Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | FILIPA COSTA LOURENÇO | ||
Descritores: | DIREITO DE QUEIXA DIREITO DE RECLAMAÇÃO | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 01/23/2017 | ||
Votação: | DECISÃO INDIVIDUAL | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | IMPROCEDÊNCIA | ||
Sumário: | I. A existência e a disponibilização do livro de reclamações, (que se encontra regulado pelo 156/2005, de 15 de Setembro, com as alterações introduzidas pelo DL n.º371/2007, de 06/11) constitui um dos instrumentos que tornam mais acessível o exercício do direito de queixa, ao proporcionar ao consumidor a possibilidade de reclamar no local onde o conflito ocorreu. A criação deste livro teve por base a preocupação com um melhor exercício da cidadania através da exigência do respeito dos direitos dos consumidores; II-Pretendendo um consumidor usar da prerrogativa de usar o livro de reclamações, a disponibilização do mesmo pelo fornecedor de bens ou prestador de serviços, deve ser, e de forma inequívoca, IMEDIATA, de acordo com o artº 3 nº 1 b) e nº 4, do DL 156/2005; III- Assim, a exigência feita pelo fornecedor de serviços, após qualquer incidente, de o consumidor ser obrigado a tirar uma nova senha de atendimento, obrigando-o a novo compasso de espera, para, só depois lhe ser facultado o livro de reclamações, tal acção, visa de forma clara, obstaculizar o direito dos consumidores de reagirem imediatamente contra alegadas más praticas comerciais, violando claramente o disposto no artº 3 nº 1 al. b) do DL 156/2005 de 15/09, e praticando concomitantemente aquele uma contraordenação punida com uma coima nos termos dos artigos art.°s 3°nº 1 al. b) e 9° nº 1 a) e nº 2 da Lei 156/2005. (sumário elaborado pela relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Decisão sumária, ao abrigo do artigo 417.º n.º 6 alínea b) do Código de Processo Penal
No processo de recurso de impugnação judicial (de decisão da ANACOM) nº142/16.0YUSTR, do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, 1º Juízo, a arguida “ N... S.A.” com sede em Lisboa, devidamente identificada nos autos, foi condenada por sentença proferida em 27 de Setembro de 2016, vide folhas 862 a 893, pela prática: iii)condenar a Arguido(a)/Recorrente N..., S.A. (‘’N…”), pela prática, sob a forma negligente, em concurso efectivo, de doze ilícitos previstos e puníveis pelos art.°s 3°/1/a) e 9°/1/a)/2 da Lei 156/2005, em 6 (seis) coimas de € 3.500,00, cada uma; (...) Inconformados porém, com esta decisão proferida nestes autos, veio a recorrente já identificada, interpor o presente recurso com os fundamentos constantes da respectiva motivação que aqui se dá por reproduzida e as seguintes conclusões: Termos em que, tudo visto e ponderado, deverão V. Exas., Venerandos Juízes Desembargadores, revogar a decisão sob recurso, substituindo-a por outra que absolva a Recorrente das infrações imputadas ou, caso assim não se entenda, determine a aplicação da sanção de admoestação, pelos motivos melhor explicitados na MOTIVAÇÃO que antecede, assim se fazendo JUSTIÇA! O recurso foi admitido observando-se todos os termos legais. O Digno Magistrado do Ministério Público, junto da primeira instância respondeu concluindo pela improcedência do recurso e solicitando a rectificação da sentença pela forma ali constante que se tem por reproduzida e concluindo pela improcedência do recurso. A ANACOM apresentou resposta, na qual pugna pela manutenção da decisão recorrida. Neste Tribunal o Exm.º Procurador-Geral Adjunto teve vista dos autos. O processo seguiu os seus termos legais. II. Efectuado o exame preliminar foi considerado haver razões para a rejeição do recurso por manifesta improcedência (art.ºs 412.º, 414.º e e 420.º, n.º 1 do Código de Processo Penal) passando-se a proferir decisão sumária, ao abrigo do artigo 417.º n.º 6 alínea b) do Código de Processo Penal. A lei adjectiva instituiu a possibilidade de rejeição dos recursos em duas vertentes diversas, admitida que está, no nosso processo penal a cindibilidade do recurso, princípio acolhido nos arts. 403.º nº 1, 410.º n.º 1 e 412.º n.º 2: 1) Rejeição formal que se prende com a insatisfação dos requisitos prescritos no art. 412.º n.º 2; 2) Rejeição substantiva que ocorre quando é manifesta a improcedência do recurso. A manifesta improcedência verifica-se quando, atendendo à factualidade apurada, à letra da lei e à jurisprudência dos tribunais superiores, que é patente a sem razão do recorrente. A figura da rejeição destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, com vista a obviar ao reconhecido pendor para o abuso de recursos. A possibilidade de rejeição liminar, em caso de improcedência manifesta, tem em vista moralizar o uso do recurso (…) (Ac. STJ de 16 de Novembro de 2000, proc. n.º 2353-3; SASTJ, n.º 45, 61 e também o Ac. Tribunal Constitucional nº17/2011 , DR, II Série de 16-02-2011, decidiu: Não julga inconstitucional a norma extraída do artigo 417.º, n.º 6, alínea b), do Código de Processo Penal, quando permite ao juiz relator proferir decisão sumária de indeferimento, em caso de manifesta improcedência do mesmo, decisão essa passível de reclamação para a conferência, e Ac. TRE de 3-03-2015 : I. A manifesta improcedência do recurso (conceito que a lei não define) nada tem a ver com a extensão da matéria submetida a apreciação, nem com a sua intrínseca complexidade, nem com a prolixidade da motivação do recurso (na procura de deixar bem claras as razões de discordância com a decisão recorrida). Em caso de rejeição do recurso, a decisão limita-se a identificar o tribunal recorrido, o processo e os seus sujeitos e a especificar sumariamente os fundamentos da decisão - art. 420.º, n.º 2 do C.P.Penal.
As questões suscitadas e a apreciar no presente recurso reconduzem-se à pretensão do recorrente e contida no seu recurso: - O presente Recurso tem por objecto a referida decisão do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, na parte relativa à condenação pela prática, sob a forma dolosa, em concurso efetivo, de 6 (seis) ilícitos previstos e puníveis pelos artigos 3.º, n.º 1, b) e 9.º, n.º 1, a) do Decreto-Lei n.º 156/2005, de 15 de setembro (“DL 156/2005”), em 6 (seis) coimas de € 3.500,00, cada uma, e respeita unicamente a matéria de direito, em concreto às seguintes questões: (i) Inexistência de qualquer ilícito contra-ordenacional, nomeadamente por não existir dolo em qualquer conduta da recorrente; (ii) Medida da sanção, que julga desproporcionada. E assim se, - absolva a Recorrente das infrações imputadas ou, caso assim não se entenda, determine a aplicação da sanção de admoestação.
Decidindo diremos concisamente: A recorrente insurge-se contra a condenação que foi alvo na alínea iii) da sentença recorrida. Desde logo, a primeira questão que emerge do recurso interposto pela recorrente e a decidir no presente recurso, reconduz-se singelamente na arguição de que a arguida não pode de forma alguma ser condenada a titulo de dolo pela pratica das contraordenações impugnadas, como o foi. Ora basta uma singela leitura da sentença para recorrida para logo constatar que a recorrente parte desde logo de um pressuposto errado. Ou seja, esta nunca foi condenada pela prática das contra ordenações indicadas a título de dolo, mas sim por negligência, (remetendo-se a recorrente para um renovada leitura da sentença posta em crise) pelo que aqui logo falece a elaborada e intrincada motivação do recurso e plasmada nas suas conclusões apresentadas pela recorrente. Assim por questões óbvias e também de economia processual, sinceramente, não se nos oferece acrescentar qualquer outra asserção, senão a da falência total deste segmento do recurso por ser, manifestamente improcedente, o que se declara.
No mais, aduz a recorrente de que não praticou os ilícitos contra-ordenacionais, pois nunca (note-se no caso dos autos) impediu o acesso aos consumidores do livro de reclamações, não tendo assim violado por qualquer perspectiva que se tenha, a norma pretensamente violada, pois estes (consumidores) tinham tão só que retirar a senha de atendimento, por ordem de chegada e ficar á espera da sua vez de atendimento, não existindo qualquer norma que exija o atendimento prioritário nestes casos, ou seja quando os consumidores pretendem exercer a sua reclamação mediante a aposição das suas “ queixas” no livro de reclamações disponível no local, neste caso na loja indicada. De forma simples e escorreita aduziremos o seguinte, e fazendo naturalmente referência á legislação aplicável neste caso o Decreto- Lei 156/2005 de 15 de Setembro, que dispõe, entre o mais, o seguinte, diremos: Capítulo I Do objecto e do âmbito de aplicação Artigo 1.º Objecto 1 - O presente diploma visa reforçar os procedimentos de defesa dos direitos dos consumidores e utentes no âmbito do fornecimento de bens e prestação de serviços. 2 - O presente decreto-lei institui a obrigatoriedade de existência e disponibilização do livro de reclamações em todos os estabelecimentos de fornecimento de bens ou prestação de serviços, designadamente os constantes do anexo i ao presente decreto-lei e que dele faz parte integrante. 3 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, os fornecedores de bens e os prestadores de serviços podem disponibilizar no seu sítio de Internet instrumentos que permitam aos consumidores reclamarem.
Artigo 2.º Âmbito 1 - Para efeitos do presente decreto-lei, a referência a «fornecedor de bens ou prestador de serviços» compreende os estabelecimentos referidos no artigo anterior que: a) Se encontrem instalados com carácter fixo ou permanente, e neles seja exercida, exclusiva ou principalmente, de modo habitual e profissional, a actividade; e b) Tenham contacto com o público, designadamente através de serviços de atendimento ao público destinado à oferta de produtos e serviços ou de manutenção das relações de clientela. 2 - O anexo a que se refere o artigo anterior pode ser objecto de aditamentos. 3 - O regime previsto neste diploma não se aplica aos serviços e organismos da Administração Pública a que se refere o artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 135/99, de 22 de Abril. 4 - O livro de reclamações pode ser utilizado por qualquer utente nas situações e nos termos previstos no presente diploma. 5 - Exceptuam-se do disposto no n.º 3 os serviços e organismos da Administração Pública encarregues da prestação dos serviços de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos que passam a estar sujeitos às obrigações constantes deste decreto-lei. Contém as alterações dos seguintes diplomas: - DL n.º 371/2007, de 06/11 Consultar versões anteriores deste artigo: -1ª versão: DL n.º 156/2005, de 15/09
CAPÍTULO II Do livro de reclamação e do procedimento Artigo 3.º Obrigações do fornecedor de bens ou prestador de serviços 1 - O fornecedor de bens ou prestador de serviços é obrigado a: a) Possuir o livro de reclamações nos estabelecimentos a que respeita a actividade; b) Facultar imediata e gratuitamente ao utente o livro de reclamações sempre que por este tal lhe seja solicitado; c) Afixar no seu estabelecimento, em local bem visível e com caracteres facilmente legíveis pelo utente, um letreiro com a seguinte informação: «Este estabelecimento dispõe de livro de reclamações»; d) Manter, por um período mínimo de três anos, um arquivo organizado dos livros de reclamações que tenha encerrado. 2 - O fornecedor de bens ou prestador de serviços não pode, em caso algum, justificar a falta de livro de reclamações no estabelecimento onde o utente o solicita pelo facto de o mesmo se encontrar disponível noutros estabelecimentos, dependências ou sucursais. 3 - Sem prejuízo da regra relativa ao preenchimento da folha de reclamação a que se refere o artigo 4.º, o fornecedor de bens ou prestador de serviços ou o funcionário do estabelecimento não pode condicionar a apresentação do livro de reclamações, designadamente à necessidade de identificação do utente. 4 - Quando o livro de reclamações não for imediatamente facultado ao utente, este pode requerer a presença da autoridade policial a fim de remover essa recusa ou de que essa autoridade tome nota da ocorrência e a faça chegar à entidade competente para fiscalizar o sector em causa. Capítulo IV Das contra-ordenações Artigo 9.º Contra-ordenações 1 - Constituem contra-ordenações puníveis com a aplicação das seguintes coimas: a) De (euro) 250 a (euro) 3500 e de (euro) 3500 a (euro) 30 000, consoante o infractor seja pessoa singular ou pessoa colectiva, a violação do disposto nas alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 3.º, nos n.os 1, 2 e 4 do artigo 5.º e no artigo 8.º; b) De (euro) 250 a (euro) 2500 e de (euro) 500 a (euro) 5000, consoante o infractor seja pessoa singular ou pessoa colectiva, a violação do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 3.º, no n.º 3 do artigo 4.º e no n.º 6 do artigo 5.º 2 - A negligência é punível sendo os limites mínimos e máximos das coimas aplicáveis reduzidos a metade. 3 - Em caso de violação do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 3.º, acrescida da ocorrência da situação prevista no n.º 4 do mesmo artigo, o montante da coima a aplicar não pode ser inferior a metade do montante máximo da coima prevista. 4 - A violação do disposto nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 3.º dá lugar, para além da aplicação da respectiva coima, à publicidade da condenação por contra-ordenação num jornal de expansão local ou nacional, a expensas do infractor. Contém as alterações dos seguintes diplomas: - DL n.º 371/2007, de 06/11 Consultar versões anteriores deste artigo: -1ª versão: DL n.º 156/2005, de 15/09
Os argumentos esgrimidos pelo recorrente não fazem qualquer sentido, uma vez que a letra da lei é muito clara neste particular desiderato, bastando para tal atentar no disposto no artº 3º nº 1 b) e nº 4 do citado DL. Ou seja, pretendendo um consumidor usar da prerrogativa de usar o livro de reclamações, a disponibilização do mesmo, deve ser inequivocamente, IMEDIATA. Disto não temos duvidas, pois fazendo uma interpretação literal do texto legal/ norma violada (e sem necessidade de se proceder a interpretações restritivas ou extensivas deste normativo), temos por certo que ali aparece referido o termo “DE IMEDIATO”, artº 3 nº 1 b) d cit. DL. E mais dizemos, se aquele 1º “ IMEDIATO” não for cumprido, o que acontece? Claramente a “cominação”, antes de mais contida no nº 4 do artº 3º, predispõe (para além da previsão das coimas aplicáveis e contidas no artº 9): 4 - Quando o livro de reclamações não for imediatamente facultado ao utente, este pode requerer a presença da autoridade policial a fim de remover essa recusa ou de que essa autoridade tome nota da ocorrência e a faça chegar à entidade competente para fiscalizar o sector em causa. Ou seja o interesse a proteger aqui é tão relevante que até a lei foi clara ao conceder direito ao consumidor de requerer/ chamar a autoridade policial, quando o livro de reclamações não lhe for imediatamente facultado…ou para tomar as diligências necessárias contidas na parte final do nº4. Antes de mais avancemos, pois entende-se que, de facto, será necessário relembrar o significado da palavra: Imediato. Ora no léxico: dicionário de português on line (disponível in https://www.lexico.pt/imediato/), ali se refere: IMEDIATO (Adjectivo) 1. Diz-se do que se segue a seguir, sem qualquer intervalo, numa sequência; posterior, subsequente ou seguinte; 2. Que não apresenta nada no meio; que é direto, sem intermediários; 3. Que age ou procede rapidamente ou no mesmo instante; 4. Diz-se do que ou de quem não aceita demoras ou perdas de tempo; que ocorre sem pausas; súbito ou instantâneo; (…) Ora tendo em conta o acima exarado, a argumentação da recorrente, usada no recurso em apreciação, de que não terá cometido os ilícitos em apreço, em suma porque nunca recusou, ou proporcionou o “uso” aos consumidores do livro de reclamações aos consumidores descontentes, bastando para tal estes sujeitarem-se às regras da empresa, que eram simplesmente de os consumidores terem de tirar uma senha e ficar á espera da sua vez, para então poderem usar o livro de reclamações, definitivamente não colhe. Não colhe primeiro, pelo conteúdo da norma violada que é até bastante assertiva, na exigência de ser facultado imediatamente ao consumidor o livro de reclamações (não se compadecendo assim com nova/ ou primeira “tirada” de senhas para o efeito/ ou até num caso relatado nos autos em que estando o consumidor ao balcão a ser atendido e pedir o livro de reclamações lhe foi exigido que este fosse tirar uma nova senha só para esse efeito…) e segundo porque como claramente decorre do numero 4 do artº 3º do Decreto Lei, que dispõe que quando o livro de reclamações não for imediatamente facultado ao utente, este pode requerer a presença da autoridade policial a fim de remover essa recusa ou de que essa autoridade tome nota da ocorrência e a faça chegar à entidade competente para fiscalizar o sector em causa. No preâmbulo do DL 156/2005 pode ler-se que, o livro de reclamações constitui um dos instrumentos que tornam mais acessível o exercício do direito de queixa, ao proporcionar ao consumidor a possibilidade de reclamar no local onde o conflito ocorreu. A criação deste livro teve por base a preocupação com um melhor exercício da cidadania através da exigência do respeito dos direitos dos consumidores. …é necessário incentivar e encorajar a sua utilização introduzindo mecanismos que o tornem mais eficaz enquanto instrumento de defesa dos direitos dos consumidores e utentes… Depois, no preâmbulo do DL 371/2007 (diploma que veio alterar o DL 156) reconhece o Legislador que (através da criação do livro de reclamações) o exercício do direito de queixa, enquanto exercício da cidadania, tornou-se, assim, mais acessível aos consumidores e utentes. O alcance e extensão destas notas preambulares não pode ser entendido se não no sentido da grande importância que o legislador atribui ao livro de reclamações nesta dupla vertente, de meio efectivo de realização do direito de queixa dos consumidores, e, como instrumento de análise do mercado para identificação dos mercados em que os direitos dos consumidores estão menos acautelados, e, por conseguinte a carecer de maior intervenção no sentido da tutela deste bem jurídico fundamental que é os direitos dos consumidores com consagração no artigo 60.º da Constituição – Título III - Direitos e deveres económicos, sociais e culturais e que se refletem na estruturação da Organização económica – cfr. artigos 80.º e 81.º da CRP. Do mesmo modo, o livro de reclamações, enquanto ferramenta importante de avaliação e conhecimento do mercado, permitiu reconhecer os sectores de actividade em que os direitos dos consumidores e utentes se encontram menos acautelados. Ora o que decorre é que a agilização dos procedimentos da obtenção pelo utente/ consumidor do livro de reclamações encontra-se contido muito claramente na lei, exigindo-se a imediação na sua obtenção, ou explicitando melhor, este tem que ser imediatamente facultado ao “reclamante”, não estando por isso (sendo até de contra senso) sujeito ao regime de senhas de atendimento, nem tem nada a ver com o regime legal (recentemente alterado) de atendimento prioritário, que nada tem a ver com o caso dos autos e não pode evidentemente ser “colado ao caso”. A recorrente padeceu no caso dos autos, de forma patente no seu modo de agir, e nos procedimentos de facultar o livro de reclamações aos utentes/ consumidores, denotando alguma “agnosia” e nitidamente “ contra legem”, e assim deverá ser sancionada, como o foi aliás exemplarmente pelo Tribunal “ a quo”, não sendo manifestamente válidos nenhum dos argumentos que utilizou, os quais em rigor até visam de forma clara obstaculizar o direito dos consumidores de reagirem imediatamente contra alegadas más praticas comerciais/ empresariais ou outras, que são confrontados no seu dia a dia, ao terem que utilizar toda uma panóplia de serviços indispensáveis hoje em dia à vida em sociedade, pondo entraves e atrasando de forma patente o exercício que deve ser IMEDIATO, repete-se, do acesso ao livro de reclamações. Nada mais haverá de relevante de acrescentar ao atrás referido, que por ser tão linear nos eximimos de tecer quaisquer outro tipo de considerações.
Por fim quanto à sanção/ sanções, que a recorrente entende serem exageradas, propondo que lhe seja aplicada uma sanção de admoestação, diremos o seguinte: Considerando-se as conclusões de recurso, 26 a 34, torna-se evidente que a recorrente a pretexto de, no seu entendimento, o TCRS ter concretizado a operação de determinação da medida da pena de forma errada, mais não faz do que impugnar de facto, repetindo na conclusão 27 partes da fundamentação da douta sentença, e nas conclusões seguintes, afirmando novamente que agiu na convicção de que cumpria a lei, que agiu e bem assim os seus funcionários sem consciência da ilicitude. Quanto à pretendida sanção de Admoestação – conclusões 36 e 37 – desde logo se verifica que o TCRS não tinha de a ponderar. Em primeiro lugar, porque nenhuma norma legal no âmbito do direito das contraordenações impõe que na escolha e determinação da sanção o TCRS tenha de excluir a sanção de Admoestação, para somente depois concluir pela aplicação de coima. Depois, nos termos do recurso de impugnação judicial, a arguida nunca colocou a questão da Admoestação, logo, embora vigore no processo de contraordenação o princípio de jurisdição plena, tal questão nunca foi submetida ao seu conhecimento, mais, no referido segmento, também a decisão sancionatória não a convocou à discussão. Prevê o art.° 18°nº1 do RGCO que a determinação da medida da coima se faz em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contra-ordenação Ora na fundamentação da sentença recorrida, esta explana, em argumentação pela positiva, as razões de facto e de direito que levaram o Tribunal “ a quo” à condenação em determinadas coimas por condutas negligentes, de forma adequada e proporcional ao desvalor social da acção (negligente) e ao grau de culpa da arguida. Assim a fixação das coimas e depois da coima única, mostra-se equilibrada, justa, proporcional e razoável e não deixa ficar comprometida a crença da comunidade na validade das normas incriminadoras violadas, imitindo ainda um certeiro juízo na prevenção e na segurança dos valores que as normas contraordenacionais visam resguardar a sociedade e que a arguida beliscou com a sua actuação, que resultou provada. Ora como é por todos consabido, o recurso dirigido à medida da pena visa tão-só o controlo da desproporcionalidade da sua fixação ou a correcção dos critérios de determinação, atentos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso (vide Ac. do TRP de 2.10.2013). A intervenção correctiva do tribunal superior no que diz respeito à medida da pena aplicada só se justifica quando o processo da sua determinação revelar que foram violadas as regras da experiência ou a quantificação se mostrar desproporcionada, e tal no ensinamento de Figueiredo Dias. Mas tal não se verifica no caso em apreço e pelos motivos já atrás equacionados, pelo que improcede também este segmento do recurso, pois a determinação em concreto das coimas a aplicar, se mostram justas, equilibradas e fazendo jus, às regras legais conjugadas com os factos atinentes à sua fixação, o que se declara.
Finalizando diremos que a sentença encerra em si lapsos de escrita, assim o ponto iii) do dispositivo, no confronto com a fundamentação de facto e de direito, da douta sentença recorrida, contém dois lapsos de escrita, um, quando menciona a norma do artigo 3º/1/a) quando, claramente, se quer referir à alínea b do n.º 1 do artigo 3.º, uma vez que é nesta alínea b que se estabelece o dever de o prestador de serviços facultar imediata e gratuitamente ao utente o livro de reclamações sempre que por este tal lhe seja solicitado, o outro quando refere doze ilícitos previstos e puníveis pelos artigos 3º/1/a) e 9º/1/a) da Lei 156/2005, associando-lhes a condenação em 6 (seis) coimas, que como tal – meros lapsos de escrita cuja correcção não implica qualquer modificação essencial do sentido da condenação - deverão obter tratamento, conforme o disposto no artigo 380.º/1/b/2/3 do CPP ex vi artigo 41.º/1 do RGCO, tanto mais que a recorrente bem compreendeu qual a norma sancionatória e o número de condutas imputadas como nitidamente resulta do recurso que apresentou. De facto tal constatação que é patente e decorre da leitura da sentença recorrida, pelo que ao abrigo do disposto no artº 380º nº 1 b) do CPP e 41º nº 1 do RGCO, e por não importar qualquer modificação essencial daquela, determino a correcção da mesma nos termos do parágrafo anterior, devendo esta correcção ser feita após o trânsito em julgado e pelo Tribunal recorrido, no seu devido lugar eliminando-se assim os dois lapsos verificados.
Improcede assim o recurso interposto pelos assistentes.
III. 1.Pelo exposto rejeita-se em substância o recurso por manifestamente improcedente, confirmando-se na íntegra a decisão recorrida. 2. Nos termos do disposto nos artigos 380 nº 1 al. b), nº 2 do CPP e artº 41º nº 1 do RGCO, determino a correcção da sentença no seu ponto iii) do dispositivo, devendo passar a constar no lugar onde se menciona a norma do artigo 3º/1/a) a alínea b do n.º 1 do artigo 3.º, e onde se refere doze ilícitos, deverá passar a constar “de 6 (seis) ilícitos” . 3. Custas, a cargo da recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 6 UC’s (3+3 pela rejeição)e demais encargos legais. Lisboa, 23 de Janeiro de 2017 (elaborado em computador e integralmente revisto pela signatária nos termos do disposto no artº 94º nº 2 do C.P.P.)
Filipa Costa Lourenço
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