Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2492/21.5T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ALBERTO TAVEIRA
Descritores: DAÇÃO EM CUMPRIMENTO
PRESTAÇÃO DEVIDA
Nº do Documento: RP202403192492/21.5T8VNG.P1
Data do Acordão: 03/19/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A lei reporta-se à dação em cumprimento ou datio pro solutum, expressando que a prestação de coisa diversa da que for devida, embora de valor superior, só exonera o devedor se o credor der o seu assentimento (artigo 837º do Código Civil).
II - É essencial à referida figura a existência de uma prestação diferente da que era devida e que esta tenha, na intenção das partes, o efeito de extinguir a primitiva obrigação.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROC. N.º[1] 2492/21.5T8VNG.P1

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Tribunal Judicial da Comarca do Porto

Juízo Central Cível de Vila Nova de Gaia - Juiz 3

RELAÇÃO N.º 124

Relator: Alberto Taveira

Adjuntos: Rui Moreira

               Fernando Vilares Ferreira


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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

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I - RELATÓRIO.

AS PARTES

AA.: AA, e marido BB.

CC e

DD.

R.: EE


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Os AA.[2] intentaram a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra o R., pedindo que seja o Réu condenado a:

a) Ver declarada por sentença constitutiva a transmissão da propriedade das Autoras para ele Réu de um meio indiviso do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, freguesia ..., sob o nº ... como Rústico, situado em ..., com a área total e descoberta de 900 m2, inscrito na matriz sob o nº ..., com a seguinte COMPOSIÇÃO E CONFRONTAÇÕES: Terreno a mato – Norte, FF; Sul, GG; Nascente, HH; Poente, II, e inscrito na matriz predial rústica da identificada freguesia e concelho, sob o número de artigo ..., com nome/localização em ..., confrontações com Norte: FF Sul: GG Nascente: HH: II, valor patrimonial atual de 2,26€ e a área total de 0,0900000 ha.

b) Ver declarada, pela dação em cumprimento do meio indiviso do direito de propriedade, extinto o crédito de tornas constituído no processo de inventário que correu termos sob o número 7354/13.7TBVNG pelo Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia – Juiz 3.

Para o efeito alegam, sumariamente, que correu termos processo de inventário por morte de JJ; que o prédio em causa nos autos integrava a herança aberta por esse óbito; que nesse processo foi logrado acordo entre os interessados; que os interessados no inventário convencionaram, em matéria de pagamento de tornas, que as tornas a apurar como devidas ao interessado Réu, no valor de 44.625€, seriam pagas pelas interessadas CC e AA mediante dação do direito de propriedade quanto a um meio do imóvel que constitui a verba 20 (o prédio em causa nos autos); que as Autoras agendaram escritura de dação em cumprimento; que nas vésperas da escritura o Réu exigiu que as Autoras AA e CC reconhecessem que o prédio tinha uma determinada localização assinalada em planta pelo Réu; que a planta apresentada pelo Réu não tinha correspondência com o prédio; que as Autoras recusaram essa pretensão e o Réu recusou outorgar a escritura pública; que foi marcada uma segunda escritura, que teve o mesmo desfecho; que pretendem cumprir o acordo homologado em processo de inventário nos termos aí acordados e determinados e que o Réu impede o cumprimento de tal transação.


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Regularmente citado, o Réu apresentou contestação e deduziu reconvenção.

Em sede de contestação impugnou parte da matéria de facto alegada pelas Autoras, alegando que a localização e delimitação do prédio em processo foi efetuada por indicação das autoras e que o prédio que as mesmas pretendem dar em dação em cumprimento não tem a localização e delimitação acordada em processo de inventário, mas a que consta da planta apresentada pelo Réu.

Em sede de reconvenção, alegando que tem direito ao cumprimento da obrigação assumida pelas 1ª e 2ª Autoras no processo de inventário e ao reconhecimento da localização do prédio em termos que descreve.

Em sede reconvencional o Réu pede que sejam as Autoras condenadas a reconhecer que:

A) – O Réu é proprietário de metade indivisa do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, freguesia ..., sob o nº ... – rústico, situado em ..., com a área total de 900 m2, inscrito na matriz predial sob o nº ..., inscrito na matriz predial rústica da identificada freguesia e concelho, sob o número ...;

B) - O prédio identificado na alínea A) tem efetivamente a localização correspondente à planta que integra o doc. nº 8 junto com a petição inicial (certificado notarial) que aqui se dá por reproduzida por economia processual.

C) Seja declarada por sentença constitutiva a transmissão da propriedade para as primeiras e segunda Autoras/reconvindas um meio do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, freguesia ..., sob o nº ... – rústico, situado em ..., com a área total de 900 m2, inscrito na matriz predial sob o nº ... a que corresponde a localização identificada na planta que integra o doc. nº 8 (certificado notarial) junto com a petição inicial que aqui se dá por reproduzida por economia processual.

D) – Após, seja declarada por sentença constitutiva a transmissão da propriedade das Autoras/reconvindas para o Réu/reconvinte de um meio do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, freguesia ..., sob o nº ... – rústico, situado em ..., com a área total de 900 m2, inscrito na matriz predial sob o nº ..., inscrito na matriz predial rústica da identificada freguesia e concelho, sob o número ... a que corresponde a localização identificada na planta que integra o doc. nº 8 junto com a petição inicial que aqui se dá por reproduzida por economia processual (certificado notarial).

E) – Na impossibilidade definitiva de os primeiros Autores/reconvindos e segunda Autora/reconvinda concretizarem a dação em cumprimento de um meio do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, freguesia ..., sob o nº ... – rústico, situado em ..., com a área total de 900 m2, inscrito na matriz predial rústica da identificada freguesia e concelho, sob o número ..., com a localização e delimitação que consta do doc. nº 8 junto com a petição inicial (certificado notarial) seja declarado o incumprimento definitivo daquela obrigação dos primeiros Autores/reconvindos e segunda Autora/reconvinda.


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As Autoras apresentaram articulado de réplica, com impugnação da matéria alegada em sede de reconvenção e, pugnando pela sua improcedência. (cf. articulado de 05.07.2021)

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O Juízo Local Cível deste tribunal julgou-se incompetente, em razão do valor, para julgar a presente ação. (Cf. despacho de 17.12.2021)

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Em consequência do falecimento da Autora DD foi suspensa a instância.

Posteriormente, por sentença proferida a 13.06.2022 foram declarados habilitados como sucessoras da Autora DD as Autoras AA e CC, a fim de com elas prosseguirem os termos da ação também nesta qualidade.


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Dispensada a realização de audiência prévia foi proferido despacho saneador no âmbito do qual foi admitida a reconvenção, fixado o objeto do litígio, fixados factos assentes e os temas da prova.

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DA DECISÃO RECORRIDA


Após audiência de discussão e julgamento, foi proferida SENTENÇA julgando totalmente improcedente a demanda, nos seguintes termos:

Pelo exposto, decido:

I – Julgar a ação procedente por provada, e em consequência:

A - Declaro a transmissão pelas Autoras AA e CC, por si e na qualidade de únicas herdeiras da Autora falecida DD para o Réu EE, de um meio indiviso do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, sob o nº ..., situado em ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, com a área total e descoberta de 900 m2, inscrito na matriz sob o nº ....

B - Declaro, com esta transmissão, extinto o crédito de tornas do Réu sobre as Autoras, constituído no processo de inventário que correu termos sob o número 7354/13.7TBVNG pelo Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia – Juiz 3.

II – Julgar a reconvenção parcialmente procedente, e em consequência:

A – Declaro reconhecer o Réu EE como proprietário de um meio indiviso do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, sob o nº ..., situado em ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, com a área total e descoberta de 900 m2, inscrito na matriz sob o nº ....

III – Julgar improcedentes os demais pedidos reconvencionais.


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Custas da ação e reconvenção a cargo do Réu – artigo 527º/1 do Código de Processo Civil (atendendo a que o pedido reconvencional julgado procedente não foi impugnado pelas Autoras).“.

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DAS ALEGAÇÕES

O R., vem desta decisão interpor RECURSO, acabando por pedir o seguinte:

Termos em que, deve o presente recurso merecer provimento e por via disso, revogada a sentença recorrida, substituindo-a por decisão que julgue a presente ação totalmente improcedente por não provada e o pedido reconvencional procedente, por provado, com todas as demais consequências legais, como é de inteira jutiça“.


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O recorrente apresenta as seguintes CONCLUSÕES:

1 - Vem o presente recurso interposto da sentença proferida nos autos em epígrafe que decide;

I – Julgar a ação procedente por provada, e em consequência:

A - Declara a transmissão pelas Autoras AA e CC, por si e na qualidade de únicas herdeiras da Autora falecida DD para o Réu EE, de um meio indiviso do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, sob o nº ..., situado em ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, com a área total e descoberta de 900 m2, inscrito na matriz sob o nº ....

B - Declara, com esta transmissão, extinto o crédito de tornas do Réu sobre as Autoras, constituído no processo de inventário que correu termos sob o número 7354/13.7TBVNG pelo Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia – Juiz 3.

II – Julga a reconvenção parcialmente procedente, e em consequência:

A – Declara reconhecer o Réu EE como proprietário de um meio indiviso do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, sob o nº ..., situado em ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, com a área total e descoberta de 900 m2, inscrito na matriz sob o nº ....

III – Julga improcedentes os demais pedidos reconvencionais;

Condena nas custas da ação e reconvenção o Réu – artigo 527º/1 do Código de Processo Civil (atendendo a que o pedido reconvencional julgado procedente não foi impugnado pelas Autoras).

2 – Impugna-se a decisão proferida sobre a matéria de facto com reapreciação a prova gravada, pelo que, em conformidade com o disposto nos nºs 1 e 2 do artº 640º do C.P.Civil, o recorrente especifica:

a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e que infra se identificam;

“9. A planta apresentada pelo Réu na data da escritura não tinha correspondência com o artigo descrito no inventário.”

(…)

“14. O Réu sabe que a planta que apresentou na data marcada para escritura não tem correspondência com o prédio inscrito na matriz sob o artigo ....”

I I - Dos factos não provados

 “2. Nem o Réu nem a sua mãe conheciam a localização da totalidade dos imóveis que integraram a relação de bens.”

“3. Não conheciam a localização da metade indivisa do prédio quem constitui a verba nº 20 da relação de bens.”

“4. As Autoras indicaram a localização e delimitação do prédio como correspondendo à delimitação que se encontra na planta que faz parte do documento nº 8 junto com a petição inicial.”

“5. A planta apresentada pelo tem correspondência com o prédio.”

“6. A delimitação e a área têm correspondência com a descrição matricial, predial, e com a realidade física do prédio.”

(…)

“8. As Autoras localizaram o imóvel e delimitaram-no em cada uma das diligências de peritagem.”

“9. As Autoras pretendiam dar prédio que não existia.”

“10. A configuração do prédio que consta da planta que o Réu apresentou no Cartório e que integra o documento nº 8 junto com a petição inicial foi elaborada em conformidade com os elementos disponíveis no cadastro predial do Município e ....”

“11. Quando as Autoras se obrigaram a pagar ao Réu as tornas com a dação em cumprimento da metade indivisa da identificada verba 20, este desconhecia se já tinha sido efetuada a partilha da herança aberta por óbito de KK.”

“12. Quando assumiram a obrigação, as Autoras sabiam que não eram proprietárias da metade indivisa e omitiram tal realidade.”

(…)

“14. A procuração que as primeira e segunda Autoras exibiram à Sra. Notária não lhes conferia poderes para a dissolução da comunhão em que se encontrava a metade que deveria ser objeto da dação em cumprimento.”

“15. Se o Réu tivesse conhecimento que o prédio em questão nestes autos não tinha a localização e delimitação que consta da planta que integra o documento nº 8 junto com a petição inicial, nunca teria aceite a sua adjudicação.”

b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunha decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

Engº LL – Depoimento gravado em sistema integrado de gravação digitam com inicio ás 15:23:27 e fim às 16:15:37 – cfr ata de audiência de julgamento realizada no dia 26 de Junho de 2023; Identificam-se infra as passagens da gravação que se consideram permitir alterar a decisão sobre a matéria de facto objeto de impugnação;

00:01:18 a 00:01:20

00:02:41 a 00:02:52

00:03:16 a 00:04:25

00:04:49 a 00:05:58:

00:06:04 a 00:06:12

00:07:19 a 00:08:12

00:10:28 a 00:41:11

00:13:39 a 00:14:44

00:15:50 a 00:17:08

00:18:54 a 00:19:06

00:23:33 a 00:28:03

00:30:50 a 00:31:15

00:31:00 a 00:32:14

00:44:30 a 00:45:58

00:51:10 a 00:51:58

MM – Depoimento gravado em sistema integrado de gravação digitam com inicio às 16:21:59 e fim às 16:49:39, cfr. ata de audiência de julgamento realizada no dia 26 de Junho de 2023; Identificam-se infra as passagens da gravação que se consideram permitir

00:01:34 a 00:01:52

00:02:19 a 00:02:25

00:03:26 a 00:03:44

00:04:28 a 00:04:41

00:04:52 a 00:05:15

00:05:44 a 00:06:11

00:06:22 a 00:06:34

00:07:26 a 00:08:55

00:10:02 a 00:10:23

00:11:58 a 00:12:08

00:13:01 a 00:13:56

00:14:58 a 00:15:44

00:20:30 a 00:20:38

00:20:10 a 00:22:20

00:24:14 a 00:24:28

c)- decisão: Face à conjugação dos depoimentos prestados pelas testemunhas atrás identificadas, conjugadas com os documentos juntos aos autos, concretamente a planta que o Réu apresentou no cartório notarial e que se encontra junta com a certidão emitida pela Srª Notária e as peças que integram os relatórios de avaliação juntos aos autos pelas Autoras com o Reqtº - Refª 45364720 e com a contestação/reconvenção sob o documento nº 1, determina que a decisão proferida sobre a matéria de facto seja alterada no sentido em que é entendido pelo Réu.

Pois, salvo o devido respeito, o Mº Juiz a quo fez errada apreciação da prova produzida acerca desta factualidade constante dos pontos 9 e 14 dos factos provados após a produção de prova devem passar a ser considerados como não provados.

E, os factos constantes dos pontos 2,3,4,5,6,8,9,10,11,12, 14 e 15 dos factos não provados, deverão passar a constar dos factos provados.

- Não pode aqui deixar de se ter em consideração o teor das cadernetas prediais, pelos menos no que respeita à indicação lo local de cada um dos artigos identificados no relatório.

- Dois dos artigos matriciais - ... e ... situam-se no Lugar ... e um dos artigos ... situa-se no Lugar ....

- O artigo matricial objeto de concreta apreciação nestes autos, corresponde ao prédio sito no Lugar .... . Pelo que, conjugando-se com as plantas que integram estes documentos, o único prédio sito no Lugar ... é o que se encontra no documento apresentado pelo Réu no Cartório Notarial e consta da certidão junta aos autos.

- As testemunhas atrás identificadas Engº LL e MM procederam à avaliação dos prédios em conformidade com os elementos que lhe foram fornecidos.

- E, conforme consta da confissão da Autora AA, foi esta que identificou o local onde se situam três imóveis sem identificar a delimitação de qualquer deles.

- A Autora CC, confessa, que o Réu teria aceite realizar a escritura se as Autoras tivessem aceite a delimitação do prédio nos termos constantes do Doc. 8 junto com a petição inicial.

- Confessa ainda CC que “ á data a metade indivisa aí identificada não pertencia apenas á Autora e sua irmã mas, também à mãe;

Contudo, o a testemunha MM, referiu que localizou cada um dos artigos, por se encontrarem delimitados por postes e rede, bem assim através da análise que efetuou através do google.

Para a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, deve considera-se a confissão efetuada pelas Autoras e que consta da respetiva assentada – atas da audiência de julgamento de 14/06/2023 e 26/06/2023.

3 - No caso sob apreciação, a confissão das Autoras que consta das respectivas assentadas, o depoimento das testemunhas que acima se indicam e a conjugação com os documentos juntos aso autos, designadamente as cadernetas prediais, o documento nº 8 junto com a contestação, impõe que se modifique a decisão que é objeto de impugnação.

4 – A modificação da decisão objeto de impugnação justifica-se e encontra fundamento, por se verificar, na sentença recorrida, errada ponderação da prova produzida.

5 – Contrariamente ao que é entendido na sentença recorrida, nem nas datas em que foram marcadas as escrituras que constam dos factos considerados provados, nem quando da propositura da presente ação, não dispunham de poderes para concretizar a dação em pagamento;

6 – Tal como se encontra provado, a metade indivisa que devia constar da dação em pagamento, não pertencia em exclusivo às Autoras, sendo também pertença da Autora (falecida);

7 – Não existindo uma qualquer relação entre a mãe das Autoras e o Réu, não tinha este de aceitar a dação em pagamento efetuada por aquela, ainda que representada por procuração.

8 – A dação em pagamento efetuada com um direito pertencente à Autora falecida consubstanciaria uma doação que não é permitida e que o Réu tem o direito de recusar.

9 – Tal como se obrigaram as Autoras no acordo celebrado nos autos de inventário identificados no ponto 8 dos factos provados no despacho saneador, a dação em pagamento tinha de ser efetuada por estas e apenas por estas.

10 – Não pode assim o Réu concordar com a afirmação que consta da sentença recorrida que “resulta do facto provado sob o ponto 18 as Autoras encontravam-se mandatadas pelas Autora falecida para outorgar a escritura e, como tal, a dação podia ser concretizada..” Sublinhando-se que, o erro da sentença também se verifica na identificação do ponto 18 que não existe, nos termos que são referidos.

11 – Esta decisão não tem sequer em consideração que, mesmo que o Réu aceitasse a dação em pagamento nos termos pretendidos pelas autoras e acolhidos pela sentença recorrida, não conseguiria registar na Conservatória do Registo Predial;

12 – Por um lado, por se pretender transmitir um direito que se encontra indivisível, por outro porque estamos perante uma obrigação de pagamento de tornas assumida pelas Autoras e não pela falecida mãe.

13 – No que se refere à localização e delimitação do imóvel, não tendo sido objeto de prévia discussão, pelo menos, quando do acordo celebrado na partilha, legitimamente foi suscitada, uma vez que, o Réu apercebeu-se por comportamentos das Autoras, que estas estavam a pretender transmitir-lhe um bem cuja localização as próprias não identificam, tem o direito de esclarecer, afinal onde se situa o prédio.

14 - Mas, afinal onde se localiza o imóvel objeto da dação em pagamento?

15 - Ora, as Autoras não são capazes de identificar concretamente a localização e delimitação do imóvel.

16 – Se as Autoras não identificam o bem que devem entregar ao Réu, este tem o direito a recusar recebê-lo.

17 – Ao não identificarem as localização do prédio objeto da dação em pagamento, as Autoras violam o princípio da boa fé.~

18 - O Princípio da Boa-fé Objetiva, exige, em todas as fases da contratação, até mesmo na fase pós contratual, conduta leal dos contratantes, os quais devem observar os deveres anexos ou laterais de conduta, a fim de manter a confiança e as expectativas legítimas do Negócio Jurídico. (cfr. art.ºs 227.º, n.º 1, e 762.º, n.º 2, ambos do CCiv., respetivamente).

19 – Face a tudo o que aqui se conclui, o Réu não incumpriu a sua obrigação de aceitar a dação em pagamento.

20 – Pelo contrário, as Autoras é que estão em incumprimento perante o Réu, uma vez que, não são titulares do direito que declaram dispor quando celebraram o acordo nos autos de inventário;

21 – E, recusam identificar corretamente o bem que estão obrigadas a entregar ao Réu para pagamento das tornas que assumem ser devedoras para com o Réu.

22 - Por conseguinte, tem a presente ação de improceder na sua totalidade;

23 E, Proceder na integra o pedido reconvencional formulado nestes autos pelo Réu.

24 – Salientando-se a necessidade das Autoras adquirirem o direito que estão obrigadas a transmitir e a identificar o bem imóvel cuja metade estão obrigadas a entregar ao Réu.

25 – Tem assim de ser revogada a sentença recorrida que também faz errada interpretação e aplicação das normas jurídicas nesta identificadas.

26 – Não podendo o Réu deixar de salientar, que a sentença recorrida ignora e viola as disposições do Código do Registo Predial. “.


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Os AA. apresentaram contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.

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II-FUNDAMENTAÇÃO.


O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil

Como se constata do supra exposto, a questão a decidir, é a seguinte:

A) Modificação da decisão da matéria de facto.

Alega que foram incorrectamente julgados os seguintes factos.

Dos factos provados após produção de prova:

Pontos 9 e 14.

Dos factos não provados após produção de prova:

Ponto 2 a 6, 8 a 12, 14 e 15.

B) Admissibilidade lega da dação em pagamento .


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OS FACTOS


Os factos com interesse para a decisão da causa e a ter em consideração são os constantes no relatório, e que aqui se dão por reproduzidos.

2.1.1. Factos fixados como assentes no saneador:

1. Descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, freguesia ..., sob o nº ... consta o seguinte prédio: Rústico, situado em ..., com a área total e descoberta de 900 m2, inscrito na matriz sob o nº ..., com a seguinte composição e confrontações: Terreno a mato, a confrontar a norte FF; Sul, GG; Nascente, HH; Poente, II. (documento 1 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido)

2. Este prédio encontra-se inscrito, por sucessão hereditária e partilha, a favor do Réu na proporção de ½ a favor do réu EE e a favor das Autoras CC, DD e AA, na proporção de ½.

3. A inscrição de ½ a favor das Autoras consta em comum e sem determinação de parte ou direito por sucessão hereditária de KK.

4. A inscrição de ½ a favor do Réu consta por partilha judicial da herança aberta por óbito de JJ.

5. O prédio está inscrito na matriz predial rústica da freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, sob o artigo ..., com localização em ..., confrontações com Norte: FF Sul: GG Nascente: HH: II, valor patrimonial atual de 2,26€ e a área total de 0,0900000 hectares. (documento 2 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido)

6. São titulares inscritos na matriz predial rústica o Réu, quanto a ½, e KK – cabeça de casal da Herança, quanto a outro ½.

7. Os ante proprietários KK e JJ eram irmãos. (cf. Habilitação de herdeiros junta aos autos a 26.09.2022)

8. Pelo Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia – Juiz 3, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, correu termos sob o número 7354/13.7TBVNG, processo de inventário por óbito de JJ. (documento 3 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido)

9. O inventariado JJ faleceu em 19 de julho de 2012, sem descendentes ou ascendentes vivos, no estado de casado, em primeiras núpcias dele e segundas dela, com NN.

10. Deixou por única herdeira legitimária o cônjuge e instituiu herdeiras testamentárias suas sobrinhas, primeira e segunda Autoras.

11. O inventário foi instaurado por NN que desempenhou até ao seu falecimento, ocorrido em 1 de junho de 2014, as funções de cabeça-de-casal. (documentos 4 e 5 juntos com a petição inicial, que se dão por reproduzidos).

12. Enquanto cabeça-de-casal, em 8 de janeiro de 2014 relacionou o imóvel descrito em 1. nos seguintes termos: “11 - Metade indivisa de um prédio rústico sito em ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, com a área de 900 m2, confrontar de norte com FF, do Sul com GG, do nascente com HH e do poente, II, inscrito na respectiva matriz sob o nº.... Valor Patrimonial: 2,26€.” (documento 6 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido)

13. Após o falecimento de NN as funções de cabeça-de-casal passaram a ser desempenhadas pela Autora AA que, em 10 de outubro de 2014, prestou declarações e apresentou relação de bens. (documento 7 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido)

14. Enquanto cabeça-de-casal, relacionou o imóvel descrito em 1. nos seguintes termos: “20 - Metade indivisa de um prédio rústico sito em ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, inscrito na matriz sob o nº ..., com o valor patrimonial de 2,26€.”

15. Foi homologado acordo alcançado pelos interessados no inventário – as Autoras AA e CC e o Réu – por despacho de 8 de julho de 2019, com o seguinte teor: “Nos presentes autos de inventário a que se procede por óbito de JJ, em que é cabeça de casal AA, atenta a qualidade das partes e a natureza disponível dos interesses em causa e considerando o acordo unânime de todos os Interessados quanto às adjudicações e partilha, homologa-se, através da presente sentença, o acordo a que os Interessados chegaram na Conferência de Interessados realizada no passado dia 14.05.2019, complementado com o acordo para composição dos quinhões das interessadas AA e CC, apresentado por requerimento de 25 de junho de 2019, acordos esses espelhados no requerimento de forma à partilha apresentado a 25 de junho de 2019, considera-se desnecessária a elaboração do mapa da partilha, pois o seu conteúdo já consta dos supra mencionados acordos de fls. 366 a 375. Em consequência, ao abrigo do disposto nos arts. 283º, n 2, 284º e 290º, n. 4 do Código de Processo Civil, adjudica-se aos Interessados as verbas que nesses acordos constam e condena-se os Interessados a cumpri-los nos exatos termos acordados. As custas serão suportadas pelos Interessados na proporção dos respetivos quinhões.”.

16. O quinhão do réu foi composto com as seguintes verbas: verba 12 [artigo 1656], Verba 20 [um meio do artigo ...], Verba 24 [um meio do artigo 895], Verba 25 [um meio do artigo 1387] e das verbas de dinheiros o montante de € 205.342,82.

17. Os interessados no inventário convencionaram, em matéria de pagamento de tornas, que: As tornas a apurar como devidas ao interessado EE, no valor de 44.625€, serão pagas pelas interessadas CC e AA mediante dação do direito de propriedade quanto a um meio do imóvel que constitui a verba 20. (cf. Ata de conferência de interessados de 14.06.2019)

18. Para o dia 26 de fevereiro de 2021, pelas 12h30, no cartório notarial da Notária OO, estava agendada uma escritura de dação em cumprimento, em que as Autoras davam em pagamento metade indivisa do prédio rústico, composto de terreno a mato, sito no lugar ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo ..., com a valor atribuído de quarenta e quatro mil seiscentos e vinte cinco euros e quinze cêntimos (44.625,15 euros), descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o número ..., de ..., que se encontra registado na referida proporção a favor delas, em comum e sem determinação de parte ou direito. (documento 8 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido)

19. Consta do certificado emitido pelo Cartório terem comparecido: como primeiras, as Autoras, AA, que outorgaria por si e na qualidade de procuradora em representação de sua mãe, DD, e CC; como segundo, o Réu EE e como terceiro, BB, marido de AA.

20. Do mesmo certificado consta que “A referida escritura de dação em cumprimento resulta do acordo homologado por sentença transitada em julgado proferida nos autos de inventário Proc. Nº 7354/13.7TBVNG, que corre seus termos pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia – Juiz 3, em que as supra indicadas CC e AA se obrigaram solidariamente para com o segundo, ao pagamento a título de tornas do valor de €44.625 (quarenta e quatro mil seiscentos e vinte cinco euros) mediante dação do direito de propriedade de metade do imóvel acima descrito.”.

21. Consta, ainda, do mesmos certificado que “porém o segundo outorgante recusa-se a realizar a escritura alegando “Não existir acordo entre todos os intervenientes relativamente à exata localização do supra identificado prédio rústico, verificando-se que a metade indivisa que deveria ser objecto da escritura de dação em cumprimento encontra-se também inscrita na Conservatória do Registo Predial a favor de DD, não podendo esta efectuar a dação, por não ser devedora. No âmbito do processo de inventário atrás melhor identificado, aceitou a adjudicação de metade do aludido prédio rústico e a dação em cumprimento da outra metade para pagamento de tornas, tendo formado a sua vontade, considerando a localização que consta da planta que pretende juntar. Que é aliás a localização que consta dos relatórios de peritagem realizados no âmbito do processo de inventário, de acordo com as informações que foram prestadas ao perito por ambas as interessadas. Se assim não fosse., nunca teria aceite a adjudicação nem a dação nos termos que constam do respectivo processo de inventário. Que a presente escritura já havia estado agendada noutro Cartório Notarial no dia 5 de fevereiro de 2021 não se tendo realizado pelos motivos invocados.”

22. Consta, também do mesmo que “Pelas primeiras foi dito “serem falsos todos os fundamentos de facto e de direito invocados pelo segundo para a não outorga da escritura. A planta apresentada não tem correspondência com a realidade física do prédio, (que) sempre de todos foi conhecido, nem com os elementos identificativos que constam da descrição predial e da inscrição matricial, também de todos conhecida à data do acordo de partilha. A planta apresentada e a pretensão deduzida apenas podem traduzir pretensão de enriquecimento ilegítimo e / ou anterior reserva mental. A eventual doação implícita teria lugar entre mães e filhas, havendo de ser participada apenas no prazo de 30 dias subsequente à outorga do ato”.

23. O certificado encontra-se assinado pelas Autoras, marido e cunhado, pelo Réu e pela Notária.

24. Escritura, com o mesmo objeto, estivera anteriormente marcada, por iniciativa do Réu, no Cartório Notarial da Notária PP, na cidade do Porto, nas datas de 11 de dezembro de 2020 e 5 de fevereiro de 2021.

25. A marcação da primeira data foi comunicada pelo Réu por carta registada 24 de novembro de 2020.

26. A escritura foi desmarcada por acordo das partes, por se encontrarem ainda pendentes procedimentos de registo.

27. A marcação da segunda data resultou de acordo das partes, sem dependência de comunicação ou interpelação escrita.

28. Pela Notária foi disponibilizada ao Réu, e por este facultada às Autoras AA e CC, minuta da escritura de dação a outorgar em 5 de fevereiro de 2021.

29. Nas vésperas da escritura o Réu exigiu que as Autoras AA e CC reconhecessem que o prédio do artigo ... da freguesia ... tinha uma determinada localização por ele EE assinalada em planta.

30. As Autoras recusaram a pretensão do Réu.

31. O Réu recusou celebrar a escritura sem que visse reconhecida a pretensão.

32. Com o acordo das Autoras AA e CC, o Réu comunicou ao Cartório que a escritura agendada para 5 de fevereiro de 2021 não seria outorgada.

33. Providenciaram então as Autoras pela marcação da escritura para o dia 26 de fevereiro de 2021.


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2.1.2 Factos provados após produção de prova:

1. A Autora DD, nasceu a 24 de setembro de 1932, era filha de QQ e de RR, tendo casado a 17 de fevereiro de 1962 com KK. (assento de nascimento junto com o ofício de 17.03.2022, que se dá por reproduzida)

2. A Autora DD faleceu no dia 07 de dezembro de 2021, no estado de viúva. (assento de óbito junto com o ofício de 17.03.2022, que se dá por reproduzida)

3. KK faleceu e deixou como únicos herdeiros DD, AA e CC. (escritura de habilitação de herdeiros junto com o ofício de 17.03.2022, que se dá por reproduzida)

4. DD deixou como únicos herdeiros as Autoras AA e CC. (escritura de habilitação de herdeiros junto com o ofício de 17.03.2022, que se dá por reproduzida)

5. CC nasceu a 10 de abril de 1965 e é filha de KK e DD. (assento de nascimento junto com o ofício de 10.05.2022, que se dá por reproduzida)

6. AA nasceu a 30 de Novembro de 1962 e é filha de KK e DD. (assento de nascimento junto com o ofício de 10.05.2022, que se dá por reproduzida)

7. O Réu sabia que a metade indivisa e não partilhada no inventário, do prédio que constituía a verba nº 20 pertencia à herança de KK, sendo únicas herdeiras daquele a viúva DD e as suas filhas AA e CC.

8. A escritura referida em 19 dos factos assentes destinava-se ao cumprimento do acordo celebrado no processo de inventário.

9. A planta apresentada pelo Réu na data da escritura não tinha correspondência com o artigo descrito no inventário.

10. Apresentava localização, confrontações e área, sem correspondência com a descrição matricial e com a realidade física do prédio.

11. O Réu recusou celebrar a escritura com a descrição do imóvel nos termos em que consta da Conservatória do Registo Predial e da matriz.

12. O Réu pretende ver reconhecido para o prédio a forma de um polígono com quadro lados, nenhuns paralelos entre si, convergindo os lados poente e nascente em direção a ponto a norte, sendo o lado norte o de menor extensão.

13. O prédio sempre esteve descrito no inventário como terreno a mato, que confinava de todos os lados com outros proprietários.

14. O Réu sabe que a planta que apresentou na data marcada para escritura não tem correspondência com o prédio inscrito na matriz sob o artigo ....

15. O Réu aceitou e quis que as tornas que lhe eram devidas pelas Autoras AA e CC fossem pagas pela dação do meio indiviso do artigo matricial rústico ... da freguesia ..., meio indiviso este não relacionado no inventário.

16. No âmbito de negociações levadas a cabo no âmbito do processo de inventário, com intuito de se proceder à partilha por acordo, foi designado por ambas as partes um perito que procedeu à avaliação de todos os imóveis.

17. Para o efeito, foram as Autoras que indicaram ao perito designado a localização de todos os imóveis e o acompanharam aos respectivos locais.

18. Não tendo os interessados obtido acordo, no âmbito do processo de inventário realizou-se avaliação aos imóveis que integravam a relação de bens e as Autoras indicaram ao perito nomeado pelo Tribunal a mesma localização dos imóveis.

19. As partes não colocaram em causa a localização e delimitação que consta dos relatórios de avaliação.

20. Se as Autoras não tivessem recusado confirmar a localização e delimitação do prédio em conformidade com a planta que integra o doc. nº 8 junto com a petição inicial, a escritura de dação em cumprimento teria sido realizada.

21. A Autora DD nunca interveio no processo de inventário e nunca assumiu alguma obrigação para com o Réu.

22. A relação de bens apresentada pela Autora AA reproduzia a relação e descrição apresentada pela primitiva cabeça-de-casal, quanto aos bens imóveis que faziam parte do acervo hereditário.

23. Não tinham dúvidas quanto à delimitação e confrontações dos mesmos em face das descrições e inscrições dos mesmos.

24. A planta que faz parte do documento 8 da petição inicial foi elaborada pelo Réu, à revelia do conhecimento das Autoras.

25. As Autoras indicaram aos peritos a localização do conjunto de imóveis sitos na área, sem especificarem confrontações e delimitações.

26. As cadernetas prediais foram disponibilizadas aos peritos que fizeram as avaliações.


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2.2. Factos não provados:

1. As Autoras notificaram o Réu para comparecer na escritura por carta registada de 18 de fevereiro de 2021.

2. Nem o Réu nem a sua mãe conheciam a localização da totalidade dos imóveis que integraram a relação de bens.

3. Não conheciam a localização da metade indivisa do prédio que constitui a verba nº 20 da relação de bens.

4. As Autoras indicaram a localização e delimitação do prédio como correspondendo à delimitação que se encontra na planta que faz parte do documento nº 8 junto com a petição inicial.

5. A planta apresentada pelo tem correspondência com o prédio.

6. A delimitação e a área têm correspondência com a descrição matricial, predial, e com a realidade física do prédio.

7. As confrontações que constam da inscrição matricial são as atuais.

8. As Autoras localizaram o imóvel e delimitaram-no em cada uma das diligências de peritagem.

9. As Autoras pretendiam dar prédio que não existia.

10. A configuração do prédio que consta da planta que o Réu apresentou no Cartório e que integra o documento nº 8 junto com a petição inicial foi elaborada em conformidade com os elementos disponíveis no cadastro predial do Município e ....

11. Quando as Autoras se obrigaram a pagar ao Réu as tornas com a dação em cumprimento da metade indivisa da identificada verba 20, este desconhecia se já tinha sido efetuada a partilha da herança aberta por óbito de KK.

12. Quando assumiram a obrigação, as Autoras sabiam que não eram proprietárias da metade indivisa e omitiram tal realidade.

13. Nunca foi intenção das Autoras cumprirem a obrigação para com o Réu.

14. A procuração que as primeira e segunda Autoras exibiram à Sra. Notária não lhes conferia poderes para a dissolução da comunhão em que se encontrava a metade que deveria ser objeto da dação em cumprimento.

15. Se o Réu tivesse conhecimento que o prédio em questão nestes autos não tinha a localização e delimitação que consta da planta que integra o documento nº 8 junto com a petição inicial, nunca teria aceite a sua adjudicação.

16. O Réu revelou sempre conhecer a localização do prédio que é objecto dos autos.

17. O Réu sempre soube que as primeira e segunda Autoras era procuradoras de sua mãe.


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O tribunal não se pronuncia sobre o demais alegado por conter matéria de direito, conclusiva ou irrelevante para a decisão da causa.“, realçado nosso.

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DE DIREITO.

A)


Modificação da decisão da matéria de facto.

Alega que foram incorrectamente julgados os seguintes factos.

Dos factos provados após produção de prova:

Pontos 9 e 14, deverão ser considerados como não provados.

Dos factos não provados após produção de prova:

Ponto 2 a 6, 8 a 12, 14 e 15, deverão ser considerados como provados.

Sustenta que com base nos meios de prova, documental – plantas, relatórios periciais e cadernetas prediais – e testemunhal – LL e MM – e na confissão – depoimento de parte das AA. – tal factualidade merecerá distinta resposta.

As AA. argumentam que no recurso não são apresentadas ou expostas as razões pelas quais merece censura a decisão da matéria de facto – “Fica por identificar e por demonstrar qual o erro, ou erros, cometido(s) pela instância no julgamento de facto.”.


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São as conclusões do requerimento de recurso quem fixa o objecto do recurso.

Dispõe o artigo 640.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil, com a epígrafe, “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, o seguinte:

1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. (…)“.

A Doutrina tem vindo a expor, de modo repetido e claro, quais os requisitos que o recurso de apelação, na sua vertente de impugnação da decisão sobre a matéria de facto, terá de preencher para que possa ocorrer uma nova decisão de matéria de facto.

Nesta sede, ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, in Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5.ª Ed., em anotação à norma supratranscrita importa reter o seguinte.

a) Em primeiro lugar, deve o recorrente obrigatoriamente indicar “os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões”;

b) Em segundo lugar, tem o recorrente que indicar “os concretos meios probatórios” constantes dos autos que impõe sobre aqueles factos (alínea a)) decisão distinta da recorrida;

c) Em terceiro lugar, em caso de prova gravada, terá de fazer expressa menção das passagens da gravação relevantes;

d) Por fim, recai o ónus sobre o recorrente de indicar a decisão que, no seu entender, deveria ter sido proferida sobre as questões de factos impugnadas (alínea a)).

Com a imposição destes requisitos o legislador faz recair sobre o recorrente o ónus de alegação, de modo reforçado, para que a instância de recurso não se torne aleatória e imprevista, ie, que os recursos possam ter natureza genérica e inconsequente (neste sentido o autor citado, in ob. cit., pág. 166).


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Ponderando e apreciando a instância de recurso quanto à impugnação da decisão da matéria de facto, o recorrente, quanto aos pontos de facto indicados, preenche os apontados requisitos.

O recorrente indica claramente o sentido que pugna por ver alterado por este Tribunal da Relação do Porto.

De igual modo, indica, ainda que de modo superficial, qual ou quais os meios de prova que sustentam a alteração peticionada dos factos – prova documental, testemunhal e por confissão.

Pelo exposto o recorrente, preenche os apontados requisitos, pelo que se impõe o seu conhecimento.

Em sede de reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, a Relação tem, efectivamente, poderes de reapreciação da matéria de facto, procedendo a julgamento sobre a factualidade, assim garantindo um verdadeiro duplo grau de jurisdição.

Quanto ao âmbito da intervenção deste Tribunal, tal matéria encontra-se regulada no artigo 662.º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “modificabilidade da decisão de facto”, que preceitua no seu n.º 1 que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.

No âmbito dessa apreciação, incumbe ao Tribunal da Relação formar a seu próprio juízo probatório sobre cada um dos factos julgados em 1.ª instância e objeto de impugnação, de acordo com as provas produzidas constantes dos autos e à luz do critério da sua livre e prudente convicção, nos termos do artigo 607.º, n.º 5, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do CPC, em ordem a verificar a ocorrência do invocado erro de julgamento.

Não se ignora o papel relevante da imediação na formação da convicção do julgador e que essa imediação está mais presente no tribunal da 1.ª instância. Todavia, ainda assim, o resultado dessa imediação deve ser objetivado em argumento probatório, suscetível de discussão racional, além do mais, para evitar os riscos da arbitrariedade“, in Ac. Supremo Tribunal de Justiça, 62/09.5TBLGS.E1.S1, de 02.11.2017, relatado pelo Cons. TOMÉ GOMES, in dgsi.pt.

Por isso, passa-se a reapreciar a matéria de facto impugnada.

A primeira instância fundamentou a sua convicção com relevância para os pontos em discussão, do seguinte modo:

“No âmbito da prova documental é de relevar que todos os documentos, com exclusão das plantas apresentadas pelo Réu e constantes dos relatórios de avaliação, fazem referência ao prédio descrito sob o nº ... e inscrito sob o artigo ..., como sendo um prédio que apenas confronta com outros proprietários, com 900 m2.

De facto, da certidão permanente e da caderneta predial juntas com a petição consta que o mesmo tem as seguintes confrontações: Norte: FF; Sul: GG; Nascente: HH e Poente: II.

O mesmo consta da caderneta predial, datada de 09.10.2013, junta com a certidão que constitui o documento nº 5 da petição inicial que integrou a primeira relação de bens feita no processo de inventário, o que demonstra que pelos menos desde data anterior a 09.10.2013 as confrontações constantes da matriz se mostram inalteradas.

É, ainda, de relevar que o mesmo foi relacionado no processo de inventário, quer pela anterior cabeça de casal, quer pela Autora com a mesmas confrontações, sem que tenha sido objeto de reclamação – cf. Documentos 4 a 7 juntos com a petição inicial, que contém a certidão do processo de inventário que corre termos sob o nº 7354/13.7TBVNG da qual constam declarações de cabeça de casal da Autora e de NN, escritura de habilitação de herdeiros, relações de bens apresentadas pela Autora e NN, ata de conferencia de interessados, requerimentos de 25-06-2019, e sentença que homologou o acordo celebrado entre as partes.

Da análise de todos estes documentos verifica-se que, no processo de inventário, nunca esteve em causa a existência dos imóveis, nem a sua localização, mas tão só o valor atribuído aos mesmos, que foi objeto de reclamação e que motivou as avaliações pedidas pelas partes a título pessoal e no âmbito do processo de inventário. De facto, analisados os documentos e conciliados com os depoimentos de parte e prova testemunhal, verifica-se que o que motivou a realização das avaliações foi a atribuição de valor aos bens aceites por todos os interessados, não tendo as mesmas por objeto qualquer delimitação concreta dos imóveis.

Mais, a ½ do imóvel em causa estava relacionada no processo de inventário, integrando a verba nº 20 da relação de bens, com a descrição supra referida, foi adjudicada ao Réu, por valor igual ao valor das tornas a pagar pelas Autoras com a dação em cumprimento da outra ½ do imóvel (que não integrava o acervo hereditário), sendo que o Réu aceitou o imóvel relacionado com essa descrição e confrontações, tendo, inclusive, procedido a registo do mesmo a seu favor na conservatória em 08.10.2020, com essas mesmas confrontações.

Os factos relacionados com a posição assumida pelas partes na data da escritura resultam do certificado emitido pelo próprio cartório, aceite pelas partes.

No que se refere aos relatórios de avaliação, de 29.09.2016 e 27.02.2019, juntos com a contestação e requerimento de 21.04.2023, cujos avaliadores foram ouvidos em sede de audiência, resultou de forma clara que os mesmos tiveram por objeto a atribuição de valor ao património imobiliário a partilhar e não a concreta localização e delimitação de cada um dos prédios que o integrava e que na visita ao local estiveram presentes ambas as partes.

De facto, analisados os relatórios resulta que os prédios sitos em ... (entre os quais o imóvel em causa nos autos) foram avaliados como se de um prédio se tratasse referindo-se expressamente o relatório efetuado a pedido das partes que “Trata-se de um conjunto de 4 terrenos contíguos (…) O terreno encontra-se á face da estrada, não se encontra infraestruturado (…) O calculo da área de construção foi baseado na cércea envolvente, tipologia envolvente e de acordo com a estimativa por nós visualizada. Estimamos a construção de 7 moradias no terreno (…), com um total de construção de 1.704 m2 (…)”. Em sede de audiência o avaliador que elaborou este relatório afirmou que o fez com base nas informações que lhe foram fornecidas, sem ter em conta as confrontações constantes da matriz e que à data estava convencido tratar-se de 4 parcelas de terreno, todas com frente para a estrada, tal como as desenhou, sendo de relevar que não conseguiu enquadrar a planta elaborada pelo Réu em nenhuma das parcelas desenhadas no seu relatório.

Já do relatório referente à avaliação realizada em sede de processo de inventário consta que a localização dos terrenos foi indicada pelas Autoras como sendo “mais ou menos ali”, que os terrenos não tinham marcos nem delimitação física; que a localização foi feita com base nessa informação em ficheiro informático a partir do “Google maps”, a localização das verbas nºs 20, 21 e 22 (referentes aos prédios em ...) foi em conjunto como se tratasse de um prédio único (cf. Documento 4 e 5 desse relatório), sendo referido expressamente que a avaliação é feita em conjunto para os três prédios como se se tratasse de um prédio único porque não foi possível determinar a localização individual de cada um; que, em conjunto têm frente para a Rua (e não cada um deles individualmente), tendo as áreas de 900, 1470 e 1890 m2, sendo o prédio em causa nos autos o mais pequeno e tendo o valor sido atribuído de forma global, com o mesmo valor m2 para cada um dos prédios. Sendo que o mesmo foi confirmado pelo seu autor em sede de depoimento testemunhal, admitindo não ter procedido à avaliação de cada um dos prédios individualmente, mas como um prédio único, sem considerar que um podia não confrontar com caminho. O mesmo, quando confrontado com a planta apresentada pelo Réu na escritura, referiu não poder corresponder ao prédio em causa por ser o de menor área e nessa planta ocupar a maior parte.

Da análise destes relatório resulta, desde logo, que o prédio em causa nos autos não pode ter a configuração pretendia pelo Réu, por um lado, porque nenhum deles procedeu ou analisou a concreta localização do imóvel e por outro, manifestamente evidente, não pode o prédio em causa nos autos, que é o mais pequeno dos três prédios localizados em ... (com metade da área de um dos outros prédios), ocupar a maior parte da globalidade do terreno como proposto na planta apresentada pelo Réu.

Da análise das relações de bens resulta que dos três prédios sitos neste local, os outros dois estão descritos como confrontando a sul com caminho.

Do exposto resulta que em sede de prova documental não existe qualquer documento que permita concluir que as confrontações do prédio em causa nos autos não sejam as que constam do registo e da matriz.

A prova testemunhal produzida em audiência não permitiu obter outra convicção.

Das declarações de parte resulta que os terrenos em causa apenas serviram para “compor quinhões” depois de as partes terem acertado na partilha dos imóveis de maior valor do acervo hereditário; que os relatórios de avaliação apenas foram considerados para efeitos de atribuir valor aos bens, não tendo as partes tido em consideração a delimitação dos prédios dos mesmos constantes, (sendo de referir que para a veracidade destas declarações releva o facto de um dos relatórios dividir o terreno em 4 parcelas, quando no local, da herança, apenas existiam 3 prédios); que as partes sempre aceitaram os imóveis com a descrição feita quanto a confrontações nas relações de bens.

Das declarações do Réu resulta que o mesmo se mostrava bem informado quanto ao património, que elaborou levantamento topográfico e planta, sem participação, conhecimento ou anuência das Autoras e que a configuração que dá ao prédio é a que consta da planta “porque é onde cabe”, admitindo que no local, com esta configuração, não cabem os dois outros prédios relacionados e adjudicados no inventário como aí localizados. Tenta referir que tinha a convicção de o terreno ter frente para a rua porque era o que resultava das avaliações, mas não logrou criar tal convicção no tribunal. De facto, mostrou ser pessoa informada, que não podia desconhecer que o prédio em causa estava relacionado e foi partilhado como um prédio sem confrontações com caminho, tendo sido assim, que registou a parte adjudicada em inventário a seu favor.

Em sede de declarações de parte é de relevar o depoimento prestado pela Autora CC, pela segurança das declarações durante todo o depoimento.

A testemunha SS foi claro a afirmar que conhece os prédios e que não tem dúvidas que um se situava apenas na parte de trás, sem confrontar com o caminho.

De todo o exposto resultou a convicção segura e clara que o Réu aceitou a descrição de ½ do imóvel no inventário nos termos em que constava da relação de bens, aceitou a adjudicação dessa parte nesses termos e aceitou receber a outra ½ do imóvel das Autoras para pagamento de tornas, sem quaisquer outras condições e sem qualquer condição ou acordo quanto à concreta localização e delimitação do imóvel.“.

De todo ao acervo probatório, prova por inspecção judicial – resultante da acta e fotografias tiradas aquando a sua realização –, da prova documental, cadernetas prediais, certidões do registo predial, plantas do local, relatórios periciais, várias escrituras públicas, da prova testemunhal, toda ela, LL, MM, SS, dos depoimentos de parte/confissão, AA e CC, e declarações de parte EE, que este Tribunal procedeu à sua audição na integra, não pode acompanhar a pretensão dos apelantes. A fundamentação elaborada pela M.ma Juíza de julgamento, supratranscrita, não merece qualquer reparo por parte deste Tribunal face à sua clareza e lógica.

Trazendo à colação os meios de prova, expressamente invocados ou chamados em auxílio pretensão apresentada pelos apelantes, os mesmos não são suficientes para atingir tal desiderato. Todo o conjunto de meios de prova, que sustentaram a decisão de primeira instância não sofre de qualquer fragilidade ou debilidade que possa inquinar a força probatória plasmada na decisão da primeira instância e, portanto, a convicção a que aquele Tribunal chegou, é idêntica a que este Tribunal de recurso logrou atingir.

Importa ter presente que a prova produzida deve ser conjugada, harmonizada e ponderada no seu conjunto enquanto base da convicção formulada pelo Tribunal, não sendo legítimo valorizar meios probatórios isolados em relação a outros, sopesando os critérios de valoração, numa perspectiva racional, de harmonia com as regras de normalidade e verosimilhança, mas sempre com referência às pessoas em concreto e à especificidade dos factos em apreciação.

Com efeito, de modo consistente, coerente e espontânea, a prova testemunhal, toda ela, afirmaram a realidade que o Tribunal a quo deu como demonstrada e provada, e bem como na sua vertente de não provada, como é o caso dos presentes autos. A prova testemunha, indicada, vem corroborada pela prova documental, tal como acertadamente vem referido na decisão em crise. De igual modo,

Do meio de prova testemunhal que foi produzido em audiência de julgamento não há dúvidas que a realidade factual que foi dada como provada e não provada, deverá manter-se. E não poderia ser de outro modo.

Quer do depoimento de parte das AA., AA e CC, e das declarações de parte d R. EE, não resulta a efectiva demonstração de quais as precisas e efectivas delimitações do prédio aqui em causa – 1571 da matriz, com 900 m2 de área. As partes em litígio sabem apenas que o citado terreno/prédio fica situado na rua de ..., juntamento com outros prédios, Aa. e R..

Também é certo, ie, que decorre de tais meios de prova, depoimento e declarações de parte, que são estes os interessados/herdeiros na herança mencionada em 8 dos factos provados. Tudo para concluir, que dos meios de prova produzidos nestes autos, apenas AA. e R. poderiam apresentar depoimento sobre tal realidade. As testemunhas ouvidas, LL e MM, limitaram-se a reproduzir o que lhes foi transmitido pelos interessados no inventário. Muito estranho senão mesmo inusitado, serem os peritos que iriam proceder à identificação dos limites dos prédios, limites que os interessados desconhecem. Como reforço do afirmado temos o depoimento de LL, autor do relatório de avaliação da parcela/prédio aqui em causa, no dito processo de inventário, tendo relatado de modo claro, isento e lógico como se procedeu à avaliação dos prédios. Quando se deslocou ao local, estavam todos os interessados, AA. e R., e foram as partes quem lhes indicou que os terrenos eram naquele local, mas quanto a limites, nenhuma das partes lhes soube indicar o preciso local. Mais referiu, de modo impressivo que lhe foi referido que naquele local para além dos terrenos dos interessados no inventário, haveria outro dono de uma leira. Que nenhum dos interessados, incluindo o R., manifestou discordância ou surpresa quanto a tal questão. Todos os interessados apenas pretendiam saber o valor de uma parcela/terreno de 900 m2 naquele local.

Em face do exposto, e considerando o teor dos depoimentos de parte das AA. e declarações de parte do R., a conclusão me teros de decisão de facto não poderá deixar de ser aquela a que chegou a primeira instância.

A descrição do prédio é aquela que foi indicada no dito processo de inventário. Os interessados em tal inventário com tal se conformaram. Como decorre da prova produzida nestes autos, no inventário os interessados procederam a várias diligências, designadamente, diligências periciais.

Por fim, quanto à alega confissão das AA. AA e CC, sdr, não se vislumbra qual seja o trecho dos seus depoimentos dos quais se possa concluir por as mesmas haverem afirmado tal realidade. Tanto mais, que a M-ma, de modo acertado e correcto, procedeu à assentada dos factos confessados – artigo 463.º, n.º 1, 2 e 3 do Código de Processo Civil. As partes nada reclamaram aquando da assentada, n.º 2 do artigo 463.º do Código de Processo Civil.

Assim, não poderemos deixar de concluir por o R. ter aceite “a descrição de ½ do imóvel no inventário nos termos em que constava da relação de bens, aceitou a adjudicação dessa parte nesses termos e aceitou receber a outra ½ do imóvel das Autoras para pagamento de tornas, sem quaisquer outras condições e sem qualquer condição ou acordo quanto à concreta localização e delimitação do imóvel”, permita-se a repetição da citação.

Por todo o exposto, terá que improceder a pretensão de recurso do R., quanto à decisão da matéria de facto.


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B)


Admissibilidade legal da dação em pagamento.

Como se verifica da análise das conclusões formuladas pelo apelante, o objecto deste recurso consistia essencialmente na alteração da decisão proferida sobre a matéria controvertida. Dessa alteração, antes de qualquer outro fundamento, dependia a pretendida alteração da solução decretada na sentença em crise, pois sem isso a tese dos autores/apelantes continuaria desprovida de substrato factual apto à sua afirmação.

Por conseguinte, perante a confirmação da decisão proferida sobre a matéria de facto, nada mais cumpriria apreciar.

Ainda assim, importa conhecer da seguinte argumentação.

Argumenta o R. que a dação em pagamento, como modo de extinguir uma obrigação com um direito sobre um bem imóvel, cujo direito não se encontra determinado quer quanto á sua titularidade quer no que respeita á identificação do próprio objecto, não é admissível.

No caso dos autos, o acordo celebrado nos autos de inventário “assentou, naturalmente nas premissas que; - as Autoras eram as proprietárias da metade indivisa que se obrigaram a entregar; - que a localização do imóvel era a que foi apresentada nos autos de inventário, designadamente no relatório pericial efetuado no âmbito daqueles autos de inventário.

Em primeiro lugar, tal como resulta dos factos e das declarações do R., este já procedeu ao registo da sua metade. É no mínimo incongruente ou contraditório nos seus próprios termos, afirmar que desconhece qual seja a metade de um prédio que o próprio procedeu ao seu registo.

Em segundo lugar, não se compreende onde esteja ou se vislumbre a impossibilidade da realização a dação tal qual ela foi acordada no inventário, facto provado em 17, e que nem foi sequer impugnado pelo R. – As tornas a apurar como devidas ao interessado EE, no valor de 44.625€, serão pagas pelas interessadas CC e AA mediante dação do direito de propriedade quanto a um meio do imóvel que constitui a verba 20.

Está bem definido quem credor e devedor das obrigações em causa e bem como do seu objecto (tal como resulta da factualidade dada como provada).

Nas palavras do nosso mais alto Tribunal podemos ler:

A lei reporta-se à dação em cumprimento ou datio pro solutum, expressando que a prestação de coisa diversa da que for devida, embora de valor superior, só exonera o devedor se o credor der o seu assentimento (artigo 837º do Código Civil).

Pressupõe, pois, um acordo modificativo e porventura um acto executivo, podendo a prestação inicialmente devida ser substituída por outra, que é susceptível de consistir em um facto ou em um serviço ou na própria cessão de um direito de crédito.

O mencionado acordo do credor deve incidir sobre a dupla vertente da aceitação de prestação diversa da devida e na imediata extinção do seu direito de crédito e da correspondente obrigação.

É, com efeito, essencial à referida figura a existência de uma prestação diferente da que era devida e que esta tenha, na intenção das partes, o efeito de extinguir a primitiva obrigação.“, Ac Supremo Tribunal de Justiça , de , relatado pelo Cons , dgsi.pt.

Distinta é a dação em função do pagamento: “A lei reporta-se à dação em função do cumprimento ou datio pro solvendo, expressando, por um lado, que se o devedor efectuar uma prestação diferente da devida, para que o credor obtenha mais facilmente, pela realização do valor dela, a satisfação do seu crédito, este só se extingue quando for satisfeito e na medida respectiva (artigo 840º, n.º 1, do Código Civil).

E, por outro, que se a dação tiver por objecto a cessão de um crédito ou a assunção de uma dívida, se presume feita nos termos do número anterior (artigo 840º, n.º 2, do Código Civil).

Resulta do n.º 1 do referido artigo a realização pelo devedor de uma prestação diferente da devida ao credor, naturalmente no âmbito do acordo de um e de outro nesse sentido, não extinguindo a obrigação enquanto a prestação dada simultânea ou subsequentemente não satisfizer o direito de crédito do credor.

O traço característico da dação em função cumprimento traduz-se, pois, na circunstância de as partes não pretenderem a extinção imediata da obrigação do devedor, e quererem que ela subsista até à satisfação integral do direito de crédito concernente, como que se tratasse de um mandato conferido ao credor pelo devedor de se pagar por via da coisa ou do crédito em causa.

Não raro surge a dúvida sobre se, na espécie respectiva, ocorre a intenção das partes de extinção do direito de crédito mediante a dação, ou de condicionar essa extinção à realização do direito que a última envolve.

Para obstar a esse impasse, no caso de o objecto da dação ser a cessão de um direito de crédito ou a assunção de uma dívida, a lei estabeleceu a presunção no sentido de que ela ocorreu para que o credor obtivesse mais facilmente, pela realização do valor dela, a satisfação do seu direito de crédito.

Trata-se, naturalmente, de uma presunção legal a favor do credor, que o dispensa de provar o facto presuntivo, incidindo sobre o devedor o ónus da sua ilisão (artigo 350º do Código Civil).

Dir-se-á, em síntese, que, na situação de datio pro solvendo, o direito de crédito não se extingue pela mera entrega da coisa, ou pela cessão de crédito, ou pela assunção de alguma obrigação, mas só pela realização efectiva do seu valor ou conteúdo, conforme os casos.“, Ac citado.

Sobre a figura da dação em pagamento podemos consultar Comentário ao Código Civil, Direito das Obrigações, Das Obrigações em geral, Univ Católica Portuguesa, 2018, em anotação ao artigo 837.º do Código Civil, por JOSÉ BRANDÃO PROENÇA, onde podemos ler: “A norma dá uma visão restritiva do instituto pois não é duvidoso, como já se via em VAZ SERRA (1953: 25 e ss.), que, v.g., em vez da normal prestação de coisa diferente da devida, o devedor preste um facto, ceda um crédito ou cumpra uma dívida (MENEZES CORDEIRO, 1980: 209, e 2017: 998, PIRES DE LIMA / ANTUNES VARELA, 1997: 120, n.º 3, ANTUNES VARELA, 1997: 171, FERREIRA DE ALMEIDA, 2014: 37, MENEZES LEITÃO, 2017: 180, e RAMOS ALVES, 2017: 510 e ss.). E também não é duvidoso que qualquer prestação assumida pelo devedor possa ser extinta por dação em cumprimento. A dação assenta num acordo simultaneamente modificativo- -extintivo (aliud pro alio invito creditore solvi non potest) que tende a alterar com efeito exoneratório a obrigação primitiva do devedor, seja a dívida civil ou natural (RIBEIRO FARIA, 1988: 149). O acordo (segundo RAMOS ALVES, 2017: 671, pode consistir na aceitação de um legado) necessita de capacidade das partes, não está sujeito a forma especial, mas se a prestação consistir na transferência da propriedade de um imóvel é necessária, em princípio, escritura pública ou documento particular autenticado (vd., contudo, a aplicação do procedimento Casa Pronta por força do art. 1.º da P. n.º 1126/2009, de 01/10). Existem igualmente determinadas exigências formais ou formalidades se o «aliud» consistir, v.g., em direitos de autor, ações ou participações sociais (MENEZES LEITÃO, 2018: 186, e RAMOS ALVES, 2017: 683 e ss.). O contrato é, em regra, contemporâneo do vencimento, mas nada impede que seja celebrada uma promessa de dação em cumprimento (RAMOS ALVES, 2017: 508-509 e 750 e ss.). Por outro lado, tratando-se de um contrato extintivo de cariz oneroso, pode ser sujeito a impugnação pauliana.

Em face da factualidade dada como provada, estamõe parente a primeira figura jurídica, estando assim, extinta a obrigação de tornas que eram devidas ao R. EE.

Resta, então, concluir pela integral falência das conclusões recursivas do apelante e, nesta medida, pela improcedência do seu recurso.


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III DECISÃO


Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação do Porto, em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pelo apelante, R. (confrontar artigo 527.º do Código de Processo Civil).


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Sumário nos termos do artigo 663.º, n.º 7 do Código de Processo Civil.

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Porto, de 2024
Alberto Taveira
Rui Moreira
Fernando Vilares Ferreira
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[1] O relator escreve de acordo com a “antiga ortografia”, sendo que as partes em itálico são transcrições cuja opção pela “antiga ortografia” ou pelo “Acordo Ortográfico” depende da respectiva autoria.
[2] Seguimos de perto o relatório elaborado pelo Exmo. Senhor Juiz.