Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
271/14.5TTMTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: NELSON FERNANDES
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
RETRIBUIÇÃO
MISTA
NATUREZA
ÓNUS DA PROVA
PLURALIDADE DE EMPREGADORES
Nº do Documento: RP20180305271/14.5TTMTS.P1
Data do Acordão: 03/05/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO - 1ª
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL) (LIVRO DE REGISTOS Nº 271, FLS 60-79)
Área Temática: .
Sumário: I - A retribuição do trabalho assume-se como o conjunto de valores, pecuniários ou não, que a entidade patronal está obrigada a pagar, regular e periodicamente, ao trabalhador em razão da sua atividade, sendo integrada não só pela remuneração de base como ainda por outras prestações regulares e periódicas, que estas criem no trabalhador a convicção de que constituem um complemento do seu salário.
II - Tendo em conta os princípios de repartição do ónus da prova – especificadamente o disposto no n.º 1 do artigo 344.º do Código Civil –, face ao disposto no n.º 3 do artigo 258.º do Código do Trabalho, é sobre o empregador que impende o ónus de provar que certa prestação que fez ao trabalhador não tem a natureza de retribuição.
III - Estando em causa uma retribuição mista, constituída por uma parte de retribuição base e uma outra variável, assim de comissões correspondentes a uma percentagem do valor da faturação, a retirada desta última, por ato unilateral do empregador, viola o princípio da irredutibilidade da retribuição.
IV - Resultando do artigo 284.º do Código de Processo Civil que a transação modifica o pedido ou faz cessar a causa nos precisos termos em que se efetue, não ocorre caso julgado, decorrente de transação homologada por sentença em que ficou salvaguardada expressamente a possibilidade de o trabalhador vir a acionar judicialmente a entidade patronal para pagamento de comissões que considera serem-lhe devidas, na ação que aquele venha a interpor com este objetivo.
V - A prestação indiferenciada e simultânea de atividade pelo trabalhador a favor de várias sociedades, recebendo uma só retribuição, aponta para o carácter unitário da posição de empregador, por ser decisivo o critério da subordinação jurídica.
VII - Apesar de faltarem os requisitos previstos no artigo 101.º do Código de Trabalho, resultando provado que as sociedades possuíam estruturas organizativas comuns e que o trabalhador desenvolvia a sua atividade indistintamente para todas elas, por ser a realidade factual que determina a qualificação contratual e não o inverso – não tendo assim aqueles requisitos um escopo negocial e voluntário, mas um escopo judicial e corretivo, o que, só por si, retira sentido a tais exigências –, ao verificar-se o pressuposto material do instituto da pluralidade de empregadores em relação a várias sociedades, todas elas são solidariamente responsáveis pelo pagamento ao trabalhador dos créditos laborais.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação 271/14.5TTMTS.P1
Autor/apelado: B...
Recorrente/apelante: C... e D..., na qualidade de sócios da sociedade extinta E..., Lda., sendo a responsabilidade destes limitada ao montante que receberem na partilha dos bens das sociedades (antes, F..., Lda., atualmente designada E..., Lda., G..., Lda., atualmente designada H..., Lda., e I..., S.A.)
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Relator: Nélson Fernandes
1º Adjunto: Des. Rita Romeira
2º Adjunto: Des. Teresa Sá Lopes

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto
I - Relatório
1.
1.1. B... intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra F..., Lda., depois designada E..., Lda., G..., Lda., depois designada H..., Lda., e I..., S.A., pedindo, considerando-se que entre ele e as Rés existia uma relação laboral de pluralidade de empregadores, que estas fossem condenadas solidariamente a pagar-lhe a quantia de € 58.978,93, devida a título de comissões de vendas que deixaram de ser pagas a partir de 2012, acrescido do montante devido pela faturação dos negócios da Farmácia J... e da Farmácia K..., cujo valor deve ser apurado em liquidação da sentença, e ainda juros de mora desde a citação até trânsito em julgado da sentença.
Para tanto, em síntese, alegou que: celebrou com a 1ª Ré no dia 27 de Abril de 2009 um contrato de trabalho para o exercício das funções de Diretor Comercial, auferindo ultimamente uma remuneração base de € 2014,00, acrescido de uma retribuição variável de comissões no valor de 12% sobre a comissão cobrada aos clientes, e que em 2011 o sócio gerente da 1ª Ré criou a 2ª Ré, da qual era sócia a 1ª Ré e o dito sócio gerente, para intermediar os negócios em que estivessem em causa venda de quotas ou ações de sociedades detentoras de farmácias, área em que a 1ª Ré antes atuava, para além da mediação em trespasses de alvarás de farmácias, passando o autor a trabalhar indistintamente para as duas sociedades independentemente de qual faturasse a comissão do negócio de trespasse ou venda de alvará ou negócios de vendas de quotas; aquele sócio gerente era simultaneamente administrador da 3ª Ré que havia sido criada com o intuito de fazer a gestão de farmácias e prestar serviços a farmácias; todas as Rés tinham uma estrutura organizativa comum, trabalhando ele indistintamente para as mesmas, do que se conclui que o contrato que inicialmente havia celebrado com a 1ª Ré se transformou ao longo do tempo num contrato com uma tríplice entidade empregadora; a sua remuneração fixa era paga pela 1ª Ré e a sua remuneração variável era assegurada pelas três Rés indistintamente; contudo, tendo recebido as comissões até 2012 sobre todos os negócios mediados pelas três Rés, por decisão unilateral do respetivo sócio gerente e administrador tal pagamento deixou de ser efetuado sem qualquer justificação, reclamando por essa razão o seu valor, relativamente a todos os negócios concretizados em 2012 e até à cessação do seu contrato por extinção do posto de trabalho em 07/04/2013.

1.2 Frustrada a tentativa de conciliação levada a efeito na audiência de partes, notificadas as Rés para tais efeitos, apresentaram-se as mesmas a contestar.
Também em síntese, admitindo que o Autor trabalhava para as três (Rés), cujo capital é detido por sócios ou acionistas comuns, invocaram que não constituem, porém, uma única realidade económica, nem possuem uma estrutura organizativa comum, como ainda que apenas foi acordado com o Autor o pagamento de um prémio anual calculado pela aplicação de até 12% sobre o total das vendas angariadas pelo mesmo e na condição de aquelas vendas atingirem, anualmente, no conjunto das três sociedades, o valor mínimo de € 300.000,00, sendo tal pagamento efetuado indistintamente pelas três Rés, acordo esse que sempre foi cumprido, não tendo havido lugar ao pagamento de qualquer prémio a partir de 2012, por o Autor não ter atingido o valor mínimo de vendas de € 300.000,00.
Concluíram as Rés pela improcedência total da ação.

1.3 Respondeu o Autor, mantendo a sua posição inicial.

1.4 Proferiu-se seguidamente despacho saneador, dispensando-se nos termos do disposto pelo artigo 49º, nº 3 do Código de Processo do Trabalho a seleção da matéria de facto.

1.5 Tendo os autos prosseguido os seus termos, realizada a audiência de discussão e julgamento, veio a ser proferida sentença, em 18/06/2015, de cujo dispositivo consta:
“Por todo o exposto julgo a ação parcialmente procedente e, em consequência, decido:
I – condenar as rés solidariamente a pagar ao autor a quantia de € 55.056,00 (cinquenta e cinco mil e cinquenta e seis euros) a título de comissões, acrescida de juros de mora, á taxa legal, desde a citação até integral pagamento, acrescida da quantia a liquidar após a sentença relativa à comissão devida relativamente ao negócio (venda de quotas) da Farmácia J..., em ..., e respectivos juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito em julgado da decisão de liquidação até integral pagamento.
II – absolver as rés da parte restante do pedido.
Custas pelo autor e pela rés, na proporção dos decaimentos – art. 537º do Código de Processo Civil.
Valor da ação: € 58.978,93 (cinquenta e oito mil novecentos e setenta e oito euros e noventa e três cêntimos).”

2. Não se conformando então com o assim decidido, as Rés interpuseram recurso de apelação, apresentando as respetivas alegações, nas quais formularam como conclusões o seguidamente transcrito:
“I. As questões que aqui se colocam a douta apreciação do Meritíssimo Tribunal “ad quem” são as seguintes:
- saber se, por um lado, ficou provado que o A. recebia comissões e que as mesmas incidiam sobre o valor de todas as vendas efectuadas, e por outro lado, em caso negativo, avaliar as consequências jurídicas decorrentes do facto do mesmo peticionar o pagamento de prémios;
- saber se vigorou um contrato de trabalho entre o A. e uma pluralidade de empregadores;
- saber se é equacionável a responsabilidade solidária das RR..
II. Quanto à primeira questão, importa referir que a palavra “comissão” foi diversas vezes utilizada com referência ao montante recebido pelo Apelado em função do cumprimento dos objectivos de vendas, mas verdade é que não resultou provado que o mesmo as tenha auferido.
III. Tal conclusão resulta do depoimento de C..., (minuto 07:26 a minuto 08:30) e do depoimento da testemunha M... (minuto 20:15 a minuto 20:26 e minuto 22:00 a minuto 22:39), em conjugação com o facto das restantes testemunhas não se terem debruçado sobre a questão da natureza retributiva daqueles valores.
IV. Atendendo às regras de repartição do ónus da prova (artigos 342º e 346º do Código Civil), verifica-se que os Apelantes apresentaram contraprova de que o acordado era o pagamento de um prémio e que o Apelado não fez prova dos elementos constitutivos do direito que alega.
V. A função principal do prémio é a de recompensar a produtividade e o desempenho profissional dos trabalhadores.
VI. Como era prática comum na empresa, e ocorria, de resto, no caso da trabalhadora N... (minuto 10:30 a minuto 10:45), a bonificação era recebida sobre as vendas concretizadas pela pessoa que, directamente angariava o negócio (minuto 07:36 a minuto 08:30 de minuto 10:54:55 a minuto 12:45:49 do depoimento de C...).
VII. De resto, como afirma o Apelado a sua intervenção ocorreu directa ou indirectamente em todos os negócios (minuto 21:10 a minuto 21:27), pelo que em determinados casos, o seu papel não foi fulcral para a concretização do negócio.
VIII. Exemplo desse facto é o que sucedeu com os negócios relativos à farmácia O... em Gaia, a farmácia P... em ..., a farmácia Q... sita em Albufeira e a farmácia K... em Lisboa, conforme resulta dos depoimentos de C... (minuto 42:04 a minuto 42:50, minuto 44:00 a minuto 44:42, minuto 46:00 a minuto 47:36, minuto 56:00 a minuto 56:31 de minutos 10:54:55 a 12:45:49), S... (minuto 03:18 a minuto 04:02, minuto10:20 a minuto 11:30) e T... (minuto 04:14 a minuto 04:32, minuto 07:19 a minuto 08:11).
IX. O Recorrente não logrou provar que tinha direito a uma bonificação, em virtude de todas as vendas realizadas pelas Recorrentes, pela aplicação da percentagem de 12% já que a única testemunha que se pronunciou quanto a esse facto, U..., possui conhecimento indirecto dos factos e encontra-se necessariamente comprometida com o desfecho da presente acção, visto que demandou as, ora, Recorrentes em acção judicial na qual reclama, igualmente, comissões (minuto 00:02 a minuto 00:31 e minuto 49:53 a minuto 50:52).
X. Além disso, não ficou reflectido no contrato escrito qualquer comissão de 12% sobre as vendas de farmácias.
XI. É senso comum que as bonificações visam premiar o trabalho individual e não o trabalho desenvolvido por todas as empresas, já que para isso existe a figura da participação nos resultados.
XII. Nessa medida, e uma vez que nada foi dito pelo Sr. C... ao Recorrido nesse sentido, o mesmo não podia contar com a atribuição de uma comissão, numa percentagem fixa,
XIII. ou mesmo que lhe fosse atribuído um prémio sem mais, já que o mesmo dependia de conseguir atingir determinados “objectivos”.
XIV. Assim, de acordo com o disposto na alínea c), do número 1 do artigo 260.º do Código de Trabalho não se consideram retribuição as prestações decorrentes de factos relacionados com o desempenho ou mérito profissionais, bem como a assiduidade do trabalhador, cujo pagamento, nos períodos de referência respectivos, não esteja antecipadamente garantido (i. e. os prémios).
XV. Seguindo o entendimento do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo nº 373/10.7TTPRT.P1.S1, de 26/05/2015, o prémio de produtividade cuja atribuição estava dependente da avaliação da produtividade e do desempenho profissional dos trabalhadores não assume natureza retributiva.
XVI. Deste modo, era lícito aos Recorrentes deixar de lho pagar, sem que isso represente violação do princípio da irredutibilidade da retribuição (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo nº 292/11.0TTSTRE.E1.S1, de 17/12/2014).
XVII. Porque se está perante um erro notório na apreciação da prova constante do processo, deverá a matéria de facto constante dos pontos 4, 27, 30, 33 quando refere “12% das comissões auferidas pelas rés”, 37, 38 d), e) e f) e 39 b) dos factos dados como provados, ser considerada não provada.
SEM PRESCINDIR:
XVIII. Conforme resulta do artigo 8º, artigo 9º e artigo 10º da douta Petição Inicial, a extinção do posto de trabalho do recorrido foi objecto de impugnação judicial de despedimento que correu termos no âmbito do processo nº 386/13.7TTMTS e terminou por acordo entre as partes (Cfr. Doc. 4 junto com a Petição Inicial).
XIX. No ponto V da aludida transacção foi mencionado que: “As partes consideram extintas todas as obrigações e deveres decorrentes do contrato de trabalho celebrado entre ambos, à exceção de questões relacionadas com comissões que o autor entende lhe serem devidas, e se reserva o direito de acionar judicialmente a ré em sede própria, as quais não foram reclamadas nesta ação e que a ré não reconhece dever” (sublinhado nosso).
XX. Tendo aquela transacção sido devidamente homologada por sentença ditada para a acta, nos termos e para os efeitos do artigo 290º, número 4, do Código de Processo Civil e tendo a mesma transitado em julgado, formou-se caso julgado material com os limites fixados pelo artigo 580º e pelo artigo 581º ambos do Código de Processo Civil (Vide artigo 619º, número 1, do Código de Processo Civil).
XXI. Ora, o Recorrido naqueloutra acção, considerou extintas todas as obrigações decorrentes do contrato de trabalho celebrado, com excepção das questões relacionadas com as comissões.
XXII. Conforme foi referido supra, o Recorrido reclama nos presentes autos o pagamento de um prémio, ou seja, de uma obrigação distinta das comissões.
XXIII. Assim, nos termos do disposto no artigo 580º do Código de Processo Civil estamos perante uma excepção de caso julgado já que se repete aqui a causa quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
XXIV. Ainda que não seja doutamente entendido, o que só por mero dever de patrocínio se concebe, resta dizer que, conforme resulta do ponto 38, alínea k) dos factos provados, não houve transmissão da farmácia V..., da farmácia W... e da farmácia X....
XXV. De facto, apenas houve uma avaliação daquelas farmácias e, nessa medida, não tem o Recorrido direito a qualquer montante com referência às mesmas (Cfr. Artigos 95º e 98º da Petição Inicial).
XXVI. Deve assim o Meritíssimo Tribunal “ad quem” abster-se de decidir quanto à exigibilidade do aludido prémio, evitando assim ser colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir a decisão anterior.
XXVII. Em relação à segunda questão, importa referir que o artigo 101º do Código de Trabalho impõe que o acordo de pluralidade de empregadores esteja sujeito à forma escrita, sem distinguir a sua celebração originária ou sucessiva.
XXVIII. Ora, o contrato de trabalho foi celebrado apenas com a 1ª R., ora Recorrente. Deste modo, não se afigura possível a existência de uma pluralidade de empregadores.
XXIX. É certo que há quem defenda que a pluralidade de empregadores se basta com uma mera situação de facto. No entanto, no caso sub iudice, tal situação não é equacionável uma vez que as Recorrentes não constituirem uma única realidade económica, que entre as mesmas não subsiste uma relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, nem tão pouco possuem uma estrutura organizativa comum.
XXX. Conforme resulta do depoimento da testemunha M... (minuto 07:26 a minuto 07:46, minuto 07:56 a minuto 08:04 e minuto 18:20 a minuto 18:50) e do legal representante das Recorrentes (minuto 28:25 a minuto 30:46, minuto 32:08 a minuto 32:15 minuto 32:42 a minuto 32:53 e minuto 33:00 a minuto 33:11) as Recorrentes partilham, apenas, a mesma morada e alguns serviços de natureza administrativa,
XXXI. a comunicação institucional de marketing não é única, nem é efectuada através de site comum às três RR.,
XXXII. as newsletters eram enviadas em separado,
XXXIII. a equipa de trabalho não é constituída pelos mesmos elementos pois apenas a recepcionista e o Técnico Oficial de Contas são comuns às três RR..
XXXIV. Face à prova produzida, deverá a resposta dada aos pontos 17, 18, 19, 21, 22 e 23 dos factos provados ser alterada para não provada.
XXXV. Tal significa que, para além do não preenchimento da exigência prevista no número 2, do artigo 101º do Código de Trabalho (requisito formal) também não se acha preenchido o requisito previsto no número 1 daquele normativo legal (requisito substancial) de que depende a verificação da figura de pluralidade de empregadores.
SEM PRESCINDIR:
XXXVI. Ainda que assim não se entenda, a presença daquela situação de facto é um afloramento do princípio da prevalência da substância sobre a forma, que esbarra com o artigo 220º e com o artigo 286º do Código Civil,
XXXVII. Assim, verifica-se nulidade do acordo por ausência de forma já que a admissibilidade de celebração de um contrato de trabalho entre um trabalhador e uma pluralidade de empregadores está dependente do preenchimento cumulativo dos requisitos constantes do artigo 101º do Código de Trabalho.
XXXVIII. No que concerne à terceira questão que nos ocupa, importa referir que o número 5, do artigo 101º determina que o trabalhador opte pelo empregador ao qual fica vinculado em caso de violação dos requisitos indicados no número 1 ou número 2 do mesmo artigo.
XXXIX. Da articulação dos documentos 3 e 4 da douta Petição Inicial e do aí alegado nos artigos 6º a 10º resulta evidente que o Recorrido, até à data da propositura desta acção, reconhecia ter apenas uma entidade patronal, a 1ª R., “F..., LDA.”, ora, Recorrente.
XL. Isto porque, a comunicação da decisão de extinção do posto de trabalho foi enviada somente pela 1ª R., sem que o mesmo tenha obstado a esse facto, e porque a acção de impugnação judicial da irregularidade e licitude do seu despedimento foi por si intentada, apenas, contra a 1ª R..
XLI. O Recorrido alega e prova o contrário de uma pretensa pluralidade de empregadores, e só depois de cessado o contrato e de ter intentado uma primeira acção, apenas, contra a 1ª R., é que se deu conta da existência de três empregadores.
XLII. Deste modo, ainda que se considere a existência, de facto, de uma relação jurídica plural, não podem ser olvidadas as consequências jurídicas daí resultantes e que se traduzem na vinculação a um único empregador.
SEM PRESCINDIR:
XLIII. Em todo o caso, o A. não logrou provar que essa situação de facto se estendia à R. “I...”, ora Recorrente.
XLIV. É certo que as Recorrentes confessaram que o A. trabalhou para todas elas. Todavia, competia ao A. provar que se encontrava juridicamente subordinado, o que não logrou fazer.
XLV. De facto, neste âmbito, o Recorrido limitou-se a alegar que colaborou na apresentação inicial da 3ª R., em powerpoint, que esteve envolvido no seu arranque e que a 3ª R. ficou com a exploração da farmácia Y..., em Coimbra, tendo ele ficado incumbido da gestão operacional dessa farmácia.
XLVI. Sucede que o Apelado nada disso provou, pelo contrário toda a prova testemunhal por si produzida infirma-o, claramente.
XLVII. Isto porque, nos artigos 111, 112, 113, 114 e 115 da sua douta Petição Inicial, o Apelado afirma que, no ano de 2011, teve intervenção na venda das quotas da empresa I1..., pertencente ao sócio gerente das RR. que detinha a exploração da Farmácia Y..., em Coimbra e que as RR. (possivelmente a 2ª R) receberam 88.000,00€+Iva, sendo que a empresa que pagou a comissão foi a Z..., Lda, NIPC ........., ..., loja ..., Av. ..., nº ., ....-... COIMBRA.
XLVIII. Sucede que, a dada altura do seu depoimento, a propósito da farmácia Y..., de Coimbra o Apelado afirma que desconhece a existência da empresa I1... (minuto 15:30 a minuto 16:07).
XLIX. Deste modo, deverá a resposta dada ao ponto 26 e 34., alínea a) dos factos dados como provados ser alterada para não provada.
L. Importa, assim, referir que o Recorrido não interveio em nenhum negócio concretizado pela I..., pelo que, em todo o caso, aquela sociedade não é devedora de qualquer montante a título de prémio.
LI. Por outro lado, a prova documental produzida a este propósito, concretamente, os recibos de remuneração juntos aos autos na douta Petição Inicial (v.g. Docs. 7, 8, 9) apontam para uma relação de trabalho independente.
LII. O que desde já se alega para todos os devidos e legais efeitos.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE V. EXAS DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVERÁ SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO E REVOGADA A DOUTA DECISÃO PROFERIDA, ASSIM SE FAZENDO, A HABITUAL E SÃ JUSTIÇA.”

2.1. Contra-alegou o Autor, formulando a final, designando-o como conclusões, o seguinte:
“1. Não assistente qualquer razão às recorrentes no que tange ao recurso da matéria de facto e de direito;
2. A Recorrente impugna os seguintes factos da sentença que foram dados como provada: Factos constantes nos pontos 4, 27, 30, 33, 37, 38 alínea d), e), f), 39º b), 17, 18, 19, 21, 22 e 23, 26 e 34 alínea a) da matéria de facto dada como provada, que segundo as Recorrentes deveriam ter sido dados como não provados;
3. Todavia verifica-se a Inadmissibilidade da modificação da matéria de facto por correta apreciação segundo o princípio da livre convicção do julgador;
4. No nosso ordenamento jurídico o princípio da livre apreciação da prova, nomeadamente da prova testemunhal, consagrado no art. 396º do CC e 655º nº1 do CPC. Estes normativos concedem autonomia ao Tribunal para apreciar livremente as provas segundo a própria convicção e experiência relativamente a cada facto dado à prova, nunca se desviando porém do dever de persecução da verdade material;
5. No caso em apreço, a fundamentação da decisão de facto foi claramente fundamentada e reduzida objetivamente aos critérios sobre os quais criou a sua livre convicção. Da mesma forma que identificou negativamente a omissão de elementos probatórios suficientes para fixar certos factos controvertidos;
6. É pacifico que mesmo havendo contradições entre os depoimentos das testemunhas (que não houve no caso em apreço) só o juiz de julgamento está habilitado a apreciar livremente a prova testemunhal, de acordo com a sua prudente convicção que tenha formado acerca de cada facto controvertido, segundo o principio da livre apreciação da prova constante do Art.º 655 do C.P.C.;
7. Observada a fundamentação da materialidade acolhida, sobretudo o depoimento das testemunhas, verifica-se que a mesma assentou na credibilidade das testemunhas da Recorrida e se o Tribunal teve perante si as testemunhas verificando as ações e omissões dos seus dizeres, tiques e outras reações e optou por credibilizar uns depoimentos em detrimento de outros, tal decisão é insindicável e imutável, não se alcançando que da audição das gravações se possa augurar de modo diferente, concluindo-se que a matéria de facto a ajuizar é a que consta da sentença, improcedendo o recurso da Apelante;
8. Verifica-se igualmente que a Recorrida logrou fazer prova cabal dos factos dados como provados e impugnados pela Recorrente do presente recurso.
9. Relativamente aos pontos 4, 27, 30, 33, 37, 38 alínea d), e), f), 39º b) no que concerne às comissões;
10. Sobre estes factos pronunciou-se com conhecimento direto a testemunha AB... (depoimento de 01:11:49H, constante no registo gravado através do sistema integrado de gravação áudio digital “Habilus Media Studio” disponível na aplicação informática do Tribunal, cujo inicio e termo se encontram assinalados na acta e na referida gravação – inicio no dia 11.05.2015 às 15:12:28H e fim no mesmo dia às 16:24:18H - e cujo teor se dá por reproduzido);
11. A referida testemunha nas passagens de 00:06:40 a 00:12:01 afirmou que quando o Recorrido foi contratado, foi acordado entre ele e o Sr. C... um valor a título de comissão de 12% pela totalidade das vendas que fossem efetuadas no âmbito da atividade das empresas, situação que foi comunicada ao depoente pelo próprio C... para efeitos de processamento dos respetivos pagamentos a títulos de comissões;
12. Acrescentou inclusivamente que o recorrido recebia comissões sobre a totalidade dos negócios. Afirmou perentoriamente que não havia qualquer teto de faturação relativamente ao pagamento das comissões e que não correspondia à verdade que existissem de objetivos de € 300.000 de faturação para pagamento das referidas retribuições e que caso tal situação se verificasse teria conhecimento, já que era Diretor Financeiro das empresas.
13. Esclareceu ainda o tribunal que até à saída do Recorrido da empresa lhe foram pagas sempre comissões sobre todos os negócios e que a dada altura, talvez finais de 2012, o Sr. C... decidiu por sua iniciativa, deixar de o fazer, não só relativamente ao recorrido mas aos demais trabalhadores;
14. Por sua nas passagens de 00:21:45 a 00:25:13 afirmou que os pagamentos, embora carregados pelo depoente em sistema, eram ordenados pelo Sr. C... e que solicitou ao Recorrido a emissão de atos únicos para titular o pagamento de comissões, documentos esses juntos aos autos, e passados em nome da H... e I... pela companheira do Recorrido AC...;
15. A testemunha U... (depoimento de 01:24:43H, constante no registo gravado através do sistema integrado de gravação áudio digital “Habilus Media Studio” disponível na aplicação informática do Tribunal, cujo inicio e termo se encontram assinalados na acta e na referida gravação – inicio no dia 09.03.2015 às 15:57:10H e fim no mesmo dia às 17:21:59H - e cujo teor se dá por reproduzido), nas passagens de 00:14:32 a 00:21:12 afirmou ter conhecimento de que estava estabelecidos ao nível das Recorrentes o pagamento aos comercias e ao Diretor comercial, o Recorrido, de comissões calculadas com base em todos os negócios mediados por todas as sociedades, o que constituía a componente variável da sua remuneração.
Mais afirmou nunca ter tido conhecimento de que a equipa comercial tivesse que atingir o patamar de 300.000€ para auferir a componente variável que reputa de comissões. Relativamente ao Recorrido, esclareceu que a comissão que o mesmo auferia por todos os negócios era de 12% e que no seu caso era apenas de 2%. Acrescentou que, com base no seu caso pessoal até 2012 foram pagas as comissões e que a partir dessa altura as mesmas deixaram de ser pagas a si e ao Recorrido;
16. Já nas passagens de 00:29:01 a 00:33:58 reiterou que tanto da sua parte como do Recorrido havia uma comissão paga para todos os negócios realizados, que tal pagamento era efetuado de forma regular e que a decisão de deixar de pagar comissões foi absolutamente unilateral por parte do Sr. C..., tendo este inclusivamente procedido à extinção do posto de trabalho do Recorrido para não pagar comissões, tendo previamente havido pressão para serem alteradas as condições de toda a equipa;
17. A testemunha N... (depoimento de 00:22:13H, constante no registo gravado através do sistema integrado de gravação áudio digital “Habilus Media Studio” disponível na aplicação informática do Tribunal, cujo inicio e termo se encontram assinalados na acta e na referida gravação – inicio no dia 16.03.2015 às 10:33:39H e fim no mesmo dia às 10:55:53H - e cujo teor se dá por reproduzido), nas passagens de 00:18:00 a 00:22:12 referiu ter conhecimento das condições em que o Recorrente trabalhava e dos negócios que fez. Relativamente às funções do Recorrido afirmou que este era Diretor comercial, que era seu chefe. Relativamente a retribuições, afirmou que a depoente que também recebia comissões em função de vendas realizadas e não prémios subordinadas a qualquer critério quantitativo;
18. O Recorrido B... (depoimento de 00:40:43H, constante no registo gravado através do sistema integrado de gravação áudio digital “Habilus Media Studio” disponível na aplicação informática do Tribunal, cujo inicio e termo se encontram assinalados na acta e na referida gravação – inicio no dia 25.05.2015 às 00:09:51H e fim no mesmo dia às 10:31:23H – e cujo teor se dá por reproduzido) também prestou depoimento abundante sobre estes factos, nas passagens de 00:01:10 a 00:08:10 referiu que aquando sua admissão foi contratado com o Sr. C... um salário líquido base de €1400 e sobre a sua remuneração base acrescia uma comissão de 12% sobre a comissão cobrada pelas 3 empresas aos seus clientes. Esclareceu que inicialmente trabalhava para a E..., mas que depois forma constituídas as outras duas empresas Rés e vigorava o mesmo regime para todas, que sempre lhe forma pagas comissões até o Gerente Sr. C... decidiu unilateralmente deixar de o fazer em finas de 2012;
19. Relativamente aos depoimentos de M... e C... mencionados pelas Recorrentes com fundamentadores do seu recurso de facto, a Mma. Juiz “a quo” desmontou os referidos documentos de forma sublime, sendo que por, economia processual se remete para o veiculado quanto a esta matéria: “a incapacidade de o legal representante das rés explicar, afinal, o que vinha sendo praticado no que respeita aos pagamentos convencionados com o autor para além da retribuição e em função dos negócios realizados, prestando um depoimento, pleno de hesitações, de contradições, de saltos lógicos, que nem a testemunha M... conseguiu confirmar, sendo incapaz, também ela, de explicar qual a relevância dos negócios efetuados pelas rés nos pagamentos feitos ao autor (e até a si mesma) para além da retribuição, apresentando mesmo uma versão diferente da trazida aos autos pela ré já que acabou por dizer que o que era pago era uma percentagem sobre o valor de € 300.000,00, o que nem as rés, nem o legal representante alguma vez afirmaram”;
20. Os referidos pontos 4, 27, 30, 33, 37, 38 alínea d), e), f), 39º b) no que concerne às comissões se encontram bem julgados, devendo manter-se como provados;
21. No que diz respeito aos pontos 17, 18, 19, 21, 22 e 23 da matéria dada como provada;
22. A testemunha AB... (depoimento de 01:11:49H, constante no registo gravado através do sistema integrado de gravação áudio digital “Habilus Media Studio” disponível na aplicação informática do Tribunal, cujo inicio e termo se encontram assinalados na acta e na referida gravação – inicio no dia 11.05.2015 às 15:12:28H e fim no mesmo dia às 16:24:18H - e cujo teor se dá por reproduzido), referiu nas passagens de 00:08:45 a 00:18:55 afirmou que as 3 empresas funcionavam como uma só, a comunicação institucional de marketing era efetuada através de um site comum, onde se apresentavam os serviços de mediação, intermediação e gestão de farmácias, situação que se repetia nas newsletters enviadas aos clientes e potenciais clientes. Esclareceu ainda que as 3 empresas se apresentavam na L... num stand comum, que tinham a mesma designação (1ª e 2ª RR) de G... e que os meios de trabalho, material de escritório, software (PHC) onde se registava toda a actividade eram comuns e base de dados eram comuns.
Esclareceu ainda que a equipa de trabalho das três RR era constituída pelos mesmos elementos, e todos trabalhavam sem diferenciar em cada processo o trespasse de alvará, da venda de quotas de uma sociedade, uma vez que o trabalho que era feito era, essencialmente, a angariação promoção e venda de farmácias;
23. A testemunha U... (depoimento de 01:24:43H, constante no registo gravado através do sistema integrado de gravação áudio digital “Habilus Media Studio” disponível na aplicação informática do Tribunal, cujo inicio e termo se encontram assinalados na acta e na referida gravação – inicio no dia 09.03.2015 às 15:57:10H e fim no mesmo dia às 17:21:59H - e cujo teor se dá por reproduzido), nas passagens de 00:03:50 a 00:14:32 corroborou estas afirmações de AB...;
24. O Recorrido B... (depoimento de 00:40:43H, constante no registo gravado através do sistema integrado de gravação áudio digital “Habilus Media Studio” disponível na aplicação informática do Tribunal, cujo inicio e termo se encontram assinalados na acta e na referida gravação – inicio no dia 25.05.2015 às 00:09:51H e fim no mesmo dia às 10:31:23H – e cujo teor se dá por reproduzido) nas passagens de 00:08:20 a 00:18:12 referiu que a partir do momento em que as 3 empresas forma constituídas, sempre trabalhou de forma indistinta para as todas, independentemente da entidade que visse a faturar o negocio. Acrescentou que as empresas tinham uma comunicação de marketing comum, forma à expopharma num único stand e que o quadro de pessoal era o mesmo, ou seja, todos trabalhavam para as 3 empresas sem distinção nem diferenciação;
25. Estes depoimentos forma corroborados pelo testemunho N... (depoimento de 00:22:13H, constante no registo gravado através do sistema integrado de gravação áudio digital “Habilus Media Studio” disponível na aplicação informática do Tribunal, cujo inicio e termo se encontram assinalados na acta e na referida gravação – inicio no dia 16.03.2015 às 10:33:39H e fim no mesmo dia às 10:55:53H - e cujo teor se dá por reproduzido) sobretudo nas passagens de 00:04:12:00 a 00:18:02 onde referiu que, não obstante trabalhar à distância na zona de Coimbra, sempre que ia à sede das empresas as reuniões eram efetuadas com todo o pessoal, indiferenciadamente, asseverando tratar-se do mesmo quadro de pessoal a trabalhar para as 3 empresas, com os mesmos meios de trabalho e o mesmo grau de visibilidade externa em termos de marketing;
26. Os referidos pontos 17, 18, 19, 21, 22 e 23 da matéria de facto encontram-se bem julgados, devendo manter-se como provados;
27. Quanto aos pontos 26 e 34 alínea a) dos factos provados;
28. A testemunha AB... (depoimento de 01:11:49H, constante no registo gravado através do sistema integrado de gravação áudio digital “Habilus Media Studio” disponível na aplicação informática do Tribunal, cujo inicio e termo se encontram assinalados na acta e na referida gravação – inicio no dia 11.05.2015 às 15:12:28H e fim no mesmo dia às 16:24:18H - e cujo teor se dá por reproduzido) nas passagens de 00:18:55 a 00:21:44 afirmou ter conhecimento que num determinado período que não consegue concretizar o Recorrido foi incumbido da gestão operacional da Farmácia Y..., em Coimbra, juntamente com a diretora técnica e proprietária do alvará, ali desempenhando funções durante 3/4 meses, todas as segundas-feiras;
29. O Recorrido B... (depoimento de 00:40:43H, constante no registo gravado através do sistema integrado de gravação áudio digital “Habilus Media Studio” disponível na aplicação informática do Tribunal, cujo inicio e termo se encontram assinalados na acta e na referida gravação – inicio no dia 25.05.2015 às 00:09:51H e fim no mesmo dia às 10:31:23H – e cujo teor se dá por reproduzido), nas passagens de 00:13:0 a 00:18:12 referiu que foi incumbido da gestão operacional da Farmácia Y..., em Coimbra, juntamente com a diretora técnica e proprietária do alvará, ali desempenhando funções durante 3/4 meses, todas as segundas-feiras;
30. Pelo que os referidos pontos 26 e 34 alínea a) da matéria de facto encontram-se bem julgados, devendo manter-se como provados;
31. De acordo com a factualidade dada como provada, a remuneração fixa do Recorrido era assegurada pela 1ª R e a sua remuneração variável assegurada pelas três RR, indistintamente, pelo menos até ao ano de 2012;
32. Quando o Recorrido foi contratado, além da retribuição base foi convencionada uma comissão de 12% sobre a comissão da 1ª R auferida sobre os negócios de vendas das farmácias e não obstante tal não ter ficado refletido no contrato de trabalho, a realidade até 2012 o Recorrido auferiu em todos os negócios mediados pelas três Recorrentes uma comissão de 12% sobre o valor cobrado pelas vendas das farmácias, tendo aliás. tido intervenção direta em todos os negócios;
33. Tais quantias perfaziam o montante global de € 53.978,93, acrescido do montante devido pela faturação dos negócios da Farmácia J... e Farmácia K..., cujo valor foi relegado para liquidação de sentença;
34. De acordo com o princípio da irredutibilidade da retribuição é expressamente proibido à entidade empregadora unilateralmente reduzir a retribuição do trabalhador;
35. Assim não era licito às Recorrentes deixar de pagar ao Recorrido as comissões devidas pelas vendas efetuadas em 2012 e 2013;
36. Neste sentido propugna o Ac. STJ de 16/01/2008 (Bravo Serra), p. 07S3786;
37. Tendo em conta que existia uma Pluralidade “de facto” de empregadores para o qual o A. trabalhava, devem, pois ser as 3 Recorrentes ser condenadas solidariamente no pedido nos termos do art. 92º do CT.;
38. Como estamos perante um contrato de trabalho celebrado inicialmente com a 1ª R, mas que se transformou ao longo do tempo num contrato vigente com uma tríplice entidade empregadora;
39. O Recorrido estava inserido na estrutura organizativa das três Recorrentes que eram os beneficiários da sua atividade, realizava a sua prestação laboral sob as orientações das destas, laborava em beneficio de cada uma delas no mesmo escritório que era comum às três, ou em local ou locais indicados por estas, sob as ordens do gerente/administrador de facto e de direito das mesmas, que era e é o sr. C...;
40. O Recorrido estava numa situação de dependência económica das três Recorrentes recebia o pagamento da sua retribuição fixa por parte da 1ª R e a retribuição variável indistintamente das três a quem prestava contas e responsabilidades;
41. O Recorrido utilizava no seu labor instrumentos pertencentes a cada uma das três Recorrentes;
42. O Recorrido trabalhou ininterruptamente para as três Recorrentes por período bem superior a 90 dias.
43. O contrato de trabalho celebrado com uma pluralidade de empregadores aparece regulado no art. 92º do CT. que admite expressamente que um trabalhador possa estar vinculado a uma pluralidade de empregadores que pode ocorrer nas situações previstas nos números 1 e 2 deste preceito;
44. É permitido que um trabalhador fique vinculado a vários empregadores nestes dois tipos de situações: a) Quando entre os empregadores exista uma relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, ou seja, exista uma situação de coligação intersocietária prevista e regulada no Código das Sociedades Comerciais – artºs 481º e segs. -, com excepção da relação de simples participação; b) quando os empregadores, independentemente da sua estrutura societária, mantenham estruturas organizativas comuns.
45. Esta posição é sufragada por Catarina Carvalho –“Algumas Questões Sobre a Empresa E O Direito Do Trabalho No Novo Código Do Trabalho”, in A Reforma do Código do Trabalho, Coimbra Editora, pags. 438 e ss.
46. Uma vez que o Recorrido passou, a partir de certa altura, a desenvolver a sua actividade a favor das 2ª e 3ª RR, podemos, então, falar de adesão ao contrato por parte destas, circunstância de poder existir um contrato formal em que apenas um dos empregadores aparecia identificado como tal é decisivo na qualificação jurídica da situação, desde que se estabelecesse o vínculo da subordinação jurídica;
47. Com efeito, o estabelecimento de um vínculo de subordinação jurídica, traduzido, designadamente, na circunstância de as diversas entidades que beneficiam da prestação de trabalho darem indistintamente ordens e instruções ao trabalhador ou requererem a apresentação de elementos respeitantes ao exercício das suas funções, permite-nos imputar-lhes diretamente o estatuto de empregador;
48. No caso dos autos resulta que o Recorrido trabalhava sob a subordinação das três Recorrentes respondendo apenas perante a sua chefia direta o Sr. C..., gerente/administrador das 3 três RR, existindo factualmente uma situação de pluralidade de empregadores;
49. Pelo que deve ser mantida a decisão de condenação das Recorrentes no peticionado pelo Recorrido.
Termos em que deve não deve ser concedido provimento ao presente recurso, improcedendo o mesmo.
ASSIM SE FARÁ JUSTIÇA”

2.2 Por despacho de 28-10-2015 o recurso foi admitido pelo Tribunal a quo, como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo, e, por despacho de 25-11-2015, com fundamento no facto de se mostrar documentado nos autos que as Rés H..., Lda e E..., Lda, se encontravam em processo de revitalização, correndo termos respetivamente os processos nº 1859/15.2T8VNG – J3 na 2ª Secção do Comércio (Vila Nova de Gaia) da Instância Central da Comarca do Porto e nº 8578/15.8T8VNG – J2, da 2ª Secção do comércio (Vila Nova de Gaia) da Instância Central da Comarca do Porto, estando em curso em ambos os processos a fase de negociações, foi declarada quanto àquelas, nos termos do disposto no artigo 17º-E, nº 1 do CIRE, suspensa a instância.
No mesmo despacho foi ainda determinado, quanto à Ré I..., Lda., que oportunamente os autos fossem remetidos a este Tribunal da Relação do Porto, com vista á apreciação do recurso interposto.

2.3 Subido o recurso a esta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da rejeição do recurso quanto à matéria de facto, por falta de cumprimento dos ónus estabelecidos no artigo 640.º do Código de Processo Civil – pois que se fez a sua impugnação por temas, numa mistura conjugada de excertos de depoimentos, de juízos de facto, de juízos de valor, de conceitos legais, de afirmações doutrinárias e de decisões dos Tribunais Superiores, sem indicar, ainda, com precisão e com exatidão as passagens da gravação relativas a cada facto e nas quais se fundamenta a sua impugnação –, e a sua improcedência quanto ao mais.

2.4 Com data de 18 de Abril de 2016, foi proferido Acórdão por esta Relação no qual se declarou suspensa a instância também quanto à Ré I..., Lda., não se conhecendo por essa razão do recurso.

2.5 Descendo os autos à 1ª Instância aí foi proferido, em 01-06-2016, o seguinte despacho:
“Considerando o teor do douto acórdão que antecede, e com vista à determinação das consequências das decisões proferidas nos processos que motivaram a suspensão total da instância, designadamente os processos nº 1859/15.2T8VNG- J3, 8578/15.8T8VNG- J3 e 8555/15.9T8VNG – J3, todos da 2ª Secção do Comércio, sedeada em Vila Nova de Gaia, da Instância Central da Comarca do Porto, solicite informação sobre os respetivos estados.”

2.6 Posteriormente, com data de 08/09/2016 foi determinado que se solicitasse informação sobre o estado do processo de insolvência da ré H... (processo nº 522/16.1T8VNG-J3), bem como à Conservatória do Registo Comercial competente sobre se, face ao disposto pelo art. 234º, nº 4 do C.I.R.E. corre termos processo com vista á liquidação oficiosa da ré E....”

2.7 Em 06-10-2016 foi determinada a notificação das partes para se pronunciarem, querendo, quanto às consequências do registo do encerramento da liquidação da ré E... para o prosseguimento dos presentes autos e demais ações apensas.

2.8 No seguimento de requerimento do Autor em que reiterava a substituição da Ré pelos seus sócios C... E D..., prosseguindo em consequência a ação contra estes, bem como os processos apensos, foi proferido despacho, com data de 14-11-2016, de cujo dispositivo consta:
“Defere-se, pois, parcialmente o requerido pelo autor e em consequência decide-se:
- determinar o prosseguimento dos autos e de todos os respetivos apensos contra os sócios da sociedade extinta E..., Lda, C... e D..., melhor identificados nos autos, sendo a responsabilidade destes limitada ao montante que receberem na partilha dos bens das sociedades;
- julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide no que respeita à ré H..., Lda.
Custas pelo autor e pela ré H... na proporção de metade tendo por referência 1/3 do valor da causa fixado na sentença já proferida nos autos – art. 536º, nº 2, al. e) do Código de Processo Civil.
Notifique, incluindo os supra identificados sócios C... e D....”

2.9 Posteriormente, com data de 27-02-2017 foi proferido o seguinte despacho:
“Os presentes autos encontram-se a prosseguir os seus termos contra as rés E..., Lda, substituída pelos seus sócios C... e D... e I..., S.A.
Relativamente a esta última sociedade correu termos processo de revitalização, o que, tendo entretanto cessado as demais causas de suspensão, determinou que os autos se mantivessem suspensos até ao momento.
Tal processo de revitalização conforme decorre dos autos terminou sem que tivesse sido homologado qualquer plano de revitalização e, tendo prosseguido para processo de insolvência, o mesmo está a aguardar distribuição (cfr. fls. 1023 a 1034, 1036 verso e 1038, 1039).
Consequentemente, tal como alegado pelo autor, não subsiste qualquer motivo para a suspensão dos presentes autos.
Por isso, determina-se que os autos sejam remetidos ao Tribunal da Relação para apreciação do recurso interposto da sentença.”

2.10 Subidos os autos a esta Relação pelo ora relator foi proferida decisão sumária, com o teor seguinte:
“Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, constata-se que os mesmos não estão em condições de se proceder ao conhecimento do recurso, pelas razões seguintes:
Desde logo, tendo a acção sido proposta contra três Rés, respectivamente, E..., Lda, H..., Lda e I..., S.A. (as quais vieram, realizado que foi o julgamento, a ser condenadas, nos termos da sentença então proferida), foi pelas mesmas interposto recurso de apelação para este Tribunal da Relação.
Porém, não cumprindo de momento pronunciar-me quanto ao mais, assim sobre as decisões entretanto proferidas pelo Tribunal a quo depois da descida dos autos desta Relação por decorrência do acórdão de fls. 1061, constata-se que, na sequência da pendência de processos especiais de revitalização (PER) referentes a cada uma das Rés, foi suspensa a instância quanto a todas estas, muito embora em momentos distintos, sendo que, mais tarde, todas elas foram declaradas insolventes, sem que, diga-se, conste destes autos que este facto tenha sido tido em conta quanto à representação processual das mesmas.
Em primeiro lugar, agora referindo-me apenas às Rés E... e H..., tendo os respetivos processos de insolvência sido encerrados por insuficiência de bens, ocorrendo em consequência o registo da liquidação oficiosa de tais sociedades, a determinar a extinção de ambas nos do art. 160º, nº 2 do Código das Sociedades Comerciais, tal extinção não foi tida em conta no que se refere ao mandato forense que haviam conferido ao Ilustre Advogado que as representava, continuando o mesmo o ser notificado como se o mandato se mantivesse válido não obstante aquela extinção das Rés, praticando mesmo actos em seu nome, entre os quais pronúncia sobre o requerimento do Autor no sentido do prosseguimento da ação contra os sócios da Ré E..., nomeadamente C... e D..., ao abrigo do disposto no artigo 162.º do CSC.
Em segundo lugar, independentemente do que se referiu anteriormente, não cumprindo aqui pronúncia naturalmente sobre a bondade da decisão proferida pelo Tribunal a quo em 14/11/2016, a verdade é que, não relevando propriamente para a questão que se aprecia o decidido na parte em que se julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide no que respeita à ré H..., já, porém, referente à parte em que se decidiu determinar o prosseguimento dos autos e de todos os respetivos apensos contra os sócios da sociedade extinta E..., Lda., C... e D..., sendo a responsabilidade destes limitada ao montante que receberem na partilha dos bens das sociedades, a verdade é que não resulta dos autos que esses tenham sido sequer citados para os termos da acção, sendo que, necessariamente, não sendo de confundir as pessoas jurídicas Ré (entretanto extinta) e os respectivos sócios, sendo que sempre só estes – e não pois a sociedade extinta –, depois dessa citação para os termos da causa, passarão a assumir nesta causa a posição de Réus[1]. E, porque assim é, tendo presente que na presente acção já foi proferida sentença, a qual é porém objecto de recurso, porque este foi interposto por pessoas colectivas entretanto extintas – deixando assim de ter personalidade e capacidade judiciárias[2] –, sempre se imporá, para o conhecimento daquele recurso, que manifestem no processo essa expressa intenção, com obrigatória junção de procuração em que atribuam poderes forenses a advogado (artigo 40.º, n.º 1, al. c), do CPC), sob pena de, não o fazendo, se retirarem as legais consequências, assim, no caso, de não ter seguimento o recurso (artigo 41.º do CPC). Aliás, ainda a esse propósito, importa ter presente que eventuais custas processuais devidas passarão a ser a cargo não das sociedades extintas e sim das pessoas contra as quais prossegue o processo.
Por outro lado, agora a respeito da sociedade I..., S.A., o conhecimento dos autos da sua declaração de insolvência terá de justificar pronúncia[3], face ao disposto no CIRE, incluindo para efeitos da própria representação no processo, assim eventual intervenção do administrador de insolvência – artigo 85.º e 86.º, desde logo se estiverem em causa bens patrimoniais com interesse para o processo de insolvência –, e, particularmente, no que agora nos ocupa, quanto aos efeitos daquela declaração para o mandato conferido a advogado, valendo aqui o que se referiu anteriormente a esse propósito.
Do exposto resulta, pois, que previamente à remessa dos autos a esta Relação se impõe ao Tribunal a quo que estabilize, nos termos impostos por lei, quer a instância, de modo a saber-se quem são afinal as partes na acção do lado passivo e, porque foi interposto recurso, quem assume agora a qualidade de recorrente, como ainda, nesse caso, que tenha constituído, como imposto por lei, mandato a favor de advogado, sob pena de o recurso não ter seguimento.
São estas as razões que impõem, por não estarem em condições de ser objecto de conhecimento por esta Relação, a devolução dos autos à 1.ª Instância, o que se determina.”

2.11 Baixando os autos à 1ª Instância, realizadas diversas diligências, com data de 14-12-2017 foi proferido despacho com o teor seguinte:
“Nos presentes autos de acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum que B... intentou, além do mais, contra I..., S.A., com vista ao pagamento de créditos salariais, uma vez que, conforme resulta da certidão de fls. 1206 a 1210, a ré foi declarada insolvente por sentença transitada em julgado, considerando a vocação universal do processo de insolvência, nomeadamente da reclamação de créditos, para apreciar todos os créditos invocados pelos credores do insolvente e o teor do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência proferido pelo STJ em 08/05/2013, publicado no DR, 1ª série, nº 39 de 25/02/2014, nos termos do disposto pelo art. 277º, al. e) do C.P.C., julgo extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.
Custas pelo autor e pela ré I..., na proporção de metade tendo por referência 1/3 do valor da causa fixado na sentença já proferida nos autos – art- 536º, nº 2, al. e) do Código de Processo Civil.”
Mais se fez constar:
“Considerando a decisão supra os presentes autos prosseguirão agora, apenas contra a ré E..., substituída pelos sócios liquidatários, conforme decisão de fls. 1151 a 1155.
Uma vez que os mesmos vieram expressamente declarar que mantém interesse no recurso interposto pela ré E... da sentença proferida nos autos e que, face á respectiva declaração de reiteração da procuração já junta aos autos pela qual constituíram mandatário o Dr. AD... e que se nos afiguram supridas as deficiências a que se referiu a douta decisão do Venerado Tribunal da Relação de fls. 1180 a 1182, após trânsito em julgado da decisão supra, remeta os autos àquele Tribunal com vista à apreciação do recurso.”

2.12 Subidos os autos de novo a esta Relação, cumpridas as formalidades legais, cumpre decidir:

II. Questões prévias
1. Delimitação do âmbito do recurso
Como resulta do que se fez constar do relatório, tendo sido o recurso interposto num momento em que na ação figuravam como Rés as sociedades E..., Lda., H..., Lda., e I..., S.A., veio posteriormente, na sequência da declaração de insolvência de todas elas, a ser declarada nos autos a extinção da instância, sendo que os autos prosseguem, assim também a apreciação deste recurso, apenas contra a E..., substituída pelos sócios liquidatários, conforme decisão proferida nos autos, a fls. 1151 a 1155, decisão esta que, importa ainda esclarecer, não é objeto de apreciação em sede do presente recurso, no qual apenas se terá em consideração, face a tal decisão, a substituição operada e aí afirmada, nos termos em que o foi, sem apreciação pois, porque extravasa o âmbito do nosso conhecimento, quaisquer consequências que possam decorrer daquela decisão para a afirmação de eventuais direitos.
Com o referido esclarecimento, importando entrar na apreciação do recurso, uma questão prévia se impõe também desde já apreciar, levantada expressamente no parecer a que alude o n.º 3 do artigo 87.º do Código de Processo de Trabalho (CPT), assim a de saber se esse é ou não de rejeitar quanto à reapreciação da matéria de facto.

2. Admissibilidade do recurso sobre a matéria de facto
No seu parecer sustenta o Exmo. Procurador-Geral Adjunto que o recurso deve ser rejeitado quanto à reapreciação da matéria de facto, por falta de cumprimento dos ónus estabelecidos no artigo 640.º do Código de Processo Civil, sustentando que a Recorrente faz a sua impugnação por temas – assim, inexistência de comissões, inexistência de pluralidade de empregadores e inexistência de responsabilidade solidária –, fazendo uma mistura conjugada de excertos de depoimentos, de juízos de facto, de juízos de valor, de conceitos legais, de afirmações doutrinárias e de decisões dos Tribunais Superiores, sem indicar, sequer, com precisão e com exatidão as passagens da gravação relativas a cada facto e nas quais fundamenta a sua impugnação.
Não tendo ocorrido pronúncia por parte da Apelante, cumprindo apreciar, não poderemos deixar de acompanhar, como veremos de seguida, o bem fundamentado parecer do Exmo. Procurador-Geral Adjunto.
Dispõe o n.º 1 do artigo 662.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 87º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho (CPT), que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Aí se abrangem, naturalmente, as situações em que a reapreciação da prova é suscitada por via da impugnação da decisão sobre a matéria de facto feita pelo recorrente.
Nestes casos, deve porém o recorrente observar o ónus de impugnação previsto no artigo 640.º, no qual se dispõe:
“1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”
Nas palavras de Abrantes Geraldes, “(…) a modificação da decisão da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que foi declarado na 1.ª instância”[4]. Contudo, como também sublinha o mesmo autor, “(..) a reapreciação da matéria de facto no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662.º não pode confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter”[5].
Tendo por base os citados dispositivos legais, teremos de considerar que a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação, tendo que ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância – pois que só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição[6] –, muito embora não se trate de um segundo julgamento e sim de uma reponderação, não se basta com a mera alegação de que não se concorda com a decisão dada, exigindo antes da parte que pretende usar dessa faculdade, a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos, sem limitar porém o segundo grau de sobre tais desconformidades, previamente apontadas pelas partes, se pronunciar, enunciando a sua própria convicção – não estando, assim, limitada por aquela primeira abordagem pois que no processo civil impera o princípio da livre apreciação da prova, artigo 607.º, nº 5 do CPC[7].
Do exposto resulta, assim, que o cumprimento do ónus de impugnação que se analisa, não se satisfazendo como se disse com a mera indicação genérica da prova que na perspetiva do recorrente justificará uma decisão diversa daquela a que chegou o tribunal recorrido, impõe ao recorrente que concretize quer os pontos da matéria de facto sobre os quais recai a sua discordância quer, ainda, que especifique quais as provas produzidas que, por as ter como incorretamente apreciadas, imporiam decisão diversa, sendo que, quando esse for o meio de prova, se torna também necessário que indique com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição.
Discorrendo sobre a matéria, escreve-se no recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de outubro de 2016[8] que, “Como resulta claro do art. 640º nº 1 do CPCivil, a omissão de cumprimento dos ónus processuais aí referidos implica a rejeição da impugnação da matéria de facto”, observando-se também no Acórdão do mesmo Tribunal de 7 de julho de 2016[9] que, “para que a Relação possa apreciar a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, tem o recorrente que satisfazer os ónus que lhe são impostos pelo artigo 640º, nº 1 do CPC, tendo assim que indicar: os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, conforme prescreve a alínea a); os concretos meios de prova que impõem decisão diversa, conforme prescrito na alínea b); e qual a decisão a proferir sobre as questões de facto que são impugnadas, conforme lhe impõe a alínea c).” Ainda, por último, no mesmo sentido, conclui-se no Acórdão do mesmo Tribunal de 27 de outubro de 2016[10], – proferido num caso em que a Relação não conheceu do recurso relativamente à impugnação da decisão sobre a matéria de facto não pelo incumprimento pela recorrente no corpo das alegações, dos ónus impostos pelos nºs 1 e 2, al. a) do art. 640º e sim pelo facto de se terem omitido nas conclusões a indicação de quais as alíneas da matéria de facto provada e/ou quais os números da matéria de facto não provada que se impugnam, bem como a decisão, que no entender do recorrente, deveria ser proferida sobre esses concretos pontos da factualidade provada e/ou não provada –, que o “Supremo Tribunal já por variadas vezes se pronunciou sobre a questão, tendo, de forma reiterada, decidido que, para cumprimento dos ónus impostos pelo art. 640º do CPC, o recorrente terá que indicar nas conclusões, com precisão, os pontos da matéria de facto que pretende que sejam alterados pelo tribunal de recurso e a decisão alternativa que propõe.”[11] Em conformidade com esse entendimento, aí se conclui, também, que “perante a sobredita omissão, não havia lugar ao convite ao aperfeiçoamento, mas à rejeição do recurso no tocante à impugnação da decisão sobre a matéria de facto”.
Por referência ao afirmado regime, constata-se que, no caso, tal como salienta o Exmo. Procurador-Geral Adjunto no parecer que emitiu, não foram adequadamente cumpridos os ónus a que antes aludimos, estabelecidos no artigo 640.º do CPC, pois que, sustentando que os pontos 4°, 27°, 30° e 33º (quando se refere 12% das comissões auferidas pela Ré), 38°, alíneas d), e) e f), 17°, 16°, 21°, 220, 23° e, por último, 26° e 34°, alínea a), todos da matéria de facto provada devem ser julgados e considerados como não provados, constata-se que, de modo manifesto, a impugnação não é dirigida, como se impunha, a factos concretos e adequadamente individualizados que o Tribunal tenha dado como provados ou não provados, sendo-o antes por temas/conjunto de factos, assim, como bem se evidencia naquele Parecer, a inexistência de comissões, inexistência de pluralidade de empregadores e inexistência de responsabilidade solidária, sendo que, por referência pois a esses temas, globalmente considerados, faz-se referência a excertos de depoimentos prestados, fazendo-se apelo a juízos de facto e/ou de valor, a conceitos legais, afirmações doutrinárias e a decisões dos Tribunais Superiores, sem se indicar, sequer, quanto às passagens de depoimentos a que se faz apelo, a que facto concreto, devidamente individualizado, se dirigem – ou seja, sem indicação, quanto a cada facto a que se dirige o recurso, com precisão e com exatidão, quais as passagens da gravação relativas a esse facto nas quais se fundamenta a impugnação.
Isso mesmo de evidencia, de modo claro, no parecer do Exmo Procurador-Geral Adjunto quando refere o seguinte (citando):
“a. Para concluir pela inexistência de comissões afirma:
- O recorrido não logrou provar que tinha direito a uma bonificação, em virtude de todas as vendas realizadas pelas recorrentes pela aplicação da percentagem de 12%”:
- Não ficou refletido no contrato escrito qualquer comissão de 12% sobre as vendas de farmácias”;
- Diz-nos “a experiência da vida e suas regras que as bonificações visam premiar o trabalho individual e não o trabalho desenvolvido e não o trabalho desenvolvido por todas as empresas, já que para isso existe a figura da participação nos resultados”, etc.
b. Para concluir Dela inexistência de pluralidade de empregadores refere.
- “O artigo 101° do Código do Trabalho vigente impõe que o acordo de pluralidade de empregadores esteja sujeito á forma escrita, sem distinguir a sua celebração originária e ou sucessiva”;
- “O contrato de trabalho foi celebrado apenas com a 1ª ré, ora recorrente. Deste modo, não se afigura possível a existência de uma pluralidade de empregadores”;
- “Como resulta do que antecede, as recorrentes partilham, apenas, a mesma morada e alguns serviços de natureza administrativa”;
- “Sendo certo que a comunicação institucional de marketing não é única, nem é efetuada através do site comum às três empresas;
- “Além disso, não é verdade que a equipa de trabalho seja constituída pelos mesmos elementos pois apenas a rececionista e o Técnico de Contas são comuns às três recorrentes”
- “Assim, verifica-se que as três recorrentes não constituíram uma única realidade económica, que entre as mesmas não subsiste uma relação societária de participações reciprocas, de domínio ou de grupo, nem tão pouco possuem uma estrutura organizada comum”, etc.
c. Para concluir pela inexistência de responsabilidade solidária diz:
- ‘Efetivamente, se pluralidade de empregadores houvesse, de facto, certo é que, não havendo acordo escrito, ela era nula, seja originária seja sucessiva”;
- “Na ausência de acordo escrito, o n.º 5, do artigo 101°, confere ao trabalhador o direito de optar pelo empregador ao qual fica vinculado - “Ainda que se considere a existência, de facto, de uma relação jurídica plural, não podem ser olvidadas as consequências jurídicas daí resultantes e que se traduzem na vinculação a um único empregador”; etc.”

Para além do que se referiu anteriormente, sequer é afinal indicada, assim em cumprimento do ónus estabelecido na alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º, a decisão que deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, o que se tonaria necessário face à posição que se assume no recurso, nos termos que resultam, expressamente, da posição que sobre essas assume, bem elucidada na transcrição anterior, pois que, apresentando afinal uma outra realidade factual, diversa da que consta dos factos, importaria que, em conformidade, indicasse a redação a dar aos factos em conformidade com tal realidade.
Tudo o que se referiu permite concluir, como no parecer do Exmo Procurador, pala falta de cumprimento dos ónus de impugnação estabelecidos no artigo 640.º do CPC, do que resulta, como nesse estabelecido, concordando-se assim com a conclusão daquele parecer, a rejeição do recurso no que à impugnação da matéria de facto diz respeito, o que se decide.

III. Questões a resolver
Sendo pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso (artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC) – aplicável “ex vi” do artigo 87.º, n.º 1, do CPT –, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir: (1.) O Direito do caso: (1.1) Conceito de retribuição/as comissões; (1.1.1) Do caso julgado; (1.2) Da pluralidade de empregadores.
***
IV – Fundamentação
A) De facto
O tribunal a quo deu como provados os factos seguidamente transcritos:
“1) O A. e a 1ª R. celebraram no dia 27 de abril de 2009 um contrato de trabalho, com o teor do documento de fls. 35 a 40, que se dá por reproduzido, pelo qual o autor foi admitido ao serviço daquela para exercer por sua conta, sob a sua autoridade, direcção e fiscalização a categoria profissional de Diretor Comercial.
2) Competindo-lhe, entre outras tarefas: a coordenação e direção das equipas de mediação, prospeção de mercado, angariação de clientes interessados na compra e venda de farmácias, estabelecer a ponte entre potenciais compradores e vendedores.
3) Sendo que o A. auferia ultimamente uma remuneração base de € 1.007,00, acrescida de outro tanto a título de “cláusula de não concorrência”.
4) Acrescida ainda de uma retribuição variável de comissões de 12% sobre as comissões das vendas efetuadas.
5) O contrato de trabalho do A. cessou no dia 07 de Abril de 2013 por extinção de posto de trabalho, o que foi objeto de impugnação judicial no processo nº 386/13.7TTMTS, do 1º Juízo do Tribunal do Trabalho de Matosinhos, que findou por acordo, através do qual a ré aceitou pagar ao autor, além do mais, a quantia líquida de € 20.000,00, como compensação global pela cessação do contrato, calculada em função da retribuição base aceite pelas partes de € 2.014,00, nos demais termos do documento de fls. 45 a 47, que se dão por reproduzidos.
6) A 1ª R., é uma sociedade de mediação imobiliária que tem como sócios C... e D..., sendo o gerente o sócio C....
7) A compra e venda de farmácias era efetuada mediante o trespasse do respetivo alvará ou da venda de quotas ou ações de uma sociedade detentora de uma farmácia.
8) Quando o A começou trabalhar para a 1ª R, em 2009, esta tinha designação de G..., Lda e, não obstante ter no seu objeto social medição imobiliária e, em abstrato, poder intervir apenas enquanto mediadora em trespasses de alvarás de farmácias, atuava também na intermediação de negócios de compra e venda de quotas ou ações de sociedades detentoras de uma farmácia.
9) Na sequência da mediação da compra da Farmácia AE... (Porto) o A. e a 1ª R. foram confrontados pelo marido de uma das proprietárias com o facto de que a venda de quotas de uma sociedade estava fora do âmbito de trabalho de uma imobiliária, colocando em causa o contrato de mediação assinado com a 1ª R.
10) Nesta sequência o sócio gerente da 1ª R. criou a 2ª R., G..., Lda, para, além do mais, intermediar os negócios em que estivessem em causa venda de quotas ou ações de sociedades detentoras de farmácias.
11) A referida sociedade tem como objecto: prestação de serviços de verificação contabilística de documentos e informação sobre as empresas; corretagem comercial, nomeadamente atividades de intermediação na compra e venda de pequenas e médias empresas, incluindo farmácias; corretagem de patentes; actividades de avaliação, exceto de bens imobiliários e seguros. Elaboração de estudos económicos e financeiros. Consultoria para os negócios e a gestão.
12) Tinha como sócios a 1ª R. e C..., sendo gerente o sócio C..., o sócio e gerente da 1ª R.
13) A partir dessa data o A. passou a trabalhar indistintamente para as duas sociedades, independentemente de qual faturasse a comissão dos negócios de trespasses ou venda de alvarás ou negócios de vendas de quotas.
14) O sócio e gerente da 1ª e 2ª RR era igualmente administrador único da 3ª R., constituía em Janeiro de 2009, com o intuito de fazer a gestão de farmácias e prestar serviços a farmácias, com o objeto social de consultoria para negócios, serviços relativos a contabilidade e recursos humanos, exploração, aquisição e marketing de farmácias; comércio por grosso de representação, importação e exportação de todo o tipo de artigos para a área da saúde.
15) As três sociedades tinham sede na mesma morada.
16) Operavam no mesmo espaço físico, partilhando as mesmas instalações.
17) A comunicação institucional de marketing era efetuada através de um site comum, pelo menos à 1ª e 2ª RR, onde se apresentavam os serviços de mediação, intermediação e gestão de farmácias.
18) Situação que se repetia nas newsletters enviadas aos clientes e potenciais clientes.
19) As três RR apresentavam-se na L... num stand comum.
20) A 1ª e 2ª RR designavam-se ambas G....
21) Os meios de trabalho, material de escritório, software (PHC) onde se registava toda a actividade eram comuns, pelo menos à 1ª e 2ª RR, tendo para as duas a mesma base de dados.
22) A equipa de trabalho das três RR era constituída pelos mesmos elementos, designadamente:
Gerente – C..., Diretor,
Diretor comercial – B...,
Secretaria/Telefonista – M...,
Gestor de Backoffice/Administrativo – U...,
Comerciais – N..., AF....
23) Sendo que todos trabalhavam sem diferenciar em cada processo o trespasse de alvará, da venda de quotas de uma sociedade, uma vez que o trabalho que era feito era, essencialmente, a angariação promoção e venda de farmácias
24) O A. geria uma equipa de comerciais, cujo trabalho consistia em angariar o cliente (farmácia ou comprador).
25) O A. efetuou a apresentação inicial da 3ª ré em “PowerPoint”, estando envolvido no seu arranque.
26) Por determinação do Sr. C..., gerente e administrador das três rés, o A. foi incumbido da gestão operacional da Farmácia Y..., em Coimbra, juntamente com a diretora técnica e proprietária do alvará, ali desempenhando funções durante 3/4 meses, todas as segundas-feiras.
27) O A. recebia o pagamento da sua retribuição fixa por parte da 1ª R e a retribuição variável indistintamente das três RR.
28) No exercício da sua actividade em benefício das três RR, o autor utilizava viatura, telemóvel e computador portátil, pertencentes pelo menos à primeira ré.
29) O autor respondia apenas perante a sua chefia direta, o Sr. C..., gerente/administrador das três rés.
30) Até 2012 o autor auferiu em todos os negócios mediados pelas três rés uma comissão de 12% sobre o valor cobrado.
31) Pela venda da Farmácia AG... situada em ..., em que foi realizado um trespasse de alvará à empresa AH... Lda, uma das rés recebeu de comissão 150.000,00€+IVA.
32) O A. recebeu ainda antecipadamente 31.200,00€, da 3ª ré, por conta de 2 negócios: da venda da Farmácia AI..., de Cinfães através da qual uma das rés recebeu comissão de mediação 200.000,00€+IVA e da venda da Farmácia AJ..., situada em ..., da qual uma das rés deveria receber de comissão de mediação 60.000,00€+IVA.
33) O A. recebeu da 3ª R a quantia bruta de € 49.200 (12% das comissões auferidas pelas rés) titulada por atos isolados subscritos por este e pela companheira AC..., e contra a entrega de faturas.
34) No ano de 2011 o A. teve intervenção nos seguintes negócios realizados pelas RR:
a) venda das quotas da empresa I1..., pertencente ao sócio gerente das RR que detinha a exploração da Farmácia Y..., Coimbra, mediante o qual a 2ª ré recebeu 88.000,00€+IVA, tendo a comissão sido paga pela Z..., Lda;
b) venda da Farmácia AK..., Castelo Branco (negócio de cessão de quotas) tendo uma das RR recebido um cheque de 44.500,00€ título de comissão;
c) venda da Farmácia AL..., sita em Oeiras (cessão de quotas), tendo uma das RR recebido a comissão de 50.000,00€+IVA paga por AM...;
d) venda do alvará da Farmácia AN..., ..., tendo uma das rés recebido 27.500,00€+IVA a título de comissão da AO..., Lda,
e) venda da Farmácia AP..., ... tendo uma das RR recebido 35.700,00€ em 2011 e outros 35.700,00€ em prestações em 2012 da AQ..., Lda;
f) venda do alvará da Farmácia AS..., V.N.Gaia, tendo uma das RR recebido 85.000,00€ paga pela sociedade AT..., Lda e por AU... e sido faturado como consultoria;
g) venda da Farmácia AI..., Cinfães (cessão de quotas), tendo uma das rés recebido 60.975,00€+IVA, quantia que foi faturada à sociedade AV..., Lda.
35) Em 2011 o A recebeu da 2ª ré a quantia bruta de € 27.180 (tendo sido deduzida a quantia de € 31.200 recebida como adiantamento em 2010) a título de comissão de 12% sobre a comissão cobrada pelas rés aos seus clientes.
36) Tendo o autor emitido atos isolado a favor da 2ª R e entregue faturas para titular a transferência.
37) Em 2012, após propostas de alteração do pagamento das comissões, que o autor não aceitou, o sócio gerente das três RR decidiu, deixar de pagar as comissões.
38) No ano de 2012 foram realizados pelas rés os seguintes negócios (que tiveram a intervenção do autor):
a) Farmácia AP..., ... (venda de quotas) tendo uma das RR durante 2012, recebido os restantes 35.700,0€+IVA que foram faturados à AQ...;
b) Farmácia AE..., Lisboa (venda de alvará), tendo uma das RR recebido 50.000,00€+ IVA, tendo a farmácia sido comprada pela empresa, AW..., Lda;
c) intermediação da compra e venda (de quotas) da Farmácia AX..., Coimbra, recebendo uma das RR 63.000,00€+IVA, valor que foi faturado como consultoria de gestão à empresaAY..., Lda;
d) venda da Farmácia O..., Gaia (venda de quotas) tendo a 2ª R recebido 75.000,00+IVA, valor que foi faturado como serviços prestados no âmbito de mediação, à empresa AZ..., Lda,
e) venda da Farmácia Q... (venda de Alvará) ..., Albufeira a 1ª R recebeu 18.000,00€ + IVA, valor faturado à empresa BB..., Lda;
f) intermediação na venda (venda de quotas) da Farmácia P..., ..., Silves recebeu a 2ª R 50.000,00€+IVA, faturada à empresa BC..., S.A.
g) venda (de quotas) da Farmácia BD..., Vagos, tendo uma das rés recebido 35.000.00€+IVA, sendo faturada metade da comissão a duas empresas;
h) BE..., Lda, com sede no ...;
i) Farmácia BF..., com sede na Rua ..., nº .., ....;
j) venda (venda de Alvará) da Farmácia BG..., Sintra, tendo uma das RR recebido a comissão de 32.850,00€+IVA, faturada à empresa BH...;
k) avaliação das Farmácias V... (P. Delgada), W... (Arouca) e BK... (Braga) tendo sido cobrado pelas RR o total de 4.250,00€+IVA.
39) Até Abril de 2013 concretizaram-se ainda os seguintes negócios com intervenção do A.:
a) venda da Farmácia AI..., Porto (venda de alvará) em que a 2ª R recebeu a quantia de 45.000,00€+IVA, sendo compradora a BM..., Lda,
b) venda da Farmácia K..., Lisboa (venda de quotas) em que a 2ª R recebeu a quantia de € 50.000,00, faturada a BB..., Lda;
c) Farmácia J..., ... (venda de quotas).”
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B) Discussão
1. O direito do caso
O objeto de recurso e assim o nosso conhecimento, o que aliás resulta expressamente da 1.ª conclusão constante das alegações, passa pela apreciação das questões seguintes: (1.1) o pagamento ou não ao Autor de valores a título de comissões e consequências que daí resultam, (1.1.1) incluindo a apreciação da existência ou não de caso julgado face ao acorrido no processo nº 386/13.7TTMTS que terminou por acordo entre as partes; (1.2) a existência ou não de uma situação de pluralidade de empregadores e, por decorrência, (1.2.1) saber se existe ou não responsabilidade solidária.
Conhecendo:
1.1 Conceito de retribuição/ das comissões
Sustenta-se no recurso (conclusões II a XVII) que o Autor não logrou provar que tinha direito a uma bonificação, em virtude de todas as vendas realizadas pelas Recorrentes, pela aplicação da percentagem de 12%, estando antes em causa, diversamente, em função do cumprimento de objetivos de vendas, como foi acordado, o pagamento de um prémio, cuja função principal é a de recompensar a produtividade e o desempenho profissional dos trabalhadores, não se considerando assim, de acordo com o disposto na alínea c), do n.º 1 do artigo 260.º do Código de Trabalho (CT/2009), retribuição, razão pela qual era lícito deixar de o pagar, sem que isso represente violação do princípio da irredutibilidade da retribuição.
Em sentido contrário se pronuncia o Apelado, pugnando pelo acerto da sentença recorrida, no que é acompanhado Pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto no seu parecer.
A decisão recorrida, fazendo designadamente apelo ao disposto nos artigos 129.º, n.º 1, al. d), 258.º, 61.º, 262.º, n.º 2, al. a), do CT/2009, concluiu que, constituindo as comissões “prestações variáveis que se traduzem na atribuição ao trabalhador de uma parte, normalmente definida em percentagem, do valor das transacções realizadas, em nome e proveito do empregador”, as mesmas, “desde que convencionadas no contrato ou prestadas com regularidade e periodicidade”, devem considerar-se retribuição”[12], daí resultando que “o empregador não pode alterar as condições básicas do contrato no que respeita à atribuição de comissões sem acordo do trabalhador, a menos que tal alteração não constitua uma forma substancialmente distinta de determinação da remuneração variável, ou resulte de alteração do ponto de vista da prestação de parte do trabalhador.”
Ora, chamados a pronunciarmo-nos sobre essa questão nesta sede recursiva, desde já avançamos ser o nosso entendimento coincidente com o sentido decisório da decisão recorrida, como ainda a sua fundamentação, por apelo ao quadro normativo aplicável, assim, como naquela, o resultante do CT/2009 – pois que, remontando o início do contrato de trabalho a 27 de Abril de 2009, é à luz desse que a questão deve ser analisada e decidida.
Não obstante a suficiência da fundamentação constante da sentença, com o intuito de melhor se esclarecer a nossa posição, diremos ainda o seguinte:
Dentro do quadro normativo aplicável, em resposta sobre o que há-de entender-se por retribuição, importa ter presente o que se dispõe no artigo 258.º do CT/2009, resultando dos seus n.ºs 1 a 3 que “considera-se retribuição a prestação que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho” (n.º 1), incluindo-se nessa “a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie”, sendo que “presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador” (n.º 3)[13].
Do citado normativo resulta que, em face do que se dispõe no seu n.º 3, tendo em conta os princípios de repartição do ónus da prova – especificadamente o disposto no n.º 1 do artigo 344.º do Código Civil –, é sobre o empregador que impende o ónus de provar que certa prestação que fez ao trabalhador não tem a natureza de retribuição.
Como se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Outubro de 2012, a retribuição representa, assim, “a contrapartida, por parte do empregador, da prestação de trabalho efectuada pelo trabalhador, sendo que o carácter retributivo de uma certa prestação exigia regularidade e periodicidade no seu pagamento, o que tem um duplo sentido: por um lado, apoia a presunção da existência de uma vinculação prévia do empregador; por outro lado, assinala a medida das expectativas de ganho do trabalhador.”
Deste modo, devendo entender-se por regularidade da prestação que essa não é arbitrária, mas sim constante, a periodicidade determina que essa seja paga em períodos certos ou tendencialmente certos no tempo, assumindo-se pois esta ideia de periodicidade como típica do contrato de trabalho. Do exposto resulta que, sendo em primeira linha a retribuição determinada diretamente pelo clausulado do contrato e pelos usos laborais – sem esquecermos, naturalmente, o que resulta ainda de certos critérios normativos, como o sejam o salário mínimo, a igualdade retributiva, etc. –, já num segundo momento, porém, lhe poderão acrescer certas prestações que preencham os aludidos requisitos de periodicidade e regularidade.
Sublinhando o primeiro critério a ideia de correspetividade ou contrapartida negocial – é retribuição tudo o que as partes contratarem (ou resultar dos usos ou da lei para o tipo de relação laboral em causa) como contrapartida da disponibilidade da força de trabalho –, já o segundo, por sua vez, assenta numa presunção – considera-se que as prestações que sejam realizadas regular e periodicamente pressupõem uma vinculação prévia do empregador e suscitam uma expetativa de ganho por parte do trabalhador, ainda que tais prestações se não encontrem expressamente consignadas no contrato[14].
Nos termos expostos, a retribuição do trabalho assume-se como o conjunto de valores, pecuniários ou não, que a entidade patronal está obrigada a pagar, regular e periodicamente, ao trabalhador em razão da atividade por este desempenhada – ou, mais rigorosamente, da disponibilidade da força de trabalho por ele oferecida[15] –, sendo integrada assim não só pela remuneração de base como ainda por outras prestações regulares e periódicas, feitas direta ou indiretamente, desde que estas, sendo como se disse de carácter regular e periódico, criem no trabalhador a convicção de que constituem um complemento do seu salário[16].
Assim tem sido afirmado pela doutrina e jurisprudência, que nos têm dado, do mesmo modo, o mote para a solução, caso a caso[17], incluindo no que se refere, como na situação que se decide, às chamadas comissões sobre vendas, traduzidas em percentagem sobre o valor dessas, como também que a sua retirada por ato unilateral do empregador viola o chamado princípio da irredutibilidade da retribuição – garantia para o trabalhador prevista na lei ordinária (no sentido de que a retribuição não pode ser diminuída exceto nos casos legalmente previstos) –, de que é exemplo, porque elucidativo, o Acórdão de 16 de Janeiro de 2008[18], então sobre o regime vigente no domínio da LCT, mas com plena aplicação ao caso – em termos de sucessão de vigência de normas até ao presente, o artigo 258.º do CT/2009 corresponde, sem alterações relevantes quanto ao que ao caso interessa, ao que constava dos n.º s 1 a 3 do artigo 249.º do CT/2003 e artigo 82.º da LCT, aprovada pelo DL n.º 49 408, de 24.11.1969 –, afirmando, nomeadamente, estando em causa uma retribuição mista, porque constituída pela retribuição base e por uma parte variável, assim as comissões correspondentes a uma percentagem do valor da faturação, esta não poderia deixar de ser paga, precisamente porque “quando a lei fala na proibição de diminuição da retribuição não está a referir-se à retribuição global mas à retribuição estrita, ou seja, àquelas prestações que o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho e tudo o que seja pago com carácter de regularidade (arts. 82º nºs.1 e 2 da LCT e 249º nºs. 1 e 2 do CT.).” Mais se evidenciou no mesmo Aresto, a propósito das comissões, que estas integravam, como parte variável, a retribuição – “como, aliás, não poderia deixar de ser, consoante decorria do artº 82º, nº 2, do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho aprovado pelo Decreto-Lei nº 48.408, de 24 de Novembro de 1969, à data vigente, solução que, hoje, continua a ser consagrada no artº 249º, nº 2, do Código do Trabalho), entendida esta no seu sentido estrito” –, sem deixar de se ter presentes os ensinamentos da Doutrina[19] e o afirmado pela Jurisprudência, também a propósito de o chamado princípio da irredutibilidade da retribuição, considerada em sentido estrito, constituir “uma garantia para o trabalhador prevista na lei ordinária” – “no sentido de que a retribuição não pode ser diminuída excepto nos casos legalmente previstos”.
Mais recentemente, nesse caso sobre as denominadas “Comissões de Vendas a Bordo”, se pronunciou mais uma vez, em diversos arestos, o Supremo Tribunal de Justiça, no sentido de que essas integravam o conceito de retribuição, de que é exemplo o Acórdão de 17 de Novembro de 2016[20], em que se pode ler, citando, que “como se concluiu em qualquer dos citados Acórdãos do STJ, as Comissões de Vendas a Bordo integram o conceito de retribuição”
Sendo este também, como se disse, o nosso entendimento, improcede o recurso no que a esta questão diz respeito.

1.1.1 Do caso julgado
Nas conclusões XVIII a XXII invoca-se uma outra questão, assim a da ocorrência da exceção do caso julgado, fazendo-se apelo à transação homologada por sentença no processo n.º 386/13.7TTMTS, assim o seu ponto V, em que consta o seguinte: “As partes consideram extintas todas as obrigações e deveres decorrentes do contrato de trabalho celebrado entre ambos, à exceção de questões relacionadas com comissões que o autor entende lhe serem devidas, e se reserva o direito de acionar judicialmente a ré em sede própria, as quais não foram reclamadas nesta ação e que a ré não reconhece dever”.
Mais uma vez sem razão, porém, como veremos de seguida.
Na verdade, tornando-se necessário fazer o enquadramento da questão suscitada, assim do caso julgado, limitar-nos-emos, evitando extensos e desnecessários exercícios teóricos, a remeter para o que, há muito, tem sido afirmado pela Doutrina[21] e Jurisprudência, em particular sobre as suas vertentes negativa – impedimento de que as questões se possam voltar a suscitar, entre as mesmas partes, em ação futura – e positiva – vulgarmente designada por autoridade do caso julgado, no sentido de que a solução naquele compreendida se torna vinculativa noutros casos a ser decididos nos tribunais. Sendo unânime, quanto a esta última função (negativa, ou exceção de caso julgado), que terá de verificar-se a (tríplice) identidade que resulta do disposto no artigo 581.º do CPC, assim a identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir[22], já quanto à primeira (autoridade do caso julgado) tem havido, como é consabido, desde há muito divergências, pois que enquanto para alguns Autores – no que são acompanhados pela maioria da jurisprudência[23] – a autoridade do caso julgado não requer aquela referida tríplice identidade, podendo assim estender-se a outros casos – nomeadamente quanto a questões que sejam um antecedente lógico necessário da parte dispositiva do julgado[24], já para outros[25], diversamente, ambas as funções estão afinal sujeitas àquela tríplice identidade.
Importando então aplicar tais critérios ao caso, do que se trata é de saber se a homologação judicial da transação ocorrida no processo supra referenciado obsta a que o Autor, sendo precisamente este o objeto da presente ação, possa pedir, e assim ser condenada a Ré (como o foi na sentença recorrida) no seu pagamento, comissões de 12% sobre as efetuadas.
Ora, cumprindo apreciar, a resposta à questão apresenta-se, salvo o devido respeito, como linear, pois que, resultando precisamente do artigo 284.º do CPC (antes, artigo 294.º) que a transação modifica o pedido ou faz cessar a causa nos precisos termos em que se efetue, não abrangendo pois as questões que expressamente dela se excluam, no caso, precisamente face ao teor da transação homologada por sentença, ficaram excluías, expressamente, “as questões relacionadas com comissões que o autor entende lhe serem devidas, e se reserva o direito de acionar judicialmente a ré em sede própria, as quais não foram reclamadas nesta ação e que a ré não reconhece dever”. Ou seja, o que se constata é que se pretende também nesta parte esgrimir argumentos, que não obtiveram resposta positiva – assim desde logo no julgamento da matéria de facto – relacionados com a tese, invocada na contestação, cujo ónus incumbia às então Rés, como se refere na sentença recorrida, de que o acordado era o pagamento de um prémio de até 12% sobre o total das vendas angariadas pelo autor e na condição de aquelas vendas atingirem, anualmente, no conjunto das três sociedades, o valor mínimo de € 300.000,00, bem como que o correspondente valor não tivesse sido pago ao autor por não ter sido atingido aquele valor mínimo de vendas – de resto, pelo menos em 2012 tal valor foi até ultrapassado, ascendendo a € 363.800,00.
Do exposto resulta, sem necessidade de maiores considerações, o claudicar das conclusões do recurso, também quanto a esta questão, não se podendo concluir que o agora decidido contradiga ou reproduza a decisão proferida no referido processo n.º 386/13.7TTMTS.

1.2 Da pluralidade de empregadores
Por último, nas conclusões XXVII a LII invoca-se que, diversamente do decidido pelo Tribunal a quo – o qual é acompanhado pelo Apelado e no parecer do Ministério Público –, não estamos perante um caso de pluralidade de empregadores.
Sem razão, mais uma vez, como bem se salienta na sentença recorrida, a cuja fundamentação no geral aderimos, não se demonstrando assim mais uma vez os argumentos invocados no recurso, argumentos esses que, salvo o devido respeito, até porque baseados também em alteração da base factual que não se logrou alcançar em sede de recurso, naquela sentença encontram plena resposta.
Daí que, remetendo-se em geral nesta parte para essa sentença, apenas nos permitamos, sem prejuízo de podermos cair em risco de alguma repetição, acrescentar, a propósito da figura da pluralidade de empregadores, prevista e regulamentada no artigo 101.º do CPT, que, como se observa no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de janeiro de 2015[26], para além de dispensar o apelo a figuras de contornos (mais) controversos, “como a desconsideração da personalidade jurídica”, a “circunstância de as diversas entidades que beneficiam da prestação de trabalho darem indistintamente ordens e instruções ao trabalhador ou requererem a apresentação de elementos respeitantes ao exercício das suas funções, permite-nos imputar-lhes diretamente o estatuto de empregador”, “[s]endo igualmente certo que fatores como a prestação indiferenciada e simultânea de uma atividade a favor de várias sociedades, (…) recebendo uma só retribuição, apontam para o carácter unitário da posição de empregador”[27].
É verdade que o CT/2009, no seu artigo 101.º, faz referência a uma “relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo”, estruturas organizativas comuns ou a observância de requisitos formais.
No entanto, como tem sido afirmado pela doutrina e jurisprudência, apenas se torna decisivo, neste âmbito, o critério da subordinação jurídica, o que vale por dizer que, verificado este elemento em relação a vários empregadores, estamos perante uma pluralidade de empregadores – ao invés, se a subordinação jurídica se revelar apenas em relação a um empregador, haverá um único empregador”[28]. Ou seja, a circunstância de existir um contrato formal em que apenas um dos empregadores aparece identificado como tal não é decisiva na qualificação jurídica da situação, desde que se tenha estabelecido o vínculo da subordinação jurídica em relação a outras entidades, pois, é a realidade factual que determina a qualificação contratual e não o inverso.[29] Como adverte Maria do Rosário Palma Ramalho[30], “(…) o facto de este caso de pluralidade não estar previsto na lei nem obedecer aos requisitos de admissibilidade legalmente previstos para aquela figura não tem aqui um escopo negocial e voluntário, mas um escopo judicial e correctivo – o que, só por si, retira sentido às exigências dos requisitos de forma e do requisito substancial do acordo das partes (…). Uma vez admitida a constituição de uma situação de contitularidade da posição de empregador, crê-se que dela são de retirar as devidas consequências, nomeadamente para efeitos da sujeição desta situação ao regime especial de responsabilidade solidária pelos créditos laborais, (…) e que parece poder aqui aplicar-se por analogia”. Como se refere na sentença[31], “o contrato continua a ter apenas duas partes, o trabalhador e o empregador, mas este é plural”[32].
Ora, volvendo ao caso, resultando sem dúvidas da factualidade provada que as então sociedades Rés possuíam “estruturas organizativas comuns” (n.º 1 do artigo 101.º), embora falte o acordo expresso das partes na constituição do vínculo laboral com a contitularidade da posição de empregador, bem como os requisitos formais da redução do acordo a escrito e as menções obrigatórias no respetivo documento constitutivo (n.º 2 do mesmo artigo), verifica-se porém o pressuposto material do instituto da pluralidade de empregadores, em relação a todas as sociedades, para as quais aliás o Autor desenvolvia atividade, sendo que, mesmo quanto à remuneração auferida, era a parte fixa recebida diretamente da 1.ª Ré e a variável indistintamente por todas elas, tudo permitindo concluir, até porque tal questão não se encontra abrangida sequer pelo caso julgado firmado no processo n.º 386/13.7TTMTS – podendo assim nesta nova ação ser demandadas todas as sociedades que eram afinal contitulares da posição jurídica de empregador (conclusões XL a XLII) –, como na decisão recorrida[33], para onde se remete também quanto ao mais por merecer no essencial a nossa concordância, no sentido de que, “partilhado as rés uma mesma estrutura organizativa e beneficiando as três da prestação do trabalho do autor que àquelas se encontrava jurídica e economicamente subordinado, se constitui entre elas e o autor, um contrato de trabalho entre as mesmas eram contitulares da posição jurídica de empregador, sendo, por isso, solidariamente responsáveis pelo pagamento ao autor da quantia a que nos referimos supra.”.
Por último, não relevando o que se dirige aqui a meios de prova de factos, pois que de argumentos jurídicos agora se trata, importa ter presente, em particular quanto às conclusões XLIII a XLV e L, que o eventual interesse da sociedade I..., por decorrência da sua extinção, sem que em relação a ela se tenha decidido que a ação prossiga contra os respetivos sócios, como resulta do relatório que se elaborou, não está agora já em apreciação em sede do presente recurso, tornando desnecessárias quaisquer considerações nesse âmbito.
Na verdade, volta a lembrar-se, esta Relação depara-se com uma situação peculiar pois que, figurando na ação três sociedades como Rés, tendo o recurso sido interposto por todas elas, posteriormente, como resulta dos autos, veio a ser declarada a insolvência de todas elas, sendo que, declarada nos autos a extinção da instância quanto às restantes, os autos prosseguem, assim também a apreciação deste recurso, apenas contra a E..., mas substituída pelos sócios liquidatários, conforme decisão proferida nos autos, a fls. 1151 a 1155, decisão esta que, volta a reafirmar-se, não é objeto de apreciação em sede do presente recurso, no qual apenas teremos pois em consideração, face a tal decisão, a substituição operada e aí afirmada, nos termos em que o foi – sem apreciação pois, como se disse antes, porque extravasa o âmbito do nosso conhecimento, quaisquer consequências que possam decorrer daquela decisão para a afirmação de eventuais direitos.
Com o referido enquadramento, não obtendo, nos termos antes analisados, sustentação os argumentos apresentados nas conclusões, importa declarar improcedente o recurso.
Face ao decaimento, as custas são no caso da responsabilidade dos sócios liquidatários da “E...”, que expressamente vieram afirmar o respetivo interesse no conhecimento do recurso (art.º 527.º do CPC).
***
V – DECISÃO:
Acordam os juízes que integram a Secção Social do Tribunal da Relação do Porto, rejeitando-o quanto à reapreciação da matéria de facto, em declarar no mais improcedente o recurso.
Custas do recurso conhecido a cargo dos sócios liquidatários da “E...”, identificados nos autos.
Anexa-se o sumário do Acórdão – artigo 663º, nº 7 do CPC.
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Porto, 5 de março de 2017
Nelson Fernandes
Rira Romeira
Teresa Sá Lopes
___________
[1] Vejam-se sobre o regime dos artigos 162.º e 163.º do CSC, designadamente: Raul Ventura, Dissolução e Liquidação de Sociedades, 1987, pags. 16-17; Na jurisprudência, entre outros, os Acs. STJ de 26 de Junho de 2008, RP de 12 de Janeiro de 2012 e RL de 7 de Outubro de 2015, escrevendo-se neste último, designadamente, “(...) sendo o meio adequado a citação dos sócios para contra eles prosseguir a acção, em substituição da sociedade.”
[2] Com a extinção, deixa de existir a pessoa colectiva, que perde a sua personalidade jurídica e judiciária, não obstante as relações jurídicas de que a sociedade era titular possam não extinguir-se (arts. 162º, 163º e 164º do CSC).
[3] Não poderemos deixar de fazer alusão, nio entanto, ao Ac. do STJ de Uniformização de Jurisprudência n.º 1/2014, de 08.05.2013, DR 39, Série I, de 25.02.2104 Transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a acção declarativa proposta pelo credor contra o devedor, destinada a obter o reconhecimento do crédito peticionado, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art. 287.º do C.P.C.
[4] Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, Coimbra, 2013, p. 221/222
[5] Op. cit., p. 235/236
[6] Cf. neste sentido o Ac. STJ de 24/09/2013, in www.dgsi.pt
[7] Cf. Ac. STJ de 28 de Maio de 2009, in www.dgsi.pt
[8] www.dgsi.pt
[9] processo nº 220/13.8TTBCL.G1.S1, disponível igualmente em www.dgsi.pt
[10] processo 110/08.6TTGDM.P2.S1 (mais uma vez em www.dgsi.pt)
[11] Constando do mesmo Acórdão, em apoio do decidido, a referência à posição também já afirmada nos Acórdãos STJ de 01/10/2015 (p.824/11.3TTLRS.L1.S1), 11.02.2016 (p. 157/12.8 TUGMR.G1.S1), 22.09.2015 (p. 29/12.6TBFAF.G1.S1) e 4.03.2015 (p. 2180/09.0TTLSB.L1.S2), 26.11.2015 (p. 291/12.4TTLRA.C1.S1), 3.12.2015 (p. 3217/12.1TTLSB.L1.S1), 3.03.2016 (p. 861/13.3TTVIS.C1.S1)
[12] Fazendo ainda apelo ao Ac. RL de 2009.12.03,processo n.º 2195/05.8TTLSB-4.
[13] Em termos de sucessão de vigência de normas até ao presente, constata-se que o referido artigo 258.º do CT/2009 corresponde, sem alterações relevantes quanto ao que ao caso interessa, ao que constava dos n.º s 1 a 3 do artigo 249.º do CT/2003 e artigo 82.º da LCT, aprovada pelo DL n.º 49 408, de 24.11.1969.
[14] Vide, Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, págs. 440-441
[15] Cf. Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, pág. 439.
[16] Neste sentido, Monteiro Fernandes, ob. cit., pág. 449; Bernardo Lobo Xavier in Curso de Direito do Trabalho, 2.ª ed., pág. 382
[17] Veja-se a esse respeito, porque elucidativo, o que se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Setembro de 2006 – citado, por sua vez, no Acórdão do mesmo Tribunal de 12 de Março de 2009, disponível em www.dgsi.pt. Ainda, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Janeiro de 2008, Relator Conselheiro Bravo Serra, in www.dgsi.pt.
[18] Ver nota anterior.
[19] Assim, Pedro Soares Martinez, Direito do Trabalho, 3ª ed., pág. 559, Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 13ª ed., pág. 437 e seguintes, e Júlio Manuel Vieira Gomes, Direito do Trabalho, I, Relações Individuais de Trabalho, pág. 759 e seguintes, em particular pág. 773 sobre as comissões enquanto integrantes da retribuição.
[20] Relatora Conselheira Ana Luísa Geraldes, in www.dgsi.pt.
[21] Assim, entre outros, Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, pág. 572, Castro Mendes, Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil, Ed. Ática, págs.. 38-39, e Lebre de Freitas e outros, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2.º, Coimbra Ed., 2.ª Ed., 2008, pág 354, todos citados no Ac. STJ de 22 de junho de 2017, disponível em www.dgsi.pt, Relator Cons. Tomé Soares Gomes.
[22] No que diz respeito à identidade de sujeitos, torna-se essencial não a sua identidade física, mas sim a mesmidade da posição ou da qualidade jurídica na titularidade direitos e obrigações contemplados pelo julgado – assim Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. III, Coimbra Editora, 1981, págs. 97 a99 –, sendo que, a propósito da identidade do pedido e da causa de pedir, é essa aferia não globalmente e antes em função de cada pretensão parcelar em que haja de decompor-se o objeto das causas em confronto e respetivos segmentos decisórios – Ac. STJ de 22 de junho de 2017,citado.
[23] Entre outros, os acórdãos do STJ de 13/12/2007, relatado pelo Cons. Nuno Cameira no processo n.º 07A3739, de 06/3/2008, relatado pelo Cons. Oliveira Rocha, no processo n.º 08B402, de 23/11/2011, relatado pelo Cons. Pereira da Silva no processo n.º 644/08.2TBVFR.P1.S1, acessíveis na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj, também referenciados no Ac. STJ de 22 de junho de 2017, supra citado, que nesta parte seguimos de perto.
[24] [3] Vide, entre outros, os seguintes acórdãos do STJ: de 13/12/2007, relatado pelo Juiz Cons. Nuno Cameira no processo n.º 07A3739; de 06/3/2008, relatado pelo Juiz Cons. Oliveira Rocha, no processo n.º 08B402; de 23/11/2011, relatado pelo Juiz Cons. Pereira da Silva no processo n.º 644/08.2TBVFR.P1.S1, acessíveis na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj.
[25] Assim o Professor Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil anotado, Vol. III, Coimbra Editora, 3.ª Edição, 1981, pp. 92-93.
[26] Disponível em www.dgsi.pt
[27] Ainda, com particular interesse, Ac. STJ de 21 de Janeiro de 2014, mesmo Sítio, Relator Conselheiro Leones Dantas
[28] Veja-se o Ac. RP de 12-05-2014, consultável no mesmo endereço internet
[29] Acs. RL de Lisboa, 19 de Junho de 2013, Relatora Desembargadora Paula Sá Fernandes, e de 16 de março de 2016, Relatora Desembargador Leopoldo Soares, ambos in www.dgsi.pt.
[30] Grupo Empresariais e Societários – Incidências Laborais, Coimbra, Almedina, 2008, pág. 410
[31] Por apelo a Júlio Gomes, Direito do Trabalho, Volume I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora 2007, pag. 232 a 235, Catarina de Oliveira Carvalho, Algumas Questões Sobre a Empresa e o Direito do Trabalho no Novo Código do Trabalho, em A Reforma do Código do Trabalho, Centro de Estudos Judiciários, Coimbra Editora 2004, pags. 437 e segs. e José Andrade Mesquita, Direito do Trabalho, 2ª edição, Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 2004, pags. 99 e segs.
[32] Ainda, citando Cristina de Oliveira Carvalho (nota anterior): “Esta relação jurídica caracteriza-se pela existência de um único vínculo contratual que liga o trabalhador a uma pluralidade de entidades, as quais assumem concomitantemente a posição de entidade empregadora. Deparamos, assim, com um caso de contitularidade da posição de empregador, a qual pode ser originária ou sucessiva. Em ambas as hipóteses, temos sempre uma relação laboral “entre duas partes”, não existindo qualquer vestígio de “triangularidade”, característica de outras configurações (designadamente, da cedência ocasional), embora uma dessas “partes” seja integrada por várias entidades»
[33] Elucidativo o seguinte trecho da sentença: “(…)Assim, como refere José Andrade Mesquita, Algumas Questões Sobre a Empresa e o Direito do Trabalho no Novo Código do Trabalho, em A Reforma do Código do Trabalho, Centro de Estudos Judiciários, Coimbra Editora 2004, pág 43) «Abrangem-se aqui sem dúvida, os casos em que há meios de produção utilizados indiferentemente pelos vários empregadores. Pode tratar-se do próprio local de trabalho, dos mais variados instrumentos de produção (máquinas, veículos, etc) ou das matérias-primas. Mas o conceito de estruturas organizativas comuns não tem necessariamente a ver com elementos físicos, abrangendo ainda outras situações em que há uma organização laboral unitária».
A propósito deste conceito diz Catarina de Oliveira Carvalho, na obra citada, pag. 443 «Essencial é a existência de “estruturas organizativas comuns” à actividade económica desenvolvida, particularmente, instalações, equipamentos ou recursos colocados à disposição das diversas entidades».
Também Luís Miguel Monteiro, no Código do Trabalho Anotado, Pedro Romano Martinez e outros, 5ª ed., 2007 pag. 246, a propósito deste conceito refere que “(… a expressão legal – “estruturas organizativas comuns” – exige que os empregadores partilhem mais do que a posição jurídica de credor da prestação de trabalho. A actividade económica que prosseguem tem de se servir de instalações (escritório, estaleiro de obra), equipamentos (telefónicos, informáticos, de diagnóstico) ou recursos (biblioteca, serviços de segurança ou de atendimento telefónico) que sendo característicos da actividade desenvolvida, estão à disposição de todos».”