Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4547/11.5TBCSC.L1-6
Relator: TERESA PARDAL
Descritores: REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
GUARDA CONJUNTA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/22/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: -   Na regulação do exercício das responsabilidades parentais, a lei prevê, se tal não contrariar o interesse da menor, a regra do regime de guarda conjunta para as questões de particular importância na vida da criança, devendo ser fixada a residência desta, também de acordo com o seu interesse e cabendo ao progenitor com quem a menor residir a decisão sobre os actos correntes da sua vida.  

-  A guarda conjunta com residências alternadas entre os dois progenitores com uma relação conflituosa entre si não é do interesse da uma menor, com sete anos de idade.

        (sumário elaborado pela relatora)                                                           

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO.

A.. e B… intentaram acção de divórcio por mútuo consentimento, prescindindo reciprocamente de alimentos, juntando relação de bens comuns e acordo relativo ao uso de casa de morada de família e, não havendo acordo quanto à regulação das responsabilidades parentais relativas à filha de ambos C…, nascida no dia 23 de Setembro de 2006, juntaram separadamente as respectivas propostas para o efeito, propondo a mãe que as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida da menor deverão ser exercidas em conjunto por ambos os progenitores, devendo a menor ficar a residir consigo e propondo o pai a guarda conjunta da menor, devendo esta residir com a mãe e o pai, de forma intercalada e sucessiva, por períodos de uma semana.

Concluíram pedindo que fosse decretado o divórcio e, caso não viesse a ser obtido acordo em conferência a convocar, que fossem reguladas as responsabilidades parentais relativamente à filha menor.

Realizou-se a tentativa de conciliação, mas não foi possível obter o acordo dos progenitores, que vieram oferecer as suas alegações.

Foi fixado regime provisório que, para além do mais, determinou que a menor ficasse a residir com a mãe.

Procedeu-se a diligências de prova, após o que foi proferida sentença que decretou o divórcio entre as partes com a consequente dissolução do matrimónio, homologando os acordos relativos ao uso da casa de morada de família, aos bens comuns e aos alimentos entre cônjuges e, relativamente ao exercício das responsabilidades parentais referentes à filha menor do casal, fixou o seguinte regime:

1- A menor residirá com a mãe.

2- A menor passará com o pai dois fins-de-semana seguidos e que se seguirá um fim-de-semana com a mãe. Para tanto, o pai irá buscar a menor à escola, findas as actividades escolares, onde a reconduzirá na segunda-feira, antes do início das actividades.

3- A menor almoçará com o pai um dia durante a semana.

4- A menor passará com a mãe o dia da mãe e o dia do aniversário natalício desta, sem prejuízo das actividades escolares.

5- A menor passará com o pai o dia do pai e o dia do aniversário natalício deste, sem prejuízo das actividades escolares.

6- No dia do seu aniversário, a menor almoçará com um dos progenitores e jantará com o outro, de forma alternada e sem prejuízo das actividades escolares. A menor pernoitará com o progenitor com o qual jantar. Na falta de acordo, no ano de 2014 janta com o pai.

7- A menor passará com cada um dos progenitores, em anos alternados, a interrupção lectiva do Carnaval. Na falta de acordo entre os pais, no ano de 2014 passará tal interrupção com a mãe.

8- A menor passará com cada um dos progenitores uma das duas semanas das férias escolares da Páscoa, Na falta de acordo, no ano de 2014 passa a primeira semana com o pai.

9- A menor passará com um dos progenitores o período compreendido entre o primeiro dia das férias escolares no Natal e o dia 25 de Dezembro e passará com o outro o remanescente de tais férias, de forma alternada. A menor é entregue ao progenitor com o qual passa o primeiro período às 11 horas do dia 25 de Dezembro. Na falta de acordo entre os progenitores, no ano de 2014 passa o primeiro dos referidos períodos com a mãe.

10- A menor passará com cada um dos progenitores metade das férias escolares de Verão, em concretos períodos a acordar entre os progenitores. Na falta de acordo, tais períodos não serão superiores a vinte dias seguidos e caberá a escolha dos mesmos ao pai nos anos pares e à mãe nos anos ímpares. O progenitor ao qual cabe escolher as férias comunicará o outro a sua escola até o último dia do mês de Maio do ano a que respeita.

11- A título de alimentos para a menor, o progenitor suportará a quantia de 120,00 euros por mês, quantia esta que depositará, até ao dia 8 de cada mês, em conta que a progenitora indicará nos autos em 5 dias. Esta pensão sofre uma actualização anual, de acordo com o índice de inflação, ocorrendo a primeira actualização em Janeiro de 2015.

12- O progenitor suportará 50% das despesas da menor com consultas médicas, medicamentos, material escolar e uma actividade extra-curricular escolhida por ambos os pais.

                                                            *

Inconformado, o progenitor interpôs recurso e alegou, formulando as seguintes conclusões:

1. O presente recurso vem interposto da decisão quanto à regulação das responsabilidades parentais da filha menor dos Requerentes.

2. O recurso do ora recorrente fixa-se somente quanto à matéria de parte da alínea B), referente à regulação das responsabilidades parentais, mais concretamente aos pontos 1) e 2), sendo que o presente recurso não abrange assim nem os demais pontos da alínea B), nem a alínea A), referente aos acordos sobre o uso da que foi a casa de morada de família, aos bens comuns, aos alimentos entre cônjuges, nem à matéria da alínea C), referente à dissolução do casamento.

3. O recurso restringe-se assim ao facto de o tribunal não ter decidido no interesse da menor e com a fixação de um regime de guarda alternada e partilhada.

4. Entende o ora recorrente que a decisão em causa não constitui a melhor solução para a menor C…, bem como entende que essa decisão não se encontra minimamente fundamentada, resultando assim numa decisão contrária à lei e injusta.

5. Salvo o devido respeito, a Mª Juiz a quo a decidir sem fundamentar a sua decisão, uma vez que o dever de fundamentação perpassa todo o sistema judicial, a fim de evitar decisões arbitrárias, insusceptíveis de serem sindicadas superiormente (vide art. 154º do NCPC, anterior 158º, como regra geral).

6. A Mª Juiz entendeu que o elemento fundamental para aquilatar da opção entre a atribuição da guarda ou residência da menor com um dos progenitores ou, em alternativa, em sistema de guarda alternada, residiria nos relatórios da ISS, afirmando desde logo que “ (…) ambos os progenitores são atentos e preocupados.”

7. Como é dado ver do teor da sentença não se alcançam os fundamentos da decisão do Tribunal "a quo". Apenas se refere, como justificação e não fundamentação para a escolha deste regime o seguinte:

O pai mora em Queluz e a mãe mora na Parede.

A menor frequenta uma escola que se situa perto da casa da mãe.

A menor frequenta o parque que se situa perto da escola e da casa da mãe, onde convive com outras crianças da escola que frequenta.

Acresce que o regime de guarda alternada implicaria que, na semana em que estivesse com o pai, a menor tivesse que fazer deslocações diárias entre Queluz e a Parede.

8. A decisão é assim justificada apenas por a escola da menor ser em Carcavelos, residindo a mãe na Parede e o pai em Queluz.

9. Ou seja, a decisão ora recorrida assenta apenas na distância que vai de Queluz para a Parede. No fundo a decisão é tomada por atenção à distância de 11,31 Km, a qual é percorrida, de viatura, em pouco mais de 10 minutos.

10. A decisão recorrida é, desde logo, nula por vício de fundamentação, nos termos da alínea b) do nº 1 do art. 615º do NCPC (anterior 668º), o que se invoca, para todos os legais efeitos, uma vez que não é invocado ou indicado qualquer facto concreto ou aduzida qualquer uma singela razão que permitisse fundamentar a decisão de entregar a menor unicamente aos cuidados da mãe senão a distância de 11,31 Km entre a residência da mãe e a residência do pai.

11. O art. 205, nº 1 da Constituição da República, por seu turno, diz-nos que «as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.»

12. É, assim, manifesta a existência de um dever de fundamentação das decisões judiciais, dever esse com consagração constitucional e que se justifica pela necessidade das partes, com vista a apurar do seu acerto ou desacerto e a decidir da sua eventual impugnação, precisarem de conhecer a sua base fáctico-jurídica.

13. Para que as partes, bem como a própria sociedade, entendam as decisões judiciais, e não as sintam como um ato autoritário, importa que tais decisões se articulem de forma lógica. Uma decisão vale, sob o ponto de vista doutrinal, o que valerem os seus fundamentos.

14. E, embora a força obrigatória da sentença ou despacho esteja na decisão, sempre essa força se deve apoiar na justiça. Ora os fundamentos destinam-se precisamente a formar a convicção de que a decisão é conforme à justiça.

15. A decisão surge assim como um resultado, como a conclusão de um raciocínio, e não se compreende que se enuncie unicamente o resultado ou a conclusão, omitindo-se as premissas de que ela emerge.

16. A fundamentação da sentença revela-se de igual forma indispensável em caso de recurso, pois na reapreciação da causa, o tribunal superior tem de saber em que se fundou a decisão recorrida.

17. Consequência da inobservância deste dever de fundamentação será a nulidade da sentença que não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão - cfr. arts. 615, nº 1, al. b) NCPC.

18. Deveria assim a douta sentença recorrida indicar, ainda que de forma sumária, as razões jurídicas em que se fundamentou a decisão provisória proferida, dando dessa forma cumprimento ao dever de fundamentação das decisões judiciais.

19. Da leitura desta decisão, logo se constata que a mesma não contém qualquer fundamentação, quer fáctica, quer jurídica, que possa justificar a opção que foi tomada, designadamente aquela que determinou ficar a menor Estrela a residir habitualmente com a mãe.

20. Desconhece-se em absoluto o percurso lógico que foi feito pela Mmª Juíza a quo no sentido de fixar o concreto regime que acima se transcreveu, porquanto nem sequer indica a idade da criança, nem sequer menciona o facto de a menor C…, antes desta decisão, residir não com a mãe, mas com a mãe e pai em regime totalmente alternado e compartilhado, sendo que demonstrava ser uma criança realizada e feliz, o que não sucede agora com esta decisão que rompeu totalmente com essa realidade da criança.

21. Consequentemente, por ser esta a situação que se verifica no caso "sub judice", pois não se encontram especificados os fundamentos de facto e de direito que determinaram a convicção do julgador, há que concluir pela falta de fundamentação, o que tem como consequência a nulidade da decisão recorrida nos termos dos arts. 615, nº 1, al. b) do Cód. do Proc. Civil, aplicável por força do art. 613º, nº 3 do mesmo diploma.

22. Independentemente da questão de o ora recorrente defender que há notório erro na apreciação da prova gravada, conforme se trata infra, cabe chamar a atenção para, na decisão recorrida, se ter omitido por completo e assim não o ponderando para a decisão a tomar, os relatórios elaborados pela ISS.

23. Os relatórios do ISS são elementos de prova que estão nos autos e por exigência expressa da lei, notoriamente mais isentos que a prova testemunhal, objectivos e assim mais perto do que realmente interessa num processo em que o maior desiderato é o superior interesse da menor.

24. Esses relatórios, dos quais a Mª Juiz a quo fez integral tábua rasa, apontavam precisamente para uma decisão diferente, para uma decisão até contrária à que foi tomada.

25. Ora, se esse elemento de prova, que reveste especial importância, pela sua isenção, objectividade e cariz profissional, é por completo ignorado pela decisão de que ora se recorre, como não esperar que em sede de recurso se altere a decisão?

26. Como se pode verificar pela simples leitura dos citados relatórios, nos inquéritos à mãe da Estrela, e ora Recorrida, esta referiu que: “(…) o requerido foi desde sempre um pai presente em todos os aspectos da vida da Estrela enquanto viveram juntos”.

27. No relatório da Recorrida consta uma alusão que inexiste no relatório do Recorrente B…, o que é sintomático do que as técnicas se aperceberam quanto à mãe da C…: “Destaca-se que as relações paterno/materno-filiais, situam-se a um nível diferenciado das relações conjugais, não podendo assim ser confundido ou misturado as duas esquecendo-se do superior interesse de C…, nomeadamente no que concerne à educação e escolha de equipamento escolar”.

28. Acresce ainda que nesse relatório se diz, precisamente no final e como conclusão de toda a análise técnica que “(…) será manifestamente importante que os contactos paterno-filiais ocorram, de modo a manter os laços afectivos, pois o esbatimento da figura paterna causa necessariamente desequilíbrios e angústias”.

29. No relatório referente ao Recorrente B…o constam as seguintes conclusões:

• “(…) afigura-se-nos que B… evidencia uma atitude receptiva para chegar a consensos com a progenitora, mostrando preocupação pela estabilidade e bem estar da filha.”

“Afigura-se-nos que as propostas apresentadas pelo progenitor, quanto à regulação das responsabilidades parentais, serão de considerar, pois parecem sustentar tempo igualitário de convivência e preservação de laços afectivos e vinculação com ambos os progenitores, para além da participação activa deste nas decisões da vida da criança”.

30. É clara a inclinação das técnicas para uma situação de guarda alternada e partilhada, como forma de permitir um efectivo crescimento físico, psíquico e emocional da menor C…, sendo que esse regime, já ocorrido durante os períodos de férias de Verão de 2011, 2012 e 2013, se mostrou o mais apto a eliminar completamente a conflituosidade e permitir que a menor cresça e se desenvolva com a presença de ambos os progenitores.

31. Verifica-se assim que o regime preconizado e defendido como o mais apto à satisfação das necessidades da menor pelos dois relatórios da Segurança Social seria sempre um regime que possibilitasse um equilíbrio entre o tempo em que a menor passe, quer com o pai quer com a mãe, apontando assim claramente para uma decisão que optasse, neste caso em concreto, por um regime de guarda alternada.

32. A decisão recorrida vem optar por um regime completamente diferente, contrariando assim a prova existente nos autos, prejudicando assim o superior interesse da menor, certamente justificado por uma posição de princípio motivada apenas por uma questão e opção pessoal da Mª Juiz a quo, mas que não encontra qualquer conforto na prova.

33. A decisão será assim por via do recurso anulável e substituída por outra que realmente defenda apenas os interesses da menor, na senda do que é sugerido pelos relatórios da ISS, com uma guarda alternada e partilhada, pelo que a presente decisão apresenta notória contrariedade com a prova produzida, bem como um erro notório na apreciação da prova, sendo assim revogável.

34. A menor C… encontrar-se-ia muito melhor e mais feliz, realizada e confortável com um regime de guarda partilhada e alternada.

35. Face ao que se acha preceituado no art. 715, nº 1 do Cód. do Proc. Civil, deverá o tribunal de recurso, mesmo ocorrendo aquela nulidade resultante da falta de fundamentação da decisão, conhecer do seu objecto, substituindo-se ao tribunal recorrido.

36. Nos autos existem todos os elementos necessários ao conhecimento do presente recurso.

37. Há não só que declarar a nulidade da decisão recorrida, como ainda apreciar a aplicação de decisão que mantenha o regime que vinha vigorando antes de ser decretado o regime provisório (o erro vem desde aí…), ou seja, o regime da guarda alternada e partilhada da menor C….

38. Sendo este o único regime que possibilitará à menor a manutenção de uma íntima ligação com ambos os progenitores, como de resto sempre sucedeu durante a sua vida e pelos motivos supra expostos.

39. A guarda, conjunta ou mesmo, alternada supõe que os desentendimentos entre os progenitores sejam eliminados ou minimizados, colocando os interesses da criança acima dos mesmos; pressupõe uma convivência estreita entre ambos os progenitores e a possibilidade de tomada de decisões em comum (Ac. RE. de 04/05/2010 em http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/a52e205629edc93480257726005245e5?OpenDocument).

40. O mesmo entendimento teve o Acórdão nº 3456/2006-8 de Tribunal da Relação de Lisboa, 14 de Dezembro de 2006, segundo o qual “O regime da " guarda conjunta" ou " guarda alternada" afigura-se o regime de regulação do exercício do poder paternal mais em conformidade com o interesse da criança porque lhe possibilita contactos em igual proporção com o pai, a mãe e respectivas famílias”.

41. O qual acrescenta ainda, a este propósito, que “não se diga que poderá representar inconveniente para a criança a mudança de residência pela instabilidade criada, considerando que a instabilidade é uma realidade presente e futura na vida de qualquer criança com pais separados e, por outro lado, na realidade o que a criança adquire são duas residências cada qual com as suas características próprias, que permitem o contacto mais constante e efectivo com os dois pais, não devendo esquecer-se a extraordinária adaptabilidade das crianças a novas situações”.

42. Um regime de guarda conjunta e alternada será o que melhor defende o superior interesse da mesma, até porque esta decisão impõe um regime que implica que quando a menor passe o fim-de-semana com a mãe, o pai esteja 12 (doze) dias sem ver a menor e sem a menor ver o seu pai, solução totalmente contrária ao interesse da menor, como resulta dos relatórios da ISS juntos aos autos.

43. Vários pontos de facto julgados na presente demanda foram-no em nítida contradição com a prova efectivamente produzida e, em muitos desses casos, em total oposição à mesma.

44. A decisão dá como provadas as alíneas F) a H), referindo apenas que a depoente P… foi “antiga empregada doméstica do casal”.

45. Ora a simples audição do início da inquirição da mesma revela precisamente o contrário, que nunca foi empregada doméstica do casal: a 0:57 do seu depoimento e a instâncias do Ilustre mandatário da Requerente ouve-se o seguinte: “Advogado: Conhece o casal? Testemunha: conheço. Eu trabalhei com a S… e com a D. M…. Trabalhava em casa do casal? Exacto…Não! Trabalhava para casa da S… e da D. M…”.

46. Verifica-se assim que a Mª Juiz a quo parte de um pressuposto completamente errado quanto à razão de ciência desta testemunha, pelo que o seu depoimento não poderia ter sido invocado para dar esses factos como provados.

47. No que se refere ao ponto da alínea O), dado como provado, a Mª Juiz remeteu a prova para os documentos de fls. 237 e 238 e para os depoimentos de S…, P…, L… e AC….

48. A testemunha P… quando inquirida pelo mandatário da Requerente sobre esta matéria, sendo que o mesmo inquiriu sobre se essa conclusão se baseava em alguma conversa que a depoente tenha tido com a criança, respondeu (voltas 08:56): “Não. Eu falar com ela sobre isso nunca falei.”.

49. A testemunha L…, quando inquirida (voltas 05:13) pelo mandatário da Requerente sobre se a mãe tem algo a recear que a filha passe muito tempo com o pai, algum facto que conheça, o depoente afirmou peremptoriamente (voltas 05:24) “Não, não, não, não, por esse lado eu não vejo…não sei”.

50. E quando o ora signatário (voltas 06:50) inquiriu o depoente sobre se alguma vez a menor lhe tenha dito que não queria estar com o pai ou passar mais tempo com o pai, o mesmo afirmou, sem dúvidas, “Não, não, não.”

51. Ainda a instâncias do ora signatário (voltas 07:13) foi-lhe perguntado se o regime de guarda alternada e partilhada, que o depoente havia mencionado como prejudicial para as crianças, no caso da C…, em concreto, seria um regime desaconselhável, o mesmo respondeu que (voltas 07:26) “Não é só no caso da C…; eu acho que isso não é bom para ninguém, porque estar uma semana numa casa e depois outra semana noutra casa, hábitos diferentes (…).

52. E quando se insistiu, especificamente no caso da menor C…, se haveria algum óbice referente ao pai ou à mãe da C…, o mesmo disse que (voltas 07:38) “ Não é por causa do pai ou da mãe”, ou seja, o depoente não apresentou qualquer facto que neste caso sub iudice desaconselhasse uma guarda alternada, pelo que também não será pelo depoimento desta testemunha que a Mª Juiz poderia dar tal matéria por provada e que esse estado emocional da menor (alegria, felicidade) decorresse directamente de passar mais tempo com a mãe do que com o pai.

53. Mesmo a instâncias da Mª Juiz sobre se a menor falava destes assuntos com o depoente, o mesmo referiu claramente que (voltas 07:55) “comigo não conversa” e quando inquirido sobre se a criança falava com o depoente sobre o tempo que passa com o pai, o mesmo referiu (voltas 08:15) “Comigo não. Nunca calhou ter comigo essa conversa, ao pé de mim”.

54. A testemunha S… a este propósito, quando lhe foi perguntado, pelo mandatário da Requerente, como era o ambiente na casa da irmã quando o casal ainda vivia junto, a mesma referiu: “Era um ambiente de discussão constante” (voltas 01:50);“A C… infelizmente participou em quase todas as coisas” (voltas 02:03);“Era uma criança muito traumatizada, como é lógico em crianças que passam este tipo de vivências”.

55. Depois, a voltas 07:24 o mandatário da Requerente pergunta o seguinte “Desde então, desde essas cenas, ainda o casal estava junto, até hoje (imperceptível) a C… sossegou, está melhor?, ao que a depoente responde: “A C… vivia num ambiente difícil, um casal que se dava muito mal, muito mal, e portanto tinha grandes dificuldades, tinha; sentia-se que ela vivia sob pressão; Foi-se acalmando e a C… é uma menina muito inteligente, soube lidar com isto (…) fez-se uma menina muito forte e neste momento está uma criança que, eu posso dizer, calma, tranquila, vive a sua vidinha, está estabilizada”.

56. O que foi pedido à depoente foi que comparasse a C… e a sua evolução entre o período em que os progenitores ainda viviam juntos, num ambiente de discussão, e o momento actual.

57. Nenhuma comparação foi pedida às testemunhas entre o tempo pós-separação e até a ser decretado o regime provisório, em que a menor viveu uma guarda partilhada e alternada e agora depois de decretado esse regime: daí que a conclusão da Mª Juiz a quo e a matéria dada como provada esteja eivada de um erro básico, pois a comparação que se estabeleceu foi entre o tempo de vivência em comum do casal e o momento actual, o que nada interessa para a escolha de um ou outro regime. E é com base nestes dois tempos que as testemunhas fazem as suas comparações, entre o momento actual e o momento em que existia coabitação dos progenitores e não entre o momento em que vigorou um regime de guarda alternada e o momento actual.

58. Refira-se ainda, quanto ao depoimento desta testemunha S… que, quando perguntada sobre se acha que o Requerido B… é ou não um bom pai, diz, a voltas 16:13 “Ele é um bom pai”, e quando lhe é perguntado pelo ora signatário (voltas 30:18) se “Acha que no fundo o B… não é uma pessoa capaz para lidar com a C…, por exemplo, metade do tempo, metade do tempo com o pai, metade do tempo com a mãe”, a mesma responde, não respondendo, de forma muito significativa:

59. “Eu pergunto é se há alguma criança que mereça ficar metade do tempo com a mãe e metade do tempo com o pai, é isso que eu pergunto…”.

60. Ou seja as testemunhas em causa respondem ao que é a sua opinião em termos absolutamente gerais, sobre o regime da guarda alternada, mas sempre sem conseguirem articularem uma singelíssima razão que obstaculizasse a opção por esse regime no caso concreto da menor C…, o que é sintomático da justeza da posição do requerido que tem todas as condições para exercer a parentalidade de uma forma plena no regime de guarda alternada, solução que como também já vimos é a preconizada nos relatórios da ISS e que também é sustentada, no concreto, pelas testemunhas que o Requerido apresentou em juízo.

61. No depoimento da testemunha AC… foi-lhe perguntado, pelo mandatário da Requerente, a voltas 02:38 o seguinte: “Antes dos pais se separarem, vocês viviam todos juntos, já aqui foi dito por várias testemunhas, a C… já existia, qual o relacionamento da C… em casa e como é que a C… era em casa e como é que a C… vivia face às dificuldades dos pais?”, uma vez mais comparando a actualidade com a altura em que os progenitores coabitavam e não comparando a actualidade com o período em que vigorou a guarda alternada.

62. A resposta, obviamente, vem comparar esses dois períodos: antes da separação do casal e depois da separação do casal: a voltas 03:25 o depoente afirma que “antes de os pais se separarem a C… vivia com os pais e estava no pré-escolar numa escola em Lisboa, na Ajuda (…); era uma criança e uma pessoa muito instável, insegura (…). Compara assim esse período com a actualidade, a voltas 04:47: “ A C… sente-se muito feliz e segura (…) hoje a C… é uma pessoa segura, uma criança segura”.

63. Por outro lado, quando inquirido sobre a possibilidade da guarda alternada e a instância do ora signatário, a voltas 27:31 e repetida a voltas 28:21, e até depois de insistência da Mª Juiz para que o mesmo respondesse, perguntou-se ao depoente se a Estrela está mal se estiver com o pai; a resposta do depoente, a voltas 30:13 é elucidante: “O pai é pai e a mãe é mãe”. Este é então a única razão encontrada pelo depoente para justificar a recusa de um regime de guarda alternada…

64. Verifica-se assim um erro notório na apreciação da prova, porquanto a Mª Juiz a quo infere da alínea O) que essa factualidade se verifica neste momento, em confronto com uma situação de guarda alternada, quando, na realidade, todas estas testemunhas, sem excepção, compararam tão somente o que a C… era quando vivia com os pais e estes coabitavam e a actualidade.

65. Não podia assim esse facto ser dado como assente, sem que se tivesse esclarecido que essa realidade da criança é a actual em contraponto com a situação que a criança vivia aquando da coabitação dos pais.

66. Por outro lado importa ainda referir que elementos de prova testemunhal relevantes existiram, mas que forma por completo, e injustificadamente, ignorados para a decisão.

67. Tal sucedeu com depoimento da testemunha JL…: afirma a mesma, a voltas 01:07 que “O B… e a C… têm uma relação de cumplicidade entre os dois; O B… adora a miúda, a miúda vê o pai como um ai-Jesus”.

68. O mesmo se passou com todo o depoimento da Dra. V…, que é psicóloga escolar e clínica, para além de lidar intimamente com a menor, porquanto mantém um relacionamento com o ora recorrente: afirma a mesma, a voltas 01:48 que “É uma criança feliz, mas entristecida em alguns factos. Em parte têm a ver com menções que já teve a liberdade de fazer, espontaneamente, em relação, por exemplo com o pouco tempo que passa com o pai. Diz que é sempre pouco tempo e que o tempo passa muito rápido, gostava de estar mais, que não entende porque é que não pode estar mais, às vezes até chora quando está na hora de ir embora.”

69. A mesma prossegue a voltas 02:55: “Houve uma ocasião em que falou com o meu filho; estavam a ter uma conversa em relação aos pais (…) e ela mencionou que gostava de estar mais tempo com o pai”.

70. A voltas 03:50, quando inquirida sobre se a menor C… beneficiaria se passasse mais tempo com o pai, respondeu a depoente (voltas 04:14) afirmando que “Seria benéfico e por várias razões, na minha opinião: em primeiro lugar porque é ela própria que manifestou esse desejo e com expressão de emoções nesse sentido”. Prossegue referindo, a voltas 04:41, “Ela própria me diz isso”.

71. Finalmente, quando inquirida sobre a reacção e comportamento da menor na altura em que está com o pai e quanto ao relacionamento com outras crianças, que “é óptimo; imediatamente brinca e se dá, pergunta, conversa”.

72. De igual forma não foi dada importância a grande parte do depoimento da testemunha AL…, mãe do Requerido, que afirma, a voltas 01:18: “É um pai mais do que presente, é um pai que toda a gente gostaria quereria, está sempre disponível, desde a primeira hora que tomou conta dela, de lhe fazer e dar comer, de lhe dar banho (…)”.

73. Sobre o tempo que a menor passa com o pai, refere a depoente, a voltas 04:58, “Nestas últimas férias ela disse-me: Avó, não venho só passar o fim-de-semana, vou ficar 15 dias com o meu pai, toda contente, toda feliz”.

74. E a voltas 06:48 refere a depoente que “O tempo que ela está com o pai é pouco; para ela e para o pai. Ela vem muito feliz e quando se está para ir embora (…) ela já não está tão feliz como quando veio, isso eu noto.

75. A total desconsideração e esquecimento destes factos mencionados pelas testemunhas do Requerido levou a que não se ponderasse seriamente a possibilidade de decretar um regime de guarda alternada e partilhada.

76. A questão de se ter dado como provado que “O requerente foi condenado por condução de veículo na via pública em estado de embriaguez, cometido em data anterior a 4.6.2003” resulta de uma tentativa torpe e de um autêntico ataque de carácter.

77. O documento de fls 485 a 488 nada diz nem muito menos prova que o Requerido tenha sido condenado.

78. O tribunal deu como provado um facto sem qualquer espécie de fundamento, o que, no mínimo, se estranha, bem como se estranha que se tenha deixado discutir um assunto que ocorreu antes do nascimento da própria menor.

79. Não deveria assim este facto ter sido dado como provado, constituindo assim mais um manifesto erro na apreciação da prova.

80. O mesmo sucede quanto à alínea J), porquanto ficou provado que a casa em questão é propriedade do Requerido e de um seu primo.

                                                            *

A apelada contra-alegou, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.

O recurso foi admitido como apelação com subida nos autos e efeito suspensivo.

As questões a decidir são:

I) Nulidade da sentença.

II) Impugnação da matéria de facto.

III) Regime a fixar na regulação das responsabilidades parentais.

                                                            *

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FACTOS.

Os factos considerados provados pela sentença recorrida são os seguintes:

A) B… e A… casaram um com o outro em 11.9.2004.

B) Em 23.9.2006 nasceu C…, filha dos requerentes.

C) O casal habitava numa casa de tipologia 4, onde a C… tem quarto próprio. No mesmo condomínio, habitam os pais e a irmã da requerente. A menor convive diariamente com as duas primas que habitam no mesmo condomínio.

D) Ambos os pais prestavam à menor C… os cuidados básicos, designadamente ambos lhe davam banho, a alimentavam e vestiam.

E) A menor mantém forte ligação afectiva com ambos os progenitores.

F) Em data não apurada, o relacionamento entre o casal tornou-se conflituoso, sendo que, com frequência, discutiam em frente da menor.

G) Em 2.6.2011, ocorreu um conflito entre os requerentes na frente da menor. Ouvindo gritos oriundos da casa do casal, a irmã da requerente ali acorreu e de lá retirou a menor, que estava assustada. Foi solicitada a intervenção da PSP.

H) Em 2.6.2011, o requerente saiu da que foi a casa de morada de família, onde permaneceram a requerente e a menor C….

I) Em 28.10.2011 foi estabelecido regime provisório, fixando a residência da menor com a mãe.

J) O progenitor habita, com um primo, em casa que é propriedade da avó de ambos. Nessa casa, a menor tem quarto próprio.

K) Nos fins-de-semana que a menor passa com o pai este cozinha para a menor, leva-a a passear, brinca com ela e dá-lhe atenção.

L) Nos anos lectivos de 2010/2011 e 2011/2012, a menor a menor frequenta a pré-escolar na Associação Infantário Jardim de Infância …, sita em Alcântara e inserida no agrupamento escolar onde o requerente lecciona. O requerente era o encarregado de educação da menor, participando activamente na comunidade escolar. Ambos os pais eram preocupados e interessados. Em contexto escolar, a menor uma criança passiva e insegura ao nível emocional.

M) Os progenitores não se entenderam quanto à escolha da escola que a menor iria frequentar no ano lectivo de 2012/2013, altura em que ia iniciar o primeiro ano de escolaridade obrigatória. Pretendeu a requerente inscrevê-la numa escola sita nas proximidades da sua habitação e pretendeu o requerente inscrevê-la numa escola do agrupamento que frequentava. Em 27.6.2012, foi tal questão decidida pelo tribunal.

N) A menor foi matriculada na escola EB nº1, de Carcavelos no ano lectivo de 2012/2013. No corrente ano lectivo mantém-se na referida escola e frequenta o segundo ano de escolaridade. A menor gosta da escola e mostra-se integrada na mesma. Fora da escola, a menor convive com algumas colegas. A menor frequenta o parque sito perto da escola e da casa onde habita.

O) A menor está estável, mais segura e menos tímida. É uma criança feliz.

P) Os conflitos entre os progenitores persistem.

Q) A requerente é professora e aufere mensalmente 1.117,43 euros.

R) O requerente é professor e aufere mensalmente 1.184,44 euros.

S) O requerente foi condenado por condução de veículo na via pública em estado de embriaguez, cometido em data anterior a 4.6.2003.

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ENQUADRAMENTO JURÍDICO.

I) Nulidade da sentença.

O apelante vem arguir a nulidade da sentença prevista no artigo 668º nº1 b) do CPC, alegando que a decisão não contém fundamentação.

Manifestamente não tem razão, pois a decisão está fundamentada.

O alegado pelo apelante a este respeito relaciona-se com a questão de saber se a fundamentação é ou não suficiente para a correcção da decisão proferida, questão esta que se prende com o mérito da causa, a apreciar em sede própria.

Assim e concordando-se ou não com os fundamentos apresentados, não se verifica qualquer nulidade.

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II) Impugnação da matéria de facto.

O apelante pretende a alteração das alíneas F) a H), J), O) e S) dos factos provados, defendendo que os mesmos não devem ser considerados provados (das alíneas F) a H) e S)) ou provados com redacção diferente (das alíneas J) e O)).

É a seguinte a redacção das referidas alíneas:

F) Em data não apurada, o relacionamento entre o casal tornou-se conflituoso, sendo que, com frequência, discutiam em frente da menor.

G) Em 2.6.2011, ocorreu um conflito entre os requerentes na frente da menor. Ouvindo gritos oriundos da casa do casal, a irmã da requerente ali acorreu e de lá retirou a menor, que estava assustada. Foi solicitada a intervenção da PSP.

H) Em 2.6.2011, o requerente saiu da que foi a casa de morada de família, onde permaneceram a requerente e a menor C….

J) O progenitor habita, com um primo, em casa que é a propriedade da avó de ambos. Nessa casa, a menor tem quarto próprio.

O) A menor está estável, mais segura e menos tímida. É uma criança feliz.

S) O requerente foi condenado por condução de veículo na via pública em estado de embriaguez, cometido em data anterior a 4.6.2003.

No que diz respeito às alíneas F) a H), alega o apelante que os mesmos não podem ser considerados provados com base no depoimento da testemunha P…, pois, ao contrário do que refere a sentença recorrida, esta testemunha não era empregada do casal, mas sim da irmã da requerente apelada.

Contudo, desde logo, esta testemunha, que trabalhava na casa da irmã da requerente apelada, situada por baixo da casa desta, embora não tivesse assistido ao episódio de 2.06.2011, declarou que costumava ouvir as constantes discussões do casal, o que é relevante para o facto constante na alínea F).

Quanto aos factos das alíneas G) e H), que respeitam ao episódio do dia 2.06.20011, ficaram sobejamente demonstrados com o depoimento da testemunha S…, irmã da requerente apelada, que assistiu aos mesmos e os descreveu com consistência e com o expediente de fls 441 a 448, que é o auto de notícia dessa data, da PSP, que relata a ocorrência.

Deverão, assim, manter-se estes factos. 

Relativamente ao facto J), nenhuma prova foi feita sobre a propriedade da casa habitada pelo requerente apelante. Resultou apenas dos depoimentos das testemunhas AL… (mãe do apelante), JL… (tio do apelante) e TL… (primo com que o apelante vive) que a casa pertenceu aos avós do apelante, e passou a ser utilizado pelos filhos desta – a mãe e tio do apelante – que, por sua vez a disponibilizaram ao respectivos filhos – o apelante e o seu primo.

Deste modo, deverá a alínea J) ser alterada, passando a ter a seguinte redacção:

O progenitor habita, com um primo, numa casa pertencente à família de ambos. Nessa casa a menor tem um quarto próprio”.

O conteúdo da alínea O), para além de resultar dos factos provados nas alíneas L) e M), que relatam a evolução positiva da menor, foi confirmado pelas testemunhas S…, L…, A C…, M…, P…, todas elas tendo afirmado que a menor se encontra bem, estável e mais feliz do que antes de o casal se separar; por seu lado, as testemunhas AL…, JL…, TL… e V… acabaram também por admitir que a menor é uma criança feliz, apesar das suas referências no sentido de que a menor teria demonstrado vontade de estar mais tempo com o pai, referências essas que não se mostram consistentes em face da restante prova.

E, ao contrário do que alega o apelante, os depoimentos que realçam a boa relação que o apelante tem com a filha foram atendidos e não desvalorizados pela sentença recorrida, que, na alínea E) considerou provado que ambos os progenitores (pai incluído) têm uma forte ligação afectiva com a menor, na alínea K) descreveu a atenção que o progenitor dá à filha nos seus convívios e na alínea L) também descreve a sua participação activa na comunidade escolar.

Manter-se-á, assim a alínea O) dos factos provados.

Finalmente, quanto ao facto da alínea S), que só poderia provar-se documentalmente, dir-se-á que a única prova documental é a que consta a fls 485 a 488, da qual apenas resulta que em 2003 o progenitor frequentou um curso de “Comportamento Criminal e Estratégias de Prevenção da Reincidência”, aplicado pelo Instituto de Reinserção Social, tendo-lhe sido também marcada uma consulta de alcoologia.

Esta prova não é suficiente para demonstrar o facto constante na alínea S), pelo que esta deverá eliminar-se do elenco dos factos provados.    

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III) Regime a fixar na regulação das responsabilidades parentais.

Decretando-se o divórcio entre os cônjuges, será necessário regular o exercício das responsabilidades parentais relativamente à filha menor de ambos.

Para o efeito, rege o artigo 1906º do CC, com a seguinte redacção e com sublinhado nosso:

1- As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinha, devendo prestar informações ao outro logo que possível.

2- Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que as responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores.

3- O exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente, ou ao progenitor com quem ele se encontra temporariamente; porém, este último, ao exercer as suas responsabilidades, não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes, tela como elas são definidas pelo progenitor com quem o filho reside habitualmente.

4- O progenitor a quem cabe o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente pode exercê-las por si ou delegar o seu exercício.

5- O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro.

6- Ao progenitor que não exerça, no todo ou em parte, as responsabilidades parentais assiste o direito de ser informado sobre o modo do seu exercício, designadamente sobre a educação e as condições de vida do filho.

7- O tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto co ambos e de partilha de responsabilidade entre eles.   

Deste conjunto de regras, retira-se desde logo que existem dois tipos de questões relativas à vida dos filhos menores, aos quais se aplicam dois critérios diferentes: questões de particular importância na vida do menor e questões relativas aos actos da vida corrente do menor.

Assim, para as questões de particular importância para a vida do menor, a regra é a de que as responsabilidades parentais são exercidas por ambos os progenitores, ou seja, é a regra da guarda conjunta (nº1 do artigo 1906º).

Só excepcionalmente, quando se entender que o exercício dessa guarda conjunta contraria os interesses do menor, deve o tribunal atribuir a guarda apenas a um dos progenitores, mediante decisão devidamente fundamentada (nº2 do artigo 1906º).

Já para as questões relativas aos actos de vida corrente do menor, a regra é a de que as mesmas serão decididas pelo progenitor com quem o menor reside habitualmente, ou por aquele com quem o menor se encontra temporariamente, desde que, neste último caso, sejam respeitadas as linhas orientadoras do progenitor com quem a criança reside habitualmente (nº3 do artigo 1906º).

Para se saber qual é o progenitor que tomará as decisões sobre a vida corrente do menor, determinará o tribunal a residência do menor, bem como os direitos de visita, sempre de acordo com os interesses da criança (nº5 do artigo 1906º).   

No presente caso, a sentença recorrida apenas determina qual a residência da menor e os direitos de visita, mas não refere expressamente a quem cabe a guarda da menor, ou seja, a quem cabe a decisão das questões de particular importância na vida da menor.

Não existe nos autos qualquer elemento que leve a considerar que a guarda conjunta não é do interesse da menor, pois resulta dos factos provados que ambos os progenitores têm grande ligação afectiva com a menor e estão presentes e atentos na sua vida.

Deste modo, haverá que aplicar a regra geral do nº1 do artigo 1906º, devendo entender-se ser esse o sentido da decisão recorrida.

É no que diz respeito à decisão sobre a residência da menor que divergem os progenitores desde o início do processo, pretendendo a mãe que a menor fique a residir consigo e pretendendo o pai que a menor resida com ambos alternadamente por períodos de uma semana.

Caberá, no entanto clarificar que a residência alternada não equivale a guarda alternada, como parece entender o apelante nas suas alegações.

Tem-se entendido que as regras definidas no artigo 1906º permitem o exercício da guarda alternada, no qual, não só o menor residiria alternadamente com cada um dos progenitores, mas também se atribuiria a guarda exclusiva ao progenitor que o tivesse a residir consigo, ficando o outro progenitor, nesse período, apenas com um direito de visita e de fiscalização.

Diferente da guarda alternada é a guarda conjunta, estabelecida na lei como regra geral, com residência alternada, caso em que o nenhum dos progenitores deixa de ter a guarda conjunta, mesmo nos períodos em que o filho está a residir com o outro progenitor.

No caso dos autos, não havendo acordo entre os requerentes, parece evidente que a guarda alternada está fora de questão, pois se trata de um regime em que é muito relevante o acordo entre os progenitores, na medida em que se afasta do regime geral de guarda permanentemente conjunta e em que cada um dos progenitores prescinde da guarda no período em que o menor está a residir com o outro progenitor.

Como acima já se expôs, não havendo motivo para se excluir a guarda a nenhum dos requerentes e não havendo acordo, deverá afastar-se a possibilidade de guarda alternada, devendo a guarda ser exercida conjuntamente.

Relativamente à residência alternada, haverá que ter em conta o princípio de que será sempre o interesse do menor a nortear a decisão (nºs 5 e 7 do artigo 1906º).

Assim, não obstante a boa relação que a menor possa ter com os dois progenitores e a dedicação de ambos, a residência alternada só poderá ser uma opção se for do interesse da menor.

E, numa idade em que a criança ainda não tem autonomia nas suas decisões mais correntes da vida – como é o caso da filha dos requerentes, que tem sete anos – é do seu interesse um regime que privilegie a estabilidade e uma orientação uniforme nas decisões correntes da sua vida (a que se refere a 2ª parte do nº3 do artigo 1906º), o que não se mostra viável quando – como também é o caso – os progenitores mantêm uma relação conflituosa (cfr neste sentido acs RL 18/03/2013, P. 3500/10 7/11/2013, P. 7598/12, 26/06/2014, P. 4089/10 e 11/09/2014, P. 1869, todos em www.dgsi.pt)..

A residência alternada dos menores, havendo bom entendimento entre os progenitores, poderá resultar numa fase posterior, de adolescência, em que os menores já têm alguma autonomia e já não estão tão dependentes dos pais no âmbito de todas as decisões a tomar sobre os actos da sua vida corrente; mas não é o caso dos autos, face à idade da menor e à relação existente entre os progenitores.

Nem se diga que os relatórios sociais (obviamente não vinculativos na decisão do tribunal) são de parecer de que a guarda e residência da menor devem ser fixadas de acordo com a proposta do apelante, pois uma leitura atenta dos dois relatórios, elaborados por técnicas diferentes – e não da leitura exclusiva do relatório relativo ao apelante – se extrai que em ambos se reconhece a boa competência do progenitor avaliado, mas também se sublinha a importância de ultrapassar as divergências entre os dois progenitores.

Conclui-se, portanto, que não é do interesse da menor a fixação de residência alternada, devendo fixar-se a residência com um dos progenitores, sem prejuízo do regime de convívio com o outro progenitor.

Provando-se que a menor sempre residiu com a mãe, que se encontra estável e feliz, que se verifica uma boa evolução na adaptação à escola, a qual se situa perto da residência da mãe, deve-se manter a situação, sendo certo que, no regime fixado na sentença recorrida, está salvaguardado o regime de convívio com o pai, nomeadamente ao fixar-se dois fins-de-semana seguidos na sua companhia, alternando-se com apenas um fim-de-semana na companhia da mãe.

Improcedem, portanto, as alegações do apelante.       

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DECISÃO.

Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação e confirma-se a sentença recorrida, com a fixação de um regime de guarda conjunta e de residência com a mãe e nos demais termos aí constantes.

                                                            *

Custas pelo apelante.

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2015-01-22

Maria Teresa Pardal

Carlos Marinho

Anabela Calafate