a Cl.ª 61.ª visa tão só substituir a antiga Cl.ª 74.ª n.º 7 e nenhuma referência faz aos seus requisitos, até porque é ampliada a sua abrangência ao passar a incluir o motorista afeto ao nacional e distinguir o serviço ibérico do internacional, e acima de tudo é clara ao excluir taxativamente os motoristas que não têm direito a ela, sem incluir o recorrente em tal exclusão, pois é perentória ao excluir apenas o motorista de viaturas ligeiras até 7,5 toneladas. 48 - Compulsada a ata interpretativa, não oferece assim dúvidas de que a mesma é valorada em ambos os acórdãos em confronto para a asserção da aplicação da Cl.ª 61.ª para os dois trabalhadores que exercem a mesma função e para a mesma entidade patronal. 49 - A ata interpretativa ao ser valorada nos dois acórdãos em confronto, há que antes de mais e forçosamente respeitar a vontade das partes outorgantes, e para mais quando resulta da mesma que a prestação prevista na Cl.ª 61.ª do CCT de 2018 é devida sem que haja necessidade de demonstrar ser a condução penosa para o motorista, uma vez que nela se encontra inclusive expresso de que é indiferente as distâncias que o mesmo percorre com o veículo que lhe está atribuído. 50 - Neste sentido o acórdão fundamento valoriza, sublinha e salienta no seu dispositivo o que vem dito na ata interpretativa em causa, pelo que se realça a imperiosa citação: “Assim, todo e qualquer trabalhador com a categoria de motorista de pesados e ligeiros – com exceção dos motoristas ligeiros afetos ao transporte nacional -, têm direito a receber estas prestações pecuniárias, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estão afetos. Em suma para a aplicação desta cláusula é indiferente se a distância percorrida pelo veículo que o trabalhador está afeto, é de 2km, 10 km, 20 km ou mais.” 51 - Na verdade a ata interpretativa vem clarificar o pensamento, a vontade e o fim visado pelos outorgantes com a redação da cláusula 61.ª no CCTV de 2018, ao clarificar quem é que efetivamente fica excluído da sua aplicação, ou seja, somente os motoristas de ligeiros que conduzissem viaturas até 7,5 toneladas, pelo que tal exclusão está interdita ao recorrente e aos seus demais colegas de trabalho, que exercem a função de motorista do nacional por conduzirem viaturas pesadas até 44 toneladas. 52 - Tanto mais que a justificação do Tribunal a quo no seu acórdão sob reapreciação tem de cair por terra ao não atribuir a Cl.ª 61.ª ao recorrente ao constar na factualidade provada o n.º de viagens realizadas em média por dia e a distância percorrida em cada uma das viagens/transporte pelo Recorrente e quando tal factualidade à luz da ata interpretativa considera irrelevante a distância percorrida para a atribuição da Cl.ª 61 da CCTV. 53 - O recorrente com a categoria de motorista de pesados reconhecida, tem assim direito a receber esta prestação pecuniária da Cl.ª 61.ª, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estava afeto, ou o tipo de organização do trabalho, que compete às entidades empregadoras em rentabilizar os recursos humanos da melhor forma e alocá-los a seu contendo, sem os prejudicar. 54 - Não há assim qualquer violação do princípio de “salário igual para trabalho igual”, porque os motoristas de pesados que estejam deslocados e cfr. já acima demonstrou, recebem um acréscimo que o Autor não recebe, nomeadamente as diárias para alimentação e valores de refeição que são completamente diferentes e muito superiores às ajudas de custo diárias do recorrente, uma vez que este recebe o subsídio de refeição igual para todos os restantes trabalhadores que exercem outras funções. 55 - Estaremos perante a violação do princípio do “salário igual para trabalho igual”, se o Autor com a categoria de motorista de pesados no serviço nacional (não permitindo a CCTV subdivisões na classificação das categorias profissionais) não receber as mesmas componentes retributivas dos outros motoristas de pesados do serviço nacional e do colega de trabalho que exerce a mesma função, denominada pela recorrida de serviço interno. 56 - Como solução temos a única interpretação permitida pelo Douto Tribunal ad quem e que no modesto entendimento do recorrente será a da ata interpretativa mas segundo o sentido e alcance que as partes outorgantes lhe quiseram dar. 57 - A Ata Interpretativa veio assim em 09-01- 2019 esclarecer sim todas as eventuais dúvidas. Dúvidas que parecem ser as do douto acórdão do Tribunal ad quo, que decide com base na ata, mas em prejuízo do ora recorrente e fá-lo sem certezas. 58 - Assim, o recorrente não pode aceitar o argumento do acórdão sob censura que o penaliza ao recorrer aos vários elementos interpretativos da ata (histórico, sistemático e teleológico), constitutivos do elemento espiritual da suposta cláusula e texto da ata, quando tal só é necessário se o elemento literal da ata ou da cláusula for insuficiente para determinar o verdadeiro sentido em que a convenção coletiva de trabalho tem de ser interpretada, sendo que no caso em análise o elemento gramatical é inequívoco e este é suficiente para se encontrar o verdadeiro sentido da convenção e que no caso em apreço diz e se repete: “Assim, todo e qualquer trabalhador com a categoria de motorista de pesados e ligeiros – com exceção dos motoristas ligeiros afetos ao transporte nacional -, têm direito a receber estas prestações pecuniárias, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estão afetos.” 59 - Consequentemente, há que valorar o texto da convenção e a ata interpretativa no que concerne à Cl.ª 61.ª do CCTV publicado no BTE n.º 34 de 15 de setembro de 2018, estabelecida pelas partes no exercício do seu direito à liberdade sindical e á autonomia negocial coletiva. 60 - Ora do exposto resulta que a ata interpretativa é de ter valoração essencial na interpretação e da aplicação da Cl.ª 61.ª do CCT de 2018, cfr. defende e clarifica o acórdão fundamento, pelo que se ao colega de trabalho do recorrente foi reconhecido tal direito para o ora recorrente tal também deverá suceder. 61 - Contudo, não se pode olvidar que resulta igualmente do acórdão fundamento que a redação da cláusula 61.ª do CCTV de 2019 publicado no BTE n.º 45 tem uma redação diferente, e não há qualquer ata interpretativa que venha clarificar a inserção das expressões que podem suscitar dúvidas no ressurgimento e comunicabilidade com a antiga Cl.ª 74/7 outrora aplicável somente aos motoristas afetos ao serviço internacional. Em atalho de foice, 62 - Dir-se-á que o mesmo o acórdão fundamento, a este título, sempre padece de erro interpretativo, uma vez que o n.º 1 vem no fundo esclarecer e definir que um motorista de pesados é quem presta “uma atividade que implica regularmente um elevado grau de autonomia e a possível realização de trabalho extraordinário de difícil controlo e verificação pela empresa, decorrente da imprevisibilidade da duração concreta dos serviços a serem realizados e encontrando-se deslocados das instalações dos empregadores e sem controlo hierárquico direto”, e isto enquanto forma de excluir os motoristas de pesados que conduzam viaturas até 7,5 toneladas, 63 - O sentido dos novas CCTV de 2018 e 2019 nunca foi o de compensar somente os esforços e riscos acrescidos de quem conduz veículos pesados no estrangeiro, com a eventual necessidade de passar dias inteiros em viagem e de aí pernoitar. 64 - O sentido foi acabar com o pagamento das horas extra para TODOS os motoristas de pesados. 65 - Esta questão terá que certamente ser reapreciada noutra sede, através de uma comissão paritária que decorrerá no términus do mês em curso e até porque o ora recorrente é representado por um Sindicato e tem sido assente pela própria ANTRAN que tais negociações jamais esteve no espirito e ou visou excluir qualquer trabalhador do nacional que transporte veículos pesados com capacidade superior a 7,5 toneladas, como é o caso em apreço. Contudo, retomando o caso em apreço, 66 - Tal não obsta ao recorrente, pese embora divergência do enquadramento e interpretação da Cl.ª 61.ª, no contexto da publicação do CCTV de 2019, que se acolha mesmo assim, a solução aventada no acórdão fundamento, ao ser reconhecido o direito a um trabalhador ao pagamento previsto na Cl.ª 61.ª do CCTV de 2018 e por força da Cl.ª 89.ª do CCTV de 2019 ao pagamento da Cl.ª 61.ª do CCTV de 2019 assente em nova redação. 67 - Na verdade, segundo o acórdão fundamento, decide que verificado que o trabalhador tem direito a receber a Cl.ª 61.ª do CCTV de 2018, e mesmo que o trabalhador não viesse a reunir os requisitos do regime da Clª 61º do CCT de 2019 que sucedeu, nem por isso deixará de ter direito à quantia pecuniária nela prevista pois, de contrário, tal traduzir-se-ia numa diminuição de uma regalia de carácter regular e permanente com influência na retribuição líquida do trabalhador. 68 - Resulta assim do acórdão fundamento que o trabalhador e ora recorrente deve beneficiar da aplicação da Cl.ª 61.ª prevista no CCT de 2018 e, consequentemente, por estar perante um direito adquirido deve beneficiar da continuação do seu recebimento à luz da Cl.ª 61.ª do CCT de 2019. 69 - Assim a sucessão do CCTV de 218 pelo CCTV de 2019, quer no que tange ao recorrente, quer a todos os seus colegas de trabalho afetos ao mesmo tipo de serviço no que concerne ao pagamento da Cl.ª 61.ª sempre estariam garantidos pelo que dispõe a Cl.ª 89.ª de natureza imperativa do CCT de 2019, no que a manutenção de regalia do trabalhador diga respeito. 70 - Vejamos, a cláusula 89.º do CCTV de 2019 sob a epígrafe “manutenção de regalias anteriores e prevalência de normas” diz: “1 - Da aplicação do presente CCTV não poderão resultar quaisquer prejuízos, designadamente baixa ou mudança de categoria ou classe, diminuição de retribuição e outras regalias de carácter regular ou permanentes, não contempladas neste CCTV e, bem assim, diminuição da retribuição líquida do trabalhador; 2 - (..); 3 - (..); 4 - A presente norma tem natureza imperativa.” 71 - Donde resulta que segundo o acórdão fundamento que sufraga o entendimento de que pese embora o trabalhador, como sucede com o recorrente, não reunir as condições para que possa beneficiar do regime da Cl.ª 61.ª mas do CCT de 2019, tal não afasta o direito ao seu recebimento por à data da sua entrada em vigor já se encontrar beneficiado da anterior redação da Cl.ª 61.ª do CCTV de 2018, pelo que o trabalhador por força da Cl.ª 89.ª do CCTV de 2019, tem direito a recebê-la, sob pena de “tal traduzir-se numa diminuição de uma regalia de carácter regular e permanente com influência na retribuição líquida do trabalhado”. 72 - Neste seguimento, entende o recorrente, que cfr. decorre do acórdão de fundamento deve ter direito a receber a Cl.ª 61.ª ou prestação equivalente, quer referente aos anos de 2018, 2019, 2020, 2021 e 2022 , quer enquanto o contrato de trablho perdurar. Concretizando, 73 - Deve a recorrida ao recorrente a titulo de Clª. 61.ª de outubro de 2018 a dezembro de 2018 a retribuição especifica prevista na Cl.ª 61.ª, do CCTV publicado no BTE n.º 34 de 15 de setembro de 2018, cuja forma de cálculo foi devidamente concretizada pelo recorrente no artigo 21.º da sua petição inicial e que consiste no valor mensal de 352,59 € por um mês de serviço completo – (Valor hora = 725,14 + 14,50 + 16,00 x 12 :2080 = 755,64 x 12 : 2080 = 9067,68 : 2080 = 4,36€ hora; 1 ª hora valor hora acrescido de 50% , logo 4,36 + 50% = 6,54 €; 2.ª hora valor hora acrescido de 75% , logo 4,36 + 75% = 7,63 € ;Valor das duas horas suplementares perfaz a importância de 6,54 + 7,63 = 14,17 €; 14,17 € x 30 = 425,10; 425,10 – 72,51 € = 352,59 €), 74 - Pelo que deve ser reconhecido que é devido pela Recorrida ao Recorrente a titulo de cláusula 61.ª de outubro de 2018 a dezembro de 2018 a importância total de 1057,77 € (352,59 €/Cl.ª 61.ª x 3 meses = 1057,77 €). 75 - Deve a recorrida a titulo de Cl.ª 61.ª de Janeiro de 2019 a dezembro de 2019 a retribuição específica prevista na já mencionada Cl.ª 61.ª do CCTV publicado no BTE n.º 34 de 15 de setembro de 2018, cuja forma de cálculo foi devidamente concretizada pelo recorrente no artigo 43.º da sua petição inicial e que consiste no valor mensal de 355,76€ por um mês de serviço completo – (Retribuição base - 717,74 € (732,39 € - 14,65 €) – por ter ficado decidido em 1.ª instância que a retribuição base do recibo de vencimento incluir complemento salarial e confirmado pelo Tribunal a quo; Complemento salarial – 14,65 (732,39 x 0.02); Diuturnidade – 16.00 €; Regime de trabalho para trabalhadores Móveis (Cláusula 61.ª)- 355,76 €; VH - 732,39+ 14,65 + 16 x 12:2080 = 763,04 x12:2080 = 9156,48 = 4,40€ hora;1 ª hora valor hora acrescido de 50% , logo 4,40+ 50% = 6,60€; 2 ª hora valor hora acrescido de 75%, logo 4,40 + 75% = 7,70€ ;Valor das duas horas suplementares perfaz a importância de14,30€ - (6,54 + 7,63 = 14,17 €); 14,30 € x 30 dias =429,00; 429,00 – 73,24 €/subsídio noturno = 355,76 €). 76 - Pelo que deve ser reconhecido que é devido pela Recorrida a titulo de cláusula 61.ª ao recorrente de janeiro de 2019 a dezembro de 2019, acrescido do valor correspondente a um subsídio de férias, a importância total de 4.624,88 € (355,76 €/Cl.ª 61.ª x 12 meses = 4.269,12 €; 4.269,12 €; + 355,76 €/subsídio de férias) 77 - Deve a recorrida a titulo de Cl.ª 61.ª de janeiro de 2020 a dezembro de 2020, sendo que no ano de 2020, mais concretamente a partir de 01/01/2020 entrou em vigor o CCTV publicado no BTE n.º 45 de 8 de dezembro de 2019, a retribuição especifica prevista na Cl.ª 61.ª do CCTV de 2019 no valor de 363,22 € /mês por um mês de serviço completo (739,71 € + 17,00 € = 771,51 € + 48%), e cuja forma de cálculo atenta a decisão em primeira instância teve como valores de referência na Retribuição base e complemento salarial. 78 - Pelo que deve ser reconhecido que é devido pela Recorrida a titulo de cláusula 61.ª ao recorrente de janeiro de 2020 a dezembro de 2020, acrescido de dois subsidio de férias (um referente a 2020 e outro a 2021), a importância total de 4.721,86€ (363,22€ /Cl.ª 61.ª x 12 meses + 363,22 € /subsídio de férias de 2020 = 4.358,64 € + 363,22). 79 - Deve a recorrida a titulo de Cl.ª 61.ª de janeiro de 2021 a dezembro de 2020, sendo que a partir de julho de 2021 ganhou mais uma diuturnidade, a retribuição especifica prevista na Cl.ª 61ª do CCTV de 2019 no valor de 363,22€ /mês por um mês de serviço completo (739,71 € + 17,00 € = 771,51 € + 48%) até junho de 2021 e no valor de 381,03 € / mês (733,07 € +25,14 €+ 35,60 €=793,81 € + 48%) de julho /2021 a dezembro/2021. 80 - Pelo que deve ser reconhecido que é devido pela Recorrida a titulo de cláusula 61.ª ao recorrente de janeiro de 2021 a dezembro de 2021, acrescido de um subsidio de férias a importância total de 4902,15 € (372,49 € /Cl.ª 61.ª x 6 meses de janeiro a junho + 381,03 €/Cl.ª 61.ª x 6 meses de julho a dezembro + 381,03 € /subsídio de férias de 2021 = 2234,94 € + 2286,18 € + 381,03 € =490,15 €). 81 - Deve a recorrida a título de Cl.ª 61.ª ao longo do 2022 , com relevância para janeiro e fevereiro, meses estes que antecederam a instauração a Cl.ª 61.ª aferida para o ano de 2022, no valor de 402,32 € (777,23 € + 25,14 € + 35,80 € = 838.17 € + 48% = 402,32 €) por um mês completo de serviço. 82 - Pelo que até à propositura da ação, fevereiro de 2022, é devido pela recorrida ao recorrente a titulo Cl.ª 61.ª o valor de 804,64 € (402,32 €/janeiro + 402,32 €/fevereiro). 83 - Totaliza assim, seguindo a linha de raciocínio do acórdão de fundamento, o crédito do recorrente devido pela recorrida ao recorrente no total de 16.111,30 € a titulo de Cl.ª 61.ª , desde 2018 até à propositura dos presentes autos (Fevereiro de 2022 inclusive) cujo apuramento necessário será de evidenciar que cumpre com a necessária e forçosa adequação ao decisório em 1.ª instância com o que vem firmado em matéria de apuramento de valores passiveis de confirmação seguindo a praxis e espirito presente no CCTV quer de 2018 quer de 2019, e tudo cima descriminado. 84 - A admissão do recurso de revista, pela via da revista excecional, para além da resolução do litígio entre as partes, visa acima de tudo salvaguardar a estabilidade do sistema jurídico globalmente considerado e a normalidade do processo de aplicação do Direito. 85 - A questão de direito em apreciação apresenta manifesta novidade, e onde a resposta a dar pelo Supremo Tribunal de Justiça – assumindo uma dimensão paradigmática para casos futuros – se mostra necessária e vital para contribuir para a segurança e certeza do direito. 86 - A questão jurídica que o recorrente pretende ver esclarecida por meio de Acórdão de Uniformização de Jurisprudência é a de saber se todos e quaisquer motoristas afetos ao serviço nacional têm direito à Cl.ª 61.ª de 2018 e consequentemente à nova redação da Clª 61ª do CCTV de 2019 por força da Cl.ª 89 do CCTV de 2019. 87 - Estriba-se assim o presente recurso no disposto na alínea c), do n.° 1, do artigo 672.°, do Cód. Proc. Civil, isto é, em virtude do Acórdão recorrido se achar em absoluta contradição com o Acórdão proferido pelos mesmos juízes do Tribunal da Relação de Coimbra em 28 de abril de 2023, no âmbito do processo n.º 176/22.6T8LRA.C1, transitado em julgado, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito. 88- O Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento estão em frontal contradição, e ambos encontram fundamento para as decisões divergentes, mas na divergente interpretação que por seu turno é dada em cada caso à ata interpretativa de 9 de janeiro de 2019 e que teve o objetivo de uniformizar o entendimento da aplicação de algumas cláusulas do CCTV de 2018 publicado no BTE n.º 34 de 15 de setembro, durante oprocesso negocial de revisão global, inclusive a cláusula 61.ª em apreço. 89 - Ora a interpretação da ata que visava auxiliar na interpretação da Cl.ª 61.ª no Acórdão fundamento foi decidida de forma diametralmente oposta à do acórdão recorrido que por sinal também se socorre e se fundamenta da mesma ata e não obstante a manutenção integral da matéria de facto assente em ambos os acórdãos que cfr. acima se demonstrou são na sua essencialidade coincidentes. 90 - A única interpretação permitida pelo Douto Tribunal a quo seria a da ata interpretativa mas não o fez, ou seja, não valorou a interpretação que as partes outorgantes lhe quiseram dar. 91 - Deve ser assim reconhecido ao Autor/recorrente com a categoria de motorista de pesados o direito a receber esta prestação pecuniária da Cl.ª 61.ª, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estava afeto, ou o tipo de organização do trabalho, que compete às entidades empregadoras. 92 - Não há assim qualquer violação do princípio de “salário igual para trabalho igual” para com os outros motoristas afetos ao serviço do nacional deslocados, porque estes motoristas de pesados por estarem deslocados recebem um acréscimo que o recorrente não recebe, e o seu valor é completamente diferente das ajudas de custo diárias do recorrente que recebe o subsídio de refeição igual para todos os restantes trabalhadores e nos precisos moldes já acima enunciados. 93 - Haverá violação sim, do princípio do “salário igual para trabalho igual”, se o recorrente com a categoria de motorista de pesados no serviço nacional (não permitindo a CCTV subdivisões na classificação das categorias profissionais) não receber as mesmas componentes retributivas dos outros motoristas de pesados do serviço nacional e do colega de trabalho identificado no acórdão fundamento que exerce a mesma função, denominada pela recorrida de “serviço interno”. 94 - Ao não ter decidido assim, o Tribunal a quo é que viola o disposto no art. 59.º, n.º 1 al. c) da Constituição da República Portuguesa. 95 - Como se sabe, o artigo 59.º, n.º 1, al. a) da Constituição da República Portuguesa estabelece um princípio de igualdade em matéria salarial, assim traduzido: “todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual”. 96 - Citando Monteiro Fernandes (Direito do Trabalho, 12.ª Edição, Almedina, pag. 445 e ss.), o princípio de equidade retributiva “que se traduz na fórmula para trabalho igual salário igual assume projeção normativa direta e efetiva no plano das relações de trabalho o que significa que não pode, por nenhuma das vias possíveis (contrato individual, convenção coletiva, regulamentação administrativa, legislação ordinária) atingir-se o resultado de, numa concreta relação de trabalho, ser paga retribuição desigual da que seja paga, no âmbito da mesma organização, como contrapartida de trabalho igual. Trata-se, pois, de uma diretriz imediatamente operatória, não apenas enquanto critério de validade da regulamentação legal e convencional, mas, sobretudo, como critério de licitude da prática contratual concreta”. 97 - Consequentemente não pode subsistir dúvidas de que o ora recorrente tem direito a receber mensalmente a retribuição da Cl.ª 61 e também nas férias e subsídio de férias, à semelhança do seu colega de trabalho em que tal direito foi reconhecido no acórdão fundamento, sob pena de violação no mesmo local de trabalho do referido imperativo constitucional. 98 - O Tribunal a quo ao não decidir assim, violou todos os normativos legais e doutrinais e jurisprudenciais em que se baseou e, em especial a Cl.ª 61.ª da CCTV do CCTV de 2018 e 2019 , Cl.ª 89.º do CCTV de 2019 e o art.º 59.º, n.º 1 al. c) da CRP, pelo que deve vingar nos moldes amplamente expostos o direito ao recorrente em receber a retribuição mensal referente à Cl.ª 61.ª, quer de outubro de 2018 até à propositura da ação (fevereiro de 2022), quer enquanto o contrato de trabalho perdurar. 99 - Pelo que se conclui que em face da demonstrada existência de soluções opostas quanto à mesma questão fundamental de direito deverá ser proferido Acórdão para Uniformização de Jurisprudência no que concerne à interpretação da Cl.ª 61.ª do CCTV de 2018 e da Cl.ª 61.ª do CCTV de 2019, por força da ata interpretativa supra e por inerência da Cl.ª 89.ª do CCTV de 2019 100 - Por todo o exposto tal Acórdão Uniformizador, tão ansiado e imperioso, deverá no nosso modesto entender, sempre sufragar o posicionamento vertido no acórdão fundamento que radica o seu posicionamento na correta leitura da ata interpretativa que os outorgantes quiseram fazer prevalecer. É o que se pede e espera desse Alto Tribunal, assim se fazendo JUSTIÇA!» * 11. A Ré VIDRALA - LOGISTICS, UNIPESSOAL LDA. veio responder dentro do prazo legal ao recurso de revista do Autor, tendo para o efeito deduzudo as seguintes conclusões, na parte que para aqui releva: «1. Quer a sentença de 1.ª instância quer o douto Acórdão decidiram que o Recorrente não tem direito à retribuição prevista na Cláusula 61.ª do CCTV de 2019 e na Cláusula 61.ª do CCTV de 2019, publicados no BTE n.º 34 de 15 de setembro e no BTE n.º 45 de 8 de dezembro, respetivamente. 2. […] 7. O Acordão recorrido não merece qualquer censura ou reparo. 8. No exercício da sua atividade profissional, o Recorrente exerce a função de motorista por conta, sob a autoridade e direção da Recorrida, conduzindo veículos pesados de mercadorias. 9. Funções que se resumem ao transporte de vidros entre as instalações da empresa “G..., SA.” e os dois armazéns dessa mesma sociedade, ambos sitos em ..., numa distância nunca superior a 5 km, não saindo do concelho da ..., sendo designado como motorista interno. 10. O CCT de 2019 prevê, na cláusula 61.ª, uma prestação pecuniária para os trabalhadores que prestem “uma atividade que implica regularmente um elevado grau de autonomia e a possível realização de trabalho extraordinário de difícil controlo e verificação pela empresa, decorrente da imprevisibilidade da duração concreta dos serviços a serem realizados e encontrando-se deslocados das instalações dos empregadores e sem controlo hierárquico direto”. 11. Esta cláusula substitui a cláusula 74.ª, n.º 7 do CCT de 1982 que estipulava o pagamento de uma remuneração especial, com a finalidade de compensar a especial penosidade do trabalho de um motorista internacional, deslocado no estrangeiro, que aí pernoita, com esforços e riscos acrescidos. 12. Pelo que, na interpretação da cláusula 61.ª importa atender não só ao elemento literal, mas também a elementos lógicos, de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica. 13. A cláusula 74.ª, n.º 7 do CCT de 1982 pretendia compensar os esforços e riscos acrescidos de quem conduz veículos pesados no estrangeiro, com a eventual necessidade de passar dias inteiros em viagem e daí pernoitar. 14. Atendendo aos antecedentes históricos, ao fim da Cláusula 74.ª, n.º 7 e ao teor da Cláusula 61.ª, é certo que o objetivo da Cláusula 61.ª é compensar o esforço e risco acrescidos do trabalho dos motoristas de pesados que se veem obrigados a prestar, habitualmente, trabalho suplementar de difícil fiscalização por parte da entidade empregadora, uma vez que prestam trabalho longe das instalações da empresa, com grande autonomia, sem supervisão dos superiores hierárquicos, e com a possibilidade de pernoitar fora de casa. 15. Como bem decidiu o Tribunal a quo “exige-se a prova por parte do trabalhador (o respetivo ónus sobre ele recai) dos factos donde se possa extrair que o desempenho da sua atividade como motoristas apresenta uma maior penosidade, um esforço acrescido e um maior isolamento”. 16. O Recorrente não sai do concelho da ..., percorrendo no máximo 5 km em cada trajeto entre as instalações da empresa e os seus armazéns, tem um horário de trabalho de 8 horas diárias, em regime de 3 turnos rotativos, todos os dias vai dormir a casa, aufere retribuição pelas horas de trabalho suplementar prestadas, tendo supervisão diária dos seus superiores hierárquicos. 17. Aufere retribuição pelas horas de trabalho suplementar prestadas e pelo prestação de trabalho em dia feriado, bem como subsídio de turno e um “prémio de função”, apenas auferido pelos motoristas com a categoria de motorista interno. 18. Tendo, além do mais, supervisão diária dos seus superiores hierárquicos em todas as suas tarefas, não existindo qualquer liberdade de escolha das tarefas a realizar e do material a transportar. 19. É inequívoco que a Cláusula 61.ª dos CCT de 2018 e 2019 não é aplicável à situação específica de trabalhadores como o Recorrente que, enquanto motorista de pesados interno, não tem a penosidade nem os esforços e riscos acrescidos aos motoristas de pesados que trabalham no nacional, ibérico ou internacional, fora da área das instalações da Recorrida, que têm autonomia na sua organização, sendo difícil o controlo e verificação do trabalho suplementar prestado dada a sua imprevisibilidade, podendo ter de pernoitar fora de casa atendendo às viagens realizadas. 20. A ata interpretativa não afasta a verificação do requisitos da penosidade, do esforço acrescido e maior isolamento para a aplicação da Cláusula 61.ª do CCT. 21. Caso o presente recurso de revista proceda, sendo a Recorrida condenada no pagamento da Cláusula 61.ª, é manifesto que o Recorrente não pode conservar o que recebeu a título de trabalho suplementar, trabalho prestado em dia feriado, subsídio de turno e prémio de função. Termos em que se deve considerar inadmissível o presente recurso de revista excecional e manter-se o douto Acórdão.» * 12. O ilustre Procurador-Geral Adjunto colocado junto deste Supremo Tribunal de Justiça proferiu Parecer nos autos que concluiu nos seguintes moldes: «Somos, assim, de parecer que o presente recurso de revista deverá ser considerado procedente, sendo revogado o douto acórdão recorrido.» * 13. As partes não se pronunciaram sobre o teor desse Parecer, dentro do prazo legal de 10 dias, apesar de terem sido notificadas do mesmo. * 14. Cumpre decidir. II. FACTOS 15. Com relevância para o presente Aresto, há a considerar os seguintes factos: - FACTOS PROVADOS PELO TRIBUNAL DA 1.ª INSTÂNCIA: «1. A Ré é uma sociedade comercial que se dedica ao transporte público ocasional de mercadorias e transporte público internacional rodoviário de mercadorias e logística, comércio de vidros, utilidades, porcelanas, esmaltes e análogos. 2. A sociedade “G..., SA.” é proprietária da fábrica e dos armazéns em referência infra e é detentora da totalidade do capital social da Ré. 3. No dia 01.07.2015 a Ré, então denominada J... UNIPESSOAL, LDA., admitiu o Autor ao seu serviço para desempenhar as funções inerentes à categoria profissional de motorista, através de contrato de trabalho a termo que se foi renovando no tempo. 4. A Ré tem ao seu serviço diversos motoristas que se dedicam à atividade de transporte rodoviário de mercadorias em viaturas pesadas. 5. Enquanto motorista ao serviço da Ré, o Autor faz o transporte de garrafas de vidro de e para a fábrica G..., SA., sita em Rua ..., em ..., de e para os dois armazéns da Ré, um sito na ... e outro na ..., também em .... 6. Pelo que os transportes realizados pelo Autor são feitos no concelho de .... 7. A distância percorrida nas viagens de ida e volta referidas em 5. é de cerca de 5 km. 8. A Ré tem ao seu serviço 10 trabalhadores, entre os quais o Autor, a exercer as funções referidas em 5.. 9. O Autor sempre esteve afeto às funções referidas em 5., nunca tendo exercido funções no transporte ibérico e internacional ou fora da .... 10. Os motoristas afetos aos transportes referidos em 5. têm um regime de trabalho de três turnos rotativos, semanalmente, de segunda-feira a domingo, a saber das 05h00 às 13h00, das 13h00 às 21h00 e das 21h00 às 05.h00. 11. Cada turno corresponde a oito horas diárias de trabalho, com uma pausa de 45 minutos. 12. Pelo facto de trabalhar em turnos, o Autor recebe mensalmente um subsídio de turno, no valor de € 155,16 (cento e cinquenta e cinco euros e dezasseis cêntimos), conforme recibos de vencimento juntos aos autos. 13. Sempre que o Autor prestou trabalho suplementar ou trabalho em dia de feriado, a Ré pagou os valores que eram devidos a esses títulos, conforme resulta dos recibos de vencimento juntos. 14. Todos os motoristas que exercem as funções suprarreferidas recebem um prémio de função pelo trabalho de cargas e descargas que efetuam, trabalho esse que não é efetuado pelos restantes motoristas da Ré. 15. O “prémio de função” consta de todos os recibos de vencimento e tem o valor mensal de € 155,16 (cento e cinquenta e cinco euros e dezasseis cêntimos). 16. O Autor realiza uma média de cinco transportes diários da fábrica da G..., SA. para os seus armazéns e vice-versa, não saindo da .... 17. Todos os dias dorme em casa. 18. No exercício das suas funções, ao realizar o seu trabalho diariamente, o Autor tem em conta uma listagem que lhe é fornecida no dia anterior à tarde pelo chefe do armazém ou pelo gerente da empresa. 19. É o Sr. BB, responsável dos serviços de logística da Ré, quem coordena o trabalho dos motoristas e quem elabora os horários dos mesmos. 20. Quando a Ré determina que o Autor preste trabalho suplementar, designadamente para substituir outro motorista, é-lhe paga a remuneração correspondente. 21. Sempre que o Autor trabalha em dia feriado esse trabalho é-lhe pago. 22. O trabalho do Autor é controlado e determinado pela Ré diariamente, quer quando carrega na fábrica quer quando descarrega nos armazéns, através do sistema informático inserido nos equipamentos de trabalho e da entrega de listagens com as referências que tem de carregar/descarregar. 23. a 63. [pagamentos feitos pela Ré ao Autor e constantes dos respetivos recibos de vencimento, respeitantes aos meses de outubro de 2018 a fevereiro de 2022] 64. Até setembro de 2020, a rubrica “vencimento base” integrava o complemento salarial, conforme recibos de vencimento juntos aos autos. 65. A partir de outubro de 2019 a rubrica “compensação trabalho noturno”, que se destinava efetivamente a compensar o trabalho em regime de turnos rotativos, passou a denominar-se “subsídio 3 turnos”. - FACTOS ADITADOS PELO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA: - “ No contrato de trabalho inicial (01/07/2015) consta que a Ré se obrigou a pagar ao Autor a retribuição base no valor de 715,13 €/mês, prémio de função no valor de 100,00€/mês e subsídio noturno no valor de 150,00 €/mês, tendo-se tais valores se mantido nas suas renovações com exceção do prémio de função, que a partir da segunda renovação (01/01/2016) passou a ser de 150,00 €/mês.”; - “O Autor sempre esteve afeto, em exclusivo, ao transporte “interno” da Ré, nos termos referidos no facto 5.”; - “O Autor conduz viaturas com tonelagem superior a 7,5 t”. - FACTOS NÃO PROVADOS: Não existem factos não provados que possam ter relevância para a decisão de mérito.». III – OS FACTOS E O DIREITO É pelas conclusões do recurso que se delimita o seu âmbito de cognição, nos termos do disposto nos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 679.º, 639.º e 635.º, n.º 4, todos do Novo Código de Processo Civil, salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608.º n.º 2 do NCPC). * A – REGIME ADJECTIVO E SUBSTANTIVO APLICÁVEIS Importa, antes de mais, definir o regime processual aplicável aos autos dos quais depende o presente recurso de revista, atendendo à circunstância da instância da ação declarativa com processo comum laboral ter sido intentada no dia 8/4/2022, com a apresentação, pelo Autor da sua Petição Inicial, ou seja, muito depois das alterações introduzidas pela Lei n.º 107/2019, datada de 4/9/2019 e que começou a produzir efeitos em 9/10/2019. Tal ação, para efeitos de aplicação supletiva do regime adjetivo comum, foi instaurada depois da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, que ocorreu no dia 1/9/2013. Será, portanto e essencialmente, com os regimes legais decorrentes da atual redação do Código do Processo do Trabalho e do Novo Código de Processo Civil como pano de fundo adjetivo, que iremos apreciar as diversas questões suscitadas neste recurso de Revista. Também se irá considerar, em termos de custas devidas no processo, o Regulamento das Custas Processuais, que entrou em vigor no dia 20 de Abril de 2009 e se aplica a processos instaurados após essa data. Importa, finalmente, atentar na circunstância dos factos que se discutem no quadro destes autos recursórios terem ocorrido na vigência do Código de Trabalho de 2009, que, como se sabe, entrou em vigor em 17/02/2009, sendo, portanto, o regime dele decorrente que aqui irá ser chamado à colação em função da factualidade a considerar e consoante as normas que se revelarem necessárias à apreciação e julgamento do objeto do presente recurso de Revista, tudo sem prejuízo da Regulamentação Coletiva que é aplicável à relação laboral dos autos. B – OBJETO DA PRESENTE REVISTA Neste recurso de Revista está em causa decidir se o Autor tem direito a receber a retribuição específica prevista na Cláusula 61.ª dos CCTV entre ANTRAM e outra e a FECTRANS e outros, com publicação nos BTE, n.º 34 de 15.09.2018 e n.º 45 de 18.12.2019, respetivamente, ainda que sem perder de vista a Ata Interpretativa e a Nota Explicativa que acerca da aplicação dessa Cláusula constam, respetivamente, da primeira e segunda convenção coletiva antes identificadas. Não deixa, igualmente, de ser relevante relembrar que a presente revista resultou da admissão do recurso de revista excecional originalmente interposto pelo trabalhador, com base na alínea c) do número 1 do artigo 672.º do NCPC, tendo-se afirmado, a esse respeito, no Acórdão da formação prevista no número 3 dessa mesma disposição legal, o seguinte acerca da evidente contradição existente entre o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra [TRC] que aqui é o Aresto recorrido e o Acórdão-Fundamento que não só provém da mesma secção social do TRC, como, curiosamente, foi relatado pelo mesmo Juiz-Desembargador: «Ora, relativamente a esta última questão suscitada pelo Recorrente – direito à retribuição prevista na cl.ª 61.ª do CCTV de 2018 e na Cl.ª 61.ª do CCTV de 2019, publicado no BTE n.º 34 de 15 de setembro e no BTE n.º 45 de 8 de dezembro de 2019 respetivamente -, parece-nos, de facto, existir a contradição invocada pelo recorrente entre o Acórdão do TRC que aqui é objeto de recurso [2] e o Acórdão desse mesmo Tribunal da 2.ª instância identificado como Acórdão fundamento [3], contradição essa que resulta, desde logo, do teor dos respetivos Sumários elaborados pelo relator comum a ambos os Arestos [sublinhados a negrito da nossa responsabilidade]. O Juiz Desembargador que redigiu esses dois Acórdãos é o próprio a reconhecer no Aresto aqui recorrido uma mudança de interpretação do regime convencional constante do CCT de 2018 e respetiva Ata Interpretativa, quando afirma o seguinte: «Esta Relação teve já oportunidade de se pronunciar sobre esta questão no acórdão 176/22.6T8LRA.C1 de 28.04.2023, consultável em www.dgsi.pt/jtrc. Neste aresto, afirmou-se que no domínio do CCTV de 2018 seria de aceitar a interpretação segundo a qual, à semelhança do que acontecia no anterior CCTV (de 1980), a quantia prevista na sua Cl.ª 61.ª só seria devida aos motoristas de pesados quando estivesse demonstrado que o desempenho da condução fosse suscetível de apresentar uma maior penosidade e um esforço acrescido. No entanto, apelando à ata interpretativa de 09.01.2019 elaborada para o CCTV de 2018, segundo a qual “a presente cláusula (61.ª), apesar de ter como epigrafe “Regime de trabalho para os trabalhadores deslocados”, não é por esta que resulta o seu âmbito de aplicação; efetivamente tal é fixado pelo disposto no seu n.º 1. A opção por esta redação, no que à epígrafe diz respeito, visou apenas tornar mais claro que esta cláusula visa substituir a anterior cláusula 74/7 do anterior CCTV – embora com algumas alterações - adotando-se por isso parte da epígrafe desta última. Assim, todo e qualquer trabalhador com a categoria de motorista de pesados e ligeiros – com exceção dos motoristas ligeiros afetos ao transporte nacional -, têm direito a receber estas prestações pecuniárias, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estão afetos. Em suma para a aplicação desta cláusula é indiferente se a distância percorrida pelo veículo que o trabalhador está afeto, é de 2km, 10 km, 20 km ou mais”, entendeu-se e decidiu-se que para o trabalhador motorista ter direito à prestação pecuniária prevista nesta cláusula não era necessário demonstrar que o desempenho da condução fosse suscetível de apresentar uma maior penosidade e um esforço acrescido. Após melhor reflexão sobre a questão que se controverte, propendemos agora para que, da ata interpretativa, não resulta a conclusão a que havíamos chegado no citado aresto. Com efeito, embora a questão não seja totalmente isenta de dúvidas, se esta cláusula 61ª se destinou a substituir a cláusula a 74.º n.º 7 do CCTV de 1980 (e nisto todos estão de acordo), para que o trabalhador tenha direito a receber a quantia nela prevista, necessário se torna que se encontram reunidos os requisitos exigidos para que, em face da Cl.ª 74.º n.º 7, fosse atribuído tal direito ao trabalhador motorista. Ou seja: exige-se a prova por parte do trabalhador (o respetivo ónus sobre ele recai) dos factos donde se possa extrair que o desempenho da sua atividade como motoristas apresenta uma maior penosidade, um esforço acrescido e um maior isolamento. E, ponderando melhor sobre a ata interpretativa, não vemos agora que da mesma resulte a interpretação de que a atribuição da prestação prevista na Cl.ª 61.ª do CCTV de 2018 prescinda da demonstração da maior penosidade no desempenho das funções por parte do motorista. Na ata interpretativa afirma-se expressamente que visa substituir a anterior cláusula 74/7 do anterior CCTV esclarecendo-se que todo e qualquer trabalhador com a categoria de motorista de pesados e ligeiros – com exceção dos motoristas ligeiros afetos ao transporte nacional -, têm direito a receber estas prestações pecuniárias, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estão afetos. Apenas se pretende esclarecer quais as categorias de trabalhadores abrangidos pela cláusula e não afastar a verificação do requisitos da penosidade, esforço acrescido e maior isolamento. Também é esta a melhor interpretação tendo em conta a uniformidade do sistema jurídico e o teor da mesma cláusula do CCTV de 2019 Nesta, evitando quaisquer dúvidas de interpretação, alude-se expressamente à situação da prestação de uma atividade que implique regularmente um elevado grau de autonomia e a possível realização de trabalho suplementar de difícil controlo e verificação pela empresa, decorrente da imprevisibilidade da duração concreta dos serviços a serem realizados encontrando-se deslocados das instalações dos empregadores e sem controlo hierárquico direto; ou seja, consignaram-se os motivos que a jurisprudência havia considerado como sendo necessários verificarem-se para que que fosse atribuída a quantia da anterior cl.ª 74.º n.º 7 do antigo CCTV de 1980. Com a redação dada à Cl.ª 61.ª do CCT de 2019 houve, no entendimento que agora perfilhamos, uma clara intenção das partes outorgantes em precisar o que havia sido estipulado na mesma Cl.ª do CCT de 2018 no sentido de a retribuição especial ser devida para compensar os trabalhadores motoristas de pesados da maior penosidade e esforço acrescido inerentes à sua atividade, partindo do pressuposto que essa atividade impõe, normalmente, a prestação de trabalho suplementar de difícil controlo.» Importará fazer uma correção quanto ao resultado que o recorrente entende que irá obter no quadro desta revista – a prolação de um Acórdão Uniformizador de Jurisprudência -, quando não é essa a decisão coletiva que irá ser aqui proferida, dado este recurso não se confundir nem ser suscetível de se reconduzir a um recurso extraordinário de Uniformização de Jurisprudência nem o Autor nem a Ré terem requerido oportunamente a ampliação do presente recurso de revista ou tal alargamento do objeto recursório ter sido suscitado como necessário ou conveniente por todos ou por qualquer um dos membros do coletivo de juízes-conselheiros que o julgam. Recorde-se, finalmente, aqui que este Supremo Tribunal de Justiça [STJ] já teve oportunidade de apreciar esta mesma problemática no quadro do acórdão proferido em 03/07/2024, pelo coletivo formado pelos Juízes-Conselheiros Domingos José de Morais [relator], Mário Belo Morgado e Ramalho Pinto, no recurso de revista interposto no âmbito do processo n.º 1354/22.3T8LRA.C1.S1, com o seguinte Sumário: «Os motoristas afectos ao transporte nacional rodoviário, conduzindo veículos pesados com mais de 7,5 toneladas, tem direito a receber as prestações pecuniárias previstas e reguladas nos termos das Cláusulas 61.ª dos Contratos Colectivos de Trabalho Verticais, publicados nos BTE n.º 34 de 15.09.2018 e BTE n.º 45 de 18.12.2019.» [4] C – REGULAMENTAÇÃO COLETIVA APLICÁVEL Seguindo de perto o Parecer elaborado pelo ilustre Procurador-Geral Adjunto colocado junto deste STJ, façamos o périplo necessário pela regulamentação coletiva de trabalho aplicável à relação laboral dos autos e à matéria específica que aqui nos ocupa: «Começamos por revisitar o clausulado que se encontra em causa. Dispõe a Cláusula 74.ª do CCTV de 1982: «(Regime de trabalho para os trabalhadores deslocados no estrangeiro) 1 - Para que os trabalhadores possam trabalhar nos transportes internacionais rodoviários de mercadorias deverá existir um acordo mútuo para o efeito. No caso de o trabalhador aceitar, a empresa tem de respeitar o estipulado nos números seguintes. 2 - […] 7 - Os trabalhadores têm direito a uma retribuição mensal, que não será inferior à remuneração correspondente a duas horas trabalho extraordinário por dia. 8 - A estes trabalhadores, de acordo com o estabelecido no número anterior, não lhes é aplicável o disposto nas cláusulas 39.ª (Retribuição de trabalho nocturno) e 40.ª (Retribuição de trabalho extraordinário). …». Já a Cláusula 61.ª do CCTV de 2018, estabelece: «(Regime de trabalho para os trabalhadores deslocados) 1 - Os trabalhadores móveis afetos ao transporte internacional, ibérico e nacional, excecionando-se destes últimos os trabalhadores móveis que conduzem veículos com menos de 7,5 toneladas, terão obrigatoriamente o direito a receber o correspondente a duas horas de trabalho suplementar, retirado o montante referido no número três. 2 – […] 3 - Ao valor apurado nos termos do número anterior, será retirado o valor correspondente ao subsídio de trabalho noturno, calculado nos termos do número 2 da cláusula 48.ª do CCTV. 4 - Estes trabalhadores, de acordo com o estabelecido nos números anteriores, não lhes é aplicável o disposto na cláusula 49.ª (Retribuição do trabalho suplementar em dia útil). 5 - O pagamento desta prestação pecuniária substitui o número 7 da cláusula 74.ª do anterior CCTV e, bem assim, todas e quaisquer formas de pagamento do trabalho suplementar que tenham sido criadas, unilateralmente pelas empresas ou estabelecidas por acordo entre estas e os trabalhadores, mesmo que o valor desta prestação seja inferior ao anteriormente praticado.». A ata interpretativa desta cláusula, datada de 09.01.2019, esclarece: «13. Esta Ata interpretativa teve o objectivo de uniformizar o entendimento da aplicação de algumas cláusulas do CCTV durante o processo negocial de revisão global. No ponto 13) Cláusula 61.ª, n.ºs 1 e 3 (Regime de trabalho para os trabalhadores deslocados) refere: “A presente cláusula, apesar de ter como epígrafe “Regime de trabalho para os trabalhadores deslocados”, não é por esta que resulta o seu âmbito de aplicação; efectivamente tal é fixado pelo disposto no seu n.º 1. A opção por esta redacção, no que à epígrafe diz respeito, visou apenas tornar mais claro que esta cláusula visa substituir a anterior cláusula 74/7 do anterior CCTV – embora com algumas alterações - adotando-se por isso parte da epígrafe desta última. Assim, todo e qualquer trabalhador com a categoria de motorista de pesados e ligeiros – com excepção dos motoristas ligeiros afectos ao transporte nacional -, têm direito a receber estas prestações pecuniárias, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estão afectos. Em suma para a aplicação desta cláusula é indiferente se a distância percorrida pelo veículo que o trabalhador está afecto, é de 2 km, 10 km, 20 km ou mais.» A Cláusula 61.ª do CCTV de 2019 estipula: «(Retribuição do regime específico de trabalho dos motoristas) 1 - Os trabalhadores que, por acordo com a empresa, desempenhem a função de motorista afeto ao transporte internacional, ibérico ou nacional, excecionando-se destes últimos os motoristas que conduzem veículos com menos de 7,5 toneladas, por prestarem uma actividade que implica regularmente um elevado grau de autonomia e a possível realização de trabalho extraordinário de difícil controlo e verificação pela empresa, decorrente da imprevisibilidade da duração concreta dos serviços a serem realizados e encontrando-se deslocados das instalações dos empregadores e sem controlo hierárquico directo, terão obrigatoriamente o direito a receber, em contrapartida de tal regime, uma retribuição especifica no montante correspondente a 48 % do valor total resultante da soma da retribuição base (cláusula 44.ª), diuturnidades (cláusula 46.ª) e complemento salarial (cláusula 59.ª), não lhes sendo devido qualquer outro valor a título de trabalho suplementar em dia normal de trabalho. …». Esta Cláusula tem a seguinte nota explicativa: «Nota explicativa: Para efeitos do acordo mencionado no número 1 desta cláusula, estão incluídos todos os contratos de trabalho para a função de motorista, celebrados antes deste contrato colectivo de trabalho. Mais se esclarece que esta retribuição específica substituí a anterior cláusula 61.ª do CCTV celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS e publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 34, de 15 de setembro de 2018 e primitiva cláusula 74.ª número 7 prevista no CCTV celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS (anterior FESTRU) e publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 9, de 8 de março de 1980 e demais alterações. A cláusula 21.ª reflecte a proibição, que vincula empregadores e trabalhadores, prevista no Decreto-Lei n.º 237/07, de 19 de junho, de ser prestado trabalho semanal para além dos limites nesta fixados. Apesar de não ser obrigatório, face ao concreto modo como o trabalho é prestado, esta figura poderá ser aplicada na relação mantida entre empresas e motoristas que, por acordo, estão afectos ao transporte nacional, conduzindo viaturas inferiores a 7.5 ton., sejam elas superiores ou não a 3,5 ton.». Por fim, dispõe a Cláusula 89.ª do CCTV de 2019: «(Manutenção de regalias anteriores e prevalência de normas) 1 - Da aplicação do presente CCTV não poderão resultar quaisquer prejuízos, designadamente baixa ou mudança de categoria ou classe, diminuição de retribuição e outras regalias de carácter regular ou permanentes, não contempladas neste CCTV e, bem assim, diminuição da retribuição líquida do trabalhador. …». É com base neste quadro jurídico de origem convencional que iremos averiguar se o Autor recorrido tem ou não direito à prestação que se acha prevista na Cláusula 61.ª cos CCT de 2018 e 2019. D – REGRAS DE INTERPRETAÇÃO DA REGULAMENTAÇÃO COLETIVA O Aresto deste Supremo Tribunal de Justiça antes identificado e proferido no dia 03/07/2024 refere o seguinte, acerca das regras de interpretação das cláusulas de natureza normativa [que são precisamente as que estão em questão na economia deste recurso de revista]: «8.1. - Como se pode ler no Acórdão do Pleno da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), de 06.07.2022, proc. n.º 4661/19.9T8LSB.L1.S1, in www.dgsi.pt, “Este Tribunal tem afirmado reiteradamente que as convenções coletivas, pelo menos no que toca à sua parte normativa, estão sujeitas, na sua interpretação, às mesmas regras que regem para a interpretação da lei. Assume, assim, particular importância o disposto no artigo 9.º do Código Civil. Por outro lado, a letra da convenção é de grande importância como ponto de partida da interpretação das cláusulas de uma convenção coletiva.”. Quatro exemplos, cujos sumários sintetizam tal afirmação: - Acórdão do STJ de 04.05.2011, proc. n.º 4319/07.1TTLSB.L1.S1: “1. Na interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções colectivas de trabalho regem as normas atinentes à interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstracção e serem susceptíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros. 2. Na fixação do sentido e alcance de uma norma, a par da apreensão literal do texto, intervêm elementos lógicos de ordem sistemática, histórica e teleológica.”. - Acórdão do STJ de 16.12.2020, Proc. n.º 9906/17.7T8LSB.L1.S1: “I. A interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho deve obedecer às regras próprias da interpretação da lei, atribuindo-se uma importância acrescida à letra da cláusula.” - Acórdão do STJ de 14.04.2021, proc. n.º 378/19.2T8PNF.P1.S1 “I. A interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho deve obedecer às regras próprias da interpretação da lei. II. O enunciado linguístico da norma é o ponto de partida da atividade interpretativa, cujo objetivo é procurar reconstituir o pensamento das partes outorgantes da convenção, tendo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada. III. Na atividade de interpretação devem ser considerados os limites do próprio texto, de forma a excluir entre os seus possíveis sentidos o pensamento que não tenha na sua letra um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.”. - Acórdão do STJ de 08.06.2021, proc. n.º 2276/20.8T8VCT.S1: “I - A letra da convenção é não apenas o ponto de partida da interpretação, mas o limite da mesma; II - Se uma interpretação proposta não tiver o mínimo de apoio no teor literal da cláusula torna-se desnecessário recorrer a outros elementos, já que o recurso aos mesmos não permite fazer vingar tal interpretação, carecendo a mesma do referido mínimo de apoio na letra da cláusula.”, todos publicados in www.dgsi.pt. […] 9. - O artigo 9.º do Código Civil estabelece: “1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada. 2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.” Interpretar a lei consiste em fixar, de entre os sentidos possíveis, o seu sentido e alcance decisivos. [cfr. MANUEL DE ANDRADE, «Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das leis», págs. 21 e 26]. Para alcançar tal desiderato, o ponto de partida consiste na sua interpretação literal, isto é, na apreensão do sentido gramatical ou textual da lei (“letra da lei”). Este elemento tem, desde logo, uma função negativa: eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio ou, pelo menos, qualquer correspondência ou ressonância nas palavras da lei. O elemento gramatical ou textual tem sempre de ser utilizado em conjunto com o elemento lógico (que por sua vez se subdivide em três: o elemento racional ou teleológico, o elemento sistemático e o elemento histórico). Não pode haver uma interpretação gramatical e outra lógica. O elemento sistemático (“a unidade do sistema jurídico”) compreende a consideração das outras disposições legais que formam o quadro legislativo em que se insere a norma em causa, bem como as disposições que regulam situações paralelas. O elemento racional ou teleológico (“o pensamento legislativo”), consiste na “ratio legis”, no fim prosseguido pelo legislador ao elaborar a norma, a sua razão de ser. Por último, o elemento histórico (“as circunstâncias em que a lei foi elaborada”) compreende o contexto em que foi elaborada, a evolução histórica do preceito, as suas fontes. [cfr. BAPTISTA MACHADO, «Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador», 12.ª reimpressão, págs. 175 e ss.]. É neste contexto normativo-jurídico que se impõe a apreciação do objecto do recurso.» E – INTERPRETAÇÃO DAS CLÁUSULAS CONVENCIONAIS APLICÁVEIS AO LÍTÍGIO DOS AUTOS Esse mesmo Aresto deste Supremo Tribunal de Justiça, entrando já e propriamente no objeto do recurso de revista aí em julgamento, faz a seguinte abordagem ao regime jurídico de natureza convencional que resultava da anterior Cláusula 74.ª do CCT de 1980 [por demais conhecida pelos tribunais de trabalho nacionais] e das cláusulas que, nos CCT de 2018 e 2019, lhe sucederam, socorrendo-se, para o efeito, do Parecer aí emitido pelo Ministério Público: «8.2. - Era também jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça no acórdão n.º 7/2010, de 09 de julho, processo n.º 3976/06.0TTLSB.L1.S1, publicado no Diário da República n.º 132/2010, Série I, de 07.09.2010, de que «A retribuição mensal prevista no n.º 7 da cláusula 74.ª do contrato colectivo de trabalho celebrado entre a ANTRAM - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE TRANSPORTES PÚBLICOS RODOVIÁRIOS DE MERCADORIAS e FESTRU - FEDERAÇÃO DOS SINDICATOS DE TRANSPORTES RODOVIÁRIOS URBANOS, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 9, de 8 de Março 1980, e no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 16, de 29 de Abril de 1982, tendo como base mínima de cálculo o valor equivalente a duas horas extraordinárias, é devida em relação a todos os dias do mês do calendário.». É mencionado no referido Acórdão de Fixação de Jurisprudência do STJ que “A especial característica de retribuição mensal, supra-assinalada [leia-se: a retribuição especial prevista na cláusula 74.ª, n.º 7, do CCTV de 1982], de compensação de uma acordada disponibilidade, tornando-a alheia à efectiva prestação de trabalho extraordinário, não tem qualquer ligação com o período normal de trabalho, que compreende os dias úteis do mês; por outro lado, diversamente da remuneração por trabalho extraordinário, é uma atribuição patrimonial regular que radica na possibilidade do exercício da actividade em particulares condições de penosidade e risco, e não em situações excepcionais referidas ao tempo normal de trabalho.”. E do teor do Acórdão pode resumir-se: a retribuição especial prevista na cláusula 74.ª, n.º 7, do CCTV de 1982, tinha por objetivo compensar os motoristas de transportes internacionais rodoviários de mercadorias pela maior “penosidade, esforço e risco acarretados pela possibilidade de desempenho de funções no estrangeiro, atribuída pela consideração de uma actividade que possa conduzir a tal desempenho, implicando uma prestação de trabalho extraordinário de difícil controlo, não dependendo, pois, a dita retribuição de uma efectiva prestação deste tipo de trabalho”. 10. - O Ex.mo Sr. Procurador-Geral Adjunto escreveu no seu Parecer [5]: “Ora, é inegável que a Cláusula 61.ª do CCTV de 2018 e a Cláusula 61.ª do CCTV 2019 substituíram a Cláusula 74.ª do CCTV de 1982, sendo certo que esta apenas se aplicava aos motoristas que se encontravam deslocados no estrangeiro, ou seja, aos motoristas dos transportes internacionais rodoviários de mercadorias. (…). Acontece que do texto da Cláusula 61.ª dos CCTV de 2018 extrai-se, desde logo, que, apesar da sua epígrafe referir que é um «regime de trabalho para os trabalhadores deslocados», o regime aí previsto abrange os motoristas afetos ao transporte internacional, ibérico e nacional, ficando apenas excluídos do mesmo os que conduzem veículos com menos de 7,5 toneladas. Tal conclusão é confirmada pela ata interpretativa quando expressamente refere que o âmbito de aplicação desse regime não depende da deslocação, mas sim do pressuposto constante no n.º 1, sendo indiferente a distância que percorrem, dando o exemplo que pode ser de «2 km, 10 km, 20 km ou mais». Pelo que, apesar de aquelas Cláusulas substituírem a Cláusula 74.ª, n.º 7, do CCTV de 1982, constata-se que as alterações introduzidas são de relevo, particularmente no âmbito da sua abrangência. Por outro lado, a Cláusula 61.ª dos CCTV de 2019, embora com diferente redação, vem no fundo, e no que interessa, a confirmar a abrangência do regime previsto, aditando o esclarecimento, que faz parte do texto da própria Cláusula, que esse regime se deve ao facto de os trabalhadores abrangidos prestarem uma atividade que «implica regularmente um elevado grau de autonomia e a possível realização de trabalho extraordinário de difícil controlo e verificação pela empresa, decorrente da imprevisibilidade da duração concreta dos serviços a serem realizados e encontrando-se deslocados das instalações dos empregadores e sem controlo hierárquico directo». Veja-se, ainda, que na nota explicativa se admite que não sendo obrigatório, «face ao concreto modo como o trabalho é prestado», o regime pode ser aplicado aos motoristas em transporte nacional, que conduzam veículos inferiores a 7,5 toneladas. Pelo que, e com o devido respeito, não se nos afigura que se possa interpretar a Cláusula 61.ª do CCTV de 2018 de uma forma diferente da Cláusula 61.ª do CCTV de 2019, já que a ausência de uma ata explicativa idêntica à realizada em 09.01.2019, não tem qualquer relevo interpretativo. Não se coloca em causa que o objetivo daquelas cláusulas é a atribuição de uma compensação por trabalho suplementar regularmente efetuado e de difícil controlo, de alguma forma uma espécie de compensação por IHT. O regime em causa não terá sido propriamente pensado para a forma de prestação de trabalho que o recorrente mantém, mas o que é certo que as Cláusulas em causa não excluem a sua aplicação a situações deste género – veja-se que, de acordo com a ata interpretativa, se admite que possa existir trabalho suplementar não controlado se a distância percorrida pelo motorista for de 2 km. (…). Acontece é que da letra das cláusulas a interpretar não conseguimos encontrar qualquer elemento que permita a conclusão de que a atribuição daquela quantia pecuniária esteja dependente do facto do desempenho da atividade do motorista apresentar uma maior penosidade, um esforço acrescido e um maior isolamento. Pelo que uma interpretação nesse sentido não tem qualquer correspondência ou apoio na letra daquelas Cláusulas, e, como tal, não é admissível. Ou seja, o regime previsto nas Cláusula 61.ª do CCTV de 2018 e da Cláusula 61.ª do CCTV de 2019 é aplicável automaticamente aos motoristas afetos ao transporte internacional, ibérico e nacional, com exceção dos operam no serviço nacional e conduzem veículos com menos de 7,5 toneladas, conforme se extrai, particularmente, dos n.ºs 1 das referidas Cláusulas. Já será diferente a situação dos motoristas em serviço nacional com veículos com tonelagem inferior a 7,5 toneladas, já que não estando os mesmos abrangidos por aquele regime, só poderão gozar do mesmo «face ao concreto modo como o trabalho é prestado», de acordo com a nota explicativa da Cláusula 61.ª do CCTV de 2019. Em consequência, entendemos que o recorrente tem direito às prestações pecuniárias resultantes da Cláusula 61.ª do CCTV de 2018 e da Cláusula 61.ª do CCTV de 2019.”. F – LITÍGIO DOS AUTOS Chegados aqui e tendo como pano de fundo tal interpretação das Cláusulas 61.ª dos CCTV de 2018 e 2019, com a qual concordamos, por nos parecer a mais afeiçoada à letra e ao espírito do texto das mesmas, designadamente, quando confrontados com o teor da Ata Interpretativa [2018] e da Nota Explicativa [2019] também antes transcritos, há que cruzar tal leitura jurídica desse regime comnvencional com os factos pertinentes que foram dados como provados pelas instâncias, para chegar a conclusão idêntica à alcançada pelo mencionado Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 3/7/2024, assim como pelo Parecer emitido nestes autos pelo ilustre Procurador Geral-Adjunto colocado e que vão no sentido do Autor ter direito ao recebimento da prestação específica prevista nas aludidas cláusula 61.ª dos CCT de 2018 e 2019. Pode, de facto, ler-se, em tal Aresto, com perfeita aplicação «Em síntese: atentos os textos das Cláusulas 61.º, n.ºs 1, dos CCTVs, BTE n.° 34 de 15.09.2018 e BTE n.° 45 de 18.12.2019, os motoristas de transporte nacional rodoviário, excepto “os que conduzem veículos com menos de 7,5 toneladas” e “os motoristas ligeiros afectos ao transporte nacional”, têm direito a receber as referidas prestações pecuniárias - “duas horas de trabalho suplementar” e “retribuição específica” -, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos a cuja condução estão afectos. E no final da Nota explicativa da Cláusula 61.ª, n.º 1, do CCTV, BTE n.º 45 de 18.12.2019, ainda se pode ler: «Apesar de não ser obrigatório, face ao concreto modo como o trabalho é prestado, esta figura poderá ser aplicada na relação mantida entre empresas e motoristas que, por acordo, estão afectos ao transporte nacional, conduzindo viaturas inferiores a 7.5 ton., sejam elas superiores ou não a 3,5 ton.». 12. - No caso dos autos, estando provado - ponto 4) dos factos provados - que o Autor conduz “veículos pesados de mercadorias até 44 toneladas”, não só não estava abrangido pela única excepção expressa nas Cláusulas 61.ª, n.ºs 1 dos CCTV de 2018 e de 2019, como é indiferente a distância percorrida no exercício das suas funções de motorista nacional rodoviário, como decorre, literalmente, da parte final da mencionada Acta interpretativa de 19.01.2019: “Assim, todo e qualquer trabalhador com a categoria de motorista de pesados e ligeiros – com excepção dos motoristas ligeiros afectos ao transporte nacional -, têm direito a receber estas prestações pecuniárias, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estão afectos. Em suma para a aplicação desta cláusula é indiferente se a distância percorrida pelo veículo que o trabalhador está afecto, é de 2km, 10 km, 20 km ou mais.”. (negrito nosso). Em conclusão: o Autor tem direito às prestações pecuniárias previstas e reguladas nos termos das Cláusulas 61.ª dos CCTVs, publicados nos BTE n.º 34 de 15.09.2018 e BTE n.º 45 de 18.12.2019, a calcular em incidente de liquidação.» Ora, se tivermos em atenção que ficou [também] demonstrado neste autos que o Autor, desde 1/7/2015 e enquanto motorista ao serviço da Ré, conduz viaturas com tonelagem superior a 7,5 t, em regime de turnos rotativos, em funções que nunca se traduziram no transporte ibérico e internacional ou fora do concelho da ..., mas antes no denominado transporte “interno” de garrafas de vidro dentro da área de tal concelho, em distâncias de cerca de 5 km [ida e volta], podemos igualmente concluir que não existe nenhum obstáculo jurídico que ressalte do regime convencional aqui em apreço, pois nenhum das exceções consagradas nas duas cláusulas 61.ª dos CCT de 2018 e 2109 ocorrem aqui, a saber: estarmos face a um motorista de transporte rodoviário nacional que conduza veículos ligeiros ou veículos pesados com menos de 7 toneladas e meia. Interessa também realçar que para a questão em apreço, é irrelevante o número de quilómetros diariamente percorridos pelo Autor ou até o tipo de condução a ele exigido ou por ele desenvolvido, pois a aplicação do dito regime convencional não depende de uma maior penosidade, um esforço acrescido e/ou um maior isolamento de tal atividade de motorista. Logo, pelos fundamentos expostos, tem o recurso do Autor de ser julgado procedente e, nessa medida, de o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de ser revogado nesta parte, com a inerente condenação da Ré a pagar ao recorrente as prestações previstas nas cláusulas 61.ª dos CCT de 2018 e 2019. Importa, contudo e ainda nesta matéria, ter em conta o que a Recorrida requer na sua 21.ª Conclusão do presente recurso (“21. Caso o presente recurso de revista proceda, sendo a Recorrida condenada no pagamento da Cláusula 61.ª, é manifesto que o Recorrente não pode conservar o que recebeu a título de trabalho suplementar, trabalho prestado em dia feriado, subsídio de turno e prémio de função”), como, aliás, já reclamava cautelar e subsidiariamente no âmbito da sua contestação. Tal matéria da compensação com esses créditos laborais já liquidados ao trabalhador não foi apreciada pelo Tribunal da Relação de Coimbra, face à decisão pelo mesmo tomada e que agora foi revogada, nessa parte, por este Supremo Tribunal de Justiça, que, contudo, não se pode substituir às instâncias no que respeita a tal julgamento. Logo, têm os presentes autos de baixar ao Tribunal da Relação de Coimbra com vista à análise e decisão dessas questões [tribunal esse que, por sua vez e se assim o entender necessário, poderá remeter a ação para esse mesmo efeito ao tribunal da 1.ª instância]. As instâncias deverão, naturalmente e caso se justifique, concatenar a decisão sobre esses créditos laborais e a respetiva compensação com o direito ao recebimento das prestações previstas nas cláusulas 61.ª dos CCT de 2018 e 2019 e que foi reconhecido ao Autor por este STJ, mediante a quantificação dos montantes referentes a cada um deles, nos termos do artigo 75.º do Código de Processo do Trabalho ou, se tal não se revelar possível, relegar tal quantificação para futuro incidente de liquidação [artigos 609.º, número 2 e 358.º e seguintes do NCPC]. IV – DECISÃO Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.º, número 1, do Código do Processo do Trabalho e 671.º, 679.º e 663.º do Novo Código de Processo Civil, acorda-se, neste Supremo Tribunal de Justiça, em julgar procedente o presente recurso de Revista interposto pelo Autor AA, com a inerente revogação do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra nessa parte e a subsequente condenação da Ré a pagar ao recorrente as prestações previstas nas cláusulas 61.ª dos CCT de 2018 e 2019 e por ele reclamadas. Não tendo a matéria da compensação dos créditos laborais que foi suscitada pela Ré na sua contestação e também nas suas contra-alegações de recurso sido ainda apreciada nos autos, baixem os mesmos ao Tribunal da Relação de Coimbra, nos moldes e para os fins antes expostos em sede de fundamentação. Custas da ação a fixar a final e da presente revista a cargo da recorrida - artigo 527.º, número 1 do Novo Código de Processo Civil. Registe e notifique. Lisboa 26 de Fevereiro de 2025 José Eduardo Sapateiro [Juiz-Conselheiro Relator] Domingos José de Morais [Juiz-Conselheiro Adjunto] Paula Leal de Carvalho [Juíza-Conselheira Adjunta] SUMÁRIO [6] ___________________________________________ 1. Embora nada seja referido no dispositivo, o Tribunal da Relação aditou os seguintes factos ao elenco de factos provados: - “ No contrato de trabalho inicial (01/07/2015) consta que a Ré se obrigou a pagar ao Autor a retribuição base no valor de 715,13 €/mês, prémio de função no valor de 100,00 €/mês e subsídio noturno no valor de 150,00 €/mês, tendo-se tais valores se mantido nas suas renovações com exceção do prémio de função, que a partir da segunda renovação (01/01/2016) passou a ser de 150,00 €/mês.”; - “O Autor sempre esteve afeto, em exclusivo, ao transporte “interno” da Ré, nos termos referidos no facto 15.”; - “O Autor conduz viaturas com tonelagem superior a 7,5t”.↩︎ 2. «E que possui o seguinte Sumário: «1. […] 2. O complemento salarial previsto na Cl.ª 59.ª do Contrato Coletivo de Trabalho Vertical celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS, publicado no BTE n.º 45 de 08.12.2019,e com Portaria de Extensão no BTE n.º 49/2020, de 26.02, não entra no cômputo do montante do salário base devido aos motorista abrangidos por aquele CCTV. 3. A retribuição especial prevista na cláusula 74.ª, n.º 7 do CCT entre celebrado entre a ANTRAM e a FESTRU, publicado no BTE, 1.ª série, n.º 9, de 08-03-80, tinha por objetivo compensar os trabalhadores motoristas de transportes internacionais rodoviários de mercadorias da maior penosidade e esforço acrescido inerentes à sua atividade, tendo sido atribuída pela consideração de que essa atividade impõe, normalmente, a prestação de trabalho suplementar de difícil controlo. 4. Tal retribuição não pressuponha uma efetiva prestação de trabalho suplementar, revestia carácter regular e permanente e, como tal, integrava o conceito de retribuição, sendo devida em relação a todos os dias do mês, independentemente da prestação efetiva de qualquer trabalho, acrescendo à retribuição de base. 5. As cláusulas 61.ª dos CCT celebrados entre a ANTRAM e a FECTRANS publicados nos BTES n.º 34 de 15.09.20 e n.º 45 de 18.12.2019 visaram substituir a cláusula 74.ª, n.º 7 do CCTV de 1980. 6. Para que o motorista tenha direito a auferir a quantia prevista nas cláusulas 61.ª do CCTs de 2018 e de 2019, exige-se que prove estar a prestar uma atividade de transporte que implique regularmente um elevado grau de autonomia e a possível realização de trabalho suplementar de difícil controlo e verificação pela empresa, decorrente da imprevisibilidade da duração concreta dos serviços a serem realizados e encontrando-se deslocados das instalações dos empregadores e sem controlo hierárquico direto.» - NOTA DE RODAPÉ DA TRANSCRITA FUNDAMENTAÇÃO DO ARESTO DA FORMAÇÃO, COM O NÚMERO [3].↩︎ 3. «O Sumário de tal Acórdão-Fundamento é o seguinte: «1. […] 3. A retribuição especial prevista na cláusula 74.ª, n.º 7 do CCT entre celebrado entre a ANTRAM e a FESTRU, publicado no BTE, 1.ª série, n.º 9, de 08-03-80, tinha por objetivo compensar os trabalhadores motoristas de transportes internacionais rodoviários de mercadorias da maior penosidade e esforço acrescido inerentes à sua atividade, tendo sido atribuída pela consideração de que essa atividade impõe, normalmente, a prestação de trabalho suplementar de difícil controlo. 4. Tal retribuição não pressuponha uma efetiva prestação de trabalho suplementar, revestia carácter regular e permanente e, como tal, integrava o conceito de retribuição, sendo devida em relação a todos os dias do mês, independentemente da prestação efetiva de qualquer trabalho, acrescendo à retribuição de base 5 As cláusulas 61.ª dos CCT celebrados entre a ANTRAM e a FECTRANS publicados nos BTES n.º 34 de 15.09.20 e n.º 45 de 18.12.2019 visaram substituir a cláusula 74.ª, n.º 7 do CCTV de 1980. 6. Considerando a redação da cláusula 61.ª do CCT de 2018 e o teor da ata interpretativa subscrita pelos outorgantes desse CCT, um motorista de pesados tem direito à quantia prevista na referida cláusula independentemente da demonstração do motorista se encontrar a prestar uma atividade que implica regularmente um elevado grau de autonomia e a possível realização de trabalho extraordinário de difícil controlo e verificação pela empresa, decorrente da imprevisibilidade da duração concreta dos serviços a serem realizados e encontrando-se deslocados das instalações dos empregadores e sem controlo hierárquico direto. 7. Esta demonstração já terá de ser feita com base na aplicação da cláusula 61.ª do CCT de 2019 para que o motorista tenha direito a receber a quantia pecuniária nela prevista. 8. Contudo, encontrando-se um trabalhador motorista abrangido pelos dois CCTs (de 2018 e 2019) da aplicação do CCT de 2019 não poderá resultar quaisquer prejuízos, designadamente diminuição de retribuição e outras regalias de carácter regular ou permanentes, não contempladas nesse CCTV e, bem assim, diminuição da retribuição líquida do trabalhador.» - NOTA DE RODAPÉ DA TRANSCRITA FUNDAMENTAÇÃO DO ARESTO DA FORMAÇÃO, COM O NÚMERO [4].↩︎ 4. Publicado em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e3a0a605c7f4aea780258b5000337c13?OpenDocument.↩︎ 5. O Parecer elaborado no âmbito deste recurso de Revista segue muito de perto, conforme o próprio afirma [«Vamos, assim, seguir o parecer que emitimos no recurso de revista excecional apreciado nesses autos»], tal Parecer parcialmente reproduzido na fundamentação do Aresto deste STJ acima reproduzida, sendo o autor de ambos o mesmo Exmo. Procurador-Geral Adjunto que se acgha colocado junto deste Supremo Tribunal de Justiça.↩︎ 6. Idêntico, quer em termos de descritores, como de texto, aos constantes do Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 3/7/2024, prolatado no âmbito do Processo n.º 1354/22.3T8LRA.C1.S1, publicado em www.dgsi.pt.↩︎ |