Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2983/18.5T8LSB.L1-2
Relator: LAURINDA GEMAS
Descritores: VIAGEM ORGANIZADA
SEGURO DE GRUPO
CANCELAMENTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/05/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGAR PROVIMENTO
Sumário: I - O contrato de seguro de grupo celebrado entre a 3.ª ré, Seguradora, e a 2.ª ré, Tomadora do Seguro, cobre os riscos de um conjunto alargado de pessoas, os Segurados, ligadas à Tomadora do Seguro por uma relação distinta, os contratos de viagem organizada, no caso a viagem que foi organizada pela 2.ª ré (operadora turística) e vendida pela 1.ª ré (agência de viagens) aos autores, Segurados, que aderiram ao seguro em causa.
II - A tal contrato de seguro aplicam-se as disposições que resultaram do acordo de vontade das partes e que resumidamente resultam do certificado de seguro de viagem, aplicando-se também as condições gerais da apólice, constituindo estas cláusulas contratuais gerais determinadas pela seguradora, e ainda, quanto ao regime legal, além das normas constantes do Regime Jurídico do Contrato de Seguro (LCS), o estabelecido no Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro (Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais).
III - A Seguradora não se pode prevalecer perante os Segurados das condições gerais da Apólice relativamente às quais não tenham sido cumpridos os deveres de comunicação e informação.
IV - Tendo os autores aderido a um seguro de viagem que incluía, na modalidade “vip”, a cobertura dos gastos de cancelamento da viagem desde que, conforme previsto nas condições gerais, “a viagem fosse contratada na mesma data em que o seguro tiver sido contratado ou, no máximo, 3 dias antes”, a ser aplicável esta cláusula, há que interpretá-la à luz do disposto nos artigos 236.º e 238.º do CC e na esteira da jurisprudência que vem defendendo que, nos contratos de seguro deve, em caso de dúvida, prevalecer o sentido mais favorável a quem deles beneficia. Logo, a expressão “seguro contratado” tem de se reportar ao momento da adesão que é feita pelos Segurados.
V - Se assim não for interpretada, mas reportando-a ao momento da subscrição do seguro pela Tomadora do Seguro em plataforma eletrónica criada pela Seguradora (emissão do certificado de seguro de viagem), essa cláusula deve ser considerada nula, por ser contrária à boa-fé, privando os Segurados - que desde o primeiro momento manifestaram a sua vontade de adesão ao seguro “vip” conforme lhes foi proposto - da cobertura dos gastos de cancelamento da viagem, por razões a que são completamente alheios, atinentes à deficiente conceção ou funcionamento da plataforma informática e à falta de prontidão da Tomadora do Seguro, que não foi devidamente informada por aquela.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, os Juízes Desembargadores abaixo identificados

I - RELATÓRIO
Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. (3.ª Ré) interpôs o presente recurso de apelação da sentença que julgou procedente a ação contra si - e também, nos termos do art. 39.º do CPC, contra Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. (1.ª Ré) e Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. (2.ª Ré) - intentada por JF…, CF… e MS….
Na Petição Inicial, apresentada em 07-02-2018, estes Autores, pediram:
a) a título principal, a condenação da Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. a pagar aos Autores o capital seguro, no valor de 9.000,00 €, acrescido de juros vencidos e vincendos desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento;
b) a título subsidiário, a condenação das Rés Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. e Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. a pagar aos Autores o valor de 9.000,00 €, a título de indemnização pelo incumprimento contratual, acrescido de juros vencidos e vincendos, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento.
Alegaram os Autores, para tanto e em síntese, que: são um casal com uma filha, tendo celebrado com a Ré Multi Destinos um contrato de viagem à Costa Rica, organizada pela 2.ª Ré, operadora turística; foi contratado um seguro de viagem que incluía a cobertura de cancelamento de viagem até ao montante máximo de 3.000 € por passageiro; no dia da partida, antes do check-in no aeroporto, a Autora M… sentiu-se mal e desfaleceu, tendo necessitado de assistência médica hospitalar, o que impediu os Autores de embarcarem; a Ré seguradora recusa-se a pagar a quantia total de 9.000 € atinente aos gastos de cancelamento da viagem.
Citada a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda., apresentou Contestação, em que se defendeu por exceção (invocando a sua ilegitimidade processual passiva) e por impugnação.
Também a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. apresentou Contestação, defendendo-se por exceção (invocando a exceção de ilegitimidade processual passiva) e por impugnação.
A Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. apresentou Contestação, na qual se defendeu invocando a exclusão da cobertura de gastos de cancelamento pelo facto de o seguro ter sido feito mais de 3 dias após a contratação da viagem, concluindo pela sua absolvição do pedido.
Notificados para o efeito, os Autores responderam às exceções invocadas pelas Rés Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. e Quadrante Mistério Unipessoal, Lda., pugnando pela improcedência das mesmas.
A requerimento da Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda., foi admitida a intervenção principal provocada da Seguradoras Unidas, S.A., a qual, regularmente citada para o efeito, apresentou Contestação em que se defendeu por impugnação, concluindo pela improcedência da ação.
A requerimento da Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda., foi admitida a intervenção principal provocada da Mapfre Seguros, S.A., a qual, também regularmente citada para o efeito, apresentou Contestação, em que se defendeu por impugnação, concluindo pela improcedência da ação.
Na audiência prévia foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade processual passiva invocada pelas Rés Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. e Quadrante Mistério Unipessoal, Lda.; mais foi dispensada a prolação do despacho de identificação do objeto de litígio e enunciação dos temas da prova.
Realizou-se a audiência final de julgamento, com a prestação de declarações de parte e a produção de prova testemunhal, tendo também, no decurso da mesma, sido admitida a junção de documento (emails) em poder da testemunha DC…. Foi requerida pela 3.ª Ré (ora Apelante) a prestação de depoimento de parte pela gerente da Ré Quadrante, o que foi indeferido, com fundamento na manifesta extemporaneidade.
Após, foi proferida a sentença (recorrida) cujo dispositivo tem o seguinte teor:
“Pelo exposto, nos termos das disposições legais supra citadas, julgo procedente, por provada, a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum de declaração, instaurada por JF…, CF… e MS… contra a sociedade Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda, a sociedade Quadrante Mistério Unipessoal, Lda e a sociedade Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A., e em que são intervenientes principais a sociedade Seguradoras Unidas, S.A. e a sociedade Mapfre – Seguros Gerais, S.A. e, em consequência:
1 – Condeno a ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. a pagar aos autores a quantia de € 9 000,00 (nove mil euros), acrescida de juros vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento;
2 – Não conheço, por prejudicado, o pedido subsidiário formulado pelos autores contra as rés Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda e Quadrante Mistério Unipessoal, Lda.
Custas da ação a cargo da ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A., nos termos dos artigos 527º, n.º 1 e 2 e 607º, n.º 6 do Código de Processo Civil.
Registe e notifique.
Inconformada com esta decisão, veio a Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A interpor recurso de apelação, formulando na sua alegação as seguintes conclusões (sublinhado nosso):
1. O objeto da presente ação consiste em saber se a aqui R. e recorrente (e os restantes RR.) é responsável pelo pagamento das coberturas disponibilizadas pelo contrato de seguro de assistência em viagem denominado “Travel Protect Platinum Grupo” que celebrou com a R. Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. no caso da participação de sinistro feita pelos AA. e aqui recorridos.
2. Constitui facto assente que a aqui recorrente, no exercício da sua atividade mercantil, celebrou o referido contrato de seguro com a R. Quadrante Mistério Unipessoal, Lda., que ficou com a qualidade de tomador, titulado pela Apólice n.º Quadra-…-…-…, cujas Condições Gerais a aqui recorrente juntou com a sua contestação (cf. doc. 1)
3. Trata-se de um seguro de assistência em viagem, da modalidade contributivo e um seguro de grupo (cf. arts. 76.º e 77.º, n.º 1 e 2 e 78.º, da Lei n.º 72/2008, de 16 de abril – Lei do Contrato de Seguro).
4. A referida R. Quadrante Mistério exerce a atividade de operadora turística, organizando viagens que são adquiridas por agências, como é o caso da 1.ª R. Multidestinos. Viagens e Turismo, Lda.
5. Os segurados do seguro em causa eram os AA., aqui recorridos.
6. O contrato de seguro acima referido foi celebrado entre a aqui recorrente e a R. Quadrante Mistério no dia 28 de junho de 2017, tal como é atestado pelo doc. 2, junto com a contestação da aqui recorrente.
7. O seguro em causa, sendo um seguro de grupo, faz recair sobre o tomador do mesmo, ou seja, in casu, a R. Quadrante Mistério, a obrigação de informar os segurados sobre as coberturas contratadas e as respetivas exclusões bem como os direitos e obrigações existentes em caso de sinistro (cf. artigos 76.º e 78.º, n.º 1, da LCS).
8. Nos termos da norma do artigo 78.º n.º 5, da LCS, fica o tomador (in casu a R. Quadrante Mistério) vinculado a fazer prova de ter fornecido aos segurados as referidas informações, não recaindo no caso vertente tal obrigação sobre o segurador.
9. Com a celebração do contrato de seguro, a aqui recorrente entregou ao tomador do seguro (a R. Quadrante Mistério) a apólice com as cláusulas que integram o referido seguro, não só para conhecimento do tomador mas também para conhecimento dos segurados.
10. A recorrente sempre esteve disponível para prestar os esclarecimentos que lhe fossem pedidos e nunca se furtou a fazê-lo.
11. Neste tipo de seguros o segurador (in casu a aqui recorrente) não tem que preocupar-se ou mesmo saber se o tomador dá ou não a conhecer aos segurados o conteúdo da apólice.
12. Ocorreu um sinistro que consistiu na indisposição súbita de um dos segurados que o impediu de fazer a viagem contratada à Costa Rica, viagem esta contratada à R. Multi Destinos em 23 de maio de 2017.
13. A aqui recorrente recebeu a participação do referido sinistro no dia 7 de setembro de 2017, através de um correio eletrónico que lhe foi enviado pelo 1.º A. e recorrido (cf. doc. 18, junto com a p.i.).
14. Solicitava-se no referido email à aqui recorrente que procedesse ao reembolso das despesas com a viagem, fazendo uma descrição sumária dos factos ocorridos e fornecendo diversos documentos (cf. doc. 18, p.i.).
15. A aqui recorrente deu de imediato início aos procedimentos que sempre faz cada vez que recebe uma participação de sinistro, preparando um processo que instruiu com todos os elementos de que dispunha.
16. No decurso da gestão e análise do processo que os serviços da recorrente constataram que se verificava o preenchimento de uma cláusula de exclusão específica da cobertura referente aos gastos de cancelamento da viagem, que tinha como consequência fazer com que o sinistro em causa ficasse excluído do âmbito de proteção do seguro.
17. A referida cláusula era a que se continha no artigo 11.º, al. G) das Condições Gerais da Apólice, através da qual se consideravam excluídas da cobertura dos gastos de cancelamento ou de interrupção da viagem as viagens contratadas com uma antecedência superior a 3 dias face à data da subscrição do Seguro (cf. doc. 1, contestação da aqui recorrente).
18. A mesma estipulação resulta do artigo 10.º da Apólice, referente à cobertura dos gastos e cancelamento ou de interrupção da viagem (cf. doc. 1, contestação da aqui recorrente).
19. De facto, no ponto 1.1, do segundo parágrafo, daquele artigo 10.º determina-se que esta cobertura só é válida e eficaz se o Seguro que a compreende for contratado na mesma data em que for contratada a viagem objeto do mesmo ou, no máximo, até 3 dias após a data da contratação da viagem, não produzindo quaisquer efeitos quando o Seguro seja contratado em data anterior à data da contratação da viagem nem quando o seja depois de decorridos 3 dias sobre a data da contratação da viagem (cf. doc. 1, contestação).
20. A Apólice fornece uma definição precisa do que se deve entender por data de contratação da viagem, estipulando que se trata da data em que é emitido o primeiro bilhete do meio de transporte a ser utilizado pelo Segurado e/ou a data na qual é efetuada a reserva do quarto de hotel onde o Segurado irá ficar hospedado (cf. terceiro parágrafo do n.º 1.1 do artigo 10.º, referente à Cobertura dos Gastos de Cancelamento ou de Interrupção da Viagem), (doc. 1, junto com a contestação da aqui recorrente).
21. As reservas dos quartos de hotel foi efetuada no dia 1 de junho de 2017, tendo os bilhetes de voo eletrónicos sido emitidos no dia 4 de agosto de 2017 (cf. docs. 7 a 10, juntos com a p.i.).
22. Pelas disposições transcritas, deve concluir-se que as coberturas dispensadas pela Apólice de seguro em causa só estariam disponíveis no caso de o contrato de seguro ter sido subscrito pelo tomador no dia 1 de junho ou no máximo 3 dias depois desta data, o que não aconteceu uma vez que apenas foi subscrito no dia 28 de junho.
23. Não foi assim cumprido o prazo estipulado na apólice e a que acima se fez referência com a consequência previsível e inevitável de não poder a aqui recorrente reembolsar as despesas decorrentes do cancelamento da viagem dos aqui recorridos.
24. O tomador do seguro (a R. Quadrante Mistério) contratou o presente seguro através da Internet, numa aplicação informática da aqui recorrente denominada SGOE (http://s-o-g-e.com).
25. O referido tomador acedeu àquela aplicação tendo inserido o nome de utilizador a respetiva palavra-passe.
26. O tomador que escolheu o tipo e modalidade de seguro que desejava contratar, inserindo os nomes e apelidos dos segurados e os dados relativos à viagem, concluindo com a emissão do certificado de seguro de viagem a respetiva impressão.
27. Inexistiu autorização direta por parte da aqui recorrente, uma vez que a mesma se encontra subjacente à possibilidade de aceder à referida aplicação informática.
28. O tomador dispunha de um prazo para contratar o seguro, prazo esse cujo cumprimento era determinante para efeitos de assegurar a validade e eficácia das coberturas contratadas, o que como já se disse não aconteceu.
29. A circunstância essencial que deu origem ao presente litígio foi não ter sido respeitado o referido prazo de 3 dias, que constava nos artigos 10.º, 1.1 e 11.º, al. G), da Apólice com as Condições Gerais do Seguro.
30. O tomador do seguro sabia ou não devia ignorar a existência do referido prazo, uma vez que recebeu a Apólice com as Condições Gerais do Seguro.
31. O tomador do seguro é que tinha conhecimento da data da viagem e podia assim operar de modo a que o referido prazo fosse respeitado, o que não aconteceu.
32. A aqui recorrente não interveio nem tinha de intervir na emissão do certificado de seguro de viagem porquanto se limitou a celebrar o contrato de seguro com o tomador.
33. A aqui recorrente não sabia nem tinha de saber quais as pessoas que iriam adquirir a qualidade de segurados, pois apenas o tomador e a empresa que organizou a viagem (a R. Multidestinos) o poderiam saber.
34. A aqui recorrente foi assim totalmente alheia a todas as operações e factos que vieram a produzir-se após a celebração do contrato de seguro de assistência em viagem com o tomador.
35. Só lhe poderia assim ser assacada responsabilidade pelo não pagamento ou reembolso das despesas de viagem caso se viesse a demonstrar que não foi legítima a sua recusa em fazê-lo.
36. O tomador do seguro (a R. Quadrante Mistério) sustentou em Tribunal que não lhe poderia caber a responsabilidade por desconhecer a existência da referida regra dos 3 dias, que se contém nos já referidos artigos 10.º, 1.1 e 11.º, al. G), da Apólice com as Condições Gerais do Seguro.
37. A regra dos 3 dias faz parte há já alguns anos das Condições Gerais do referido seguro, pelo que a Quadrante Mistério não poderia desconhecê-la.
38. A douta sentença recorrida considerou provados diversos factos, com interesse para a decisão do presente recurso: (…)
39. No que diz respeito ao facto provado n.º 31, deve dizer-se que, de acordo com a lei, tratando-se de um seguro de grupo, a aqui recorrente não tinha que ter dado conhecimento das condições do seguro aos aqui recorridos, até porque nem sequer sabia ou tinha obrigação de saber as respetivas identidades (cf. artigo 78.º da LCS).
40. Essa obrigação recaía sim sobre o tomador, nos termos do disposto no artigo 78.º, n.º 5, da LCS.
41. Considerou a douta sentença recorrida como não provados diversos factos sendo que, para a finalidade do presente recurso, importam os que se encontram consignados nas als. v), x), w), y), e aa).
42. O facto que se contém na al. v) dá como não provado que a aqui recorrente tenha prestado à ré Quadrante Mistério todos os esclarecimentos e informações sobre as condições do contrato de seguro referido em 24 (contrato celebrado entre a aqui recorrente e a Quadrante Mistério).
43. Ora, salvo o devido respeito, este facto deveria ter sido dado como provado porquanto fez-se prova de que a aqui recorrente prestou todos os esclarecimentos que lhe foram pedidos pelo tomador do seguro (Quadrante Mistério), não só por lhe ter sido enviado o documento com as Condições Gerais da Apólice como pela disponibilidade para terem sido esclarecidas as questões que foram colocadas.
44. A este propósito requer-se a reapreciação do depoimento da testemunha DC…, que depôs na sessão de julgamento que teve lugar no dia 30 de abril de 2019, sobre este ponto em concreto tendo afirmado o que se transcreveu na pp. 12 e ss. das presentes alegações que aqui se dá por integralmente reproduzido (DC… – Testemunha, nome do ficheiro áudio 20190430144506_19478452_2871108.wma, 30.04.2019, 00:38:41);
45. Esta testemunha explicou ainda, de forma clara, a razão pela qual a recorrente não tinha assumido o pagamento das despesas que decorreram do sinistro, tendo-o feito de acordo com o depoimento que se transcreveu nas pp. 15 e 16 das presentes alegações (ibidem).
46. Do depoimento desta testemunha resulta que a R. Quadrante Mistério conhecia e não podia ignorar o conteúdo da Apólice de seguro que livremente contratou e que os colaboradores da aqui recorrente sempre prestaram todas as informações e esclarecimentos que lhes foram solicitados pelos colaboradores do tomador do seguro.
47. A mesma testemunha atesta que as Condições Gerais do Seguro foram enviadas à Quadrante Mistério, tomador do seguro, o que aliás é lógico e constitui uma obrigação do segurador.
48. Por outro lado, o tomador do seguro (Quadrante Mistério) nunca se queixou de não ter recebido ou tido acesso às referidas Condições Gerais, mas unicamente de não conhecer a referida regra dos 3 dias que nas mesmas se continha.
49. A propósito da referida regra dos 3 dias que o tomador pretendia não conhecer, foi feita prova quer testemunhal quer documental de que a Quadrante Mistério não podia desconhecer a referida regra.
50. Com efeito, a mesma testemunha DP… não só afirmou ao Tribunal que a referida regra sempre esteve nas Condições Gerais como deu a conhecer um documento que trazia com ele que atestava o conhecimento dessa regra por parte da referida Quadrante Mistério, tal como resulta do respetivo depoimento transcrito na p. 17 das presentes alegações, que aqui se dá por integralmente reproduzido (DC… – Testemunha, nome do ficheiro áudio 20190430144506_19478452_2871108.wma, 30.04.2019, 00:42:44);
51. Na sequência desta parte do depoimento desta testemunha, a aqui recorrente requereu que o referido documento fosse junto aos autos por ter manifesto interesse para a descoberta da verdade material, ao abrigo do que dispõe o artigo 423.º, n.º 3 do CPC, tendo este requerimento sido deferido pela Merit.ª Juíza.
52. O referido documento encontra-se junto aos autos (cf. doc. de fls. 130) e consiste num email com data de 23 de outubro de 2014, onde é feita referência expressa à regra dos 3 dias por uma funcionária ou colaboradora da Quadrante Mistério.
53. Tendo sido confrontada com o referido documento, a testemunha DP… o que consta da transcrição do seu depoimento nas pp. 18 e 19 das presentes alegações, que aqui se dá por integralmente reproduzido (DC… Testemunha, nome do ficheiro áudio 20190430144506_19478452_2871108.wma, 30.04.2019, 01:24:31);
54. Curiosamente, não é feita qualquer referência a este documento nem ao depoimento desta testemunha a propósito deste facto na douta sentença, o que pode significar que passou desapercebido.
55. Deste modo, e partir do depoimento desta testemunha, que se transcreveu, não só se fez prova que as Condições Gerais do seguro foram enviadas e dadas a conhecer ao tomador como ainda que este tinha conhecimento há anos da regra dos 3 dias.
56. Por força da reapreciação da prova gravada das declarações da testemunha DP… requer-se que passem a considerar-se provados os factos constantes das als. v) e x), indicados pela douta sentença recorrida, atenta a produção da prova transcrita e cuja reapreciação expressamente se solicita.
57. Requer-se ainda que, por força da reapreciação da das declarações indicadas da mesma testemunha, seja acrescentado aos referidos factos que a R. Quadrante Mistério tinha conhecimento da regra dos 3 dias constante dos artigos 10.º, 1.1 e 11.º, al. G), das Condições Gerais.
58. Refere-se ainda no facto não provado da al. x) que não se provou que a entrega da apólice fosse com a finalidade de que a Quadrante Mistério a entregasse aos autores, ou seja, aos segurados.
59. Ora, já se viu que, nos termos da lei, a aqui recorrente não tinha obrigação de fazer chegar aos segurados as condições da apólice por se tratar de um seguro de grupo.
60. Quem tinha essa obrigação era justamente o tomador do seguro Quadrante Mistério, tal como resulta do disposto no artigo 78.º n.º 5, da LCS.
61. Requer-se assim que seja considerado provado que a aqui recorrente entregou a Apólice com as Condições Gerais do seguro ao tomador Quadrante Mistério e que este tinha a obrigação de fornecer uma cópia aos segurados.
62. O facto considerado não provado na al w) esbarra também nos depoimentos das duas referidas testemunhas, que confirmaram terem iniciado os procedimentos de imediato assim que receberam a participação do sinistro que afetou um dos aqui recorridos.
63. Requer-se assim que o facto que se encontra na al. w) (douta sentença recorrida) seja considerado provado.
64. Do mesmo se deve considerar que o facto não provado constante da al. y) (douta sentença recorrida) seja considerado provado.
65. Com efeito, de acordo com o facto provado 53 ficou assente que a Quadrante Mistério contratou o seguro através da plataforma informática, mas esta dava a possibilidade de escolher o seguro pretendido.
66. Prova-o o teor do depoimento da testemunha DP…, que se transcreveu nas pp 20 a 22 das presentes alegações e se dá aqui por integralmente reproduzido (DC… – Testemunha, nome do ficheiro áudio 20190430144506_19478452_2871108.wma, 30.04.2019, 00:34:38);
67. Daqui se retira que havia várias possibilidades e hipóteses que se ofereciam à entidade que desejava contratar o seguro em causa (a Quadrante Mistério), pelo que se requer que, em função da reapreciação do referido depoimento da testemunha DP…, o facto que se encontra na al. y) passe a ser considerado provado.
68. Finalmente, o facto considerado não provado consignado na al. aa) (a aqui recorrente ter estado sempre disponível para prestar todas as informações solicitadas sobre o contrato de seguro em causa) deve igualmente ser considerado provado em função do depoimento da referida testemunha DP… (ibidem).
69. Do exposto, temos que a aqui recorrente, sempre com o devido respeito, entende ter sido produzida prova testemunhal e não testemunhal que leva a que possam, através da respetiva reapreciação, ser considerados provados os factos que se contêm nas als. v), x), w) y) e aa) e ainda acrescentar o facto de que a Quadrante Mistério tinha conhecimento da regra dos 3 dias constante artigos 10.º, 1.1 e 11.º, al. G), das Condições Gerais.
70. Na fundamentação jurídica a que procede, a douta sentença aponta corretamente um conjunto de preceitos a que já se fez referência, como, p.ex., o que consta do artigo 78.º, n.º 1, onde se contém a obrigação que recai sobre o tomador do seguro de informar os segurados sobre as coberturas contratadas e as suas exclusões (cf. douta sentença, p. 28, in fine).
71. Considera em seguida a douta sentença recorrida que o seguro de grupo é um contrato de adesão, visto que não existe liberdade de negociação.
72. O facto de existir a possibilidade de se escolher opções retira à celebração deste contrato de seguro a possibilidade de ser considerado como contrato ou negócio de adesão.
73. Tal como resulta do depoimento da testemunha DP… (transcrição 00:34:38, pp. 25 e 26 alegações) e TM…, Quadrante Mistério o fez por sua iniciativa e livre vontade, como sempre teve possibilidade de optar por algumas condições do seguro que são de livre escolha pelo tomador.
74. Daqui se retira que o seguro em causa dispõe de diversas coberturas que podem ser livremente escolhidas pelo tomador do mesmo, através da plataforma eletrónica.
75. Não parece assim correta, salvo o devido respeito, a qualificação feita pela douta sentença recorrida no sentido de que estamos perante um contrato de adesão.
76. A douta sentença recorrida socorre-se desta qualificação de contrato de adesão para recorrer à aplicação do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, que disciplina as cláusulas contratuais gerais.
77. A partir daqui abre a porta para imputar à aqui recorrente uma série de obrigações que manifestamente não cabem ao caso concreto.
78. Com efeito, em primeiro lugar o tomador do seguro (a Quadrante Mistério) é uma operadora turística com anos de exercício de atividade e habituada a contratar seguros de grupo.
79. Não se trata assim de uma entidade que esteja à mercê das seguradoras ou que seja surpreendida com cláusulas como as que integram o contrato de seguro em causa.
80. Este contrato não foi celebrado entre a aqui recorrente e os segurados, não tendo a recorrente, nos termos da lei, que esclarecer os segurados que nem sabe quem são.
81. Estar assim a impor uma tal obrigação à aqui recorrente é, salvo o devido respeito, extravasar o que dispõe a Lei do Contrato de Seguro que é a que se aplica ao caso vertente.
82. Afirma a douta sentença recorrida que os autores foram surpreendidos pela atuação da ré seguradora que declinou a responsabilidade assumida por via do contrato de seguro de grupo (cf. p. 31).
83. Ora, salvo o devido respeito, uma tal conclusão não pode colher pela razão simples de que a relação contratual que existe no caso vertente não é entre a seguradora e os segurados mas sim entre a seguradora e o tomador do seguro e entre este e os segurados.
84. É assim que se passa nos seguros de grupo, cuja disciplina jurídica não deixa lugar a dúvidas tal como se encontra consagrada nos artigos 72.º e ss. da LCS.
85. Não foi com a aqui recorrente que os recorridos autores negociaram ou aderiam ao que quer que fosse.
86. Aliás, a douta sentença recorrida acaba por reconhecer que o dever de informar os segurados cabia à Quadrante Mistério, só que conclui que esse dever não desonera a aqui recorrente por esta ter a obrigação de comunicar e explicar as condições gerais do contrato de seguro aos aderentes, nos termos dos artigos 5.º e 6.º do DL n.º 446/85, de 25 de outubro (cf. douta sentença, pp. 31 e 32).
87. Salvo o devido respeito, afigura-se que esta construção esbarra não só contra o regime jurídico que regula o contrato de seguro de grupo como também contra os factos que foram provados e que revelam que não só não houve adesão como que não existia qualquer obrigação por parte da recorrente de esclarecer os segurados que nem sabia quem eram (não tendo obrigação de saber).
88. A douta sentença incorre em contradição quando vem dizer não ter sido provado que a Quadrante Mistério e a aqui recorrente não cumpriram o ónus de explicar aos autores, aqui recorridos, as condições do seguro, esquecendo que antes tinha já reconhecido que esse dever só cabia, nos termos da lei ao tomador do seguro Quadrante Mistério.
89. Repete-se em definitivo que inexistia qualquer obrigação por parte da aqui recorrente de informar os segurados exceto se estes a tivessem interpelado ou pedido quaisquer esclarecimentos o que não aconteceu.
90. Quem tinha essa obrigação era o tomador do seguro, sendo, por conseguinte, sobre este que uma tal responsabilidade deveria recair.
91. Finalmente, não se entende como foi possível à douta sentença recorrida passar por cima das cláusulas do seguro que previam a existência do referido prazo de 3 dias. Trata-se de cláusulas que integravam as condições do seguro, eram do conhecimento do tomador e foram dadas como provadas pela douta sentença (cf. facto provado n.º 51).
92. Considerar que das referidas cláusulas resultava um desequilíbrio significativo, desproporcionado e injustificado da situação da seguradora em relação aos aderentes, que pagaram o prémio na expetativa verem coberto o risco previsto é estar a assacar à seguradora uma responsabilidade que na verdade não lhe cabe. Com efeito, não foram os segurados que negociaram com a seguradora nem que pagaram o prémio do seguro a esta.
93. Aliás, a referida regra dos 3 dias não constituía um requisito de eficácia do seguro mas apenas da cobertura dos gastos de cancelamento, que era o que estava em causa (ver depoimento da testemunha DP… (00:49:08, pp. 25 a 27, alegações, que aqui se dá por integralmente reproduzido).
94. Este ponto afigura-se relevante uma vez que colide, salvo o devido respeito, com o entendimento que é feito pelo Tribunal. Com efeito, está apenas em causa a cobertura de gastos com o cancelamento, mantendo-se o seguro vigente com as outras coberturas contratadas eficazes.
95. Inexiste assim qualquer razão para se considerar como não aplicáveis as cláusulas que se contêm nos artigos 10.º, 1.1 e 11.º, al. G) das Condições Gerais da Apólice que como tal deverão ter-se por aplicadas.
Conclui a Apelante, pedindo que, com a reapreciação da prova produzida, seja revogada (ou modificada) a sentença recorrida no sentido da sua absolvição do pedido.
Foi apresentada alegação de resposta pelos Autores em que concluem nos seguintes termos (transcrevemos a parte útil, omitindo as conclusões atinentes ao pedido subsidiário):
(…) 6. O depoimento prestado, no dia 30.04.2019, pela testemunha DC… não permite dar como provada a matéria constante da alínea v).
(…) 8. A ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. endereçou à ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda uma missiva datada de 25 de Agosto de 2017, informando que: (…)
9. Esta carta aponta no sentido da cláusula dos 3 (três) dias respeitante à cobertura dos gastos de cancelamento apenas ter passado a ser aplicável ou, pelo menos, dada a conhecer à 2.ª “Quadrante Mistério” em 25.08.2017.
10. Em face da prova produzida, parece-nos ser de manter a alínea v) no elenco dos factos não provados.
11. Não se logrou provar a matéria constante da alínea x), devendo realçar-se, no que respeita aos Autores, que a apólice de seguro nunca lhes foi dada a conhecer.
12. Inexiste prova suficiente que permita aditar à matéria de facto que a Quadrante Mistério tinha conhecimento da regra dos 3 dias constante dos artigos 10.º, 1.1 e 11.º, al. G), das Condições Gerais.
13. Quanto ao facto não provado sob a alínea w), a ora Recorrente não indica quais os concretos elementos probatórios que justificam que tal facto seja dado como provado.
14. No que concerne ao facto não provado sob a alínea y), não se vislumbra do excerto do depoimento da testemunha DC… qualquer declaração que permita dar por provada esta matéria, limitando-se a testemunha a afirmar que o seguro tem diversas coberturas e que apenas a cobertura dos gastos de cancelamento se encontrava excluída em virtude da regra dos 3 (três) dias.
15. Relativamente ao facto não provado sob a alínea aa), não resulta, em nosso entender, demostrado pela prova produzida em julgamento, não se extraindo dos depoimentos transcritos nas alegações de recurso.
16. Da factualidade provada resulta que entre a 2.ª Ré “Quadrante Mistério”, na qualidade de tomadora de seguro, e a 3.ª Ré “Mapfre Asistencia” foi celebrado, em 28 de Junho de 2017, um contrato de seguro “Travel Protect Platinum Grupo”, titulado pela apólice n.º Quadra-…-…-…, a que os Autores aderiram, na qualidade de segurados.
17. O contrato de seguro em causa nos presentes autos apresenta-se como um seguro de grupo de assistência em viagem, na modalidade contributiva, sendo, nessa medida, um contrato de adesão, o qual integra cláusulas gerais que foram elaboradas sem prévia negociação individual e que os Autores segurados se limitaram a subscrever.
18. Na modalidade de contrato de adesão é lhe aplicável o regime previsto no Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro.
19. A obrigação geral de comunicação, informação e explicação das cláusulas do contrato de seguro que impende sobre a 2.ª Ré “Quadrante Mistério”, enquanto tomadora do seguro, por força do disposto no artigo 78º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, não desonera a 3.ª Ré seguradora “Mapfre Asistencia”, predisponente, de cumprir a sua obrigação de comunicar e explicar as condições gerais do contrato de seguro de grupo aos aderentes, uma vez que ela é a responsável primeira por essa comunicação e informação no âmbito dos contratos de adesão, nos termos dos artigos 5º e 6º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro.
20. O ónus de informação completa e esclarecida sobre o conteúdo do contrato e respetivas exclusões em vista da proteção do aderente tanto impende sobre a ré tomadora de seguro, como sobre a ré seguradora, por força do princípio da boa fé contratual previsto no artigo 227º do Código Civil, das disposições conjugadas dos artigos 5º e 6º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, e da necessidade da salvaguarda da proteção do consumidor segurado aderente, como parte mais fraca e vulnerável.
21. Atendendo à matéria de facto provada e na hipótese de a mesma não vir a ser alterada de acordo com o requerido pela ora Recorrente, não ficou demonstrado que a 3.ª Ré Seguradora, na altura da contratação, tenha efetivamente disponibilizado e comunicado à 2.ª Ré tomadora do seguro o conteúdo integral das condições gerais e particulares indispensáveis à definição da cobertura do seguro e das suas exclusões, mormente as de que agora se pretende prevalecer, o que, por si só, seria impeditivo do cabal cumprimento do subsequente dever de comunicação e de informação por parte da própria tomadora do seguro aos Autores segurados.
22. Resultou, por sua vez, provado que os Autores não foram informados, nem lhes foram comunicadas as cláusulas de exclusão constantes do seguro, nas quais se inclui aquela que retira do âmbito da cobertura de gastos de cancelamento as viagens contratadas com uma antecedência superior a três dias face à data da subscrição do seguro, invocada pela 3.º Ré seguradora para se eximir do pagamento do capital seguro, verificado o risco previsto.
23. A falta de comunicação das cláusulas de exclusão do seguro aos aderentes tem como efeito a sua eliminação do conteúdo contratual, nos termos do artigo 8º, alíneas a) e b) do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, não podendo a 3.º Ré seguradora prevalecer-se dessa cláusula para se eximir da sua responsabilidade de ressarcir pela ocorrência do risco sob cobertura.
24. Acresce que é manifesto o caráter abusivo, por contrário à boa fé, da cláusula de exclusão em apreço, que retira do âmbito da cobertura de gastos de cancelamento as viagens contratadas com uma antecedência superior a três dias face à data da subscrição do seguro, à luz do disposto nos artigos 15º e 16º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, pois que em resultado de tal cláusula de exclusão a cobertura fica aquém daquilo com que os segurados aderentes de boa fé poderiam contar, tendo em consideração o objeto e a finalidade do contrato de seguro, sendo certo que nunca tal questão foi suscitada na altura da subscrição do seguro, existindo um desequilíbrio significativo, desproporcionado e injustificado da situação jurídica da seguradora em detrimento dos segurados aderentes, que pagaram o prémio na expectativa de verem coberto o risco previsto, que põe em causa o princípio da igualdade entre as partes contratantes, pelo que sempre seria de considerar nula tal cláusula de exclusão, nos termos do artigo 12º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro.
25. Por esta duplicidade de fundamentos mostra-se inaplicável a cláusula de exclusão invocada pela 3.ª Ré seguradora, ora Recorrente, concluindo-se que a garantia do seguro – na vertente do risco por cancelamento de viagem - cobre o sinistro sofrido pelos Autores segurados, aqui Recorridos.
26. Pelo que os Autores, ora Recorridos, têm direito ao reembolso, até ao limite de € 3 000,00 (três mil euros) por pessoa, dos gastos irrecuperáveis de alojamento e de transporte suportados, devendo, portanto, manter-se na íntegra a Sentença recorrida. (…)
Concluem, defendendo que deve manter-se na íntegra a Sentença recorrida, ou, caso assim não se entenda, que seja apreciado o pedido subsidiário formulado pelos Autores.
Também foi apresentada alegação de resposta pela Ré Multidestinos, Viagens e Turismo, Lda., em que defende a confirmação da sentença recorrida, concluindo nos seguintes termos (transcrevemos a parte útil):
(…) 3. A Ré Multidestinos desempenhou no presente negócio a função de agência vendedora, assumindo-se por sua vez a ré Quadrante Mistério como agência organizadora, nos termos da Lei n.º 61/2011, de 6 de Maio.
(…) 11. E se assim é nenhuma responsabilidade há que assacar à Ré Multidestinos, porquanto enquanto agência vendedora (cf. Facto provado n.º 1 e 33) apenas assumiu um papel de mera intermediária entre o consumidor final, ora AA., e a agência organizadora, Ré Quadrante Mistério.
12. A Ré Multidestinos é completamente alheia aos termos e procedimentos tendentes à contratação do dito seguro, porquanto não é a esta que cabe – como efectivamente não coube – a celebração do contrato de seguro.
13. Tampouco teve qualquer tipo de intervenção na contratação do dito seguro.
14. Além do mais, é facto assente que a recorrente, no exercício da sua actividade mercantil, celebrou o referido contrato de seguro com a Ré Quadrante Mistério, que ficou com a qualidade de tomador, titulado pela Apólice n.º Quadra-…-…-….
15. Não resultando por isso qualquer obrigação, no que aos procedimentos tendentes à celebração do seguro concerne, para a Ré Multidestinos.
16. Razão pela qual, se deverá manter a douta sentença no que à Ré Multidestinos concerne nos precisos termos em que se encontra, uma vez que não se logrou provar que houve da parte desta qualquer tipo de dever incumprido.
17. No entanto, e quanto ao alegado pela Recorrente no que diz respeito à falta de cumprimento do famigerado prazo de 3 dias pela Ré Quadrante Mistério, tomador de seguro naquele contrato,
18. Sempre se diga que da prova produzida em julgamento não resultou que a Ré Quadrante tinha conhecimento da referida regra dos 3 dias,
19. Tampouco que a Recorrente prestou a esta todos os esclarecimentos e informações a que estava obrigada nos termos do DL n.º 446/85, de ....
20. Muito antes pelo contrário.
21. Encontra-se junto aos presentes autos um documento enviado pela Recorrente à Ré Quadrante Mistério onde refere explicitamente que a dita regra dos 3 dias apenas entraria em vigor a partir de 25 de Agosto de 2017, documento cujo conteúdo foi dado como provado no facto n.º 49.
22. Por outro lado, a Recorrente fundamenta as suas alegações de recurso no depoimento da testemunha DC…, depoimento esse considerado pelo Tribunal a quo como «algo emotivo e bastante comprometido».
23. Ora, não obstante ter a testemunha DP… referido que a informação respeitante à regra dos 3 dias referida na missiva constante do facto provado n.º 49 se tratou de «um lapso», tal não logrou convencer a aqui Ré Multidestinos, tampouco o Tribunal a quo.
(…) 26. Ora, não se pode aceitar que a Recorrente disponibilize uma plataforma digital de subscrição de seguros onde não é possível impedir que essa subscrição seja submetida quando estão em causa coberturas que estejam à partida excluídas.
27. Ora, a Recorrente nessa tal plataforma aceitou de forma automática a subscrição do seguro pela R. tomador de seguro – Quadrante Mistério – que gerou inevitavelmente o pagamento de um prémio que a Recorrente e cujos riscos sabia que nunca iriam estar cobertos.
28. Nesta conformidade, não se pode conceber que venha agora a Recorrente insistir na aplicação de uma cláusula de exclusão que, conforme refere a douta sentença recorrida se trata de cláusula de manifesto carácter abusivo.
(…) 30.     Ora, nunca poderá por isso o pedido ora formulado pela Recorrente proceder, devendo manter-se a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo.
(…) 33.     Ora, resulta da prova produzida que a razão pela qual a ré tomadora de seguro – Quadrante Mistério – não cumpriu a dita cláusula terá sido porque esta não tinha conhecimento da mesma.
34. Aliás, a Recorrente não logrou provar que prestou efectivamente à ré Quadrante Mistério todos os esclarecimentos e informações sobre as condições do contrato de seguro, tampouco que lhe havia entregue a respectiva apólice (cf. Facto não provado n.º v) e x)).
35. Todavia, insiste a Recorrente na defesa da tese de que o dever de informar os segurados das condições do seguro era da responsabilidade do tomador de seguro nos termos do art.º 78.º da LCS.
36. Ora, tal seria plenamente aplicável se não estivessemos perante um contrato de adesão, cujo regime está plasmado no DL n.º 446/85, de 25 de outubro e onde expressamente é referido no seu art.º 5.º que «as cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las», que não é nada mais nem nada menos que o caso dos presentes autos.
(…) 39. Mais adiante e quanto à intenção da Recorrente de integração dos factos não provados n.ºs v), x), w), y) e aa) na matéria assente, acrescentado ainda aos referidos factos que a Ré Quadrante Mistério tinha conhecimento da regra dos 3 dias constante no art.º 10.º, 1.1 e 11.º, al. G) da apólice,
40. porquanto da prova produzida em julgamento, nomeadamente do depoimento da testemunha DC… resultar inequivocamente que assim foi,
41. reitera-se o que supra se referiu quanto a este depoimento, uma vez que se tratou de um depoimento vago, sem qualquer conhecimento directo dos factos revelantes, limitando-se a referir os procedimentos habituais encetados pela sua entidade empregadora ora Recorrente em situações similares.
(…) 43. Nesta conformidade, bem andou o Tribunal a quo na decisão proferida também neste ponto, não devendo obter qualquer procedimento a pretensão da Recorrente no que concerne aos factos não provados, uma vez que não há prova suficiente que ateste que foram prestadas as informações e esclarecimentos necessários ao tomador de seguro para que este pudesse cumprir a famigerada regra dos 3 dias.
44. Posto isto, e estando em causa um contrato de adesão que tal como devidamente explanado na douta sentença recorrida se trata de um contrato «em que um dos contraentes, não tendo a menor participação na preparação das respectivas cláusulas, se limita a aceitar o texto que o outro contraente oferece, em massa, ao público interessado ter-se-á de lançar mão do regime aplicável às cláusulas contratuais gerais constante do DL n.º 446/85, de 25 de outubro.
45. Neste sentido e nos termos do art.º 12.º do referido diploma legal sempre seria de considerar nula a dita cláusula constante das condições gerais da apólice e respeitante ao prazo de 3 dias para a subscrição do seguro.
46. E isto porquanto se considerar ter ficado cabalmente demonstrado que para além do seguro ter sido subscrito numa plataforma digital, não foram prestados quaisquer esclarecimentos adicionais e respeitantes às condições do mesmo, conforme obrigam os art.ºs 5.º e 6.º daquele diploma legal. (…)
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
***
II - FUNDAMENTAÇÃO
Como é consabido, as conclusões da alegação do recorrente delimitam o objeto do recurso, ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal (artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC).
Face ao teor das conclusões da alegação de recurso, identificamos as seguintes questões a decidir:
1.ª) Se deve ser alterada a decisão da matéria de facto, sendo considerados provados os factos vertidos nas alíneas v), x), w) y) e aa) e ainda o facto de a Quadrante Mistério ter conhecimento da “regra dos 3 dias” constante dos artigos 10.º/1.1 e 11.º/al. G), das Condições Gerais.
2.ª) Se os Autores não podem beneficiar da cobertura atinente aos gastos de cancelamento da viagem por força da aplicação ao caso das cláusulas constantes dos artigos 10.º/1.1, e 11.º/al. G), das Condições Gerais da Apólice, interpretando-as e apreciando se as mesmas se devem considerar excluídas perante os Autores ou nulas.
Factos provados
Na sentença recorrida, foram considerados provados os seguintes factos (alterámos a numeração, de forma a ordenar os factos provados por ordem lógica e cronológica, mantendo entre parenteses a numeração constante da sentença):
1. (33.) A Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. é uma agência de viagens e turismo, que se dedica, além do mais, à venda de viagens turísticas elaboradas por agências organizadoras/operadores turísticos.
2. (34.) A Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. é uma operadora turística, uma agência organizadora de viagens, que vende às agências de viagem.
3. (35.) Os Autores solicitaram à Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. um orçamento para uma viagem à Costa Rica de 19 de agosto de 2017 a 3 de setembro de 2017.
4. (36.) A Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. endereçou à Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda., um e-mail datado de 3 de maio de 2017, que se encontra junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, solicitando o seguinte orçamento:
“(...) 3 pax’s
Aug
14 nts
1 San Juan
2 Vulcao
11 Praia
Plafont 9000€ (...)”.
5. (37.) A Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. endereçou à Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda., um e-mail, datado de 3 de maio de 2017 e sob o assunto “Orçamento Costa Rica”, que se encontra junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual consta, além do mais, o seguinte:
“(...) Conforme solicitado, segue proposta de orçamento para viagem à Costa Rica.
Informo que até ao momento não temos nenhum hotel bloqueado/reservado para as datas da viagem, a disponibilidade é momentânea.
Possibilidade de voos neste momento – VOOS NÃO BLOQUEADOS
Partida a 13 de Agosto 2017 // Chegada a 28 de Agosto 2017 – estadia 14 Noites
IB3107       13AUG   LISMAD 0745 1005
IB6315       13AUG   MADSJO 1150 1435
IB6314       27AUG   SJOMAD 1605 1035+1
IB3110       28AUG   MADLIS 1135 1155
Documentação e/ou vacinas necessários:
Obrigatório passaporte leitura ótica com validade mínima de 6 meses após o dia de chegada a Portugal.
Informo que em alguns hóteis não existe 3 camas num quarto triplo, mas pode existir uma cama dupla + sofá-cama extra para a 3ª pessoa.
Local  Hotel  N.º de Noites
San José Best Western Irazu 3* (pequeno-almoço)   01
Arenal Arenal Manoa 3* (pequeno-almoço)     02
Guanacaste Riu Guanacaste (Tudo Incluído)   11
Descrição  Valor por Pessoa   Quantidade     Total
Programa Base em quarto triplo 2.395,00€  12.395,00€
Supl. tarifa aérea   740,00€
Taxas de aeroporto   441,52€
Preço final por pessoa PVP
10.729,56 1
1 740,00€
441,52€
3.576,52€
Preço total da viagem PVP (03 pessoas – 01 triplo) 3€
Valores NET agência                                              
Comissão programa base 15% 359,25€
Total de comissões por pessoa  359,25€
Total de comissões Agência  3 -1.077,75€
Preço total da viagem NET (03 pessoas – 01 (triplo) 9.651,81€
Local          Hotel       N.º de Noites
San José Best Western Irazu 3* (pequeno-almoço)  01
Arenal Arenal Manoa 3* (pequeno-almoço) 02
Manuel António Si Como No (pequeno-almoço incluído)  11
Descrição  Valor por Pessoa   Quantidade Total
Programa Base em quarto triplo 2.250,00€  12.250,00€
Supl. tarifa aérea 740,00€   1740,00€
Taxas de aeroporto   441,52€   1441,52€
Preço final por pessoa PVP 3.431,52€
10.294,56
Preço total da viagem PVP (03 pessoas – 01 triplo) 3€
Valores NET agência                                              
Comissão programa base 15%  337,50€
Total de comissões por pessoa 337,50€
Total de comissões Agência 3  -1.012,50€
Preço total da viagem NET (03 pessoas – 01 triplo) 9.282,06€
Seguro e Assistência em viagem:
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Os preços incluem:
Passagem aérea em classe económica, de acordo com o itinerário
Transporte do Aeroporto ao Hotel e Vice-versa (em regular)
Alojamento 14 noites nos hóteis e regimes alimentar indicados
Taxas hoteleiras e Iva
Seguro Multiviagens
Taxas de aeroporto, segurança e combustível (sujeitas a alteração até ao momento da emissão dos bilhetes)
Os preços não incluem:
Extras de carácter pessoal
Visitas opcionais
Despesas de reserva, no valor total de € 20,00 NET
Imposto de saída (...)
Notas:
Preços sujeitos à disponibilidade existente no momento de reserva e efetiva e emissão
Regra geral, a hora do check-in é após as 15h00 e a hora do check-out é até às 12h00.
O Itinerário poderá sofrer alterações na ordem das visitas, inerentes a quaisquer condições especiais ocorridas localmente.
Preços sujeitos à variação cambial do Dólar (...)”.
6. (38.) A Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. endereçou à Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda., um e-mail datado de 15 de maio de 2017, que se encontra junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, solicitando uma alteração ao orçamento referido em (37.) no que à estadia e datas da viagem concerne.
7. (39.) A Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. endereçou à Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda., um e-mail, datado de 23 de maio de 2017 e sob o assunto “Orçamento Costa Rica”, que se encontra junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual consta, além do mais, o seguinte:
“(...) Conforme solicitado, segue proposta de orçamento para viagem à Costa Rica.
Informo que até ao momento não temos nenhum hotel bloqueado/reservado para as datas da viagem, a disponibilidade é momentânea.
Voos bloqueados
Partida a 19 de Agosto 2017 // Chegada a 3 de Setembro 2017 – estadia 14 Noites
Notas:
Preços sujeitos à dispo1. …/… MRS  2. …/… MR
3. …/… MRS
IB3107 19AUG   LISMAD HK3 0745 1005
IB6315  19AUG   MADSJO   HK3  1150 1435
IB6314  02SEP  SJOMAD HK3 1605 1035+1
IB3110  03SEP  MADLIS HK3 1135 1155
Documentação e/ou vacinas necessários:
Obrigatório passaporte leitura ótica com validade mínima de 6 meses após o dia de chegada a Portugal.
Informo que em alguns hóteis não existe 3 camas num quarto triplo, mas pode existir uma cama dupla + sofá-cama extra para a 3ª pessoa.
Local  Hotel  N.º de Noites
San José     Best Western Irazu 3* (pequeno-almoço) 01
Tortuguero Mawamba Lodge 3* (pensão completa) 02
Arenal        Arenal Manoa 3* (pequeno-almoço) 02
Guanacaste Riu Guanacaste (Tudo Incluído) 09
Descrição  Valor por Pessoa   Quantidade       Total
Programa Base em quarto triplo 2.520,00€   12.520,00€
Supl. tarifa aérea       625,00€   1625,00€
Taxas de aeroporto   440,21€   1440,21€
Preço final por pessoa PVP 3.585,21 €
10.755,63
Preço total da viagem PVP (03 pessoas – 01 triplo) 3€
Valores NET agência
Comissão programa base 15%  378,00€
Total de comissões por pessoa 378,00€
Total de comissões Agência 3 -1.134,00€
Preço total da viagem NET (03 pessoas – 01 triplo) 9.621,63€
Local Hotel N.º de Noites
San José Best Western Irazu 3* (pequeno-almoço)  01
Tortuguero Mawamba Lodge 3* (pensão completa*)  02
Arenal Arenal Manoa 3* (pequeno-almoço)   02
Manuel António Si Como No (pequeno-almoço)  09
Descrição  Valor por Pessoa   Quantidade   Total
Programa Base em quarto triplo 2.410,00€ 12.410,00€
Supl. tarifa aérea  625,00€   1625,00€
Taxas de aeroporto   440,21€   1440,21€
Preço final por pessoa PVP 3.475,21 €
10.425,63
Preço total da viagem PVP (03 pessoas – 0 (triplo) 3€
Valores NET agência                                              
Comissão programa base 15% 361,50€
Total de comissões por pessoa  361,50€
Total de comissões Agência  3  -1.084,50€
Preço total da viagem NET (03 pessoas – 01 triplo) 9.341,13€
*Pensão completa (sem bebidas incluídas)
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Imposto de saída (...)
Notas:
Preços Sujeitos à Disponibilidade existente no momento de reserva e efetiva e emissão.
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O Itinerário poderá sofrer alterações na ordem das visitas, inerentes a quaisquer condições especiais ocorridas localmente.
Preços sujeitos à variação cambial do Dólar (...)”.
8. (1.) Em 23 de maio de 2017, a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. enviou ao Autor, por e-mail, que se encontra junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e a pedido deste, um orçamento para uma viagem à Costa Rica, com data de partida de Lisboa a 19 de agosto de 2017 e data de chegada a 3 de setembro de 2017, para três participantes: o Autor, o cônjuge deste, CA…, e a filha de ambos, MD….
9. (2.) O orçamento referido em (1.) incluía:
a) passagens aéreas em classe económica entre o aeroporto de Lisboa e a capital da Costa Rica, San José, e vice-versa;
b) transporte do aeroporto ao hotel e vice-versa;
c) alojamento de 14 (catorze) noites, sendo 3 (três) noites em regime de pequeno almoço, 2 (duas) noites em regime de pensão completa e 9 (nove) noites em regime de tudo incluído;
d) seguro “multiviagens e assistência quadrante 24 horas” e
e) taxas hoteleiras e IVA, taxas de aeroporto, segurança e combustível.
10. (3.) A viagem referida em (1.) foi orçamentada em 10.755,63 € (dez mil, setecentos e cinquenta e cinco euros e sessenta e três cêntimos).
11. (4.) De acordo com o orçamento referido em (1.), a contratação do seguro “MULTIASSISTENCIA VIP” importava um custo adicional de 20,00 € (vinte euros) por pessoa segura.
12. (5.) O valor orçamentado referido em (3.) foi objeto de um desconto acordado verbalmente entre o Autor e a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda., tendo o preço da viagem sido fixado por esta em 10.100,00 € (dez mil e cem euros).
13. (6.) No dia 26 de maio de 2017, o Autor solicitou à Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. a reserva da viagem referida em (1.) para os Autores, pelo preço final de 10.100,00 € (dez mil e cem euros).
14. (7.) Em simultâneo com o descrito em (6.), o Autor solicitou à Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. a contratação de um seguro “com as melhores coberturas”, designadamente, para gastos com o cancelamento da viagem.
15. (8.) Em 26 de maio de 2017, a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. reservou junto da operadora de viagens, a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda., a referida viagem com indicação de “seguro vip” para os Autores.
16. (40.) Em 26 de maio de 2017, a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda., endereçou à Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda., um e-mail datado de 3 de maio de 2017, que se encontra junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, dando indicação que se poderia avançar com a reserva do serviço, fazendo menção expressa de que os Autores pretendiam o “seguro vip”.
17. (9.) O Autor efetuou o pagamento da referida viagem à Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda., acrescido do custo adicional da contratação do “seguro vip”, no valor total de 10.160,00 € (dez mil, cento e sessenta euros), nos seguintes termos:
a) a quantia de 4.000,00 € (quatro mil euros), em 1 de junho de 2017;
b) a quantia de 5.000,00 € (cinco mil euros), em 31 de julho de 2017; e
c) a quantia de 1.160,00 € (mil, cento e sessenta euros), em 1 de agosto de 2017.
18. (30.) O Autor procedeu ao pagamento do custo adicional de 20,00 € (vinte euros) por pessoa para contratação de um “seguro vip” com cobertura dos riscos da viagem, nomeadamente, os gastos de cancelamento.
19. (10.) Em 1 de junho de 2017, foram emitidos os vouchers dos hotéis escolhidos para alojamento.
20. (41.) Em 1 de junho de 2017, foi pela Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. confirmada a reserva referida em (40).
21. (42.) Na descrição da confirmação de reserva referida em (41.) consta expressamente o “Seguro Multiviagens e Assistência Quadrante 24 horas”.
22. (43.) Em 1 de junho de 2017, a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. procedeu a um pagamento no valor de 3.750,00 € (três mil, setecentos e cinquenta euros) à Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda.
23. (24.) No dia 28 de junho de 2017, a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. e a Ré Mapfre Asistencia – Companhia de Seguros e Reseguros, S.A. (Sucursal em Portugal) firmaram entre si um acordo denominado “contrato de seguro Tavel Protect Platinum Grupo”, titulado pela apólice n.º Quadra-…-…-…, em que figuram, como tomadora de seguro, a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. e, como segurados, os Autores e em que o limite de capital seguro fixado para “gastos de cancelamento” é de 3.000,00 € (três mil euros) por cada segurado.
24. (51.) Das condições gerais da apólice de seguro de assistência em viagem “Travel Protect” da Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A., que se encontram junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta, além do mais, o seguinte:
“(...) ARTIGO 10º
COBERTURA DE GASTOS DE CANCELAMENTO OU DE INTERRUPÇÃO DA VIAGEM
Em virtude do presente contrato, a MAPFRE ASISTENCIA indemnizará o Segurado pelos gastos que se produzam a seu cargo como consequência do cancelamento ou da interrupção da viagem.
1. GASTOS DE CANCELAMENTO DA VIAGEM
1.1. A garantia de gastos de cancelamento da viagem vigorará desde que a MAPFRE ASISTENCIA receba a comunicação da inclusão do Segurado por parte do Tomador do Seguro e terminará no momento do início da viagem (momento de embarque no meio de transporte colectivo contratado para realizar a viagem).
Esta cobertura só é válida e eficaz se o Seguro que a compreende for contratado na mesma data em que for contratada a viagem objecto do mesmo ou, no máximo, até 3 dias após a data da contratação da viagem, não produzindo quaisquer efeitos quando o Seguro seja contratado em data anterior à data da contratação da viagem nem quando seja depois de decorridos 3 dias sobre a data da contratação da viagem.
Para efeitos da presente cobertura é considerada “data da contratação da viagem” a data na qual é emitido o primeiro bilhete do meio de transporte a ser utilizado pelo Segurado e/ou a data na qual é efectuada a reserva do quarto de hotel onde o Segurado irá ficar hospedado.
1.2. A MAPFRE ASISTENCIA será responsável pelo reembolso, até ao limite fixado nas Condições Particulares e/ou Especiais, dos gastos irrecuperáveis de alojamento e de transporte que se produzam a cargo do Segurado e lhe sejam facturados pela aplicação das condições gerais de venda dos seus prestadores de serviços, desde que o mesmo proceda ao cancelamento da viagem antes do respectivo início, por uma das seguintes causas:
a) Doença grave ou acidente corporal grave do Segurado que o impeça de viajar.
b) Doença grave, acidente corporal grave ou falecimento do cônjuge do Segurado, de algum dos seus filhos, pais, avós, irmãos, sogros, genros, noras ou cunhados.
c) Doença grave, acidente corporal grave ou falecimento da pessoa encarregue de exercer a custódia dos filhos menores de idade ou deficientes do Segurado, na residência habitual deste, durante a viagem do Segurado.
d) Ter sido notificado na qualidade de parte, testemunha ou jurado, salvo se a notificação tiver chegado ao seu conhecimento em data anterior à da contratação da viagem. O Segurado deve facultar à MAPFRE ASISTENCIA, para apreciação e posterior devolução, o original da notificação.
e) Danos graves causados na residência habitual do Segurado ou no seu domicílio profissional, próprios ou arrendados, por arrombamento de porta(s) e/ou janela(s), roubo, incêndio, explosão ou inundação, que os torne inabitáveis ou que acarrete grave risco de produção de maiores danos e justifique de forma imprescindível e imediata a presença do Segurado.
f) Despedimento do Segurado por motivos não disciplinares. O Segurado deve apresentar à MAPFRE ASISTENCIA a comunicação do seu empregador, a qual só será aceite se a data da mesma for posterior à da contratação deste Seguro.
g) Cancelamento pela pessoa que acompanharia o Segurado na viagem, que tenha contratado a viagem em simultâneo com o Segurado e esteja segura por este mesmo contrato, sempre que o cancelamento tenha origem numa das causas anteriormente enumeradas.
1.3. Caso ocorra o falecimento do Segurado antes do início da viagem, qualquer dos familiares referidos na alínea b) de 1.2. pode proceder ao respectivo cancelamento logo que tome conhecimento do falecimento e sempre antes da hora de início da viagem, devendo para o efeito notificar a MAPFRE ASISTENCIA e a agência de viagens do Segurado, invocando o respectivo falecimento.
a) a MAPFRE ASISTENCIA é responsável por indemnizar os custos e/ou penalizações, conforme disposto em 1.2., desde a data da notificação.
b) Para reclamar a indemnização prevista nesta cobertura, devem ser apresentados à MAPFRE ASISTENCIA os seguintes documentos: Certidão de Óbito do Segurado, factura original e/ou recibo do pagamento da viagem à agência e cópia do certificado por ela emitido, documento original do cancelamento expedido pelo operador turístico e, caso a viagem tenha sido organizada e contratada através de uma agência de viagens, cópia da factura dos gastos irrecuperáveis ou nota de débito dos mesmos, comprovados pelos prestadores dos serviços, documentos a serem facultados por estes à agência de viagens, cópia das condições gerais de venda do operador, bem como prova da data em que o cancelamento da viagem foi efectivamente efectuado junto dos prestadores dos serviços.
c) A indemnização será paga a quem provar ser herdeiro legítimo do Segurado e de acordo com as classes de sucessíveis estabelecidas no Código Civil.
1.4. A notificação do cancelamento da viagem deve ser obrigatoriamente efectuada à MAPFRE ASISTENCIA e à agência de viagens logo que o Segurado, ou um seu familiar no caso de incapacidade absoluta ou falecimento deste, tenha conhecimento do evento que determine o cancelamento, ficando a MAPFRE ASISTENCIA responsável por indemnizar os gastos irrecuperáveis de alojamento e de transporte desde a data da sua notificação.
1.5. No que respeita aos gastos de alojamento e de transporte, o Segurado obriga-se a tomar as providências necessárias no sentido de recuperar, no todo ou em parte, as verbas já liquidadas, incumbindo à MAPFRE ASISTENCIA assumir completamente os gastos de alojamento e de transporte que venham a ser considerados irrecuperáveis.
1.6. Para reclamar a indemnização ao abrigo desta cobertura, o Segurado deverá apresentar os seguintes documentos:
a) Cópia do documento justificativo do evento que o impede de viajar (Atestado Médico, Certidão de Óbito, Informação dos Bombeiros, denúncia efectuada na polícia, informação da companhia de seguros, etc.). Os documentos deverão conter obrigatoriamente a data da ocorrência (hospitalização, falecimento, sinistro), o diagnóstico ou o tipo de dano, o historial e antecedentes clínicos e o tratamento prescrito, conforme aplicável de acordo com a causa impeditiva.
b) Factura original e/ou recibo do pagamento da viagem à agência e cópia do certificado de seguro emitido pela agência.
c) Documento original do cancelamento, expedido pelo operador turístico e factura dos gastos irrecuperáveis ou nota de débito dos mesmos emitida pela agência de viagens.
d) Caso a viagem tenha sido organizada e contratada através de uma agência de viagens, cópia da factura dos gastos irrecuperáveis ou nota de débito dos mesmos, comprovados pelos prestadores dos serviços, documentos a serem facultados por estes à agência de viagens, cópia das condições gerais de venda do operador, bem como prova da data em que o cancelamento da viagem foi efectivamente efectuado junto dos prestadores dos serviços. (...)
ARTIGO 11º
EXCLUSÕES ESPECÍFICAS DA COBERTURA DE GASTOS DE CANCELAMENTO OU DE INTERRUPÇÃO DA VIAGEM
Não se garantem os cancelamentos ou interrupções da viagem que tenham a sua origem em:
a) Tratamento estético, curativo, numa contra-indicação de viagem ou de vacinação ou ainda na impossibilidade de em certos destinos o Segurado seguir um tratamento médico preventivo aconselhado.
b) Epidemias e suicídio, na forma tentada ou consumada.
c) Não apresentação, por qualquer causa, dos documentos indispensáveis desde o início até ao termo da viagem, como por exemplo: passaporte, vistos, cartões de identificação, certificados de vacinação.
d) Tratamentos de odontologia não urgentes ou de reabilitação.
e) Doenças de pessoas cuja idade seja igual ou superior a 75 anos.
f) Doenças e/ou acidentes preexistentes à data da contratação da viagem e do Seguro, incluindo as recaídas agudas.
g) Viagens contratadas com uma antecedência superior a 3 dias face à data da subscrição do Seguro.
h) Gravidez ou parto sem complicações, em parto que ocorra após 37 semanas (inclusive) de gestação, em parto ocorrido no estrangeiro e suas eventuais complicações logo que se inicie a trigésima sexta semana de gravidez, independentemente da existência ou não de qualquer risco para a mulher grávida ou para o nascituro, bem como em interrupção voluntária da gravidez quando não seja devidamente justificada por um médico da especialidade com base em pelo menos um dos seguintes fundamentos: perigo de morte da mulher grávida; grave e irreversível ou duradoura lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida; seguros motivos para prever que o nascituro venha a sofrer de forma incurável de grave doença ou malformação congénita; feto inviável.
i) Ingestão voluntária de álcool, drogas, substâncias tóxicas, narcóticos ou medicamentos adquiridos sem prescrição médica, bem como em qualquer doença mental ou desequilíbrio psíquico. (...)”.
25. (31.) As Rés Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda., Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. e Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. não deram conhecimento aos Autores do conteúdo das condições gerais da apólice referida em (24.).
26. (32.) Os Autores não foram informados pelas Rés Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. e Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. da data [28 de junho de 2017] de contratação referida em (24.).
27. (52.) O acordo referido em (24.) foi firmado pela Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda., através da internet, numa aplicação informática da Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. denominada SOGE (hhttp://s-o-g-e.com).
28. (53.) A Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. acedeu à aplicação informática referida em (52.) através da inserção do nome de utilizador e da respetiva palavra passe.
29. (54.) A Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. inseriu o nome e os apelidos dos Autores e os dados relativos à viagem, tendo sido emitido e impresso o certificado de seguro de viagem.
30. (55.) Para a celebração do acordo e a emissão do certificado de seguro de viagem da forma descrita não são fornecidas as datas de reserva de voos/alojamento ou as de emissão do bilhete/voucher.
31. (44.) Em 3 de agosto de 2017, a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. procedeu a um pagamento no valor de 5.552,88 € (cinco mil, quinhentos e cinquenta e dois euros e oitenta e oito cêntimos) à Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda.
32. (11.) Em 4 de agosto de 2017, foram emitidas as passagens aéreas dos Autores na referida viagem.
33. (12.) No dia 19 de agosto de 2017, os Autores compareceram no aeroporto de Lisboa, por volta das 5:15 horas.
34. (13.) Quando os Autores se encontravam na fila do check-in, a Autora MS… acusou sensação de mal-estar geral, tendo, pouco depois, perdido os sentidos e caído inanimada.
35. (14.) A Autora MS… foi observada pelos socorristas presentes no aeroporto de Lisboa.
36. (15.) A Autora MS… recuperou os sentidos e os Autores voltaram para a fila do check-in.
37. (16.) Após o descrito em (15.), a Autora MS… começou a sentir náuseas, acompanhadas por sensação de desmaio.
38. (17.) Perante o descrito em (16.), os Autores seguiram do aeroporto de Lisboa para o Hospital da Luz.
39. (18.) Os Autores permaneceram no Hospital da Luz, no serviço de atendimento médico permanente, entre as 06:42 horas e as 08:10 horas, do dia 19 de agosto de 2017.
40. (19.) Foi diagnosticada uma lipotimia/pré-lipotimia à Autora MS….
41. (20.) De acordo com o relatório de alta de atendimento médico permanente referente a MS…, datado de 19 de agosto de 2017, que se encontra junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, “a paciente não se encontrava em condições de tomar voo às 7:45”.
42. (21.) Os Autores não embarcaram no dia 19 de agosto de 2017 no voo IB 3107 com destino a Madrid.
43. (22.) Os Autores não embarcaram no voo IB 6315 com destino a San José.
44. (23.) Os Autores não realizaram a viagem à Costa Rica reservada para o período entre 19 de agosto de 2017 a 3 de setembro de 2017.
45. (25.) No dia 19 de agosto de 2017, o Autor comunicou à Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. o cancelamento da viagem.
46. (26.) No dia 19 de agosto de 2017, o Autor participou, por telefone, à Ré Mapfre Asistencia – Companhia de Seguros e Reseguros, S.A. (Sucursal em Portugal) o cancelamento da viagem.
47. (27.) O Autor endereçou à Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A., que recebeu, um e-mail datado de 7 de setembro de 2017, que se encontra junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual consta, além do mais, o seguinte:
“(...) Assunto: Pedido de reembolso VOUCHER Nº QUADRA-…-…-… (...)
Venho por este meio solicitar o reembolso de viagem que não se pode concretizar pelo facto da minha filha, MD…, se ter sentido mal no aeroporto tendo tido necessidade de apoio medico e deslocação ao Hospital.
Anexo toda a documentação solicitada. (...)” .
48. (28.) Juntamente com o e-mail referido em (27.), o Autor remeteu à Ré Mapfre Asistencia – Companhia de Seguros e Reseguros, S.A. (Sucursal em Portugal) a documentação solicitada.
49. (29.) A Ré Mapfre Asistencia – Companhia de Seguros e Reseguros, S.A. (Sucursal em Portugal) endereçou ao Autor uma missiva datada de 29 de setembro de 2017, que se encontra junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, da qual consta, além do mais, o seguinte:
“(...) ASSUNTO: PROCESSO Nº … – TRAVEL PROTECT PLATINUM VOUCHER Nº QUADRA-…-…-… (...)
Serve a presente carta para acusar a recepção da documentação remetida por V. Exa. por correio electrónico que permitiu a análise do seu processo de reembolso por despesas de cancelamento de viagem devido a doença da sua filha MD….
Determina a alínea g) do Artigo 11º “EXCLUSÕES ESPECÍFICAS DA COBERTURA DE GASTOS DE CANCELAMENTO” da apólice contratada por V. Exa. o seguinte:
11 – EXCLUSÕES ESPECÍFICAS DA COBERTURA DE GASTOS DE CANCELAMENTO OU DE INTERRUPÇÃO DE VIAGEM
Não se garantem as anulações, cancelamentos ou interrupções que tenham a sua origem em:
f) Viagens contratadas com uma antecedência superior a 3 dias face à data da subscrição do Seguro.
Para efeitos da presente cobertura é considerada “data da contratação da viagem” a data na qual é emitido o primeiro bilhete do meio de transporte a ser utilizado pelo Segurado e/ou a data na qual é efectuada a reserva do quarto de hotel onde o Segurado irá ficar hospedado. Assim sendo, verificamos que a reserva da sua estadia foi processada a 01-06-2017, sendo a apólice apenas contratada a 28-06-2017, não se cumprindo por parte da sua agência de viagens/operador o prazo regulamentar de 3 dias para a emissão da mesma.
Face ao exposto, lamentamos informar que este sinistro, embora medicamente justificado, não se encontra abrangido pela garantia de Gastos de Cancelamento da Viagem, e não pode ser considerado para efeitos de reembolso. (...)”.
50. (49.) A Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. endereçou à Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. uma missiva datada de 25 de agosto de 2017, que se encontra junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, da qual consta, além do mais, o seguinte:
“(...) Assunto: Apólice N.º QUADRA-…-…/ Normas de subscrição de seguros de viagem Exmos. Senhores,
No âmbito da apólice em epígrafe de que V. Exas são titulares, vimos por este meio informar que, a partir da presente data, passarão a vigorar as seguintes normas de subscrição:
1. A subscrição do seguro de viagem deve ser realizada antes do início da viagem, não se considerando válida a cobertura nos restantes casos;
2. Tratando-se de grupos de viajantes, devem incluir-se no seguro todos os elementos de um agregado familiar, não sendo possível garantir exclusivamente os filhos ou apenas um dos cônjuges;
3. Para que as coberturas de gastos de cancelamento e de interrupção de viagem sejam válidas, o seguro deve ser contratado no momento da reserva inicial da viagem ou, no máximo, até 3 dias após a reserva.
4. A data de início e de fim do seguro deve ser coincidente com a data de início e fim da viagem;
5. A prorrogação de seguros, para além do período de viagem inicialmente previsto, deve ser solicitada antecipadamente aos nossos serviços através dos canais de comunicação habituais. (...)”.
51. (45.) A Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda., na qualidade de tomadora do seguro e de segurada, e a [interveniente principal] Açoreana Seguros, S.A., atualmente Seguradoras Unidas, S.A., na qualidade de seguradora, firmaram entre si um acordo denominado “contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil das agências de viagem e turismo”, titulado pela apólice n.º …, mediante o qual a responsabilidade civil decorrente da atividade daquela Ré, na sua qualidade de agência de viagens e turismo, suas sucursais ou representações legais e instituições de economia social, foi transferida para esta seguradora, nos termos das condições gerais e particulares, que se encontram junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, tendo sido convencionada uma franquia geral a cargo da segurada de “10,0000% Percentagem do Valor do Sinistro”, tendo como valor mínimo 250,00 € (duzentos e cinquenta euros) e como valor máximo 1.500,00 € (mil e quinhentos euros).
52. (46.) Nos termos do acordo referido em (45.), o montante de capital seguro máximo garantido por sinistro e por anuidade/vigência ascendia a 150.000,00 € (cento e cinquenta mil euros).
53. (47.) Nos termos do acordo referido em (45.), o local de risco indicado foi: “R 25 ABRIL CC CRUZ PAU LJ 22 2845 137 CRUZ DE PAU”.
54. (48.) No que concerne ao âmbito específico da cobertura do contrato referido em (45.), das condições gerais da apólice consta, além do mais, o seguinte: “o presente Contrato cobre, até ao limite do capital fixado nas Condições Particulares, as indemnizações que possam legalmente recair sobre o Segurado, por responsabilidade civil resultante de danos patrimoniais e/ou não patrimoniais decorrentes de lesões corporais e/ou materiais causados a clientes ou a terceiros, resultantes exclusivamente de ações ou omissões suas, dos seus representantes ou mandatários, no âmbito da sua atividade definida nas Condições Particulares”.
55. (50.) A Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. e a Mapfre Seguros, S.A. [interveniente principal] firmaram entre si um acordo denominado “contrato de seguro de responsabilidade civil”, titulado pela apólice n.º …/…, mediante o qual a responsabilidade civil decorrente da atividade daquela Ré foi transferida para esta seguradora.
Factos não provados
Na sentença recorrida, foram considerados não provados os factos seguintes (sublinhámos os impugnados no presente recurso):
a) o descrito em (12.) tenha ocorrido em 19 de agosto de 2018;
b) nas circunstâncias referidas em (14.) tenha sido avaliada a tensão arterial e glicémia, tendo a tensão arterial registado um valor ligeiramente acima do normal e a glicémia valores normais, segundo indicação dos referidos socorristas;
c) os Autores tenham atuado conforme o descrito em (15.) após a avaliação referida em b);
d) o Autor tenha reservado a viagem referida em (1.) em 23 de maio de 2017;
e) a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. tenha contratado o seguro com cobertura de “gastos de cancelamento” junto da Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A.;
f) a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. tenha como objeto social a “venda de equipamentos audio-visuais; eventos e animação turística”;
g) a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. tenha apresentado aos Autores as condições de seguro, designadamente, no que às coberturas do mesmo concerne;
h) tenham sido prestadas aos Autores todas as informações respeitantes à cobertura do seguro que o pacote de viagem em causa incluía;
i) a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. tenha informado os Autores das vantagens subjacentes à contratação do seguro MULTIASSISTENCIA VIP, por um acréscimo de 20,00 € (vinte euros) por pessoa;
j) em 3 de agosto de 2017, a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. tenha remetido via e-mail à Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. o comprovativo do pagamento referido em (44.), solicitando o envio de toda a documentação atinente à viagem para posterior envio aos autores;
k) a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. tenha enviado a documentação atinente à viagem (bilhetes de avião, número de reserva dos hóteis...) por correio à Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. 48 (quarenta e oito) horas após o envio do e-mail referido em j);
l) durante o mês de agosto, o Autor procedeu ao levantamento da documentação nos escritórios da Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda.;
m) os Autores sejam clientes da Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. há mais de cinco anos, contratando anualmente em média duas viagens sempre dentro dos montantes referidos em (3.) e (5.);
n) a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. tenha prestado todas as informações essenciais e necessárias aos Autores de todo o conteúdo da apólice, nomeadamente das respetivas coberturas;
o) os Autores tenham escrito no livro de reclamações da Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda., tendo sido a primeira reclamação desta em 20 (vinte) anos de serviço;
p) a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. tenha perdido um cliente que representava grande parte da sua receita;
q) a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. seja conhecida pela excelência e profissionalismo nos serviços prestados;
r) a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. tenha comunicado, prestado e fornecido todas as informações e esclarecimentos atinentes às condições gerais e especiais da apólice de seguro referida em (24.), designadamente, as relativas a possíveis cancelamentos;
s) a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda., no âmbito da apólice referida em (24.), tenha comunicado a ocorrência de um processo de reembolso de despesas de cancelamento da viagem do Autor;
t) a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. tenha apresentado toda a documentação que clinicamente demonstrava o impedimento do cliente;
u) a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. tenha informado detalhadamente a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. sobre as condições gerais e especiais da apólice referida em 24);
v) a Ré Mapfre Asistencia – Companhia de Seguros e Reseguros, S.A. (Sucursal em Portugal) tenha prestado à Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. todos os esclarecimentos e informações sobre as condições do contrato de seguro referido em (24.);
x) a apólice de seguro referida em (24.) tenha sido entregue à Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. para que esta a fizesse chegar ao conhecimento dos Autores;
w) assim que recebeu o e-mail referido em (27.), a Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. tenha iniciado de imediato os procedimentos de abertura do processo de reembolso, tendo instruído o mesmo com todas as informações e documentos a ele inerentes;
y) após o descrito em (53.), a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. tenha tido oportunidade de escolher o tipo ou modalidade de seguro que desejava contratar;
z) a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. não tenha necessitado de qualquer autorização da Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. para a contratação do seguro;
aa) a Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. tenha estado sempre disponível para prestar todas as informações solicitadas sobre o seguro referido em (24.).
Na sentença, o Tribunal motivou a decisão sobre a matéria de facto provada e não provada nos seguintes termos:
A convicção do Tribunal fundou-se na apreciação crítica do conjunto da prova produzida em sede de audiência de julgamento, valorada à luz da lei e das regras de experiência, em conformidade com o disposto no artigo 607º, n.º 4 e 5 do Código de Processo Civil, designadamente:
- nas declarações de parte do autor JF…, que, apesar do seu óbvio interesse na causa, contribuiu para o esclarecimentos dos factos em apreço, tendo prestado declarações de forma segura, convicta e pormenorizada, motivo por que tais declarações mereceram credibilidade ao Tribunal, em particular, na parte em que foram inequivocamente confirmadas pelos demais meios de prova; afirmou que a ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda vendeu aos autores uma viagem à Costa Rica, durante os dias 19 de agosto de 2017 a 3 de setembro de 2017, que foi angariado pela ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda; esclareceu que tal viagem foi orçamentada durante o mês de março de 2017 e adjudicada por escrito no final do mês de maio de 2017, tendo os autores contratado um seguro com as melhores condições e um conjunto de coberturas mais abrangentes no valor de € 20,00 (vinte euros) por pessoa, que pagaram; referiu que, no dia 19 de agosto de 2019, apesar de os autores terem comparecido no aeroporto de Lisboa para embarcarem no voo, não o fizeram, em virtude de a autora MD… se ter sentido mal e ter sido assistida no Hospital da Luz; afirmou que no próprio dia contactou a ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. para fazer a participação, que apenas formalizou em setembro de 2017, depois de reunida toda a documentação por esta solicitada; referiu que, apesar de a ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. ter reconhecido o cancelamento das viagens medicamente justificado, a mesma informou que não haveria lugar a qualquer indemnização dos autores, uma vez que o operador turístico não tinha contratado o seguro dentro do prazo a que estava obrigado; esclareceu que os autores contrataram o seguro ao abrigo de um pacote de viagem, na qualidade de segurados, desconhecendo os precisos termos e as condições do seguro contratado; referiu que a ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda entregou aos autores o certificado de seguro de viagem, juntamente com os vouchers das viagens nos finais de julho de 2017;
- nos depoimentos das testemunhas:
- MM…, técnica de turismo e funcionária da ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda há cerca de 19 (dezanove) anos, que prestou um depoimento espontâneo, objetivo e seguro, motivo por que tal depoimento mereceu credibilidade ao Tribunal, em particular, na parte em que foi inequivocamente confirmado pelos demais meios de prova; afirmou que os autores eram clientes frequentes da ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda há cerca de sete ou oito anos; relatou as circunstâncias em que os autores compraram uma viagem à Costa Rica, na qual estava incluído um “seguro vip” solicitado pelos autores aquando da reserva da viagem, o qual teve um custo suplementar de € 20,00 (vinte euros) por pessoa; esclareceu que tal seguro tinha cobertura de gastos de cancelamento e o capital de seguro de € 3 000,00 (três mil euros) por pessoa; afirmou que os vouchers das viagens foram emitidos no dia 1 de junho de 2017 e que entregou toda a documentação aos autores cerca de oito ou dez dias antes da viagem, designadamente, o certificado de seguro de viagem de fls. 42; negou, no entanto, ter recebido as condições gerais da apólice de seguro de assistência em viagem constantes de fls. 107 verso e seguintes; quando confrontada com o documento de fls. 45, afirmou tratar-se da mensagem enviada pelo autor e recebida pela depoente; esclareceu que os autores solicitaram um circuito na Costa Rica para três pessoas à ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda, tendo esta contratado os serviços da ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda e vendido aos autores um pacote de viagens, onde estava incluído o seguro, cuja subscrição incumbia a esta ré; quando confrontada com os e-mails de fls. 86 e seguintes, confirmou o seu teor, tendo afirmado que a data da contratação da viagem foi em 26 de maio de 2017 e a data da confirmação da reserva junto da ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda foi em 1 de junho de 2017, altura em que foram emitidos os vouchers de hotel, tendo os bilhetes de avião sido emitidos em 4 de agosto de 2017;
- SC…, amiga dos autores, que prestou um depoimento claro, objetivo e conciso, tendo afirmado ter conhecimento que os autores não embarcaram na viagem para a Costa Rica em agosto de 2017, porque a autora MD… se sentiu mal, desmaiou e teve de fazer exames médicos;
- SG…, técnica de turismo e funcionária da ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda desde 2012, que prestou um depoimento claro e objetivo, motivo por que tal depoimento mereceu credibilidade ao Tribunal na parte em que foi inequivocamente confirmado pelos demais meios de prova; afirmou que a ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda enviou um e-mail à ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda a solicitar um orçamento para organização de uma viagem com início em 19 de agosto de 2017 e, nessa sequência, esta ré orçamentou e organizou a viagem dos autores, na qual estava incluído um seguro de viagem vip, cujos detalhes não soube especificar, tendo afirmado desconhecer o teor da apólice de seguro; esclareceu que o seguro foi subscrito pela ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda, através de uma plataforma da ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A., a que aquela tem acesso, na qualidade de tomadora de seguro, e onde se tem de introduzir o nome dos clientes/segurados, o destino e as datas de partida e de chegada da viagem, mas não as datas de emissão dos bilhetes de avião; referiu que nunca teve conhecimento da existência de qualquer condição contratual a definir o prazo de três dias a partir da data da reserva da viagem para a subscrição do seguro, sendo que tal regra não constava da apólice de seguro e só posteriormente foi enviada por escrito à ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda tal informação; afirmou que a confirmação da reserva da viagem ocorreu em 1 de junho de 2017 e em 4 de agosto de 2017 foram emitidos os bilhetes de avião, tendo toda a documentação ficado finalizada nesta data; esclareceu que a ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda enviou à ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda o certificado de seguro de viagem de fls. 42 e não as condições gerais constantes de fls. 107 verso e seguintes;
- AM…, técnica de turismo e funcionária da ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda desde 2014, que revelou não ter conhecimento direto acerca dos factos em apreço, tendo apenas afirmado que somente no final de agosto de 2017 foram alertados para o facto de terem três dias a contar do pedido de reserva para subscrever o seguro, nunca tendo sido antes suscitada tal questão;
- JB…, funcionário da ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda há cerca de sete anos, desempenhando funções na área comercial da empresa, que prestou um depoimento algo emotivo e comprometido com a tese por esta defendida nos autos, motivo por que tal depoimento apenas foi valorado pelo Tribunal na parte em que foi inequivocamente confirmado pelos demais meios de prova; revelou ter tido conhecimento que os autores não puderam embarcar por motivo de saúde e acionaram o seguro, tendo a ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. informado que não iria assumir a responsabilidade; quando confrontado com o documento de fls. 67 verso, afirmou tratar-se de uma carta endereçada pela ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. à ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda datada de 29 de agosto de 2017, data a partir da qual, assegurou, esta ré teve conhecimento do teor da cláusula 10.ª das condições gerais constantes de fls. 107 verso;
- DC…, funcionário da ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. desde 2009, que prestou um depoimento algo emotivo e bastante comprometido com a tese por esta defendida nos autos, motivo por que tal depoimento apenas foi valorado pelo Tribunal na parte em que foi inequivocamente confirmado pelos demais meios de prova; revelou ter conhecimento do teor da apólice de seguro “Travel Protect”, cujas condições gerais constam de fls. 107 verso e seguintes, a qual afirmou ter sido subscrita pela ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda, na qualidade de tomadora de seguro, e em que os autores figuram como segurados; referiu que, apesar de ter sido acionada a cobertura de gastos de cancelamento, se verifica uma cláusula de exclusão de tal cobertura, por estar em causa uma viagem contratada com uma antecedência superior a três dias face à data da subscrição do seguro; afirmou que a ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda, na qualidade de tomadora de seguro, tinha conhecimento das condições gerais da apólice; reconheceu o teor da missiva de fls. 67 verso, subscrita pelo diretor comercial da ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A., tendo referido que se tratou de um lapso a expressão “a partir desta data”;
- TN…, funcionário da ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. desde abril de 2015, onde desempenha as funções de gestor de reclamações, que revelou ter conhecimento da existência e das condições do contrato de seguro “Travel Protect” contratado pela ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda, na qualidade de tomadora de seguro; referiu que tal seguro abrangia a cobertura de gastos de cancelamento, mas apenas se fosse contratado no mesmo dia ou até três dias depois da contratação da viagem, visando tal regra proteger o cliente; afirmou que o processo de episódio médico ocorrido em trânsito para a viagem ao estrangeiro foi apresentado ao departamento de reembolso da ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A., que declinou a responsabilidade, por não ter sido observado o prazo de três dias na contratação do seguro; quando confrontado com os documentos de fls. 63 verso e 107 verso e seguintes, confirmou o seu teor, tendo esclarecido que a carta de fls. 63 verso foi um reforço do que já existia nas condições gerais da apólice; contribuiu para o esclarecimento do procedimento seguido na contratação de seguro através da plataforma informática da ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A., tendo referido que se exige apenas a indicação do nome das pessoas que vão viajar e respetivas datas de nascimento e das datas de início e fim da viagem; admitiu que a ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. aceita a contratação do seguro mesmo que o risco não esteja coberto;
- nos documentos constantes dos autos, maxime, e-mails de fls. 19 a 28; documentos comprovativos de transferências bancárias de fls. 29, 30 e 31; documento de fls. 32; bilhete eletrónico de fls. 33 a 35; declaração de presença de fls. 36; relatório de alta de atendimento médico permanente de fls. 37 e 38; e-mails de fls. 39 a 41; certificado de seguro de viagem de fls. 42 e respetivo clausulado de fls. 43; listagem de segurados de fls. 44; documento de fls. 45; e-mail de fls. 49 e 50; missiva de fls. 51; missiva de fls. 67 verso; condições particulares de seguro de fls. 68 e 69 frente; e-mails de fls. 84 verso a 87 e 88 verso a 91; confirmação de reserva de fls. 88 frente; documentos comprovativos de transferências bancárias de fls. 92; fatura/recibo de seguro de fls. 93 frente; publicação de fls. 93 verso; apólice de seguro de assistência em viagem/condições gerais de fls. 107 verso a 130 frente; documento de fls. 130 verso; condições particulares e gerais de apólice de fls. 161 a 164 frente e documentação de fls. 194 a 202.
*
A convicção do Tribunal relativamente à factualidade provada referida em 1), 2), 3) e 4) assentou no teor do e-mail de fls. 19 a 21, conjugado com as declarações de parte do autor e com o depoimento da testemunha MM….
Para demonstração da factualidade provada referida em 5), 6) e 7), foi determinante o teor do e-mail de fls. 22, conjugado com as declarações de parte do autor e com o depoimento da testemunha MM….
Os factos provados referidos em 8) foram confirmados pelo teor do e-mail de fls. 25 a 28, conjugado com os depoimentos das testemunhas MM… e SG….
A factualidade provada referida em 9) foi atestada pelo teor dos documentos comprovativos de transferências bancárias de fls. 29, 30 e 31, em conjugação com as declarações de parte do autor e com o depoimento da testemunha MM….
A factualidade provada referida em 10) e 11) foi considerada admitida por acordo e/ou confissão, nos termos do artigo 574º, n.º 2 do Código de Processo Civil, e confirmada pelo teor de fls. 32 a 35.
Para demonstração da factualidade provada referida em 12), 13), 14), 15), 16) e 17), foram determinantes as declarações de parte do autor, conjugadas com a declaração de presença de fls. 36 e o relatório de alta de atendimento médico permanente de fls. 37 e 38, com o depoimento da testemunha SC… e com as regras da experiência comum.
A declaração de presença de fls. 36, conjugada com as declarações de parte do autor, foi determinante para demonstração da factualidade provada referida em 18).
O relatório de alta de atendimento médico permanente de fls. 37 e 38 foi determinante para a demonstração da factualidade provada referida em 19) e 20).
A convicção do Tribunal relativamente à factualidade provada referida em 21), 22) e 23) assentou no teor dos documentos de fls. 39 a 41, em conjugação com as declarações de parte do autor, com o depoimento da testemunha SC… e com as regras da experiência comum.
Os factos provados referidos em 24) foram atestados pelo certificado de seguro de viagem de fls. 42 a 44, as condições gerais da apólice de seguro de assistência em viagem de fls. 107 verso a 130 frente e o documento de fls. 130 verso, em conjugação com os depoimentos das testemunhas SG…, DC… e TN….
Para demonstração dos factos provados referidos em 25), foram determinantes as declarações de parte do autor, conjugadas com o depoimento da testemunha MM… e o documento de fls. 45.
A factualidade provada referida em 26) assim resultou das declarações de parte do autor, conjugadas com o depoimento da testemunha MM…, com o teor do e-mail de fls. 49 e 50 e com as regras da experiência comum.
O e-mail de fls. 49 e 50, conjugado com as declarações de parte do autor, foi determinante para demonstração da factualidade provada referida em 27) e 28).
A missiva de fls. 51, conjugada com as declarações de parte do autor, foi determinante para demonstração da factualidade provada referida em 29).
Relativamente aos factos provados referidos em 30), foram determinantes as declarações de parte do autor, conjugadas com os depoimentos das testemunhas MM… e SG….
A convicção do Tribunal relativamente à factualidade provada referida em 31), 32), 33) e 34) baseou-se nas declarações de parte do autor, conjugadas com os depoimentos das testemunhas MM… e SG….
As declarações de parte do autor, conjugadas com o depoimento da testemunha MM…, foram determinantes para demonstração da factualidade provada referida em 35).
O e-mail de fls. 88 verso foi determinante para demonstração da factualidade provada referida em 36).
O e-mail de fls. 84 verso e 85 foi determinante para demonstração da factualidade provada referida em 37).
O e-mail de fls. 89 foi determinante para demonstração da factualidade provada referida em 38).
O e-mail de fls. 90 e 91 foi determinante para demonstração da factualidade provada referida em 39).
O e-mail de fls. 86 frente foi determinante para demonstração da factualidade provada referida em 40).
O e-mail de fls. 87 verso e 88 frente foi determinante para demonstração da factualidade provada referida em 41) e 42).
Os factos provados referidos em 43) e 44) foram atestados pelo teor dos documentos comprovativos de transferências bancárias de fls. 92, em conjugação com os depoimentos das testemunhas MM… e SG….
A factualidade provada referida em 45), 46), 47) e 48) assim resultou das condições gerais e particulares da apólice de seguro de fls. 161 a 164, conjugadas com o teor da fatura/recibo de fls. 93 frente.
Os factos provados referidos em 49) foram atestados pelo teor da missiva de fls. 67 verso, em conjugação com os depoimentos das testemunhas SG…, JB…, DC… e TN….
Para demonstração dos factos provados referidos em 50), assumiu particular relevância as condições particulares da apólice de seguro de fls. 68 e 69.
O teor da apólice de seguro de assistência em viagem/condições gerais de fls. 107 verso a 130 frente foi determinante para demonstração da factualidade provada referida em 51).
A convicção do Tribunal relativamente à factualidade provada referida em 52), 53), 54) e 55) assentou na análise do teor do documento de fls. 130 verso, em conjugação com os depoimentos das testemunhas SG… e TN….
*
Os factos não provados assim resultaram de nenhuma prova ter sido efetuada quanto aos mesmos ou de estarem em contradição com os factos dados por provados ou de encerrarem, em si, expressões que comportam matéria conclusiva, juízos de valor ou conceitos de direito.
De salientar que, subsistindo dúvidas sobre a realidade de determinados factos, o Tribunal fez apelo ao princípio consagrado no artigo 414º do Código de Processo Civil, conjugado com princípio geral do ónus da prova previsto no artigo 342º, n.º 1 e 2 do Código Civil, resolvendo a questão contra a parte a quem o facto aproveita.
Assim sendo, os factos não provados referidos na alínea a) assim resultaram por estarem em contradição com os factos provados referidos em 12).
Os factos não provados referidos nas alíneas b), c), e), f), i), j), k), l), m), o), p), q), s), t), u), v), x), w), y), z) e aa) assim resultaram da ausência de prova inequívoca efetuada quanto aos mesmos.
A factualidade não provada referida na alínea d) assim resultou da ausência de prova efetuada quanto à mesma e da circunstância de se encontrar em contradição com a factualidade provada referida em 6).
A factualidade não provada referida na alínea g), h), n) e r) assim resultou da ausência de prova efetuada quanto à mesma e da circunstância de se encontrar em contradição com a factualidade provada referida em 31).
1.ª questão – Da impugnação da decisão da matéria de facto
Conforme previsto no art. 662.º, n.º 1, do CPC, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Dispõe o artigo 640.º do CPC, sobre o ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, que:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”
Por outro lado, tendo o recurso por objeto a reapreciação da prova gravada, torna-se necessária, também sob pena de rejeição do recurso na respetiva parte, a observância do mais previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 640.º, ou seja, a indicação exata, no corpo da alegação de recurso, das passagens da gravação em que se funda o recurso ou a transcrição dos excertos tidos por relevantes.
Parece-nos que “aligeirar” de alguma forma esta imposição legal constituiria uma inadmissível interpretação corretiva ou ab-rogante, sem correspondência com o texto da lei e o espírito da norma, não justificada por qualquer contradição insanável com outro preceito legal.
Neste sentido, a título exemplificativo, veja-se:
- o acórdão da Relação de Coimbra de 24-02-2015, proferido no processo n.º 145/12.4TBPBL.C1, disponível em www.dgsi.pt:
«(…) ao Recorrente, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados - v.g., declarações das parte e dos peritos, e depoimentos das testemunhas -, caberá, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (nº 2, a), do artº 640º do NCPC, que corresponde ao n.º 2 do art.º 685-B do CPC).
Por outro lado, (…) importa, também, que o Recorrente, ofereça alegação que se mostre hábil a uma cabal impugnação da matéria de facto.
Isto porque a alegação em causa tem de se alicerçar em erro que se aponte à convicção do Tribunal que determinou o sentido das respostas que este deu quanto à matéria de facto, sendo que uma tal alegação não se basta com a mera discordância do Apelante quanto ao facto de não terem sido atendidas as declarações das testemunhas de cujos depoimentos se serve para, no recurso, impugnar a decisão proferida pelo Tribunal “a quo” quanto à matéria de facto.
O erro que é mister o recorrente evidenciar ao proceder, em recurso, à impugnação da decisão da matéria de facto - saliente-se que estamos ainda no plano da alegação e não em sede de apreciação do mérito ou demérito do teor dos depoimentos para provocarem a alteração factual pretendida - é, note-se, o que enferma o processo valorativo do Tribunal “a quo” relativamente à prova produzida, não residindo, pois, na mera consequência dessa putativa deficiente valoração, que se traduz na circunstância de a(s) resposta(s) dada(s), ser(em) contrária(s) ou diversa(s), daquela(s) que o Recorrente defende merecer a base instrutória.
Torna-se, pois, necessário, que o recorrente alegue um erro de valoração da prova escorado em fundamento que o evidencie, para que o Tribunal de recurso verifique o acerto dessa alegação e, consequentemente, pondere a procedência da alteração que, no âmbito da matéria de facto, é peticionada.»
- o acórdão da Relação de Coimbra de 12-12-2017, no processo n.º 320/15.0T8MGR.C1, disponível em www.dgsi.pt:
“I - O artigo 640º do CPC impõe ao recorrente que pretenda impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto dois ónus, definindo uma hierarquia entre eles, enunciando-se no nº 1 aqueles que vêm sendo considerados/classificados de ónus principais e no nº 2 estão aqueles considerados/classificados por ónus secundários, pois que daqueles estão subordinados ou dependentes.
II - Considera-se cumprido o 2º ónus previsto no nº 2 do citado normativo, isto é, satisfeita a exigência nele prevista, desde que, no caso de audiência ter sido gravada, o recorrente identifique/indique a testemunha, a data do seu depoimento, o início e o termo da gravação do seu depoimento, da transcrição, nas alegações que antecedem as suas conclusões, das passagens mais relevantes desse depoimento, dos pontos de facto que considera incorretamente julgados, dos meios probatórios que impunham decisão diversa e bem como o sentido da decisão que, no seu entender, deveria ter sido proferida quanto ao factos impugnados.”
Com efeito, servindo o recurso para sindicar os erros de julgamento na decisão sobre a matéria de facto invocados pelo recorrente, é indispensável que este, quando fundar o recurso nos concretos meios probatórios constantes de gravação, proceda à indicação das passagens da gravação em que se baseia ou à transcrição dos excertos que considere relevantes, em ordem a habilitar o tribunal de 2.ª instância a apreciar se os mesmos impunham (ou não) decisão diversa. Este ónus que de forma tão clara está previsto no citado preceito legal será facilmente cumprido pelo recorrente, assim habilitando o Tribunal de recurso a sindicar os eventuais erros de julgamento.
Sempre sem perder de vista que, na decisão da matéria de facto, o Tribunal apenas pode considerar os factos essenciais que integram a causa de pedir (ou as exceções), bem como os factos instrumentais, complementares ou concretizadores que resultem da instrução da causa, e os factos de que tem conhecimento por via do exercício das suas funções (art. 5.º do CPC), estando-lhe vedado, por força do princípio da limitação dos atos consagrado no art. 130.º do CPC, conhecer de matéria que, ponderadas as várias soluções plausíveis da questão de direito, se mostra irrelevante para a decisão de mérito. São manifestações do princípio dispositivo e do princípio da economia processual que se impõem ao juiz da 1.ª instância aquando da seleção da matéria de facto provada / não provada na sentença, mas também na 2.ª instância, no tocante à apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Assim, conforme referido no acórdão da Relação de Lisboa de 27-11-2018, proferido no processo n.º 1660/14.0T8OER-E.L1, a jurisprudência dos Tribunais superiores vem reconhecendo que “a reapreciação da matéria de facto não constitui um fim em si mesma, mas um meio para atingir um determinado objetivo, que é a alteração da decisão da causa, pelo que sempre que se conclua que a reapreciação pretendida é inútil – seja porque a decisão sobre matéria de facto proferida pela primeira instância já permite sustentar a interpretação do direito aplicável ao caso nos termos sustentados pelo recorrente, seja porque ainda que proceda a impugnação da matéria de facto, nos termos requeridos, a decisão da causa não deixará de ser a mesma – a reapreciação sobre matéria de facto não deve ter lugar, por constituir um ato absolutamente inútil, contrariando os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2.º, n.º 1, 137.º, e 138.º do CPC).” Neste sentido, além dos acórdãos aí citados - acórdãos da Relação de Guimarães de 10-09-2015, no processo 639/13.4TTBRG.G1, e 11-07-2017, no processo n.º 5527/16.0T8GMR.G1; da Relação do Porto de 01-06-2017, no processo n.º 35/16.1T8AMT-A.P1; e do STJ de 13-07-2017, no processo n.º 442/15.7T8PVZ.P1.S1 -, veja-se ainda o acórdão do STJ de 17-05-2017, no processo n.º 4111/13.4TBBRG.G1.S1 (todos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt, embora aí com omissão de algumas passagens).
Alínea v) dos factos não provados
O Tribunal recorrido considerou não provado que: v) a Ré Mapfre Asistencia – Companhia de Seguros e Reseguros, S.A. (Sucursal em Portugal) tenha prestado à Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. todos os esclarecimentos e informações sobre as condições do contrato de seguro referido em (24.).
No entender da Apelante, o facto vertido em v) deve ser considerado provado, concluindo a este respeito:
“43. Ora, salvo o devido respeito, este facto deveria ter sido dado como provado porquanto fez-se prova de que a aqui recorrente prestou todos os esclarecimentos que lhe foram pedidos pelo tomador do seguro (Quadrante Mistério), não só por lhe ter sido enviado o documento com as Condições Gerais da Apólice como pela disponibilidade para terem sido esclarecidas as questões que foram colocadas.
44. A este propósito requer-se a reapreciação do depoimento da testemunha DC…, que depôs na sessão de julgamento que teve lugar no dia 30 de abril de 2019, sobre este ponto em concreto tendo afirmado o que se transcreveu na pp. 12 e ss. das presentes alegações que aqui se dá por integralmente reproduzido (DC… – Testemunha, nome do ficheiro áudio 20190430144506_19478452_2871108.wma, 30.04.2019, 00:38:41);
45. Esta testemunha explicou ainda, de forma clara, a razão pela qual a recorrente não tinha assumido o pagamento das despesas que decorreram do sinistro, tendo-o feito de acordo com o depoimento que se transcreveu nas pp. 15 e 16 das presentes alegações (ibidem).
46. Do depoimento desta testemunha resulta que a R. Quadrante Mistério conhecia e não podia ignorar o conteúdo da Apólice de seguro que livremente contratou e que os colaboradores da aqui recorrente sempre prestaram todas as informações e esclarecimentos que lhes foram solicitados pelos colaboradores do tomador do seguro.
47. A mesma testemunha atesta que as Condições Gerais do Seguro foram enviadas à Quadrante Mistério, tomador do seguro, o que aliás é lógico e constitui uma obrigação do segurador.
48. Por outro lado, o tomador do seguro (Quadrante Mistério) nunca se queixou de não ter recebido ou tido acesso às referidas Condições Gerais, mas unicamente de não conhecer a referida regra dos 3 dias que nas mesmas se continha.
49. A propósito da referida regra dos 3 dias que o tomador pretendia não conhecer, foi feita prova quer testemunhal quer documental de que a Quadrante Mistério não podia desconhecer a referida regra.
50. Com efeito, a mesma testemunha DP… não só afirmou ao Tribunal que a referida regra sempre esteve nas Condições Gerais como deu a conhecer um documento que trazia com ele que atestava o conhecimento dessa regra por parte da referida Quadrante Mistério, tal como resulta do respetivo depoimento transcrito na p. 17 das presentes alegações, que aqui se dá por integralmente reproduzido (DC… – Testemunha, nome do ficheiro áudio 20190430144506_19478452_2871108.wma, 30.04.2019, 00:42:44);
51. Na sequência desta parte do depoimento desta testemunha, a aqui recorrente requereu que o referido documento fosse junto aos autos por ter manifesto interesse para a descoberta da verdade material, ao abrigo do que dispõe o artigo 423.º, n.º 3 do CPC, tendo este requerimento sido deferido pela Merit.ª Juíza.
52. O referido documento encontra-se junto aos autos (cf. doc. de fls. 130) e consiste num email com data de 23 de outubro de 2014, onde é feita referência expressa à regra dos 3 dias por uma funcionária ou colaboradora da Quadrante Mistério.
53. Tendo sido confrontada com o referido documento, a testemunha DP… o que consta da transcrição do seu depoimento nas pp. 18 e 19 das presentes alegações, que aqui se dá por integralmente reproduzido (DC… Testemunha, nome do ficheiro áudio 20190430144506_19478452_2871108.wma, 30.04.2019, 01:24:31);
54. Curiosamente, não é feita qualquer referência a este documento nem ao depoimento desta testemunha a propósito deste facto na douta sentença, o que pode significar que passou desapercebido.
55. Deste modo, e partir do depoimento desta testemunha, que se transcreveu, não só se fez prova que as Condições Gerais do seguro foram enviadas e dadas a conhecer ao tomador como ainda que este tinha conhecimento há anos da regra dos 3 dias.”
Os Autores e a Ré Multidestinos defendem o acerto da decisão recorrida neste particular, salientando aqueles que o depoimento prestado, no dia 30-04-2019, pela testemunha DC… não permite dar como provada a matéria constante da alínea v), mais lembrando o conteúdo da missiva datada de 25 de agosto de 2017.
Vejamos.
Em primeiro lugar, importa ter presente que o facto em questão podia ter sido melhor concretizado, não só porque o que aqui interessa são as condições gerais atinentes aos gastos de cancelamento de viagem, mas também e sobretudo porque a Ré Quadrante, Unipessoal, Lda. é uma sociedade comercial, não sendo claro a quem terão sido prestados os esclarecimentos e as informações? Ao gerente desta sociedade? Note-se que só na audiência final foi requerido pela 3.ª Ré, ora Apelante, o depoimento de parte da gerente da 2.ª Ré, o que foi indeferido, por manifesta extemporaneidade.
A testemunha DP…, funcionário da Apelante desde 2009, na qualidade de comercial, responsável pela angariação de clientes (as agências de viagens), não deu conta de nenhum contacto com este gerente ou mesmo com os funcionários da Quadrante que tiveram intervenção no caso concreto no sentido da prestação de esclarecimentos e informações, resultando do seu depoimento que as condições gerais já estavam a ser usadas antes mesmo de ter começado a trabalhar por conta da Apelante. No seu depoimento limitou-se praticamente a sublinhar o óbvio, dizendo que constava da apólice essa exclusão e referindo que, nos seus contactos com os clientes (sem precisar nenhum contacto com as pessoas acima referidas), informa sempre dessa “regra dos 3 dias”; mas se foi ou não, no caso concreto, informado verbalmente fosse a quem fosse, nada sabia. Confrontado com a missiva de 25 de agosto de 2017, em que a Apelante, na pessoa do seu Diretor Comercial, informa sobre as normas de subscrição de seguros que “passarão a vigorar”, incluindo no ponto 3. os gastos de cancelamento de viagem, foi pouco convincente, até por não ser o responsável pela elaboração dessa carta, aludindo a uma necessidade de esclarecimentos e dizendo que se tratava de lapso o ponto 3. ter sido incluído nesses moldes.
O seu depoimento tem a particularidade de aludir a uma troca de mensagens de correio eletrónico (em 2014) entre uma funcionária da Quadrante (OS…), que não teve intervenção nos factos em apreço nos autos, e um outro funcionário da Apelante (NA…), em que a primeira pretendia saber se podia fazer um seguro com a cobertura em apreço apesar de já terem decorrido mais de 3 dias desde o momento da reserva, o que, na sua ótica (da testemunha), revelava o conhecimento pela Quadrante dessa exclusão. Mas, na verdade, disse também a testemunha que tendo o referido NA… indagado junto de si como deveriam proceder, acedeu a que o seguro fosse celebrado.
Embora na sentença recorrida não seja feita referência a estes emails, não nos parece que isso se deva a esquecimento (como diz a Apelante), até porque constam de documento que mereceu pronúncia expressa da Sr.ª Juíza na audiência final, mostrando-se bem atenta a esse respeito quando a testemunha exibiu a documentação que os continha. Esse documento não tem, pura e simplesmente, a relevância probatória que a Apelante defende, pelas razões que já referimos.
Além disso, a testemunha TN…, funcionário da Apelante, cujo depoimento também ouvimos na íntegra (apesar de a Apelante se referir ao depoimento desta testemunha, sem indicar as passagens da gravação do mesmo, nem transcrever os excertos que considera relevantes), referiu que, na prática, havia a possibilidade de ser feito o seguro Premium depois dos 3 dias apesar do que constava das condições gerais, o que justificou como um “gesto comercial”.
Por outro lado, mesmo que as condições gerais dos contratos de seguro que a Quadrante celebrava via plataforma eletrónica (como ambas as duas referidas testemunhas deram conta) estivessem em poder da Quadrante (o que nem sequer resulta dos factos provados), a verdade é que não se provou que tenham sido prestadas, designadamente ao gerente desta Ré ou aos funcionários que tiveram intervenção na contratação do seguro em apreço nos autos, informações ou esclarecimentos a respeito dessas condições gerais.
Pelo contrário, o único esclarecimento que está provado a respeito das condições que importam nos presentes autos (e tudo o resto é irrelevante para o caso) é o que foi feito pela missiva de 25 de agosto de 2017, facto que foi considerado provado.
Mantem-se, assim, inalterada a decisão da matéria de facto, neste particular.
Alínea x) dos factos não provados
Na sentença recorrida, foi considerado não provado que: x) a apólice de seguro referida em (24.) tenha sido entregue à Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. para que esta a fizesse chegar ao conhecimento dos Autores.
Defende a Apelante, nas suas conclusões, algo desordenadas, que este facto deve ser considerado provado, porquanto:
“56. Por força da reapreciação da prova gravada das declarações da testemunha DP… requer-se que passem a considerar-se provados os factos constantes das als. v) e x), indicados pela douta sentença recorrida, atenta a produção da prova transcrita e cuja reapreciação expressamente se solicita.
(…) 58. Refere-se ainda no facto não provado da al. x) que não se provou que a entrega da apólice fosse com a finalidade de que a Quadrante Mistério a entregasse aos autores, ou seja, aos segurados.
59. Ora, já se viu que, nos termos da lei, a aqui recorrente não tinha obrigação de fazer chegar aos segurados as condições da apólice por se tratar de um seguro de grupo.
60. Quem tinha essa obrigação era justamente o tomador do seguro Quadrante Mistério, tal como resulta do disposto no artigo 78.º n.º 5, da LCS.
61. Requer-se assim que seja considerado provado que a aqui recorrente entregou a Apólice com as Condições Gerais do seguro ao tomador Quadrante Mistério e que este tinha a obrigação de fornecer uma cópia aos segurados.”
Os Autores contrariam isto, dizendo que “não se logrou provar a matéria constante da alínea x), devendo realçar-se, no que respeita aos Autores, que a apólice de seguro nunca lhes foi dada a conhecer.”
Ora, o facto em apreço não se pode considerar provado uma vez que a respeito do mesmo não foi produzida qualquer prova, sendo certo que o depoimento da referida testemunha DP… não lança luz sobre tal matéria, já que, como resultou do seu depoimento, não acompanhou a contratação do seguro em causa, limitando-se a explicar que a contratação dos seguros de viagem é feita através de plataforma eletrónica, conforme, aliás, já consta dos factos provados (pontos 52. a 54. da sentença).
Quanto ao que resulta da lei a respeito dos deveres das partes, é matéria de direito que obviamente deverá ser considerada na sede própria, mas que não justifica, de modo algum, dar como provado o aludido facto.
Mantem-se inalterada a decisão da matéria de facto nesta parte.
Alínea w) dos factos não provados
Na sentença recorrida foi considerado não provado que: w) assim que recebeu o e-mail referido em (27.), a Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. tenha iniciado de imediato os procedimentos de abertura do processo de reembolso, tendo instruído o mesmo com todas as informações e documentos a ele inerentes.
A este respeito a Apelante, tanto no corpo da sua alegação de recurso como nas suas conclusões, limita-se a defender que:
“62. O facto considerado não provado na al w) esbarra também nos depoimentos das duas referidas testemunhas, que confirmaram terem iniciado os procedimentos de imediato assim que receberam a participação do sinistro que afetou um dos aqui recorridos.”
Os Autores salientam que, quanto ao facto não provado sob a alínea w), a Recorrente não indica quais os concretos elementos probatórios que justificam que o mesmo seja dado como provado.
Com efeito, não indicou a Apelante, a este propósito, quais as testemunhas a que se refere, nem quais as passagens da gravação dos respetivos depoimentos ou os trechos transcritos dos mesmos em que fundamenta a sua pretensão. Aliás, só por lapso se explica que, a encerrar no corpo da alegação de recurso a questão da impugnação da decisão sobre a matéria de facto provada, a Apelante, ao fazer uma espécie de análise crítica à formação da convicção do Tribunal, mencione, ao referir-se à testemunha TM…, “as transcrições que se fizeram do seu depoimento”.
Ademais, o facto em questão mostra-se substantivamente irrelevante.
Assim, rejeita-se, neste particular, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Alínea y) dos factos não provados
Na sentença recorrida foi considerado não provado que: y) após o descrito em (53.), a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. tenha tido oportunidade de escolher o tipo ou modalidade de seguro que desejava contratar.
A este respeito, sustenta a Apelante, nas suas conclusões, que:
“65. Com efeito, de acordo com o facto provado 53 ficou assente que a Quadrante Mistério contratou o seguro através da plataforma informática, mas esta dava a possibilidade de escolher o seguro pretendido.
66. Prova-o o teor do depoimento da testemunha DP…, que se transcreveu nas pp 20 a 22 das presentes alegações e se dá aqui por integralmente reproduzido (DC… – Testemunha, nome do ficheiro áudio 20190430144506_19478452_2871108.wma, 30.04.2019, 00:34:38);
67. Daqui se retira que havia várias possibilidades e hipóteses que se ofereciam à entidade que desejava contratar o seguro em causa (a Quadrante Mistério), pelo que se requer que, em função da reapreciação do referido depoimento da testemunha DP…, o facto que se encontra na al. y) passe a ser considerado provado.”
Os Autores, por sua vez, afirmam não se vislumbrar do excerto do depoimento da testemunha DC… qualquer declaração que permita dar por provada esta matéria, limitando-se a testemunha a afirmar que o seguro tem diversas coberturas e que apenas a cobertura dos gastos de cancelamento se encontrava excluída em virtude da regra dos 3 (três) dias.
Do referido depoimento não resulta expressamente esse facto, mas infere-se. Na verdade, a testemunha limitou-se a referir, a dado passo do seu depoimento, que havia “vários tipos de seguros” e, noutra altura, que a contratação era feita através de plataforma eletrónica.
Ora, assim sendo, e tendo também em consideração que está provado que o Autor procedeu ao pagamento de um custo adicional de 20 € por pessoa para contratação de um “SEGURO MULTIASSISTENCIA VIP” com cobertura dos riscos da viagem, nomeadamente os gastos de cancelamento, é forçoso concluir que, após o descrito em (53.), a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. teve oportunidade de seleccionar, de entre os tipos ou modalidades de seguro de viagem aí constantes, aquele seguro específico, com cobertura, além do mais, dos riscos atinentes ao cancelamento da viagem.
Assim, nesta parte, atende-se a impugnação da decisão da matéria de facto provada, pelo que será aditado ao elenco dos factos provados, como ponto 53.-A, que:
Após o descrito em (53.), a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. teve oportunidade de selecionar, de entre os tipos de seguro de viagem aí constantes, um “SEGURO MULTIASSISTENCIA VIP” que incluía a cobertura dos riscos do cancelamento da viagem.
Alínea aa) dos factos não provados
Na sentença recorrida foi considerado não provado que: aa) a Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. tenha estado sempre disponível para prestar todas as informações solicitadas sobre o seguro referido em (24.).
A este respeito, a Apelante limita-se a concluir que:
“68. Finalmente, o facto considerado não provado consignado na al. aa) (a aqui recorrente ter estado sempre disponível para prestar todas as informações solicitadas sobre o contrato de seguro em causa) deve igualmente ser considerado provado em função do depoimento da referida testemunha DP… (ibidem).”
Por seu turno, os Autores defendem não resultar “demostrado pela prova produzida em julgamento, não se extraindo dos depoimentos transcritos nas alegações de recurso.”
Ora, este facto é substantivamente irrelevante e também não resulta provado pelo depoimento da testemunha DP…, considerando que não acompanhou a contratação do seguro em apreço.
Improcede, assim, neste particular, a pretensão da Apelante.
Facto não incluído na decisão sobre os factos provados e não provados
Finalmente, defende a Apelante que, “por força da reapreciação da das declarações indicadas da mesma testemunha, seja acrescentado aos referidos factos que a R. Quadrante Mistério tinha conhecimento da regra dos 3 dias constante dos artigos 10.º, 1.1 e 11.º, al. G), das Condições Gerais”.
Os Autores, pelo contrário, sustentam inexistir prova suficiente que permita aditar à matéria de facto que a Quadrante Mistério tinha conhecimento da “regra dos 3 dias” constante dos artigos 10.º/1.1 e 11.º/al. G), das Condições Gerais.
Também a Ré Multi Destinos defende que da prova produzida em julgamento não resultou que a Ré Quadrante tivesse conhecimento da referida “regra dos 3 dias”.
O facto em questão não consta do elenco dos factos provados, nem do elenco dos factos não provados, sendo certo que não foi alegado pelas partes, designadamente pela Apelante, nos seus articulados. Na perspetiva desta, se bem percebemos a sua posição, este facto não pode deixar de ser inferir da circunstância de a Quadrante ter acesso às condições gerais dos seguros que contratava com a Apelante.
Ora, remetemos para as considerações que acima fizemos, a propósito do facto vertido em v), salientando, em particular, a missiva de 25 de agosto de 2017: somente a partir da receção dessa carta é seguro afirmar que a Ré Quadrante tinha conhecimento da “regra dos 3 dias”. Com efeito, até então, face aos depoimentos das testemunhas DP… e TM…, e mesmo admitindo, por hipótese, que o gerente da Quadrante e/ou os funcionários, tinham conhecimento dessa “regra”, por constar das condições gerais dos seguros contratados, a verdade é que a mesma se perfilava como meramente indicativa, considerando a possibilidade de ser desconsiderada, numa prática que também a Apelante não desconhecia.
Assim, não se justifica o pretendido aditamento.
2.ª questão – Da exclusão da cobertura dos gastos de cancelamento da viagem
Na sentença recorrida teceram-se as seguintes considerações de direito:
Da factualidade provada resulta que, entre a ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda, na qualidade de tomadora de seguro, e a ré Mapfre Asistencia – Companhia de Seguros e Reseguros, S.A. (Sucursal em Portugal) foi celebrado, em 28 de junho de 2017, um contrato de seguro “Tavel Protect Platinum Grupo”, titulado pela apólice n.º Quadra-…-…-…, a que os autores aderiram, na qualidade de segurados.
O contrato de seguro é uma convenção em virtude da qual uma pessoa (o tomador de seguro) transfere para outra (seguradora) o risco de verificação de um dano, na esfera própria ou alheia, mediante o pagamento de uma determinada remuneração (prémio), comprometendo-se a seguradora, caso a situação de risco se concretize, a satisfazer ao segurado ou a terceiro uma indemnização pelos prejuízos sofridos ou um determinado montante previamente estipulado (neste sentido, Moitinho de Almeida, in O Contrato de Seguro no Direito Português e Comparado, Livraria Sá da Costa, 1971, página 23-24 e Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12/04/2014, processo n.º 919/13.9TVLSB.L1.S1 e de 14/04/2015, processo n.º 294/2002.E1.S1, ambos in www.dgsi.pt).
Tal contrato assume um caráter consensual - porque se realiza por via do simples acordo das partes - e formal - porque o segurador é obrigado a formalizar o contrato num instrumento escrito, que se designa por apólice de seguro e a entregá-lo, desde logo, ao tomador de seguro, dependendo, portanto, a sua validade da sua redução a escrito.
Desse documento escrito deverão constar todas as condições gerais, especiais e/ou particulares do negócio jurídico celebrado, regulando-se o contrato pelas respetivas cláusulas, desde que não proibidas por lei, e, na sua falta ou insuficiência, pelas disposições do regime jurídico do contrato de seguro, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16 de abril, e, na falta de previsão destas, pelas regras gerais previstas no Código Comercial e no Código Civil.
O artigo 76º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro define “contrato de seguro de grupo” como sendo o contrato que “cobre riscos de um conjunto de pessoas ligadas ao tomador do seguro por um vínculo que não seja o de segurar”.
O contrato de seguro de grupo pressupõe uma relação trilateral entre a seguradora, o tomador do seguro e o aderente que se constitui em dois momentos: numa primeira fase estática, ocorre a celebração do contrato entre a seguradora e o tomador do seguro; numa segunda fase dinâmica, o tomador do seguro promove a adesão ao contrato junto dos membros do grupo (neste sentido, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 14/04/2015, proc. 294/2002.E1.S1 e de 05/10/2018, processo n.º 261/15.0T8VIS.C1.S2, ambos in www.dgsi.pt).
De acordo com o artigo 77º, n.º 2 do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, “o seguro de grupo diz-se contributivo quando do contrato de seguro resulta que os segurados suportam, no todo ou em parte, o pagamento do montante correspondente ao prémio devido pelo tomador do seguro”, podendo ser acordado que os segurados paguem diretamente ao segurador a sua parte do prémio.
Nos termos do artigo 78º, n.º 1 do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, “o tomador do seguro deve informar os segurados sobre as coberturas contratadas e as suas exclusões, as obrigações e os direitos em caso de sinistro, bem como sobre as alterações ao contrato, em conformidade com um espécimen elaborado pelo segurador”, competindo ao tomador de seguro provar que forneceu tais informações, de acordo com o n.º 2 do referido preceito legal.
Acrescenta ainda o n.º 4 do referido preceito legal que: “o segurador deve facultar, a pedido dos segurados, todas as informações necessárias para a efectiva compreensão do contrato”.
O dever de informação previsto no artigo 78º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro está relacionado com o próprio conteúdo do contrato, devendo ser qualificado como um dever de informação pré-contratual, que se impõe em nome da atuação dos contraentes segundo as regras da boa fé.
1.2. Perante a factualidade descrita não restam dúvidas que o contrato de seguro de grupo de assistência em viagem, da modalidade contributiva, que está em causa nos autos é um contrato de adesão, que integra cláusulas gerais que foram elaboradas sem prévia negociação individual e que os autores segurados se limitaram a subscrever.
Nas palavras de Antunes Varela, contrato de adesão é aquele “em que um dos contraentes, não tendo a menor participação na preparação das respetivas cláusulas, se limita a aceitar o texto que o outro contraente oferece, em massa, ao público interessado” (vide Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, 7.ª edição, pág. 262).
Considerando que, nos contratos de adesão, é prática comum a inclusão de cláusulas contratuais gerais, que não são fruto da livre negociação desenvolvida entre as partes, já que são pré-elaboradas e são impostas por uma das partes no contrato que assume uma posição dominante, sendo objeto de simples subscrição ou aceitação pelo lado da parte a quem são propostas, o regime das cláusulas contratuais gerais previsto no Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, visando proteger o aderente e restabelecer a justiça interna do contrato específico, veio estabelecer um conjunto de regras e de deveres de comunicação e de informação a cargo do predisponente e acentuar a sua obrigação de agir de boa fé e de preservar a confiança contratual do aderente.
Neste sentido, o artigo 5º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, sob a epígrafe “Comunicação”, prescreve, no seu n.º 1, que: “As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las”.
Acrescenta o n.º 2 do referido preceito legal que: “a comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência”. O n.º 3 do referido preceito legal prescreve ainda que: “o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais”.
Por sua vez, o artigo 6º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, sob a epígrafe “Dever de informação”, dispõe, no seu n.º 1, que “o contratante que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique”, devendo ainda ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis solicitados, de acordo com o n.º 2 do aludido preceito legal.
Nos termos do artigo 8º, alíneas a) e b) do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, consideram-se excluídas dos contratos singulares as cláusulas que não tenham sido objeto de comunicação, nos termos do artigo 5º do mesmo diploma legal, e as cláusulas comunicadas com violação do dever de informação, de molde a que não seja de esperar o seu conhecimento efetivo.
O artigo 15º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, por sua vez, estabelece a proibição das cláusulas contratuais gerais contrárias à boa-fé.
Na concretização deste preceito legal e tendo em consideração os limites impostos pelo abuso do direito, o artigo 16º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, estabelece o seguinte: (…)
1.3. No caso sub judice, os autores, consumidores e aderentes no contrato de seguro “Tavel Protect Platinum Grupo”, titulado pela apólice n.º Quadra-…-…-…, efetuaram uma participação de sinistro junto da ré Mapfre Asistencia – Companhia de Seguros e Reseguros, S.A. (Sucursal em Portugal), confiando na proteção do seguro com cobertura de gastos de cancelamento de viagens até ao limite de capital de € 3 000,00 (três mil euros) por pessoa.
Foram, no entanto, os autores segurados surpreendidos pela atuação da ré seguradora que declinou a responsabilidade assumida por via do contrato de seguro de grupo após a adesão, invocando, por um lado, a existência de uma cláusula de exclusão específica da cobertura referente aos gastos de cancelamento da viagem contida no artigo 11º, alínea g) das condições gerais da apólice de seguro, através da qual se consideravam excluídas da cobertura de gastos de cancelamento da viagem “as viagens contratadas com uma antecedência superior a três dias face à data da subscrição do seguro”, alegando que a viagem em causa tinha sido contratada no dia 1 de junho de 2017, ou seja, muito antes do referido prazo de três dias face à data da subscrição do seguro, em 28 de junho de 2017 e, por outro lado, sustentando que a eventual não comunicação do conteúdo da cláusula em apreço pela ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda, tomadora do seguro, não lhe seria imputável ou oponível.
Ora, estando em causa um contrato de seguro de grupo contributivo, com recurso ao uso de cláusulas contratuais gerais, às quais os autores segurados se limitaram a aderir, deve convocar-se para a resolução do presente litígio o regime jurídico previsto no Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro. [Não podemos considerar o regime jurídico do contrato de seguro - que tem especialmente como destinatários o tomador de seguro e a seguradora, e não o segurado - como uma lei especial que derroga o diploma que fixa o regime das cláusulas contratuais gerais, enquanto lei geral ou comum (neste sentido, vide Acordão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/04/2015, processo n.º 294/2002.E1.S1 e Acordão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22/05/2014, processo n.º 1805/12.5TVLSB.L1-2, ambos in www.dgsi.pt)]
Tal significa que a obrigação geral de comunicação, informação e explicação das cláusulas do contrato de seguro que impende sobre a ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda, enquanto tomadora do seguro, por força do disposto no artigo 78º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, não desonera a ré seguradora Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A., predisponente, de cumprir a sua obrigação de comunicar e explicar as condições gerais do contrato de seguro de grupo aos aderentes, uma vez que ela é a responsável primeira por essa comunicação e informação no âmbito dos contratos de adesão, nos termos dos artigos 5º e 6º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro.
Na verdade, o ónus de informação completa e esclarecida sobre o conteúdo do contrato e respetivas exclusões em vista da proteção do aderente tanto impende sobre a ré tomadora de seguro, como sobre a ré seguradora, por força do princípio da boa fé contratual previsto no artigo 227º do Código Civil, das disposições conjugadas dos artigos 5º e 6º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, e da necessidade da salvaguarda da proteção do consumidor segurado aderente, como parte mais fraca e vulnerável (neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/04/2015, processo n.º 294/2002.E1.S1, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 09/01/2012, processo n.º 27/10.4T2AND.C1, Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 07/11/2017, processo n.º 1301/15.9T8VCT.G1 e Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27/09/2018, processo n.º 849/17.5T8FLG.P1, todos in www.dgsi.pt).
In casu, não ficou inequivocamente demonstrado nos autos que a ré seguradora, na altura da contratação, tenha efetivamente disponibilizado e comunicado à ré tomadora do seguro o conteúdo integral das condições gerais e particulares indispensáveis à definição da cobertura do seguro e das suas exclusões, mormente as de que agora se pretende prevalecer, o que, por si só, seria impeditivo do cabal cumprimento do subsequente dever de comunicação e de informação por parte da própria tomadora do seguro aos autores segurados.
Por outro lado, nem a ré tomadora do seguro, nem a ré seguradora, lograram provar ter dado cumprimento ao ónus de comunicação aos autores aderentes de todo o conteúdo do contrato de seguro de grupo, tendo, ao invés, resultado provado que estes não foram informados, nem lhes foram comunicadas as cláusulas de exclusão constantes do seguro, nas quais se inclui aquela que retira do âmbito da cobertura de gastos de cancelamento as viagens contratadas com uma antecedência superior a três dias face à data da subscrição do seguro, invocada pela ré seguradora para se eximir do pagamento do capital seguro, verificado o risco previsto.
Ora, a falta de comunicação das cláusulas de exclusão do seguro aos aderentes tem como efeito a sua eliminação do conteúdo contratual, nos termos do artigo 8º, alíneas a) e b) do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, não podendo a ré seguradora prevalecer-se dessa cláusula para se eximir da sua responsabilidade de ressarcir pela ocorrência do risco sob cobertura (neste sentido, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 14/04/2015, processo n.º 294/2002.E1.S1, de 29/11/2016, processo n.º 274/15.8T8GMR.S1 e de 05/10/2018, processo n.º 261/15.0T8VIS.C1.S2, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 09/01/2012, processo n.º 27/10.4T2AND.C1 e Acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 25/01/2018, processo n.º 2143/15.7T8VCT.G1 e de 05/04/2017, processo n.º 493/14.9TBGMR.G1, todos in www.dgsi.pt).
Em todo o caso e ainda que assim se não entendesse, sempre se diga que é manifesto o caráter abusivo, por contrário à boa fé, da cláusula de exclusão em apreço, que retira do âmbito da cobertura de gastos de cancelamento as viagens contratadas com uma antecedência superior a três dias face à data da subscrição do seguro, à luz do disposto nos artigos 15º e 16º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, pois que em resultado de tal cláusula de exclusão a cobertura fica aquém daquilo com que os segurados aderentes de boa fé poderiam contar, tendo em consideração o objeto e a finalidade do contrato de seguro, sendo certo que nunca tal questão foi suscitada na altura da subscrição do seguro, existindo um desequilíbrio significativo, desproporcionado e injustificado da situação jurídica da seguradora em detrimento dos segurados aderentes, que pagaram o prémio na expectativa de verem coberto o risco previsto, que põe em causa o princípio da igualdade entre as partes contratantes, pelo que sempre seria de considerar nula tal cláusula de exclusão, nos termos do artigo 12º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro.
Nestes termos, não se sendo de aplicar a cláusula de exclusão invocada pela ré seguradora e concluindo-se que a garantia do seguro – na vertente do risco por cancelamento de viagem - cobre o sinistro sofrido pelos autores segurados, têm os mesmos direito ao reembolso, até ao limite de € 3 000,00 (três mil euros) por pessoa, dos gastos irrecuperáveis de alojamento e de transporte suportados.
Face ao exposto, deverá ser julgado totalmente procedente o pedido principal e, consequentemente, deverá a ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. ser condenada a pagar aos autores o capital seguro, no valor de € 9 000,00 (nove mil euros), acrescido de juros vencidos e vincendos desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento, ficando assim prejudicado o conhecimento do pedido subsidiário formulado pelos autores, nos termos do artigo 554º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
A Apelante insurge-se contra isto, defendendo que inexiste “qualquer razão para se considerar como não aplicáveis as cláusulas que se contêm nos artigos 10.º, 1.1 e 11.º, al. G) das Condições Gerais da Apólice que como tal deverão ter-se por aplicadas.”
Sustenta designadamente que:
“88. A douta sentença incorre em contradição quando vem dizer não ter sido provado que a Quadrante Mistério e a aqui recorrente não cumpriram o ónus de explicar aos autores, aqui recorridos, as condições do seguro, esquecendo que antes tinha já reconhecido que esse dever só cabia, nos termos da lei ao tomador do seguro Quadrante Mistério.
89. Repete-se em definitivo que inexistia qualquer obrigação por parte da aqui recorrente de informar os segurados exceto se estes a tivessem interpelado ou pedido quaisquer esclarecimentos o que não aconteceu.
90. Quem tinha essa obrigação era o tomador do seguro, sendo, por conseguinte, sobre este que uma tal responsabilidade deveria recair.
91. Finalmente, não se entende como foi possível à douta sentença recorrida passar por cima das cláusulas do seguro que previam a existência do referido prazo de 3 dias. Trata-se de cláusulas que integravam as condições do seguro, eram do conhecimento do tomador e foram dadas como provadas pela douta sentença (cf. facto provado n.º 51).
92. Considerar que das referidas cláusulas resultava um desequilíbrio significativo, desproporcionado e injustificado da situação da seguradora em relação aos aderentes, que pagaram o prémio na expetativa verem coberto o risco previsto é estar a assacar à seguradora uma responsabilidade que na verdade não lhe cabe. Com efeito, não foram os segurados que negociaram com a seguradora nem que pagaram o prémio do seguro a esta.
93. Aliás, a referida regra dos 3 dias não constituía um requisito de eficácia do seguro mas apenas da cobertura dos gastos de cancelamento, que era o que estava em causa (ver depoimento da testemunha DP… (00:49:08, pp. 25 a 27, alegações, que aqui se dá por integralmente reproduzido).”
Apreciando.
Estamos, não se discute, perante um contrato de seguro de grupo que se rege pelo Decreto-Lei n.º 72/2008 de 16 de abril (doravante, LCS), em que a Seguradora é a Ré ora Apelante e a Tomadora do Seguro é a Ré Quadrante, contrato que cobre os riscos de um conjunto alargado de pessoas, os Segurados, ligadas à Tomadora do Seguro por uma relação distinta da do seguro (os contratos de viagem organizada - regulados atualmente pelo Decreto-Lei n.º 17/2018, de 08-03, que revogou o Decreto-Lei n.º 61/2011, de 06-05, em vigor à data dos factos em apreço nos autos), no caso a viagem que foi organizada pela Ré Quadrante e vendida pela Ré Multidestinos, aos Autores, Segurados.
Recaindo, é certo, sobre a Tomadora do Seguro a obrigação de pagar o prémio à seguradora, estamos também perante um seguro de grupo contributivo, na medida em que, como resulta dos factos provados, os Autores, segurados, suportaram o pagamento de, pelo menos, uma parte do prémio (pagando o custo adicional de 20 € por pessoa para a contratação do “seguro vip”).
Sobre algumas questões controvertidas a respeito do seguro de grupo, remetemos, por economia, para o acórdão do STJ de 20-06-2017, no processo n.º 1709/13.4TBFLG.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
É sabido que o seguro de grupo envolve dois momentos: quando se realiza o contrato entre o segurador e o tomador do seguro; quando os segurados aderem ao contrato de seguro.
Ora, é também fora de dúvida a adesão pelos Autores ao referido seguro de grupo contributivo em que a Quadrante interveio como Tomadora do Seguro e a Apelante como Seguradora.
Mas, desde já adiantamos, não ser claro para nós quando é que se realizou efetivamente o contrato entre a Apelante e a Tomadora do Seguro Quadrante, mais nos parecendo, até pela forma como foi emitido o certificado de seguro, que, conforme apontado pela Professora Maria Inês de Oliveira Martins (na obra citada no referido acórdão do STJ de 20-06-2017), existia um contrato de seguro quadro, há muito negociado entre as partes (Seguradora e Tomadora do Seguro), ao qual, no que ora importa, o seguro de cancelamento de viagem, a adesão por parte dos Segurados era facultativa.
Ao contrato de seguro em questão aplicam-se, como não podia deixar de ser, as disposições que resultaram do acordo de vontade das partes e que resumidamente resultam do certificado de seguro de viagem (doc. 16 junto com a Petição Inicial), aplicando-se também, em termos que adiante apreciaremos, as condições gerais da apólice (doc. 1 junto com a Contestação da Apelante), constituindo estas cláusulas contratuais gerais determinadas pela seguradora, e ainda, quanto ao regime legal, além das normas constantes do referido Regime Jurídico do Contrato de Seguro (LCS), também o estabelecido no Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro (Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais).
No capítulo dedicado ao Seguro de Grupo, preceitua o art. 78.º da LCS, sob a epígrafe “Dever de informar”, que:
1 - Sem prejuízo do disposto nos artigos 18.º a 21.º, que são aplicáveis com as necessárias adaptações, o tomador do seguro deve informar os segurados sobre as coberturas contratadas e as suas exclusões, as obrigações e os direitos em caso de sinistro, bem como sobre as alterações ao contrato, em conformidade com um espécimen elaborado pelo segurador.
2 - No seguro de pessoas, o tomador do seguro deve ainda informar as pessoas seguras do regime de designação e alteração do beneficiário.
3 - Compete ao tomador do seguro provar que forneceu as informações referidas nos números anteriores.
4 - O segurador deve facultar, a pedido dos segurados, todas as informações necessárias para a efectiva compreensão do contrato.
5 - O contrato de seguro pode prever que o dever de informar referido nos n.os 1 e 2 seja assumido pelo segurador.
Na “Lei do Contrato de Seguro Anotada” da autoria de Pedro Martinez e outros, 2016, 3.ª edição, Almedina (págs. 313-314), em anotação a este artigo, explica-se que o n.º 3 estabelece o ónus da prova pelo tomador do seguro de fornecimento das informações estabelecidas nos n.ºs 1 e 2, o que convoca a disciplina prevista no art. 79.º, e procede a uma inversão das regras gerais em matéria de prova (art. 342.º, n.º 1, do CC). Dá-se também aí conta da importante discussão em torno da extensão do dever de informar ao segurador por via dos artigos 5.º e 6.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro (bem como a exclusão da cláusula do contrato, no caso da sua omissão, em virtude do artigo 8.º do mesmo diploma), referindo as “posições desencontradas acolhidas no Ac. do STJ de 15 de abril de 2015(Maria dos Prazeres Beleza), in www.dgsi.pt, Proc. 385/12.6TBBRG.G1.S1 e no Ac. 14 de outubro de 2015 (Clara Sottomayor), in www.dgsi.pt, Proc. 294/2002.E1.S1”.
Também no acórdão do STJ de 20-06-2017, no processo n.º  1709/13.4TBFLG.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt, se destaca esta divergência jurisprudencial, referindo-se precisamente que: “É sabido que a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça na matéria não é uniforme: alguns Acórdãos orientam-se no sentido de que o dever de informação aos aderentes nos seguros de grupo cabe exclusivamente ao tomador do seguro; outros, por força da aplicação do regime das cláusulas contratuais gerais, defendem que também o segurador tem deveres de informação; e outros, ainda, que mesmo que tal dever recaia em primeira linha sobre o tomador do seguro, não se pode afastar que no caso concreto, por força da ambiguidade das cláusulas contratuais gerais predispostas pelo segurador, o incumprimento do dever de informação lhe seja também imputável.”
No primeiro sentido, veja-se, por exemplo, o acórdão do STJ 05-04-2016, no processo n.º 36/12.9TBALD.C1-A.S1: “I. No caso de seguro de grupo, e salvo acordo em contrário estabelecido no contrato, compete ao tomador do seguro, e não ao segurador, a obrigação de informação ao aderente (segurado) das cláusulas contratuais gerais (coberturas, exclusões, obrigações e direitos em caso de sinistro) e suas alterações. II. O incumprimento desta obrigação por parte do tomador do seguro não é oponível ao segurador, pelo que a cláusula geral não comunicada não se pode ter por excluída do âmbito da adesão ao seguro.”
Ainda no referido acórdão de 20-06-2017, o STJ parece inclinar-se no sentido destas duas últimas posições, afirmando designadamente: “Mas mesmo que se adira ao entendimento de que o dever de informação recai sobre o tomador do seguro, existem no caso vertente factos dados como provados que sempre permitiriam responsabilizar o segurador”.
Em nosso entender, e conforme já acima adiantámos, o regime jurídico das cláusulas contratuais é também aplicável, ainda que com as devidas adaptações, tendo designadamente em atenção o disposto no seu artigo 1.º:
“1 - As cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma.
2 - O presente diploma aplica-se igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar.
3 - O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo.”
Na situação em apreço, as cláusulas gerais do contrato de seguro, até por se tratar de um seguro de grupo, estavam previamente estabelecidas, limitando-se os Autores a aceitá-las quando manifestaram a sua vontade de aderirem à apólice de “seguro vip”, não restando por isso dúvidas de que às mesmas deve aplicar-se o regime das cláusulas contratuais gerais.
Neste sentido, a título meramente exemplificativo, veja-se também o Acórdão do STJ de 02-11-2017, no processo n.º 620/09.8TBCNT.C1.S1, disponível em www.dgsi.pt:
“I - Um contrato de seguro de grupo (ramo vida) em que são intervenientes uma seguradora, uma instituição financeira (como tomadora e credora beneficiária) e uma pessoa singular (como aderente-segurada) constitui um contrato celebrado no âmbito de um esquema contratual com uma estrutura tripartida complexa, tendo por base um plano de seguro e, na sua execução, várias adesões/celebrações de contratos de seguro concretizados nas declarações de vontade das pessoas seguras de aderirem ou fazerem parte do referido plano de seguro.
II - Nestas situações, a seguradora e o tomador do seguro (a instituição bancária) celebram entre si um contrato de seguro que vai funcionar como o quadro em que, posteriormente, se estabelecem as situações ou relações de seguro (situações de risco) propriamente ditas.
III - Tal contrato de seguro reveste a natureza de contrato de adesão, no sentido que as cláusulas contratuais gerais que o regem não são sujeitas a negociação, mas apresentadas como um formulário que o destinatário do seguro se limita a subscrever, estando, assim, sujeito ao regime das Cláusulas Contratuais Gerais, aprovado pelo DL n.º 446/85, de 25-10.
IV - No âmbito do seguro do ramo vida releva a existência de inquéritos clínicos, que acompanham a proposta, assumindo-se estes como um instrumento para a seguradora alicerçar a decisão de contratar e proceder à avaliação concreta do risco que assume, daí o dever que assiste ao segurado de prestar declarações verdadeiras e exactas.
V - Por sua vez, está a seguradora obrigada ao dever de comunicar, na íntegra, aos aderentes as cláusulas contratuais gerais que se limitem a subscrever ou aceitar, devendo este ser realizado nos termos do n.º 1 do art. 5.º do DL 446/85, de 25-10, recaindo sobre a mesma o ónus da prova de que o cumpriu de forma adequada e efectiva (n.º 3 do aludido art. 5.º).
VI - Sem embargo da qualificação do contrato de seguro como de adesão e das exigências que a lei comete à seguradora, contraente mais forte, tal não exime o segurado de alegar a matéria de facto pertinente da violação dos deveres de comunicação e de informação.
VII - Não o tendo feito, nem tendo suscitado a questão ao longo processo, trazendo-a apenas à discussão na alegação do recurso de revista, sem ter sido submetida, previamente, à apreciação quer da 1.ª instância, quer do tribunal da Relação, reveste a mesma a natureza de questão nova que, não sendo de conhecimento oficioso, não cabe ao Supremo conhecer.”
No caso dos autos, foi alegada e resultou provada a matéria de facto atinente à violação dos deveres de informação, designadamente que as Rés Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda., Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. e Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. não deram conhecimento aos Autores do conteúdo das condições gerais da apólice em apreço.
Consideramos inaceitável, no contexto fáctico apurado, que a Seguradora se possa eximir da obrigação de pagamento da quantia peticionada a pretexto de que era sobre a Tomadora do Seguro que recaía o dever de informar os segurados sobre as coberturas contratadas e as suas exclusões.
Com efeito, não podemos esquecer que o art. 78.º, n.º 1, da LCS manda também aplicar os artigos 18.º a 20.º da LCS, dos quais resulta designadamente que cabe ao segurador prestar todos os esclarecimentos exigíveis e informar o tomador do seguro das condições do contrato, acrescendo ainda, quando se trate de contrato de seguro celebrado à distância, da informação prevista no art. 4.º do DL n.º 24/2014, de 14 de fevereiro.
Ora, por estranho que possa parecer, a verdade é que a Apelante nem sequer logrou provar que enviou à Tomadora do Seguro Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. as referidas condições gerais, muito menos que tenha prestado informações a esse respeito para a efetiva compreensão do contrato. Logo, tendo também presente o princípio geral da boa-fé norteador do cumprimento das obrigações contratuais (cf. art. 762.º do CC), é inadmissível que a Apelante se possa prevalecer do incumprimento de dever de informação por parte da Tomadora do Seguro quando ela própria, Seguradora, não demonstrou que tivesse prestado a esta última a indispensável colaboração para que a mesma pudesse cumprir cabal e devidamente o seu dever de informar.
Ademais, não podemos deixar de ver no contrato de seguro de grupo em apreço um contrato quadro, o qual, nas palavras de Maria Inês de Oliveira Martins “em certos aspectos de regime, manifesta analogia com a mediação de seguros. Com efeito, o contrato celebrado entre o segurador e o tomador funciona como um contrato que sem impor uma obrigação de celebração de contratos futuros entre o segurador e os segurados – o que não estaria sequer ao seu alcance, já que os segurados são terceiros face a este contrato quadro – pré-determina o seu conteúdo” (citação retirada do referido acórdão do STJ de 20-06-2017).
Neste sentido aponta claramente a forma como o contrato de seguro Tavel Protect Platinum Grupo foi firmado pela Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda., através da Internet, numa aplicação informática da Ré Mapfre Asistencia – Compañía Internacional de Seguros Y Reaseguros, S.A. denominada SOGE (hhttp://s-o-g-e.com), evidenciando bem que a Apelante pretendeu reduzir ao máximo a sua intervenção. Era a própria Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda. que acedia a essa aplicação informática através da inserção do nome de utilizador e da respetiva palavra passe, a qual gerava automaticamente o certificado de seguro, o que significa que a Apelante deu amplos poderes à Tomadora do Seguro, confiando que os funcionários da mesma fossem, ao fim e ao cabo, auxiliares daquela na contratação do seguro em causa, numa situação à qual não poderá deixar de aplicar-se o regime da mediação, mormente o que emerge do art. 88.º da LCS, atinente ao tomador do seguro que seja simultaneamente mediador de seguros com poderes de representação.
Por tudo isto, parece-nos claramente inaceitável vir agora demarcar-se da atuação dos funcionários da Quadrante. Se a Apelante não teve o cuidado de inserir na plataforma um mecanismo para impedir a contratação do “seguro vip” quando pela excessiva antecedência temporal já não queria aceitar a adesão do Segurado, nem de zelar para que fosse entregue aos segurados, ainda que por intermédio da Tomadora do Seguro, um documento do qual constassem as condições gerais do seguro e as condições específicas da adesão, tão pouco procedendo a um controlo posterior à data de emissão do certificado do seguro (que não podia desconhecer), aceitando, pois, que a adesão fosse efetuada nos termos indicados pelas demais partes e recebendo inclusivamente o respetivo acréscimo do prémio, é inaceitável que possa prevalecer-se do clausulado contratual em apreço que não foi comunicado nem devidamente informado aos segurados.
Assim, e considerando, neste particular, as razões aduzidas na sentença recorrida, que merecem a nossa concordância, concluímos que atento o incumprimento dos deveres de comunicação e informação das cláusulas contratuais, mormente das atinentes à cobertura/exclusão em apreço constantes dos artigos 10.º/1.1, e 11.º/al. G das condições gerais da apólice, de harmonia com o disposto nos citados preceitos legais, incluindo os artigos 4.º a 8.º do Decreto-Lei n.º 446/85, tais cláusulas se devem considerar excluídas.
Ainda que assim não se entendesse, haveria que interpretar a referida cláusula e apreciar da sua validade, à luz do referido regime jurídico, mormente dos artigos 12.º e seguintes do referido Decreto-Lei n.º 446/85.
Lembramos o teor das condições gerais da apólice de seguro que nos interessam.
Assim, consta do art. 10.º, atinente à “COBERTURA DE GASTOS DE CANCELAMENTO OU DE INTERRUPÇÃO DA VIAGEM”, o seguinte:
“Em virtude do presente contrato, a MAPFRE ASISTENCIA indemnizará o Segurado pelos gastos que se produzam a seu cargo como consequência do cancelamento ou da interrupção da viagem.
1. GASTOS DE CANCELAMENTO DA VIAGEM
1.1. A garantia de gastos de cancelamento da viagem vigorará desde que a MAPFRE ASISTENCIA receba a comunicação da inclusão do Segurado por parte do Tomador do Seguro e terminará no momento do início da viagem (momento de embarque no meio de transporte colectivo contratado para realizar a viagem).
Esta cobertura só é válida e eficaz se o Seguro que a compreende for contratado na mesma data em que for contratada a viagem objecto do mesmo ou, no máximo, até 3 dias após a data da contratação da viagem, não produzindo quaisquer efeitos quando o Seguro seja contratado em data anterior à data da contratação da viagem nem quando seja depois de decorridos 3 dias sobre a data da contratação da viagem.
Para efeitos da presente cobertura é considerada “data da contratação da viagem” a data na qual é emitido o primeiro bilhete do meio de transporte a ser utilizado pelo Segurado e/ou a data na qual é efectuada a reserva do quarto de hotel onde o Segurado irá ficar hospedado.”
E consta do artigo 11.º, atinente a “EXCLUSÕES ESPECÍFICAS DA COBERTURA DE GASTOS DE CANCELAMENTO OU DE INTERRUPÇÃO DA VIAGEM”, o seguinte:
“Não se garantem os cancelamentos ou interrupções da viagem que tenham a sua origem em:
a) Tratamento estético, curativo, numa contra-indicação de viagem ou de vacinação ou ainda na impossibilidade de em certos destinos o Segurado seguir um tratamento médico preventivo aconselhado.
b) Epidemias e suicídio, na forma tentada ou consumada.
c) Não apresentação, por qualquer causa, dos documentos indispensáveis desde o início até ao termo da viagem, como por exemplo: passaporte, vistos, cartões de identificação, certificados de vacinação.
d) Tratamentos de odontologia não urgentes ou de reabilitação.
e) Doenças de pessoas cuja idade seja igual ou superior a 75 anos.
f) Doenças e/ou acidentes preexistentes à data da contratação da viagem e do Seguro, incluindo as recaídas agudas.
g) Viagens contratadas com uma antecedência superior a 3 dias face à data da subscrição do Seguro.”
Cumpre interpretar as referidas cláusulas à luz do disposto nos artigos 236.º e 238.º do CC e na esteira da jurisprudência que vem defendendo que, nos contratos de seguro deve, em caso de dúvida, prevalecer o sentido mais favorável a quem deles beneficia, de harmonia com a regra ambiguitas contra stipulatorum (exemplificativamente o acórdão do STJ de 11-07-2006, na Revista n.º 1855/06 - 7.ª Secção, sumário disponível em www.stj.pt).
Como já vimos, os Autores aderiram a um seguro de viagem que incluía a cobertura dos gastos de cancelamento da viagem desde que contratada (a viagem) na mesma data em que o seguro tiver sido contratado/subscrito ou, no máximo, 3 dias antes.
Mas quando é que foi contratada a viagem? Seríamos levados a pensar que foi no dia 26-05-2017, cf. ponto 13 do elenco dos factos provados neste acórdão. Porém, não é essa a data a considerar, já que expressamente se refere que a data a considerar para o efeito é a “data na qual é emitido o primeiro bilhete do meio de transporte a ser utilizado pelo Segurado e/ou a data na qual é efectuada a reserva do quarto de hotel onde o Segurado irá ficar hospedado.”
Ora, a data em que foram emitidos os bilhetes de avião (primeiro meio de transporte a ser utilizado) foi 04-08-2017, antes, pois, da contratação do seguro, entre Tomadora do Seguro e Seguradora, através da referida plataforma eletrónica.
Infere-se da fundamentação de direito da sentença que o tribunal recorrido terá considerado que a reserva dos quartos de hotel tinha sido efetuada em 01-06-2017, uma vez que nessa data foram emitidos os vouchers dos hotéis escolhidos para alojamento (cf. ponto 19. do acórdão) e a reserva da viagem confirmada (cf. ponto 20. do acórdão). Porém, a verdade é que isso não nos parece forçoso, não constando do elenco dos factos provados que as várias reservas dos quartos dos hotéis tenham efetivamente sido realizadas, designadamente pela Quadrante, nessa data.
Mas mesmo que assim não fosse, cabe perguntar quando foi contratado o seguro? Não deixa de ser interessante e até esclarecedor o teor da carta de 25 de agosto de 2017, em que expressamente se refere:
“1. A subscrição do seguro de viagem deve ser realizada antes do início da viagem, não se considerando válida a cobertura nos restantes casos;
2. Tratando-se de grupos de viajantes, devem incluir-se no seguro todos os elementos de um agregado familiar, não sendo possível garantir exclusivamente os filhos ou apenas um dos cônjuges;
3. Para que as coberturas de gastos de cancelamento e de interrupção de viagem sejam válidas, o seguro deve ser contratado no momento da reserva inicial da viagem ou, no máximo, até 3 dias após a reserva.”
Daí parece evidenciar-se que, na ótica da Ré seguradora, “subscrição do seguro de viagem” e “contratação do seguro de viagem” não são a mesma coisa, o que se compreende porquanto, como vimos, estamos perante uma relação “trilateral”, com momentos temporais distintos: por um lado, a adesão pelos segurados a um contrato de seguro-quadro, escolhendo a modalidade que lhes interessa, numa manifestação de vontade por parte dos mesmos, remetendo para a ideia de contratação do seguro; por outro lado, a subscrição do seguro entre Tomadora e Seguradora, que se faz mediante a plataforma eletrónica.
Ora, a nosso ver, a expressão “seguro contratado” constante da referida condição geral tem de se reportar à adesão que é feita pelo segurado. E se assim for interpretada, não vemos nessa cláusula nada de abusivo ou contrário à boa-fé. Com efeito, além de poder ser vantajoso para os segurados ficarem logo de início abrangidas situações que poderão vir a obrigar ao cancelamento da viagem, será (a par dos deveres de informação do tomador do seguro ou do segurado) uma forma de prevenir que os viajantes procurem evitar o pagamento do acréscimo de prémio, aguardando para ver se é conveniente lançar mão dessa cobertura, fazendo-o apenas se, já depois da contratação da viagem (até meses depois), tiverem conhecimento de circunstâncias que talvez o aconselhem (por receio de que possam vir a ser suscetíveis de levar ao cancelamento da viagem).
No caso dos autos, provou-se que o Autor, no dia 26 de maio de 2017, no seguimento do que lhe tinha sido proposto no email de 23 de maio de 2017 (incluindo quanto ao seguro – cf. factos vertidos nos pontos 8. e 11. do acórdão), solicitou à Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. a reserva da viagem e, em simultâneo, solicitou a esta Ré (única com qual contratou diretamente) a contratação de um seguro “com as melhores coberturas”, designadamente, para gastos com o cancelamento da viagem. Mais se tendo provado, que, nessa data, a Ré Multi Destinos, Viagens e Turismo, Lda. reservou junto da operadora de viagens, a Ré Quadrante Mistério Unipessoal, Lda., a referida viagem com indicação de “seguro vip” para os Autores.
Nesta ótica, não podemos deixar de considerar que os Autores, logo em 26-05-2017, declararam que pretendiam aderir ao dito seguro, manifestando antecipadamente a sua vontade de adesão ao mesmo. Assim, e tendo em conta a resposta da Quadrante, Tomadora do Seguro, em 01-06-2017, confirmando a reserva, a adesão dos Autores ao seguro coincidiu com o dia em que terão sido (hipoteticamente) reservados os hotéis e antes mesmo de terem sido emitidos os bilhetes dos voos.
Portanto, a cobertura de gastos de cancelamento é válida, eficaz e não se pode considerar excluída já que o seguro foi efetivamente contratado no momento da reserva inicial da viagem.
Apesar de a Quadrante ter tardado em inserir os elementos na plataforma atinentes à emissão do certificado de seguro, isso em nada afeta a validade do seguro, que não depende de forma especial e veio a ser formalizado como vimos, tanto assim que, conforme também está provado, para a celebração do acordo e a emissão do certificado de seguro de viagem da forma descrita não são fornecidas as datas de reserva de voos/alojamento ou as de emissão do bilhete/voucher.
Lembramos, a este propósito, que a Apelante, como responsável pela plataforma informática de contratação de seguros, não cuidou de inserir na mesma campos que tivessem de ser preenchidos a esse respeito (data da reserva de voos/hotéis, por um lado, e cobertura de gastos de cancelamento ou de interrupção da viagem, por outro lado), os quais, em conjunto com a data de subscrição na plataforma do seguro/data de emissão do certificado de seguro de viagem, gerassem um alarme ou uma mensagem de erro na emissão deste certificado, nos casos em que fosse indicada aquela cobertura sem observância da “regra dos 3 dias”.
Os Autores segurados, desde o primeiro momento manifestaram a sua vontade de adesão ao “seguro vip”, tendo-lhes sido confirmado, logo em 01-06-2017, que a reserva o incluía, atenta a resposta da Tomadora de seguro, em quem, saliente-se, a Ré seguradora depositava toda a confiança para fazer a subscrição do seguro na plataforma, como se de mediadora se tratasse. Veja-se que aquela vontade dos Autores coincide com o momento da contratação da viagem, na hipótese de terem sido reservados os hotéis nessa data, ou é mesmo anterior a essa contratação, se considerarmos a data da reserva dos bilhetes dos voos.
Logo, interpretando nestes moldes os citados artigos, a cobertura em apreço não se pode considerar excluída.
Quando muito poder-se-ia defender (e até isso é duvidoso) que as circunstâncias ocorridas entre o dia 1 de junho e o dia 28 de junho não estavam abrangidas, pois a cobertura ainda não se tinha iniciado, mas não que o ocorrido daí em diante não estivesse abrangido.
Mas se tais artigos forem interpretados da forma como a Apelante defende e que foi também a considerada na sentença recorrida, então não temos qualquer dúvida em considerar tais cláusulas nulas, por abusivas e contrárias à boa-fé, como entendeu o Tribunal recorrido.
Com efeito, preceitua o art. 12.º do Decreto-Lei n.º 446/85 que as cláusulas contratuais gerais proibidas por disposição deste diploma são nulas nos termos nele previstos.
Por seu turno, o art. 15.º deste diploma legal estabelece o princípio geral de proibição das cláusulas contratuais gerais contrárias à boa fé, o qual é concretizado no art. 16.º, dispondo que (N)a aplicação da norma anterior devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face da situação considerada, e, especialmente:
a) A confiança suscitada, nas partes, pelo sentido global das cláusulas contratuais em causa, pelo processo de formação do contrato singular celebrado, pelo teor deste e ainda por quaisquer outros elementos atendíveis;
b) O objectivo que as partes visam atingir negocialmente, procurando-se a sua efectivação à luz do tipo de contrato utilizado.”
Não se pode olvidar que quem recorre à utilização de cláusulas contratuais gerais se encontra numa posição de superioridade relativamente aos aderentes, aos quais não é facultada qualquer possibilidade de interferência na “modelação” das cláusulas, cujos interesses não podem, pois, deixar de ser levados em consideração, só assim se podendo repor o equilíbrio contratual exigido por uma conduta conforme à boa fé. Portanto, a cláusula imposta deve ser, de um ponto de vista objetivo, equilibrada e razoável na ponderação dos vários interesses em presença.
Ora, volvendo ao clausulado contratual em apreço, é claro que seria contrária à boa fé uma cláusula que privasse os Segurados da pretendida cobertura do seguro (cancelamento da viagem), por razões a que são completamente alheios, atinentes a uma deficiente conceção ou funcionamento da plataforma informática criada pela Apelante e à falta de prontidão da Tomadora do Seguro não devidamente informada por aquela Seguradora, quando, desde o primeiro momento, aqueles manifestaram a sua vontade de adesão ao seguro em causa, conforme lhes foi proposto, tendo pago o respetivo acréscimo do prémio, adesão que se tem de considerar efetuada.
Com efeito, seria completamente desproporcional e abusivo que os Segurados/aderentes, apesar de terem cumprido tudo o que estava ao seu alcance, acabassem privados dessa cobertura pela circunstância de a Tomadora do Seguro ter tardado em inserir numa plataforma eletrónica os elementos do seguro sem que a Seguradora nada - rigorosamente nada - viesse dizer em contrário num prazo razoável (que até lhes possibilitaria, além da restituição do valor que pagaram, terem contratado com outra seguradora o seguro de cancelamento de viagem pretendido).
Em conclusão, as cláusulas em apreço se interpretadas da forma defendida pela Seguradora Apelante são nulas por contrárias à boa-fé.
Assim, não merece censura a apreciação feita na sentença recorrida a este respeito, improcedendo as conclusões da alegação de recurso.
Vencida a Ré-Apelante, é responsável pelas custas do presente recurso (artigos 527.º e 529.º, ambos do CPC).
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III - DECISÃO
Pelo exposto, decide-se negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar a sentença recorrida e condenar a Apelante no pagamento das custas do recurso.
D.N.

Lisboa, 05-03-2020
Laurinda Gemas
Gabriela Cunha Rodrigues
Arlindo Crua