Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00002627
Parecer: P000362005
Nº do Documento: PPA28042005003600
Descritores: REDE NACIONAL DE EMERGÊNCIA E SEGURANÇA
SISTEMA INTEGRADO DAS REDES DE EMERGÊNCIA E SEGURANÇA DE PORTUGAL (SIRESP)
PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA
INTERESSE PÚBLICO
CONTRATO ADMINISTRATIVO
AQUISIÇÃO DE BENS E SERVIÇOS
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
PRINCÍPIO DA JURIDICIDADE
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
PRINCÍPIO DA AUTOVINCULAÇÃO
PRINCÍPIO DA JUSTIÇA
PRINCÍPIO DA IMPARCIALIDADE
IMPEDIMENTO
ESCUSA
SUSPEIÇÃO
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA
PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE
PRINCÍPIO DA CONCORRÊNCIA
PRINCÍPIO DA ESTABILIDADE DO CONCURSO
PRINCÍPIO DA IMUTABILIDADE DAS PROPOSTAS
ESCOLHA DO CO-CONTRATANTE
MATÉRIA DE FACTO
ACTO ADMINISTRATIVO
INVALIDADE
NULIDADE
ANULABILIDADE
FALTA DE LEGITIMAÇÃO
GOVERNO DEMISSIONÁRIO
GOVERNO DE GESTÃO
COMPETÊNCIA
LIMITAÇÃO
ESTRITA NECESSIDADE
ACTO URGENTE
ACTO DISCRICIONÁRIO
FUNDAMENTAÇÃO
ACTO DE ALTA ADMINISTRAÇÃO
PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DO ESTADO
PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO
Livro: 00
Numero Oficio: 1749
Data Oficio: 03/30/2005
Pedido: 04/01/2005
Data de Distribuição: 04/01/2005
Relator: ESTEVES REMÉDIO
Sessões: R1
Data da Votação: 04/28/2005
Tipo de Votação: MAIORIA COM 5 VOT VENC
Sigla do Departamento 1: MAI
Entidades do Departamento 1: MIN DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 05/04/2005
Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: 25-05-2005
Nº do Jornal Oficial: 101
Nº da Página do Jornal Oficial: 8072
Indicação 2: ASSESSOR:SUSANA PIRES
Área Temática:DIR ADM*ADM PUBL/DIR CONST
Ref. Pareceres:P002131978Parecer: P002131978
P001271990Parecer: P001271990
P000351993Parecer: P000351993
P000111994Parecer: P000111994
P000671995Parecer: P000671995
P000721995Parecer: P000721995
P000081996Parecer: P000081996
P001342001Parecer: P001342001
P001372001Parecer: P001372001
P000032002Parecer: P000032002
P000432002Parecer: P000432002
P000622002Parecer: P000622002
P000702002Parecer: P000702002
P001522002Parecer: P001522002
P001082003Parecer: P001082003
P001152003Parecer: P001152003
P000262004Parecer: P000262004
P000812004Parecer: P000812004
P000092005Parecer: P000092005
Legislação:RCM 88/89 DE 12/08; RCM 26/2002 DE 05/02; RCM 56/2003 DE 08/04; DL 197/99 ART7 A ART15 ART77 N1 I) N2 ART78 N1 C) N4 DE 08/06; DL 86/2003 ART1 A ART7 ART8 A ART11 ART12 A ART14 DE 26/04; DN 35/2003 DE 25/07; DESP CONJ 606/2003 DE 30/04; DESP CONJ 734/2003 DE 09/07; DESP CONJ 758/2003 DE 11/08; DESP CONJ 219/2005 DE 09/03; DESP 6453 DE 29/03/2005; ; CPADM91 ART1 N1 ART3 N1 ART5 N1 N2 ART6 ART44 A ART51 ART133 A ART 136 ART137 N2 ART141 ART178 N1 ART182 ART183 ART185 N1;CONST76 ART186 ART266; DL 59/99 DE 02/03; L 64/93 ART8 ART9 ART9-A ART14 DE 26/08; L 28/95 DE 18/08; L 12/96 DE 18/04; L 42/96 DE 31/08; L 12/98 DE 24/02; L 91/2001 ART16 N2 DE 20/08; L 48/2004 DE 24/08; L 98/97 ART5 N1 C) ART46 N1 B) DE 26/08; DPR 100-A/2004 DE 13/12; DPR 18/2005 DE 12/03; DPR 19/2005 DE 12/03;
Direito Comunitário:
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:AC STA DE 03/04/2002 PROC 0416/2004
AC TC 56/1984
AC TC 65/2002 DE 08/02
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Conclusões: 1.ª – Sem prejuízo da sua adequação técnica e da verificação dos respectivos pressupostos económico-financeiros, a parceria público-privada, organizada, ao abrigo do n.º 15 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 56/2003, de 8 de Abril, para constituir instrumento contratual para a aquisição, instalação e manutenção do Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP), e cujas condições de lançamento foram aprovadas pelo Despacho Conjunto n.º 734/2003, de 9 de Julho de 2003, da Ministra de Estado e das Finanças e do Ministro da Administração Interna, tem em consideração os pressupostos e requisitos de carácter estritamente jurídico estabelecidos nos artigos 6.º, n.º 1, e 7.º do Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril, que define o regime jurídico das parcerias público-privadas;
2.ª – Em face dos dados disponíveis, afigura-se que o procedimento relativo à concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do SIRESP, não revela, até ao acto de adjudicação, a existência de vícios geradores de invalidade dos actos aí praticados susceptíveis de serem ainda tempestivamente impugnados;
3.ª – Designadamente, ao Conselho Consultivo – que não tem competência para investigar matéria de facto – não foram facultados elementos de facto que permitam ponderar a existência de actuações violadoras do princípio da imparcialidade da Administração;
4.ª – De acordo com o preceituado no n.º 5 do artigo 186.º da Constituição, o Governo em funções após a sua demissão fica sujeito a um regime jurídico especial, caracterizado por uma substancial limitação da sua capacidade, resultante da demissão e do consequente défice de legitimação, apenas podendo praticar validamente os actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos;
5.ª – A estrita necessidade a que se refere o n.º 5 do artigo 186.º da Constituição corresponde a uma urgência concreta e datada, traduzida na premência de praticar um certo acto, cujo adiamento comprometeria gravemente a realização do interesse público;
6.ª – Em face do respectivo procedimento de contratação, o acto de adjudicação do contrato para a aquisição, instalação e manutenção do Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP), concretizado pelo Despacho Conjunto n.º 219/2005, de 23 de Fevereiro, não reveste a natureza de acto estritamente necessário para assegurar a gestão dos negócios públicos;
7.ª – Assim sendo, o Despacho Conjunto n.º 219/2005, de 23 de Fevereiro, do Ministro das Finanças e da Administração Pública e do Ministro da Administração Interna, membros de um Governo de gestão, em funções a pós a sua demissão, operada pelo Decreto do Presidente da República n.º 100-A/2004, de 13 de Dezembro, enferma de nulidade, por violação do n.º 5 do artigo 186.º da Constituição.

Texto Integral:


Senhor Ministro de Estado e da Administração Interna ,
Excelência:

I

No âmbito do processo de adjudicação do Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP), e com vista à sua apreciação jurídica, dignou-se Vossa Excelência solicitar a emissão de parecer, com carácter de urgência, do Conselho Consultivo ([1]).

No Despacho ([2]) em que solicita a intervenção deste corpo consultivo, consignou Vossa Excelência que aquele processo «tem suscitado diversas questões de natureza jurídica, técnica e financeira, algumas das quais têm tido expressão pública através dos órgãos de comunicação social», acrescentando o seguinte:

«Não obstante a relevância do Estado se dotar de um SIRES, importa, para defesa do interesse público e do prestígio e credibilidade das instituições, esclarecer cabalmente as questões suscitadas e que estão sintetizadas na informação que me é presente pelo Senhor Subsecretário de Estado da Administração Interna».

Lê-se ainda no mesmo Despacho:

«Em primeiro lugar, suscita-se uma questão prejudicial quanto à competência circunstancial do anterior Governo para proferir o Despacho Conjunto n.º 219/2005, de 23 de Fevereiro.
(...)
Em segundo lugar, importa confirmar a adequação financeira da solução proposta adjudicar, conforme suscita o Senhor Subsecretário de Estado na sua informação.
A estas questões acresce a adequação do relacionamento entre os utilizadores e o operador ser intermediado por uma “entidade gestora” sediada no MAI. Com efeito, não resulta demonstrado no processo que esteja prevista a dotação desta “entidade” dos meios financeiros necessários à satisfação dos encargos, nem está garantida a sua satisfação pelos utilizadores.
(...)
Em terceiro lugar, importa confirmar a adequação técnica da solução proposta, mas também aclarar as dúvidas suscitadas quanto à elaboração do próprio caderno de encargos, que, por mais de uma vez, tem sido referido como pré-condicionando a selecção de um e só um dos potenciais concorrentes.
(...)
Por fim, importa clarificar a apreciação jurídica deste processo, designadamente apurando se há razão determinante para a anulação do concurso e se tal é legalmente admissível.»

Quanto às questões financeiras emergentes deste processo, foi solicitado ao Senhor Ministro de Estado e das Finanças que ordenasse à Inspecção-Geral de Finanças a elaboração de parecer técnico sobre as mesmas.

Ao Senhor Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior foi solicitada a obtenção de «parecer técnico de entidade científica independente, qualificada no domínio das telecomunicações, sobre a adequação técnica da solução proposta, bem como da neutralidade do caderno de encargos face aos potenciais concorrentes ao concurso».

Com as condicionantes inerentes à urgência pretendida, cumpre emitir o parecer solicitado ([3]).

II

Para melhor percepção e delimitação do objecto da consulta, entende-se oportuno dar nota sucinta dos passos mais relevantes do procedimento em causa, tarefa a empreender com base na seguinte documentação enviada:

Programa de procedimento;
Caderno de encargos;
Relatório da Comissão de Avaliação no «Procedimento relativo à contratação da concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do SIRESP» (elaborado nos termos e para os efeitos do ponto 28 do Programa de Procedimento) ([4]), com os seguintes anexos:

«1 – Relatório da Comissão de Avaliação (elaborado em 17 de Novembro de 2003 nos termos e para os efeitos dos pontos 25.5. a 25.8. do Programa do Procedimento) e respectivos anexos [[5]].
2 – Actas das sessões de negociação [[6]].
3 – Avaliação técnica da Proposta reformulada.
4 – Síntese da evolução dos parâmetros económico-financeiros (apresentada à Comissão de Avaliação em 16 de Março de 2004).
5 – CD-ROM – Documentos finais (recebido na 5.ª sessão de negociação, efectuada em 26 de Janeiro de 2005) [[7]].
6 – Versão final da minuta do Contrato de Gestão [[8]].
7 – Apreciação económico-financeira do Caso Base de 20.01.2005 (elaborado pelo assessor financeiro da Comissão de Avaliação em 3 de Fevereiro de 2005).
8 – Aditamento ao Estudo Estratégico e Económico-Financeiro (elaborado pelo assessor financeiro da Comissão de Avaliação em 24 de Janeiro de 2005).
9 – Relatório de análise dos aspectos jurídicos relativos à fase de negociações (elaborado pelo assessor jurídico da Comissão de Avaliação em 3 de Fevereiro de 2005).
10 – Alocação de Riscos Base Indicativa.
11 – Cópia das cartas de compromisso do Proponente e das Entidades Financiadoras.»

III

1. O reconhecimento da «vital importância [em] garantir a interoperacionalidade das comunicações de emergência e de segurança» foi explicitamente afirmado na Resolução do Conselho de Ministros n.º 88/99, de 12 de Agosto ([9]), sendo, como é dito no respectivo preâmbulo, «aconselhável a instalação e utilização de uma infra-estrutura única que sirva de suporte às radiocomunicações das diversas entidades com atribuições nos domínios assinalados, em detrimento da multiplicidade de redes actualmente existentes». A adopção em Portugal da norma europeia de trunking digital TETRA ([10]) no estabelecimento de uma rede móvel de emergência e segurança propiciará a necessária eficácia no estabelecimento de comunicações entre grupos fechados de utilizadores envolvidos naqueles domínios, permitindo, simultaneamente, a interoperacionalidade entre as entidades que partilham a mesma infra-estrutura (do preâmbulo).

«A existência de uma única rede afecta às comunicações desta natureza constitui instrumento apto a assegurar a melhor racionalização da gestão dos recursos financeiros e a optimização da utilização do espectro radioeléctrico, permitindo satisfazer, também, de forma eficiente os requisitos operacionais dos serviços de segurança e de emergência, nomeadamente aos níveis da qualidade, da fiabilidade e da segurança das comunicações» (do preâmbulo).

Entre outras medidas, foi decidido:

«1 – A futura rede móvel de emergência e de segurança deverá basear-se numa infra-estrutura única, que servirá de suporte à generalidade das radiocomunicações estabelecidas pelas entidades com intervenção neste domínio.
2 – Para efeitos do disposto no número anterior, deve ser iniciado um processo de migração tecnológica das actuais redes de segurança e de emergência para os sistemas de trunking digital, o qual deve ser faseado e adaptado às especificidades tecnológicas e operacionais das várias redes existentes, com vista à modernização das comunicações e à garantia da interoperacionalidade entre as várias entidades com atribuições nas referidas áreas de intervenção.
3 – Sem prejuízo de outras que venham a ser identificadas, deverão integrar a futura rede móvel de emergência e segurança as seguintes entidades: a Polícia Judiciária, a Polícia de Segurança Pública, a Guarda Nacional Republicana, o Serviço de Informações e Segurança, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, o Instituto de Conservação da Natureza, a Direcção-Geral das Florestas, o Serviço Nacional de Protecção Civil, o Serviço Nacional de Bombeiros, as associações de bombeiros voluntários, o Instituto Nacional de Emergência Médica e a Cruz Vermelha Portuguesa.
(...)
6 – Compete ao ICP [Instituto das Comunicações de Portugal] propor ao membro do Governo responsável pela área das comunicações os instrumentos legislativos e regulamentares necessários ao concurso para selecção do operador de rede de suporte, bem como consignar as frequências às estações de radiocomunicações que a constituem em coordenação com o Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA).
7 – O MAI deverá contactar os demais departamentos da administração central do Estado que tutelem as entidades com atribuições no domínio da emergência e da segurança, com vista quer ao levantamento das respectivas necessidades de comunicação, globais e individuais, quer à recolha de dados para a elaboração de um caderno de encargos necessário para a realização do concurso.»


2. O projecto visando a implementação da Rede Nacional de Emergência e Segurança veio a ser denominado de «SIRESP – Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal» através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 26/2002, de 5 de Fevereiro ([11]).

Esta Resolução, que revogou a anteriormente indicada, reafirma a necessidade da implementação daquela Rede, regista expressamente «o carácter de urgência da definição dos parâmetros que permitirão a concretização em tempo útil da Rede Nacional de Emergência e Segurança» (do preâmbulo) e regista a denominação, já referida, do projecto e da futura rede nacional de emergência e segurança (n.º 1).

No n.º 2 procede-se à definição do SIRESP como «um sistema único, baseado numa só infra-estrutura, nacional, partilhado, que deve assegurar a satisfação das necessidades de comunicações das forças e serviços de emergência e de segurança, satisfazendo a intercomunicação e a interoperabilidade entre as diversas forças e serviços e, em caso de emergência, permitir a centralização do comando e da coordenação».

O n.º 3 desta Resolução indica, sem prejuízo de outras que venham a ser identificadas, as seguintes entidades que partilharão o SIRESP: associações humanitárias de bombeiros voluntários, Cruz Vermelha Portuguesa, Direcção-Geral das Florestas, Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, Exército, Força Aérea Portuguesa, Guarda Nacional Republicana, Instituto da Conservação da Natureza, Inspecção-Geral das Actividades Económicas, Instituto Nacional de Emergência Médica, Instituto Nacional de Medicina Legal, Marinha, órgãos da autoridade marítima nacional, Polícia Judiciária, Polícia de Segurança Pública, Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Serviço de Informações de Segurança, Serviço Nacional de Bombeiros e Serviço Nacional de Protecção Civil.

Foi adoptado para a exploração e utilização do sistema, o princípio do utilizador-pagador (n.º 5), estabelecendo-se ainda:

«(...) toda a infra-estrutura tecnológica básica do SIRESP – Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal deverá ser instalada em duas fases e durante cinco anos.
Assim ter-se-á: 1.ª fase – a executar em 2003 e 2004 – serão instaladas estações de base e toda a infra-estrutura básica correspondente nos distritos, do continente, de Lisboa, Porto, Braga, Coimbra, Aveiro, Leiria e Faro; 2.ª fase – a executar em 2005, 2006 e 2007 – serão instaladas, em conformidade com o cenário de implementação a adoptar, as restantes estações de base e toda a infra-estrutura prevista nos restantes 11 distritos do continente. Em paralelo, e em articulação com os Governos Regionais das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, será elaborado um plano específico para instalar as estações de base e toda a infra-estrutura básica correspondente nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.»

Pelo n.º 11 desta Resolução foi determinado:

«(...) para assegurar a exploração do SIRESP – Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal deverão ser constituídas duas entidades distintas: um conselho de utilizadores, de carácter exclusivamente público, integrando representantes de todos os utilizadores da rede e presidido por um elemento indicado pelo Ministério da Administração Interna, o qual presidirá também à entidade operacional de segurança a definir pelo Governo, e uma entidade empresarial tendo por base uma parceria público-privada, respeitando o princípio utilizador-pagador e prosseguindo regras de gestão que visem o autofinanciamento».

A coordenação de todo o processo conducente à implementação do projecto SIRESP, bem como da migração tecnológica das redes existentes, foi atribuída ao Ministério da Administração Interna, em articulação com o ICP, autoridade nacional de comunicações (n.º 12).


3. A Resolução do Conselho de Ministros n.º 26/2002, que vem de se referir, foi, entretanto, revogada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 56/2003, de 8 de Abril ([12]).

Esta última Resolução, perante o invocado «actual quadro de contenção da despesa pública» (do preâmbulo) procede à redefinição das condições de instalação do SIRESP de forma a assegurar a sua implementação em tempo útil e à definição do «modelo das entidades que asseguram a gestão e operacionalidade daquele Sistema».

Em nota preambular, registam-se algumas considerações que, para melhor compreensão da temática subjacente a esta consulta, será útil conhecer:

«A existência de várias entidades com atribuições no âmbito da emergência e segurança, tuteladas por diferentes ministérios, impõe, no domínio das comunicações, a utilização de uma rede nacional única em tecnologia trunking digital, partilhada, que permitirá, em caso de emergência, a centralização do comando e da coordenação das diversas forças e serviços de segurança.
A existência desta rede nacional permitirá, ainda, satisfazer, de forma eficiente, os requisitos operacionais daquelas forças e serviços, garantindo a qualidade, a fiabilidade e a segurança das comunicações, bem como a racionalidade dos meios e recursos existentes.
A Resolução do Conselho de Ministros n.º 26/2002, de 5 de Fevereiro, denominou o projecto e a rede nacional de emergência de SIRESP – Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal, definindo-o como um sistema único, baseado numa só infra-estrutura, nacional, partilhado, que deve assegurar a satisfação das necessidades de comunicações das forças e serviços de emergência e de segurança, satisfazendo a intercomunicação e a interoperabilidade entre as diversas forças e serviços e, em caso de emergência, permitir a centralização do comando e da coordenação.
Considerando que a configuração e a gestão das comunicações de emergência e segurança nacionais exigem sigilo e operacionalidade e atendendo à particular complexidade e especificidade da estruturação do próprio sistema face ao interesse público em presença, que envolve interesses essenciais de segurança do Estado Português, o Ministério da Administração Interna, através do Gabinete de Estudos e de Planeamento de Instalações (GEPI), desencadeou já, ao abrigo do disposto na alínea i) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 77.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho, o necessário procedimento para a contratação de uma assessoria jurídica e financeira que assegurará o acompanhamento do processo administrativo a adoptar para a contratação do fornecimento do SIRESP, bem como o modelo institucional para a gestão daquele Sistema.»

Nos n.os 1 e 2 define-se o SIRESP, em termos idênticos à definição constante da Resolução de 2002, e referenciam-se as mesmas entidades que o irão partilhar. O princípio do utilizador-pagador para a exploração e utilização do Sistema é também reafirmado (n.º 6).

No n.º 3 estabelece-se «que o SIRESP preveja as necessárias ligações ao Conselho Nacional de Planeamento Civil de Emergência, por forma a assegurar os meios de telecomunicações que, em situações de crise, anormalidade grave ou em tempo de guerra, garantam a indispensável articulação entre este órgão e os serviços de emergência e segurança».

Tal como na anterior Resolução, foi estabelecida a instalação, de forma faseada, de toda a infra-estrutura tecnológica básica do SIRESP, nos termos previstos nos n.os 8 e 9, onde se decide:

«8 – Estabelecer que toda a infra-estrutura tecnológica básica do SIRESP seja instalada de forma faseada, durante seis anos. Na primeira fase, a executar em 2003 e 2004, serão instaladas estações de base e toda a infra-estrutura básica correspondente às zonas urbanas e suburbanas das cidades de Lisboa, Porto, Braga, Guimarães, Coimbra, Aveiro, Leiria e Faro. Nas fases seguintes, a executar entre 2005 e 2008, será finalizada a cobertura dos distritos de Lisboa, Porto, Braga, Coimbra, Aveiro, Leiria e Faro, e instaladas, de acordo com o cenário de implementação a adoptar, as demais estações de base, bem como toda a infra-estrutura prevista nos restantes distritos do continente.
9 – Estabelecer que em paralelo com esta instalação e em articulação com os governos Regionais das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, seja elaborado um plano específico para instalar as estações de base e toda a infra-estrutura básica correspondente naquelas Regiões Autónomas.»

Quanto à estrutura orgânica do sistema, foi determinada a criação de um conselho de utilizadores, de carácter exclusivamente público, integrando representantes de todos os utilizadores (n.º 13) e prevista a criação de uma entidade para a gestão e exploração do SIRESP (n.º 14).

Foi ainda determinado (n.º 15):

«(...) a aquisição, a instalação e a manutenção do SIRESP poderão ter por base uma parceria público-privada, a estabelecer nos termos e de acordo com as regras e procedimentos previstos na legislação aplicável nessa matéria, caso se verifiquem os requisitos necessários, e que funcionará de acordo com regras de gestão que visem o respectivo autofinanciamento».

A coordenação do processo conducente à implementação do SIRESP ficou atribuída ao Ministério da Administração Interna, em articulação com a Autoridade Nacional de Comunicações, ICP-ANACOM (n.º 16).

IV

1. A opção pelo recurso a uma parceria público-privada para a aquisição, instalação e manutenção do SIRESP foi ponderada, como se viu, pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 26/2002, e reafirmada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 56/2003.

Afigura-se, assim, de utilidade que se teçam algumas considerações sobre este instrumento contratual e respectivo regime jurídico.

Actualmente, a concepção do papel do Estado no desenvolvimento económico e social está em clara redefinição.

De modo crescente, sublinha-se, «a renovação das instituições estatais envolve a concorrência do sector público e a mobilização da capacidade do sector privado nas formas de prestação de serviços públicos»; e acrescenta-se que a redução da intervenção directa do Estado «tem sobretudo visado o acréscimo da eficiência e eficácia dos serviços públicos, a melhoria da cobertura e qualidade dos serviços prestados, a ampliação das possibilidades de escolha dos cidadãos, bem como o financiamento e sustentabilidade da expansão dos serviços» ([13]).

De facto, reconhece-se, «[n]ão é (...) necessário que o sector público seja o único fornecedor de certos bens e serviços» ([14]).

A contenção da despesa pública e as crescentes exigências de contenção dos défices orçamentais e da dívida pública determinou «a necessidade de encontrar alternativas ao financiamento tradicional do Sector Público para a prossecução de determinadas actividades, uma vez que continuam e continuarão a fazer-se sentir, fortemente, as necessidades de construção e manutenção de infra-estruturas e de provisão de serviços públicos de diversa natureza. Sobretudo quando objecto de programas plurianuais que exigem avultadas disponibilidades financeiras» ([15]).

No espaço europeu, tem-se observado o desenvolvimento do fenómeno das parcerias público-privadas em numerosos domínios da competência do sector público. Como constata a Comissão das Comunidades Europeias, «[o] recurso acrescido às operações de PPP explica-se por diferentes factores. Dadas as restrições orçamentais com que se confrontam os Estados-Membros, ele corresponde a uma necessidade de financiamentos privados no sector público. Explica-se igualmente pela vontade de beneficiar da experiência e dos modos de funcionamento do sector privado no âmbito da vida pública. O desenvolvimento das PPP insere-se ainda na evolução geral do papel do Estado na esfera económica, passando do papel de operador directo para o de organizador, de regulador e de fiscalizador» ([16]).

As parcerias público-privadas (PPP, na sua expressão abreviada, frequentemente usada) designam uma forma de cooperação ou reunião de esforços entre as autoridades públicas e os operadores económicos privados visando, nomeadamente, financiar, construir, explorar uma infra-
-estrutura ou o fornecimento de um serviço, implementar, enfim, um conjunto de investimentos sem recurso às fontes convencionais de receitas do Estado.


Numa acepção ampla, a parceria público-privada pode definir-se como «todas as formas de colaboração entre os poderes públicos e as empresas privadas»; numa acepção restrita, traduz-se na «colaboração entre o Estado e empresas privadas em volta de projectos comuns, permitindo a cada uma das partes servir melhor os interesses da outra» ([17]).

Após enunciar algumas vantagens que, do ponto de vista económico-financeiro, os projectos comuns em regime de parceria apresentam ([18]), escreve o mesmo Autor ([19]):

«O elemento fundamental para o desenvolvimento das PPP é a confiança (x1), dada a duração das operações em causa e os riscos incorridos. A confiança dos poderes públicos nos operadores privados, no seu saber fazer, na sua capacidade em se adaptar às mudanças, na sua boa vontade; mas também a confiança dos operadores privados nos poderes públicos, na sua boa-fé, na sua capacidade de criar o ambiente propício ao sucesso, na sua vontade de não mudar as regras do jogo».


2. O Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril, veio introduzir no nosso ordenamento jurídico, a figura das parcerias público-privadas e estabelecer o seu regime, inscrevendo-se no movimento, já assinalado, de implementação de novas experiências contratuais de articulação entre a Administração e as entidades privadas.

É seu propósito, consoante se afirma no seu artigo 1.º, «a definição de normas gerais aplicáveis à intervenção do Estado na definição, concepção, preparação, concurso, adjudicação, alteração, fiscalização e acompanhamento global das parcerias público-privadas».

Em termos de organização sistemática, este diploma é constituído por quatro capítulos. O capítulo I, abrangendo os artigos 1.º a 7.º, é dedicado às «Disposições gerais». O capítulo II compreende os artigos 8.º a 11.º e respeita à «Avaliação das parcerias». O capítulo seguinte (artigos 12.º a 14.º) contempla a «Fiscalização e acompanhamento das parcerias». O capítulo V, constituído por dois artigos, diz respeito às «Disposições finais».

A definição da figura e âmbito de aplicação constam do artigo 2.º:
«Artigo 2.º
Definição de parceria público-privada e âmbito de aplicação

1 – Para efeitos do presente diploma, entende-se por parceria público-privada o contrato ou a união de contratos, por via dos quais entidades privadas, designadas por parceiros privados, se obrigam, de forma duradoura, perante um parceiro público, a assegurar o desenvolvimento de uma actividade tendente à satisfação de uma necessidade colectiva, e em que o financiamento e a responsabilidade pelo investimento e pela exploração incumbem, no todo ou em parte, ao parceiro privado.
2 – São parceiros públicos:
a) O Estado e entidades públicas estaduais;
b) Os fundos e serviços autónomos;
c) As empresas públicas e as entidades por elas constituídas com vista à satisfação de interesses comuns.
3 – O presente diploma é igualmente aplicável a todas as parcerias em que o equivalente ao parceiro não público seja uma empresa pública, uma cooperativa ou uma instituição privada sem fins lucrativos.
4 – Constituem, entre outros, instrumentos de regulação jurídica das relações de colaboração entre entes públicos e entes privados:
a) O contrato de concessão de obras públicas;
b) O contrato de concessão de serviço público;
c) O contrato de fornecimento contínuo;
d) O contrato de prestação de serviços;
e) O contrato de gestão;
f) O contrato de colaboração, quando estiver em causa a utilização de um estabelecimento ou uma infra-estrutura já existentes, pertencentes a outras entidades, que não o parceiro público.
5 – Excluem-se do âmbito do presente diploma:
a) As empreitadas de obras públicas;
b) Os arrendamentos;
c) Os contratos públicos de aprovisionamento;
d) Todas as parcerias público-privadas que envolvam um encargo acumulado actualizado inferior a 10 milhões de euros ou um investimento inferior a 25 milhões de euros, excluindo-se destes montantes os provenientes de fundos comunitários;
e) Todos os outros contratos de fornecimento de bens ou de prestação de serviços, com prazo de duração igual ou inferior a três anos, que não envolvam a assunção automática de obrigações para o parceiro público no termo ou para além do termo do contrato.»

Os fins das parcerias público-privadas estão assinalados no artigo 4.º do diploma:

«Constituem finalidades essenciais das parcerias público-‑privadas o acréscimo de eficiência na afectação de recursos públicos e a melhoria qualitativa e quantitativa do serviço, induzida por formas de controlo eficazes que permitam a sua avaliação permanente por parte dos potenciais utentes e do parceiro público.»

A execução do objecto da parceria deverá, preferencialmente, ser acompanhada e controlada pelo parceiro público, por forma a garantir, como prescreve o artigo 5.º do diploma em apreço, «que são alcançados os fins de interesse público subjacentes». Ao parceiro privado caberá, nos termos do mesmo preceito, «o financiamento e o exercício e a gestão da actividade contratada».

O artigo 6.º constitui um preceito basilar na normação das parcerias público-privadas na medida em que estabelece os pressupostos de que depende o seu lançamento e contratação. O n.º 1 deste preceito dispõe o seguinte:

«1 – O lançamento e a contratação da parceria público-privada pressupõem:
a) O cumprimento, quando for o caso, das normas relativas à programação financeira plurianual constantes da lei de enquadramento orçamental;
b) A clara enunciação dos objectivos da parceria, definindo os resultados pretendidos e permitindo uma adequada atribuição das responsabilidades das partes;
c) A configuração de um modelo de parceria que apresente para o parceiro público vantagens relativamente a formas alternativas de alcançar os mesmos fins, avaliados nos termos previstos no artigo 16.º, n.º 2, da lei de enquadramento orçamental, e que, simultaneamente, apresente para os parceiros privados uma expectativa de obtenção de remuneração adequada aos montantes investidos e ao grau de risco em que incorrem;
d) A prévia adequação às normas legais e demais instrumentos normativos, bem como a obtenção das autorizações e pareceres administrativos exigidos, tais como, entre outros, os de natureza ambiental e urbanísticos, dos quais dependa o desenvolvimento do projecto, de modo a permitir que todo o risco da execução seja ou possa ser transferido para o parceiro privado;
e) A concepção de modelos de parcerias que não impliquem ou evitem, sempre que possível e salvo fundamentação adequada, a assunção, perante os parceiros privados, de quaisquer cláusulas ou regimes indemnizatórios de longo prazo, aplicáveis a quaisquer formas, legalmente permitidas, de modificação unilateral dos contratos determinadas pelo Estado, que comprometam materialmente o normal exercício do dever de apreciação do interesse público e correspondente prossecução, em virtude da excessiva ou injustificada onerosidade, ou da respectiva inadequação por força da imprevisibilidade da matéria ou da duração do compromisso;
f) A adopção, na fase prévia à contratação, das diligências e a consagração das exigências que se revelem adequadas à obtenção de um resultado negocial economicamente competitivo.»

O n.º 3 deste preceito determina que «[a] verificação da conformidade do projecto de parceria com os pressupostos referidos no n.º 1 deve ser realizada com o maior grau de concretização possível em função da fase em que o projecto se encontre».

O artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 86/2003 constitui também um preceito basilar na economia das parcerias público-privadas, devendo a sua normação ser considerada, como se verá, quer na fase da sua preparação e lançamento, quer no momento em que se decida a sua adjudicação ou não adjudicação.
«Artigo 7.º
Partilha de riscos

A partilha de riscos entre as entidades públicas e privadas deve estar claramente identificada contratualmente e obedece aos seguintes princípios:
a) Os diferentes riscos inerentes à parceria devem ser repartidos entre as partes de acordo com a sua capacidade de gerir esses mesmos riscos;
b) O estabelecimento da parceria deverá implicar uma significativa e efectiva transferência de risco para o sector privado;
c) Deverá ser evitada a criação de riscos que não tenham adequada justificação na redução de outros riscos já existentes;
d) O risco de insustentabilidade financeira da parceria, por causa não imputável a incumprimento ou modificação unilateral do contrato pelo parceiro público, ou a situação de força maior, deve ser, tanto quanto possível, transferido para o parceiro privado.»

No capítulo II estão contempladas as normas de natureza procedimental relativas à preparação, estudo e lançamento das parcerias.

O artigo 8.º prevê o procedimento relativo à preparação e estudo de parcerias no âmbito do qual, para além do ministro da tutela sectorial, intervém sempre, por força das implicações financeiras e orçamentais, o Ministro das Finanças ([20]).

Nos termos do n.º 2 do artigo 8.º, o estudo e preparação de uma parceria público-privada «devem ter em consideração a conveniência de averiguação prévia do posicionamento do sector privado relativamente ao tipo de parceria em análise, tendo em vista, designadamente, a constatação dos potenciais interessados e das condições de mercado existentes».

Está prevista uma comissão de acompanhamento do projecto de parceria em preparação, composta por um mínimo de dois elementos e um máximo de cinco em representação de cada um dos Ministros das Finanças e da tutela sectorial.

Esses membros actuam com independência e objectividade, como se depreende dos n.os 4 e 7 do mesmo preceito. Qualquer um deles tem poderes para obter da entidade encarregue pelo ministério da tutela sectorial da preparação do projecto, bem como das entidades que eventualmente desempenhem funções de consultoria, assessoria, ou que, por qualquer forma, colaborem na preparação do projecto, toda a informação relativa ao decurso e evolução dos trabalhos.

De acordo com o n.os 6 e 7 deste preceito, quando a entidade encarregue pelo ministério da tutela sectorial da preparação do projecto considerar que o mesmo se encontra em estado de prosseguir para a fase de lançamento, notificará por escrito a comissão de acompanhamento, sendo obrigatória a emissão de dois pareceres independentes, não vinculativos, por parte dos membros nomeados por cada um dos ministérios.

Sublinhe-se que, nos termos do n.º 8, «[o] parecer dos membros nomeados pelo Ministro das Finanças analisa em especial a conformidade da versão definitiva do projecto de parceria com o disposto no n.º 1 do artigo 6.º e no artigo 7.º do presente diploma e discrimina, tanto quanto possível quantitativamente, os custos e riscos assumidos pelo sector público implícitos no projecto».

Emitidos estes pareceres, os Ministros das Finanças e da tutela sectorial aprovam mediante despacho conjunto as condições de lançamento da parceria (n.º 9).

De acordo com o n.º 10 deste preceito, este despacho conjunto deverá conter:

«a) O programa de concurso;
b) O caderno de encargos;
c) A análise das opções que determinaram a configuração do projecto;
d) A descrição do projecto e do seu modo de financiamento;
e) A demonstração do seu interesse público;
f) A justificação do modelo de parceria escolhida;
g) A demonstração da comportabilidade dos custos e riscos decorrentes da parceria em função da programação financeira plurianual do sector público administrativo.»

Em seguida, conforme dispõe o artigo 10.º deste diploma, o ministro da tutela sectorial procede ao lançamento da parceria, nos termos do procedimento prévio à contratação aplicável.

O diploma prevê ainda uma comissão de avaliação de propostas, designada por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da tutela sectorial, composta por representantes dos respectivos ministros, tendo, entre as suas incumbências, nos termos do artigo 9.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 86/2003, a de avaliação, tanto quanto possível quantitativa, dos riscos e encargos em que incorre o parceiro público, directa ou indirectamente, para além da avaliação do mérito relativo das propostas, tendo especialmente em conta o tipo de avaliação prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º».

O artigo 11.º, respeitando à adjudicação e reserva de não atribuição, estabelece o seguinte:
«Artigo 11.º
Adjudicação e reserva de não atribuição

1 – A adjudicação é realizada pelo ministro da tutela sectorial, mediante despacho conjunto subscrito com o Ministro das Finanças, o qual aprecia a conclusão do relatório elaborado pela comissão de avaliação de propostas e demonstra a verificação de conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 6.º e no artigo 7.º, bem como das menções referidas nas alíneas c) a g) do n.º 10 do artigo 8.º.
2 – A qualquer momento do processo de selecção do parceiro privado, pode dar-se por interrompido ou anulado o processo em curso, sem direito a qualquer indemnização, sempre que, de acordo com a apreciação dos objectivos a prosseguir, os resultados das análises e avaliações realizadas até então e os resultados das negociações levadas a cabo com os candidatos não correspondam, em termos satisfatórios, aos fins de interesse público subjacentes à constituição da parceria.
3 – A interrupção ou anulação do processo de constituição da parceria é decidida com observância do procedimento previsto no n.º 1.»

V

1. Em concretização das decisões adoptadas na Resolução do Conselho de Ministros n.º 56/2003, de 8 de Abril, e em obediência ao procedimento previsto no artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 86/2003, pelo Despacho Conjunto n.º 606/2003, de 30 de Abril de 2003, da Ministra de Estado e das Finanças e do Ministro da Administração Interna ([21]), foi «constituída a comissão de acompanhamento do projecto de parceria público-privada para a aquisição, a instalação e a manutenção do SIRESP, Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal».

Pelo Despacho Conjunto n.º 734/2003, de 9 de Julho de 2003, das mesmas entidades ministeriais ([22]), foram aprovadas as «condições de lançamento da parceria constantes do programa de procedimento, caderno de encargos e estudo estratégico e económico-financeiro da parceria público-privada para a implementação do Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal».


2. O programa de procedimento, através do qual se definem os termos a que obedece a respectiva tramitação tem por objecto, como se enuncia no seu n.º 1, «a concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção de um Sistema Integrado de tecnologia trunking digital para a Rede de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP), de acordo com as condições jurídicas e as especificações técnicas contidas no caderno de encargos».

A entidade adjudicante é o Estado Português, através do Gabinete de Estudos e Planeamento de Instalações do Ministério da Administração Interna (GEPI), sendo o procedimento conduzido por uma comissão de avaliação de propostas nomeada por despacho conjunto do Ministro das Finanças e do Ministro da Administração Interna ([23]). Nos termos do n.º 4.2. do Programa de Procedimento:

«À comissão de avaliação compete prestar esclarecimentos, assegurar a realização do acto de abertura de propostas, deliberar sobre a habilitação e aptidão dos proponentes, efectuar a avaliação das propostas e a sua negociação e realizar os demais actos e formalidades do procedimento, podendo, para o efeito, solicitar apoio a outras entidades».

De acordo com o n.º 7.1. do Programa, «[a]s entidades consultadas podem concorrer isoladamente ou em agrupamento com outras empresas sem que entre elas exista, neste último caso, qualquer modalidade jurídica de associação». Nos termos do n.º 7.8. do mesmo documento, «[o] contrato será celebrado com uma empresa, sob a forma de sociedade comercial anónima com sede em Portugal, tendo como objecto exclusivo a prossecução das actividades compreendidas no contrato, a constituir pelas entidades componentes do agrupamento ou pela empresa à qual for adjudicado o Sistema».

O Programa compreende as disposições e comandos que são comuns a qualquer outro programa concursal, estabelecendo no n.º 25 os parâmetros a considerar na selecção das propostas e alguns aspectos que, na avaliação das propostas, merecerão particular atenção pela comissão de avaliação ([24]).

O relatório final da comissão de avaliação será submetido à aprovação dos Ministros das Finanças e da Administração Interna (n.º 25.8.).

Na sequência da aprovação do relatório, o Programa de Procedimento prevê uma fase de negociações entre o proponente cuja proposta tenha sido mais bem avaliada e a comissão de avaliação, visando-
-se «atingir um aperfeiçoamento e uma melhoria da proposta, tendo por objecto os aspectos das propostas mais relacionadas com os factores referidos no ponto 25.1. [
[25]], e tendo como resultado final a minuta do contrato e respectivos anexos».

O n.º 29 do Programa versa sobre a «[a]djudicação provisória e definitiva», definindo-se ali a primeira figura como o «acto mediante o qual, após a conclusão das negociações e elaboração do respectivo relatório, os Ministros de Estado e das Finanças e da Administração Interna escolhem um dos proponentes como adjudicatário». A adjudicação definitiva ocorre com a assinatura do contrato. Para este efeito, o proponente escolhido deverá apresentar ao GEPI, no prazo de 30 dias, documentação comprovativa da constituição da sociedade anónima operadora.

O n.º 30.1., sobre a «Não adjudicação e interrupção do procedimento», dispõe o seguinte:

«30.1. Os Ministros de Estado e das Finanças e da Administração Interna, por sua iniciativa ou mediante proposta da comissão de avaliação, reservam-se o direito de, a qualquer momento da fase de negociações, interromper as mesmas ou dá-las por concluídas com qualquer dos proponentes, caso, de acordo com a sua livre apreciação:
30.1.1. Os resultados obtidos não satisfaçam o interesse público;
30.1.2. As respostas ou contrapropostas forem manifestamente insuficientes e/ou evasivas;
30.1.3. As respostas ou contrapropostas não forem apresentadas no prazo para o efeito fixado.»


3. O Caderno de Encargos tem igualmente o perfil que, em regra, qualquer outro documento homólogo possui em procedimentos de natureza concursal. Compreende, portanto, o conjunto de princípios, regras e orientações aplicáveis ao contrato.

No domínio das definições constantes deste documento, é útil fixar as que dizem respeito aos sujeitos que intervirão no início e no desenvolvimento da relação contratual para a qual foi desencadeado o respectivo procedimento de formação.

Assim: «”Adjudicatário” significa o proponente que venha a ser escolhido para celebrar o Contrato, no final do Procedimento e nos termos da respectiva Proposta»; «”Entidade Gestora” significa a entidade pública que venha a ser designada para celebrar o Contrato por parte do Estado e que ficará responsável pela gestão e exploração do SIRESP» ([26]); «”Entidades Utilizadoras” significa as entidades que irão utilizar, de forma partilhada, o SIRESP, mediante acordo a celebrar com a Entidade Gestora»; «”Operadora” significa a sociedade a constituir pelo Adjudicatário (...), que irá celebrar o Contrato com a Entidade Gestora e será responsável pela implementação e exploração do SIRESP».

A fls. 15 do Caderno de Encargos, ponto 26.2, estipula-se que «a entrada em serviço da fase referida no artigo 25.1 [onde são mencionadas as zonas urbanas e suburbanas das cidades de Lisboa, Porto, Braga, Guimarães, Coimbra, Aveiro, Leiria e Faro] deverá verificar-se, impreterivelmente, até ao termo do mês de Abril de 2004», acrescentando-se a fls. 33 do mesmo Caderno (Secção B — descrição do sistema a implementar), ponto 1.3., alínea k, que «[n]o que se refere à primeira fase da implementação da rede, tendo em conta o seu âmbito, deve ser dada especial atenção à cobertura das zonas urbanas ou suburbanas em que se encontram implantados estádios onde vai ser disputado o EURO 2004».


4. Por Despacho de 9 de Julho de 2003, o Ministro da Administração Interna ([27]), com invocação do disposto no n.º 2 do artigo 77.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho, «e para os efeitos da alínea i) do n.º 1 da mesma disposição legal», veio determinar:

«1. (...) que a implementação do projecto SIRESP – Sistema Integrado das Comunicações de Emergência e Segurança de Portugal, de acordo com a Resolução do Conselho de Ministros n.º 56/2003, de 8 de Abril, envolve interesses essenciais de segurança do Estado Português no domínio das comunicações de emergência e de segurança, pelo que se justifica, nos termos da lei, excepcionar das regras procedimentais de contratação previstas no citado diploma os contratos relativos à concepção, fornecimento e manutenção do sistema integrado de tecnologia trunking digital para as Redes de Emergência e Segurança de Portugal.
2. Nos termos do artigo 10º do Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril, autorizo o estabelecimento dos contratos necessários à aquisição de bens e serviços de concepção, fornecimento e manutenção de um sistema integrado de tecnologia trunking digital para as Redes de Emergência e Segurança de Portugal, mediante um procedimento que envolve um convite para apresentação de propostas a cinco entidades idóneas e com capacidade técnica, económica e financeira reconhecidas, e inclui uma fase de negociações com o concorrente que apresentar a proposta melhor classificada, estando o respectivo regime definido em Programa de Concurso e Caderno de Encargos aprovado por despacho conjunto de 9 de Julho de 2003, dos Ministros das Finanças e da Administração Interna nos termos do disposto no n.º 9 do artigo 8º do mesmo Decreto-Lei.»


5. De acordo com o Relatório da Comissão de Avaliação, de 17 de Novembro de 2003, «foram convidadas a apresentar Proposta cinco entidades idóneas e com capacidade técnica, económica e financeira reconhecidas, sendo de realçar que as mesmas esgotam o universo dos fabricantes de infra-estruturas de rede trunking digital passíveis de utilização pelas Forças de Segurança dos países signatários do Acordo de Schengen, a saber: a Siemens, a EADS, a OTE, a Nokia e a Motorola» ([28]).

A solicitação dos interessados, o prazo para apresentação das propostas, cujo termo ocorreria em 1 de Setembro de 2003, foi prorrogado até ao dia 15 do mesmo mês, por terem sido «considerados válidos e pertinentes os argumentos invocados para esse efeito» (do Relatório).

Realizado o Acto de Abertura das Propostas, foi constatado que apenas foi recebida uma única proposta apresentada pelo consórcio constituído pelas sociedades MOTOROLA, Inc., PT VENTURES, SGPS, S.A., SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A., DATACOMP – Sistemas de Informática, S.A., e ESEGUR – Empresa de Segurança, S.A.

Apreciada a proposta apresentada nas suas vertentes técnica, jurídica e financeira e com o apoio dos consultores contratados pelo GEPI para assessorarem o processo ([29]), a Comissão de Avaliação considerou ([30]) que «[f]ace às pontuações atribuídas, a Proposta, nos exactos termos em que é apresentada, revela-se inadequada ao interesse público a prosseguir».

«Todavia – acrescenta o mencionado Relatório – apesar da pontuação atribuída à Proposta e aos reparos a ela efectuados, tendo em conta que apenas foi apresentada uma proposta e considerando» a «importância do processo em causa e a adequação, em termos genéricos, da solução técnica apresentada», que se trata «de um processo excepcionado das regras procedimentais da contratação pública» e «se previu no respectivo Programa de Procedimento uma fase de negociações (cfr. ponto 26)» e que «com a mencionada fase de negociações se visa atingir um aperfeiçoamento e uma melhoria da proposta que consubstanciem, necessariamente, condições mais vantajosas para a entidade adjudicante do que as inicialmente apresentadas», a Comissão de Avaliação entendeu que, «apesar da avaliação efectuada à Proposta, não deverá, desde já ser excluída a hipótese de, em fase de negociações, se virem a obter do Proponente as condições técnicas e financeiras adequadas à satisfação do interesse público em matéria de comunicações de emergência e de segurança» ([31]).

Submetida a aprovação, a proposta mereceu a concordância do Ministro da Administração Interna e da Ministra de Estado e das Finanças, por despachos de 19 de Novembro de 2003, e de 7 de Janeiro de 2004, respectivamente.


6. Na sequência, foi encetada uma fase de negociações, tendo sido entregue ao Proponente um documento intitulado «Convite à reformulação da Proposta apresentada pelo Consórcio», onde a Comissão de Avaliação indicou os tópicos sobre os quais aquela reformulação deveria incidir, de molde a poder tomar-se a decisão de prosseguir ou não as negociações. No mesmo documento procedeu-se a uma listagem dos aspectos de cariz técnico e financeiro onde a proposta se mostrava mais vulnerável, identificáveis pelas pontuações oportunamente atribuídas.


7. No final, e consoante se afirma no «Relatório da Comissão de Avaliação (elaborado nos termos e para os efeitos do ponto 28 do Programa de Procedimento)», datado de 14 de Fevereiro de 2005, conclui-se que, na sequência da apreciação dos documentos contratuais resultantes da fase de negociações e com base em documentos elaborados pelos consultores contratados pelo GEPI, «foram corrigidas as fragilidades e melhorada a informação contida na documentação técnica» no tocante aos itens indicados.

Quanto aos termos e condições económico-financeiras, a Comissão conclui que «o sistema proposto satisfaz adequadamente os requisitos técnicos constantes nas especificações do Caderno de Encargos, não apresentando nenhuma deficiência significativa».

Finalmente, do ponto de vista da análise jurídica das condições obtidas em sede de negociações, considera-se terem sido ultrapassadas as insuficiências detectadas quanto ao grau de compromisso dos fundos alheios (através da obtenção pelo Proponente de uma garantia firme de financiamento do projectos) e quanto ao grau de compromisso dos fundos próprios (por terem sido asseguradas garantias bancárias para salvaguardar o cumprimento das obrigações de capitalização da Operadora por parte dos seus accionistas).

Os aspectos que se relacionam com a configuração do próprio Contrato de Gestão, com a alocação dos riscos e com a previsão das cláusulas penais que assumem as entidades que sejam subcontratadas em consequência de mora e pelo incumprimento defeituoso, foram também considerados satisfeitos.

Procedeu-se ainda à densificação dos aspectos relativos à definição dos casos de força maior, ao regime das multas contratuais, aos mecanismos e fundamentos da rescisão e da reposição do equilíbrio do contrato «que correspondem, genericamente, ao standard de mercado para projectos desta natureza» ([32]).

Assim, a Comissão de Avaliação considera estar «verificada a conformidade com as disposições legais aplicáveis à contratação de parcerias público-privadas, nomeadamente no que respeita ao disposto nos artigos 6.º, n.º 1, e 7.º do Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril» e propõe a «adjudicação do Contrato de Gestão para a Concepção, Projecto, Fornecimento, Montagem, Construção, Gestão e Manutenção do Sistema Integrado de tecnologia trunking digital das Redes de Emergência e Segurança de Portugal ao consórcio composto pelas empresas Motorola, Inc., PT Ventures, SGPS, S.A., SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A., Datacomp – Sistemas de Informática, S.A. e Esegur – Empresa de Segurança, S.A., no valor global de 538,2 milhões de euros, correspondente ao Valor Actual dos Pagamentos do Estado de 340,7 milhões de euros e de acordo com a programação plurianual indicada no ponto 3.2.8. do presente relatório».


8. As conclusões do Relatório da Comissão de Avaliação de Propostas foram aprovadas pelo Despacho Conjunto n.º 219/2005, de 23 de Fevereiro de 2005, do Ministro das Finanças e da Administração Pública e do Ministro da Administração Interna ([33]). No mesmo Despacho adjudica-se o identificado contrato ao consórcio referido.

Tendo em atenção o seu particular relevo, no âmbito desta consulta, julga-se oportuna a transcrição deste Despacho Conjunto:

«Considerando o disposto no Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril, que define as normas aplicáveis à intervenção do Estado na definição, concepção, preparação, concurso, adjudicação, alteração, fiscalização e acompanhamento global das parcerias público-‑privadas;
Considerando as conclusões do relatório elaborado em 14 de Fevereiro de 2005 pela comissão de avaliação de propostas nomeada pelo despacho conjunto n.º 758/2003, de 11 de Agosto, que se aprovam e adoptam;
Considerando que o despacho conjunto n.º 734/2003, de 29 de Julho, que aprovou as condições de lançamento da parceria público-‑privada para a implementação do Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal – (SIRESP), contém todas as menções referidas nas alíneas c) a g) do n.º 10 do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril;
Considerando que a análise constante do relatório elaborado pela comissão de avaliação de propostas demonstra a verificação de conformidade e cumprimento dos pressupostos previstos no n.º 1 do artigo 6.º do citado Decreto-Lei n.º 86/2003 para o lançamento e contratação de uma parceria público-privada e dos princípios relativos à partilha de riscos prevista no artigo 7.º do mesmo diploma legal;
Considerando a proposta de adjudicação da parceria público-‑privada contida nas conclusões constantes no n.º 5 do relatório da comissão de avaliação atrás referido;
Considerando que o adiamento da presente adjudicação da parceria público-privada poderia causar inevitáveis atrasos na implementação do SIRESP, comprometendo irremediavelmente a sua conclusão no prazo estabelecido no n.º 8 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 56/2003, de 8 de Abril;
Considerando que o protelamento da implementação desta infra-
-estrutura de comunicações móveis, destinada a permitir a interligação das diversas entidades responsáveis pela emergência e segurança, provocaria o atraso na coordenação das forças policiais a nível operacional e dos bombeiros no combate aos fogos florestais, pondo em causa a salvaguarda do interesse público;

Considerando que a Resolução do Conselho de Ministros n.º 26/2002, de 5 de Fevereiro, já então reconhecia carácter de urgência à viabilização, em tempo útil, da Rede Nacional de Emergência e Segurança;
Considerando, enfim, depois de ouvido o auditor jurídico junto do Ministério da Administração Interna, que a presente adjudicação se revela como acto de gestão corrente, em função da sua natureza imprescindível e inadiável, atendendo à imperiosa urgência da implementação, em tempo útil, do SIRESP;
Nos termos da cláusula 29.1. do programa de procedimento aprovado pelo despacho conjunto n.º 734/2003, de 29 de Julho, e ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril;
1 – Aprovam-se e adoptam-se as conclusões do relatório elaborado pela comissão de avaliação de propostas, designadamente no que respeita à verificação da conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 6.º e no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril.
2 – Adjudica-se o contrato para a concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do sistema integrado de tecnologia trunking digital das redes de emergência e segurança de Portugal ao consórcio composto pelas empresas Motorola, Inc., PT Ventures, SGPS, S.A., SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A., Datacomp – Sistemas de Informática, S.A. e Esegur – Empresa de Segurança, S.A.».


9. Entretanto, pelo Despacho n.º 6453 (2.ª série), de 2 de Março de 2005 ([34]), do Ministro da Administração Interna, foi determinado que «até à efectiva constituição da entidade gestora, a Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna ficará, nos termos e para os efeitos previstos no caderno de encargos e no programa de procedimento de contratação do SIRESP, como entidade gestora provisória, com todas as competências aí indicadas, designadamente a da celebração do contrato com a sociedade operadora».

VI

1. A parceria público-privada lançada para a implementação do SIRESP configura, já se disse, uma associação entre a Administração e um consórcio formado por entidades empresariais privadas que, devendo obedecer a requisitos ou pressupostos legalmente tipificados, se destina a satisfazer interesses da colectividade tão fundamentais quanto o são os que respeitam à segurança e à emergência.

O acordo de vontades que fixou essa parceria, designado na versão final da minuta redigida na fase de negociações, como «contrato relativo à concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção de um sistema integrado de tecnologia trunking digital para a Rede de Emergência e Segurança de Portugal», integra-se no exercício da função administrativa do Estado, aí avultando o interesse público prosseguido pela Administração.

Sobre a razão que está na base da opção por um contrato de direito público ou por um contrato de direito privado, tem-se entendido ser, precisamente, a ponderação do interesse público que justifica a escolha do legislador ou do órgão encarregado da decisão de contratar por uma ou outra modalidade.

Como escreve EDUARDO PAZ FERREIRA, «a apreciação do interesse público, nalguns casos determina que os meios privados sejam idóneos para a realização dos fins em vista, enquanto que, noutros, a própria natureza do interesse vai justificar uma regulamentação diversa» ([35]).

«Quer isto dizer que, como sublinhou Orlando de Carvalho, nuns casos o interesse público limita-se a funcionar como elemento teleológico para a celebração do contrato (contrato de direito privado), noutros intervém não só como critério para a realização do contrato mas como factor “modelador” activo e permanente do contrato (contrato de direito público) (x1).» ([36])

Acrescenta o mesmo Autor:

«A interferência do interesse público como factor de modelação do contrato vai, no entanto, fazer-se sentir em graus muito diversos, podendo traduzir-se só em aspectos pontuais, que não chegam para descaracterizar o contrato como contrato de direito privado.

«O contrato de direito público aparece apenas quando estamos em face de uma intensidade tal do elemento interesse público que se configura um verdadeiro poder de orientação ou direcção da Administração, que conserva a faculdade de alterar radicalmente os termos do contrato.

«Surge, então, um conjunto de poderes relativamente tipificados nos principais contratos administrativos e que são o de fiscalização, o de modificação unilateral das condições e o de aplicação de sanções.» ([37])

Segundo o n.º 1 do artigo 178.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), «diz-se contrato administrativo o acordo de vontades pelo qual é constituída, modificada ou extinta uma relação jurídica administrativa».

Concretizando o conceito de relação jurídica administrativa, FREITAS DO AMARAL, considera ser «aquela que, por via de regra, confere poderes de autoridade ou impõe restrições de interesse público à Administração perante os particulares, ou que atribui direitos ou impõe deveres aos particulares perante a Administração» ([38]).

Refere-se no Parecer do Conselho Consultivo n.º 72/95 ([39]):

«Os principais poderes de autoridade que as relações de direito administrativo envolvem são os de fiscalização, modificação unilateral e de aplicação de sanções (x2).

«No âmbito formativo dos contratos administrativos, a Administração está sujeita a especiais condicionalismos, ao contrário do que ocorre na sua execução, onde se manifesta o exercício de poderes de autoridade, consubstanciados, designadamente, na modificação unilateral do conteúdo das prestações, na direcção do modo da sua execução, na fiscalização desta, na rescisão unilateral e na aplicação de sanções (X3).» ([40])


2. Ensaiando a sua qualificação jurídica, a parceria público-privada, com o objecto já assinalado, assenta numa relação contratual em que o parceiro privado presta um serviço «em vez do» parceiro público, sob o controlo e fiscalização deste ([41]).

Com este perfil, por força da relevância do interesse público nele subjacente e perante as marcas de administratividade que ele contém, correspondentes às que, habitualmente, acompanham estes esquemas contratuais, afigura-se-nos que o contrato a celebrar com o consórcio adjudicatário se integra na categoria dos contratos administrativos, regulados pelo direito público.

Pondera-se no Parecer n.º 67/95:

«Na disciplina da contratação com a Administração Pública, sobressaem alguns tópicos que têm a ver com a natureza peculiar de um dos sujeitos.

«Diz-se, pois, que “os traços mais relevantes da sua disciplina respeitam, por um lado, ao procedimento necessário para que a “vontade contratual” do contraente público possa dizer-se regularmente formada e manifestada, e, por outro, à exigência de controlos destinados a garantir a legitimidade da operação e a sua conformidade com o interesse público” (x4).

«Por isso que o contrato venha a representar, as mais das vezes, o culminar de uma série complexa de procedimentos administrativos preparatórios, necessários à sua própria validade, destinados a garantir, desde logo, a correcção, imparcialidade e conveniência na escolha do co-contraente.

«Com uma consequência importante: “se um dos actos preliminares, pertencentes à sequência, falta ou é inválido, tal vício – que não é vício do contrato, mas do procedimento administrativo preparatório do contrato – reflecte-se sobre este último e determina a sua invalidade” (x5).»

Efectivamente, de acordo com o artigo 185.º, n.º 1, do CPA, «os contratos administrativos são nulos ou anuláveis, nos termos do presente Código, quando forem nulos ou anuláveis os actos administrativos de que haja dependido a sua celebração».

VII

O objecto da consulta – clarificação da apreciação jurídica do processo de adjudicação do Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal, «designadamente, apurando se há razão determinante para a anulação do concurso» – reclama que se examinem os princípios que enformam a Administração Pública no exercício de toda a sua actividade e, por isso, também daquela que empreende em sede de formação dos contratos administrativos.

1. Dispõe o artigo 266.º da Constituição:

«1 – A Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos.
2 – Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé.»

O artigo 3.º, n.º 1, do CPA, concretizando o princípio geral consagrado no artigo 266.º, n.º 2, da Constituição, prescreve que «os órgãos da Administração Pública devem actuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes sejam atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes forem atribuídos».

Como sublinha PEDRO GONÇALVES, «o princípio da sujeição da Administração à lei vale naturalmente para toda a actuação administrativa e para todas as formas de actuação administrativa, pelo que o contrato administrativo não pode constituir um “ghetto” de excepção à aplicação do princípio» ([42]).

Conexionado com os demais princípios, também assinalados no n.º 2 do artigo 266.º da Constituição, o princípio da legalidade aponta para um princípio de âmbito mais abrangente, o princípio da juridicidade da Administração (pois todo o direito serve de fundamento e é pressuposto da actividade da Administração), o que representa um consequente acréscimo de limites internos aos poderes discricionários da Administração ([43]).

O princípio da igualdade, desenvolvido no artigo 5.º, n.º 1, do CPA, vincula a Administração a adoptar igual tratamento em relação às pessoas em geral, proíbe tratamento preferencial e tratar identicamente situações não iguais ([44]).

Corolário deste princípio é o da autovinculação da Administração, por seu turno associado ao princípio da imparcialidade, que implica que os seus poderes discricionários devam ser concretizados segundo os mesmos critérios, medidas e condições relativamente a todos os particulares em idêntica situação ([45]).

O princípio da proporcionalidade implica que a Administração, no uso de poderes discricionários, deva prosseguir o interesse público em termos de justa medida, isto é, escolhendo as soluções de que decorram menos gravames, sacrifícios ou perturbações para a posição jurídica dos administrados.

Este princípio constitucional é desenvolvido no n.º 2 do artigo 5.º do CPA, o qual prescreve que «as decisões da Administração que colidam com direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares só podem afectar essas posições em termos adequados e proporcionais aos objectivos a realizar».

Como se escreve no Parecer n.º 8/96, que continuamos a acompanhar, a actuação administrativa colidente com a posição jurídica dos particulares deve ser adequada e apta à prossecução do interesse público, necessária ou exigível à satisfação daquele interesse, e proporcional em relação ao custo/benefício.

A propósito do procedimento administrativo, salientam alguns autores, que as decisões da Administração proferidas no seu âmbito não são inadequadas ou desproporcionadas em virtude de os meios procedimentais usados serem inadequados ou desproporcionados, mas porque, em razão disso, não foram considerados alguns pressupostos que o deviam ter sido, ou foram qualificados erroneamente, com a consequente ilegalidade decisória ([46]).

O citado Parecer n.º 8/96 examina, em seguida, os princípios da justiça e da imparcialidade nos seguintes termos:

«O princípio da justiça, constitucionalmente consagrado, vincula a Administração a pautar a sua actividade por determinados critérios de valor, designadamente a dignidade da pessoa humana, a efectividade dos direitos fundamentais, e os próprios princípios da igualdade e da proporcionalidade.

«Por seu turno, o princípio da imparcialidade, essencialmente respeitante às relações entre a Administração e os particulares, postula que, no conflito entre o interesse público e o interesse dos particulares, ela deve proceder com isenção na determinação do primeiro, e deve actuar com igualdade face ao segundo no quadro de critérios uniformes de prossecução daquele ou (...) o princípio da imparcialidade, essencial no quadro do procedimento administrativo, vincula a Administração a ponderar, nas suas opções, todos os interesses juridicamente protegidos envolventes do caso concreto, em termos de equidistância em relação a eles, de modo a cumprir a exigência de objectividade da decisão final.

«O CPA reporta-se a este princípio no artigo 6º, estabelecendo que a Administração, no exercício da sua actividade, deve tratar de forma justa e imparcial todos os que com ela entram em relação».

Como se afirma no Parecer n.º 35/92, de 9 de Junho de 1994, «[a] actividade administrativa será imparcial sempre que as suas decisões se determinem exclusivamente por “critérios próprios, adequados ao cumprimento das suas funções específicas no quadro da actividade geral do Estado”, os quais não podem ser substituídos ou distorcidos por influência de interesses alheios à função, sejam esses interesses pessoais do funcionário, interesses de indivíduos, de partidos políticos, ou mesmo interesses políticos concretos do Governo”» ([47]).


A garantia da imparcialidade administrativa implica, entre outras medidas, o estabelecimento de impedimentos dos titulares de órgãos e agentes da Administração para intervirem em assuntos em que tenham interesse pessoal e directo ou indirecto e a previsão de fundamentos de escusa e suspeição quando ocorra circunstância pela qual possa razoavelmente suspeitar-se da sua isenção ou da rectidão das suas condutas.

O Código do Procedimento Administrativo contempla estas garantias de imparcialidade nos artigos 44.º a 51.º, tratando, sucessivamente, os casos de impedimento e os fundamentos da escusa e da suspeição.

Os impedimentos, cujos casos o artigo 44.º do CPA prevê de modo taxativo, implicam «a proibição de os órgãos ou agentes da Administração tomarem decisões sobre assuntos em que estejam pessoalmente interessados, de forma directa ou indirecta, bem como a de celebrarem ou tomarem parte em contratos celebrados com a Administração» ([48]).

A delimitação do conceito de interesse impeditivo de intervenção no procedimento «há-de fazer-se em função de dois parâmetros: por um lado, trata-se de garantir a objectividade e utilidade pública da decisão administrativa em vista da (melhor) prossecução do interesse público, e por outro lado, de assegurar a imparcialidade e a transparência dessa decisão, face àqueles que nela estão interessados e face à colectividade em geral. O interesse aqui tido em vista é, em princípio, de natureza material, mas podem também, em certas situações, ser atendíveis interesses morais» ([49]).

O artigo 48.º do CPA dispõe sobre escusa e suspeição: o titular de órgão ou agente deve pedir dispensa de intervir no procedimento quando ocorra circunstância pela qual possa razoavelmente suspeitar-se da sua isenção ou da rectidão da sua conduta (n.º 1); com fundamento semelhante e até ser proferida decisão definitiva, pode qualquer interessado opor suspeição a titulares de órgãos ou agentes que intervenham no procedimento, acto ou contrato (n.º 2).

Sendo taxativo o elenco legal de impedimentos, constante do n.º 1 do artigo 44.º, as circunstâncias justificativas de escusa (ou dispensa) e suspeição referidas no artigo 48.º do CPA são meramente exemplificativas da cláusula geral e aberta constante do n.º 1 deste último artigo ([50]).

Tanto os impedimentos como as suspeições pressupõem a consideração da pessoa do titular do órgão ou agente da Administração; porém, para a lei, a possível parcialidade da actuação do titular do órgão ou agente não é na suspeição tão evidente e carece de juízo de aproximação administrativa à situação concreta que estiver em causa.

«Por isso – diz-se ([51]) – enquanto a situação de impedimento, a existir, se traduz na mera verificação de um pressuposto legal que conduz ao impedimento (e à invalidade do acto praticado pelo impedido) – considerando o Código que a situação de impedimento origina, em abstracto, uma perturbação no exercício da competência –, na suspeição a lei já não impõe a proibição de intervenção do titular do órgão, deixando a questão à decisão de um órgão da própria Administração, conhecedor do carácter daquele que vai agir pela Administração e dos interesses que se jogam no respectivo procedimento.

«Isto quer dizer que, se não se deu por um impedimento, que existia, a decisão final do procedimento nem por isso deixa de ser inválida; ao passo que se a escusa ou suspeição não forem declaradas, a decisão final, podendo ser impugnada com fundamento em parcialidade (desproporção ou desigualdade), não é, porém, imediata e directamente ilegal, só pelo facto de ser da autoria daquela pessoa.»


2. Estes princípios aplicam-se a toda a actividade administrativa, sendo particularmente salientes em sede de formação dos contratos administrativos, em cuja categoria se inclui o «contrato para a concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do sistema integrado de tecnologia trunking digital das redes de emergência e segurança de Portugal», objecto de adjudicação provisória pelo Despacho Conjunto n.º 219/2005.

Não obstante esse contrato se basear numa parceria público-‑privada, importa lembrar que, nos termos do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 86/2003, o lançamento da parceria deve obedecer aos «termos do procedimento prévio à contratação aplicável».

Neste contexto, há que convocar o regime que respeita à formação dos contratos de aquisição de bens e serviços, estabelecido no Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho.

Nos seus artigos 7.º a 15.º, inseridos nas disposições gerais e comuns, o Decreto-Lei n.º 197/99 apresenta o conteúdo daqueles princípios, bem como de «três princípios característicos dos procedimentos contratuais públicos – o princípio da transparência e da publicidade e o princípio da concorrência e ainda o princípio da responsabilidade ([52]).

2.1. Devem realçar-se, para a economia deste parecer, os princípios da transparência e da publicidade, consagrados no artigo 8.º, o da concorrência, a que se refere o artigo 10.º, e o da estabilidade, constante do artigo 14.º

«O critério de adjudicação e as condições essenciais do contrato que se pretende celebrar devem estar definidos previamente à abertura do procedimento e ser dados a conhecer a todos os interessados a partir da data daquela abertura» (artigo 8.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 197/99).

2.2. Relativamente ao princípio da estabilidade, o artigo 14.º do citado Decreto-Lei n.º 197/99, prescreve que «Os programas de concurso, cadernos de encargos e outros documentos que servem de base ao procedimento devem manter-se inalterados durante a pendência dos respectivos procedimentos» (n.º 1).

O princípio da estabilidade reporta-se, como se salienta no Parecer n.º 152/2002 ([53]), quer às regras do concurso, quer aos concorrentes.

Afirma-se no mesmo Parecer:

«O princípio da estabilidade objectiva ou das regras do concurso implica que a regulamentação do concurso (programa do concurso, caderno de encargos e outros documentos que lhe servem de base) deve manter-se inalterada durante a pendência do respectivo procedimento (x6).

«O princípio da estabilidade subjectiva dos concorrentes significa que quem concorre ao concurso é o concorrente com a composição com que se apresentou, isto é, como determinada entidade individual ou societária ou como um certo grupo de indivíduos ou empresas associadas(-).

«O princípio da intangibilidade ou imutabilidade das propostas de um concurso público “traduz a ideia de que com a entrega da proposta, e consequente termo do prazo de entrega das mesmas, o respectivo autor fica por ela vinculado, não a podendo alterar ou retirar” (x7).

«Significa tal princípio, por outras palavras, que com a entrega da proposta (e com o termo do “prazo do concurso”) o concorrente fica vinculado a ela e, consequentemente, já não a pode retirar nem alterar até que seja proferido o acto de adjudicação ou até que decorra o prazo da respectiva validade.»

Relacionando a regra da imutabilidade das propostas com o princípio da igualdade, observa MARCELO REBELO DE SOUSA ([54]):

«O princípio da igualdade postula o tratamento não discriminatório dos concorrentes ao longo de todo o procedimento de concurso público, que as propostas sejam apreciadas tal como são e apenas em função do respectivo mérito objectivo e que a adjudicação represente, para todos os concorrentes, um acto de opção definitiva entre as propostas apresentadas pelos concorrentes, nos exactos termos em que foram formuladas.»

Quanto maior for a vertente concursal do tipo de procedimento, maior será o rigor do princípio da imutabilidade das propostas, escreve-se ainda naquele Parecer ([55]).

2.3. O princípio da concorrência tem que ver com os princípios da igualdade, da justiça, da imparcialidade e da transparência ([56]), sendo definido no artigo 10.º, nos seguintes termos:

«Na formação dos contratos deve garantir-se o mais amplo acesso aos procedimentos dos interessados em contratar, e em cada procedimento deve ser consultado o maior número de interessados, no respeito pelo número mínimo que a lei imponha.»


3. Examinando a relevância dos princípios expostos no momento da formação do contrato e, mais concretamente, no procedimento administrativo dirigido à escolha do co-contratante, afirmou-se no Parecer n.º 134/2001 ([57]):

«Como elemento central da formação do contrato surge o procedimento administrativo dirigido à escolha do co-contratante. Entre nós, a conformação do respectivo modelo de individualização baseia-se na ideia de concorrência, o que se traduz na consagração legal, como regra geral aplicável aos contratos administrativos, da obrigatoriedade do concurso público.

«Depois de tipificar, no artigo 182.º do CPA, as diferentes formas de escolha do co-contratante – concurso público, concurso limitado por prévia qualificação, concurso limitado sem apresentação de candidaturas, negociação com ou sem publicação prévia de anúncio, ajuste directox8 –, o legislador manifesta a sua clara preferência pelo concurso público, ao estatuir, no artigo 183.º do CPA, que, “com ressalva do disposto nas normas que regulam a realização de despesas públicas ou em legislação especial, os contratos administrativos devem ser precedidos de concurso público”.

«Com FREITAS DO AMARAL, diremos que, nos contratos administrativos, “o espírito que enforma a legislação portuguesa” é “o de que a melhor forma de salvaguardar os vários interesses públicos envolvidos – realização da melhor escolha, garantia de competência, capacidade e idoneidade do co-contratante, transparência e seriedade do processo de selecção, igualdade de oportunidades dos interessados – consiste em fazer a escolha do contraente particular por meio de concurso público”x9. Por isso, defende o autor que o uso de outras modalidades de escolha do co-contratante – concurso limitado, negociação ou ajuste directo – tem de se considerar excepcionalx10. E justifica: “o concurso público, aceitando a livre competição dos interessados e não excluindo ninguém, é o sistema que melhor garante tanto o direito de livre acesso dos particulares à contratação pública, como a seriedade, transparência e isenção da escolha a efectuar pela Administração, na base de uma efectiva igualdade de oportunidades entre todos os interessados” (x11) (x12).

«(...)

«Hoje, perante a vigência de uma regra geral de obrigatoriedade de concurso público, surge como pertinente localizar a fonte desse princípio (x13).

«Neste ponto, note-se que a Constituição da República Portuguesa não contém expressamente qualquer referência à obrigatoriedade de concurso público nos contratos administrativosx14. O mais que o texto constitucional consagra é o princípio da imparcialidade, no seu artigo 266º, n.º 2, que exige “igualdade de tratamento dos interesses dos cidadãos através de um critério uniforme de prossecução do interesse público”x15, bem como uma ideia de desburocratização, expressa no seu artigo 267.º, n.º 1, de que decorre a necessidade de “transparência nos procedimentos de actuação e decisão dos serviços administrativos” (x16).

«De tudo isto poderia pretender-se retirar a imposição de um procedimento de escolha do co-contratante como o concurso público, por garantir com maior efectividade o tratamento igual de todos os interessados em contratar com a Administração e a transparência do procedimento.

«Embora não se manifeste neste sentido a generalidade da doutrina (x17), é esse o entendimento de MARGARIDA OLAZABAL CABRAL, para quem “o ambiente de publicidade inerente a todo o concurso público […] transformam-no certamente no procedimento de contratação administrativa preferido pela Constituição”, concluindo que “esta impõe um princípio geral de contratação administrativa por meio de concurso público, de tal maneira que será desde logo inconstitucional uma lei que consagre o princípio contrário” (x18).

«Em todo o caso, a autora desde logo reconhece que “há valores e princípios constitucionais que determinam que o concurso público não seja o procedimento escolhido nalguns casos”, como sucede quando “os princípios da igualdade, da imparcialidade e da transparência aliados aos deveres de boa administração se contentam com procedimentos mais flexíveis e menos formalizados” de contratação administrativa (x19).

«No entanto, não deixa a autora de admitir que do princípio da imparcialidade sempre resultaria a ilegalidade de uma actuação parcial dos agentes administrativos eventualmente decorrente da uma hipotética consagração do ajuste directo como regra de contratação (x20).

«Parece, afinal, que – independentemente da solução da querela sobre o carácter constitucional do princípio do concurso público – existe um significativo domínio de discricionariedade legislativa na fixação das regras de individualização do co-contratante, o qual legitima a dispensa de concurso público em situações justificadas, a aferir necessariamente segundo um critério de prossecução do interesse público (x21).»


4. Desta transcrição, como se sublinhou em recente pronúncia do Conselho Consultivo ([58]), «colhe-se como seu sentido primordial o de que todos os contratos administrativos, mesmo os que não estejam sujeitos a uma regulamentação específica, devem obedecer, na sua formação, a parâmetros que se deduzem, por um lado, dos princípios fundamentais da actividade administrativa, designadamente os de natureza material, consagrados no artigo 266.º da Constituição, e, por outro lado, das regras gerais sobre contratos administrativos acolhidas no Código do Procedimento Administrativo.

«São, assim, de atender os princípios constitucionais da prossecução do interesse público e do respeito dos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares, da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé. E deve tomar-
-se em consideração que, em matéria de contratos administrativos, o CPA assenta num princípio de concorrência, conferindo preferência ao concurso público.


«Aliás, note-se que o Decreto-Lei n.º 197/99 só afasta a aplicação dos Capítulos III e seguintes do diploma aos contratos excepcionados identificados no Capítulo II – e não das «Disposições gerais comuns», constantes do Capítulo I, que incluem, designadamente, os princípios enunciados na Secção II do Capítulo I (legalidade, prossecução do interesse público, transparência, publicidade, igualdade, concorrência, imparcialidade, proporcionalidade, boa fé, estabilidade, responsabilidade), os quais constituem emanação dos princípios constitucionais e legais mencionados ([59]).

«Isto não impede, como vimos, a dispensa de concurso público em situações justificadas, a aferir necessariamente segundo um critério de prossecução do interesse público.»

O artigo 77.º, n.º 1, alínea i), do Decreto-Lei n.º 197/99, preceitua que não estão sujeitos ao disposto nos seus capítulos seguintes os contratos «que, nos termos da lei, sejam declarados secretos ou cuja execução deva ser acompanhada de medidas especiais de segurança, ou quando a protecção dos interesses essenciais de segurança do Estado Português o exigir». Nos termos do n.º 2, do preceito, esta excepção «deve ser reconhecida em despacho fundamentado do respectivo ministro».

Quanto ao regime dos contratos cuja execução deva ser acompanhada de medidas especiais de segurança, concluiu-se no Parecer n.º 9/2005 pela admissibilidade de os mesmos serem celebrados por ajuste directo ou, por maioria de razão, através de outra modalidade mais exigente que o ajuste directo e menos exigente que o concurso público ([60]).

VIII

Seleccionados e coligidos os factos considerados pertinentes em função do objecto da consulta e reunido o quadro normativo que se entende aplicável, é tempo de tomar as opções juridicamente recomendáveis sobre a questão de saber «se há razão determinante para a anulação do concurso e se tal é legalmente admissível».


1. A tarefa enunciada aconselha que, previamente, se teçam algumas considerações, ainda que em termos necessariamente sumários, sobre o regime da invalidade dos actos administrativos ([61]).

A ilegalidade dos actos administrativos – violação do bloco da legalidade – determina, como consequência, o desvalor dos actos administrativos que assume formas específicas consubstanciadas em vícios sancionáveis sob diferentes formas.

Como escreve PAULO OTERO, «a ordem jurídica cria graus ou níveis diferentes de desvalor jurídico para a violação da legalidade, revelando, deste modo, que nem toda a desconformidade da actuação administrativa face à lei tem o mesmo sancionamento ou a mesma gravidade dentro do contexto do sistema jurídico: (i) existem desconformidades geradoras de ilegalidade que são toleráveis, reconhecendo-lhes a ordem jurídica a susceptibilidade de produzirem todos os efeitos jurídicos como se os respectivos actos fossem válidos e, salvo se forem revogados ou anulados judicialmente dentro de certo prazo, o simples decurso do tempo permite que se tornem inatacáveis com o argumento da sua desconformidade face à legalidade (-); (ii) existem desconformidades cuja legalidade gerada é, pelo contrário, intolerável, negando a ordem jurídica a tais actos a produção de quaisquer efeitos jurídicos, sem prejuízo de, por decurso do tempo, poder reconhecer, segundo exigências ditadas pela tutela dos valores segurança e confiança, alguns efeitos jurídicos a meras situações de facto criadas à sombra de tais actos; (iii) existem desconformidades, por último, em que a gravidade da ilegalidade é considerada em termos tais que a ordem jurídica se recusa a aceitar ou a identificar qualquer configuração jurídica mínima a esses actos e aos seus pretensos efeitos, banindo ambos do mundo do Direito ([62]).

O Autor referencia, sucessivamente, as três formas de invalidade, correspondentes a graus diferentes de desvalor da actuação administrativa: a anulabilidade, a nulidade e a inexistência jurídica. O regime jurídico desta última forma de invalidade assemelha-se bastante ao da nulidade, aplicando-se-lhe, como princípio geral, o regime da nulidade ([63]).

As formas da invalidade – nulidade e anulabilidade – e respectivo regime estão contempladas nos artigos 133.º a 136.º do CPA.

A nulidade constitui um desvalor excepcional, sendo a anulabilidade configurada como o desvalor-regra ou forma de invalidade típica da actuação administrativa desconforme com a legalidade ([64]), como resulta do artigo 135.º do CPA:

«São anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção.»

A determinação dos actos nulos é feita no artigo 133.º do CPA. No seu n.º 1 referenciam-se os casos de nulidade por natureza; no n.º 2, enumeram-se, exemplificativamente, casos de nulidade.

Assim, são nulos:

(i) Os actos a que falte qualquer dos elementos essenciais;
(ii) Os actos para os quais uma norma legal comine expressamente essa forma de invalidade;
(iii) Os actos contidos na enumeração casuística do n.º 2 do citado artigo 133º:

– Os actos viciados de usurpação de poder;
– Os actos estranhos às atribuições dos ministérios ou das pessoas colectivas referidas no artigo 2.º [do CPA] em que o seu autor se integre;
– Os actos cujo objecto seja impossível, ininteligível ou constitua um crime;
– Os actos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental;
– Os actos praticados sob coacção;
– As deliberações de órgãos colegiais que forem tomadas tumultuosamente ou com inobservância do quórum ou da maioria legalmente exigidos;
– Os actos que ofendam os casos julgados;
– Os actos consequentes de actos administrativos anteriormente anulados ou revogados, desde que não haja contra-interessados com interesse legítimo na manutenção do acto consequente.

Deparando-nos na situação que suscitou esta consulta com um procedimento visando a celebração de um contrato de fornecimento de bens ou serviços ao Estado, cuja adjudicação provisória foi decidida por dois membros titulares de órgão de soberania (Governo), afigura-se-nos pertinente convocar os casos de nulidade tipificados na Lei n.º 64/93, de 26 de Agosto ([65]), sobre o regime jurídico das incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos.

No seu artigo 14.º, esta Lei determina a nulidade dos actos praticados em infracção ao disposto nos artigos 8.º, 9.º e 9.º-A, que se transcrevem:
«Artigo 8.º
Impedimentos relativos a sociedades

1 – As empresas cujo capital seja detido numa percentagem superior a 10% por um titular de órgão de soberania ou titular de cargo político, ou por alto cargo público, ficam impedidas de participar em concursos de fornecimento de bens ou serviços, no exercício de actividade de comércio ou indústria, em contratos com o Estado e demais pessoas colectivas públicas.
2 – Ficam sujeitas ao mesmo regime:
a) As empresas de cujo capital, em igual percentagem, seja titular o seu cônjuge, não separado de pessoas e bens, os seus ascendentes e descendentes em qualquer grau e os colaterais até ao 2.º grau, bem como aquele que com ele viva nas condições do artigo 2020.º do Código Civil;
b) As empresas em cujo capital o titular do órgão ou cargo detenha, directa ou indirectamente, por si ou conjuntamente com os familiares referidos na alínea anterior, uma participação não inferior a 10%.
Artigo 9.º
Arbitragem e peritagem

1 – Os titulares de cargos políticos e altos cargos públicos estão impedidos de servir de árbitro ou de perito, a título gratuito ou remunerado, em qualquer processo em que seja parte o Estado e demais pessoas colectivas públicas.
2 – O impedimento mantém-se até ao termo do prazo de um ano após a respectiva cessação de funções.
Artigo 9.º-A
Actividades anteriores

1 – Sem prejuízo das disposições adequadas do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-
-Lei n.º 6/96, de 31 de Janeiro, os titulares de órgãos de soberania, de cargos políticos e de altos cargos públicos que, nos últimos três anos anteriores à data da investidura no cargo, tenham detido, nos termos do artigo 8.º, a percentagem de capital em empresas neles referida ou tenham integrado corpos sociais de quaisquer pessoas colectivas de fins lucrativos não podem intervir:

a) Em concursos de fornecimento de bens ou serviços ao Estado e demais pessoas colectivas públicas aos quais aquelas empresas e pessoas colectivas sejam candidatos;
b) Em contratos do Estado e demais pessoas colectivas com elas celebrados;
c) Em quaisquer outros procedimentos administrativos, em que aquelas empresas e pessoas colectivas intervenham, susceptíveis de gerar dúvidas sobre a isenção ou rectidão da conduta dos referidos titulares, designadamente nos de concessão ou modificação de autorizações ou licenças, de actos de expropriação, de concessão de benefícios de conteúdo patrimonial e de doação de bens.
2 – O impedimento previsto no número anterior não se verifica nos casos em que a referida participação em cargos sociais das pessoas colectivas tenha ocorrido por designação do Estado ou de outra pessoa colectiva pública.»


2. Não se ignora que em órgãos da comunicação social e a propósito da adjudicação provisória, decidida no Despacho Conjunto n.º 219/2005, foram referenciadas situações que, se se confirmassem, poriam em causa a imagem de objectividade e de seriedade que os órgãos e titulares da Administração devem guardar, podendo, ademais, traduzir violação do princípio da imparcialidade, com o inerente vício daquele acto administrativo, gerador da sua invalidade.

Examinando o acervo documental desta consulta, cuja composição já foi a seu tempo referida, e recordando que o Conselho Consultivo carece de competência para investigar matéria de facto, não se evidencia – face aos elementos de facto facultados – uma actuação administrativa violadora do princípio da imparcialidade em qualquer das suas assinaladas dimensões.


3. Interessa, de seguida, determinar da adequação do procedimento relativo à contratação da concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do SIRESP com os demais princípios expostos e com as normas substantivas e processuais, sobre as parcerias público-privadas, contidas no Decreto-Lei n.º 86/2003.

Quanto ao cumprimento das normas estabelecidas para as parcerias público-privadas, esse procedimento, tanto quanto se retira dos elementos enviados, cumpriu as normas de cunho processual contidas nos artigos 8.º e 9.º daquele diploma legal.


4. Questão muito mais relevante, consistirá em saber se se verificam no caso os pressupostos estabelecidos no artigo 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 86/2003, nomeadamente aquele que nesta matéria, assume, indiscutivelmente, fundamental importância. Trata-se do requisito contemplado na alínea c) daquele preceito. Interessa avaliar e determinar se a configuração da parceria a estabelecer por via do contrato provisoriamente adjudicado «representa para o parceiro público [Estado Português] vantagens relativamente a formas alternativas de alcançar os mesmos fins». Essa comparação e avaliação, em que sobressaem aspectos de natureza financeira, tomará por base, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 16.º da Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto ([66]) – lei de enquadramento orçamental – (preceito para o qual aquele remete), um programa alternativo visando a obtenção dos mesmos objectivos com exclusão de financiamentos ou de exploração a cargo de entidades privadas. Interessa, afinal, proceder, após a ponderação de um vasto número de variáveis, a uma comparação entre as vantagens de uma opção exclusivamente a cargo da Administração e as que podem obter-se através de uma associação a parceiro(s) privado(s).

Refira-se que este pressuposto deve ser especificamente ponderado, quer pela comissão de avaliação das propostas, quer no momento da prolação do despacho conjunto de adjudicação, nos termos, respectivamente, do n.º 2 do artigo 9.º, e do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-‑Lei n.º 86/2003.

Também os aspectos que se reportam à distribuição ou partilha dos riscos das entidades pública e privada envolvidas na parceria devem ser especialmente identificados e ponderados nas diversas vertentes enunciadas nas várias alíneas do artigo 7.º

A Comissão de Avaliação de propostas considerou «verificada a conformidade com as disposições legais aplicáveis à contratação de parcerias público-privadas, nomeadamente no que respeita ao disposto nos artigos 6.º, n.º 1, e 7.º do Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril», destacando a ocorrência dos pressupostos e a partilha dos riscos implicados ([67]).

A não ser que, eventualmente, a Inspecção-Geral de Finanças, cuja intervenção foi solicitada, venha a exprimir entendimento diferente sobre as questões financeiras emergentes deste processo e demonstrar a falta do pressuposto acima destacado, o que geraria a ilegalidade da parceria, por vício da violação de lei, propendemos para considerar, com base nos elementos documentais que acompanham o pedido de consulta, não se evidenciar a carência dos pressupostos legalmente estabelecidos para a implementação de uma parceria público-privada neste contrato.

O próprio Tribunal de Contas, no exercício das suas atribuições em sede de fiscalização prévia, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 46º, n.º 1, alínea b), e 5º, n.º 1, alínea c), da Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto (Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas), não deixará de fiscalizar a legalidade do contrato adjudicado ([68]).


5. Como oportunamente se deu conta, o Ministro da Administração Interna decidiu excepcionar das regras procedimentais da contratação, previstas no Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho, os contratos relativos à concepção, fornecimento e manutenção do sistema integrado de tecnologia trunking digital para as Redes de Emergência e Segurança de Portugal. Fê-
-lo, com invocação do disposto no n.º 2 do artigo 77.º daquele Decreto-Lei, com referência à alínea
i) do n.º 1 da mesma disposição legal, tendo em consideração, nomeadamente, as funcionalidades do sistema a implementar e os interesses essenciais de segurança envolventes. Com efeito, como se refere no respectivo Despacho ([69]), o sistema destina-se, «entre outras funções, a assegurar as necessidades de comunicações móveis das Forças Armadas, das Forças de Segurança e restantes autoridades e serviços responsáveis pela emergência e segurança interna», sendo que uma parte fundamental das comunicações interessam à segurança interna e externa do Estado.

Por outro lado, consignou-se ali também, «a particular complexidade e especificidade da contratação do SIRESP face ao interesse público em presença, que envolve interesses essenciais de segurança do Estado Português, aconselha a que seja adoptado, para aquela contratação, um procedimento excepcional ao abrigo da alínea i) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 77.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho».

Atendendo ao objecto do contrato presente na consulta, os fins que se visam alcançar e o universo e natureza das entidades que vão partilhar o SIRESP (cfr. n.º 2 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 56/2003), não é difícil aceitar que estamos perante uma das situações prevenidas no citado artigo 77.º, n.º 1, alínea i), que justificam a sua não sujeição, nos termos já referidos, às regras procedimentais de contratação previstas naquele diploma.

Estando, ademais, aquele despacho ministerial devidamente fundamentado, concluímos pela legalidade do recurso ao tipo de procedimento adoptado – convite para apresentação de propostas endereçado «a cinco entidades idóneas e com capacidade técnica, económica e financeira reconhecidas com inclusão de uma fase de negociações com o concorrente que apresentar a proposta melhor classificada» ([70]).


6. Como dão nota os relatórios da Comissão de Avaliação de propostas, de 17 de Novembro de 2003 e de 14 de Fevereiro de 2005, foi apresentada no «Procedimento relativo à contratação da concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do SIRESP» uma única proposta. Em face da pontuação obtida, essa proposta foi considerada inadequada pela Comissão de Avaliação. Não obstante, este órgão entendeu que, «apesar da avaliação efectuada à Proposta, não deverá, desde já ser excluída a hipótese de, em fase de negociações, se virem a obter do Proponente as condições técnicas e financeiras necessárias à satisfação do interesse público em matéria de comunicações de emergência e de segurança» ([71]).

Na sequência de convite efectuado, nesse sentido, pela Comissão de Avaliação, o consórcio proponente procedeu à reformulação da sua proposta nos aspectos, de cariz técnico e financeiro, em que apresentava maior vulnerabilidade. No final, a Comissão de Avaliações considerou que foram «corrigidas as fragilidades», podendo «referir-se que, de uma maneira geral, o sistema proposto satisfaz adequadamente os requisitos técnicos constantes nas especificações do Caderno de Encargos, não apresentando nenhuma deficiência significativa». Quanto aos termos e condições económico-financeiros obtidos em sede de negociação, entendeu a Comissão que «os mesmos consubstanciam uma solução adequada para o desenvolvimento do Sistema em regime de parceria público-privada» ([72]).

A situação exposta poderia suscitar a questão de saber se não terá sido infringido o princípio da estabilidade reportado à regra da intangibilidade ou da imutabilidade das propostas em procedimento concursal, pretendendo-se significar que com a entrega da proposta o concorrente fica vinculado a ela e, consequentemente, já não a pode retirar nem alterar até que seja proferido o acto de adjudicação ou até que decorra o prazo da respectiva validade».

Afigura-se-nos que não. Muito embora o n.º 26.1. do Programa de Procedimento se refira à situação «normal» de um procedimento verdadeiramente concursal (em que figurem, portanto, dois ou mais proponentes), prevendo, nesse contexto, uma fase de negociações com o proponente cuja proposta tenha sido mais bem avaliada, não se descortina impedimento à sua aplicação no caso de participação de um único proponente.

O princípio da imutabilidade das propostas deve ser aferido com o concreto tipo de procedimento. Como já se sublinhou, quanto maior for a sua vertente concursal, maior será o rigor do princípio da imutabilidade das propostas. A exigência da imutabilidade ou da intangibilidade das propostas decorre do princípio da concorrência que «postula a consideração dos concorrentes a determinado concurso como opositores uns dos outros, por forma a que compitam entre si e sejam avaliados, bem como as respectivas propostas, sempre e apenas pelo seu mérito relativo, em confronto com um padrão ou padrões iniciais imutáveis» ([73]).

Uma vez que só um proponente se apresentou e porque não se evidencia alteração das regras do procedimento, constantes no respectivo Programa e no Caderno de Encargos, concluímos pela não violação daquele princípio.

IX

No Despacho em que se solicita a intervenção do Conselho Consultivo, no âmbito mais vasto da «apreciação jurídica deste processo», a que temos vindo a proceder, suscita-se a questão relativa à «competência circunstancial do anterior Governo para proferir o Despacho Conjunto n.º 219/2005, de 23 de Fevereiro».


1. Os subscritores do Despacho Conjunto n.º 219/2005, à data da sua prolação, integravam o XVI Governo Constitucional, que se achava na situação de demitido, por força do Decreto do Presidente da República n.º 100-A/2004, de 13 de Dezembro, decorrente do pedido de demissão apresentado pelo Primeiro-Ministro.

Esse Governo manteve-se nessa situação até 12 de Março de 2005, data da exoneração do Primeiro-Ministro, operada pelo Decreto do Presidente da República n.º 18/2005, de 12 de Março, e da nomeação e posse do Primeiro-Ministro do XVII Governo Constitucional, aquela efectivada pelo Decreto do Presidente da República n.º 19/2005, de 12 de Março, na sequência das eleições de 20 de Fevereiro de 2005.

O artigo 186.º da Constituição prescreve:
«Artigo 186.º
Início e cessação de funções

1 – As funções do Primeiro-Ministro iniciam-se com a sua posse e cessam com a sua exoneração pelo Presidente da República.
2 – As funções dos restantes membros do Governo iniciam-se com a sua posse e cessam com a sua exoneração ou com a exoneração do Primeiro-Ministro.
3 – As funções dos Secretários e Subsecretários de Estado cessam ainda com a exoneração do respectivo Ministro.
4 – Em caso de demissão do Governo, o Primeiro-Ministro do Governo cessante é exonerado na data da nomeação e posse do novo Primeiro-Ministro.
5 – Antes da apreciação do seu programa pela Assembleia da República, ou após a sua demissão, o Governo limitar-se-á à prática dos actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos.» ([74])

Desta disposição, interessa destacar o disposto no n.º 5, na parte em que determina que, «após a sua demissão, o Governo limitar-se-á à prática dos actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos».


2. A propósito da delimitação das competências de um Governo de gestão, sem base presidencial ou parlamentar de confiança, JORGE MIRANDA, antes da introdução do n.º 5 na revisão de 1982 ao então artigo 189.º da Constituição (correspondente ao actual artigo 186.º), escrevia que tal Governo «não pode adoptar directrizes ou providências que correspondam a uma nova definição política do país», sem que, todavia, isso implique confiná-lo à mera função administrativa ([75]). E o Autor acrescenta que «[a] priori, nada impede, com efeito, que o Governo pratique actos da função política ou da função legislativa (-) e o princípio da continuidade do Estado, designadamente na ordem internacional, poderá mesmo exigi-lo. Não é a natureza jurídica das competências que conta, é o alcance político dos actos em concreto (...) atentas as necessidades do país» ([76]).

No mesmo quadro legislativo, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA ([77]), mais restritivamente, afirmavam sobre esta matéria:

«O Governo demitido que se mantém transitoriamente em funções está sujeito a verdadeiros limites jurídicos implícitos quanto à sua competência. Os membros do Governo demitido devem limitar-se a despachar os negócios correntes e a praticar actos de administração ordinária.»


3. Os «Governos demitidos», os «Governos sem programa apreciado» e os «Governos demissionários» constituem para FREITAS DO AMARAL modalidades do designado «Governo de gestão», definido como o «Governo Constitucional sujeito a um regime jurídico especial, e designadamente a uma substancial limitação de competência, em virtude da sua demissão ou da falta de apreciação parlamentar do seu programa» ([78]).

Para o mesmo Autor os Governos demitidos correspondem aos «Governos que foram objecto de um acto formal de demissão praticado pelo Presidente da República» ([79]).

Face ao disposto no n.º 5 do artigo 186º da Constituição, acima reproduzido, FREITAS DO AMARAL, tomando por base o critério das funções do Estado, conclui que «os Governos de gestão devem poder praticar todos os actos compreendidos na função administrativa, excepção feita aos chamados actos de alta administração ou de administração extraordinária, que só serão legítimos em caso de urgência» ([80]).

No enquadramento da competência dos Governos de gestão, este Autor distingue os actos absolutamente proibidos, os actos genericamente permitidos e os actos relativamente proibidos.

Nos actos absolutamente proibidos têm cabimento vários tipos de actos, seja qual for a função do Estado em que se integrem: (i) os actos de execução do programa do Governo; (ii) os actos contraditórios com os fundamentos da demissão; (iii) os actos que traduzam uma inovação política fundamental ou comportem uma limitação significativa da liberdade de decisão do Governo seguinte; (iv) os actos de utilização de autorizações legislativas; (v) de um modo geral, todos os actos que não possam ser qualificados, em face da Constituição, como «actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos».

Nos actos genericamente permitidos incluem-se os actos da função administrativa, com excepção dos actos de alta administração ou de administração extraordinária.

Nos actos relativamente proibidos integram-se os actos em princípio proibidos, mas que, a título excepcional, e em determinadas condições, devem ser considerados permitidos: (i) os actos de alta administração, ou de administração extraordinária; (ii) os actos políticos e legislativos em geral que não sejam absolutamente proibidos ([81]).

Quanto aos actos relativamente proibidos, FREITAS DO AMARAL considera que a sua prática por um Governo de gestão estará legitimada desde que se verifiquem as seguintes condições: (i) a necessidade do acto a praticar; (ii) a urgência da sua prática; (iii) a fundamentação expressa daquela necessidade e desta urgência ([82]).

Como ponderam ANTÓNIO DUARTE SILVA e MIGUEL LOBO ANTUNES ([83]), «a determinação da competência do Governo de gestão ficou-se por uma fórmula simultaneamente maleável (pode praticar os actos de todas as funções) e condicionada por um duplo limite (a sua competência está limitada pela estrita necessidade, por um lado, e pela gestão dos negócios públicos, por outro]».

Por sua vez, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA afirmam que o conceito de estrita necessidade «é suficientemente enfático para exigir uma definição bastante exigente», apontando para esse efeito dois índices: «(a) importância significativa dos interesses em causa, em tais termos que a omissão do acto afectasse de forma relevante a gestão dos negócios públicos; (b) inadiabilidade, ou seja, impossibilidade de, sem grave prejuízo, deixar a resolução do assunto para o novo Governo (...)» ([84]).

Para FREITAS DO AMARAL, como vimos, «o conceito da necessidade estrita corresponde à noção de urgência – a qual no contexto, deve ser definida como a necessidade instante de praticar um certo acto, em termos de o seu adiamento para data ulterior comprometer gravemente a realização do interesse público» ([85]).

Debruçando-se sobre a estrita necessidade do acto a praticar, o Tribunal Constitucional tem feito corresponder tal conceito essencialmente aos de inadiabilidade ou urgência: «perante certa situação dos negócios públicos, o Governo terá naquela altura de dar um acto de resposta» ([86]).

A doutrina acentua ainda que, para os efeitos do n.º 5 do artigo 186.º da Constituição, não basta a invocação abstracta de uma qualquer urgência teórica, exigindo-se «uma urgência concreta e datada, isto é, assente na demonstração de que, em função da presumível duração da crise, não é possível, sem prejuízo grave para o interesse público, esperar pela data provável da plena operacionalidade do Governo» ([87]), o que pressupõe a fundamentação expressa da necessidade do acto e da urgência da sua prática ([88]).

Vigora, assim, no ordenamento constitucional português o princípio da limitação da competência do Governo demitido.

Isto significa que o Governo demitido deve, em regra, abster-se de actuar e só poderá praticar validamente os actos cujo adiamento possa prejudicar gravemente o interesse público.

Temos, desta forma, e em primeiro lugar, que a urgência pressuposta no n.º 5 do artigo 186.º da Constituição é um conceito jurídico, não um conceito empírico: não se trata de aceitar, em termos voluntaristas, que, face ao atraso do País, qualquer acto que implique progresso ou desenvolvimento, é um acto urgente; trata-se, sim, de, em termos jurídicos, acorrer a uma necessidade «instante», ou de reconhecer uma urgência especial, qualificada, que apenas compreende os actos que não podem de todo em todo, sem prejuízo grave para o interesse público, esperar pelo início de funções do novo Governo [aqui não são indiferentes tanto o «horizonte de vida» ([89]) do Governo de gestão como a proximidade da entrada em funções do novo Governo].

Em segundo lugar, tratando-se de acto integrado num procedimento, a urgência tem de se encontrar objectivamente alicerçada no procedimento ou, pelo menos, no caso de procedimentos do tipo do aqui analisado, no despacho conjunto que procedeu à adjudicação.

Por fim, a urgência há-de aferir-se também tendo em conta o carácter vinculado ou discricionário do acto em causa, pois a existência de vinculações (absolutas ou tendenciais) e a inexistência de escolha descaracterizam ou esbatem a premência da sua prática ([90]).


4. Convirá, então, recordar o procedimento relativo à contratação da concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do SIRESP, o qual se pode sintetizar nos termos seguintes:

a) A Resolução do Conselho de Ministros n.º 88/99, de 12 de Agosto, reconheceu a vital importância de garantir a interoperacionalidade das comunicações de emergência e de segurança, afirmando ser «aconselhável a instalação e utilização de uma infra-estrutura única que sirva de suporte às radiocomunicações das diversas entidades com atribuições nos domínios assinalados, em detrimento da multiplicidade de redes actualmente existentes»;

b) A Resolução do Conselho de Ministros n.º 26/2002, de 5 de Fevereiro, realça «o carácter de urgência da definição dos parâmetros que permitirão a concretização em tempo útil da Rede Nacional de Emergência e Segurança», estabelecendo-se ainda que «toda a infra-estrutura tecnológica básica do SIRESP — Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal deverá ser instalada em duas fases e durante cinco anos;

c) A Resolução do Conselho de Ministros n.º 56/2003, de 8 de Abril, procedeu à redefinição das condições de instalação do SIRESP de forma a assegurar a sua implementação em tempo útil, estabelecendo «que toda a infra-estrutura tecnológica básica do SIRESP seja instalada de forma faseada, durante seis anos; na primeira fase, a executar em 2003 e 2004, serão instaladas estações de base e toda a infra-estrutura básica correspondente às zonas urbanas e suburbanas das cidades de Lisboa, Porto, Braga, Guimarães, Coimbra, Aveiro, Leiria e Faro; nas fases seguintes, a executar entre 2005 e 2008, será finalizada a cobertura dos distritos de Lisboa, Porto, Braga, Coimbra, Aveiro, Leiria e Faro, e instaladas, de acordo com o cenário de implementação a adoptar, as demais estações de base, bem como toda a infra-estrutura prevista nos restantes distritos do continente» (n.º 8);

d) Em 30 de Abril de 2003, pelo Despacho Conjunto n.º 606/2003, da Ministra de Estado e das Finanças e do Ministro da Administração Interna (Diário da República, II Série, n.º 118, de 22 de Maio de 2003), foi «constituída a comissão de acompanhamento do projecto de parceria público-privada para a aquisição, a instalação e a manutenção do SIRESP»;

e) Em 9 de Julho de 2003, pelo Despacho Conjunto n.º 734/2003, das mesmas entidades ministeriais (Diário da República, II Série, n.º 173, de 29 de Julho de 2003), foram aprovadas as «condições de lançamento da parceria constantes do programa de procedimento, caderno de encargos e estudo estratégico e económico-financeiro da parceria público-privada para a implementação do Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal»; saliente-se que, a fls. 15 do Caderno de Encargos, ponto 26.2, estipula-se que «a entrada em serviço da fase referida no artigo 25.1 [onde são mencionadas as zonas urbanas e suburbanas das cidades de Lisboa, Porto, Braga, Guimarães, Coimbra, Aveiro, Leiria e Faro] deverá verificar-se, impreterivelmente, até ao termo do mês de Abril de 2004», logo se acrescentando, a fls. 33 do mesmo Caderno (Secção B – descrição do sistema a implementar), ponto 1.3., alínea k, que «[n]o que se refere à primeira fase da implementação da rede, tendo em conta o seu âmbito, deve ser dada especial atenção à cobertura das zonas urbanas ou suburbanas em que se encontram implantados estádios onde vai ser disputado o EURO 2004»;

f) Em 9 de Julho de 2003, por Despacho do Ministro da Administração Interna, foi reconhecido que «[a] particular complexidade e especificidade da contratação do SIRESP face ao interesse público em presença, que envolve interesses essenciais de segurança do Estado Português, aconselha a que seja adoptado, para aquela contratação, um procedimento excepcional ao abrigo da alínea i) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 77.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho, tendo sido aprovado um procedimento que envolvia um convite para apresentação de propostas a cinco entidades idóneas e uma capacidade técnica, económica e financeira reconhecidas, e incluía uma fase de negociações com o concorrente que apresentar a proposta melhor classificada;

g) Em 10 de Julho de 2003, foram convidadas a apresentar «Proposta» a Siemens, a EADS, a OTE, a Nokia e a Motorola;

h) Em 25 de Julho de 2003, pelo Despacho Conjunto n.º 758/2003, (Diário da República, II série, n.º 184, de 11 de Agosto de 2003), foi constituída a comissão de avaliação de propostas para a parceria público-privada em causa;

i) A solicitação dos interessados, o prazo para apresentação das propostas, cujo termo ocorreria em 1 de Setembro de 2003, foi prorrogado até ao dia 15 do mesmo mês;

j) Realizado o acto de abertura das propostas, foi constatado que apenas foi recebida uma única proposta apresentada pelo consórcio constituído pelas sociedades MOTOROLA, Inc., PT VENTURES, SGPS, S.A., SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A., DATACOMP – Sistemas de Informática, S.A., e ESEGUR – Empresa de Segurança, S.A.;

l) Em 17 de Novembro de 2003, apreciada a proposta apresentada nas suas vertentes técnica, jurídica e financeira, a Comissão de Avaliação considerou que «[f]ace às pontuações atribuídas, a Proposta, nos exactos termos em que é apresentada, revela-se inadequada ao interesse público a prosseguir», no entanto, pronunciou-se no sentido de que não deveria ser excluída a hipótese de, em fase de negociações, se virem a obter do Proponente as condições técnicas e financeiras adequadas à satisfação do interesse público em matéria de comunicações de emergência e de segurança;

m) Esse entendimento da Comissão de Avaliação mereceu a concordância do Ministro da Administração Interna e da Ministra de Estado e das Finanças, em despachos datados, respectivamente, de 19 de Novembro de 2003 e de 7 de Janeiro de 2004;

n) Na sequência, foi encetada uma fase de negociações, tendo sido entregue ao Proponente um documento intitulado «Convite à reformulação da Proposta apresentada pelo Consórcio», onde a Comissão de Avaliação indicou os tópicos sobre os quais aquela reformulação deveria incidir;

o) Em 14 de Fevereiro de 2005, a Comissão de Avaliação considera estar «verificada a conformidade com as disposições legais aplicáveis à contratação de parcerias público-privadas, nomeadamente no que respeita ao disposto nos artigos 6.º, n.º 1, e 7.º do Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril» e propõe a adjudicação do Contrato de Gestão para a Concepção, Projecto, Fornecimento, Montagem, Construção, Gestão e Manutenção do Sistema Integrado de tecnologia trunking digital das Redes de Emergência e Segurança de Portugal ao consórcio indicado na alínea j), no valor global de 538,2 milhões de euros»;

p) Em 23 de Fevereiro de 2005, o Despacho Conjunto n.º 219/2005, do Ministro das Finanças e da Administração Pública e do Ministro da Administração Interna (Diário da República, II série, n.º 48, de 9 de Março de 2005), aprovou as conclusões do Relatório da Comissão de Avaliação, adjudicando o referido contrato ao consórcio proposto.


5. A análise detalhada do procedimento atinente à contratação da concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do SIRESP, evidencia apenas uma urgência concreta e datada relativa à implementação dessa infra-estrutura, qual seja a da realização em Portugal do Campeonato Europeu de Futebol (EURO 2004); por isso, o Caderno de Encargos estipulava que a entrada em serviço da fase referida no artigo 25.1 [locais onde se encontravam implantados os estádios do EURO 2004] deveria verificar-se, impreterivelmente, até ao termo do mês de Abril de 2004.

O certo é que esse objectivo não se concretizou, tendo deixado de subsistir, com o encerramento do EURO 2004, a única razão invocada para a urgência do procedimento de contratação ([91]).

Por outro lado, também o Despacho Conjunto n.º 219/2005 não aduz razões justificativas convincentes no sentido de que o acto de adjudicação em apreço era inadiável.

Na verdade, refere o mencionado despacho que «o adiamento da presente adjudicação da parceria público-privada poderia causar inevitáveis atrasos na implementação do SIRESP, comprometendo irremediavelmente a sua conclusão no prazo estabelecido no n.º 8 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 56/2003, de 8 de Abril»; contudo, nesse preciso n.º 8 ([92]), referia-se que a infra-estrutura tecnológica básica do SIRESP seria instalada de forma faseada, durante seis anos, prevendo-se que, na primeira fase, a executar em 2003 e 2004, seriam instaladas estações de base e toda a infra-‑estrutura básica correspondente às zonas urbanas e suburbanas das cidades de Lisboa, Porto, Braga, Guimarães, Coimbra, Aveiro, Leiria e Faro, e nas fases seguintes, a executar entre 2005 e 2008, seria finalizada a cobertura dos distritos de Lisboa, Porto, Braga, Coimbra, Aveiro, Leiria e Faro, e instaladas, de acordo com o cenário de implementação a adoptar, as demais estações de base, bem como toda a infra-estrutura prevista nos restantes distritos do continente. Nesta conformidade, na data em que foi proferido o Despacho Conjunto n.º 219/2005, já não era possível instalar o SIRESP nos prazos assinalados no invocado n.º 8, pelo que não se poderá aceitar semelhante justificação para qualificar a atinente adjudicação como de natureza imprescindível e inadiável.

O mesmo se deve dizer do alegado atraso na coordenação dos bombeiros no combate aos fogos florestais, já que, como bem se demonstrou, os locais elegidos como prioritários no n.º 8 da citada Resolução do Conselho de Ministros n.º 56/2003, correspondiam às zonas urbanas e suburbanas das cidades (situadas predominantemente no litoral) onde se realizariam os jogos de futebol no âmbito do EURO 2004, pelo que a dimensão operacional relativa ao combate de fogos florestais (que ocorrem sobretudo no interior do País) não poderá ser considerada como relevante para considerar a questionada adjudicação como urgente e inadiável.

Cumpre, aliás, realçar que a referência aos bombeiros e ao combate aos fogos florestais surgiu pela primeira vez no despacho de adjudicação, sem nunca ter sido referenciada ao longo do procedimento como razão justificadora da urgência.

Ademais, assinalar-se-á que não existe qualquer relação directa entre o SIRESP e o combate aos fogos florestais que permita concluir que o não accionamento inadiável do sistema seja directamente causador de grave dano para o interesse público.

Ainda para fundamentar a urgência da adjudicação, o Despacho Conjunto n.º 219/2005 refere que a Resolução do Conselho de Ministros n.º 26/2002, de 5 de Fevereiro, já havia reconhecido carácter de urgência à viabilização, em tempo útil, da Rede Nacional de Emergência e Segurança.

No entanto, releva destacar que a Resolução do Conselho de Ministros n.º 26/2002, de 5 de Fevereiro, não reconhece carácter de urgência à instalação da Rede Nacional de Emergência e Segurança, mas sim, à «definição dos parâmetros que permitirão a concretização em tempo útil» [cfr. supra, 2. b) e preâmbulo da resolução].

De todo o modo, e considerando a avaliação em concreto da situação, não se vê justificação plausível para não se aguardar pelo início de funções do novo Governo, previsto para pouco tempo depois, tanto mais que a operacionalidade do SIRESP não seria imediata – na verdade, no prazo de trinta dias contados da data de assinatura do contrato, a operadora submete à aprovação da Entidade Gestora um plano de gestão do projecto; para o arranque e aceitação provisória decorre ainda mais um prazo de 3 meses; há lugar a ensaios e a provas; e terá de haver recepção e aceitação de cada fase do sistema, bem como acções de formação para o pessoal (fls. 15-18 do caderno de encargos).

Poderá, neste contexto, falar-se, não tanto no princípio da continuidade do Estado, como, face aos contornos da situação presente, no princípio da continuidade do serviço público, para frisar a ideia de que «o funcionamento do serviço não pode tolerar interrupções» ([93]).

Mas, ainda aqui, há-de reconhecer-se que o sistema existente, não obstante as suas deficiências, continua a funcionar e a assegurar as comunicações nos domínios da emergência e da segurança.

Pelas razões apontadas, a parte decisória do Despacho Conjunto n.º 219/2005 não se apresenta como conclusão lógica e necessária dos motivos invocados; o despacho contém, nesta medida, uma fundamentação incongruente, vício que a doutrina e a jurisprudência ([94]) colocam no mesmo plano da falta de fundamentação e que é, no caso presente ([95]), gerador da anulabilidade do acto.

Outro argumento importante para afastar a inadiabilidade da adjudicação, reside no facto de se tratar de um acto não vinculado.

Diz o n.º 2 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 86/2003 que a qualquer momento do processo de selecção do parceiro privado, pode dar-se por interrompido ou anulado o processo em curso, sem direito a qualquer indemnização.

Por conseguinte, não estando demonstrado haver grave prejuízo para o interesse público em deixar a resolução do assunto para o novo Governo, o facto de se tratar de um acto discricionário aconselharia mesmo a não adjudicação.

Apesar de se falar da natureza provisória da adjudicação (aludida no programa de procedimento de lançamento da parceria), a «provisoriedade» apenas releva de uma perspectiva formal, já que o qualificativo se refere à adjudicação ainda não consubstanciada em contrato assinado, enquanto a adjudicação definitiva surgirá com essa assinatura.

De qualquer modo, a adjudicação provisória não deixa de constituir a verdadeira e própria adjudicação, sendo a adjudicação definitiva a mera formalização desse acto. Constitui, por isso, um acto constitutivo de direitos, sujeito ao regime de anulação dos actos desta natureza.

Para além do referido, trata-se, na terminologia de FREITAS DO AMARAL, de um acto de alta administração, qualificação que julgamos resultar com clareza do carácter estratégico e estruturante do SIRESP, dos interesses e encargos que envolve, das opções implicadas (com destaque para a da parceria público-privada) e do próprio valor (538,2 milhões de euros).

Finalmente, não podemos deixar de salientar o quanto se afigura manifestamente desproporcionado e desrazoável não se esperar cerca de um mês no contexto de um processo que está atrasado dois anos, tanto mais que o acto em causa não estava sujeito a prazo, menos ainda a prazo peremptório ou preclusivo ([96]).

Assim, não resulta objectivamente do antedito procedimento de contratação que a adjudicação em causa revista a natureza de acto urgente e que o seu adiamento pudesse comprometer, irremediavelmente, a respectiva viabilização, em tempo útil, já que entre a data de prolação do Despacho Conjunto n.º 219/2005, e a posse do novo Governo, que se efectivou em 12 de Março seguinte, apenas mediaram 17 dias.

Em face do exposto, o acto de adjudicação do contrato para a concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do SIRESP, concretizado pelo Despacho Conjunto n.º 219/2005, de 23 de Fevereiro, subscrito pelo Ministro das Finanças e da Administração Pública e pelo Ministro da Administração Interna, enquanto membros de um Governo demitido, não se pode qualificar como acto estritamente necessário, urgente ou inadiável, para assegurar a gestão dos negócios públicos, pelo que é ilegal, por violação do disposto no n.º 5 do artigo 186.º da Constituição.


6. Aqui chegados, importa caracterizar as apontadas ilegalidades.

6.1. A questão pode, numa primeira análise, ser colocada no plano da competência: os Ministros subscritores do Despacho Conjunto n.º 219/2005, de 23 de Fevereiro, enquanto membros de um Governo demitido, atento os limites da competência previstos no n.º 5 do artigo 186.º da Constituição, careciam de competência para adjudicar o contrato de gestão para a concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do SIRESP.

Em geral, a doutrina distingue entre a incompetência absoluta ou incompetência por falta de atribuições, e a incompetência relativa ou incompetência por falta de competência: a primeira verifica-se quando um órgão da Administração pratica um acto fora das atribuições da pessoa colectiva a que pertence ou fora das atribuições do ministério respectivo; a segunda ocorre quando um órgão de uma pessoa colectiva pratica um acto que está fora da sua competência ([97]).

No nosso Direito Administrativo, a nulidade tem carácter excepcional, consistindo a regra na anulabilidade.

Os actos nulos encontram-se definidos e enumerados, exemplificativamente, no artigo 133.º do CPA, que trata do âmbito de aplicação da anulabilidade nos artigos 135.º e seguintes.

Face ao disposto no citado artigo 133.º, dir-se-ia que o acto administrativo em causa estaria ferido do vício de incompetência relativa, gerador de anulabilidade, nos termos do regime estabelecido nos artigos 135.º a 137.º do CPA.

Consequência idêntica – a da anulabilidade – resulta, como vimos, da fundamentação contraditória e incongruente do Despacho Conjunto n.º 219/2005, agora com referência as artigos 124.º, n.º 1, 125.º, n.º 2, e 135.º do CPA.

O acto administrativo anulável, embora inválido, produz os seus efeitos como se válido fosse, enquanto não for anulado, pode ser revogado nos termos estabelecidos no artigo 141.º do CPA e pode se ratificado, reformado ou convertido, nos termos das normas que regulam a competência para a revogação dos actos inválidos e a sua tempestividade (n.º 2 do artigo 137.º do CPA).

Importa ter em conta que a circunstância de nos encontrarmos no domínio do contencioso pré-contratual (cfr. artigo 100.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos) tem reflexos significativos ao nível da impugnação dos actos administrativos anuláveis (cfr. o artigo 101.º do mesmo Código) ([98]).

6.2. Afigura-se, todavia, que a ilegalidade deverá ser colocada num plano mais exigente.

O Governo demitido, embora deva continuar a assegurar a gestão dos negócios públicos até à posse de novo governo, «está em funções com capacidade substancialmente diminuída», isto é, embora deva «continuar a assegurar a gestão dos negócios públicos até à posse do novo Governo, está naturalmente ferido de uma severa capitis deminutio ([99]).

Como refere FREITAS DO AMARAL ([100]), «um Governo que apresenta a sua demissão, é um governo politicamente acabado: é um Governo que perdeu por sua própria iniciativa a auctoritas política de que até esse momento dispunha».

Neste sentido, caracterizando a situação dos governos demitidos, fala-se sugestivamente em capitis deminutio in articulo mortis ([101]).

Temos assim que, um governo de gestão, nestas condições, é um Governo de tal modo afectado na sua legitimidade que deixa de ter poderes para praticar actos de autoridade típicos de um Governo no exercício normal das suas funções. A Constituição fere-o de uma capitis deminutio de tal modo grave que, fora do que seja estritamente necessário para a gestão inadiável dos negócios públicos, se torna impossível imputar-lhe uma vontade susceptível de produzir efeitos jurídicos com força de autoridade.

Afigura-se, pois, que não se trata de mera falta de competência, isto é, de poderes conferidos por lei para praticar determinado acto. O problema está no sujeito mas é mais grave: trata-se de um sujeito diminuído substancialmente na sua capacidade, por falta de autoridade política, de legitimação.

É sabido que os requisitos de validade do acto administrativo em relação ao sujeito são as atribuições, a competência e a legitimação em concreto para o exercício das atribuições e competência.


Entre os requisitos da legitimação para a prática do acto figura a investidura do titular do órgão ([102]).

Noutra perspectiva: os vícios relativos ao sujeito traduzem-se na usurpação de poder, na falta de atribuições, na incompetência e na falta de legitimação.

Serão nulos, em princípio, os actos praticados com usurpação de poder ou fora das atribuições, por órgão territorialmente incompetente ou com faltas graves de legitimação ([103]).

No caso, a falta grave de legitimação resulta da carência de auctoritas política resultante da demissão, que origina como que um enfraquecimento ou degradação da investidura inicial ([104]).

A consequência dos actos praticados com falta de legitimação grave não pode deixar de ser a nulidade, apesar de não se tratar de um caso expressamente previsto no artigo 133.º, n.º 1, do CPA.

A propósito da enumeração taxativa do elenco das nulidades, refere VIEIRA DE ANDRADE ([105]) que «o conceito legal de nulidade substancial, referido a “actos a que faltem elementos essenciais”, deve interpretar-se no sentido de designar os elementos essenciais de cada tipo de acto – e não apenas com o alcance dos elementos abstractos comuns a todos, em termos de reduzir a nulidade aos casos de inexistência substancial».


«Do mesmo modo – prossegue o Autor – os casos identificados na lei geral – actualmente o CPA (...) – devem ser interpretados em função de um juízo valorativo de gravidade, que pressupõem, e não como meras decisões de qualificação formal, produtos da autoridade legislativa» ([106]).

Assim, para «além dos casos previstos expressamente na lei, devem ser nulos todos os actos que sofram de vícios de tal modo graves que tornem inaceitável, em princípio, a produção dos respectivos efeitos» ([107]).

Aplicando o exposto à situação em análise, também os actos praticados por Governos demitidos, com violação do disposto n.º 5 do artigo 186.º da CRP não podem deixar de ser nulos, por falta de um elemento essencial traduzido na carência de auctoritas política decorrente da demissão ([108]).

Trata-se de uma falta de legitimação grave, o que bem se compreende, dado que só a total improdutividade dos actos em causa garante a protecção adequada do interesse público e os fins visados pela Constituição.

Na verdade, o que importa assegurar ou evitar é que os novos Governos se vejam confrontados com factos consumados praticados por Governos que, fora dos limites constitucionalmente impostos, deixaram de ter (ou ainda não têm) uma legitimação plena para a gestão os negócios públicos ([109]).

A situação é especialmente grave quando se trata de actos administrativos, pois tratando-se de actos legislativos, o Presidente da República, através do acto de promulgação, tem oportunidade de aferir a conformidade constitucional do diploma.

Em face do exposto, o Despacho Conjunto n.º 219/2005, de 23 de Fevereiro, do Ministro das Finanças e da Administração Pública e do Ministro da Administração Interna, membros de um Governo de gestão, em funções a pós a sua demissão, operada pelo Decreto do Presidente da República n.º 100-A/2004, de 13 de Dezembro, enferma de nulidade, por violação do n.º 5 do artigo 186.º da Constituição.

X

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1.ª – Sem prejuízo da sua adequação técnica e da verificação dos respectivos pressupostos económico-financeiros, a parceria público-privada, organizada, ao abrigo do n.º 15 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 56/2003, de 8 de Abril, para constituir instrumento contratual para a aquisição, instalação e manutenção do Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP), e cujas condições de lançamento foram aprovadas pelo Despacho Conjunto n.º 734/2003, de 9 de Julho de 2003, da Ministra de Estado e das Finanças e do Ministro da Administração Interna, tem em consideração os pressupostos e requisitos de carácter estritamente jurídico estabelecidos nos artigos 6.º, n.º 1, e 7.º do Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril, que define o regime jurídico das parcerias público-privadas;

2.ª – Em face dos dados disponíveis, afigura-se que o procedimento relativo à concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do SIRESP, não revela, até ao acto de adjudicação, a existência de vícios geradores de invalidade dos actos aí praticados susceptíveis de serem ainda tempestivamente impugnados;

3.ª – Designadamente, ao Conselho Consultivo – que não tem competência para investigar matéria de facto – não foram facultados elementos de facto que permitam ponderar a existência de actuações violadoras do princípio da imparcialidade da Administração;

4.ª – De acordo com o preceituado no n.º 5 do artigo 186.º da Constituição, o Governo em funções após a sua demissão fica sujeito a um regime jurídico especial, caracterizado por uma substancial limitação da sua capacidade, resultante da demissão e do consequente défice de legitimação, apenas podendo praticar validamente os actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos;

5.ª – A estrita necessidade a que se refere o n.º 5 do artigo 186.º da Constituição corresponde a uma urgência concreta e datada, traduzida na premência de praticar um certo acto, cujo adiamento comprometeria gravemente a realização do interesse público;

6.ª – Em face do respectivo procedimento de contratação, o acto de adjudicação do contrato para a aquisição, instalação e manutenção do Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP), concretizado pelo Despacho Conjunto n.º 219/2005, de 23 de Fevereiro, não reveste a natureza de acto estritamente necessário para assegurar a gestão dos negócios públicos;

7.ª – Assim sendo, o Despacho Conjunto n.º 219/2005, de 23 de Fevereiro, do Ministro das Finanças e da Administração Pública e do Ministro da Administração Interna, membros de um Governo de gestão, em funções a pós a sua demissão, operada pelo Decreto do Presidente da República n.º 100-A/2004, de 13 de Dezembro, enferma de nulidade, por violação do n.º 5 do artigo 186.º da Constituição.






VOTOS



(Mário António Mendes Serrano) - Vencido pelas razões constantes do voto do meu Excelentíssimo Colega Dr. Manuel Pereira Augusto Matos.

(Maria de Fátima da Graça Carvalho) - Vencido pelas razões constantes do voto do meu Excelentíssimo Colega Dr. Manuel Pereira Augusto Matos.

Manuel Pereira Augusto de Matos. Vencido, como relator, quanto às conclusões 2ª, enquanto ressalva o acto de adjudicação, 4ª, 5ª, 6ª e 7ª, e respectivos fundamentos, pelos motivos constantes do projecto inicial que redigira.
I
1. No Despacho em que se solicita a intervenção deste órgão consultivo, suscita-se a questão relativa à «competência circunstancial do anterior Governo para proferir o Despacho Conjunto nº 219/2005, de 23 de Fevereiro».

O subsequente desenvolvimento será dedicado ao exame desta questão, a qual deriva da circunstância de os subscritores daquele Despacho Conjunto – o Ministro das Finanças e da Administração Pública e o Ministro da Administração Interna – serem membros do XVI Governo Constitucional, que, na data daquele Despacho, se encontrava demitido pelo Decreto do Presidente da República nº 100-A/2004, de 13 de Dezembro[1]; por efeito do pedido de demissão apresentado pelo Primeiro-Ministro [artigo 195º, nº 1, alínea b), da Constituição]. Esse Governo manteve-se nessa situação até 12 de Março de 2005, data da exoneração do Primeiro-Ministro, operada pelo Decreto do Presidente da República nº 18/2005, de 12 de Março[2], e da nomeação e posse do Primeiro-Ministro do XVII Governo Constitucional, aquela efectivada pelo Decreto do Presidente da República nº 19/2005, de 12 de Março[3].


2. O artigo 186º da Constituição, integrado no Título IV dedicado ao «Governo», estabelece o seguinte:


«Artigo 186º
Início e cessação de funções
1 – As funções do Primeiro-Ministro iniciam-se com a sua posse e cessam com a sua exoneração pelo Presidente da República.
2 – As funções dos restantes membros do Governo iniciam-se com a sua posse e cessam com a sua exoneração ou com a exoneração do Primeiro-Ministro.
3 – As funções dos Secretários e Subsecretários de Estado cessam ainda com a exoneração do respectivo Ministro.
4 – Em caso de demissão do Governo, o Primeiro-Ministro do Governo cessante é exonerado na data da nomeação e posse do novo Primeiro-Ministro.
5 – Antes da apreciação do seu programa pela Assembleia da República, ou após a sua demissão, o Governo limitar-se-á à prática dos actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos.»

A questão agora em apreço é a de saber se os actos de aprovação das conclusões do relatório da comissão de avaliação de propostas e de adjudicação do «contrato para a concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do sistema integrado de tecnologia trunking digital das redes de emergência e segurança de Portugal» cabem nos limites da competência estabelecidos no nº 5 do preceito constitucional transcrito.

Os «Governos demitidos», os «Governos sem programa apreciado» e os «Governos demissionários» constituem para FREITAS DO AMARAL modalidades do designado «Governo de gestão», definido como «o Governo Constitucional sujeito a um regime jurídico especial, e designadamente a uma substancial limitação de competência, em virtude da sua demissão ou da falta de apreciação parlamentar do seu programa»[4].

Examinando o tema dos governos de gestão, ANTÓNIO DUARTE SILVA e MIGUEL LOBO ANTUNES sublinham que «[o] princípio da continuidade do Estado, na ordem interna e internacional, contraria a possibilidade de hiatos no exercício do poder – que podem ser mais ou menos extensos no tempo, segundo as circunstâncias políticas do momento e os diversos sistemas de governo -, pelo menos no respeitante à actividade administrativa, ao cumprimento de obrigações internacionais ou à solução de situações de emergência. Daí ser unanimemente entendido, mesmo sem suporte expresso na Constituição, que um governo demitido deve permanecer em funções até ser substituído»[5].

Todavia, prosseguem os mesmos Autores, «[o] equilíbrio entre os vários órgãos de soberania, a dependência do Governo perante o Parlamento e, no nosso País, também perante o PR, leva a considerar que, quando não exista a relação fiduciária em que esse equilíbrio assenta – ou porque ainda não se consumou, ou porque foi destruída - , sejam limitados os poderes do Executivo»[6].

Um Governo na situação de demitido «não se encontra na plenitude do seu estatuto, é um Governo de gestão [...] com um horizonte de vida necessariamente diverso do de um Governo que não tenha perdido a confiança política de um dos órgãos perante os quais é responsável»[7], sendo, portanto, compreensíveis os limites colocados à acção governamental.


3. A propósito da delimitação das competências de um Governo de gestão, sem base presidencial ou parlamentar de confiança, JORGE MIRANDA, escrevendo antes das alterações introduzidas na revisão constitucional de 1982 ao então artigo 189º da Constituição (correspondente ao actual artigo 186º)[8], entende que tal Governo «não pode adoptar directrizes ou providências que correspondam a uma nova definição política do país», sem que, todavia, isso implique confiná-lo à mera função administrativa[9]. A priori, nada impede, prossegue este Autor, que o Governo pratique actos da função política ou da função legislativa (-) e o princípio da continuidade do Estado, designadamente na ordem internacional, poderá mesmo exigi-lo. Não é a natureza jurídica das competências que conta, é o alcance político dos actos em concreto [...] atentas as necessidades do país»[10].

Debruçando-se sobre o mesmo tema, à luz do nº 5 do artigo 186º da Constituição, acima reproduzido, FREITAS DO AMARAL, tomando por base o critério das funções do Estado, conclui que «os Governos de gestão devem poder praticar todos os actos compreendidos na função administrativa, excepção feita aos chamados actos de alta administração ou de administração extraordinária, que só serão legítimos em caso de urgência»[11].

No enquadramento da competência dos Governos de gestão, este Autor distingue os actos absolutamente proibidos, os actos genericamente permitidos e os actos relativamente proibidos.

Nos actos absolutamente proibidos têm cabimento vários tipos de actos, seja qual for a função do Estado em que se integrem: (i) os actos de execução do programa do Governo; (ii) os actos contraditórios com os fundamentos da demissão; (iii) os actos que traduzam uma inovação política fundamental ou comportem uma limitação significativa da liberdade de decisão do Governo seguinte; (iv) os actos de utilização de autorizações legislativas; (v) de um modo geral, todos os actos que não possam ser qualificados, em face da Constituição, como «actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos»[12].

Nos actos genericamente permitidos incluem-se os actos da função administrativa, com excepção dos actos de alta administração ou de administração extraordinária.

Nos actos relativamente proibidos integram-se os actos em princípio proibidos, mas que, a título excepcional, e em determinadas condições, devem ser considerados permitidos: (i) os actos de alta administração, ou de administração extraordinária; (ii) os actos políticos e legislativos em geral que não sejam absolutamente proibidos[13].

Quanto aos actos relativamente proibidos, o Autor que vimos acompanhando considera que a sua prática por um Governo de gestão estará legitimada desde que se verifiquem as seguintes condições: (i) a necessidade do acto a praticar; (ii) a urgência da sua prática; (iii) a fundamentação expressa[14].

Como ANTÓNIO DUARTE SILVA e MIGUEL LOBO ANTUNES sublinham, a revisão constitucional de 1982 teve a preocupação de formular um estatuto global para o início e cessação de funções do Governo, mas não avançou com qualquer diferenciação (jurídica e/ou política) dessas situações. «Sobre a determinação da competência do Governo de gestão ficou-se por uma fórmula simultaneamente maleável (pode praticar os actos de todas as funções) e condicionada por um duplo limite (a sua competência está limitada pela estrita necessidade, por um lado, e pela gestão dos negócios públicos, por outro)[15].

Quanto à estrita necessidade do acto a praticar, a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem feito corresponder o seu conceito essencialmente ao da inadiabilidade ou da urgência: «perante certa situação dos negócios públicos, o Governo terá naquela altura de dar um acto de resposta»[16].

Para J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA a definição do conceito de estrita necessidade «há-de encontrar-se fundamentalmente a partir de dois índices: (a) a importância significativa dos interesses em causa, em tais termos que a omissão do acto afectasse de forma relevante a gestão dos negócios públicos; (b) a inadiabilidade, ou seja, impossibilidade de, sem grave prejuízo, deixar a resolução do assunto para o novo Governo»[17]


4. O acto de adjudicação do contrato em causa nesta consulta, corporizado no Despacho Conjunto nº 219/2005, de 23 de Fevereiro de 2005, configura, indiscutivelmente, um acto administrativo praticado no exercício da função administrativa definida, segundo JOÃO CAUPERS, como a função que, no respeito pelo quadro legal e sob a direcção dos representantes da colectividade, desenvolve as actividades necessárias à satisfação das necessidades colectivas[18].

«A actividade em que se consubstancia a função administrativa é multiforme, abrangendo designadamente a produção de bens e a prestação de serviços, bem como as actuações que visem a obtenção e gestão dos recursos materiais e humanos a alocar ao seu desenvolvimento; o seu âmbito concreto varia em função dos interesses públicos que em cada momento histórico sejam constitucional e legislativamente considerados relevantes [...]»[19]. Esta função compreende, pois, a actividade pública contínua destinada a satisfazer as necessidades colectivas em cada momento seleccionadas.

Posto isto, resta verificar se se encontra preenchido o pressuposto da estrita necessidade, prescrito no nº 5 do artigo 186º da Constituição, aferido, essencialmente, em função da inadiabilidade ou da urgência do acto a praticar.


5. No Despacho Conjunto nº 219/2005, os Membros do Governo que o subscrevem dão nota da urgência quanto à implementação do SIRESP, assinalando que essa natureza fora já reconhecida na Resolução do Conselho de Ministros nº 26/2002. Assinalam ainda, neste âmbito, que a adjudicação do contrato «se revela como acto de gestão corrente, em função da sua natureza imprescindível e inadiável, atendendo à imperiosa urgência da implementação, em tempo útil, do SIRESP».

O Senhor Auditor Jurídico no Ministério da Administração Interna, no Parecer elaborado em confirmação do que emitira, oralmente, e em momento anterior ao da prolação daquele Despacho Conjunto[20], considerando que «o enquadramento jurídico dos factos atrás resumidos [«pressupostos de facto tidos em consideração na análise da questão»] [[21]] obedeceu, no essencial, ao disposto no nº 5 do artigo 186º da Constituição da República Portuguesa», acrescentando que o preceito «não estabelece qualquer limite à natureza dos actos que podem ser praticados por um Governo demitido ou por um novo Governo ainda não plenamente empossado pela Assembleia da República»; que, «independentemente da natureza desses actos [...], para além dos casos expressamente proibidos por lei (como acontece, por exemplo, com a nomeação de dirigentes de grau 1), o que releva é que eles sejam estritamente necessários; que «[a] estrita necessidade afere-se, em primeiro lugar, pela importância significativa dos interesses em causa, afigurando-se desnecessário, face aos elementos retirados da fundamentação das 3 Resoluções do Conselho de Ministros [...], acrescentar seja o que for para reafirmar a importância vital da concretização do projecto em exame; que «[e]m segundo lugar, a estrita necessidade afere-se pela inadiabilidade, ou seja, pela previsão, nas concretas circunstâncias em que o acto deve ser praticado, de que o seu adiamento poderá acarretar graves prejuízos».


6. A necessidade da existência de uma rede única de comunicações encontra-se bem sublinhada nas Resoluções do Conselho de Ministros já referidas.

Como se afirma na Resolução do Conselho de Ministros nº 26/2002, uma rede única «permite satisfazer, de forma eficiente, os requisitos operacionais dos serviços de emergência e segurança ao nível da qualidade, fiabilidade e segurança das comunicações». Previamente, na mesma Resolução, depois de se sublinhar que as comunicações constituem «instrumento basilar para o exercício eficiente da sua actividade» pelas várias entidades, «tuteladas por diferentes ministérios», que exercem atribuições nos domínios da emergência e da segurança, o Conselho de Ministros constata que «a situação actual das diferentes redes de comunicações, de emergência e de segurança, suscita problemas derivados da vida útil dos equipamentos utilizados, da tecnologia analógica que as suportam e da fragmentação/ausência de integração das principais funcionalidades».

A Resolução do Conselho de Ministros nº 56/2003 constata igualmente a mesma situação de necessidade na implementação de uma rede única, partilhada pelas várias entidades com atribuições nas áreas da emergência e da segurança, «que permitirá, em caso de emergência, a centralização do comando e da coordenação das diversas forças e serviços de segurança». Uma rede com este perfil permitirá ainda satisfazer, de forma eficiente, os requisitos operacionais das forças e serviços de emergência e de segurança, «garantindo a qualidade, a fiabilidade e a segurança das comunicações, bem como a racionalidade dos meios e recursos existentes».

Perante a descrita situação de facto vigente no domínio das comunicações entre as entidades e serviços que actuam nas áreas da emergência e da segurança, caracterizada pela diversidade, fragmentação e pela sua não interoperabilidade, consideramos urgente e inadiável a adopção pelo Estado-Administração de um sistema único, baseado numa só infra-estrutura, nacional e partilhado, capaz de assegurar a satisfação das necessidades de comunicações das forças e serviços de emergência e de segurança, satisfazendo a intercomunicação e a interoperabilidade entre as diversas forças e serviços e, em caso de emergência, permitir a centralização do comando e da coordenação.

Estando em causa aspectos essenciais e prementes no domínio da emergência e da segurança, e encontrando-se findo o prévio procedimento administrativo, a aprovação do relatório da Comissão de Avaliação das Propostas e a adjudicação do contrato para a concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do sistema integrado de tecnologia trunking digital das redes de emergência e segurança de Portugal, através do Despacho Conjunto nº 219/2005, de 23 de Fevereiro de 2005, configuram-se como actos inadiáveis e urgentes.

Neste contexto, cumpre concluir pelo preenchimento do requisito constitucional da estrita necessidade quanto à prática daqueles actos, não violando o Despacho Conjunto nº 219/2005, de 23 de Fevereiro, a norma contida no nº 5, do artigo 186º da Constituição.

II
Em face do exposto, e relativamente à posição que obteve vencimento, formulara no mesmo projecto, as seguintes conclusões:

«2ª - O procedimento relativo à concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do SIRESP, não revela a existência de vícios geradores de invalidade dos actos aí praticados;

«3ª - Aceita-se como necessária, urgente e inadiável a adopção de um sistema como o definido, para o SIRESP, pelo nº 1 da Resolução do Conselho de Ministros nº 56/2003: «sistema único, baseado numa só infra-estrutura de telecomunicações nacional, partilhado, que deve assegurar a satisfação das necessidades de comunicações das forças e serviços de emergência e de segurança, satisfazendo a intercomunicação e a interoperabilidade entre as diversas forças e serviços e, em caso de emergência, permitir a centralização do comando e da coordenação»;

«4ª - Considerando-se preenchido o requisito da estrita necessidade, prescrito no nº 5 do artigo 186º da Constituição, o Despacho Conjunto nº 219/2005, de 23 de Fevereiro de 2005, do Ministro das Finanças e da Administração Pública e do Ministro da Administração Interna, membros de um Governo de Gestão, em funções após a sua demissão, operada pelo Decreto do Presidente da República nº 100-A/2004, de 13 de Dezembro, não infringe aquela norma constitucional.»




[1] Publicado no Diário da República, I Série-A, nº 290, de 13 de Dezembro de 2004.
[2] Publicado no Diário da República, I Série-A, nº 50-A, de 12 de Março de 2005.
[3] Publicado no mesmo Diário da República.
[4] Governos de Gestão, 2ª edição, revista e actualizada, Principia – Publicações Universitárias e Científicas, 2002, pp. 12-13. Para o Autor, os Governos demitidos correspondem aos «Governos que foram objecto de um acto formal de demissão praticado pelo Presidente da República» (ibidem). É esta a modalidade que está subjacente neste segmento do presente parecer.
[5] “Sobre os Governos de Gestão”, Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, Coimbra Editora, 2003, p. 976.
[6] Ibidem.
[7] V. JORGE MIRANDA, “A Competência do Governo na Constituição de 1976”, Estudos sobre a Constituição, 3º Volume, Livraria Petrony, 1979, pp. 633 e segs.
[8] O artigo 189º da Constituição, na sua versão original, dispunha no nº 4, o seguinte: «Em caso de demissão, os membros do Governo cessante permanecerão em funções até à posse do novo Governo». Na revisão constitucional de 1982, além de outras alterações introduzidas ao artigo 189º, foi-lhe aditado o nº 5 cuja redacção se mantém.
[9] Ob. cit., pp. 650-651.
[10] Ibidem. O Autor defende uma perspectiva ampla para o enquadramento teórico da questão, mantendo o mesmo entendimento quanto aos poderes do Governo de gestão. Mais ampliativamente, v. o Parecer deste Conselho nº 213/78, de 13 de Dezembro de 1978 (Diário da República, II Série, nº 21, de 25 de Janeiro de 1979), com as seguintes conclusões:
«1ª - Em caso de demissão, e enquanto se mantiver em funções, o Governo conserva a competência prevista nos artigos 200º e seguintes da Constituição.
2ª - O exercício concreto da competência do Governo, nas condições referidas na conclusão anterior, deve ter por base um juízo de legitimidade política relativa ao acto a praticar.»
[11] Governos de Gestão, cit., p. 33.
[12] Idem, pp. 34-35.
[13] Idem, ibidem.
[14] Idem, ob. cit., p. 37.
[15] Ob. cit., p. 962.
[16] Do Acórdão do Tribunal Constitucional nº 56/84 (Diário da República, II Série, de 9 de Agosto de 1984). V. Acórdão do mesmo Tribunal nº 65/02, de 8 de Fevereiro de 2002 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos), onde se procede ao balanço da jurisprudência constitucional sobre esta matéria.
[17] Ob. cit., p. 743.
[18] Introdução ao Direito Administrativo, Âncora Editora, 6ª edição, 2001, p. 40.
[19] MARCELO REBELO DE SOUSA e ANDRÉ SALGADO DE MATOS, ob. cit., p. 35.
[20] Parecer nº 203-G/05, de 4 de Abril de 2005 [Procº nº M/546 DE: 31.MAR.05 (Procº nº 311/2003-MAI)], entretanto enviado.
[21] Pressupostos registados no ponto 4. do Parecer. A questão fora colocada pelo então Ministro da Administração Interna com o seguinte enunciado: «Tendo em consideração que a Assembleia da República tinha sido dissolvida e o Governo tinha sido demitido, caberia nos seus poderes de gestão dos negócios públicos o acto de aprovação do relatório e de acolhimento da proposta de adjudicação, cuja prática, no caso, era da competência conjunta do MAI e do MFAP?»

(José António Barreto Nunes) - Vencido pelas razões constantes do voto do meu Excelentíssimo Colega Dr. Manuel Pereira Augusto Matos.

(Mário Gomes Dias ) Vencido pelas razões constantes do voto do meu Excelentíssimo Colega Dr. Manuel Pereira Augusto Matos.


([1]) Pedido formulado através do of.º 1749 – Proc.º 311/03, de 30 de Março de 2005.
([2]) De 30 de Março de 2005.
([3]) Por vencimento do Relator inicial, o processo foi objecto de redistribuição. A adaptação do projecto de parecer à posição maioritária do Conselho implicou afeiçoamentos de pormenor nos pontos I a VIII e a reformulação dos pontos IX e X.
([4]) Datado de 14 de Fevereiro de 2005.
([5]) Anexos seguintes, não numerados: «Avaliação Técnica da Proposta»; «Relatório de Apreciação Económico-Financeira da Proposta», elaborado pelo BPI; «Relatório de Análise da Proposta», elaborado pela Linklaters.
([6]) Sessões realizadas em 19 de Janeiro de 2004, 11 de Fevereiro de 2004, 23 de Abril de 2004, 30 de Junho de 2004, e 26 de Janeiro de 2005.
([7]) Contém 45 anexos, alguns deles com vários apêndices. O anexo 1 integra o «Compromisso de confidencialidade». O anexo 37 refere-se à «Estrutura accionista» do «consórcio SIRESP», com a seguinte constituição e participação: Motorola, Inc (14,9%), PT Ventures SGPS, S. A. (30,55%), SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S. A. (33%), DATACOMP – Sistemas de Informática, S. A. (9,55%) e ESEGUR – Empresa de Segurança, S. A. (12%). Os demais anexos documentam especificações e requisitos técnicos do sistema e diversas minutas de acordos e contratos instrumentais.
([8]) «Contrato relativo à concepção, projecto, fornecimento, montagem, construção, gestão e manutenção do SIRESP» a celebrar entre a «entidade gestora do SIRESP» e a «operadora».
([9]) Aprovada a 22 de Julho de 1999.
([10]) Segundo o glossário de telecomunicações disponível em www.anacom.pt, as iniciais “TETRA” correspondem à expressão inglesa Terrestrial Trunked Radio (Tecnologia Digital de Rádio Móvel Privado).
([11]) Aprovada a 10 de Janeiro de 2002.
([12]) Aprovada a 19 de Março de 2003.
([13]) JORGE ABREU SIMÕES, “Parcerias público-privadas”, A reinvenção da função pública – Da burocracia à gestão, Encontro INA, Lisboa 14.15 Março 2002, Edição do Instituto Nacional de Administração (INA), p. 181.
([14]) ALFREDO JOSÉ DE SOUSA, “As Parcerias Público-Privadas e o Desenvolvimento – o Papel do Controlo Financeiro Externo”, Revista do Tribunal de Contas, n.º 36, Jul./Dez. 2001, p. 32.
([15]) ALFREDO JOSÉ DE SOUSA, ob. cit., p. 33. Acentuando a expansão da cobertura dos serviços públicos com eficiência e qualidade e em economia de meios, v. JORGE ABREU SIMÕES, “Parcerias público-privadas no sector da saúde”, cit., p. 185.
([16]) Livro Verde sobre as Parcerias Público-Privadas e o Direito Comunitário em matéria de Contratos Públicos e Concessões, Bruxelas, 30 de Abril de 2002, COM(2004).
([17]) ALFREDO JOSÉ DE SOUSA, loc. cit., p. 34. Sobre o tema, v. CARLOS SOARES ALVES, Os Municípios e as Parcerias Público-Privadas: Concessões e Empresas Municipais, Edição ATAM, Lisboa 2002, pp. 255-256.
([18]) Participação mais responsável de todos os agentes, quer públicos quer privados, envolvidos no financiamento do projecto; desnecessidade do Estado canalizar recursos públicos avultados para financiar os investimentos; manutenção pela Administração do controlo e supervisão dos serviços prestados.
([19]) ALFREDO J. DE SOUSA, loc. cit., p. 35.
(x1) «PAUL LIGNIÈRES, op. cit. [Partenariats publics privés, Litec. 2000], p. 10.»
([20]) Pelo Despacho Normativo n.º 35/2003, de 25 de Julho de 2003 (Diário da República, I Série-B, n.º 191, de 20 de Agosto de 2003), a PARPÚBLICA – Participações Públicas (SGPS), S. A. foi «incumbida da prestação de apoio técnico ao Ministro das Finanças no contexto dos procedimentos de definição, concepção, preparação, concurso, adjudicação, alteração e acompanhamento global das parcerias público-‑privadas, reguladas pelo Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril.» (n.º 1).
([21]) Publicado no Diário da República, II Série, n.º 118, de 22 de Maio de 2003.
([22]) Publicado no Diário da República, II Série, n.º 173, de 29 de Julho de 2003.
([23]) A comissão de avaliação de propostas para a parceria público-privada em apreço nesta consulta foi constituída pelo Despacho Conjunto n.º 758/2003, de 25 de Julho de 2003 (Diário da República, II Série, n.º 184, de 11 de Agosto de 2003).
([24]) Relativos ao valor actual líquido esperado dos pagamentos da Entidade Gestora do Sistema emergente do Contrato, ao grau de risco e de compromisso associado àquele valor e à solidez da estrutura financeira, empresarial e contratual.
([25]) Essencialmente os referidos na nota anterior.
([26]) Esta Entidade Gestora «será uma entidade pública, na dependência do Ministério da Administração Interna, à qual será atribuída a competência para assegurar a gestão da utilização e de segurança do SIRESP» (n.º 5.1. do Caderno de Encargos).
([27]) Cuja cópia se obteve na pendência deste processo.
([28]) As cartas convite foram endereçadas a estas entidades em 10 de Julho de 2003 (cfr. p. 2 do Relatório).
([29]) Linklaters e BPI.
([30]) Pág. 6 do Relatório de 17 de Novembro de 2003.
([31]) Págs. 6 e 7 do Relatório.
([32]) Ponto 5 do Relatório, pp. 31 e 32.
([33]) Publicado no Diário da República, II Série, n.º 48, de 9 de Março de 2005.
([34]) Publicado no Diário da República, II Série, n.º 61, de 29 de Março de 2005.
([35]) Da Dívida Pública e das Garantias dos Credores do Estado, Colecção Teses, Almedina, Coimbra, 1995, p. 352.
(x1a) «“Contrato Administrativo e Acto Jurídico Público [(Contributo para uma Teoria do Contrato Administrativo)”, Boletim da Faculdade de Direito, suplemento XI, 1953], págs. 75 e segs.”»
([36]) Ibidem.
([37]) EDUARDO PAZ FERREIRA, ibidem.
([38]) Curso de Direito Administrativo, com a colaboração de LINO TORGAL, Vol. II, Almedina, 2001, p. 518. Acerca do conceito de contrato administrativo, v. PEDRO GONÇALVES, O Contrato Administrativo – Uma Instituição do Direito Administrativo do nosso Tempo, Almedina, 2003, pp. 25 e ss., e MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA/PEDRO COSTA GONÇALVES/J. PACHECO DE AMORIM, Código do Procedimento Administrativo, 2.ª Edição, Almedina, Coimbra, 1997, pp. 809 e ss.
([39]) De 24 de Janeiro de 1996, homologado.
(x2) «FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, Vol. I, Coimbra, 1994, págs. 439 e 458 e segs.»
(X3) «JOÃO MARTINS CLARO, “o Contrato Administrativo”, “Código do Procedimento Administrativo”, edição do Centro de Estudos do Instituto Nacional de Administração”, Lisboa, 1992, págs. 131 a 144.»
([40]) O tema do contrato administrativo tem sido frequentemente analisado pelo Conselho Consultivo como sucedeu, de entre outros, nos Pareceres n.os 127/90, de 21 de Março de 1991 (Diário da República, II Série, n.º 196, de 27 de Agosto de 1991), 11/94, de 24 de Março de 1994 (Diário da República, II Série, n.º 141, de 21 de Junho de 1994), 67/95, de 18 de Abril de 1996 (Diário da República, II Série, n.º 200, de 29 de Agosto de 1996), 134/2001, de 16 de Janeiro de 2003, 137/2001, de 25 de Outubro de 2001 (Diário da República, II Série, de 5 de Janeiro de 2002), 108/2003, de 4 de Dezembro de 2003 (Diário da República, II Série, n.º 74, de 27 de Março de 2004), e 115/2003, de 23 de Outubro de 2004 (Diário da República, II Série, n.º 39, de 24 de Fevereiro de 2005).
([41]) Cfr., para maiores desenvolvimentos, Livro Verde ..., cit., p. 9.
(x4) «ENZO ROPPO, op. cit. [O Contrato, tradução de ANA COIMBRA e JANUÁRIO GOMES], p. 343.»
(x5) «Ibidem, pág. 344.»
([42]) Ob. cit., p. 94. Acompanha-se, neste passo, o Parecer n.º 108/2003, de 4 de Dezembro de 2003 (Diário da República, II Série, n.º 74, de 27 de Março de 2004).
([43]) J. J. GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição revista, Coimbra Editora, 1993, pp. 922 a 925. V. ALEXANDRA LEITÃO, A Protecção dos Terceiros no Contencioso dos Contratos da Administração Pública, Almedina, Coimbra, 1998, p. 67.
([44]) V. o Parecer n.º 8/96, de 20 de Março de 1996 (Diário da República, II Série, n.º 224, de 26 de Setembro de 1996), que, por momentos, se acompanha.
([45]) Cfr. MARTIM ALBUQUERQUE, Da Igualdade, Introdução à Jurisprudência, Coimbra, 1993, e MARCELO REBELO DE SOUSA/ANDRÉ SALGADO DE MATOS, Direito Administrativo Geral – Introdução e Princípios Fundamentais, Tomo 1, Dom Quixote, 2004, pp. 209-213.
([46]) Neste passo o Parecer n.º 8/96 remete para MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA/PEDRO COSTA GONÇALVES/JOÃO PACHECO DE AMORIM, Código do Procedimento Administrativo Anotado, volume I, 1993, pp. 153-156.
([47]) Seguindo-se JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, A Imparcialidade da Administração como Princípio Constitucional, Separata do vol. XLIX (1974) do Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.
([48]) FREITAS DO AMARAL/JOÃO CAUPERS, JOÃO MARTINS CLARO/JOÃO RAPOSO/MARIA DA GLÓRIA DIAS GARCIA/PEDRO SIZA VIEIRA/VASCO PEREIRA DA SILVA, Código do Procedimento Administrativo Anotado, 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 1998, p. 100. V. Parecer n.º 81/2004, de 25 de Novembro de 2004 (Diário da República, II Série, n.º 39, de 24 de Fevereiro de 2005), que, por momentos, se acompanha.
([49]) M. ESTEVES DE OLIVEIRA et allii, Código..., cit., 2.ª edição, p. 247.
([50]) Continuamos a seguir o citado Parecer n.º 81/2004.
([51]) M. ESTEVES DE OLIVEIRA et allii, Código..., cit., 2.ª edição, p. 245.
([52]) Parecer n.º 43/2002, de 14 de Agosto de 2002 (Diário da República, II Série, n.º 251, de 30 de Outubro de 2002).
([53]) De 16 de Janeiro de 2003 (Diário da República, II Série, n.º 38, de 14 de Fevereiro de 2003).
(x6) «Para mais desenvolvimentos, v. REBELO DE SOUSA, ob. cit. [O Concurso Público na Formação do Contrato Administrativo, Lex, Lisboa, 1994], págs. 69-71, e MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA/RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, Concursos ..., cit. [Concursos e outros Procedimentos de Adjudicação Administrativa – Das Fontes às Garantias, Almedina, Coimbra, 1998], págs. 108-115.»
(x7) «PAULO OTERO, “Intangibilidade das propostas em concurso público e erro de facto na formação da vontade: a omissão de elementos não variáveis na formulação de uma proposta”, em O Direito, 1999, I-II (Janeiro-Junho), pág. 97.»
([54]) O Concurso Público na Formação do Contrato Administrativo, Lex, Lisboa, 1994, pp. 74 e 75.
([55]) Cfr. MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, Concursos e outros Procedimentos de Adjudicação Administrativa – Das Fontes às Garantias, Almedina, Coimbra, 1998, pp. 106 e 107.
([56]) MARCELO REBELO DE SOUSA, O Concurso ..., cit., p. 63.
([57]) De 16 de Janeiro de 2003.
(x8) «Nos n.os 2 a 6 do artigo 182.º do CPA descreve-se cada uma dessas modalidades de escolha do co-contratante nos seguintes termos:
“(...)
2 – Ao concurso público são admitidas todas as entidades que satisfaçam os requisitos gerais estabelecidos por lei.
3 – Ao concurso limitado por prévia qualificação somente podem ser admitidas as entidades seleccionadas pelo órgão administrativo adjudicante.
4 – Ao concurso limitado sem apresentação de candidaturas apenas serão admitidas as entidades convidadas, sendo o convite feito de acordo com o conhecimento e a experiência que o órgão administrativo adjudicante tenha daquelas entidades.
5 – Os procedimentos por negociação implicam a negociação do conteúdo do contrato com um ou vários interessados.
6 – O ajuste directo dispensa quaisquer consultas.”
(...)»
(x9) «Ob. cit. [Curso de Direito Administrativo, Vol. II, Almedina, Coimbra, 2001], pp. 593-594».
(x10) «Idem, p. 596».
(x11) «Ibidem
(x12) «Sobre os princípios concretamente em causa no concurso público, cfr. MARCELO REBELO DE SOUSA, ob. cit., que distingue entre princípios comuns aos contratos em geral e princípios próprios da função administrativa, incluindo: nos primeiros, os do respeito dos direitos, liberdades e garantias, da boa fé, da força vinculativa contratual (na modalidade de estabilidade contratual), da igualdade, da justiça, da proporcionalidade e da protecção da confiança; e, nos segundos, os da legalidade, da tutela dos direitos e interesses legítimos, da prossecução do interesse público, da boa administração, da autonomia pública, da imparcialidade e da transparência – deles derivando específicos princípios do concurso público, quais sejam os da objectividade, da publicidade, da concorrência e da estabilidade das regras. Também aludindo aos diferentes princípios modeladores do concurso público, v. MARGARIDA OLAZABAL CABRAL, O Concurso Público nos Contratos Administrativos, Almedina, Coimbra, 1997, pp. 82-97. Ainda com interesse, cfr. FAUSTO DE QUADROS, “O Concurso Público na Formação do Contrato Administrativo”, Revista da Ordem dos Advogados, ano 47, Dezembro/1987, pp. 710-‑736.»
(x13) «Uma reflexão sobre essa pretérita querela doutrinária, à luz da actual regra geral do concurso público (artigo 183.º do CPA), conduz MARGARIDA OLAZABAL CABRAL à formulação da seguinte questão: “Constituirá o concurso público na celebração dos contratos administrativos uma mera opção do legislador, dentro do seu espaço de discricionariedade, ou será o mesmo imposto pela Constituição, de tal maneira que seria inconstitucional um regime jurídico que de todo o afastasse?” (ob. cit., p. 255).»
(x14) «Encontra-se apenas uma referência ao concurso público no artigo 296.º da Constituição, a propósito da “reprivatização da titularidade ou do direito de exploração de meios de produção e outros bens nacionalizados depois do 25 de Abril de 1974”, para cujo efeito a norma determina a utilização preferencial desse meio, entre outros. Por sua vez, no artigo 47º, n.º 2, da Constituição alude-se a um concurso, que é estabelecido como regra para exercício do direito de acesso à função pública.»
(x15) «J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, ob. cit. [Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição revista, Coimbra Editora, Coimbra, 1993], p. 925. Como referem os autores, esse princípio da imparcialidade relaciona-se ainda intimamente com o da igualdade (ibidem).»
(x16) «Idem, p. 927.»
(x17) «Claramente no sentido de que a Constituição nada dispõe sobre contratos administrativos, cabendo ao legislador estabelecer o regime procedimental que considere mais adequado, v. FREITAS DO AMARAL, Curso..., cit., pp. 574-575 […].»
(x18) «Ob. cit., p. 260.»
(x19) «Idem, pp. 261-262.»
(x20) «Idem, p. 258.»
(x21) «Acaba também MARGARIDA OLAZABAL CABRAL por acolher esta asserção (idem, pp. 262-263).»
([58]) Parecer n.º 9/2005, de 3 de Março de 2005, que se acompanha neste segmento expositivo.
([59]) Com efeito, o princípio da concorrência, contemplado no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 97/99, só encontra a sua plena densificação quando lido à luz da regra do concurso público, consagrada no artigo 183.º do CPA.
([60]) Na economia desta consulta, considera-se desnecessária a assunção de compromisso quanto à divergência suscitada no mesmo Parecer (repercutida nas declarações de voto então apresentadas) sobre a questão da aplicação subsidiária para estes contratos do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, por força do disposto no artigo 189.º do CPA.
([61]) O procedimento aberto com vista à celebração do contrato, em regime de parceria público-privada, em causa nesta consulta, é composto, como procedimento administrativo que é, por uma sucessão ordenada de actos administrativos (cfr. artigo 1.º, n.º 1, do CPA)
([62]) Legalidade e Administração Pública – O Sentido da Vinculação Administrativa à Juridicidade, Almedina, 2003, p. 963. V. Parecer n.º 26/2004, de 16 de Dezembro de 2004.
([63]) FREITAS DO AMARAL, Curso..., vol. II, cit., pp. 413 a 416, e PAULO OTERO, ob. cit., p. 1033.
([64]) PAULO OTERO, ob. cit., p. 1023. Sobre as razões que justificam este regime, v. FREITAS DO AMARAL, Curso..., vol. II, cit., p. 409.
([65]) Alterada pelas Leis n.os 28/95, de 18 de Agosto, 12/96, de 18 de Abril, 42/96, de 31 de Agosto, e 12/98, de 24 de Fevereiro.
([66]) Alterada pela Lei n.º 48/2004, de 24 de Agosto.
([67]) Cfr. ponto 4 do relatório de 14 de Fevereiro de 2005.
([68]) Sobre o papel do Tribunal de Contas no contexto das parcerias público-privadas, quer ao nível do controlo prévio da legalidade dos respectivos contratos, quer do controlo concomitante, quer ainda do controlo sucessivo da gestão financeira que a sua execução implica, v. ALFREDO JOSÉ DE SOUSA, ob. cit., p. 42.
([69]) De 9 de Julho de 2003.
([70]) Procedimento que se poderá integrar no tipo previsto no artigo 78.º, n.os 1, alínea c), e 4, do Decreto-Lei n.º 197/99.
([71]) V. p. 7 do Relatório de 17 de Novembro de 2003.
([72]) Cfr. pp. 30 e 31 do Relatório de 14 de Fevereiro de 2005.
([73]) Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 3 de Abril de 2002, citado no Acórdão do mesmo Tribunal, de 19 de Maio de 2004 (processo n.º 0416/04), disponível nas Bases Jurídico-Documentais do ITIJ, em www.dgsi.pt/sta.
([74]) Os n.os 1 a 4 correspondem, sem alterações, aos n.os 1 a 4 do artigo 189.º da 1.ª Revisão Constitucional (1982), e, com alterações, aos n.os 1 a 4 do artigo 189.º da versão originária da Constituição (com a epígrafe «Cessação de funções»), que dispunham:
«1. As funções do Primeiro-Ministro cessam com a sua exoneração pelo Presidente da República.
2. As funções de todos os membros do Governo cessam com a exoneração do Primeiro-Ministro.
3. As funções dos Secretários e Subsecretários de Estado cessam com a exoneração do respectivo Ministro.
4. Em caso de demissão, os membros do Governo cessante permanecerão em funções até à posse do novo Governo.»
O n.º 5 corresponde, sem alterações, ao n.º 5 do artigo 189.º da 1.ª Revisão Constitucional, sem correspondência na versão originária (cf. J. L. PEREIRA COUTINHO/JOSÉ MANUEL MEIRIM/MÁRIO TORRES/MIGUEL LOBO ANTUNES, Constituição da República Portuguesa, Editorial Notícias, 1989, p. 302).
([75]) Jorge Miranda, “A Competência do Governo na Constituição de 1976”, Estudos sobre a Constituição, 3.º volume, Livraria Petrony, 1979, pp. 650-651.
([76]) Ibidem. V. também o Parecer do Conselho Consultivo n.º 213/78, de 13 de Dezembro de 1978 (Diário da República, II Série, n.º 21, de 25 de Janeiro de 1979), segundo o qual – como diz JORGE MIRANDA (ibidem, p. 652, nota 41) – «o Governo conserva a sua competência, embora o exercício desta deva ter por base um juízo de legitimidade política relativamente aos actos a praticar». Note-se que também este parecer foi emitido antes da introdução na Constituição (em 1982) do actual n.º 5 do artigo 186.º
([77]) Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, Limitada, 1978, p. 370.
([78]) Governos de Gestão, 2.ª edição revista e actualizada, Principia, Publicações Universitárias e Científicas, 2002, p. 12.
([79]) Ob. cit., p. 13.
([80]) Governos de Gestão, cit., p. 33.
([81]) FREITAS DO AMARAL, ob. cit., pp. 34-35.
([82]) Ob. cit., p. 37.
([83]) “Sobre os Governos de gestão”, em Estudos de Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, Coimbra Editora, 2003, p. 962.
([84]) Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição, Coimbra Editora, 1993, p. 743.
([85]) Ob. cit., p. 37.
([86]) Acórdão n.º 56/84 (Diário da República, I Série, n.º 184, de 9 de Agosto de 1984); v. também o Acórdão n.º 65/2002, de 8 de Fevereiro de 2002 (Diário da República, II Série, n.º 51, de 1 de Março de 2002).
([87]) FREITAS DO AMARAL, ob. cit., p. 37.
([88]) Neste sentido, GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, ibid.
([89]) JORGE MIRANDA, “A Competência do Governo na Constituição de 1976”, ibidem.
([90]) Para a caracterização dos conceitos referidos, v. JOÃO CAUPERS, Introdução ao Direito Administrativo, Âncora editora, 6.ª edição, pp. 66-72.
([91]) A título informativo, refira-se que no Programa do XVI Governo Constitucional não há qualquer referência nem é assumido qualquer compromisso em relação ao SIRESP (cfr. Diário da Assembleia da República, II Série-A, n.º 75, de 24 de Julho de 2004, pp. 3040-3041).
([92]) Cfr. supra, III, 3.
([93]) JEAN RIVERO, Direito Administrativo, Almedina, Coimbra, 1981, p. 501; v. também os Pareceres do Conselho Consultivo n.os 3/2002, de 2 de Maio de 2002 (Diário da República, II série, n.º 193, de 22 de Agosto de 2002), e 62/2002, de 21 de Novembro de 2002 (Diário da República, II Série, n.º 67, de 20 de Março de 2003).
([94]) Para indicações pormenorizadas de uma e outra, v. o Parecer do Conselho Consultivo n.º 70/2002, de 14 de Julho de 2004.
([95]) Há situações em que a falta de fundamentação pode originar a própria nulidade (cf. M. ESTEVES DE OLIVEIRA/PEDRO GONÇALVES/PACHECO DE AMORIM, Código..., cit. pp. 589-590).
([96]) A este propósito FREITAS DO AMARAL (ob. cit., p. 37) exemplifica: «se uma decisão tiver de ser tomada num certo dia em que o Governo de gestão ainda se encontre em funções como tal, é claro que a urgência concreta imporá que seja esse Governo a tomá-la; se, porém, a urgência significar que uma determinada decisão terá de ser tomada no prazo de um mês, e for já seguro que o novo Governo será empossado dentro de oito ou quinze dias, é óbvio que não deverá ser o Governo de gestão a tomar tal decisão».
([97]) Cfr. JOÃO CAUPERS, Introdução..., cit., p. 192.
([98]) Cfr. PEDRO GONÇALVES, “Contencioso Administrativo pré-contratual”, Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 44, Março/Abril 2004, pp. 3 e ss.
([99]) GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição..., cit., p. 742.
([100]) Ob. cit., p. 14.
([101]) LEOPOLDO ELIA, citado por FREITAS DO AMARAL, ob. cit., p. 8.
([102]) A par do quórum nos órgãos colegiais, da autorização para a prática do acto, da ausência de impedimentos do agente ou titular do órgão e do decurso de um período de tempo dentro do qual o acto deve ser praticado ou decorrido o qual o acto deixa de poder ser levado a cabo (Cf. JOSÉ FIGUEIREDO DIAS/FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Direito Administrativo, CEFA – Centro de Estudos e Formação Autárquica, Coimbra, 2001, p. 226).
([103]) Cfr. VIEIRA DE ANDRADE, Direito Administrativo/2.º ano, Sumários ao curso de 2001/2002, ed. policopiada, p. 56.
([104]) O mesmo sucede em relação a Governo antes da apreciação do seu programa pela Assembleia da República, situação em que a investidura, não obstante a posse, não atingiu ainda a sua plenitude.
([105]) “Nulidade e anulabilidade do acto administrativo”, Anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (Plenário), de 30 de Maio de 2001, Processo n.º 22 251, Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 43, Janeiro/Fevereiro 2004, pp. 46 e ss.
([106]) No mesmo sentido, MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA (Direito Administrativo, Almedina, Coimbra, 1980, vol. I, p. 547) pondera que «a razão da consagração do regime da invalidade absoluta está no facto de se reconhecer que certos interesses públicos ou particulares têm uma tal dignidade e relevância que seria aberrante aplicar-‑lhes o regime da invalidade relativa».
([107]) VIEIRA DE ANDRADE, loc. cit., p. 47.
([108]) Segundo a cláusula geral inserta no n.º 1 do artigo 132.º do CPA, é nulo o acto a que falte qualquer elemento essencial. Sobre o alcance desta cláusula, cfr. MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA/PEDRO GONÇALVES/PACHECO DE AMORIM, Código..., cit., 2.ª ed., pp. 641 e ss.
([109]) Nesta circunstância, perante um acto nulo, assiste ao Governo a possibilidade de, não obstante a declaração da sua nulidade nos termos gerais, praticar um outro acto de conteúdo idêntico ao anulado se tal for exigido pela prossecução do interesse público.