Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2502/18.3T8CSC-A.L1-6
Relator: CRISTINA NEVES
Descritores: TELEVISÃO
PROVIDÊNCIA CAUTELAR NÃO ESPECIFICADA
DIREITO À HONRA E CONSIDERAÇÃO SOCIAL
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
LIBERDADE DE IMPRENSA
CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I O direito à imagem e à reserva da intimidade da vida privada, integra a categoria dos direitos absolutos, constitucionalmente protegidos e como tais oponíveis a todos os terceiros que os têm de respeitar.

II Idêntica protecção destes direitos, é conferida pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, cujas normas são objecto de automática recepção no nosso ordenamento jurídico (artº 8 nº1 da C.R.P.), que no seu artº 12, estabelece que ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio, ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e consideração.

III O direito de exprimir e de divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações, goza de idêntica cobertura quer na Convenção Europeia dos Direitos do Homem (artº 10º), quer na nossa constituição (artºs 37 e 38 da C.R.P.).

IV Existindo conflito entre o direito à liberdade de informação e o direito à imagem e à reserva da intimidade da vida privada, deve este ser resolvido de acordo com os princípios gerais (artºs 18 º2, 37.°, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa, 29.º, n.º 1 da Lei da Imprensa), na medida em que o conflito entre direitos iguais ou da mesma espécie resolve-se pela cedência de todos, na medida do necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito, sem maior detrimento para qualquer das partes (art. 335., n.º 1 do Cód. Civil).

V O direito a informar deve ser exercido com respeito pela dignidade da pessoa humana, devendo garantir, na medida do possível, a reserva da intimidade da vida privada e da imagem dos cidadãos, sendo que estes direitos de personalidade só podem ser limitados por acto do próprio titular, excepto quando essa limitação for contrária aos princípios da ordem pública.

VI Constando de reportagens televisivas, a divulgação de factos respeitantes à adopção do requerente, com divulgação do nome e identidade dos adoptantes, dos menores adoptados (incluindo o requerente) e de fotografias destes, quer enquanto crianças, quer já adultos, resulta violado, não só o carácter secreto do processo de adopção, mas o direito à imagem e à reserva da intimidade da vida privada do requerente, sem que o interesse público na divulgação de alegados factos ilícitos envolvendo um “suposto “esquema de adopções ilegais por parte de uma igreja de grande expressão e divulgação públicas, o justifique.

VII Permanência destas reportagens na internet, em site da TVI, com continuação da divulgação do nome e imagem do requerente, constitui uma violação do direito do requerente ao seu bom nome, imagem e reserva da intimidade da sua vida privada, que se prolonga com a continuação do visionamento destas reportagens sem as limitações introduzidas pela decisão recorrida-ocultação ou remoção do nome e imagem do requerente- sendo esta providência adequada a evitar esta lesão (permitindo ainda assim o direito constitucional de informação das recorridas).

(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.



RELATÓRIO:


A, interpôs procedimento cautelar comum contra B, jornalista, C, jornalista, D, jornalista, E, jornalista e directora Adjunta da TV… e TV…, F, jornalista e director Adjunto da TV… e TV…, G, jornalista e subdirector da T… e TV…., H, jornalista e subdiretor da TV.. e  TV…, I [ TV….., S.A. ] e  J  [ …. Digital, S.A.], pedindo que se ordene:
a)- As 8ª e 9ª Requeridas a removerem de todos os seus sites os conteúdos acima identificados onde são relatados factos da vida privada do Requerente, em concreto, os episódios, 7 a 9 da reportagem “O Segredo dos Deuses”;
b)- As 8ª e 9ª Requeridas a se absterem de difundir qualquer facto que diga respeito à vida privada, familiar e íntima do Requerente, nomeadamente, todo e qualquer facto que diga respeito ao seu processo de adoção;
c)- Todos os Requeridos jornalistas e Directores, quer os Directores Requeridos, quer aqueles que lhes vierem a suceder nas funções, a absterem-se de divulgarem factos ou imagens referentes à vida privada, familiar e íntima do Requerente, nomeadamente, todo e qualquer facto que diga respeito ao seu processo de adoção;
d)- Os Requeridos jornalistas de se absterem de divulgarem factos ou imagens referentes à vida privada, familiar e íntima do Requerente, nomeadamente, todo e qualquer facto que diga respeito ao seu processo de adopção;
e)- Os Requeridos proibidos de difundir, em qualquer suporte dos quais sejam proprietários ou colaboradores, (nomeadamente, na televisão, Internet ou imprensa escrita) factos da vida privada do Requerente, que digam respeito ao processo de adoção e à sua vida privada e familiar.

Alega o requerente, em síntese, que os requeridos iniciaram uma série de reportagens designadas “O Segredo dos Deuses” em 11/12/17, contendo supostas denúncias de um esquema de adopção ilegal de crianças, em Portugal, por parte de bispos da IURD e seus familiares, incidindo a 8ª e 9ª reportagem sobre o processo de adopção do requerente e seu irmão, revelando a sua identidade, com fotografias do requerente, quer enquanto criança, quer já adulto e revelações sobre a sua infância e adopção, traumáticas para si e que violam os seus direitos de reserva da intimidade da sua vida privada, provocando-lhe vexame e humilhação, sendo actualmente abordado por desconhecidos, pretendendo explicações sobre estes relatados factos.
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Não tendo sido dispensada a audiência prévia dos requeridos, vieram estes deduzir oposição, tendo os 1º a 7º requeridos invocado o interesse público das notícias, a inexistência de imputações pejorativas das notícias aos menores nelas visados e ainda, que o requerente não foi referido nas seis primeiras reportagens, não tendo pois legitimidade para peticionar a remoção das 10 reportagens exibidas; a 8ª requerida (fls 85 a 96) invocou a inexistência de responsabilidade por o A. divulgar a sua imagem (adulta e infantil) na mesma plataforma onde se encontra a reportagem, invocando “interesse público” na divulgação da “notícia” (da forma como foi feita), alegando ainda não haver qualquer “conteúdo negativo ou imputação pejorativa à pessoa do requerente”; a 9ª requerida excepcionou a inexistência de responsabilidade, por não ser proprietária dos conteúdos difundidos.
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Prosseguindo os autos, procedeu-se à diligência de inquirição de testemunhas, no termo da qual, o tribunal recorrido, proferiu decisão que julgou “a presente providência cautelar parcialmente procedente, e determina-se que as 8ª e 9ª RR. removam ou ocultem, dos episódios 7 a 9 da reportagem ‘O Segredo dos Deuses’, a imagem da face do A., e o seu nome verdadeiro”
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Não conformados com esta decisão, impetraram os 8º e 9º requeridos recurso da mesma, impugnando a matéria de facto e de direito, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem:

Conclusões:
A) As Recorrentes não se conformam com a douta decisão recorrida porque julga incorrectamente vários pontos da matéria de facto e faz uma errada interpretação da lei e errada ponderação do conflito de direitos existente entre os direitos do requerente e os das ora recorrentes;
B) De acordo com os meios de prova disponíveis é possível concluir que os factos subjacentes ao quesito n.º 8 e 9 da decisão devem ser corrigidos e mesmo eliminados já que contém ínsitas conclusões que não decorrem e contrariam a prova junta aos autos;
C) Para além da fundamentação da matéria de facto nada referir especificamente sobre a matéria de facto vertida no facto n.º 8, compulsados os autos, nenhuma prova documental, gravada ou outra, existe que a possa minimamente sustentar e fundamentar;
D) A única testemunha do requerente, Jaqueline …., nada refere sobre estes factos, apenas mencionando que recebeu a reportagem dos autos por Links da sua cunhada que vive na Suiça e da sua filha que vive na Alemanha, mas que só o seu esposo as viu, visionando a testemunha apenas “flashes”;
E) O requerente, por seu lado, nas suas declarações de parte, nada de relevante disse sobre esta matéria que permita a sua fixação como matéria provada;
F) A resposta dada ao identificado facto 8.º deve por isso ser totalmente eliminada já que não corresponde minimamente ao que se encontra demonstrado nos autos ou tenha sido claramente e com segurança mencionado em audiência de julgamento por qualquer das testemunhas ou declarantes.
G) Do facto identificado como n.º 9, verificado o depoimento da única testemunha do requerente e as suas declarações de parte em audiência de julgamento, apenas resulta claro o primeiro facto identificado - por causa da transmissão da reportagem o A. acabou por reviver episódios da sua infância que queria esquecer – mas já não a restante que, aliás, é em sua grande medida conclusiva e mesmo qualificativa;
H) Deve por isso o conteúdo do facto n.º 9 ser corrigido e passar a ter apenas a seguinte redacção. “Por causa da transmissão da reportagem o A. acabou por reviver episódios da sua infância que queria esquecer.”;
I) Por outro lado, existem vários factos alegados pelas recorrentes nas suas oposições, que foram objecto de diversa e bastante prova documental e testemunhal, que não se encontram devidamente plasmados na matéria de facto;
J) Alegaram todas as requeridas nas suas oposições que as imagens do requerente utilizadas na reportagem Segredo dos Deuses foram retiradas de publicações do próprio na sua página de facebook e que esta é de acesso público;
K) Para além da documentação junta aos autos e que demonstra estes factos, nomeadamente os documentos 1 a 5 das oposições das recorrentes e bem assim os documentos 12, 13 e 14 das demais requeridas, também em audiência de julgamento tal foi especificamente referido por testemunhas do requerente, requeridos e mesmo nas declarações de parte do requerente;
L) Por isso deve ser adicionada e dada como provada a seguinte matéria de facto: “As imagens do requerente utilizadas na reportagem Segredo dos Deuses foram retiradas de publicações do próprio na sua página de facebook.”
M) Dos factos provados não resulta demonstrado o periculum in mora, nem ficou demonstrado o receio de lesão grave e de difícil reparação, exigido pelo n.º1, do art. 362.º, e n.º 1, do art. 368.º do CPC;
N) Deve, por isso, considerar-se como improcedente a presente providência por inexistência do requisito exigido no n.º 1, do art.º 387.º, do CPC.;
O) Também não se mostra preenchido outro dos requisitos essenciais do n.º 1, do art. 362.º, do CPC - a adequação da providência para remover o perigo de lesão;
P) Sobretudo quando a lesão que se pretende evitar e que se encontra identificada na decisão sob recurso, é a protecção do requerente de abordagens de desconhecidos e já decorreram mais de sete meses sobre a emissão da reportagem e a sua partilha na Internet, não sendo de prever que a visualização desses conteúdos no site da TVI seja incrementado;
Q) Por outro lado, o Tribunal a quo efectuou uma errada ponderação dos interesses em jogo no conflito de direitos entre os direitos do requerente e os das aqui recorrentes;
R) A conduta das recorrentes foi adequada aos interesses em jogo e à função de informar que as deve mover.
S) Não tendo praticado qualquer acto que leve a comprimir o direito à liberdade de expressão de que constitucionalmente gozam.
T) Os factos atinentes ao comportamento das recorrentes, mas também os relativos ao comportamento do requerente, impõem nova apreciação sobre a adequação e proporcionalidade das providências decretadas, e a conclusão de que as mesmas se revelam desadequadas e desproporcionais aos interesses em jogo.
U) E impõem que, em sede de apreciação da concordância prática entre os direitos do requerente e os das recorrentes, se determine a prevalência do direito de liberdade de expressão das requeridas, pois actuaram unicamente no cumprimento de um dever, bem como no exercício do seu direito legítimo de radiodifundir uma reportagem, e fizeram-no de forma adequada e proporcional, apenas pretendendo o esclarecimento da opinião pública, pela difusão das duas principais versões dos acontecimentos em conflito.
V) Ao decidir como consta da douta decisão, o Mmo. Juiz a quo, violou o disposto nos art.s 362.º, n.º 1, e 368.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, art.s 17.º, 18.º, 37.º e 38.º da Constituição da República Portuguesa, art. 10.º da Convenção Europeia dos Direitos de Homem e o art. 335.º do Código Civil.
POR TODAS ESTAS RAZÕES, E POR TODAS AS DEMAIS A
QUE V. EXAS DARÃO O MUI DOUTO SUPRIMENTO, DEVERÁ A DECISÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA SER REVOGADA E SUBSTITUIDA POR OUTRA QUE DECLARE A IMPROCEDÊNCIA DA ACÇÃO, SÓ ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA!”
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Pelo requerente foram interpostas contra-alegações, delas constando as seguintes:

VICONCLUSÕES:
1. Os Recorridos vêm pedir a alteração da resposta dada ao ponto 8 dos factos provados constantes da sentença recorrida no qual se pode ler:" Na sequência da transmissão da reportagem o A, foi identificado por desconhecidos, que o abordavam e queriam falar sobre o tema (“adopção ilegal') — acabando o A. por ter de dar explicações a desconhecidos, para esclarecer os factos"
2. Ao longo de todo o seu depoimento o Recorrido, sempre que é questionado da forma como teve acesso à reportagem em crise, explica que foi abordado por desconhecidos, com perguntas evasivas sobre a sua vida privada, sobre os seus pais e sobre o seu processo de adoção, mais explica que lhe foram enviados vários link's através do Facebook com as várias reportagens (cfr. declarações de parte do Requerente, depoimento prestado na audiência de julgamento de 24.05.2018, com uma duração de 00:29:02, de 00:00:25: a 00:06:13, de 00:18:01 a 00:18:11, de 00:22:04 a 00:22:18 e 11:26:15 a 11:55:17).
3. Também a Testemunha Jacqueline …., corroborou o depoimento do ora Recorrido, tendo confirmado que o mesmo havia tido conhecimento das reportagens através de link's enviados por desconhecidos, tendo inclusive descrito vários telefonemas do seu filho, sempre que este era confrontado por desconhecidos e por pessoas do seu local de trabalho que o questionavam sobre os seus pais adotivos, comentários esses sempre depreciativos e que causavam grande transtorno ao seu filho, ora Recorrido (cfr. depoimento da testemunha Jacqueline ….., prestado na audiência de julgamento de 24.05,2018, com uma duração de 01.02:02, de 10:23:01: a 11:25:02, de 00:13:13 a 00:13:32, de 00:24:11 a 00:26:24 e 00:39:14 a 00:39:47).
4. Pelo que, considerando a prova produzida, não existem quaisquer razões para alterar a resposta dada ao ponto 8 dos factos provados constantes da sentença recorrida.
5. As Recorrentes pedem igualmente a alteração dos factos dados como provados no ponto 9 da sentença recorrida, onde se pode ler: "Por causa da transmissão da reportagem, o A, acabou por reviver episódios da sua infância que queria esquecer— tendo ficado chocado e consternado com o conteúdo da reportagem, e continua a sentir frustração e impotência por ver a sua imagem diariamente devassada nos conteúdos disponibilizados "on-line".
6. Que a divulgação da imagem e do nome verdadeiro do Recorrido, prejudicou em muito o quotidiano do mesmo, nenhuma das partes contesta, até porque quer do depoimento do Recorrido quer do depoimento da Testemunha Jacqueline …., resulta evidente, que o Requerente foi abordado quer pela família (que residia no estrangeiro) tia e irmã, quer por amigos, quer por desconhecidos, na sequência da transmissão da aludida reportagem (cfr. declarações de parte do Requerente, depoimento prestado na audiência de julgamento de 24.05.2018, com uma duração de 00:29:02, de 00:00:25: a 00:06:13 e cfr testemunho de Jacqueline … prestado na audiência de julgamento de 24.05.2018, com uma duração de 01:02:02, de 10:23:01: a 11:25:02, de 00:24:11 a 00:26:24).
7. Já quanto á parte final do facto 9 da matéria de facto provada "tendo ficado chocado e consternado com o conteúdo da reportagem, e continua a sentir frustração e impotência por ver a sua imagem diariamente devassada nos conteúdos disponibilizados on-line." entendem as Recorrentes que tais factos devem ser eliminados, uma vez que são, nas alegações das Recorrentes, conclusivos e qualificativos.
8. Ao contrário do alegado pelas Requerentes ao longo dos depoimentos, fica patente a frustração, impotência do Recorrido, são vários os episódios relatados pelo próprio e pela sua mãe de como a reportagem em crise teve impacto na vida familiar do ora Recorrido.
9. Basta uma breve análise dos depoimentos supra referidos para se perceber o transtorno do Recorrido e de como a divulgação da sua imagem e nome verdadeiro na reportagem fizeram com que o Requerente revisitasse episódios traumáticos da sua infância, nomeadamente períodos conturbados antes da adoção, aliás ao ser confrontado com vários link's enviados por desconhecidos, o Requerente, ora Recorrido viu toda a sua estabilidade emocional ser abalada por um passado.
10. Assim, em causa não está a origem das fotografias (Facebook do Requerente) mas sim o uso abusivo das mesmas e a sua utilização por parte das Requeridas para uma reportagem, que só por si é bastante depreciativa para a família adotiva do Recorrido, razão pela qual, deve o ponto 9 manter-se na integra na matéria provada.
11. No que respeita à alegada falta de fundamentação dada pelo Tribunal "a quo" aos pontos 8 e 9 dos factos dados como provados andou bem o Tribunal "a quo" quando deu como provados os factos 8 e 9, sendo que tais factos foram julgados como provados com base no depoimento do ora Recorrido e da Testemunha Jacqueline …..
12. Considerando a prova produzia e a jurisprudência supra citada, não devem ser alteradas as respostas dadas aos pontos 8 e 9 dos factos provados constantes da sentença recorrida, devendo improceder o recurso nesta parte.
13. Por último, pretendem as Recorrentes que sejam julgados provados os seguintes factos "As imagens do requerente utilizadas na reportagem Segredo dos Deuses foram retiradas de publicações do próprio na sua página de Facebook", sendo acrescentados à matéria de facto dada como provada.
14. Ora, ainda que se aceite o aditamento de tais factos à matéria de facto provada, e ainda que resulte do depoimento do ora Recorrido que as imagens utilizadas na reportagem em crise foram retiradas do seu Facebook, a verdade é que resulta igualmente do depoimento do Recorrido que a utilização de tais imagens não foi feita com o seu consentimento do Recorrente ora Recorrido, nem tão pouco foi o mesmo questionado sobre a utilização de tais imagens pelas Requeridas (cfr. declarações de parte do Requerente, no depoimento prestado na audiência de julgamento de 24.05.2018, com duração de 00:29:02, de 00:11:48 a 00:14:24), sendo que essa falta de autorização foi julgada provada pelo Tribunal "a quo" , sem que as requeridas pusessem em causa tal facto (cfr. ponto 7 dos factos provados constantes da sentença recorrida).
15. Mais se diga, que também da prova produzida e não colocada em crise pelas ora Recorrentes resulta claro que a Reportagem Segredo dos Deuses foi transmitida com relatos de testemunhos, nomeadamente da mãe biológica do Recorrido, sendo que estes relatos foram transmitidos tendo sido protegida a identidade da Senhora Maria …., e não tendo sido revelado o seu nome verdadeiro (cfr. testemunho de Jacqueline … prestado na audiência de julgamento de 24.05.2018, com duração de 01:02:02, de 00:03:57 a 00:04:13).
16. Em suma, não obstante as imagens terem sido retiradas do Facebook do Recorrido, a verdade é que o Recorrido não autorizou a divulgação de tais imagens, não foi abordado previamente sobre a reportagem e do fim da utilização de tais imagens, resultando isso evidente da prova produzida nos autos.
17. As Recorrentes vêm alegar que não ficou demonstrado o requisito do justo receio, o que, salvo melhor opinião, não corresponde à verdade, nem pode acolher o merecimento deste douto Tribunal.
18. Ora, importa esclarecer que o "fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável" deve ser entendido, não em função de qualquer potencial violação, mas em função da demora na tutela definitiva desse direito. É por isso que, consideradas pela perspetiva da ação principal de que são dependência, as providências cautelares visam assegurar a utilidade dessa ação, pois que estas providências salvaguardam a utilidade da decisão proferida nessa ação perante qualquer situação decorrente de factos ocorridos antes do seu proferimento.
19. Neste contexto, releva salientar a especial protecção que os direitos de personalidade merecem, a nível nacional e internacional, o seu caracter de direitos absolutos e a sua natureza não patrimonial, que inferirá directamente na gravidade dos danos e na irreparabilidade da lesão.
20. Os direitos de personalidade do Requerente, ora Recorrido, mormente o direito à reserva da vida privada, dispõe de protecção a nível civilístico, nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 80.° do Código Civil, nos termos do qual: "todos devem guardar reserva quanto à intimidade da vida privada de outrem".
21. Tem entendido a nossa jurisprudência que a lesão de direitos de personalidade, em concreto do direito à reserva da vida privada, consubstancia uma lesão "irreparável na medida em que se trata de direito fundamental e a sua natureza não patrimonial impede a repristinação do estado anterior à ofensa".
22. Com a violação do direito à reserva da intimidade da vida privada, direito absoluto, "o resultado danoso confunde-se com a conduta lesiva", existindo a efectiva verificação do dano, a qual se traduz, in casu, na publicação dos episódios em apreço e na permanência da disponibilização dos mesmos nas plataformas digitais das Recorrentes.
23. Quanto mais tempo as Recorrentes puderem reproduzir a imagem (ainda presente em algumas frames) e o nome do Recorrido, maiores serão os danos sofridos na esfera pessoal do Recorrido que nenhuma acção de indemnização compensará, porquanto se trata de um direito fundamental, de carácter absoluto e natureza não patrimonial, cuja reconstituição natural é impossível.
24. Nestes termos, ao contrário do que pretendem as Recorrentes fazer crer, existe, no caso em apreço, fundado receio de que o direito geral de personalidade do Recorrido seja violado pelas Recorrentes, como já o foi, mas cuja ameaça de lesão continua actual em relação ao futuro, porquanto cada dia que passa em que a imagem e o nome do Recorrido permanecem identificados nas reportagens ainda disponíveis nas plataformas digitais das Recorrentes, é mais um dia em que uma nova pessoa o reconhece e identifica, disseminando cada vez mais a sua identidade.
25. Em suma, a conduta adoptada pelas Recorrentes traduz-se na violação dos direitos de personalidade do ora Recorrido, nos termos do disposto nos artigos 70.° e 80.° do Código Civil e no artigo 26.° da Constituição da República Portuguesa, verificando-se o fundado receio de que cause na esfera do Recorrido uma lesão grave que é, por definição, irreparável.
26. Vêm as Recorrentes alegar que a providência instaurada não é adequada para remover o perigo de lesão dos direitos de personalidade do Recorrido, afirmando, para o efeito, por um lado, que "decorridos mais de sete meses sobre a exibição da reportagem na antena da I e da sua disponibilização nos sítios de internet das requeridas" a esmagadora maioria do público interessado na temática da reportagem já a visionou e por outro, que "as reportagens dos autos encontram-se disseminadas por toda a internet".
27. Em primeiro lugar, importa salientar que o Recorrido não lançou mão da providência cautelar após sete meses da emissão da reportagem, tendo-o feito nas semanas imediatamente subsequentes à emissão dos primeiros dez episódios da reportagem em apreço nestes autos.
28. Não pode o Recorrido ser penalizado pela morosidade dos tribunais na tramitação da providência cautelar, a qual foge em absoluto do seu alcance e controlo, restando-lhe a possibilidade lhe ser facultada a intervenção dos tribunais para a defesa dos seus direitos.
29. Em segundo lugar, importa ressalvar que não vale para aqui a circulação e divulgação das reportagens na internet para legitimar a não aplicação de uma medida cautelar, pois a lesão que ocorra por aquela via não justifica a lesão que venha a ocorrer por outra via como é a da manutenção da imagem e nome do Recorrido nas reportagens ainda disponíveis nas plataformas digitais das Recorrentes, aliás, fonte primordial de acesso para quem queira rever ou procurar os episódios da reportagem denominada "O Segredo dos Deuses".
30. Ademais, entende a nossa jurisprudência maioritária que "as lesões ocorridas subsistentes fortalecem a convicção da gravidade da situação e reforçam a necessidade de tutela cautelar para evitar a repetição ou persistência dessas situações lesivas"
31. A medida cautelar decretada apenas determinou que se retirasse a imagem e o nome verdadeiro do Requerente, dos episódios que se encontram disponíveis nos sítios da Internet das ora Recorrentes, de modo a proteger a sua identidade. Por contraponto, veja-se que as Recorrentes não foram condenadas a retirar das referidas plataformas digitais a totalidade dos episódios em que o Requerente era identificado, mas tão só a ocultar a sua imagem e o seu nome.
32. A providência requerida é adequada a remover o periculum in mora, ou seja, o prejuízo da demora inevitável do processo, assegurando consequentemente a efectividade dos direitos de personalidade do requerente que estão a ser postos em causa ou ameaçados.
33. Termos em que, se encontra demonstrado, in casu, não só o fundado receio de lesão grave e de difícil reparação, como também a adequação da providência cautelar instaurada para remover a lesão reiterada pela conduta das ora Recorrentes, estando preenchidos os requisitos legais do artigo 362.° do Código de Processo Civil.
34. Nas suas alegações vêm os Recorrentes invocar que o Tribunal "a quo" efectou uma errada ponderação dos interesses em jogo no conflito de direitos entre os direitos do Requerente e os direitos das Requeridas. Os Recorrentes vêm alegar que a sua actuação está a coberto da liberdade de imprensa e que os direitos de personalidade do Recorrido não prevalecem sobre o referido direito das Recorrentes. Ora, salvo melhor opinião não assiste qualquer razão aos Recorrentes.
35. O direito à informação constitucionalmente consagrado não é um direito absoluto, comportando limitações que devem limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, com respeito pelos princípios da proporcionalidade, adequação e necessidade.
36. Sendo que o Supremo Tribunal de Justiça já entendeu que quando estiver em causa um interesse público que se sobreponha aos direitos de personalidade e a divulgação seja feita de forma a não exceder o necessário a tal divulgação, sendo exigível que a informação veiculada se cinja à estrita verdade dos factos.
37. Conforme consta da sentença recorrida e o Recorrido até pode admitir, os factos relatados na reportagem, sendo verdadeiros, que não são, têm interesse público. Acontece que a capa do interesse público não é uma carta branca dada aos Recorrentes para apresentarem, contarem, a história que entenderem, nem como entenderem. A verdade é que apesar de os factos poderem ser considerados de interesse público, isso não legitima os Recorrentes de incluírem na reportagem imagens não autorizadas do Recorrido, quer em criança, quer em adulto, de divulgarem a identificação do Recorrido e da sua família e factos relativos à sua infância e ao seu processo de adopção, constituindo essa divulgação uma lesão injustificada ao direito à imagem e reserva da vida privada do Recorrido.
38. Dos factos dados como provados na sentença recorrida resulta que na reportagem são expostos factos relativos à vida pessoal do Recorrido, sendo descritos factos relativos ao seu passado e ao seu processo de adopção, assim como são mostradas imagens do Recorrido, sem que para tal os Recorrentes tenham solicitado a autorização do Recorrido.
39. Conjugando tais factos com a natureza secreta do processo de adopção, a qual se encontra estabelecida na lei, a conclusão não pode ser outra se não a da existência de uma clara violação do direito à reserva da vida privada do Recorrido. Sendo que, como parece óbvio, para divulgarem os factos os Recorrentes não tinham de divulgar a identidade e a imagem do Recorrido e da sua família, podendo ter dado a mesma notícia sem incluir tais elementos.
40. A esta circunstância não obsta o facto de os Recorrentes terem retirado as imagens do perfil de Facebook do Recorrido. Conforme já entendeu o Tribunal da Relação do Porto.
41. Pelo que, no caso concreto, e ao contrário do entendimento dos Recorrentes, o direito à liberdade de imprensa não prevalece sobre o direito à imagem e reserva da vida privada do Recorrido, devendo o recurso improceder nesta parte.
42. Por tudo o supra exposto, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente e mantida na integra a sentença recorrida.

Termos em que:
a)- Deve o presente recurso ser julgado improcedente, no que respeita à impugnação sobre a matéria de facto;
b)- Deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente e em consequência, ser mantida, na integra, a decisão recorrida, assim se fazendo a costumada Justiça!!!”
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QUESTÕES A DECIDIR
Nos termos do disposto nos Artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial.[1] Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.[2]

Nestes termos, as questões a decidir que delimitam o objecto deste recurso, consistem em apreciar:
a)- Se se verificam os requisitos para reapreciação da matéria de facto apurada no tribunal recorrido e se esta deve ser alterada nos termos propugnados pelo recorrente;
b)- se se verificam os pressupostos para deferir o presente procedimento cautelar comum: se existiu violação do direito do requerente à reserva da intimidade da sua vida privada e à imagem, constituindo este violação lesão grave e dificilmente reparável destes direitos de personalidade e da adequação da providência para remover o perigo de lesão.
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Corridos que se mostram os vistos aos Srs. Juízes adjuntos, cumpre decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

O tribunal recorrido considerou a seguinte matéria de facto:
“1-As 1ª e 2ª RR. são jornalistas, desenvolvem a sua actividade profissional nos canais de televisão TV.. e TV…, e são autoras e responsáveis pelo conteúdo da reportagem denominada ‘O Segredo dos Deuses’ transmitida pela I, e disponível no ‘site www.tv....iol.pt’.

2-O 3º R. é o director do serviço de, e responsável pela orientação e supervisão do conteúdo dos, programas de televisão da TV..e TV…; os 4º e 5º RR. são directores-adjuntos, e, os 6º e 7º, subdirectores (fls 34v a 37).

3-A 8ª R. é proprietária dos serviços de programas televisivos da TV.. e TV…4 (fls 40 a 41v), e a 9ª R. é proprietária dos ‘sites’ da TV.. e TV… do portal ‘IOL’ - mostrando-se juntas a fls 220v a 227 as “CONDIÇÕES GERAIS – Autenticação MCD” emitidas pela 9ª R..

4-Em 19-XII-17 foi transmitido o 7º episódio da reportagem ‘O Segredo dos Deuses’ – cujo suporte se mostra junto aos autos e se dá aqui por reproduzido (sendo correcta a transcrição efectuada nos artigos 36º a 38º, 42º, 45º a 61º, 109º, 110º, 115º, 116º, 119º a 122º, 144º a 146º da p.i.).

5-Em 20-XII-17 foi transmitido o 8º episódio da reportagem ‘O Segredo dos Deuses’ – cujo suporte se mostra junto aos autos e se dá aqui por reproduzido (sendo correcta a transcrição efectuada nos artigos 63º a 68º, e 123º a 125º da p.i.).

6-Em 21-XII-17 foi transmitido o 9º episódio da reportagem ‘O Segredo dos Deuses’ – cujo suporte se mostra junto aos autos e se dá aqui por reproduzido (sendo correcta a transcrição efectuada nos artigos 70º a 82º da p.i.).

7-O A. não autorizou os RR. a divulgar de factos relativos à sua vida ou ao processo de adopção, ou imagens suas, em adulto ou em criança – nem teve conhecimento prévio do teor das reportagens.

8-Na sequência da transmissão da reportagem o A. foi identificado por desconhecidos, que o abordavam e queriam falar sobre o tema (“adopção ilegal”) – acabando o A. por ter de dar explicações a desconhecidos, para esclarecer os factos.

9-Por causa da transmissão da reportagem, o A. acabou por reviver episódios da sua infância que queria esquecer – tendo ficado chocado e consternado com o conteúdo da reportagem, e continua a sentir frustração e impotência por ver a sua imagem diariamente devassada nos conteúdos disponibilizados ‘on-line’.

Factos não demonstrados:
10- O A. sente-se vexado e humilhado perante milhares de pessoas que viram a reportagem.”
***

DA REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
Insurgem-se os 8º e 9º requeridos contra a decisão proferida sobre a matéria de facto que o tribunal deu como assente nos pontos 8 e 9, impetrando:
- a eliminação do facto nº8;
- a alteração do facto nº 9 para o seguinte “Por causa da transmissão da reportagem o A. acabou por reviver episódios da sua infância que queria esquecer.”, uma vez que das declarações do requerente e de sua mãe adoptiva, não resultaram adquiridos nem o facto nº8 nem a parte final do facto nº9.
Mais requerem o aditamento à matéria de facto, do por elas alegado: “As imagens do requerente utilizadas na reportagem Segredo dos Deuses foram retiradas de publicações do próprio na sua página de facebook.”, uma vez que tal facto resulta dos docs. 1 a 5 das suas oposições, do depoimento das suas testemunhas e das declarações do requerente e de sua mãe adoptiva.

Decidindo:
a)- Se se verificam os requisitos para reapreciação da matéria de facto apurada no tribunal recorrido e se esta deve ser alterada nos termos propugnados pelos recorrentes;
Relativamente aos requisitos de admissibilidade do recurso quanto à reapreciação da matéria de facto pelo tribunal “ad quem”, versa o artº 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, o qual dispõe que:
«Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a)- Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b)- Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c)- A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”

No que toca à especificação dos meios probatórios, «Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (Artigo 640º, nº 2, al. a) do Código de Processo Civil).

No que respeita à observância dos requisitos constantes deste preceito legal, após posições divergentes na nossa jurisprudência, o Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a pronunciar-se no sentido de que «(…) enquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.» [3]

Assim, “O que verdadeiramente importa ao exercício do ónus de impugnação em sede de matéria de facto é que as alegações, na sua globalidade, e as conclusões, contenham todos os requisitos que constam do art. 640º do Novo CPC.

A saber:
- A concretização dos pontos de facto incorrectamente julgados;
- A especificação dos meios probatórios que no entender do Recorrente imponham uma solução diversa;
- E a decisão alternativa que é pretendida.[4]

Como explicita LOPES DO REGO[5], o ónus imposto ao recorrente que impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto traduz-se do seguinte modo:
“a)- Na necessidade de circunscrever ou delimitar o âmbito de recurso, indicando claramente qual a parcela ou segmento – o ponto ou pontos da matéria de facto – da decisão proferida que considera viciada por erro de julgamento;
b)- No ónus de fundamentar, em termos concludentes, as razões porque discorda do decidido, indicando ou concretizando quais os meios probatórios (constantes de auto ou documento incorporado no processo ou de registo ou gravação nele realizada) que implicavam decisão diversa da tomada pelo tribunal, quanto aos pontos da matéria de facto impugnados pelo recorrente.”

Posto isto, no que toca à possibilidade e limites da reapreciação da matéria de facto, não obstante se garantir um duplo grau de jurisdição[6], tem este de ser enquadrado com o princípio da livre apreciação da prova pelo julgador, previsto no artº 607 nº 5 do C. P. Civil, sendo certo que decorrendo a produção de prova perante o juiz de 1ª instância, este beneficia dos princípios da oralidade e da mediação, a que o tribunal de recurso não pode já recorrer.

De acordo com Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, pág. 347, “Algumas das provas que permitem o julgamento da matéria de facto controvertida e a generalidade daquelas que são produzidas na audiência final (…) estão sujeitas à livre apreciação do Tribunal (…) Esta apreciação baseia-se na prudente convicção do Tribunal sobre a prova produzida (art.º 655.º, n.º1), ou seja, as regras da ciência e do raciocínio e em máximas da experiência”.

Assim, para que a decisão da 1ª instância seja alterada haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes.

E nessa aferição, tem o tribunal de recurso de conhecer o iter lógico da decisão explanada pelo juiz recorrido.

Com efeito, a exigência de fundamentação prevista no artº 154 do C.P.C., com assento constitucional nos termos do disposto nos artºs 205 nº1 e 20 nº4 da C.R.P., exige actualmente a indicação do processo lógico – racional que conduziu à formação da convicção do julgador, relativamente aos factos que considerou provados ou não provados, de acordo com o ónus de prova que incumbia a cada uma das partes, tendo em conta que, na formação da convicção do julgador rege o princípio da livre apreciação das provas, excepto nos casos previstos no nº 5 do artº 607 do C.P.C.- aqueles para cuja prova seja exigida formalidade especial, os que só possam ser provados por documentos e os que estejam já provados por acordo, documento ou confissão das partes.

É este dever de fundamentação imprescindível a um processo equitativo e contraditório, salvaguardando as garantias das partes e possibilitando a sua cabal reacção, em caso de discordância em relação a esta convicção, bem como assegurando que o tribunal de recurso tem todos os elementos necessários para a apreensão e reapreciação da matéria fáctica.

Conforme referido por Abrantes Geraldes (Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, págs. 296, 297,), “o dever de fundamentação introduzido pela reforma de 1961, reforçado em 1995 e agora transferido para a própria sentença que simultaneamente deve conter a enunciação dos factos provados e não provados e as respectivas implicações jurídicas “ exige que “se estabeleça o fio condutor entre a decisão sobre os factos provados e não provados e os meios de prova usados na aquisição da convicção, fazendo a respectiva apreciação crítica nos seus aspectos mais relevantes. Por conseguinte, quer relativamente aos factos provados, quer quanto aos factos não provados, o juiz deve justificar os motivos da sua decisão, declarando por que razão, sem perda da liberdade de julgamento garantida pela manutenção do princípio da livre apreciação das provas (…), deu mais credibilidade a uns depoimentos e não a outros, julgou relevantes ou irrelevantes certas conclusões dos peritos ou achou satisfatória ou não a prova resultante de documentos. É na motivação que agora devem ser inequivocamente integradas as presunções judiciais e correspondentes factos instrumentais (…). Se a decisão proferida sobre algum facto essencial não estiver devidamente fundamentada a Relação deve determinar a remessa dos autos ao tribunal de 1ª instância, a fim de preencher essa falha com base nas gravações efectuadas ou através de repetição da produção da prova, para efeitos de inserção da fundamentação da decisão sobre a matéria de facto.”[7]

A violação deste dever de fundamentação não se confunde com a nulidade da sentença por falta de fundamentação e determina a consequências previstas no artº 662 nº2 c) e d) do C.P.C.

Ora, apesar de nas suas alegações os recorrentes se referirem a deficiente fundamentação do tribunal recorrido, quanto a esta matéria, não a tendo feito constar nas suas conclusões, o certo é que o tribunal recorrido, fundamentou a sua decisão quanto a estes pontos de facto, da seguinte forma:
“A matéria dos pontos 7 a 10 foi julgada com base nas declarações de Parte do A. (que declarou que recebeu ‘links’ com a reportagem, pelo ‘facebook/messenger’, onde começaram a falar mal da sua família; e que ficou afectado por ter vindo tudo à tona/relembrar tudo – podendo ter causado o nascimento prematuro do filho -, tendo ligado para a mãe, com medo de a perder) – conjugadas com as de sua mãe, Jacqueline …… (que contou que o A. lhe telefonou, com medo e perder mãe e pai: ‘parece que voltou a ser criancinha’).”

Daqui decorre que o tribunal recorrido fundamentou a sua decisão de facto, de forma perceptível, tendo ainda em conta a natureza cautelar, célere deste procedimento e a natureza indiciária da prova nele produzida.

Posto isto, passando à apreciação concreta dos pontos da matéria de facto impugnados, este tribunal procedeu ao visionamento das referidas reportagens, à audição da prova (testemunhal e por declarações de parte) e examinou os articulados e documentos juntos aos autos.

Passando ao primeiro fundamento de discordância, alega o recorrente que os pontos da matéria de facto nºs 8 e 9 foram incorrectamente julgados, devendo assim ser eliminado o facto nº8 e restringido o nº9, por do depoimento da mãe adoptiva do requerente e das suas declarações de parte, não decorrer esta realidade.

Ora, ouvidas umas e outras, não tem o recorrente razão.

A mãe do requerente aqui inquirida, Jacqueline …., expressamente referiu que recebeu um telefonema do seu filho, estando este muito alterado, referindo que não queria perder o pai nem a mãe, que o trauma que durante muitos anos combateu por causa da sua infância difícil, da sua marca de nascença (referida nas reportagens), voltou à tona e que, a partir daquele momento passou a sofrer de grande ansiedade e pressão pela exibição destas reportagens e sua divulgação online, que se reflectiram na sua relação com a família, incluindo com a sua esposa.

Por sua vez, o requerente aqui expressou de forma clara a sua angústia e incómodo por ver relatados estes factos que se esforçara por esquecer, por se ver abordado por desconhecidos que, inclusive na sua página de facebook, pediam explicações e comentavam o sucedido, relatando episódios em que foi abordado em Portugal, em espaços públicos, por causa destas reportagens.

Ora, as declarações de parte são um meio de prova de livre apreciação do julgador, não sendo consideradas um meio de prova menor, em especial quando referidas a factos do foro íntimo do declarante, como o seu estado de espírito face às reportagens em causa, aqui confirmadas também pela sua mãe, sendo que ouvidas as declarações de parte do requerente, afiguraram-se-nos credíveis e conformes às regras de experiência comum, tendo em conta o teor das reportagens em causa.

Mantêm-se pois inalterados estes pontos da matéria de facto.

Por último, em relação ao ponto que os recorrentes pretendem ver aditado, é assente que estas fotografias que constam das aludidas reportagens, foram retiradas do facebook do requerente, cfr. resultou do depoimento da testemunha Jacqueline …. e das declarações de parte e resulta dos docs. 1 a 5 juntos pelos recorrentes nas suas oposições.

É certo que tal facto deve ser enquadrado com o ponto nº 7 da matéria de facto assente mas, baseando-se a defesa dos recorrentes também neste ponto (de que as imagens utilizadas eram já públicas por acto do requerente), deve este ponto ser aditado à matéria de facto, sob o nº 6-A., retirando-se após as devidas conclusões em sede de apreciação e enquadramento jurídico destes factos.

Adita-se pois este ponto à matéria de facto adquirida pelo tribunal recorrido, com a seguinte redacção:
“6-A- As imagens do requerente utilizadas na reportagem Segredo dos Deuses foram retiradas de publicações do próprio na sua página de facebook.”
***

FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
Invocam os recorrentes que o julgador de primeira instância fez uma errada apreciação dos direitos em confronto, não resultando violado nem comprimido qualquer direito do requerente, não se verificando ainda os requisitos de decretação das providências cautelares comuns, como o periculum in mora, o receio de uma lesão grave e dificilmente reparável de um direito, alegando ainda que, tendo decorrido mais de sete meses de difusão desta reportagem, não é de prever que a visualização desses conteúdos no site da I seja incrementado, pelo que não faz sentido decretar esta providência.

A este entendimento se opõe o requerente, ora recorrido, considerando ainda que a lesão de direitos de personalidade, em concreto do direito à reserva da intimidade da vida privada, consubstancia uma lesão "irreparável na medida em que se trata de direito fundamental e a sua natureza não patrimonial, impede a repristinação do estado anterior à ofensa".
Passemos assim à apreciação do segundo segmento deste recurso, que se prende com os requisitos para o decretamento de providências cautelares comuns:

b)- se se verificam os pressupostos para deferir o presente procedimento cautelar comum: se existiu violação do direito do requerente à reserva da intimidade da sua vida privada e à imagem, constituindo este violação lesão grave e dificilmente reparável destes direitos de personalidade e da adequação da providência para remover o perigo de lesão.
Recorde-se que com o decretamento deste procedimento cautelar, visou o aqui recorrido a defesa dos seus direitos de personalidade, alegadamente lesados pelo conteúdo de reportagens televisivas realizadas e divulgadas pelas recorrentes, nomeadamente o direito à imagem e à reserva da intimidade da sua vida privada.
Ora, estes invocados direitos pertencem à categoria dos direitos absolutos, como tais oponíveis a todos os terceiros que os têm de respeitar.
Tais direitos encontram consagração no nosso regime civilista que, nos artigos 70 e segs. do C.C., estabelece a protecção de todos os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral, ao seu bom nome, à imagem e reputação, consagrando no artº 80 que “todos devem guardar reserva quanto à intimidade da vida privada de outrem” (nº1) sendo a extensão dessa reserva “definida conforme a natureza do caso e a condição das pessoas”.

Por sua vez dispõe o artº 79 do C.C. que “O retrato de uma pessoa não pode ser exposto, reproduzido ou lançado no comércio sem o consentimento dela (…).” (nº1) excepcionando a exigência deste consentimento quando “assim o justifiquem a sua notoriedade, o cargo que desempenhe, exigências de polícia ou de justiça, finalidades científicas ou culturais, ou quando a reprodução da imagem vier enquadrada na de lugares públicos, ou na de factos de interesse público ou que hajam decorrido publicamente.”(nº2)

Têm estes direitos de personalidade, assento constitucional, nela se prevendo a protecção da dignidade da pessoa humana como fundamento da sociedade e do estado, mormente nos artºs 13 (princípio da igualdade), 24 (inviolabilidade da pessoa humana), 25 (direito à integridade moral e física da pessoa humana) e 26 da CRP, que ressalva, em especial, o direito ao bom nome e reputação do ser humano.

Estes preceitos constitucionais, respeitantes aos direitos, liberdades e garantias, são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas (conforme decorre do artº 18 da C.R.P.)

A defesa destes direitos, decorre ainda da Declaração Universal dos Direitos do Homem, cujas normas são objecto de automática recepção no nosso ordenamento jurídico (artº 8 nº1 da C.R.P.), estipulando-se no seu artº 12, que ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio, ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e consideração, igualmente se consagrando o direito à liberdade de expressão (artº 19 (estabelecendo o art.29º, nº2, o critério de harmonização dos diversos direitos).

De igual modo, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, acolhe este princípio no seu artº 8, estipulando o respeito pela vida privada e familiar (incluindo a identidade e imagem), domicílio e correspondência.

Tem sido entendido, entre nós, quer a nível doutrinal, quer a nível jurisprudencial, que a CEDH ocupa «uma posição infraconstitucional, estando portanto a sua aplicação na ordem interna dependente da sua conformidade aos preceitos da nossa lei fundamental» e que tem um «valor supra-legal, pelo que as leis internas posteriores a um tratado internamente recebido que contrariem o disposto nos seus comandos não poderão, nessa medida, ser aplicadas pelos tribunais» (Cfr. Rui Moura Ramos, «A Convenção Europeia dos Direitos do Homem – Sua posição face ao ordenamento jurídico português» e «Aplicação da Convenção Europeia dos Direitos do Homem – Alguns Problemas», in Documentação e Direito Comparado – BMJ, 1980 e 1983, respectivamente). Os juízes nacionais estão, deste modo, vinculados à CEDH, porquanto, tendo sido ratificada e publicada, constitui direito interno que, como tal, deve ser interpretada e aplicada, primando, em termos constitucionais, sobre a lei interna (art.8º, da CRP). Aliás, nos termos do nº2, do art.16º, da CRP, «Os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem».[8]

São estes, “direitos subjectivos, privados, absolutos, gerais, extra-patrimoniais, inatos, perpétuos, intransmissíveis, relativamente indisponíveis, tendo por objecto os bens e as manifestações interiores da pessoa humana, visando tutelar a integridade e o desenvolvimento físico e moral dos indivíduos e obrigando todos os sujeitos de direito a absterem-se de praticar ou de deixar de praticar actos que ilicitamente ofendam ou ameacem ofender a personalidade alheia sem o que incorrerão em responsabilidade civil e/ou na sujeição às providências cíveis adequadas a evitar a ameaça ou a atenuar os efeitos da ofensa cometida.” (In Capelo de Sousa, “A Constituição e os Direitos de Personalidade”, Estudos sobre a Constituição, Vol. 2, Pág. 93.)

Por outro lado, como princípio constitucionalmente previsto, conta-se ainda o direito, a todos conferido, de exprimir e de divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações (artº 37 da C.R.P.), erigindo-se como princípio constitucional, em concreto, a liberdade de imprensa (artº 38 da CRP).

Este direito de expressão e de informação (livres), conforme se refere no Ac. do Tribunal Constitucional nº 113/97, In BMJ 464, pág. 121 e segs., cobnstitui “no dizer de Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., pág. 225), e na vertente do «direito de expressão», de um direito que, enquanto direito negativo ou de defesa perante o poder público, implica «o direito de não ser impedido de exprimir-se», inculcando ainda, na sua dimensão positiva, um direito «de acesso aos meios de expressão» (...); na vertente de «direito de informação» o direito de informar consiste, desde logo, na liberdade de transmitir ou comunicar informações a outrem, de as difundir sem impedimentos», direito que, no seu actuar positivo, implicará o «direito a meios para informar».

A liberdade de imprensa constitui um dos elementos essenciais de liberdade de expressão, incumbindo à imprensa difusão das informações e interesse públicos e ao público o direito a receber a informação e a poder conhecer e julgar outras ideias e atitudes, para lá das defendidas pelos seus dirigentes.

È um direito que à semelhança do direito à reserva de vida privada e familiar, encontra acolhimento e defesa na Convenção Europeia dos Direitos do Homem (artº 10), admitindo-se que no exercício da actividade jornalística, o jornalista possa formular juízos críticos e de valor, sendo no entanto, que o seu exercício, está sujeito aos princípios da relevância e proporcionalidade. 

Na nossa ordem interna, conforme resulta do Estatuto dos Jornalistas (aprovado pela Lei nº 1/99, de 13.01, na redacção da Lei 64/2007 de 06.11), este direito de informação, não está sujeito a impedimentos ou discriminações, nem subordinado a qualquer forma de censura, estando garantida a liberdade de expressão e de criação (artºs. 6º, 7º), mas sendo dever dos jornalistas exercer a actividade com respeito pela ética profissional, informando com rigor (artº14).

Com efeito, dispõe o artº 14 do Estatuto dos Jornalistas que são deveres fundamentais do jornalista:
i)- exercer a actividade com respeito pela ética profissional, informando com rigor e isenção;
ii)- abster-se de formular acusações sem provas;
iii)- respeitar a privacidade de acordo com a natureza do caso e a condição das pessoas;
iv)- não falsear ou encenar situações.”

Por seu turno, o Código Deontológico dos Jornalistas refere como deveres essenciais a observar no exercício da actividade: “9. O jornalista deve respeitar a privacidade dos cidadãos, excepto quando estiver em causa o interesse público ou a conduta do indivíduo contradiga, manifestamente, valores e princípios que publicamente defende. O jornalista obriga-se, antes de recolher declarações e imagens, a atender às condições de serenidade, liberdade e responsabilidade das pessoas envolvidas”.

Decorre ainda do artº 1 da Lei de Imprensa, aprovada pela Lei 2/99 de 13 de Janeiro (na redacção da Lei 78/2015, de 29/07), que é garantida a liberdade de imprensa, quer escrita quer decorrente de emissões televisivas, conforme resulta da Lei de Televisão (lei 27/2007 de 30/07, alterada pela Lei 78/20015 de 29/07), não constituindo no entanto, este direito de exprimir e divulgar o seu pensamento e de informar, em si, um cheque em branco, mas a ser exercido com responsabilidade e tendo como únicos limites “...os que decorrem da Constituição e da lei, de forma a salvaguardar o rigor e a objectividade da informação, a garantir os direitos ao bom nome, à reserva da intimidade da vida privada, à imagem e à palavra dos cidadãos e a defender o interesse público e a ordem democrática.” (artº 3 da Lei de Imprensa)

Idêntica limitação se estabelece na Lei de Televisão que, no seu artº 27, sob a epígrafe “Limites à liberdade de programação” estabelece que “A programação dos serviços de programas televisivos e dos serviços audiovisuais a pedido deve respeitar a dignidade da pessoa humana e os direitos, liberdades e garantias fundamentais”.

Conforme referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, pág 575, “do nº 3 do artigo 37º da CRP se pode concluir que há certos limites ao exercício do direito de exprimir e divulgar livremente o pensamento, cuja infracção pode conduzir a punição criminal ou administrativa. Esses limites visam salvaguardar os direitos ou interesses constitucionalmente protegidos de tal modo importantes que gozam de protecção, inclusive, penal. Entre eles estarão designadamente os direitos dos cidadãos à sua integridade moral, ao bom nome e reputação (cfr. art. 26º); a injúria e a difamação ou o incitamento ou instigação ao crime (que não se deve confundir com a defesa da descriminalização de certos factos) não podem reclamar-se de manifestações da liberdade de expressão ou de informação”.

Tratando-se ambos de direitos constitucionalmente garantidos, em
caso de conflito entre o direito de liberdade de informação e o direito à imagem e à reserva da intimidade da vida privada, deverá ser este resolvido de acordo com os princípios gerais e constitucionais tendo em conta os art. 37.°, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa e 29.º, n.º 1 da Lei da Imprensa e o disposto no artº 18 nº2 da CRP, nos termos do qual: «A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos».

Volvendo a Gomes Canotilho e Vital Moreira, (ob.cit., págs.392 e 393), este princípio da proporcionalidade, também chamado princípio da proibição do excesso, desdobra-se em três subprincípios: princípio da adequação (as medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se como um meio adequado para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); princípio da exigibilidade (essas medidas restritivas têm de ser exigidas para alcançar os fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos para alcançar o mesmo desiderato); princípio da justa medida ou da proporcionalidade em sentido estrito (não poderão adoptar-se medidas excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos).[9]

Decorre ainda do disposto no artº 335 nº1 do C.C., que o conflito entre direitos iguais ou da mesma espécie resolve-se pela cedência de todos, na medida do necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito, sem maior detrimento para qualquer das partes, só prevalecendo o que se deva considerar superior, se os direitos forem desiguais ou de espécie diferente (nº2).

Posto isto, conforme se refere no Ac. do S.T.J de 2017, acima citado “a nossa jurisprudência sobre liberdade de expressão, no seu confronto com o direito à honra, tende, em geral, a defender o primado deste sobre aquela (cfr., entre outros, os Acórdãos do STJ, de 26/4/94, de 14/2/02, de 7/3/02 e de 8/3/07, in www.dgsi.pt). Constata-se, pois, que, enquanto pelo lado do TEDH a solução das questões relacionadas com a ingerência na liberdade de expressão é feita tendo em consideração o seu carácter excepcional e a importância fulcral dessa liberdade numa sociedade democrática, pelo lado das instâncias nacionais há uma tendência clara para secundarizar a liberdade de expressão e para sobrevalorizar o direito à honra. O que tem valido a Portugal algumas condenações pelo TEDH, por violação do art.10º, da CEDH [cfr. os casos … c. Portugal (2000), … c. Portugal (2005), … c. Portugal (2005), … c. Portugal (2007), … c. Portugal (2007), … c. Portugal (2008), …, Ld.ª c. Portugal (2016) e MM … c. Portugal (2017)]. Refira-se, a propósito, que, nos casos em que o Estado Português vier a ser condenado pelo TEDH, por violação das normas da CEDH, pode ser interposto recurso de revisão para o tribunal que proferiu a decisão a rever [cfr. o art.449º, nº1, al.g), do CPP, introduzido pela Lei nº48/2007, de 29/8, e o art.771º, al.f), do CPC, introduzido pelo DL nº303/2007, de 24/8 (art.696º, al.f), do NCPC)].Seguiram-se, assim, as injunções da Recomendação R (2000), de 19 de Janeiro de 2000, do Comité de Ministros do Conselho da Europa, que constitui um instrumento soft law, a qual instou os Estados a prever a possibilidade de reabertura dos processos internos quando a reapreciação constituir o meio necessário para reparar o direito afectado nos casos de declaração de violação pelo TEDH.”[10]

Verifica-se, porém, que a jurisprudência nacional tem vindo a operar um ponto de viragem, tendo por base e fundamento o relevo, a dignidade e a dimensão da liberdade de expressão, como se diz no Acórdão do STJ, de 7/3/07 (cfr., ainda, os Acórdãos do STJ, de 7/2/08, 10/7/08, 30/6/11, 28/6/12, 8/5/13, 21/10/14 e 19/4/16, onde se constata a influência do paradigma jurisprudencial do TEDH)[11]

Nesta medida, conforme se sustentou no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Maio de 2013, (processo 1755/08), “Na medida em que se confrontem direitos constitucionalmente tutelados, não é possível estabelecer-se, em abstrato, qualquer relação de prevalência ou de hierarquia entre eles, nomeadamente os acolhidos pelas referidas normas e princípios consagrados na Lei Fundamental. Ambos se perfilam no mesmo patamar, portadores da mesma dignidade constitucional, a todos vinculam, são de aplicabilidade direta e apenas susceptíveis de restrições impostas por lei ou por outras normas ou princípios constitucionais, protetores de um "bem constitucionalmente valioso", com respeito pelos princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade (art. 18º CRP). São, de resto, esses princípios que hão de presidir à possibilidade de conciliação entre direitos fundamentais que se apresentem como incompatíveis.

Têm de aceitar-se, então, «restrições implícitas, derivadas, também elas, da necessidade de salvaguardar "outros direitos e interesses constitucionalmente protegidos" (art. 18º-2 cit.; cf. Jorge Miranda – Rui Medeiros, "Constituição Portuguesa Anotada, I, 160-162).

Ainda conforme estes Autores, não sendo admitidos, para direito de livre expressão, nenhum tipo e nenhuma forma de censura, tal não significa, como também já se deixou dito, que a liberdade de expressão não esteja sujeita «a concordância prática com outros direitos, designadamente com os direitos pessoais (artigos 25º, nº 1 e 26º).

Assim, como é igualmente defendido no Acórdão do STJ, de 7/2/08[12]: «Da jurisprudência que vem sendo firmada por este (TEDH), resulta uma imposição no modo de pensar: Não se justifica que se pense, logo à partida, sobre se determinada peça jornalística ofende alguém. Deverá, antes, partir-se da liberdade de que gozam o ou os respectivos autores. Só depois, se deve indagar se se justifica – atentos os critérios referenciais do mesmo tribunal, com inclusão duma margem de apreciação própria por parte dos órgãos internos de cada um dos Estados signatários da Convenção – a ingerência restritiva no campo dessa mesma liberdade e a consequente ida para sanções legais».

Com efeito, a regra é a da liberdade de informar, mas com respeito dos direitos dos cidadãos, como resulta do disposto no acima mencionado art 12º da D.U.D.H. que, no que concerne à intimidade, à honra e à reputação, prescreve que ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família ou na sua correspondência nem ataques à sua honra e reputação, e que contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito à protecção da lei.

De igual modo, no nº 2 do art 10º da C.E.D.H. prevê-se que, justamente porque o exercício do direito à liberdade de expressão "implica deveres e responsabilidades", este pode ser submetido a "sanções, previstas pela lei, que constituam providências necessárias, numa sociedade democrática, para a segurança nacional, a integridade territorial ou a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do crime, a protecção da saúde e da moral, a protecção da honra ou dos direitos de outrem…”

Ou seja, esta liberdade é, obviamente, uma liberdade responsável, e se ela não deve ultrapassar certos limites, atendendo designadamente à protecção da reputação e aos direitos da pessoa, compete-lhe contudo comunicar, com respeito dos seus deveres e das suas responsabilidades, informações e ideias sobre todas as questões de interesse geral. Tratando-se de questões de interesse geral, cabe à imprensa divulgar as informações e ideias a estas respeitantes e ao público o direito de as receber (entre outros, o Ac. do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, de 27-08-2004, no caso Rizos e Daskas c. Grécia). No entanto, tais informações e ideais devem cingir-se ao fim para que é concedida e não prosseguir outros fins, da satisfação da mera curiosidade e quando aborda a vida privada das pessoas.

Tal direito legítimo da liberdade de expressão e de informação, porque tem de coexistir com outros direitos fundamentais de igual dignidade constitucional, não pode deixar de sofrer os limites exigidos pelas necessidades de convivência social, imanente à vida em sociedade (Ac. 74/84, de 10-07-1984, do Tribunal Constitucional, DR II Série de 11-09-1984)”[13].

Volvendo ao caso concreto, constando destas reportagens a divulgação de factos supostamente integradores de um esquema de adopções ilegais, levadas a cabo por uma Igreja de grande dimensão e expressão públicas, nelas identificada, são estes factos, pela sua gravidade, a serem verídicos, de inegável interesse público e merecedores de divulgação.

Sendo estes putativos factos (esquema de adopções ilegais) merecedores de divulgação, o que está em causa neste recurso é a forma como foi feita esta divulgação, em especial nas reportagens objecto deste recurso.

Analisando as mesmas, verifica-se que:
- delas constavam o nome verdadeiro dos menores alegadamente objecto de adopção ilegal (ou roubo na versão da suposta mãe biológica), o nome adoptado por estes menores e o nome dos seus adoptantes, bem como fotografias dos menores, quer em crianças, quer em adultos;
- o nome da alegada mãe biológica, foi por sua vez alterado e a sua imagem encoberta, de forma a evitar o seu reconhecimento.
Ora, verificando-se das certidões juntas aos autos, que efectivamente decorreu processo de adopção plena destes menores junto do ordenamento jurídico português, que a decretou, este processo, cfr. refere o juiz de 1ª instância, é secreto.

Com efeito, já nos termos do disposto no artº 169 do D.L. Decreto-Lei nº 314/78 de 27-10-1978, Quando o adoptando tiver sido declarado abandonado ou confiado a um estabelecimento público ou particular de assistência e o adoptante se opuser a que a sua identidade seja revelada aos pais naturais, o processo de adopção é secreto, podendo ser unicamente mostrado ao adoptante ou ao adoptado, maior ou emancipado,”, constituindo “A violação do segredo do processo de adopção (…) crime de desobediência.”

Nas diversas alterações a este diploma legal, foi-se reforçando o carácter secreto deste procedimento de adopção, instituindo-se actualmente no artº 4 da Lei 143/2015 de 08/09 que “1- A fase judicial e os demais procedimentos administrativos e judiciais que integram o processo de adoção, incluindo os seus preliminares, têm carácter secreto.

2- O processo de adoção, incluindo os seus preliminares, pode ser consultado pelo adotado depois de atingida a maioridade.
3- Por motivos ponderosos e nas condições e com os limites a fixar na decisão, pode o tribunal, a requerimento de quem prove interesse legítimo, ouvido o Ministério Público, se não for o requerente, autorizar a consulta dos processos referidos no n.º 1 e a extração de certidões.
(…)
5- A violação do segredo dos processos referidos no n.º 1 e a utilização de certidões para fim diverso do expressamente autorizado constituem crime a que corresponde pena de prisão até um ano ou multa até 120 dias.”

Por outro lado, mais se dispõe no artº 5 deste diploma que, sob a epígrafe “Segredo de identidade” que “1- Todas as entidades públicas e privadas têm o dever de adotar as providências necessárias à preservação do segredo de identidade a que se refere o artigo 1985.º do Código Civil.” e que “2 - No acesso aos autos, nas notificações a realizar no processo de adoção e nos respetivos procedimentos preliminares, incluindo os de natureza administrativa, deve sempre ser preservado o segredo de identidade, nos termos previstos no artigo 1985.º do Código Civil.”
Este segredo de identidade previsto no artº 1985 do C.C., respeita à identidade do adoptante, que não pode ser revelada aos pais naturais do adoptado, salvo se este consentir na revelação.

Posto isto, estas normas instituídas no processo de adopção, têm razão de ser, com vista à constituição de uma nova filiação e à destruição dos vínculos familiares entre o adoptado e a sua família biológica e não podem ser destruídos nem postos em causa, com base num putativo direito a informar.

Nem nenhum interesse público justificava esta exposição pública da identidade e nome dos nela visados, ao contrário do alegado pelos recorrentes.

Repare-se que, de forma inexplicável e com evidente dualidade de critérios, os recorrentes tiveram o cuidado de omitir a identidade e imagem da alegada mãe natural, mas não tiveram idêntico cuidado de omitir a verdadeira identidade e imagem dos menores visados (alegadamente as verdadeiras vítimas deste suposto esquema de adopções ilegais) e de suas famílias.

E nada, mas absolutamente nada, justificava tal atitude que, não só viola uma disposição legal que visou tornar secreto o processo de adopção, incluindo a identidade do adoptante (aqui revelada ao mundo) como viola de forma inadmissível o direito dos nele visados, o então menor e aqui recorrente, de reserva daquilo que constitui a sua vida íntima, relatando factos respeitantes à sua mãe biológica e à sua infância que são objectivamente traumáticos em si, relatando factos relativos à sua alegada adopção que, a serem verídicos, o são igualmente, divulgando a sua identidade e imagens actuais, com vista a tornar perfeitamente identificáveis e reconhecíveis, os nela visados.

Ora, qual o interesse público nesta divulgação da identidade e imagem das supostas vítimas (os menores), ocultando por sua vez, o nome, voz e imagem da suposta mãe biológica?

Não vislumbramos nenhum que tenha consagração legal, nem nenhum foi alegado, sendo certo que este suposto direito a informar, não era incompatível com a ocultação das imagens e nomes dos menores visados e de todos os elementos que permitissem identificá-los na actualidade.

O direito a informar não é, repete-se, um cheque em branco e tem de ser exercido com responsabilidade e com respeito pela dignidade da pessoa humana.

Não consiste, nem se efectiva apenas, pelo relatar, online, de forma pública e visível para os menores visados, destes factos, sendo certo que “A informação jornalística deve procurar causar o menor mal possível, pelo que quando se ultrapassam os limites da necessidade informativa ou quando os processos são, de per si, injuriosos, a conduta é ilegítima” (cfr. Prof. Beleza dos Santos, in RU, Ano 92°, págs. 165 e sgs.)

Por outro lado, a alegação de que estas imagens terão sido retiradas do facebook do requerente, não tem qualquer relevância, face ao disposto no artº 79 nº1 do C.C. nem se pode considerar uma limitação voluntária dos direitos de personalidade, por parte do requerente.

Denote-se que, nos termos do disposto no artº 81 do C.C., os direitos de personalidade só podem ser limitados por acto do próprio titular, excepto se for contrária aos princípios da ordem pública.

Ora, se hoje se vulgarizou o uso de plataformas electrónicas na internet, tais como o facebook, o instagram e outras, para divulgação de mensagens, fotografias e aspectos da vida privada dos seus titulares (ou daquela que se quer apresentar, como vida mais ou menos privada), tal não significa uma autorização implícita para que estes conteúdos sejam reproduzidos noutras sedes e com outros fins, sejam publicitários, comerciais, divulgação de notícias, etc.

Este consentimento tem de ser expresso, sendo apenas excluída a necessidade de consentimento nos casos em que a notoriedade do visado, o cargo que desempenhe, exigências de justiça ou polícia, finalidades científicas, didácticas ou culturais, o justifique, ou quando a reprodução da imagem vier enquadrada na de lugares públicos, na de factos de interesse público ou que hajam decorrido publicamente.

Não é o requerente uma pessoa pública, parte dos factos relatados estão cobertos pelo segredo aplicável aos processos de adopção, os demais factos que nele são relatados como tendo ocorrido, são factos que, a serem verdadeiros, são de inegável interesse público, mas sem que este interesse público seja prosseguido à custa dos então menores, nela visados.  

Aliás mesmo nos casos em que existe notoriedade do visado e enquadramento público “não justificam, sem mais, a liberdade de divulgação do retrato- há que, caso a caso ponderar, se se verificam as razões de valor informativo que estão na base dessa liberdade.”-Ac. do S.T.J. de 13/03/2001, proferido no proc. nº 01B2853, relatado pelo Sr. Conselheiro Quirino Soares, disponível para consulta in www.dgsi.pt

Repare-se que a decisão aqui recorrida apenas determinou que as recorrentes “removam ou ocultem, dos episódios 7 a 9 da reportagem ‘O Segredo dos Deuses’, a imagem da face do A., e o seu nome verdadeiro” e não que estas reportagens fossem eliminadas.

Por último a alegação dos recorrentes de que, tendo a reportagem em apreço sido exibida em Dezembro de 2017 e partilhada na internet, estaria já consumada qualquer eventual lesão, não sendo de prever que a visualização desses conteúdos no site da I seja incrementado, não tem razão de ser.

Estando tais conteúdos disponíveis na internet, no site da I, a lesão dos direitos do requerente, aqui recorrido, consuma-se a cada visualização e prolonga-se enquanto a sua imagem e nome aí estiver disponível, com ligação a estes factos.

As reportagens em apreço, continuam disponíveis para quem as quiser visualizar, sem que se veja que exista superior interesse público que se sobreponha ao do requerente de não pretender ver divulgados nem o seu nome, nem a sua imagem, relacionados com estes factos (de que, a serem verdadeiros, será a principal vítima).
Estão pois verificados os requisitos necessários à decretação desta providência: fundado receio de uma lesão grave e dificilmente reparável do direito do requerente ao seu bom nome, imagem e reserva da intimidade da sua vida privada, que se prolonga com a continuação do visionamento destas reportagens sem as limitações introduzidas pela decisão recorrida-ocultação ou remoção do nome e imagem do requerente- sendo esta adequada a evitar esta lesão (sem ao mesmo tempo impedir o direito das recorridas a informar).  
***

DECISÃO.
Pelo exposto, acordam os Juízes desta relação em:
a)- julgar improcedente a apelação interposta, confirmando a decisão recorrida.
Custas pelas apelantes pelo decaimento no recurso interposto.


Lisboa, 11/12/2018


(Cristina Neves)
(Manuel Rodrigues )
(Ana Paula A.A. Carvalho)


[1]Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pp. 84-85.
[2]Abrantes Geraldes, Op. Cit., p. 87.
Conforme se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.7.2016, Gonçalves Rocha, 156/12, «Efetivamente, e como é entendimento pacífico e consolidado na doutrina e na Jurisprudência, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação». No mesmo sentido, cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4.10.2007, Simas Santos, 07P2433, de 9.4.2015, Silva Miguel, 353/13.
[3]Ac. STJ de 01.10.2015, proc. 824/11.3TTLRS.L1.S1, Ana Luísa Geraldes; Ac. STJ de 14.01.2016, proc. n.º 326/14.6TTCBR.C1.S1, Mário Belo Morgado; Ac. STJ de 11.02.2016, proc. n.º 157/12.8TUGMR.G1.S1, Mário Belo Morgado; Ac. STJ, datado de 19/2/2015, proc. nº 299/05, Tomé Gomes; Ac. STJ de 22.09.2015, proc. 29/12.6TBFAF.G1.S1, 6ª Secção, Pinto de Almeida; Ac. STJ, datado de 29/09/2015,proc. nº 233/09, Lopes do Rego; Acórdão de 31.5.2016, Garcia Calejo, proc. nº 1572/12; Acórdão de 11.4.2016, Ana Luísa Geraldes, proc. nº 449/410; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27.1.2015, Clara Sottomayor, proc. nº 1060/07.
[4]Ac. STJ. de 03.03.2016, Ana Luísa Geraldes, proc. nº 861/13.3TTVIS.C1.S
[5]Comentários ao Código de Processo Civil, Almedina, pág.465
[6]Cfr. o Acórdão da Relação de Guimarães de 04.02.2016, no Proc. 283/08.8TBCHV-A.G1, disponível em www.dgsi.pt, com o seguinte sumário: «Para que a decisão da 1.ª instância seja alterada, haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “prudente convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção, retratada na resposta que se deu à factualidade controvertida, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente aferir da razoabilidade da convicção formulada pelo juiz da 1.ª instância, face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, sem prejuízo do poder conferido à Relação de formular, nesse julgamento, com inteira autonomia, uma nova convicção, com renovação do princípio da livre apreciação da prova.»
De igual modo, cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31.05.2016, no Proc.1572/12.2TBABT.E1.S1, disponível na mesma base de dados, decidindo que «O Tribunal da Relação deve exercer um verdadeiro e efectivo 2.º grau de jurisdição da matéria de facto e não um simples controlo sobre a forma como a 1.ª instância respondeu à matéria factual, limitando-se a intervir nos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, pois que só assim se assegurará o duplo grau de jurisdição, em matéria de facto, que a reforma processual de 1995 (DL n.º 329-A/95, de 12-12) visou assegurar e que o actual Código confirmou e reforçou.»
[7]No mesmo sentido vidé Ac. do S.T.J. de 02-10-2008, relator Lázaro Faria, Proc. nº 07B1829; Ac. do T.R.Porto de 05-03-2015, relator Aristides Rodrigues de Almeida, Proc. nº 1644/11.0TMPRT-A.P1 e Ac. do T.R.Guimarães de 29/06/17, Proc. nº 13/15.8T8VCT.G1, todos disponíveis in www.dgsi.pt .
[8]Ac. do STJ de 31/01/17, relator Roque Nogueira, proferido no Proc. nº 1454/09.5TVLSB.L1.S1, disponível para consulta in www.dgsi.pt
[9]Citado no mesmo Ac. do S.T.J. de 31/01/2017); no mesmo sentido vidé Acórdão Nº634/93, do Tribunal Constitucional, de 4/11/93
[11]Vidé ainda Ac. desta R.L. de 25/06/09, elatora Ondina Carmo Alves, proferido no Proc. nº 8215/04.6TBOER.L1-2, disponível para consulta in www.dsgi.pt, “É pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que o direito ao bom nome e reputação deverá sobrepor-se ao direito de informação e crítica da imprensa – cfr. entre muitos, Ac. STJ de 30.04.94, C.J./STJ, II, t. 2, pg. 54
[12]cfr. o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 157/2001, in D.R., Série I, de 10/5/01
[13]Ac. do T.R. Lisboa de 29/04/08, relatora Ana Grácio, proferido no Proc. nº 2576/2008-1, disponível para consulta in www.dgsi.pt