Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2820/21.3T8VRL.G1
Relator: ALEXANDRA VIANA LOPES
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
ASSUNÇÃO DA TOTAL RESPONSABILIDADE
INDEMNIZAÇÃO POR DANO NÃO PATRIMONIAL
INDEMNIZAÇÃO POR DANO FUTURO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/11/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1. A declaração da Companhia de Seguros (na altura em que se deve pronunciar nos termos do art.37º/1-c) e 2-a) RSSORCA) de assunção da responsabilidade de 100% do acidente ocorrido com danos corporais, quando é realizada em termos claros, sem condicionamento a qualquer evento suspensivo ou resolutivo posterior, sem menção de provisoriedade face a peritagem em curso, declaração em relação à qual não invocou a falta ou de vício de vontade (arts.359º, 240º ss do C. Civil):
a) Não pode ser tida como provisória, nos termos do art.37º/2-a), em referência ao art.37º/1-c), do RSSORCA, por esta previsão respeitar à assunção de um valor de indemnização proposto e não aos pressupostos da responsabilidade pela obrigação de indemnizar ou ao grau de repartição da responsabilidade.
b) Corresponde a uma verdadeira proposta negocial de assumir, em relação ao valor de reparação de danos a definir, a responsabilidade total da indemnização, sem redução por repartição da culpa entre os intervenientes do acidente, declaração esta: que é irrevogável, pois chegou ao conhecimento do destinatário sem qualquer ressalva (art.230º/1 do C. Civil); é irretratável, pois na altura desta declaração de assunção de dívida não foi comunicado ao declaratário qualquer retratação, que pudesse tornar a proposta ineficaz (art.230º/2 do C. Civil); não pode ser resolvida pois a proponente não alegou (e não provou) que tivesse ocorrido uma alteração superveniente e anormal de circunstâncias que pudesse fundamentar a possibilidade de alteração da proposta (art.437º do C. Civil).
2. A proposta referida em 1 supra: dispensa a aceitação, face à totalidade da responsabilidade assumida pela ré/seguradora em relação à pretensão da comunicação do sinistro; considera-se tacitamente aceite pelo lesado, face ao pagamento integral pela ré/seguradora da reparação do veículo conduzido pelo mesmo (art.234º do C. Civil).
3. As indemnizações por danos não patrimoniais e por danos patrimoniais futuros fixadas pela equidade, nos termos respetivos dos arts.496º/4 e 566º/3 do C. Civil, não deve ser alterado no Tribunal Superior salvo se violar razões de segurança jurídica e o princípio da igualdade.
4. Não devem ser reduzidas nem ampliadas as indemnizações de € 30 000, 00 por danos não patrimoniais e de € 60 000, 00 por danos patrimoniais, fixada a jovem que tinha 19 anos à data do acidente, que:
a) Sofreu lesões (fratura da tíbia e do perónio da perna direita), tratamentos (internamento durante 6 dias, cirurgia; retirada do material de imobilização; 40 sessões de fisioterapia) e uma limitação temporária de atividades normais (défice funcional temporário total de 7 dias; défice funcional temporário parcial de 328 dias); sofreu um quantum doloris de grau 5/7; ficou com sequelas (ficou com cicatrizes; passou a ter dificuldade em permanecer em pé mais de 15/20 minutos; apresenta marcha claudicante), que lhe conferem um défice de 10 pontos, um dano estético permanente de grau 3/7 e uma repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de grau 4/7 e vai ter agravamento futuro (com a formação de artrose e necessidade de nova cirurgia).
b) No ano do acidente e da consolidação das sequelas: tinha a perspetiva de 51 anos de vida ativa e de 58 anos de esperança média de vida; era estudante do 1º ano de engenharia mecânica, vindo a ser previsível que venha a desempenhar atividade profissional de engenharia mecânica ou das competências transversais nas engenharias para as quais a licenciatura o habilitar, atividade profissional que pode vir a integrar com normalidade uma dimensão de atividade com esforço físico (sobretudo em meio industrial e fabril); ficou com dificuldade em permanecer em pé mais de 15/20 minutos e apresenta marcha claudicante, com défice permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos, sendo de admitir a existência de dano futuro, com a formação de artrose, o que lhe causará, pelo menos, maior esforço no desempenho de uma atividade profissional na área de engenharia mecânica e conexa, que lhe exija esforço físico (no estar de pé em exames de máquinas ou em situação de esforço), situação que pode comprometer a ampliação de progressões profissionais ou de cumulação fontes de rendimento.
Decisão Texto Integral:
As Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam no seguinte

ACÓRDÃO

I. Relatório:

Na presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, movida por AA contra F... - Companhia de seguros, S.A:

1. O autor:
1.1. Pediu que se condenasse a Ré a pagar-lhe a quantia de € 160.000,00, bem como as quantias relegadas para liquidação em execução de sentença e referidas nos artigos 30º a 32º da petição inicial, acrescidas de juros de mora.
1.2. Alegou, como fundamento: que conduzia um motociclo e, em sentido contrário ao seu, circulava um outro veículo que, para ultrapassar veículos que estavam estacionados no seu lado direito da via, teve de ocupar a metade esquerda da faixa de rodagem, indo colidir com o motociclo, que então circulava pela sua mão de trânsito; que, em consequência da colisão, sofreu lesões, foi submetido a duas operações e tratamentos, ficou com 15 pontos de incapacidade parcial geral e vai sofrer danos futuros com a formação de uma artrose; que, desta forma, deve ser indemnizado por dano patrimonial futuro em € 100 000, 00 (atendendo à sua idade, ao grau de incapacidade de 15 pontos e ao salário médio de € 800, 00) e por não patrimonial no valor de € 60 000, 00; que a ré assumiu 100% da responsabilidade do sinistro do veículo da sua segurada.
2. A ré apresentou contestação, na qual impugnou parte da factualidade invocada pelo autor e alegou factos integrativos da corresponsabilidade do autor no acidente, defendendo:
a) Quanto ao modo como ocorreu o sinistro: que existe concorrência de culpa do autor, por este conduzir numa localidade a mais de 60 km/h, razão pela qual não logrou travar e embateu no veículo por si seguro, já na mão de trânsito deste.
b) Quanto à assunção da responsabilidade: que, embora tivesse assumido a responsabilidade do acidente, fê-lo antes de ter conhecimento do relatório elaborado pela GEP quanto às circunstâncias em que o mesmo ocorreu, o que a levou a reverter a sua posição quando o conheceu, passando a assumir a sua responsabilidade com base numa repartição de 50% das culpas entre o autor e a condutora do veículo por si seguro.
c) Quanto aos danos: que desconhece factos que impugna; que as indemnizações pedidas são exageradas face aos critérios jurisprudenciais.
3. Realizou-se audiência prévia, na qual, nomeadamente: foi fixado o valor processual da ação em € 160 000, 00; foi identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova; foram apreciados os requerimentos de prova.
4. Realizou-se perícia.
5. Realizou-se a audiência final.
6. A 13.12.2022 foi proferida sentença, na qual se decidiu:
«Pelo exposto, julgo a ação parcialmente procedente e, em consequência:
a) Condeno a R., a pagara à A., a quantia líquida de € 90.000,00 (noventa mil euros).
b) Condeno a R., a pagar à A., a quantia ilíquida correspondente às despesas que venha a ter com a realização de cirurgia, necessária em virtude do agravamento futuro das lesões que sofreu, com a formação de artrose;
c) Condeno a R., a pagar à A., juros moratórios, à taxa legal, incidentes sobre a quantia de € 90.000,00, contados desde a data da presente decisão até integral pagamento;
d) Absolvo a R., do demais peticionado.
Custas a cargo do A. e da R., na proporção dos respetivos decaimentos - art. 527º, n º 1 e 2, do C.P.C. (sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que goza o A.).
Registe - art. 153º, n º 4, do C.P.C.
Notifique - art. 220º, n º 1, do C.P.C.».
7. A ré interpôs recurso da sentença de I-6 supra, apresentando as seguintes conclusões:
«1ª- O presente recurso de apelação é interposto da douta sentença proferida, pois que, salvo o devido respeito, não procedeu a uma justa e correcta aplicação e subsunção do direito aos factos provados, nem à correta interpretação e aplicação dos preceitos e valores legais pertinentes quanto à culpa na produção do acidente;
2ª- Assim, o nosso recurso versa sobre estas três questões:
1-A qualificação da comunicação efectuada ao autor em 17.06.2021 como confissão extrajudicial e irrevogável ;
2-A Condenação da Ré em 100% da responsabilidade do seu segurado na produção do acidente e ressarcimento dos danos;
3-Os montantes indemnizatórios atribuidos ao Autor por danos não patrimoniais e danos patrimoniais futuros .
3ª- O Tribunal considerou a comunicação efectuada ao autor em 17.06.21, como confissão extrajudicial e irrevogável, pelo que é, salvo o devido respeito, contra este entendimento que a Ré Recorrente se insurge, por entender que a alteração da posição da Ré foi anterior à propositura da acção, atempadamente comunicada ao seu representante legal, foi justificada e adequada, não tendo oportunamente o autor reagido contra a mesma , como podia e devia .
4ª- Face aos factos provados na douta sentença o Mº Juiz do Tribunal a quo considerou e bem que houve concorrência de culpas na produção do acidente , considerando “ser igual a contribuição de cada um dos condutores para os danos” , porém, não obstante isto , deu toda a relevância à comunicação efectuada ao Autor e constante do ponto 13 dos factos provados;
5ª- E desconsiderou totalmente a comunicação constante do ponto 15 dos factos provados, ou seja, após ter tomado conhecimento do relatório de averiguação das circunstâncias do sinistro, apenas aceitou extrajudicialmente a concorrência de culpas na proporção de 50% para cada condutor, o que comunica formalmente e expressamente e justifica ao seu representante.
6ª- Assim, é exactamente contra esta justiça formal e processual, que não a desejável Justiça material, que nos insurgimos, porquanto, salvo o devido respeito, facilmente se alcança que não foi feita Justiça no caso concreto.
7ª- Aquela 1ª comunicação foi efetuada após ter conhecimento do acidente, como se lhe impunha no cumprimento das normas legais em vigor, designadamente dos arts 31 º e segts do Dec. Lei 291/2007 de 21 de Agosto - seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel , doravante designada pela Lei SORCA, e antes da averiguação do sinistro pela empresa por si contratada, a GEP,SA , sendo uma posição provisória de acordo com os elementos que dispunha.
8ª- Por imperativo de regularização do sinistro de forma rápida e célere, extra judicialmente, em conformidade com aquelas normas, enviou a comunicação que consta do ponto 13 dos factos provados, sendo que este alegado reconhecimento de factos desfavoráveis, opera apenas no contexto do regime jurídico do contrato de seguro de responsabilidade automóvel e da respectiva regularização extra judicial, não sendo confissão, valendo apenas como elemento probatório que o Tribunal deve apreciar livremente.
9ª- Salvo o devido respeito, não pode retirar-se à seguradora de modo absoluto, o direito de posteriormente alterar a sua posição face aos elementos que entretanto recolheu e extrajudicialmente comunicar ao terceiro a sua posição e fundamentá-la, e também em sede judicial discutir a dinâmica do acidente, ainda mais quando o terceiro, ora Autor, não aceitou a regularização do acidente pela via extrajudicial.
10ª- Desta forma assiste à recorrente o direito e tem legitimidade, para discutir a dinâmica do acidente e competindo ao autor a prova dos danos, é que tem o ónus da prova, salvo havendo presunção legal de culpa ( artº 342º e sgts do Código Civil), sendo tal licito, pois que alegou a superveniência de um facto ou elemento probatório relativamente ao momento em que assumiu a responsabilidade .
11ª- Analisada a comunicação efectuada ao autor, facilmente se alcança que tal comunicação é para dar cumprimento ao disposto no citado art. 37º da Lei SORCA, devendo entender-se tal, como uma aceitação provisória, podendo ser alterada se posteriormente e de forma superveniente obtiver novos elementos que justifiquem a alteração, como foi o caso.
12ª- O próprio acórdão do Tribunal da Relação do Porto com o nº 2528/15.9T8PRD.P1, apenas considera que é confissão judicial, e não admite a revogação, quando é efectuada “sem justificação adequada”, o que não sucedeu in casu.
13ª- De igual modo, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 19.11.2020, in Processo nº 5748/18.0T8MAI .P1 apenas considerou uma comunicação semelhante como confissão judicial, porque a seguradora o fez apenas na acção – e não antes como sucede no nosso caso -, e porque recusou depois assumir a responsabilidade “sem explicação reconhecida e aceite”.
14ª- Aliás, neste mesmo acórdão, citando Vaz Serra :
“A regra do nº 2 do art 376º constitui uma presunção fundada na regra de experiência de quem afirma factos contrários aos seus interesses o faz por saber que são verdadeiros; essa regra não tem contudo valor absoluto, pois pode acontecer que alguém afirme factos contrários aos seus interesses apesar de eles não serem verdadeiros …
Pode por isso provar o declarante que a sua declaração não correspondeu à sua vontade ou que foi afectada de algum vicio de consentimento … ( cfm art. 359º)”.
15ª- E acrescenta:
“Ainda que com força de prova plena, a confissão, seja ela judicial ou extrajudicial, pode ser declarada nula ou anulada nos termos gerais, por falta ou vícios da vontade, designadamente por erro, nos termos do art. 359º do Código Civil.
16ª – E “ assim, o confitente é admitido a destruir a força da confissão do facto desfavorável mediante a prova de que, na realidade, tal facto não correu, que o certo é outro facto contrário ao da afirmação que consciente e voluntariamente produziu no documento.”

E conclui :
“ Nesta decorrência a carta referida não pode ter aqui valor de confissão das circunstâncias do sinistro”.
17ª- Salvo o devido respeito, tem de se entender e interpretar com granus sallis, devendo ser entendida nos termos o artº. 361º do CC, valendo com o valor de reconhecimento não confessório, ou seja :“o reconhecimento de factos desfavoráveis, que não possa valer como confissão, vale como elemento probatório que o tribunal apreciará livremente”, traduzindo-se num simples meio de prova, podendo ser ilidida mediante prova em contrário, nos termos do disposto no art. 358º, nº 2 do CC .
18ª- Como, aliás, se refere no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23.02.2021.,proferido no Processo Apelação nº 1222/17.0T8PVZ.P1, que :
“ Resta apenas declarar que é incontornável que o facto de o FGA ter assumido extrajudicialmente a responsabilidade do acidente para efeitos de seguro, nada pode valer em termos de confissão judicial nesta acção em que se discutem vários aspectos do instituto da responsabilidade civil entre os vários intervenientes.”
Assim,
19ª- A culpa na produção do acidente teria de ser repartida na mesma proporção, face aos factos provados, pois é pacifico , em matéria de colisão de veículos como é o caso dos autos, importa distinguir diversas situações, no que se refere à responsabilidade pelos danos emergentes da colisão:
a) Havendo culpa de ambos os condutores, cada um responde pelos danos que causou;
b) Se apenas um foi culpado, apenas esse responde;
d) Havendo culpa de ambos, mas não podendo determinar-se em que medida cada um deles contribuiu para os danos, presume-se que contribuíram em igual medida;
e) Não havendo culpa de nenhum dos condutores, importa distinguir:
i) Se apenas um dos veículos causou danos ao outro (por exemplo um estava parado quando foi embatido), apenas esse condutor responde pelo risco;
ii) Se ambos os veículos concorreram para o acidente, somam-se os danos resultantes do acidente para os dois veículos e reparte-se a responsabilidade total na proporção em que cada um tenha contribuído para o acidente (levando em conta o peso, velocidade, características).
20ª - Regressando ao caso concreto, e face aos factos provados e como refere o Mº Juiz do Tribunal a quo, é possível afirmar a culpa de ambos os condutores, pelo que deste modo pensamos que de facto a responsabilidade na produção do acidente é na proporção de 50% para cada .
21ª-Pois, havendo culpa de ambos, mas não podendo determinar-se em que medida cada um deles contribuiu para os danos, presume-se que contribuíram em igual medida.
22ª- Quanto aos danos não patrimoniais deve ponderar a equidade e “o seu montante deve ser proporcional à gravidade do dano, ponderando-se , para tal , nas regras de boa prudência , do bom senso prático , da justa medida das coisas” e do criterioso sopesar das realidades da vida ;
23ª- Estes princípios impõem que sejam tratados e indemnizados de modo razoável e justo situações idênticas , devendo seguir-nos por critérios e medidas padrão , em que se obtenha , tanto quanto possível um modelo indemnizatório que permita uma maior certeza jurídica , de igualdade e socialmente justa .
24ª- Resultou provado que o autor ficou com Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica é fixável em 10 pontos, e que as sequelas são, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares;
25ª- Em consequência do sinistro o autor apenas ficou a sofrer de uma incapacidade de 10 pontos , que não é impeditiva do exercício de qualquer actividade como é manifesto , público e notório .
26ª- O simples facto de ver reduzida a capacidade física ou intelectual para o trabalho só se traduzirá em “dano patrimonial futuro” se aquele a quem acontece deixar de conseguir as vantagens económicas que conseguiria com a sua plena capacidade para o trabalho intocada, se só conseguir tais vantagens aplicando mais tempo.
27ª- Face aos factos expostos, a compensação global a atribuir ao demandanteme correspondente aos danos efectivamente sofridos e de acordo com os valores normalmente atribuídos em casos análogos, deve situar-se nos 15.000,00 euros a titulo de danos não patrimoniais e 30.000,00 € a titulo de danos patrimoniais futuros, que nos parece a quantia justa , equilibrada e equitativa para a situação em apreço e operar-se a divisão de 50% de responsabilidade para a Recorrente.
28ª- Assim, salvo o devido respeito, a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação e aplicação do disposto nos arts 31º e segts do DL 291/087 de 21.08, e arts 342º, 347º, 357º, 358º, 359º, 361º, 483º, 493º , 506º , 562º e 570º do CC aos factos provados .
Termos em que, e nos mais e melhores de direito que V. EXªs doutamente suprirão, dever ser concedido provimento ao recurso, e, em consequência, revogar-se a douta sentença recorrida e substituir-se por douto acórdão , nos termos expostos .
E, assim, se a fará a inteira e sã J U S T I Ç A.».
8. O autor respondeu ao recurso da ré e interpôs recurso subordinado, apresentando as seguintes conclusões:
«1. A Ré ao assumir perante o Autor a responsabilidade total por este sinistro obrigou-se necessariamente a indemniza-lo, por todos os danos sofridos, vinculando-se, por isso, a essa obrigação que livre e espontaneamente assumiu perante o Autor, sem qualquer tipo de reserva ou dúvida.
2. A conduta assumida pela Ré/Recorrente, na presente demanda constitui um manifesto abuso de direito e também um incumprimento doloso ou gravemente negligente dos deveres de cooperação e de boa fé processual a que as partes estão submetidas por força dos artigos 7º e 9º do Código de Processo Civil, sendo, por isso, censurável e reprovável por atentar contra o respeito pelos Tribunais e prejudicar a ação da Justiça.
3. Neste sentido, Cfr. entre outros, o douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido nos autos de processo 2528/15.9T8PRD.P1, de 11/01/2018, onde se lê “Age em violação de deveres acessórios de conduta, a justificar a atribuição de indemnização pela privação do uso do veículo, a seguradora que, depois de ter assumido inequivocamente perante o segurado a atribuição de indemnização e sua quantificação por perda total do veículo, vem, cerca de três semanas depois, sem justificação adequada e violando deveres de informação, comunicar à segurada que não a vai indemnizar, como se nunca tivesse assumido tal responsabilidade e negando posteriormente a sua assunção.”
4. E, ainda, na mesma linha de raciocínio, o douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido nos autos de processo 5748/18.0T8MAI.P1, de 19/11/2020, onde se lê “Abusa do direito de ação, no exercício da sua defesa, a R. seguradora que, tendo assumido inequivocamente a responsabilidade pelo acidente e a obrigação de reparar os danos dele emergentes em momento prévio à instauração da ação pelos lesados, recusa depois essa responsabilidade, sem explicação reconhecida e aceite, conduzindo os lesados à necessidade de instaurar aquela ação judicial, nela passando a discutir as circunstâncias em que o acidente ocorreu e os pressupostos da responsabilidade civil, designadamente a culpa do seu segurado, concluindo pela sua absolvição.”
5. A decisão recorrida faz uma errada aplicação da lei e do Direito, no que aos montantes indemnizatórios fixados diz respeito.
6. O Autor/Recorrente, tem razões para divergir do montante fixado pela sentença recorrida para o compensar pelos danos não patrimoniais sofridos, o qual se tem por desadequado e insuficiente, impondo-se um valor seguramente superior de forma equitativa e de modo a responder ao comando do artigo 496º, do Código Civil, de acordo, desde logo, com a verdade material trazida aos autos.
7. Para fixar tal indemnização o Tribunal a quo deverá aferir a gravidade desse dano por padrões objetivos, ponderando, o circunstancialismo de cada aso em concreto e não atender a padrões subjetivos, uma vez que a indemnização que for fixada tem que visar, por um lado, a reparação do dano sofrido e por outro lado, sancionar a conduta lesiva do agente.
8. Para a fixação da indemnização pelos danos morais será de valorar, entre outras, a circunstância da vítima ter sofrido períodos de doença significativos, com prolongados internamentos hospitalares, períodos de imobilização e intervenções cirúrgicas, dificuldades de locomoção e de condução, além das restrições pessoais e sociais daí decorrentes.
9. Devendo, a indemnização desses danos morais ser fixada com base na equidade a qual não se deve confundir com a pura arbitrariedade ou com a total entrega da solução a critérios assentes em puro subjetivismo do julgador, devendo a mesma traduzir “a justiça do caso concreto, flexível, humana, independente de critérios normativos fixados na lei”, devendo o julgador “ter em conta as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida…”.
10. Devendo o julgador, para fixar a indemnização por danos não patrimoniais aferir a gravidade do dano atendendo a padrões objetivos e não, pelo contrário a padrões subjetivos.
11. À data do acidente o aqui Autor tinha 19 anos de idade e era estudante do 1º ano de engenharia mecânica.
12. Foi sujeito a internamento hospitalar e realizou uma intervenção cirúrgica, e tomou medicação.
13. Quando teve alta hospitalar o Autor andou de cadeira de rodas cerca de 1 mês e em casa andava com o apoio de duas muletas, uma vez que tinha a perna engessada.
14. Nessa altura necessitou de ajuda de terceira pessoa quer para as tarefas diárias, como vestir, calçar, tomar bano, confecionar refeições, para se deslocar ao Centro de Saúde para fazer penso, para se deslocar ao Hospital ... para consultas, bem como para se deslocar à faculdade para realização de exames.
15. No período em que teve que assistir a aulas on line, também sentiu dores e desconforto, pelo facto de ter que estar sentado por longos períodos.
16. Dores essas que ainda hoje persistem.
17. Em virtude das lesões que sofreu não conseguia subir e descer escadas, agachar-se, deixou de fazer trabalhos de montagem/desmontagem de motores, em virtude de não conseguir pegar em pesos ou de estar longos períodos de pé, atividade, que lhe ocupava grande parte dos seus tempos livres já que a sua paixão são os “motores”.
18. Deixando de ajudar o pai no seu período de férias escolares, porque a partir do acidente ficou impossibilitado por força das lesões sofridas e das sequelas de que hoje padece.
19. Como resultado das sequelas, que lhe advieram do acidente discutido nos altos, foi atribuído ao Autor, um défice permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos, sendo de admitir a existência de dano futuro, tendo em conta o atingimento articular das lesões do tornozelo direito.
20. Não conseguindo o Autor permanecer em pé mais de 15/20 minutos.
21. Apresenta marcha claudicante.
22. As lesões que sofreu vão ter agravamento futuro, com a formação de artrose, necessitando de nova cirurgia.
23. O Autor sofreu um défice funcional temporário total de 7 dias, com igual número de dias de repercussão temporária na atividade profissional.
24. E sofreu um período de défice funcional temporário parcial de 328 dias, com igual número de dias de repercussão temporária na atividade profissional parcial.
25. Sofreu um quantum doloris de grau 5/7.
26. Deixou de jogar paintball e ficou impossibilitado de participar das atividades académicas.
27. O Autor receou pela sua própria vida.
28. Sentiu dores logo após o acidente que se prolongaram durante o internamento e tratamentos médicos a que foi sujeito e que ainda hoje ocorrem, vendo-se o mesmo, obrigado nessas alturas a tomar analgésicos, passando o mesmo, a usar ligaduras à volta do pé, para dessa forma atenuar essas referidas dores.
29. O Autor sofreu um dano estético permanente de grau 3/7, considerando a claudicação na marcha e as cicatrizes que apresenta.
30. E sofreu uma repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de grau 4/7.
31. Por tudo isto, entendemos, que não seria, no presente caso, desajustada a quantia dos € 60.000,00 peticionada a título de danos não patrimoniais em substituição dos € 30.000,00 fixados pela sentença recorrida.
32. Como se pronunciou entre outros o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça no Processo 589/13.4TBFLG.P1.S1, de 14/12/2017. disponível em www.dgsi.pt, e que perfilhamos, “O dano biológico, perspectivado como diminuição somático-psíquica e funcional do lesado, com substancial e notória repercussão na vida pessoal e profissional de quem o sofre, é sempre ressarcível, como dano autónomo, independentemente do seu específico enquadramento nas categorias normativas do dano patrimonial ou do dano não patrimonial.” (negrito e sublinhado nossos)
33. A indemnização a fixar pelo Tribunal deve ser justa, adequada e proporcional ao dano sofrido pelo lesado e, isso, aqui não aconteceu, na medida em que a indemnização arbitrada ao Recorrido pelo Tribunal a quo é absolutamente injusta, desadequada e desproporcional aos danos por si sofridos e avaliados em sede de exame pericial.
34. Não podendo, desse modo, o aqui Recorrente conformar-se com o valor indemnizatório fixado na sentença recorrida pelo défice funcional permanente/ biológico de que o Autor ficou a padecer em consequência do acidente dos autos.
35. O Sr. Perito médico-legal, considerou que as sequelas são compatíveis com o exercício da atividade de formação frequentada à data pelo examinado.
36. O aqui Autor não será para sempre estudante, e nessa medida importava ter considerado a repercussão da sua atividade enquanto engenheiro mecânico e não só como estudante.
37. O Autor é jovem, contando à data do acidente, 19 anos de idade, sendo certo que à data do acidente não auferia qualquer salário, por ser estudante.
38. Na sua falta ou escassez, para atribuir uma justa compensação, o Tribunal deveria ter considerado o padrão médio de um homem de 19 anos de idade, que sofre de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos percentuais, com existência de dano futuro, de acordo com a prudência e as regras da experiência comum, o que entende o Recorrente não se ter verificado, in casu.
39. Conforme referido na douta sentença de fls., e no seguimento do Acórdão da Relação de Coimbra, de 21-12-2010, nesta data disponível em www.dgsi.pt “O valor da remuneração mensal a considerar também deve ser encontrado num juízo de prognose, seguindo aquilo que, em circunstâncias semelhantes, as mais das vezes sucede.”
40. E na mesma linha de pensamento, deixamos aqui também, indicado o Acórdão da Relação de Coimbra, de 05-02-2015, nesta data também disponível  em www.dgsi.pt, como resulta da mesma decisão de fls., onde se pode ler que “… em situações em que a actividade profissional do lesado não está ainda definida, a retribuição mínima mensal garantida é apenas um ponto de partida, pelo que o salário médio do país é mais adequado para encontrar o valor do dano biológico, devido ao facto de este valor médio reflectir de forma mais aproximada à realidade a situação económica global do país onde as indemnizações aqui em causa também se inserem.”
41. Sabendo nós que o salário médio mensal em Portugal ronda os € 1.300,00 e que o mesmo ao longo dos próximos anos será ainda superior, afigura-se-nos, salvo o devido respeito que será justo e equilibrado, atribuir ao Autor/Recorrente, como compensação pela IPG de 10 pontos, a indemnização de, pelo menos € 100.000,00 (ao invés dos € 60.000,00 aplicados).
42. Entende, assim, o Autor que não se mostra corretamente fixado o quantum indemnizatório que lhe é devido, na parte questionada no presente recurso, tendo em conta a factualidade provada e os critérios legais previstos para a reparação dos danos sofridos, bem como a jurisprudência existente nesta matéria.
43. Assim, pensamos face a tudo quanto vem explanado que deverão ser alterados os montantes fixados pelo Tribunal a quo a título de indemnização por dano biológico e danos não patrimoniais, fixando antes o seu valor conjunto no montante de € 160.000,00, ao invés dos € 90.000,00 que constam da sentença proferida.
44. Tudo visto e ponderado, tendo presente que só o uso da equidade permite alcançar o montante que, mais justa e equilibradamente, compense a perda da capacidade aquisitiva do Autor, entendemos que se deve alterar a indemnização pelos danos patrimoniais futuros (dano biológico) e danos não patrimoniais conforme atrás melhor referido.
45. A decisão violou os artigos 496º, 562°, 563º, 564° e 566° do Código Civil, preceitos que assim, por errada interpretação e aplicação, se encontram violados pela douta sentença recorrida, e os mais que V. Exas, doutamente, vierem a considerar.
46. Em consequência não restará outra alternativa senão alterar a decisão recorrida no que concerne ao valor da indemnização arbitrado a título de danos morais e de danos patrimoniais futuros/dano biológico.
Termos em que deve dar-se provimento ao recurso, e consequentemente alterar-se a decisão recorrida,
Assim se fazendo Justiça!»

II. Questões a decidir:

As conclusões das alegações do recurso delimitam o seu objeto, sem prejuízo da apreciação das questões de conhecimento oficioso não decididas por decisão transitada em julgado e da livre qualificação jurídica dos factos pelo Tribunal, conforme decorre das disposições conjugadas dos artigos 608º/ 2, ex vi do art. 663º/2, 635º/4, 639º/1 e 2, 641º/2- b) e 5º/ 3 do C. P. Civil.

Definem-se como questões a decidir:

1. No recurso principal:
1.1. Se pode ou não ser discutida a responsabilidade do segurado e a repartição de responsabilidade do acidente (por a recorrente defender que a comunicação de 17.06.2021 não tem valor de confissão extrajudicial e por os factos provados permitirem concluir pela existência de uma repartição de culpas) e, em caso afirmativo, se esta deve ser fixada em 50% para cada um dos condutores (conclusões 1ª a 21ª).
1.2. Se a indemnização por danos não patrimoniais deve ser reduzida para o valor de € 15 000, 00 e se a indemnização por danos patrimoniais futuros deve ser reduzida para o valor de € 30 000, 00, valores estes ainda sujeitos, na defesa e pedido da recorrente, à redução em 50% face a 1.1. supra (conclusões 22º a 28º).
2. No recurso subordinado:
2.1. Se a pretensão da Companhia de Seguros em discutir a repartição da responsabilidade pelo acidente corresponde a um abuso de direito (conclusões 1 a 4).  
2.2. Se a indemnização por danos não patrimoniais deve ser ampliada para o valor de € 60 000, 00 e se a indemnização por danos patrimoniais futuros deve ser ampliada para o valor de € 100 000, 00 (conclusões 35 a 46).

III. Fundamentação:

1. Matéria de facto provada na sentença recorrida:
«1 - No dia 29-05-2021, pelas 16.05 horas, na Rua ..., na localidade de ..., ..., ocorreu um embate entre os seguintes veículos:
a) O automóvel de matrícula ..-..-SN, conduzido por BB
b) E o ciclomotor de matrícula ..-MT-.., conduzido pelo A.
2 - O A. circulava no sentido .../..., em sentido descendente.
3 - E BB circulava no sentido .../..., em sentido ascendente.
4 - No local, atento o sentido de trânsito .../..., havia dois veículos estacionados, no lado direito da via, obstruindo a hemi-faixa de rodagem da direita, causando um estreitamento da via;
5 - Pretendendo a BB contornar/transpor esses dois veículos estacionados, circulando a cerca de 10 km/h, ocupou, com o veículo que conduzia, parte da metade esquerda da faixa de rodagem.
6 - Quando já estava prestes a concluir a transposição daqueles dois veículos, surgiu-lhe o A., de frente, a conduzir o motociclo;
7 - A mais de 50 km/h.
8 - Quando o A. viu o automóvel, travou, tendo derrapado e, tentou desviar-se do mesmo, para a esquerda, atento o seu sentido de marcha;
9 - Indo, porém, embater com o motociclo e o seu corpo, na zona da frente direita, junto ao canto direito do automóvel, que se encontrava já praticamente imobilizado;
10 - Ocorrendo o embate nas proximidades da zona do meio da faixa de rodagem;
11 - Numa via que, no local, tinha cerca de 4,80 metros de largura.
12 - Logo após o embate, o automóvel ficou com a sua lateral traseira direita a 2,70 metros e com a lateral frente direita a 2,35 metros, do limite direito da faixa de rodagem (atento o sentido de marcha do automóvel) e ficou com a lateral traseira esquerda a 1,00 metro e com a lateral frente esquerda a 1,10 metros, do limite esquerdo da faixa de rodagem (atento o sentido de marcha do automóvel).
13 - Em 17-06-2021, a R. informou o A. nos seguintes termos: “Na sequência do sinistro ocorrido, informamos que estamos a assumir 100% de responsabilidade”.
14 - Em 16-11-2021, a R. pagou ao “proprietário” do motociclo, o valor total em que importou a reparação dos danos pelo mesmo sofridos.
15 - Em 23-11-2021, depois de ter tido conhecimento do relatório de averiguação das circunstâncias do sinistro, elaborado pela GEP, a R., para eventual acordo extrajudicial de indemnização dos danos sofridos pelo A., aceitou extrajudicialmente a concorrência de culpas na proporção de 50% para cada condutor.
16 - Em consequência do ocorrido, o A. sofreu fratura da perna direita (da tíbia e do perónio).
17 - Foi socorrido pelo INEM e transportado ao Hospital ..., onde ficou internado.
18 - Aí foi submetido a cirurgia e teve alta em 04-06-2021.
19 - Em 19-07-2021 retirou o material de imobilização.
20 - Após realizou 40 sessões de fisioterapia.
21 - E teve alta definitiva em 27-10-2021.
22 - O A. nasceu em .../.../2002.
23 - À data do embate, era estudante do 1º ano de engenharia mecânica.
24 - O A. tem dificuldade em permanecer em pé mais de 15/20 minutos.
25 - Apresenta marcha claudicante.
26 - As lesões que sofreu vão ter agravamento futuro, com a formação de artrose.
27 - Razão pela qual, necessitará de nova cirurgia.
28 - O A. sofreu um défice funcional temporário total de 7 dias, com igual número de dias de repercussão temporária na atividade profissional.
29 - E sofreu um período de défice funcional temporário parcial de 328 dias, com igual número de dias de repercussão temporária na atividade profissional parcial.
30 - Sofreu um quantum doloris de grau 5/7.
31 - E um défice permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos, sendo de admitir a existência de dano futuro, tendo em conta o atingimento articular das lesões do tornozelo direito.
32 - As sequelas sofridas são compatíveis com o exercício da atividade de formação do A.
33 - O A. sofreu um dano estético permanente de grau 3/7, considerando a claudicação na marcha e as cicatrizes que apresenta;
34 - E sofreu uma repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de grau 4/7.
35 - A R. celebrou com CC, um contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel, titulado pela apólice ...41, referente ao veículo de matrícula ..-..-SN.».

2. Apreciação jurídica:
2.1. Da responsabilidade dos intervenientes no acidente:

Importa apreciar, como primeira questão colocada no recurso principal, se pode ou não ser discutida a existência de responsabilidade do autor e da segurada na ocorrência do acidente (por a recorrente defender que a comunicação de 17.06.2021 não tem valor de confissão extrajudicial e por os factos provados permitirem concluir pela existência de uma repartição de culpas) e, em caso afirmativo, se esta deve ser fixada em 50% para cada um dos condutores (conclusões 1ª a 21ª).
Para este efeito, expor-se-ão os fundamentos da sentença e do recurso e da defesa (em III- 2.1.1. infra) e, após, apreciar-se-á a questão suscitada mediante a aplicação do regime de direito aplicável (em III- 2.1.2. infra).
2.1.1. Fundamentos da sentença, do recurso e da resposta:
A sentença recorrida, apesar de entender que os factos alegados e provados sobre a dinâmica do acidente implicariam a responsabilização do autor e da segurada ré em 50% para cada um, nos termos dos arts.487º, 570º e 506º/2 do Código Civil, decidiu responsabilizar a ré pela obrigação de suportar a totalidade da indemnização face à assunção de 100% da responsabilidade pelo acidente por esta realizada a 17.06.2021.
O Tribunal a quo, para este efeito, valorou livremente a declaração (que considerou não ter sido invalidada), apesar de não aderir às posições jurisprudenciais que enunciou do Ac. RP de 19-11-2020 (que qualificara a discussão judicial sobre a responsabilidade no acidente contrária à assunção de responsabilidade como um abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium), nem dos Ac. RE de 29.04.2021 e de 27.01.2022, Ac. RP de 09.09.2013 e Ac. RL de 09.05.2019 (que entenderam que a assunção de responsabilidade pela seguradora deveria ser valorada como confissão extrajudicial de responsabilidade, dispensando a discussão na ação dos factos relacionados com as circunstâncias do acidente), nos seguintes termos:
«Ou seja, embora parte da jurisprudência enquadre a situação em causa na figura do abuso de direito e outra na figura da confissão, confluem, porém, na consequência de uma tal comunicação, qual seja, a de se ter por assente (e portanto, não ter que ser discutida) a responsabilidade da seguradora.
Parece-se-nos, porém que, as referidas figuras jurídicas do abuso de direito e da confissão, poderão, eventualmente, não ser as mais adequadas ao caso, porquanto, a primeira (o abuso de direito) nos parece versar sobre direitos substantivos (que não estão em causa nos autos, pois a seguradora não é titular de qualquer direito substantivo que esteja a exercer abusivamente) e não sobre direitos processuais; e, a segunda (a confissão) nos parece versar sobre factos - como decorre do art. 352º, do C.C., onde se consagra que, a confissão é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária - (o que não está em causa nos autos, pois que, com a assunção de 100% de responsabilidade, a seguradora não confessa os factos alegados pelo A. relativos à ocorrência do sinistro, concretamente, os que permitem concluir pela culpa da condutora do veículo automóvel) e não sobre uma determinada situação jurídica.
Afigura-se-nos, no entanto que, uma tal comunicação efetuada pela R. ao A., não pode deixar de ter relevância.
Tal comunicação traduz uma inequívoca assunção da total responsabilidade (e do consequente dever de indemnizar) da seguradora, perante o A., pelos danos por este sofridos com o sinistro (na comunicação feita pela R. ao A., aquela até lhe solicita o NIB/IBAN, para que possa transferir-lhe os valores apurados).
Ao assumir 100% da responsabilidade pelo sinistro perante o A., a R. obrigou-se a indemnizá-lo (na proporção de 100%) pelos danos por este sofridos com o sinistro, vinculando-se assim a essa obrigação que, livremente assumiu.
E assim sendo, a R. responde, na proporção de 100%, por força desta obrigação que assumiu perante o A.
O facto de, posteriormente, a R. só já ter aceite 50% da responsabilidade, não tem a virtualidade de a desvincular da obrigação que anteriormente assumira, em 100% (e muito menos assim sendo quando, a R. já indemnizara o proprietário do veículo conduzido pelo A. pela totalidade dos danos pelo mesmo sofridos com o sinistro).
A R. não tinha que ter tomado a primeira posição que tomou e não tinha que a tomar enquanto entendesse não ter os elementos que considerasse necessários para a tomar conscienciosamente.
Tal decisão foi tomada porque a R. a quis tomar e porque certamente achou que tinha elementos que lhe permitiam tomá-la.
Se a R. entendia que, sem ter na sua posse o relatório de averiguação que certamente já teria solicitado ou estaria prestes a solicitar (uma vez que o relatório é de 26-06-2021, ou seja, 9 dias após a R. ter informado o A. de que assumia 100% de responsabilidade), então deveria sobrestar na sua decisão de assunção de responsabilidade.
Se a R. se precipitou na assunção total de responsabilidade, só a si se deve essa precipitação, pelo que, só ela deve ser responsabilizada (e eventualmente prejudicada) pela mesma.
Não é que aquela obrigação assumida pela R. não pudesse eventualmente ser invalidada, se fundamento para tal houvesse. Porém, enquanto a sua invalidade não for declarada - como não foi - , ela mantém-se, vinculando a R. perante o A.
Assim sendo, ou seja, porque a R. assumiu 100% da responsabilidade decorrente do sinistro, vinculou-se/obrigou-se perante o A., a indemnizar-lhe 100% dos danos pelo mesmo sofridos em consequência do sinistro, respondendo assim nos termos dessa obrigação assumida, ainda que a condutora do veículo seguro pela R. não seja 100% responsável pela ocorrência do sinistro.
A R. está assim obrigada a reparar 100% dos danos sofridos pelo A., e que o mesmo não teria sofrido não fosse o evento lesivo - art. 563º, do C.C.».
A recorrente/ré, no recurso de apelação, opôs-se a esta decisão e fundamentação da sentença referida em III- 2.1.1.1 supra, defendendo: que a posição tomada a 17.06.2021 correu após ter tido conhecimento do acidente, ao abrigo dos arts.31º ss do DL nº291/2007, de 21 de agosto (maxime art.37º), ocorreu antes da averiguação do sinistro, foi provisória de acordo com os elementos que dispunha, não vale como confissão e apenas pode ser valorada livremente pelo Tribunal nos termos do art.361º do C. Civil; que, depois de averiguar o sinistro e conhecer o relatório, apenas aceitou 50% da responsabilidade, conforme facto provado que não foi valorado pelo Tribunal a quo como deveria, pois a seguradora não poder ficar em absoluto sem possibilidade de alterar a sua posição extrajudicialmente mediante factos supervenientes e de forma fundamentada e de discutir a dinâmica do acidente em sede judicial, sendo que o declarante pode provar que a sua declaração não correspondeu à sua vontade ou foi afetada por algum vício de consentimento, nos termos do art.359º do C. Civil e mesmo a confissão pode ser destruída mediante prova de facto contrário ao declarado (conclusões 1º a 21º).
O recorrido/autor, em resposta a este recurso, defendeu: que a ré/recorrente assumiu a responsabilidade pelo acidente em 100% e de forma definitiva, conforme comunicação de 17.06.2021 (realizada de forma livre e sem reservas), na qual pediu o NIB/IBAN para lhe pagar os valores apurados, e conforme o pagamento que fez dos danos do veículo; que, desta forma, a conduta assumida pela ré constitui um abuso de direito e um incumprimento doloso ou gravemente negligente dos deveres de cooperação e de boa-fé processual dos arts.7º e 9º do C. P. Civil (conclusões 1 a 4).        

2.1.2. Apreciação jurídica da situação em análise:
2.1.2.1. Enquadramento jurídico:

No regime do sistema de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, aprovado pelo DL nº291/2007, de 21 de agosto, retificado pela Retificação de nº96/2007, de 19 de outubro e revisto pelo DL nº153/2008, de 06.08., o legislador define obrigações da seguradora a quem for participado o sinistro, cujo incumprimento é gerador de um regime sancionatório.

Assim, após a participação do sinistro (art.35º do diploma), cabe à seguradora:
a) Obrigações gerais (arts.36º e 38º do RSSORCA), nas quais se integram  as obrigações de comunicar a assunção ou a não assunção da responsabilidade pelo sinistro participado (art.36º/1-e) e f) do RSSORCA -«e) Comunicar a assunção, ou a não assunção, da responsabilidade no prazo de 30 dias úteis, a contar do termo do prazo fixado na alínea a), informando desse facto o tomador do seguro ou o segurado e o terceiro lesado, por escrito ou por documento electrónico; f) Na comunicação referida na alínea anterior, a empresa de seguros deve mencionar, ainda, que o proprietário do veículo tem a possibilidade de dar ordem de reparação, caso esta deva ter lugar, assumindo este o custo da reparação até ao apuramento das responsabilidades pela empresa de seguros e na medida desse apuramento.»), com uma proposta razoável de indemnização (art.38º/1 do RSSORCA -«1 - A posição prevista na alínea e) do n.º 1 ou no n.º 5 do artigo 36.º consubstancia-se numa proposta razoável de indemnização, no caso de a responsabilidade não ser contestada e de o dano sofrido ser quantificável, no todo ou em parte»), sob pena de responder pelo incumprimento destes deveres (art.38º/2 e 3 do RSSORCA - «2 - Em caso de incumprimento dos deveres fixados nas disposições identificadas no número anterior, quando revistam a forma dele constante, são devidos juros no dobro da taxa legal prevista na lei aplicável ao caso sobre o montante da indemnização fixado pelo tribunal ou, em alternativa, sobre o montante da indemnização proposto para além do prazo pela empresa de seguros, que seja aceite pelo lesado, e a partir do fim desse prazo. 3 - Se o montante proposto nos termos da proposta razoável for manifestamente insuficiente, são devidos juros no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso, sobre a diferença entre o montante oferecido e o montante fixado na decisão judicial, contados a partir do dia seguinte ao final dos prazos previstos nas disposições identificadas no n.º 1 até à data da decisão judicial ou até à data estabelecida na decisão judicial.»).
b) Obrigações especiais quanto aos sinistros participados que envolvam danos corporais (arts.37º e 39º do RSSORCA), nos quais se integram, para além das informações sobre a realização da avaliação do dano corporal, o dever de tomar posição sobre a assunção da responsabilidade pelos danos, com a apresentação de proposta razoável de indemnização, que pode ter caráter definitivo ou provisório consoante haja ou não relatório de alta clínica com dano quantificável, provisoriedade, todavia, passível de consolidação por aceitação do lesado (art.37º/1-c) e 2-a) e b) do RSSORCA - «1 - Sempre que lhe seja comunicada pelo tomador do seguro, pelo segurado ou pelo terceiro lesado a ocorrência de um sinistro automóvel coberto por um contrato de seguro e que envolva danos corporais, a empresa de seguros deve, relativamente à regularização dos danos corporais: (…) c) Comunicar a assunção, ou a não assunção, da responsabilidade no prazo de 45 dias, a contar da data do pedido de indemnização, caso tenha entretanto sido emitido o relatório de alta clínica e o dano seja totalmente quantificável, informando daquele facto o tomador do seguro ou o segurado e o terceiro lesado, por escrito ou por documento electrónico. 2 - Sempre que, no prazo previsto na alínea c) do número anterior, não seja emitido o relatório de alta clínica ou o dano não seja totalmente quantificável: a) A assunção da responsabilidade aí prevista assume a forma de «proposta provisória», em que nomeia especificamente os montantes relativos a despesas já havidas e ao prejuízo resultante de períodos de incapacidade temporária já decorridos; b) se a proposta prevista na alínea anterior tiver sido aceite, a empresa de seguros deve efectuar a assunção da responsabilidade consolidada no prazo de 15 dias a contar da data do conhecimento pela empresa de seguros do relatório de alta clínica, ou da data a partir da qual o dano deva considerar-se como totalmente quantificável, se posterior.»), sob pena de responder pelo incumprimento destes deveres (art.39º/1-a) do RSSORCA - «2 - Em caso de incumprimento dos deveres fixados nas disposições identificadas no número anterior, quando revistam a forma dele constante, é aplicável o previsto nos n.os 2 e 3 do artigo anterior. 3 - Todavia, quando a proposta da empresa de seguros tiver sido efectuada nos termos substanciais e procedimentais previstos no sistema de avaliação e valorização dos danos corporais por utilização da Tabela Indicativa para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, os juros nos termos do número anterior são devidos apenas à taxa legal prevista na lei aplicável ao caso e sobre a diferença entre o montante oferecido e o montante fixado na decisão judicial, e, relativamente aos danos não patrimoniais, a partir da data da decisão judicial que torne líquidos os montantes devidos.»).
As declarações de assunção de dívida da seguradora, apresentadas neste contexto, têm sido valoradas pela Jurisprudência, nos termos também citados pela sentença recorrida: quer através da consideração que a confissão extrajudicial dispensa a alegação e prova de factos para preencher a responsabilidade, nomeadamente, no Ac. RP de 09.09.2013, proferido no processo nº1608/08.0TJPRT.P1, relatado por Carlos Querido, disponível in dgsi.pt (que sumariou «I. Tendo a seguradora, em carta dirigida ao representante do lesado, assumido a culpa do condutor do veículo segurado e a responsabilidade pela reparação dos danos decorrentes do acidente, tal declaração tem a natureza de confissão extrajudicial, revestindo força probatória plena, nos termos do n.º 2 do artigo 358.º do Código Civil. II. Na situação descrita torna-se irrelevante o facto de a confissão ter sido assumida numa fase negocial e de as partes não terem chegado a acordo quanto ao montante da indemnização, não podendo tal confissão ser ignorada ou esquecida pelo tribunal, que deverá recusar a (inútil) discussão da culpa, e passar directamente à avaliação dos danos.»), no Ac. RL de 09.05.2019, proferido no processo nº5995/18.5T8ALM-A.L1-2, relatado por Arlindo Cruas (que sumariou, nomeadamente: «(…)- a circunstancia da Requerida Seguradora ter remetido, aos lesados, cartas nas quais assume a regularização dos prejuízos decorrentes do acidente, traduz efectiva assunção de responsabilidade por parte da mesma no ressarcimento dos danos decorrentes do evento lesivo; - o facto da assunção de responsabilidade assumir a forma de “proposta provisória” – cf., a alínea a), do nº. 2, do artº. 37º ,do DL nº. 291/2007, de 21/08 - nada tem a ver com o assumir da responsabilidade indemnizatória ou ressarcitória, mas antes devido ao facto do dano, à data, ainda não poder ser totalmente quantificável, ou seja, a provisoriedade legalmente equacionada não se reporta ao assumir da responsabilidade, mas antes á definição do quantum indemnizatório a operar; - no âmbito do enunciado quadro normativo, a seguradora pode assumir ou não assumir a responsabilidade pela regularização dos danos decorrentes do evento lesivo, fundamentando a não assunção da responsabilidade nos termos equacionados no artº. 40º do citado Decreto-Lei ; - a posição assumida pela Requerida seguradora é claramente de assunção da responsabilidade de regularização dos prejuízos decorrentes do acidente, o que considerou, e efectivou, tal como expressamente reconheceu, após averiguação que efectuou “com o fito de tomar uma decisão quanto à responsabilidade, tendo em conta os elementos recolhidos” – cf., artigos 3º, 4º e 6º da oposição/contestação ; - pelo que, considera-se existir confissão extrajudicial em documento particular, dirigida à parte contrária, atribuindo-lhe a lei força probatória plena ;
- determinando que,
in casu, fruto daquela força probatória plena, inexista lugar á discussão da culpa na produção ou eclosão do evento lesivo, sendo apenas discutível o âmbito e avaliação dos danos a ressarcir ; (…)»), no Ac. RE de 29.04.2021, proferido no processo nº2340/20.3T8STR.E1, relatado por Tomé Ramião (que sumariou «1. Decorre do n.º 2 do art.º 358.º do C. Civil que a confissão extrajudicial, em documento autêntico ou particular, considera-se provada nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária ou a quem a represente, tem força probatória plena.
2. Se a seguradora, na sequência da comunicação do acidente de viação efetuada pelo condutor do veículo, remeteu ao lesado, nos termos da alínea e) do n.º1 do art.º 36.º, Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, uma missiva na qual declara assumir a responsabilidade pela regularização dos danos decorrentes do presente sinistro, com posterior acompanhamento da sua situação clínica e pagamento de todas as despesas com a sua assistência médica, designadamente intervenções cirúrgicas, tratamentos, exames, medicamentos, transportes e consultas médicas, durante cerca de seis meses, tal declaração reúne todos os requisitos da confissão extrajudicial, em documento particular, dirigida à parte contrária, atribuindo-lhe a lei força probatória plena, o que impede que se discuta nova versão do acidente quanto à culpa.»);
quer através da consideração de que a prova do facto da assunção da responsabilidade torna a discussão judicial dos factos subjacentes à mesma um abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, no Ac. RP de 19.11.2020, proferido no processo nº5748/18.0T8MAI.P1, relatado por Filipe Caroço (que sumariou «Abusa do direito de ação, no exercício da sua defesa, a R. seguradora que, tendo assumido inequivocamente a responsabilidade pelo acidente e a obrigação de reparar os danos dele emergentes em momento prévio à instauração da ação pelos lesados, recusa depois essa responsabilidade, sem explicação reconhecida e aceite, conduzindo os lesados à necessidade de instaurar aquela acção judicial, nela passando a discutir as circunstâncias em que o acidente ocorreu e os pressupostos da responsabilidade civil, designadamente a culpa do seu segurado, concluindo pela sua absolvição.»).  
No regime geral das declarações negociais, por sua vez: quanto às propostas negociais, o art.230º do Código Civil define que «1. Salvo declaração em contrário, a proposta de contrato é irrevogável depois de ser recebida pelo destinatário ou de ser dele conhecida. 2. Se, porém, ao mesmo tempo que a proposta, ou antes dela, o destinatário receber a retractação do proponente ou tiver por outro meio conhecimento dela, fica a proposta sem efeito. 3. A revogação da proposta, quando dirigida ao público, é eficaz, desde que seja feita na forma da oferta ou em forma equivalente.»; quanto à aceitação das propostas (arts.233º ss do C. Civil), o art.234º do C. Civil define que «Quando a proposta, a própria natureza ou as circunstâncias do negócio, ou os usos tornem dispensável a declaração de aceitação, tem-se o contrato por concluído logo que a conduta da outra parte mostre a intenção de aceitar a proposta.».
            O regime da irrevogabilidade da proposta (nº1 do art.230º do C. Civil) protege o tráfego negocial e a confiança do destinatário da proposta, cuja revogação não foi ressalvada quando foi apresentada, sem prejuízo da mitigação do regime pela alteração anormal das circunstâncias (art.437º do C. Civil), segundo Fernando Ferreira Pinto e Fernando Sá[i]. E o regime da retratação de proposta vigente (nº2 do art.230º do C. Civil), segundo estes autores «contém uma regra aplicável a todas as declarações negociais e não apenas à subespécie proposta, não existindo, quanto à proposta, qualquer circunstancialismo excecional que inviabilize estender esta solução;»[ii].

2.1.2.2. Situação em análise:
Importa apreciar a decisão proferida pela 1ª instância, referida em III- 2.1.1. supra, face aos fundamentos do recurso e da resposta, mediante os factos provados em 13 e 14 e o regime de direito aplicável.
Por um lado, verifica-se que a sentença recorrida julgou provado:
a) Em relação aos factos alegados nos arts.12º e 13º da petição inicial: o facto 13 por confissão do facto pela ré («Em 17-06-2021, a R. informou a A. nos seguintes termos: “Na sequência do sinistro ocorrido, informamos que estamos a assumir 100% de responsabilidade») e o facto 14 com base em prova documental e testemunhal («Em 16-11-2021, a R. pagou ao “proprietário” do motociclo, o valor total em que importou a reparação dos danos pelo mesmos sofridos»).
Ora, estes factos provados não foram impugnados nestes autos, nos termos do art.640º do C. P. Civil. Por sua vez, o facto 13, declarado confessado, foi-o efetivamente no art.19º da contestação, razão pela qual nada há a corrigir oficiosamente para os efeitos dos arts.662º/1 e 663º/2, em referência ao art.607º/4-2ª parte do C. P. Civil.
Assim, estes factos 13 e 14 estão definitivamente assentes.
b) Em relação aos factos alegados no art.20º da contestação: o facto 15 («Em 23-11-2021, depois de ter tido conhecimento do relatório de averiguação das circunstâncias do sinistro, elaborado pela GEP, a R., para eventual acordo extrajudicial de indemnização dos danos sofridos pelo A., aceitou extrajudicialmente a concorrência de culpas na proporção de 50% para cada condutor»).  
Este facto, a partir do qual a ré passou a defender que deveria assumir apenas 50% da responsabilidade, conforme demonstra também a discussão deste processo, teve lugar após a ocorrência dos factos 13 e 14.
Por outro lado, examinando os factos alegados pela ré/seguradora para sua defesa, verifica-se que esta não alegou (e, consequentemente, não provou): que quando emitiu a declaração de 17.06.2021 a tivesse condicionado a qualquer evento suspensivo ou resolutivo posterior ou o tivesse feito de forma provisória com ressalva da conclusão de peritagem que estivesse em curso; que quando emitiu a referida declaração o fez em situação de falta ou de vício de vontade, nomeadamente por erro (arts.359º, 240º ss do C. Civil).
Estamos, assim, perante uma declaração clara e incondicionada da ré de assunção da responsabilidade de 100% dos danos do acidente que vitimou o autor.
Por outro lado, ainda, lendo esta declaração de 17.06.2021, face ao regime do seguro obrigatório enunciado supra, não se pode reconhecer que a declaração tivesse apenas efeitos legais provisórios defendidos pela recorrente, uma vez: que a provisoriedade assinalada à assunção de dívida referida no art.37º/2-a), em referência ao art.37º/1-c), do RSSORCA, referindo-se à assunção acompanhada de proposta razoável de indemnização numa circunstância em que não tenha sido ainda emitido relatório clínico da alta ou o dano não esteja totalmente quantificado, respeita à assunção de um valor de indemnização proposto e não aos pressupostos da responsabilidade pela obrigação de indemnizar ou ao grau de repartição da responsabilidade; que, de qualquer forma, a indemnização provisória pode ser consolidada mediante aceitação do lesado, nos termos do art.37º/2-b) do RSSORCA.
Ora, perante estes factos provados, de acordo com o regime civil geral, não pode deixar de se entender: que a declaração incondicionada de assunção de 100% da responsabilidade pelo acidente, sobretudo realizada por uma pessoa coletiva que se dedica à atividade profissional de seguros e está obrigada a conhecer o regime legal, corresponde a uma verdadeira proposta negocial de assumir, em relação ao valor de reparação e de compensação de danos a definir, a responsabilidade total da indemnização, sem redução por repartição da culpa entre os intervenientes do acidente (art.230º do C. Civil); que esta declaração de assunção de dívida, sem qualquer ressalva, chegou ao conhecimento do destinatário, sendo por isso irrevogável (art.230º/1 do C. Civil) que, antes ou na altura desta declaração de assunção de dívida, não foi comunicado ao declaratário qualquer retratação, que pudesse tornar a proposta ineficaz (art.230º/2 do C. Civil); que esta proposta, para além de dispensar a aceitação, face à totalidade da responsabilidade assumida pela ré/seguradora (e pretendida, notoriamente, por qualquer lesado que comunique um sinistro, nos termos do art.512º do C. P. Civil), considera-se tacitamente aceite pelo lesado, tendo em conta que o pagamento integral da reparação integral do motociclo por si conduzido e provado no facto 14, obteve presuntivamente a colaboração prévia (para disponibilização de meios de pagamento) e aceitação do referido lesado (arts. 349º e 351º do C. Civil, em referência ao art.234º do C. Civil). 
Por sua vez, a ré não alegou (e, consequentemente, não provou) que tivesse ocorrido uma alteração superveniente, anormal e imprevista de circunstâncias, que pudesse fundamentar a possibilidade de alteração da proposta (art.437º do C. Civil), uma vez que, para além desta causa não ter sido invocada, a 17.06.2021 a ré já deveria saber que iria pedir a peritagem de avaliação dos danos ou que a mesma estava em curso.
Desta forma, considerando-se que a ré está vinculada pela proposta irrevogável de assumir 100% da responsabilidade do acidente, que não deixou de ser aceite tacitamente pelo lesado, fica prejudicada a discussão do grau de responsabilidade do lesado no embate e, dessa forma, da responsabilidade da seguradora/ré.
Pelo exposto, improcede esta pretensão do recurso.

2.2. Sobre as indemnizações arbitradas:
Importa apreciar, quanto aos valores indemnizatórios arbitrados (conclusões 22º a 28º do recurso principal e conclusões 35 a 46 do recurso subordinado):
a) Se a indemnização por danos não patrimoniais, fixada pelo Tribunal a quo em € 30 000, 00: deve ser reduzida para o valor de € 15 000, 00, como pretende a recorrente do recurso principal; ou deve ser ampliada para o valor de € 60 000, 00, conforme defende o recorrido/recorrente do recurso subordinado.
b) Se a indemnização por danos patrimoniais futuros, fixada pelo Tribunal a quo em € 60 000, 00: deve ser reduzida para o valor de € 30 000, 00, como pretende a recorrente do recurso principal; ou deve ser ampliada para o valor de € 100 000, 00, conforme pretende o recorrido/recorrente no recurso subordinado.
Para este efeito, expor-se-ão os fundamentos da sentença, do recurso e da resposta (em III- 2.2.1. infra) e, após, apreciar-se-á as questões suscitadas mediante a aplicação do regime de direito aplicável (em III- 2.2.2. infra).

2.2.1. Fundamentos da sentença recorrida, do recurso e da resposta:
A sentença recorrida
a) Fixou a indemnização por danos não patrimoniais em € 30 000, 00, com fundamento: na aplicação do regime do art.496º/1 do C. Civil (que tutela danos graves, de acordo com padrões objetivos), quer do critério da equidade dos arts.494º e 496º/4 do C. Civil; na ponderação dos seguintes fatores concretos:
«Os danos não patrimoniais sofridos pelo A. reconduzem-se essencialmente aos sofrimentos físicos e psíquicos que teve aquando do sinistro, assim como os que teve posteriormente, bem como os que continuará a ter pelo resto da sua vida (importando, a este respeito, destacar que, aquando do sinistro, o A. era um jovem com apenas 19 anos de idade e que, atenta a sua esperança média de vida, o seu sofrimento se prolongará por muitos anos).
Destaca-se a cirurgia a que foi submetido; o material de imobilização de que foi portador, na perna, durante mais de um mês e respetivos constrangimentos; o défice funcional temporário parcial de 328 dias; a marcha claudicante que apresenta; assim como a dificuldade em permanecer de pé mais de 15/20 minutos; o quantum doloris de grau 5/7; o défice permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos; o dano estético de grau 3/7 e; a repercussão nas atividades desportivas e de lazer de grau 4/7.
A culpa da produção do acidente foi da condutora do automóvel, mas também foi do A., embora tenha sido assumida pela R. a responsabilidade total do sinistro.
Desconhece-se a situação económica do A. (parecendo ser modesta).
Para fixação do quantum indemnizatório, importa também ter em conta os valores que os tribunais superiores vêm fixando em casos semelhantes.».
b) Fixou a indemnização por danos patrimoniais futuros em € 60 000, 00, defendendo como fundamento, em síntese: que, conforme doutrina e jurisprudência que cita, tal como no preâmbulo e art.3º/b) da Portaria nº377/2008, de 26.05, atualizada pela Portaria nº679/2009, de 25.06, o dano patrimonial futuro deve ser indemnizado, mesmo quando o lesado não auferir rendimentos ou não se repercuta de forma imediata na perda de rendimentos mas agrave o desempenho de tarefas futuras; que a fixação concreta da indemnização pode socorrer-se de fórmulas matemáticas, usando a do Conselheiro Sousa Dinis (para a qual utilizou o salário médio de € 1100, 00 face à formação que o lesado estava a realizar durante 14 meses; 45 anos de vida ativa, contados entre a previsão de fim de curso aos 25 anos e os 70 anos; o défice de 10% e o desconto pelo adiantamento de 15%- € 1100, 00 * 14 meses* 45 anos*10%- 15%= € 58 905, 00) e ampliando o resultado da mesma, pela equidade, face aos seguintes fatores- «Obtido tal valor, importa agora ter em conta a equidade, dando relevância a um conjunto de fatores que, as referidas fórmulas não contemplam, alguns deles referidos no citado Ac. do STJ de 04-12-2007, e de que destacaremos, a esperança média de vida, que nos homens vai já para além dos 78 anos de idade; o aumento salarial que é previsível o A. poder vir a ter; a possibilidade, algo previsível, de o A. poder vir a auferir um vencimento superior ao de € 1.100,00; circunstâncias perante as quais, entendemos ser de arredondar o valor em causa para € 60.000,00.».
A recorrente, no recurso principal, pugnou pela redução das indemnizações por danos não patrimoniais e por danos patrimoniais futuros, nos termos pedidos, com base na defesa, nas suas conclusões: que a indemnização por danos não patrimoniais deve arbitrar-se de acordo com a equidade, que pondere a proporção à gravidade do dano, a certeza jurídica e a igualdade; que o défice de 10 pontos não é impeditivo do exercício de qualquer atividade e é compatível com o exercício da atividade habitual mas com esforços suplementares e que só existe dano patrimonial futuro se aquele que a sofre deixar de conseguir vantagens económicas que conseguiria com a sua plena atividade ou se só conseguir vantagens aplicando mais tempo (conclusões 22º a 28º do recurso principal).
O recorrido, no recurso subordinado, defendeu a referida ampliação das indemnizações fixadas, por entender: que a indemnização pela equidade por danos não patrimoniais, a fixar de forma objetiva, deve ponderar todos os fatores que elenca (idade; lesões e dores; internamento, operação cirúrgica e medicação; limitações e sequelas funcionais e estéticas); que, para a fixação de indemnização por danos patrimoniais futuros, o perito, apesar de ter concluído que os 10 pontos são compatíveis com o exercício da atividade de formação frequentada pelo examinando, deveria também ter considerado a repercussão como engenheiro mecânico, uma vez que não será sempre estudante, tal como o Tribunal deveria ter ponderado o salário médio em Portugal de € 1300, 00, que nos próximos anos será superior (conclusões 4 a 46).

2.2.2. Apreciação jurídica da situação em análise:
2.2.2.1. Quanto aos pedidos de redução e ampliação dos danos não patrimoniais:

A. Enquadramento jurídico:
A indemnização por responsabilidade civil extracontratual deve compensar os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (art.496º/1 do C. Civil, em referência aos arts.483º e 562º ss do C. Civil).
Esta cláusula indemnizatória geral, em consonância com a tutela geral da personalidade física e moral contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça (art.70º do C. Civil), protege «mais amplamente, a tutela da pessoa, na completa expressão do seu ser (Cfr. MENEZES CORDEIRO, 2010: 408-418 e BRANDÃO PROENÇA 217b: 313-388)»[iii], compensando o dano grave, aferido objetivamente,  gravidade essa que pode abranger “não apenas o «dano exorbitante ou excecional», mas também aquele que sai da mediania, ultrapassando as fronteiras da banalidade (cfr., v.g., o Ac. STJ 04.03.2008 08A164)»[iv]  
O dano não patrimonial pode integrar compreensivamente, de acordo com a jurisprudência, nomeadamente «o dano corporal ou à saúde traduzido na diminuição psicossomática da pessoa por lesão à integridade física e psíquica- actualmente designado também como dano biológico; o dano que consiste no sofrimento físico ou psíquico- quantum doloris; o prejuízo estético; o prejuízo sexual; o dano que se traduz no prejuízo da vida concreta e relacional da pessoa, designadamente familiar- que pode ser designado por dano existencial ou à vida de relação ou por prejuízo de afirmação pessoal, e que pode ainda ser particularizado no «prejuízo de distracção ou passatempo», no «pretium juventutis», no «prejuízo da auto-suficiência»»[v]
O valor desta indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção:
a) O grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso que se justifiquem (arts.496º/4 e 494º do C. Civil), como as «flutuações do valor da moeda, etc.» e «E deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras da boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida»[vi]
O valor a arbitrar não deve reconduzir-se apenas a um valor simbólico mas significativo, ainda que baseado em critérios objetivos e não arbitrários[vii].
Esta indemnização: reveste uma natureza compensatória («tem por fim facultar ao lesado meios económicos que, de alguma sorte, o compensem da lesão sofrida, por tal via reparando, indirectamente, os preditos danos, por serem hábeis a proporcionar-lhe alegrias e satisfações, porventura de ordem puramente espiritual, que consubstanciam um lenitivo com a virtualidade de o fazer esquecer ou, pelo menos, mitigar o havido sofrimento moral»[viii] ) e uma natureza também sancionatória, que pondera a culpa do agente[ix]; deve ser fixada num valor único, ainda que que pondere diversas categorias de danos - «não se justificando autonomizar as diversas categorias para o efeito de ser atribuída uma distinta parcela indemnizatória a cada uma- cfr. os Acs. STJ 07.07.2009, 25.11.2009, 25.11.2009, 07.5.2014.26.06.2014 e 02.06.2015- solução que se compreende pela necessidade de evitar a dupla reparação do mesmo dano, uma vez que as diversas subespécies podem não revestir autonomia dogmática e são identificadas, sobretudo, com um fim descritivo»[x].
b) A consideração de todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniforme do direito (art.8º/3 do C. Civil).
De qualquer forma, e de acordo com a jurisprudência do STJ, que se perfilha, o valor indemnizatório por danos não patrimoniais, fixado num juízo de equidade na 1ª instância, não deve ser alterado no Tribunal Superior, pois não se trata de uma aplicação de critérios estritos normativos, passíveis de reapreciar numa estrita questão de direito, salvo se violar razões de segurança jurídica e o princípio da igualdade.  Neste sentido, pronunciaram-se, nomeadamente:
a) O Supremo Tribunal de Justiça a 25.05.2017: «Ora – como temos entendido reiteradamente (cfr. por ex. o Ac. de 20/5/10, proferido no P. 103/2002.L1.S1) – não poderá deixar de ter-se em consideração que tal «juízo de equidade» das instâncias, alicerçado, não na aplicação de um estrito critério normativo, mas na ponderação das particularidades e especificidades do caso concreto, não integra, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», pelo que tal juízo prudencial e casuístico das instâncias deverá, em princípio, ser mantido, salvo se o julgador se não tiver contido dentro da margem de discricionariedade consentida pela norma que legitima o recurso à equidade – muito em particular, se o critério adoptado se afastar, de modo substancial e injustificado, dos critérios ou padrões que generalizadamente se entende deverem ser adoptados, numa jurisprudência evolutiva e actualística, abalando, em consequência, a segurança na aplicação do direito, decorrente da necessidade adopção de critérios jurisprudenciais minimamente uniformizados, e , em última análise, o princípio da igualdade.
Deste modo, mais do que discutir e reconstruir a substância do casuístico juízo de equidade que esteve na base da fixação pela Relação do valor indemnizatório arbitrado, em articulação incindível com a especificidade irrepetível do caso concreto, plasmada nas particularidades singulares da matéria de facto fixada, importa essencialmente verificar, num recurso de revista, se os critérios seguidos e que estão na base de tais valores indemnizatórios são passíveis de ser generalizados para todos os casos análogos – muito em particular, se os valores arbitrados se harmonizam com os critérios ou padrões que, numa jurisprudência actualista, devem sendo seguidos em situações análogas ou equiparáveis – em situação em que estamos confrontados com gravosas incapacidades que afectam, de forma sensível e irremediável, o padrão e a qualidade de vida de lesados.»[xi].
b) Este Tribunal da Relação de Guimarães a 15.02.2018, que conclui «Assim, fixada a indemnização por danos não patrimoniais com base na equidade, o Tribunal superior só deve intervir quando os montantes fixados se revelem, de modo patente, em colisão com os critérios jurisprudenciais que vêm a ser adotados, para assegurar a igualdade, o que manifestamente, não sucede no caso. Não ocorrendo oposição, a ponderação casuística das circunstâncias do caso deve ser mantida, já que o julgador se situou na margem de discricionariedade que lhe é consentida.»[xii]
B. Situação em análise:
Importa apreciar se a indemnização fixada pela 1ª instância deve ser reavaliada, face aos factos objetivos provados e aos princípios de proporção e igualdade defendidos.
Examinando os factos provados, com base nos quais a sentença fixou a indemnização em € 30 000, 00, a ré pretende a redução para € 15 000, 00 e o autor pretende a ampliação para € 60 000, 00, verifica-se que o autor, nascido em .../.../2002, em consequência do acidente que sofreu:
a) Sofreu, como lesões, a fratura da tíbia e do perónio da perna direita (facto 16).
b) Sofreu tratamentos: internamento durante 6 dias, altura em que foi sujeito a cirurgia (factos 17 e 18, em referência a factos 1 ss); foi sujeito à retirada do material de imobilização a 19.07.2021 (facto 19), altura em que se admite que precisou de apoio de terceiras pessoas; realizou 40 sessões de fisioterapia (facto 20), com alta definitiva em 27-10-2021 (facto 21).
c) Ficou temporariamente limitado nas suas atividades normais, nomeadamente no período de tratamentos: sofreu um défice funcional temporário total de 7 dias, com igual número de dias de repercussão temporária na atividade profissional (escolar); sofreu um período de défice funcional temporário parcial de 328 dias, com igual número de dias de repercussão temporária na atividade profissional (escolar) parcial (factos 28 e 29).
d) Ficou com sequelas, designadamente, ficou com cicatrizes, passou a ter dificuldade em permanecer em pé mais de 15/20 minutos e apresenta marcha claudicante (factos 24, 25 e 33), as quais lhe conferem: um dano estético permanente de grau 3/7; uma repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de grau 4/7 (factos 33 e 34).
e) Vai ter agravamento futuro, com a formação de artrose e necessitará de nova cirurgia (conclusões 26 e 27).
f) Sofreu um quantum doloris de grau 5/7 (facto 30).

Examinando jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, que arbitrou indemnizações por danos não patrimoniais em casos de défice de funcional da integridade físico- psíquica de 10% ou em caso de IPP de 10%, em favor de crianças, jovens e jovens adultos, encontraram-se:
a) Indemnizações na ordem dos € 10 000, 00- € 20 000, 00, fixadas a lesados com incapacidade permanente geral/atual défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 10% (com repercussão na vida diária independente do trabalho) ou com IPP de 10% (com repercussão no trabalho), fixadas há mais de 10 anos e menos de 20 anos:
_ Por acórdão de 24-11-2009, proferido na Revista n.º 455/06.0TCGMR.G1.S1, relatado por João Camilo, foi fixada a indemnização de € 10 000, 00 a criança de 12 anos (em caso com quantum doloris inferior ao deste processo e sem repercussão no desempenho de atividade desportiva), sumariando: «IV - Considerando que o autor tinha 12 anos à data do acidente; que o causador do acidente agiu com culpa exclusiva e acentuada, nada tendo contribuído o autor; que foi de 10 dias o período de internamento e de 1 ano a duração do tempo de doença; que, por causa do traumatismo sofrido, passou a padecer de cefaleias e de insónias, tornando-se uma pessoa mais irritável e ansiosa; que mantém amnésia para o acidente e passou a sentir mais dificuldade em concentrar-se e em memorizar; que as sequelas determinaram uma incapacidade permanente geral de 10% e as lesões causaram ao autor um quantum doloris de grau 4 na escala de 1 a 7, no momento do acidente e no decurso do tratamento; que estas sequelas continuam a provocar-lhe dores físicas, incómodo e mau estar e que, à data do acidente, o autor era uma pessoa saudável e de constituição física normal, mostra-se adequado o valor de € 10 000, a título de compensação pelos danos não patrimoniais.».
- Por acórdão de 15-03-2007, proferido na Revista n.º 4770/06 - 7.ª Secção, relatado por Mota Miranda, foi fixada a indemnização de € 15 000, 00 a criança de 14 anos (em caso em que não está avaliada e graduada a repercussão estética e de atividade desportiva futura, como nos presentes autos), sumariando: «I - O autor, com 14 anos de idade, sofreu ferimentos que lhe afectaram a parte esquerda do corpo, designadamente a perna esquerda, o que obrigou a que fosse sujeito a uma operação cirúrgica para colocação de uma prótese (para auxiliar à recuperação óssea da mesma), podendo ainda ter de ser sujeito, no futuro, a nova operação. II - Resultaram ainda para o autor sequelas que o têm tornado cada vez mais introvertido e que lhe determinam uma incapacidade permanente de 10%. III - Considerando a gravidade destas lesões - que lhe atingiram o membro inferior esquerdo e que lhe acarretam uma limitação e privação que se prolongarão para toda a vida, afectando-lhe a sua qualidade de vida - e as dores sofridas e considerando ainda que se trata de um jovem que viu limitadas as suas actividades lúdicas, para o compensar de todo este sofrimento entende-se adequado, ajustado e equitativo, traduzindo essa gravidade do dano, o montante de 15.000,00 €».
- Por acórdão de 28-05-2009, proferido na Revista n.º 411/09 - 2.ª Secção, relatado por Oliveira Rocha, foi fixada também a indemnização de € 15 000, 00 a jovem de 25 anos (em caso com repercussão estética inferior à destes autos e sem identificação de repercussão desportiva mas com repercussão para o trabalho), sumariando-se: «VI - Demonstrando ainda os mesmos factos que o autor sofreu em consequência do acidente várias intervenções cirúrgicas, internamentos e tratamentos e ficou a padecer de várias sequelas definitivas - cicatriz de cerca de 15 cm num dos antebraços, com um dano estético associado de grau 3, e limitação da mobilidade do ombro e do indicador, a qual lhe provoca um quantum doloris de grau 4 - e que o mesmo era um jovem saudável, bem constituído, dinâmico, alegre e jovial, reputa-se de equitativo o montante de 15.000,00 € destinado ao ressarcimento dos danos não patrimoniais.»
- Por acórdão de 15-01-2004, proferido na Revista n.º 3926/03 - 2.ª Secção, relatado por Ferreira de Almeida, foi fixada a indemnização em € 19,951,92, a lesada de 24 anos (em caso com repercussão para o trabalho mas sem repercussão no exercício de atividade desportiva), sumariando-se «V - Se do acidente resultaram para a lesada cicatrizes várias, no sobrolho esquerdo, no rosto, na zona ilíaca, na coxa e no joelho direitos, tendo ainda a mesma sofrido enormes dores, quer físicas, quer morais, emergentes quer do acidente em si, quer das três intervenções cirúrgicas a que foi submetida e dos internamentos e tratamentos médicos a que teve de sujeitar-se, tendo ainda ficado com uma cicatriz com a extensão de cerca de 22 cm de comprimento, na coxa direita, que a marca do ponto de vista psicológico e estético, para além de ter vivido, durante um ano, atormentada com as possibilidades de cura e com as possíveis sequelas, e se vê agora confrontada no dia a dia com as suas cicatrizes que lhe desfeiam o corpo e lhe trazem amargura, tem-se como justo e adequado atribuir-lhe, a título de danos não patrimoniais, a indemnização de € 19,951,92 (4.000.000$00 aprox.).».
b) Indemnizações na ordem dos € 30 000, 00- € 40 000, 00, fixadas também a lesados com IPP de 10%, há mais de 10 anos:
__ Por acórdão de 29-11-2005, proferido na Revista n.º 3533/05 - 6.ª Secção, relatado por Sousa Leite, foi fixada a indemnização na ordem aproximada dos € 30 000, 00 a jovem adulto de 32 anos (em caso em que o lesado tinha mais 13 anos do que o lesado destes autos e foi submetido a mais duas operações), sumariando: «II - Considerando que foi submetido a 3 operações ao membro inferior direito, uma das quais deficientemente realizada, todas com anestesia geral, as dores intensas sofridas no pós-operatório, as dores e incómodos decorrentes dos tratamentos diários de fisioterapia para recuperação, as dores na perna e no joelho que sofreu após a alta clínica e de que continua a padecer, a deformação na perna, por encurtamento dos ossos, bem como a angústia e ansiedade pelo desconhecimento sobre as condições físicas em que iria ficar, julga-se que a indemnização destinada a compensar estes danos não patrimoniais deve ser fixada no quantitativo peticionado de 29.927, 87 Euros.».
__Por acórdão de 16-10-2008, proferido na Revista n.º 2920/08 - 2.ª Secção, relatado por Oliveira Vasconcelos, foi fixada a indemnização de € 35 000, 00 a lesado de 23 anos, sumariando «I - À data do acidente a autora tinha 23 anos e auferia mensalmente 293,79 €; sofreu várias lesões corporais, nomeadamente, traumatismo craniano, fractura de cinco arcos costais à esquerda, hemotorax, com derrame pleural, escoriações e hematomas múltiplos pelo corpo; esteve 12 dias internada num hospital e acamada cerca de seis semanas em casa; sofreu dores muito intensas. II - A autora ficou com dificuldades respiratórias, cicatriz no tórax, dispneia no esforço, mobilidade diafragmática diminuída à esquerda, tosse seca, sensação de cansaço, na marcha e durante o esforço, sequelas do foro psiquiátrico, tonturas, alterações e perturbações do sono e alterações do apetite; as consequências das lesões sofridas causaram-lhe um grande desgosto; ficou com uma IPP de 10%. III - Assim, a título de danos não patrimoniais, fixa-se o montante de 35.000,00 €, considerando-se adequada a quantia de 15.000,00 € fixada pela Relação e relativa aos danos patrimoniais futuros.».
- Por acórdão de 24-04-2009, proferido na Revista n.º 649/09 - 6.ª Secção, relatado por Salreta Pereira, foi fixada uma indemnização de € 40 000, 00 a lesado de 22 anos, sumariando-se: «III - Atendendo ao período prolongado de doença e de reabilitação funcional do Autor, as intervenções cirúrgicas a que já se submeteu e uma outra que se mostra necessária, as sequelas físicas que permanecem a nível estético e funcional, a juventude do Autor à data do acidente e o ter deixado de poder praticar desporto sem limitações justifica-se atribuir-lhe a indemnização de 40.000€ a título de danos não patrimoniais.».
c) Indemnizações superiores, mesmo em caso de défice de integridade físico- psíquica inferior a 10%, em casos com maior densidade de tratamentos e sofrimentos, v.g.:
_ Por acórdão do STJ de 25.05.2017, relatado por Lopes do Rego[xiii], foi mantida a indemnização de € 50 000, 00 a jovem sinistrado de 19 anos à data do acidente que, apesar de ter ficado com um défice permanente de integridade físico-psíquica de 7%, um quantum doloris de 4/7, um dano estético de grau 4/7 e repercussão nas atividades desportivas e de lazer de grau 3/7, teve outros impactos e sofrimentos não patrimoniais muito superiores aos sofridos pelo lesado destes autos: teve um traumatismo crânio-encefálico com perda de conhecimento e amnésia e fraturas múltiplas do membro inferior esquerdo, incluindo fratura do colo do fémur; foi sujeito a 4 cirurgias e a 125 sessões de fisioterapia; teve 627 dias de défice temporário absoluto; o seu défice permanente de integridade físico-psíquica de 7% implicaram a perda do seu posto de trabalho e a incapacidade permanente para a sua profissão habitual; ficou com repercussão da sequela na sua atividade sexual num grau 2/7 da escala.

Ora, apreciando os danos não patrimoniais destes autos, em comparação com o regime legal e com a jurisprudência citada, verifica-se que estes danos, com gravidade suficiente para serem tutelados pelo direito, foram indemnizados pela equidade em termos que não colidem manifestamente com os critérios jurisprudenciais citados, não havendo razões objetivas para reduzir ou ampliar a indemnização fixada, uma vez: que a indemnização fixada encontra no quadro médio comparativo das indemnizações fixadas pelo Supremo Tribunal de Justiça, a atualizar face aos anos decorridos e a proporcionar face às diferenças identificadas dos casos analisados face ao presente; que não há razões para reduzir a indemnização para um limite inferior ao quadro médio, atendendo a que, para além dos sofrimentos gerais de lesões, tratamentos, as sequelas e as lesões estéticas e funcionais provadas (sobretudo com o claudicar da marcha) virão a acompanhar o lesado, de apenas 19 anos, durante toda a sua vida, limitando a sua auto- estima e o desempenho relevante de atividade desportiva; que não há razões para ampliar a indemnização para limites superiores ao quadro médio citado, atendendo a que o grau de culpabilidade da condutora do veículo segurado da ré, apenas negligente e concorrente, permitiria fixar a indemnização por danos não patrimoniais num limite inferior aos danos reais causados, nos termos do art.494º/3 do C. Civil.
Pelo exposto, improcedem os pedidos de redução da indemnização e da ampliação da indemnização fixada.

2.2.2.2. Quanto aos pedidos de redução e de ampliação dos danos patrimoniais futuros:

A. Enquadramento jurídico:
A1. Da obrigação de indemnizar em geral:

No regime da obrigação de indemnizar previsto nos arts.562º ss do C. Civil, o lesante deve reconstituir a situação que existiria se não tivesse ocorrido o evento lesivo relativamente aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão (arts.562º e 563º do C. Civil).
Estes danos compreendem não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter, em consequência da lesão (art.564º/1 do C. Civil), danos estes que, todavia, podem ser ainda, qualquer um, um dano presente ou um dano futuro, por referência ao momento de apreciação da fixação da indemnização[xiv] (art.564º/2 do C. Civil).
Neste campo de diferenciação, se não existe grande controvérsia em relação aos danos presentes indemnizáveis que forem causais do evento lesivo, a previsão legal sobre o atendimento dos danos futuros no cômputo da indemnização define como condição que estes sejam previsíveis (art.564º/2 do C. Civil).
Ora, sobre esta exigência da previsibilidade, a doutrina e a jurisprudência têm distinguido subcategorias (danos certos e eventuais) e critérios quanto à indemnização (elevada probabilidade dos danos, de acordo com as regras da experiência).
De facto, nomeadamente: Almeida Costa refere que estes danos futuros podem ser «certos ou eventuais, conforme a respectiva produção se apresente infalível ou apenas possível»[xv]. Henrique Sousa Antunes, remetendo para doutrina de Vaz Serra e Antunes Varela, associa a previsibilidade do dano futuro a uma elevada probabilidade e a um grau elevado de segurança: «A previsibilidade sugere um grau elevado de probabilidade, considerando os efeitos comuns associados à lesão causada e as especificidades das circunstâncias particulares do lesado e do evento. Refere-se ANTUNES VARELA a «suficiente segurança» (…). Retomando uma fórmula dos trabalhos preparatórios, VAZ SERRA apresenta o critério seguinte (…): «é necessário que os danos futuros sejam previsíveis com segurança bastante, porque, se não o forem, não pode o tribunal condenar o responsável a indemnizar danos que não se sabe se virão a produzir-se; se não for seguro o dano futuro, a sua reparação só pode ser exigida quando ele surgir. A segurança do dano pode resultar de probabilidades. (…) Entre a certeza e a elevada probabilidade resta, ainda, uma margem significativa de apreciação para os tribunais, de acordo com as regras da experiência comum. Lê-se, em AC. RC 13.07.2016: «O dano futuro é previsível quando se prognosticar, conjeturar com antecipação ao tempo em que acontecerá, a sua ocorrência. No caso contrário, isto é, quando o homem medianamente prudente não o prognostica, o dano é imprevisível»[xvi].
A indemnização de danos (emergentes ou de lucros cessantes, de danos presentes ou futuros) é fixada em dinheiro sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor (art.566º/1 do C. Civil), devendo ter como medida, salvo disposição em contrário, a situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que teria nessa data se não existissem danos (art.566º/2 do C. Civil).
Os mesmos danos, nomeadamente os futuros, podem ser determinados ou indeterminados, caso este em que: a liquidação pode ser feita em decisão ulterior (art.609º/2 do C. P. Civil); se não puder ser averiguado o valor exato dos danos, por estar esgotada a possibilidade de determinação exata ou esta não ser possível, a indemnização reparatória dos mesmos pode ser definida pela equidade (art.566º/3 e 564º/2 do C. Civil).
Sobre a compatibilização entre os arts.564º/2 e 566º/3 do C. Civil, no caso de danos com valor indeterminado, o Ac. STJ de 22.01.1980, publicado na RLJ, a no 113, pág.325, citado por Henrique Sousa Antunes, clarifica: «A contradição aparente dessas duas disposições resolve-se no sentido de que a fixação da indemnização segundo regras da equidade só se impõe quando esgotada a possibilidade de apuramento dos elementos com base nos quais o seu montante haja de ser determinado. E no caso vertente, falta, pelo menos, um dado essencial para o cálculo dos danos futuros, que é o da idade do lesado, pois conforme a probabilidade da maior ou menor duração da sua vida ativa assim aumentará ou diminuirá o prejuízo futuro, resultante da redução da sua capacidade laboral.»
Em particular, sobre a operância da equidade nos danos futuros: Henrique Sousa Antunes, refere sobre a conveniência do uso desta via quando os dados existentes são incompatíveis com a avaliação dos danos de uma forma certa «Observa-se, no entanto, a necessidade de distinguir entre a determinação dos danos e a identificação do valor exato desses prejuízos. Aquela refere-se apenas quanto ao enquadramento factual necessário à aplicação dos critérios de indemnização previstos na lei. Deste modo, a indemnização dos danos futuros é fixada pela equidade quando os dados, suficientes, se revelem incompatíveis com a quantificação certa dos prejuízos»[xvii]; Antunes Varela sublinha a possibilidade de reparação de danos futuros a partir de um capital antecipado que compense o dano e se extinga ao final da vida, com referência à jurisprudência que enunciou este critério «Um dos casos mais frequentes em que o tribunal tem que atender a danos futuros é aquele em que o lesado perde ou vê diminuída, em consequência de facto lesivo, a sua capacidade laboral. Segundo a formulação do acórdão do S.T.J. de 9 de Janeiro de 1979 (B. M. J., nº283, págs.260 e segs.), a indemnização a pagar ao lesado deve, neste caso, representar um capital que se extinga ao fim da sua vida activa e seja susceptível de garantir, durante esta, as prestações periódicas correspondentes à sua perda de ganho» (jurisprudência inicial esta que sofreu atualizações, nomeadamente quanto aos pressupostos de idade atendíveis, como se referirá infra).
No caso da reparação dos danos duradouros e continuados ser pedida como antecipação de capital e não em forma de renda vitalícia (danos duradouros em relação aos quais a quantificação monetária antecipada da reparação também é prevista no art.567º do C. Civil para a fixação de rendas temporárias ou vitalícias a pedido do lesado[xviii], definição que tem sido entendida dever realizar-se atendendo ao «poder de compra do dinheiro na data da sentença»[xix]), a jurisprudência tem defendido ao longo do tempo a possibilidade de realização de um desconto pelo benefício de antecipação do capital (que chegou a oscilar no tempo entre 33% e 1,5%, consoante os dados da sociedade ao tempo da prolação da decisão e a situação do caso concreto), havendo jurisprudência recente a defender a possibilidade de eliminação da redução por esse benefício, considerando o quadro económico atual e as circunstâncias do caso concreto. De facto, para ilustrar este quadro jurisprudencial, podemos encontrar, nomeadamente: o acórdão do STJ de 12.11.2019, proferido no processo nº468/15.0T8PDL.L1.S1, relatado por Acácio das Neves[xx] que enunciou as molduras de taxas que já foram aplicadas e aplicou a redução de 10% na contabilização da indemnização por danos futuros de auxílio de uma terceira pessoa; o acórdão do STJ de 25.05.2017, proferido no processo nº868/10.2TBALR.E1.S1, relatado por Lopes do Rego, que considerou que o benefício de antecipação, consoante cada caso, pode ser eliminado ou reduzido, consoante as circunstâncias de cada caso, vindo a aplicar uma taxa de redução de 1,5%, com o seguinte sumário: «I. A regra ou princípio geral segundo a qual o benefício da antecipação deve descontar-se na indemnização arbitrada pelo dano patrimonial futuro deve ser adequada às circunstâncias do caso concreto, podendo nomeadamente tal benefício ser eliminado ou apagado perante a existência provável de um particular agravamento ou especial onerosidade dos danos patrimoniais futuros expectáveis que importa compensar com recurso a critérios de equidade. II. O dito benefício nunca poderia actualmente corresponder – perante o quadro económico actual e face às perspectivas razoáveis de rentabilização do montante indemnizatório recebido – aos pretendidos 20% - sendo, quando muito, equitativa e ajustada a redução ao montante do capital a atribuir à autora a título de indemnização pela perda de rendimentos do correspondente a uma taxa na ordem de 1,5%.»[xxi].
Em qualquer caso, nestes casos de operância da equidade, deve atender-se que «Nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito» (art.8º/3 do C. Civil).
A2. Da obrigação de indemnizar por danos patrimoniais futuros em caso de dano biológico:
A tendência global e atual da jurisprudência que se adota, no âmbito do referido quadro legal geral referido em III-2.2.1.1.-A supra, tem entendido, em particular, que o dano biológico causador de défice funcional é indemnizável como um dano patrimonial futuro[xxii], cause ou não cause diretamente perda de rendimentos profissionais.
De facto, como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19.09.2019, proferido no processo nº2706/17.6T8BRG.G1.S1, relatado por Maria do Rosário Morgado, este dano biológico abrange «um espectro alargado de prejuízos incidentes na esfera patrimonial do lesado, desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da sua atividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico, passando ainda pelos custos de maior onerosidade no exercício ou no incremento de quaisquer dessas atividades ou tarefas, com a consequente repercussão de maiores despesas daí advenientes ou o malogro do nível de rendimentos expectáveis»[xxiii], destinando-se a compensar «não só a perda de rendimentos pela incapacidade laboral, mas também as consequências dessa afetação, no período de vida expetável, seja no plano da perda ou diminuição de outras oportunidades profissionais e/ou de índole pessoal ou dos custos de maior onerosidade com o desempenho dessas atividades.[xxiv]»
A2.1. A fixação da indemnização do dano biológico com repercussão patrimonial futura, sobretudo em caso de perda ou redução da capacidade de ganho, tem assentado em três critérios principais, de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, que vem sendo aceite e aplicada nas instâncias, conforme sintetiza o acórdão do STJ de 28.03.2019, proferido no processo nº1120/12.4TBPTL.G1.S1, relatado por Tomé Gomes:
«1 – Determinação dum capital produtor dum rendimento que se venha a extinguir no final do período provável de vida ativa do lesado, suscetível de lhe garantir, durante esta, as prestações periódicas correspondentes à sua perda de ganho.
2 – Utilização de fórmulas abstratas ou critérios, como elemento auxiliar, com o objetivo de tornar o mais possível justas, atuais e minimamente discrepantes, as indemnizações.
3 – Uso de juízos de equidade como complemento para ajustar o montante encontrado à solução do caso concreto, uma vez que não é possível determinar um valor exato dos danos sofridos pelo lesado.
Estes três pontos são indissociáveis, necessários para se encontrar, em cada caso, o montante indemnizatório mais adequado.»[xxv]
As fórmulas e as operações matemáticas abstratas que têm sido ponderadas jurisprudencialmente no juízo de equidade do art.566º/3 do C. Civil, como um critério auxiliar de referência objetivo e aproximado, a ajustar mediante todos os outros fatores atendíveis no referido juízo, têm sido variadas, nomeadamente:
a) A propugnada no acórdão da Relação de Coimbra de 04/04/1995, publicado na CJ - Ano XX - Tomo II (e bem explicada no acórdão da mesma Relação de Coimbra de 12/02/2011, proferido no processo nº291/07.6TBLRA.C1[xxvi]):
Nesta fórmula: “P” é a prestação a pagar no 1º ano, achada pela multiplicação do rendimento mensal líquido por 14 meses no caso do trabalho dependente (por 12 meses no caso de prestação de serviços), valor anual que após se multiplica pela percentagem de incapacidade; “M” é esperança média de vida do autor na data do sinistro; “r” é a taxa de juro nominal líquida e “k” é taxa anual de crescimento de P (achada pela inflação e pelas taxas de promoção e produtividade), que permitem definir em “i” uma taxa de juros real líquida.
b) As defendidas pelo Juiz Conselheiro Sousa Dinis, na Coletânea de Jurisprudência, ano IX, Tomo I, 2001, do S.T.J., a fls. 6 a 12, citado no referido acórdão de STJ de 28.03.2019 nos seguintes termos, como dois critérios com resultados equivalentes:
«Um dos critérios assenta numa regra de três simples, tendo em conta uma determinada taxa de juro, adequada à realidade económica e financeira do país, ao aumento pecuniário que o lesado ou seus dependentes economicamente, deixaram de auferir, durante 14 meses, num ano, a idade ativa provável do mesmo, fazendo um primeiro ajustamento com um desconto que variará com o nível de vida do país, do custo de vida, em que predominará o prudente arbítrio do juiz, tendo em conta estes dados ou outros relevantes.
E, encontrado um determinado valor, este poderá sofrer alterações para mais ou para menos, de acordo com juízos de equidade, tendo em conta a idade do lesado, a progressão na carreira e outros fatores influentes, que possam existir.
O outro critério traduz-se na determinação do montante que o património do lesado deixou de auferir durante 14 meses, num ano, multiplicando-o pelo período de tempo provável de vida ativa, reduzindo o montante encontrado de acordo com regras de equidade já apontadas, e finalmente, ajustando o respetivo valor ao caso concreto, recorrendo a juízos de equidade, de acordo com a progressão na carreira, ganhos de produtividade e outros elementos influentes existentes em cada caso.»[xxvii]
As operações da Portaria n.º 377/2008, de 26-05, com ou sem as alterações introduzidas pela Portaria n.º 679/2009, de 25-06, destinadas às seguradoras com vista à elaboração de propostas de indemnização, apesar de poderem também ser ponderadas em juízo, não vinculam os tribunais[xxviii].
Nas operações financeiras de referência, que não façam já a ponderação da taxa de juro real líquida referidos em a), tem sido defendido pela jurisprudência, também, quer a dedução de um benefício de antecipação variável (que tem oscilado entre 33% e 1,5%) quer, em jurisprudência recente, a possibilidade de eliminação da redução desse benefício, considerando as circunstâncias do caso concreto, como se referiu também já no enquadramento geral supra referido. [xxix].
De acordo com a Jurisprudência maioritária atual, tem sido integrado no elenco de critérios objetivos a utilizar para a aferição dos danos futuros por perda de capacidade de ganho ou especial onerosidade da mesma, face a défice permanente na integridade física, nomeadamente:
a) O rendimento líquido do lesado (deduzido de impostos e de contribuições obrigatórias à Segurança Social), em detrimento do rendimento ilíquido, por ser aquele, aferido de forma global, esteja ou não fiscalmente comprovado, que o lesado deixará efetivamente de receber por força da lesão[xxx].
b) A esperança média de vida e não a vida ativa, tendo em conta que o maior esforço para o desempenho de tarefas mantem-se até ao termo da vida e não apenas na vida profissional ativa, esforço que pode gerar despesas e deve ter uma avaliação patrimonial[xxxi]. A esperança média de vida em 2020 foi fixada na média de 80, 7, correspondente a 77, 7 anos para os homens e 83, 4 anos para as mulheres[xxxii].
A2.2. A indemnização do dano biológico com repercussão patrimonial futura, quando o défice funcional genérico não corresponda a perda permanente de capacidade para o exercício da atividade laboral do lesado mas apenas a um desempenho com maior esforço das atividades, nomeadamente profissionais, não está vinculada de forma determinante ao rendimento anual, de acordo com jurisprudência atual e deve ser fixada pela equidade, nos termos do art.566º/3 do C. P. Civil.
Neste sentido, o acórdão do STJ de 07.03.2019, proferido no processo nº203/14.0T2AVR.P1.S1, relatado por Tomé Gomes conclui, de acordo com posição que se defende: «I. Num caso, como o presente, em que foi fixado à lesada em acidente de viação um défice funcional da integridade físico-psíquica de 19 pontos percentuais com repercussão permanente na sua atividade profissional, mas compatível com o respetivo exercício, implicando, no entanto, esforços suplementares, a indemnização patrimonial não deve ser calculada com base no rendimento anual do A. auferido no âmbito da sua atividade profissional habitual, já que o sobredito défice funcional genérico não implica incapacidade parcial permanente para o exercício dessa atividade, envolvendo apenas os referidos esforços suplementares. II. Neste tipo de situações, a solução seguida pela jurisprudência deste Supremo Tribunal é a de fixar um montante indemnizatório por via da equidade, ao abrigo do disposto no artigo 566.º, n.º 3, do CC, em função das circunstâncias concretas de cada caso, segundo os padrões que têm vindo a ser delineados, atentos os graus de gravidade das lesões sofridas e o seu impacto presumível na capacidade económica do lesado, considerando a expetativa da sua vida ativa, não confinada à idade-limite para a reforma.» [xxxiii].
B. Dados notórios ponderáveis nos termos art.412º do C. P. Civil:
B1. A decisão sobre a fixação de uma indemnização por danos futuros, a pagar como capital antecipado, deve atender, às possibilidades de rentabilização de capital, de acordo com juízos de prognose e de maior segurança possível.
Assim, atendendo-se a que um particular pode investir sem risco em depósitos a prazo ou em dívida do Estado, ponderar-se-ão os seguintes dados de conhecimento comum relevantes para o juízo de prognose sobre a rentabilidade de capital investido.
Ora, numa análise da evolução das taxas de juros de depósitos a prazo e das taxas de juro da dívida pública nos últimos 20 anos, antes da crise decorrente da guerra na Ucrânia de 2022/2023, verifica-se: 
a) As taxas de juros dos depósitos a prazo desceram, entre 2003 e 2020, de 2, 1% em 2003 para 0, 11% em 2020 (com um pico de subida em 2008 de 3, 83 e com tendência permanente de descida desde 2016- 0, 60%; em 2017- 0,47%; em 2018- 0,27%; em 2019- 0, 16%; em 2020-0, 11%)[xxxiv]
b) A taxa de rentabilidade das obrigações de tesouro a 10 anos desceu de 4, 8% em 1999 para 0,4% em 2020 (com um pico de subida de 10, 5% em 2012 e com descida consistente desde 2016- 3,2% em 2016, 3, 1% em 2017, 1,8% em 2018, 0,8% em 2019, 0,4% em 2020)[xxxv].
Numa análise de expectativas recentes de taxa de dívida pública portuguesa, antes da crise decorrente da guerra na Ucrânia de 2022/2023, poderíamos encontrar em 2021 uma taxa negativa a 5 anos, uma taxa de 0, 25% a 10 anos e de cerca de 0,5% em 20 anos[xxxvi]. Se atendêssemos nessa altura de 2021 às taxas de juro da dívida alemã (sempre mais baixas que as portuguesas, em face da redução de risco), estas estavam projetadas como negativas até 10 anos inclusive e sensivelmente nos 0,2% a 30 anos[xxxvii]
B2. Esta decisão sobre o ajustamento de uma indemnização por danos futuros, a pagar como capital antecipado, deve atender, ainda, a outros fatores, consoante a natureza do dano futuro a indemnizar.
Se a indemnização se referir a dano de perda previsível de rendimento futuro de trabalho ou de prestação de serviços, deve-se atender, nomeadamente, à evolução previsível do rendimento do lesado, a ponderar consoante a formação profissional e o trabalho do lesado, as taxas de tendência de aumento de remuneração e o grau previsível do aumento ou redução do seu rendimento.
Neste campo, destaca-se, em relação ao salário mínimo nacional, a tendência de subida entre 2016 e 2021, acima das taxas de juro e da inflação, de acordo com os regime publicados: de € 530, 00 em 2016, de acordo com o definido no Decreto-Lei n.º 254-A/2015, de 31 de dezembro; de € de 557, 00 em 2017, de acordo como definido no Decreto-Lei n.º 86-B/2016, de 29 de dezembro; de € 580, 00 em 2018, de acordo com o definido no Decreto-Lei nº 156/2017, de 28 dezembro; de € 600, 00 em 2019, de acordo com o definido no Decreto-Lei nº 117/2018, de 27 dezembro; de € 635, 00 em 2020, de acordo com o definido no Decreto-Lei nº 167/2019, de 21 de novembro; de € 665, 00 em 2021, de acordo com o definido no Decreto-Lei 109-A/2020, de 31 de dezembro. Estes valores expressaram subidas entre 2016 e 2021 numa média de 4% (nas taxas anuais 5% em 2016, de 5, 1% em 2017, de 4,1% em 2018, de 3,4% em 2019, de 5,8% em 2020 e de 4,7% em 2021).
Se a indemnização se referir a custo do bem ou do serviço futuro, deve avaliar-se ainda, nomeadamente, as previsões de evolução do custo do bem ou serviço face: às taxas de inflação previsíveis; à natureza do bem (sujeito ou não sujeito a um processo de inovação, que pode levar à descontinuação de produtos por produtos melhores mas com preços equivalentes ou superiores); ao mercado concorrencial.
Neste caso, e relativamente à evolução da taxa de inflação, verifica-se que esta sofreu, em Portugal: uma descida em 40 anos de 20,09% em 1978 a 0, 0% em 2020 (com descidas abaixo de 3,6% desde 2002, com taxas negativas em 2009 e 2014, com descidas sucessivas abaixo de 1, 4% desde 2017)[xxxviii]; uma subida em 2022, como efeitos do quadro de guerra enunciado, para 7, 8%.

C. Apreciação da situação em análise:
Por um lado, examinando os factos provados e os factos previsíveis, com relevância para apreciar a indemnização do dano biológico sofrido pelo autor, verifica-se: que o autor nasceu em .../.../2002, tendo em 2021 uma perspetiva de 51 anos de vida ativa e de 58 anos de esperança média de vida e tendo desde 2027 (desde o termo previsível da formação profissional e início de atividade laboral aos 25 anos, contam-se nos termos aproximados atendidos pelo Tribunal a quo) 45 anos de vida ativa e 52 anos de esperança média de vida; que em 2021, à data do embate, o autor era estudante do 1º ano de engenharia mecânica, vindo a ser previsível que venha a desempenhar atividade profissional de engenharia mecânica ou das competências transversais nas engenharias para as quais aquela o habilitar, atividade profissional que pode vir a integrar uma dimensão intelectual exclusiva ou dominante mas pode vir a integrar também com normalidade uma dimensão de atividade com esforço físico (sobretudo em meio industrial e fabril); que o autor, na sequência das sequelas sofridas com o acidente, tem dificuldade em permanecer em pé mais de 15/20 minutos e apresenta marcha claudicante, o que corresponde a um défice permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos, sendo de admitir a existência de dano futuro, com a formação de artrose, tendo em conta o atingimento articular das lesões do tornozelo direito; que esta situação, apesar de ser compatível com o exercício da atividade de formação do autor como estudante de engenharia, não pode deixar de lhe vir a causar, pelo menos, maior esforço no desempenho de uma atividade profissional na área de engenharia mecânica e conexa, que lhe exija esforço físico (no estar de pé em exames de máquinas ou em situação de esforço), facto que se pode presumir, nos termos dos arts.349º e 351º do C. Civil, situação que pode comprometer a ampliação de progressões profissionais ou de cumulação fontes de rendimento.
Por outro lado, nos valores alcançados com as tabelas financeiras enunciadas supra, especialmente relevantes para auxiliar a fixação de indemnizações de lesado que tenha sofrido défice funcional com perda de capacidade ganho (situação não provada nestes autos com este alcance exato e definido), verifica-se:
a) Que o Tribunal a quo na sentença contabilizou o valor de € 58 905, 00, de acordo com cálculo realizado com a fórmula simples do Conselheiro Sousa Dinis, atendendo a uma vida ativa de 45 anos, a um salário médio de € 1 100, 00 em 14 meses, a 10% de perda funcional.
b) Que, utilizando a fórmula mais completa e rigorosa da Relação de Coimbra, enunciada no enquadramento jurídico supra: atinge-se um valor de € 63 737,10, superior ao da sentença recorrida, ainda que utilizando um salário menor que aquela (de € 800, 00 referido pelo autor na sua petição inicial, apesar de no recurso pretender que se utilize o valor de € 1300, 00), em que a prestação “P” é de € 1 120, 00 (€ 800, 00 * 14 meses= € 11 200, 00; € 11 200, 00 * 10% = € 1 120, 00), acrescido de 45 anos de vida ativa em “M”, de uma taxa de juro nominal líquida de 1% em “r” e de uma percentagem de 2% em “k” (correspondente a 1% de média de promoções e 1% média de inflação);  atingir-se-ia um valor substancialmente superior a este, com a utilização desde 2027 de um salário médio previsível de € 1100, 00 (utilizado na sentença) ou € 1300, 00 (pretendido pelo recorrente no recurso).
Estes valores, apesar de não serem diretamente aplicáveis numa situação em que o défice funcional não causa diretamente perda de capacidade de ganho exata, podem funcionar como uma das referências limite de ponderação da indemnização a fixar pela equidade, nos termos do art.566º/3 do C. Civil, que deverá ponderar a globalidade dos fatores enunciados no primeiro parágrafo deste ponto C.
Por outro lado, ainda, examinando indemnizações fixadas pelo Supremo Tribunal de Justiça por danos patrimoniais futuros, verifica-se que em jurisprudência entre 2016-2021:
a) Que, em casos de défice funcional geral 4 a 6 dos pontos (cerca de metade do destes autos, com 10 pontos), e a lesados entre os 32 e 40 anos (mais velhos que o lesado destes autos com 19 anos) foram fixadas pela equidade indemnizações pela equidade na ordem dos € 20 000, 00 e € 25 000, 00:
_ O Ac. STJ de 14.01.2021, proferido no processo nº 2545/18.7T8VNG.P1.S1, relatado por Rosa Tching, fixou em € 20 000, 00 a indemnização por danos patrimoniais futuros, a lesado de 32 anos (mais velho que o lesado destes autos) com 4 pontos de défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, sem perda de capacidade de ganho, sumariando:
«I. A compensação do dano biológico tem como base e fundamento a perda ou diminuição de capacidades funcionais que, mesmo não importando perda ou redução da capacidade para o exercício profissional da atividade habitual do lesado, impliquem ainda assim um maior esforço no exercício dessa atividade e/ou a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, no decurso do tempo de vida expectável, mesmo fora do quadro da sua profissão habitual. (…)
V. Neste tipo de situações, a solução seguida pela jurisprudência deste Supremo Tribunal é a de fixar um montante indemnizatório por via da equidade, ao abrigo do disposto no artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil, em função das circunstâncias concretas de cada caso, segundo os padrões que têm vindo a ser delineados, atentos os graus de gravidade das lesões sofridas e do seu impacto na capacidade económica do lesado, considerando quer as suas potencialidades de aumento de ganho quer uma expetativa de vida ativa não confinada à idade-limite para a reforma.
VI. Tendo o lesado, à data do acidente com 32 anos de idade, ficado a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 4 pontos, sendo as sequelas em termos de repercussão permanente na atividade profissional compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicando ligeiros esforços suplementares nomeadamente nas tarefas que obriguem à permanência em pé durante períodos prolongados, quer parado quer em marcha ou a subir e descer muitas escadas, afigura-se justa e equitativa a quantia de € 20.000,00 fixada no acórdão recorrido como valor indemnizatório pela perda da capacidade geral do lesado.».
_ O Ac. STJ de 05.05.2020, proferido no processo nº 30/11.7TBSTR.E1.S1, relatado por Raimundo Queirós, considerou justo o valor de € 25 000, 00 de indemnização, a lesado de 34 anos (mais velho que o lesado destes autos), com défice de 5 pontos percentuais, sumariando:
«II- O critério de indemnização do dano biológico, enquanto dano patrimonial futuro, perda de capacidade de ganho, ou maior penosidade no desempenho de actividade laboral, é o critério da equidade – art. 566.º, n.º 3, do CC.
III- No caso dos autos, o autor, em consequência do acidente ficou com um défice funcional de 5 pontos percentuais, que afectam os dois membros inferiores, e, consequentemente, o seu suporte e movimentação, e que são de molde a repercutir-se nos mais diversos aspectos da vida do dia-a-dia.
IV- Para além do acréscimo de esforço físico no desenvolvimento da sua actividade de trabalhador da construção civil, as lesões sofridas implicam também inegável redução da sua capacidade económica geral, mormente para se dispor ao desempenho de outras actividades concomitantes ou alternativas que, presumivelmente, ainda lhe pudessem surgir na área profissional, ao longo da sua expectativa de vida.
V- Considerando que o autor, à data da consolidação das lesões tinha 34 anos de idade, sendo a esperança média de vida estabelecida para os homens de 77,7 anos, parece-nos adequado e justo o valor de 25.000,00€ fixado pela Relação.»
- O Ac. do STJ de 16.06.2016, proferido no processo n.º 1364/06.8TBBCL.G1.S2 , relatado por Tomé Gomes fixou a indemnização de € 25 000, 00 a lesado de 40 anos (mais velho que o lesado destes autos), com défice de 6 pontos, sumariando: «Tendo a A. a idade de 40 anos, à data da consolidação das sequelas, e permanecendo com uma incapacidade genérica de 6%, em termos de rebate profissional, compatível embora com a sua atividade profissional, mas não conseguindo realizar ou só executando com grande dificuldade tarefas que exigem maior esforço físico ou que requerem a sua posição de sentada por períodos mais ou menos prolongados, o que é de molde a influir negativamente e sobremaneira na sua produtividade como costureira, sendo ainda tais limitações suscetíveis de reduzir o leque de possibilidades de exercer outra atividade económica similar, alternativa ou complementar, e de se traduzir em maior onerosidade no desempenho das tarefas pessoais, mormente das lides domésticas, o que se prevê que perdure e até se agrave ao longo do período de vida expetável, mostra-se ajustada a indemnização de € 25.000,00 para compensar o dano biológico na sua vertente patrimonial».
b) Que em casos com défice funcional de 16 e 19 pontos (maiores em 6-9 pontos aos destes autos) e a lesados de 34 e 35 anos (mais velhos que o destes autos) foram fixadas indemnizações de € 36 000, 00 e € 40 000, 00:
__O Ac. do STJ de 07.03.2019, proferido no processo n.º 203/14.0T2AVR.P1.S1, relatado por Tomé Gomes, fixou a indemnização em € 40 000, 00, em relação a lesada com 35 anos à data do acidente e 37 anos à data da consolidação das sequelas, com 19 pontos, e empregada de mesa, sumariando, nomeadamente  «considerando o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, fixado em 19 pontos percentuais, com repercussão permanente na atividade profissional da A., mas com ela compatível, implicando esforços suplementares, à luz dos padrões indemnizatórios seguidos pela jurisprudência deste Supremo Tribunal, tem-se como razoável atribuir ao dito dano biológico, na respetiva vertente patrimonial, o valor de € 40.000,00».
_ O Ac. do STJ de 29.10.2019, proferido no processo nº 7614/15.2T8GMR.G1.S1, relatado por Henrique Araújo, fixou a indemnização em  € 36 000, 00, a lesado de 34 anos com défice funcional de 16 pontos- «Numa situação em que ao lesado, com 34 anos, foi atribuído um défice funcional de 16 pontos por força das lesões sofridas, sem rebate profissional mas com a subsequente sobrecarga de esforço no desempenho regular da sua atividade profissional (vendedor e empresário de materiais de construção civil e produtos agrícolas), afigura-se ajustado o montante de € 36 000,00 para indemnizar tal dano futuro». 
Atendendo a todos os fatores em ponderação, verifica-se que a indemnização fixada pelo Tribunal a quo:
a) Encontra-se fixada em valor inferior à indemnização que caberia ao lesado se o défice funcional lhe tivesse causado uma perda determinada e equivalente de capacidade de ganho e rendimentos, em relação à sua profissão habitual previsível (achada com o cálculo mais rigoroso da Relação de Coimbra e nos termos referidos).
b) É adequada a uma situação: em que se prevê que o lesado, com défice geral de integridade físico-psíquica de 10 pontos, venha a viver depois da consolidação das sequelas mais 51 anos de vida ativa e 58 anos de esperança média de vida, os quais terá de viver com o permanente défice provado; em que se presume judicialmente que o conteúdo das sequelas, apesar de serem gerais, o onerem e causem sofrimento no desempenho de atividade laboral para que se está a habilitar, na parte que lhe exijam estar de pé mais de 15 minutos ou desempenhar trabalhos com força ou pressão no tornozelo (quer paralela ao estudo durante a formação académica, se o lesado quisesse desempenhar trabalhos em part-times,  quer na sua plena vida profissional ativa), colocando-o numa situação de desfavor e limite num mercado concorrencial.
c) Encontra-se fixada no limite máximo/superior das indemnizações fixadas pelo Supremo Tribunal de Justiça, mesmo adaptadas e proporcionadas aos fatores destes autos (face aos pontos inferiores ou superiores referidos e às idades superiores dos lesados).
Assim, não se pode entender que a indemnização fixada pelo Tribunal a quo pela equidade, nos termos do art.566º/3 do C. Civil, seja manifestamente desadequada, desproporcionada ou violadora do princípio da igualdade face aos valores equitativos fixados na Jurisprudência.
Desta forma, julgam-se improcedentes o pedido de redução da indemnização do recurso principal e o pedido de ampliação da indemnização do recurso subordinado.

IV. Decisão:

Pelo exposto, as Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar improcedente o recurso de apelação principal e independente e confirmar a sentença recorrida.
*
Guimarães, 11.05.2023

Assinado eletronicamente pelas Juízes Desembargadoras Relatora, 1ª Adjunta e 2ª Adjunta

Alexandra M. Viana P. Lopes
Rosália Cunha
Lígia Venade

Sumário da Relatora:

1. A declaração da Companhia de Seguros (na altura em que se deve pronunciar nos termos do art.37º/1-c) e 2-a) RSSORCA) de assunção da responsabilidade de 100% do acidente ocorrido com danos corporais, quando é realizada em termos claros, sem condicionamento a qualquer evento suspensivo ou resolutivo posterior, sem menção de provisoriedade face a peritagem em curso, declaração em relação à qual não invocou a falta ou de vício de vontade (arts.359º, 240º ss do C. Civil):
a) Não pode ser tida como provisória, nos termos do art.37º/2-a), em referência ao art.37º/1-c), do RSSORCA, por esta previsão respeitar à assunção de um valor de indemnização proposto e não aos pressupostos da responsabilidade pela obrigação de indemnizar ou ao grau de repartição da responsabilidade.
b) Corresponde a uma verdadeira proposta negocial de assumir, em relação ao valor de reparação de danos a definir, a responsabilidade total da indemnização, sem redução por repartição da culpa entre os intervenientes do acidente, declaração esta: que é irrevogável, pois chegou ao conhecimento do destinatário sem qualquer ressalva (art.230º/1 do C. Civil); é irretratável, pois na altura desta declaração de assunção de dívida não foi comunicado ao declaratário qualquer retratação, que pudesse tornar a proposta ineficaz (art.230º/2 do C. Civil); não pode ser resolvida pois a proponente não alegou (e não provou) que tivesse ocorrido uma alteração superveniente e anormal de circunstâncias que pudesse fundamentar a possibilidade de alteração da proposta (art.437º do C. Civil).
2. A proposta referida em 1 supra: dispensa a aceitação, face à totalidade da responsabilidade assumida pela ré/seguradora em relação à pretensão da comunicação do sinistro; considera-se tacitamente aceite pelo lesado, face ao pagamento integral pela ré/seguradora da reparação do veículo conduzido pelo mesmo (art.234º do C. Civil).
3. As indemnizações por danos não patrimoniais e por danos patrimoniais futuros fixadas pela equidade, nos termos respetivos dos arts.496º/4 e 566º/3 do C. Civil, não deve ser alterado no Tribunal Superior salvo se violar razões de segurança jurídica e o princípio da igualdade.
4. Não devem ser reduzidas nem ampliadas as indemnizações de € 30 000, 00 por danos não patrimoniais e de € 60 000, 00 por danos patrimoniais, fixada a jovem que tinha 19 anos à data do acidente, que:
a) Sofreu lesões (fratura da tíbia e do perónio da perna direita), tratamentos (internamento durante 6 dias, cirurgia; retirada do material de imobilização; 40 sessões de fisioterapia) e uma limitação temporária de atividades normais (défice funcional temporário total de 7 dias; défice funcional temporário parcial de 328 dias); sofreu um quantum doloris de grau 5/7; ficou com sequelas (ficou com cicatrizes; passou a ter dificuldade em permanecer em pé mais de 15/20 minutos; apresenta marcha claudicante), que lhe conferem um défice de 10 pontos, um dano estético permanente de grau 3/7 e uma repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de grau 4/7 e vai ter agravamento futuro (com a formação de artrose e necessidade de nova cirurgia).
b) No ano do acidente e da consolidação das sequelas: tinha a perspetiva de 51 anos de vida ativa e de 58 anos de esperança média de vida; era estudante do 1º ano de engenharia mecânica, vindo a ser previsível que venha a desempenhar atividade profissional de engenharia mecânica ou das competências transversais nas engenharias para as quais a licenciatura o habilitar, atividade profissional que pode vir a integrar com normalidade uma dimensão de atividade com esforço físico (sobretudo em meio industrial e fabril); ficou com dificuldade em permanecer em pé mais de 15/20 minutos e apresenta marcha claudicante, com défice permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos, sendo de admitir a existência de dano futuro, com a formação de artrose, o que lhe causará, pelo menos, maior esforço no desempenho de uma atividade profissional na área de engenharia mecânica e conexa, que lhe exija esforço físico (no estar de pé em exames de máquinas ou em situação de esforço), situação que pode comprometer a ampliação de progressões profissionais ou de cumulação fontes de rendimento.



[i] Fernando Ferreira Pinto e Fernando Sá, in Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Portuguesa, 2014, notas V a VII, pág.522.
[ii] Fernando Ferreira Pinto e Fernando Sá, in obra citada em i), nota VIII e IX, págs.522 e 523.
[iii] Comentário ao Código Civil, Direito das Obrigações, Universidade Católica Portuguesa, 2018, Nota I ao art.496º do Código Civil, pág.356.
[iv] Obra citada em i, Nota IV ao art.496º do Código Civil, pág. 359.
[v] Obra citada em i, Nota III ao art.496º do Código Civil, págs.358 e 359.
[vi] Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª edição revista e atualizada, Coimbra Editora, Nota 6 ao art.496º do Código Civil, pá.g.501.
[vii] Ac. STJ de 17.01.2008, proferido no processo SJ200801170045382, relatado por Pereira da Silva, in dgsi.pt, entre outros.
[viii] Ac. STJ de 24.04.2013, in dgsi.pt
[ix] Ac. STJ de 19/5/2009, proferido no processo nº298/06.0TBSJM.S1, e acervo de doutrina exposto no ac. RG de 15.02.2018, proferido no processo 3nº037/15.1T8VCT.G1, todos in dgsi.pt.
[x] Obra citada in i, Nota III ao art.496º do Código Civil, pág.359.
[xi] Ac. STJ de 25.05.2017, proferido no processo n.º º 868/10.2TBALR.E1.S1, relatado por Lopes do Rego, disponível in dgsi.pt.
[xii]  Ac. RG de 15.02.2018, proferido no processo nº3037/15.1T8VCT.G1, in www.dgsi.pt.
[xiii] Ac. STJ de 25.05.2017, proferido no processo n.º º 868/10.2TBALR.E1.S1, relatado por Lopes do Rego, disponível in dgsi.pt.
[xiv] Mário Júlio de Almeida Costa, in Direito das Obrigações, 12ª Edição revista e atualizada, Almedina, outubro de 2019, pág. 597; Henrique Sousa Antunes, in Comentário ao Código Civil- Direito das Obrigações, Obrigações em Geral, Universidade Católica Editora, nota 5 ao art.564º, pág.561
[xv] Mário Júlio de Almeida Costa, in obra citada na nota antecedente, pág.597.
[xvi] Henrique Sousa Antunes, in Comentário ao Código Civil citado em i, nota 5 ao art.564º, pág.561.
[xvii] Henrique Sousa Antunes, in Comentário ao Código Civil citado em i, nota 5 ao art.564º, pág.562.
[xviii] Ana Prata sublinha a impossibilidade de conhecimento e determinação oficiosa de uma indemnização em forma de renda, in Código Civil anotado com a sua coordenação, volume I, 2ª edição revista e atualizada, 2019, Almedina, nota 1 ao art.567º, pág.765.
[xix] Henrique Sousa Antunes, in Comentário ao Código Civil citado em i, nota 3 ao art.567º, pág.573.
[xx] Acórdão do STJ de 12.11.2019, proferido no processo nº468/15.0T8PDL.L1.S1, relatado por Acácio das Neves, disponível in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/10569208ec8447be802584b3003bf644?OpenDocument
[xxi] AC STJ de 25.05.2017, proferido no processo nº868/10.2TBALR.E1.S1, relatado por Lopes do Rego, disponível in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/-/DEE63F8B194E342D8025812C003C3AC5.
[xxii] Neste sentido, v.g., ac. RC de 04.04.1995, publicado na CJ - Ano XX - Tomo II, ac. STJ de 5.07.2007, proferido no processo nº 07A1734, relatado por Nuno Cameira; ac. STJ de 28.03.2019, proferido no processo nº1120/12.4TBPTL.G1.S1, relatado por Tomé Gomes; ac. de 29.10.2019, no processo nº683/11.6TBPDL.L1.S2, relatado por Ricardo Costa; ac. do STJ de 29.10.2019, proferido no processo nº7614/15.2T8GMR.G1.S1, relatado por Henrique Araújo; ac. do STJ de 19.09.2019, proferido no processo nº2706/17.6T8BRG.G1.S1, relatado por Maria do Rosário Morgado, todos in dgsi.pt.
[xxiii] Posição esta sintetizada no Acórdão STJ de 28.03.2019, proferido no processo nº1120/12.4TBPTL.G1.S1, relatado por Tomé Gomes, disponível in dgsi.pt.
[xxiv] Ac. STJ de 19.09.2019, proferido no processo nº2706/17.6T8BRG.G1.S1, relatado por Maria do Rosário Morgado, disponível in dgsi.pt.
[xxv] Ac. STJ de 28.03.2019, proferido no processo nº1120/12.4TBPTL.G1.S1, relatado por Tomé Gomes.
[xxvi] Ac. RC de 12.02.2011, proferido no processo nº291/07.6TBLRA.C1, relatado por Pedro Martins, disponível in dgst.pt.
[xxvii] Ac. STJ de 28.03.2019, proferido no processo nº1120/12.4TBPTL.G1.S1, relatado por Tomé Gomes.
[xxviii] Ac. STJ de 19.09.2019, proferido no processo nº2706/17.6T8BRG.G1.S1, relatado por Maria do Rosário Morgado.
[xxix] Ac. STJ de 12.11.2019, proferido no processo nº468/15.0T8PDL.L1.S1, relatado por Acácio das Neves, que enuncia taxas aplicadas entre 33% e 10% e faz aplicar uma redução de 10%.
O AC STJ de 25.05.2017, proferido no processo nº868/10.2TBALR.E1.S1, relatado por Lopes do Rego, que considera que o benefício de antecipação, consoante cada caso, pode ser eliminado ou reduzido, consoante as circunstâncias de cada caso, vindo a aplicar uma taxa de redução de 1,5%, com o seguinte sumário: “I. A regra ou princípio geral segundo a qual o benefício da antecipação deve descontar-se na indemnização arbitrada pelo dano patrimonial futuro deve ser adequada às circunstâncias do caso concreto, podendo nomeadamente tal benefício ser eliminado ou apagado perante a existência provável de um particular agravamento ou especial onerosidade dos danos patrimoniais futuros expectáveis que importa compensar com recurso a critérios de equidade. II. O dito benefício nunca poderia actualmente corresponder – perante o quadro económico actual e face às perspectivas razoáveis de rentabilização do montante indemnizatório recebido – aos pretendidos 20% - sendo, quando muito, equitativa e ajustada a redução ao montante do capital a atribuir à autora a título de indemnização pela perda de rendimentos do correspondente a uma taxa na ordem de 1,5%.”
[xxx] Neste sentido, nomeadamente, ac. STJ de 21.03.2019, proferido no processo nº1069/09.8TVLSB.L2.S2, relatado por Nuno Pinto de Oliveira; ac. STJ de 19.06.2019, proferido no processo nº80/11.3TBMNC.G2.S1, relatado por Catarina Serra (e jurisprudência neste citada), ambos in dgsi.pt.
[xxxi] Vide, nomeadamente: ac. RG de 12.09.2019, no processo nº1629/18.6T8VCT.G1, relatado por Ramos Lopes; Ac. STJ de 07.03.2019, no processo nº203/14.0T2AVR.P1.S1, e Ac. STJ de 28.03.2009 no processo nº1120/12.4TBPTL.G1.S1, relatado por Tomé Gomes.
[xxxii] Disponível, a 08.05.2023, in https://www.pordata.pt/portugal/esperanca+de+vida+a+nascenca+total+e+por+sexo+(base+trienio+a+partir+de+2001)-418
[xxxiii] Ac. do STJ de 07.03.2019, no processo nº203/14.0T2AVR.P1.S1, relatado por Tomé Gomes, in dgsi.pt.
[xxxiv] Vide in https://www.pordata.pt/Portugal/Taxas+de+juro+de+dep%C3%B3sitos+(m%C3%A9dia+anual)+de+particulares+total+e+por+tipo-2850
[xxxv] Vide in
https://www.pordata.pt/Portugal/Taxas+de+rendibilidade+de+obriga%C3%A7%C3%B5es+do+tesouro-2803
[xxxvi] Vide Boletim de agosto de 2021 do IGCP, organismo público português de emissão de dívida, in https://www.igcp.pt/fotos/editor2/2021/Boletim_Mensal/08_BM_ago_1.pdf ; e
projeções do https://tradingeconomics.com/portugal/government-bond-yield
[xxxvii] Vide https://tradingeconomics.com/germany/30-year-bond-yield
[xxxviii] Vide : https://www.pordata.pt/Portugal/Taxa+de+Infla%C3%A7%C3%A3o+(Taxa+de+Varia%C3%A7%C3%A3o+do+%C3%8Dndice+de+Pre%C3%A7os+no+Consumidor)+total+e+por+consumo+individual+por+objectivo-2315