Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
81/04.8TAMGL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: LUIS RAMOS
Descritores: RECURSO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
INDEMNIZAÇÃO POR DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 11/17/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE VISEU
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 180.º, N.º 1, 183.º, N.º 2, E 184.º, POR REFERÊNCIA À ALÍNEA J) ACTUALMENTE ALÍNEA L), DO N.º 2, DO ARTIGO 132.º, TODOS DO CÓDIGO PENAL E DOS ARTIGOS 30.º E 31.º, N.ºS 1 E 3, DA LEI N.º 2/99, DE 13 DE JANEIRO, 410º , 412º,428º DO CPP E 494º,496º DO CC
Sumário: 1.A decisão sobre a matéria de facto só pode ser alterada pelo tribunal de recurso quando a mesma violar os seus momentos estritamente vinculados, designadamente quando obtida através de provas ilegais ou proibidas ou contra a força probatória plena de certos meios de prova, ou então quando afronte, de forma manifesta, as regras da experiência comum.
2.A indemnização por danos não patrimoniais, de acordo com o disposto nos artigos 129º do CP e 494ºe 496º do CC, é fixada equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso e devendo ter-se ainda em conta as regras de boa prudência, a justa medida das coisas e a ponderação das realidades da vida; finalmente, devem ainda ser tomadas em consideração as soluções jurisprudenciais para casos semelhantes.
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra

Por sentença proferida nos autos supra identificados, decidiu o tribunal:
a) Condenar o arguido P como autor de um crime de difamação agravado praticado através de meio de comunicação social, previsto e punido pelos artigos 180.º, n.º 1, 183.º, n.º 2, e 184.º, por referência à alínea j) actualmente alínea l), do n.º 2, do artigo 132.º, todos do Código Penal e dos artigos 30.º e 31.º, n.ºs 1 e 3, da Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro, na pena de 220 (duzentos e vinte) dias de multa à taxa diária de € 15,00 (quinze euros), no montante global de € 3 300 (três mil e trezentos euros);
b) Condenar o arguido P e a demandada civil, Sociedade “O Z…– Produções e Edições Regionais, Lda.”, a pagarem solidariamente ao demandante civil PA a quantia de € 10 000,00 (dez mil euros), a título de indemnização civil, acrescida de juros de mora à taxa legal, contados desde a notificação da sentença até integral e efectivo pagamento.
c) Absolver o arguido e a demandada civil do pagamento de quaisquer danos patrimoniais ao demandante civil.

Inconformado com o decidido, o arguido interpôs recurso no qual apresentou as seguintes conclusões (transcrição):
1-        O tribunal recorrido não fez rigorosa avaliação dos meios de prova produzidos;
2-        A prova documental (artigo do Jornal) em que se baseia a motivação do Tribunal recorrido, é insuficiente para a matéria de facto dada como provada nos pontos 4., 5., 9., e 14., na sentença em crise;
3-        Da prova documental (artigo do Jornal) não resulta a prática pelo arguido dos factos dados como provados pelo tribunal recorrido.
4-        Pelo que, estamos perante um erro notório por parte do Tribunal a quo, na apreciação da prova.
5-        O tribunal recorrido não aplicou o principio "in dubio pro reo" , que tendo por base a prova produzida ou não produzida, levaria à absolvição do arguido.
6-        O Tribunal a quo, incorreu em erro no julgamento (de direito), porquanto a conduta do arguido não configura a prática de um crime difamação através da imprensa.
7 - Na medida, em que as afirmações constantes do artigo do jornal, não revestem foros de difamação, porquanto não foram dirigidas ao deputado PA.
8-        O arguido no seu artigo emite uma opinião critica objectiva, no âmbito do direito à liberdade de imprensa, não atribuindo qualquer facto, mesmo sob a forma de suspeita, ou formulando sobre o deputado PA, qualquer juízo ofensivo da sua honra e consideração.
9-        A crítica objectiva, como a que é formulada no artigo escrito pelo arguido, cai fora da tipicidade de incriminações como a difamação.
10- Pelo que, não se encontram reunidos os elementos objectivos e subjectivos do tipo de crime de difamação.
11- A decisão do Tribunal a quo ao condenar o arguido, violou o disposto no artº 180º nº 1 do Código Penal.
12- Bem como violou, o artº 38º nº 1 e 2 da Constituição, na medida em que não reconheceu ao arguido, o direito de se poder expressar livremente, e criticar objectivamente, enquanto jornalista.
13- O Tribunal recorrido errou na condenação em indemnização por danos morais.
14- Porquanto, a falta de ilicitude dos factos praticados, impunham a absolvição do arguido.
15- Bem como a falta de prova quanto à existência do dano, e do nexo de causalidade entre o facto (artigo do jornal) e os danos originados pelo mesmo, impunha a absolvição do arguido.
16- Sem prescindir, deverá o montante fixado na decisão em crise é exorbitante e excessivo, violando os arts. 494º e 496º do Código Civil.
Nestes termos e nos mais de direito, que mui doutamente serão supridos, deverá a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva o arguido do crimes que lhe foi imputados.  

Respondeu o assistente PA
1) “... sendo o arguido licenciado em Filologia Românica, tendo o mestrado em Literaturas Românicas e estando a concluir o doutoramento em Literatura, melhor do que ninguém consegue perceber o alcance das palavras que escreve, as interpretações legítimas que delas e do seu contexto podem ser retiradas pelos diferentes leitores de um jornal";
2) O ora recorrente tal como ficou provado no ponto 8 dos factos dados como provados na Douta sentença, “( ... ) não fez qualquer diligência para apuramento junto do ofendido ou da referida professora da veracidade dos factos nela constantes.";
3) Certo é que, o recorrente quis ir notoriamente bem mais longe que outros escritos que lhe serviram de fonte, associando a irregularidade da colocação da referida professora ao facto de ser cunhada de um deputado, daí ter utilizado a expressão: “Senhores (as) Professores (as), mal estarão aqueles que não tiverem cunhados deputados, não forem filhas de ministro, ou amigos de directores adjuntos da DREC";
4) O recorrente ao escrever a expressão "Para esses o processo é penoso, improfícuo, moroso e complicado... muito complicado mesmo ! “queria tão somente dizer que por ser cunhada do deputado referido na noticia, o processo da sua colocação não foi penoso, nem moroso e nem complicado;
5) A forma contextualizada de todo o escrito, imputa sob a forma de suspeita, uma intervenção ilícita, uma "cunha", para a colocação irregular da sua "cunhada" professora;
6) Não existe qualquer erro de julgamento de matéria de facto, nomeadamente no que diz respeito aos pontos de facto 4, 5, 9 e 14 dados como provados na Douta decisão;
7) A atipicidade não poderá sustentar-se para os juízos que atingem a honra pessoal e a consideração pessoal, como sucede no caso em apreço;
8) Os limites à liberdade de imprensa são os que decorrem da lei - fundamental e ordinária - de forma a salvaguardar o rigor e a objectividade da informação, a garantir os direitos ao bom nome, à reserva da intimidade da vida privada, à imagem e à palavra dos cidadãos e a defender o interesse público e a ordem democrática (artigo 3°da Lei n°2/99 de 13-01);
9) A liberdade de imprensa e o direito de informação comportam limites legais, entre os quais relevam a garantia quer da objectividade, do rigor e da verdade do que é informado ao público, quer justamente também da salvaguarda do direito ao bom nome e reputação, tutelado pelo art.o 26, n.o 1 da CRP e art. ° 484 do CC
10) À eficácia dos meios de publicação informativa na realização dos fins de comunicação corresponde, como contraponto, a exigência de rigor e da máxima cautela na averiguação da realidade dos factos que divulgam, sobretudo quando essa divulgação, pela natureza do seu conteúdo, seja susceptível de afectar o direito ao bom nome e à reputação social das pessoas em geral;
11) Inexistindo falsidade dos pressupostos factuais, e estando em causa notícias inseridas em jornalismo de opinião, há que aferir a ''pretensa ofensa ao direito ao bom nome e reputação social das pessoas em geral";
12) As expressões intencionalmente utilizadas pelo recorrente no artigo de que é autor e que fez publicar no jornal “o Z.., designadamente com o título "Professora, cunhada do deputado do … P, colocada em situação de polémica legalidade.", conjugado com o escrito no interior do artigo quando se afirma "Sem sombra de ambiguidades ou demagogia fácil, este exemplo seguido pelos "peões locais" vem de cima, bastando lembrarmo-nos da recente demissão do ministro L… pela "cunha" para a entrada da filha do colega ministro, M .., no curso de …" concluindo "Senhores (as) Professores (as), mal estarão aqueles que não tiverem cunhados deputados, não forem filhas de ministro, ou amigos de directores adjuntos da DREC. Para esses o processo é penoso, improficuo, moroso e complicado ... muito complicado mesmo /", são notoriamente e objectivamente utilizadas para chamar a atenção do leitor, transmitindo-lhes a suspeita sobre o comportamento menos lícito do ora recorrente na colocação da professora, sua "cunhada", pretendendo assim, e tendo-o conseguido, que teria existido uma cunha por parte do cunhado deputado PA para que ela pudesse ter sido colocada numa situação irregular e ilegal;
13) A suspeita sobre a idoneidade do deputado PA estava lançada, indo o arguido muito para além do dever de informar, do rigor jornalístico em detrimento das notícias sensacionalistas que lhe permitiriam aumentar as vendas do jornal em causa, sendo por isso a sua actuação lesiva da sua honra e consideração pessoais;
15) Os elementos do tipo legal de crime, no caso em apreço encontram-se plenamente preenchidos pelo que, bem andou o Tribunal "a quo"condenando o ao arguido a prática de um crime de difamação agravado praticado através de meio de comunicação social, previsto e punido pelos artigos 180° n.ol, 183° n~ e 184° por referência à alínea j) do nº 2 do artigo 132°, todos do Código Penal e dos artigos 30° e 31° n.o 1 e 3, da Lei da Imprensa, Lei nº 2/99, de 13 de Janeiro;
16) Inexiste erro no julgamento relativamente à condenação em indemnização civil, e igualmente quanto ao montante de indemnização fixado a título de danos morais.
Termos em que deverá o presente recurso ser julgado improcedente na sua globalidade

O Ministério Público não respondeu.

O recurso foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito suspensivo.

Nesta instância o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual se manifesta pela improcedência do recurso.

No âmbito do art.º 417.º, n.º 2 do Código Penal o arguido nada disse.

Os autos tiveram os legais vistos após o que se realizou a conferência.

Cumpre conhecer do recurso

Constitui entendimento pacífico que é pelas conclusões das alegações dos recursos que se afere e delimita o objecto e o âmbito dos mesmos, excepto quanto àqueles casos que sejam de conhecimento oficioso.

É dentro de tal âmbito que o tribunal deve resolver as questões que lhe sejam submetidas a apreciação (excepto aquelas cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras).

Cumpre ainda referir que é também entendimento pacífico que o termo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.

Questões a decidir:

- Vícios da sentença

- Erro na apreciação da prova

- Integração jurídica dos factos

- Montante indemnizatório

Na 1.ª instância foi dada como provada a seguinte factualidade (transcrição):
1. Na edição do dia 5 de … de 200.. (Edição n.º …), na página 17, do jornal quinzenal “O Z”, propriedade de “O Z.. – Produções e Edições Regionais Lda.”, com sede … em M…, o arguido, na qualidade de Director daquele periódico, fez publicar um escrito da sua autoria, com o título “Professora, cunhada do deputado do … PA, colocada em situação de polémica legalidade.”
2. Desse artigo constavam, entre outras, as seguintes frases e expressões: “Sem sombra de ambiguidade ou demagogia fácil, este exemplo seguido pelos “peões locais” vem de cima, bastando lembrarmo-nos da recente demissão do ministro L… pela “cunha” para a entrada da filha do colega ministro, M.. no curso de ….
3. E, mais adiante, dos dois últimos parágrafos do aludido artigo, pode ainda ler-se “Senhores (as) Professores (as), mal estarão aqueles que não tiverem cunhados deputados, não forem filhas de ministro, ou amigos de directores adjuntos da DREC. Para esses o processo é penoso, improfícuo, moroso e complicado… muito complicado mesmo!”, tudo conforme cópia da página 17 daquele jornal junta a fls. 91, que aqui se dá por integralmente reproduzida.
4. Os factos imputados pelo arguido ao deputado PA através das afirmações contidas no referido artigo, são objectivamente ofensivos da sua honra e consideração, pois ligam-no à prática de um favorecimento ilegal à professora ali referenciada – contrário às normas da colocação dos professores – e à violação dos deveres inerentes ao exercício do cargo público que o mesmo desempenhava.
5. Ao escrever e fazer publicar o referido texto, o arguido representou e conformou-se com a possibilidade de, com a sua actuação, vir a atingir o ofendido PA na sua honra e consideração, sobretudo enquanto deputado da Assembleia da República e por causa dessas funções, perante o próprio e o universo indefinido dos leitores da publicação em causa, o que efectivamente veio a acontecer.
6. O arguido tinha conhecimento de que as circunstâncias de visar membro de órgão de soberania e de se servir de órgão de comunicação social lhe agravavam a responsabilidade em que sabia poder vir a incorrer.
7. O arguido, à data dos factos, não tinha qualquer conhecimento que o ofendido tivesse cometido qualquer ilegalidade ou sequer tivesse intervindo ou interferido, por qualquer modo, na colocação da professora em causa.
8. O arguido antes de publicar a notícia em causa não fez qualquer diligência para apurar junto do ofendido ou da referida professora da veracidade dos factos nela constantes.
9. Da leitura do todo conteúdo da noticia em causa poderia retirar-se a ilação de que a cunhada do deputado do… PA foi ilegalmente colocada num estabelecimento de ensino graças a um favor pessoal do referido deputado, cometendo ele também, assim, uma ilegalidade.
10. O ofendido em nada interferiu relativamente à alegada irregularidade na colocação da professora em causa.
11. O ofendido é uma pessoa bem considerada entre os seus pares, não existindo conhecimento que se tenha deixado influenciar ou tivesse influenciado fosse quem fosse para obter para si ou para a referida cunhada favores pessoais ou profissionais.
12. Ao tempo, o ofendido PA exercia as funções de deputado da Assembleia da República.    
13. As referidas expressões no contexto que resulta de todo o referido artigo escrito pelo arguido ofenderam o demandante PA.
14. O arguido ao escrever tais expressões, contextualizando-as da forma que o fez, ofendeu a honra e o bom-nome do queixoso, pondo em causa, publicamente a sua honestidade, seriedade e dignidade pessoais.
15. O ofendido sentiu-se triste e revoltado ao ler o artigo em causa e saber que outras pessoas também o leram.
16. A edição do jornal em causa, naquele dia, teve uma tiragem de 4 000 exemplares.
17. Nos bastidores da Assembleia da República, entre os deputados de todas as forças politicas, circulou uma fotocópia com o conteúdo do artigo em causa.
18. O ofendido foi confrontado por diversas pessoas com o conteúdo da noticia, precisando de defender a sua honra junto das mesmas.
19. O ofendido evitou frequentar determinados lugares, para não ser confrontado com o teor da notícia.
20. O ofendido, actualmente, exerce o cargo de Chefe de Gabinete de apoio à Presidente da Câmara de …
21. Não são conhecidos antecedentes criminais ao arguido constando do seu Certificado de Registo Criminal que os não tem.
22. O arguido é professor há cerca de 35 anos, é licenciado em Filologia Românica, tem o mestrado em Literaturas Românicas e está a concluir o doutoramento em Literatura.
23. O salário do arguido é de 2 000 euros líquidos.
24. A esposa do arguido é jurista do Ministério …, auferindo um salário mensal de 1 500 euros.
25. Vive em casa própria, pagando uma prestação mensal ao Banco no valor de 1 200 euros.
26. O arguido é uma pessoa respeitada e considerada no seu meio social e académico.”

Quanto à factualidade não provada, consignou-se (transcrição):
“Com relevo para a decisão da causa, não se provaram quaisquer outros factos para além dos referidos supra, designadamente, não se provou que:
1. A notícia ventilada afectou igualmente a carreira política do demandante civil sendo que actualmente não exerce as mesmas funções de deputado o que de alguma forma não pode deixar de relacionar-se com a publicação efectuada e a sua consequente descredibilização junto da estrutura partidária a que pertence tanto a nível distrital como a nível nacional.
2. Por ter caído, fruto da notícia publicada, na estrutura partidária, para um lugar de difícil ou impossível eleição, o demandante sofreu prejuízos patrimoniais de valor não inferior a 50 000,00 euros.
3. Ao escrever o referido artigo, o arguido apenas se limitou a transmitir factos referidos anteriormente na imprensa nacional (jornais, rádio e televisão) e os constantes do processo de inquérito da Inspecção-geral de Educação.”

O tribunal recorrido fundamentou a formação da sua convicção nos seguintes termos (transcrição):
“Dar-se-á de seguida cumprimento ao disposto no artigo 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, expondo-se os motivos de facto que fundamentaram a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para fundamentar a convicção do tribunal, explicitando-se os fundamentos lógicos da decisão final.
A convicção do Tribunal para dar como provados os factos supra descritos resultou da apreciação crítica e selectiva de toda a prova produzida em audiência conexionada com as regras de experiência comum.
Designadamente, do exemplar do “Jornal o Z” publicado em 5 de  de 200. junto a estes autos dentro de uma bolsa plástica a fls. 91. 
Para a convicção do Tribunal foram também relevantes as declarações prestadas em audiência de julgamento pelo arguido que confessou o teor da noticia em causa, ter sido o seu autor e ser o director do jornal em causa à data da referida publicação. Declarou ser o único responsável pela autoria do artigo e pela sua publicação.
Confessou, ainda, não ter feito quaisquer diligências junto do ofendido PA nem da professora em causa para aferir da veracidade dos factos relatados.
Porém, nas suas declarações pretendeu fazer crer que, apesar do referido teor, a notícia em causa não é ofensiva para o Ofendido PA, pois apenas pretende chamar a atenção para a polémica situação de colocação de professores de forma irregular. Afirmou, ainda, que a sua notícia vinha na sequência de outras notícias, de outros órgãos de comunicação social, de carácter nacional.
Ora, quanto ao primeiro aspecto, o Tribunal não conseguiu vislumbrar a bondade de tal interpretação da referida notícia.
Com efeito, sendo o arguido licenciado em Filologia Românica, tendo o mestrado em Literaturas Românicas e estando a concluir o doutoramento em Literatura, melhor do que ninguém consegue perceber o alcance das palavras que escreve, as interpretações legitimas que delas e do seu contexto podem ser retiradas pelos diferentes leitores de um jornal.
Não podendo deixar de saber que a forma como escreveu o seu artigo seria passível de ser interpretada como aludindo, sob a forma de suspeita, a uma irregular intervenção por parte do deputado em causa para obter um favor ilegítimo para a colocação de uma sua cunhada como professora num determinado estabelecimento de ensino.
Quanto ao facto da notícia em causa vir na sequência de outras notícias já publicadas em órgãos de comunicação social, de âmbito nacional, o arguido não logrou provar a veracidade de tal afirmação e, ainda que o conseguisse, não seria por isso que poderia escrever a notícia tal como o fez. Pois que, nesse caso, deveria fazer constar do seu artigo qual a sua fonte, indicando o órgão de comunicação social e a data da respectiva publicação onde foi buscar a informação que pretendia citar. 
Ora, das cópias juntas aos autos a fls. 27 e 28, portugalmail, e fls. 43 a 53, referentes a diversas noticiais publicadas no Jornal Público e no Independente, resulta à evidência, quer dos respectivos títulos quer do seu texto integral, mesmo quando fazem referência ao nome do deputado em causa e da sua ligação a uma professora colocada irregularmente, não afirmam a intervenção do referido deputado na irregularidade existente no processo da sua colocação nem lançam qualquer suspeita nesse sentido.
Por exemplo, a fls. 28 escreveu-se “de consciência tranquila, o deputado PA assegurou que não tem rigorosamente nada a ver com o destacamento da docente (…) desconheço os procedimentos levados a efeito, mas acredito na absoluta legalidade da situação.”
A fls. 29 a 32, 34 a  na Web www.educare.pt também se refere a situação de irregularidade e eventuais responsáveis sem nunca se referir o nome do ofendido PA ou qualquer intervenção sua. Apenas na mesma Web a fls. 33, 37, 38 se faz referência ao facto da professora Susana .., uma das professoras colocadas irregularmente ser cunhada do ofendido, sem contudo daí resultar qualquer insinuação quanto à intervenção deste na irregularidade em causa.      
O arguido notoriamente quis ir mais longe, associando a irregularidade da colocação da referida professora ao facto de ser cunhada de um deputado, daí ter utilizado a expressão: “Senhores (as) Professores (as), mal estarão aqueles que não tiverem cunhados deputados, não forem filhas de ministro, ou amigos de directores adjuntos da DREC. Para esses o processo é penoso, improfícuo, moroso e complicado… muito complicado mesmo!”
Daqui sabia o arguido, claramente, que poderia dar azo à interpretação de que para a professora em causa, por ser cunhada do deputado referido na noticia, o ofendido PA o processo da sua colocação não foi penoso, nem improfícuo, nem moroso e nem complicado. Tendo mesmo sido irregular. Ora, daqui também poderiam resultar interpretações no sentido de imputar tal irregularidade à interferência do referido deputado, embora a notícia não o afirmasse expressamente, permitia uma tal interpretação. Facto que o arguido, tendo as habilitações literárias que tem, não podia deixar de saber.
Mas, ainda, que tal suspeita resultasse de outras noticias, como já deixamos expresso acima, tal não autorizava o arguido a reproduzir juízos de valor pejorativos a respeito da conduta do ofendido PA, escrevendo um artigo de opinião, onde lançava suspeitas evidentes sobre o ofendido que não havia tido o cuidado de comprovar anteriormente nem fazendo qualquer referência aos jornais que afirmou, em audiência, estar a citar.
O Tribunal valorou, ainda, os documentos juntos aos autos, a fls. 309 e seguintes, referentes às investigações e processo de inquérito que decorreram no Ministério da Educação para apuramento de responsabilidades sobre a irregularidade de colocação de professores, de onde não resulta qualquer intervenção do ofendido P A para a colocação da professora S (irmã da sua companheira), vide neste sentido, a título de exemplo o teor de fls. 413 a 420, 427, 435 a 437, 440 a 441.
Igualmente, valorou o Tribunal o teor da certidão emitida pelo 1.º Juízo criminal, deste Tribunal, de fls. 796 a 968, de onde consta que o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra confirma o Acórdão proferido pelo Tribunal Colectivo no âmbito do processo n.º 887/03.5TAVIS, que condenou os arguidos S, A, J, F e A, por factos relacionados com a colocação irregular da professora S e de onde não resulta qualquer interferência, seja a que título for, do ofendido PA, que nem sequer ali foi arguido.
O Tribunal também considerou o depoimento do ofendido, PA, que relatou as circunstâncias em que tomou conhecimento da noticia em causa, que há data era deputado da Assembleia da Republica, que nunca foi contactado pelo arguido para lhe pedir quaisquer esclarecimentos sobre a sua intervenção ou não no processo de colocação da irmã da sua companheira, a professora S, contrariamente ao que aconteceu com outros órgãos de informação de âmbito nacional.
A convicção do Tribunal assentou, também, no depoimento da testemunha LA, que fazia parte do corpo redactorial do Jornal onde a notícia foi publicada, a qual prestou um depoimento coerente e objectivo, merecendo credibilidade do Tribunal.
Referiu que a notícia em causa foi publicada no interior do jornal, sem grande destaque, com pequena dimensão. Confirmou que o jornal em causa não tinha capacidade para fazer investigação e, por isso, baseavam-se em notícias de outros jornais nacionais. Contudo, foi sincero ao dizer não ter lido as noticias que sobre o assunto saíram noutros jornais e daí não poder afirmar se eram ou não iguais a que está em causa nestes autos.
Sendo uma testemunha de defesa e amigo do arguido, foi objectivo e sincero quando afirmou que na referida noticia há claramente uma insinuação entre a irregularidade e a posição do deputado PA. Acrescentando, há uma insinuação, uma dúvida por detrás da notícia que pudesse ter existido uma cunha do deputado para a colocação da professora em causa.     
Quanto às restantes declarações das testemunhas ouvidas em audiência de julgamento, MR, AS, GD (estas do pedido cível), AM EM JM JN(estas de defesa), bem como dos depoimentos escritos, das testemunhas JC e M, BG, deputados da Assembleia da República, à data em que prestaram depoimento, (uma de defesa e outra do pedido cível) o Tribunal apenas valorou tais depoimentos quando demonstraram objectividade e imparcialidade, ou quando foram corroborados com os documentos a que acima se referiu.
Porquanto, foi notório que estas testemunhas, por uma razão ou outra, aqui e ali, prestaram depoimentos subjectivos e parciais, as de defesa tentando desresponsabilizar o arguido e as de acusação tentando hiper-valorizar os danos causados ao ofendido pela notícia em causa.
Assim, as testemunhas de defesa, tentaram fazer crer que o arguido actuou com profissionalismo e no cumprimento das regras jornalísticas, o que, efectivamente, não foi o caso. E as testemunhas de acusação e do pedido civil tentando demonstrar que foi esta notícia a causadora do ofendido, actualmente, já não ser deputado da Assembleia da Republica o que também não ficou demonstrado em audiência de Julgamento.
Sendo notório para o Tribunal, que estas testemunhas não conseguiram ser objectivas nem ultrapassar as suas questiúnculas partidárias, pois, de um lado estavam pessoas ligadas ao P…X (ofendido) e do outro, (arguido), aparentemente, pessoas ligadas ao P…Z sendo os seus depoimentos influenciados pela respectiva inclinação politica e/ou amizade com um ou com outro (ofendido e arguido). 
Em conclusão, de toda a prova produzida em audiência resultou para o tribunal que as expressões usadas na noticia publicada no Jornal o Z.., que visaram o então deputado PA, nomeadamente a forma como estavam contextualizadas, não correspondiam, na realidade, à existência de qualquer suspeita credível de que o referido deputado tivesse de algum modo interferido na colocação da professora em causa, irmã da sua companheira e menos, que o arguido tivesse conhecimento dessa suspeita ou de qualquer intervenção do ofendido no processo de colocação em causa.
Nem o arguido fez quaisquer diligências para apurar da veracidade dessa suspeita, (ainda que esta existisse), como ele próprio confessou em audiência de julgamento.
Na verdade, o arguido disse nunca ter contactado o ofendido PA ou a sua “cunhada” para aferir da veracidade das imputações constantes da notícia em causa.
Assim, teremos de concluir que o arguido não terá feito tudo aquilo que estava ao seu alcance para apurar os factos. E, com o material que tinha em seu poder, não podia ter escrito o artigo que escreveu e que fez publicar no jornal de que era director.
Com efeito, os dados objectivos que estavam em seu poder não lhe permitiam escrever de forma a lançar a suspeita de interferência do deputado PA na colocação irregular da sua cunhada professora.
Podia ter denunciado a colocação irregular de professores, criticar a forma como se processava tal colocação mas jamais tentar fazer passar a ideia que tal irregularidade provinha do aproveitamento de ser cunhada do deputado em causa.
Quanto aos factos relativos aos danos patrimoniais invocados pelo ofendido, também não logrou este fazer a respectiva prova, pois, não ficou demonstrado que tivesse sido a notícia em causa que determinou a sua não eleição no acto eleitoral seguinte para deputado.
Na verdade, como foi afirmado pelas testemunhas do pedido cível, em audiência, no acto eleitoral seguinte o ofendido ocupava o mesmo lugar nas listas do P…X, ora, não é liquido que tivesse sido colocado num lugar acima, que lhe permitisse a eleição directa, caso não ocorresse esta noticia. Tendo resultado provado que na legislatura em que desempenhou funções de deputado também só o fez por ter ocupado o lugar de outro deputado que teria ido desempenhar funções governativas.
Ora, no acto eleitoral seguinte as eleições foram ganhas pelo P…Z, assim quem formou governo foi este partido e, como foi por todos realçado, nessa eleições o P…Z teve maioria absoluta e o P...X uma quebra muito acentuada, tendo perdido mais de 30 deputados. Assim, para o ofendido ser eleito, com muito menos deputados e sem saídas para o governo, o seu lugar teria de ser praticamente de cabeça de lista ou o seguinte, o que o ofendido não provou minimamente pudesse ter acontecido.
Assim, perante este resultado, nunca seria liquido que fosse pela notícia em causa que o ofendido ficou afastado das funções de deputado.
Mas também, tendo saído outras notícias, em jornais de âmbito nacional, relativas ao caso e com o nome do ofendido, embora não tão claramente negativas para o ofendido, como saíram, é perfeitamente razoável que as mesmas também pudessem, pelos mesmos motivos, levar o seu partido a não lhe querer dar um lugar de grande destaque nas listas eleitorais.
Até porque não seria um jornal regional que teria grande importância, caso o partido o quisesse efectivamente promover a um lugar elegível. É por todos sabido que os políticos mudam frequentemente de círculos eleitorais e até de autarquias quando os partidos nisso têm interesse.
Porém, noticias, ainda que menos graves, em jornais de âmbito nacional, podem mais facilmente afectar a imagem politica do ofendido do que uma noticia na 17.ª página de um jornal regional.
Assim, o Tribunal não se convenceu que a notícia em causa causasse quaisquer danos patrimoniais ao ofendido, até porque este continua a exercer funções politicas numa Câmara que fica bem próxima do concelho em que foi publicado o jornal em causa, Nelas/Mangualde.      
As condições económicas e sociais do arguido resultaram do teor das suas declarações à falta de outros elementos de prova.
A ausência de antecedentes criminais por parte do arguido foi constatada a partir do teor do seu Certificado de Registo Criminal de fls. 969 dos autos.”


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O recorrente invoca o vício de erro notório na apreciação da prova.

No entanto, como recorrentemente acontece, confunde conceitos.

Com efeito, estamos perante o vício da al. c. do artº 410º do Código de Processo Penal[[1]] “quando se retira de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável, quando se dá como provado algo que notoriamente está errado, que não podia ter acontecido, ou quando, usando um processo racional e lógico, se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória, ou notoriamente violadora das regras da experiência comum, ou ainda quando determinado facto provado é incompatível ou irremediavelmente contraditório com outro dado de facto (positivo ou negativo) contido no texto da decisão recorrida. Mas existe igualmente erro notório na apreciação da prova quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras da experiência ou as legis artis, como sucede quando o tribunal se afasta infundadamente do juízo dos peritos” (Código de Processo Penal Anotado”, de M. Simas Santos e M. Leal Henriques, pág. 740).

O erro notório consiste num desacerto do raciocínio na apreciação das provas que ressalta de imediato patenteado numa simples leitura da decisão recorrida uma vez que as provas anunciam claramente um sentido e a decisão recorrida conclui em sentido contrário.

De uma forma linear mas abrangente, escreve-se no acórdão do STJ de 12 de Junho de 1996, processo n.º 268/96:

“Em sede de erro notório na apreciação da prova, as regras de experiência comum só podem ser invocadas quando da sua aplicação resulte, sem equívocos, a existência do aludido erro, já que a lei exige, para ser válido, enquanto motivo de anulação, que ele tenha veste de “notório”, isto é, que contra o que resulta de elementos que constem dos autos e cuja força probatória plena não haja sido infirmada ou de dados do conhecimento público generalizado, se emite um juízo sobre a verificação ou não de certa matéria de facto e se torne incontestável a existência de tal erro de julgamento sobre a prova produzida.

É o que acontece, nomeadamente, quando por forma manifesta, e sem adequada justificação, se dá como não provada matéria constante de documento com força probatória plena sem que o mesmo tenha sido arguido de falso, ou quando se afirme como existente ou inexistente um facto, que seja do conhecimento público não se ter ou se ter produzido.

Fora destas hipóteses, porém, o erro notório na apreciação da prova só pode resultar do texto da própria decisão recorrida, em virtude de o conhecimento da prova oralmente produzida em audiência se encontrar subtraído, pela sua intrínseca natureza, a qualquer reapreciação pelo tribunal de recurso.

A prova produzida tem de ser apreciada na sua globalidade, não sendo lícito contestá-la enquanto tal, com base unicamente num dos seus meios, isolados do conjunto.

São totalmente irrelevantes as considerações que os recorrentes fazem no sentido de pretenderem discutir a prova feita em julgamento e de solicitarem a este Supremo Tribunal que modifique tal prova e passe a aceitar como realidade aquilo que o interessado pretende corresponder ao sentido do que tenha resultado do aludido julgamento.”

Em suma, o vício em causa apenas se verifica quando do texto da sentença e usando um método racional e lógico de análise, se torna evidente para qualquer pessoa minimamente atenta que a conclusão a que chegou o tribunal recorrido é ostensivamente violadora das regras da experiência comum([2]).

Ora, no caso “sub judice” é evidente que o recorrente não aponta tal vício ao texto da sentença.

O que o recorrente aponta ao tribunal é um erro na apreciação da prova produzida em julgamento, que é coisa diferente.

É o que resulta claro das suas conclusões.

E o mesmo se diga quanto ao invocado vício de insuficiência para a decisão de facto.

Com efeito, a alínea a. do n.º 2 refere-se à insuficiência da matéria de facto provada para a decisão de direito, ou seja, há insuficiência da matéria de facto provada “quando da actualidade vertida na decisão em recurso, se colhe faltarem elementos que, podendo e devendo ser indagados, são necessários para se poder formular um juízo seguro de condenação ou absolvição” (Ac. do STJ de 97-05-08, Ac.s STJ V, 2, 200).

Como se diz em “Código de Processo Penal Anotado”, de M. Simas Santos e M. Leal Henriques, pág. 738, parafraseando o acórdão do STJ de 99/06/02, processo n.º 288/99, “a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada existe quando os factos provados são insuficientes para justificar a decisão assumida, ou quando o tribunal recorrido, podendo fazê-lo, deixou de investigar toda a matéria de facto relevante, de tal forma que essa matéria de facto não permite, por insuficiência, a aplicação do direito ao caso submetido a apreciação; no cumprimento do dever de descoberta da verdade material, que lhe é imposto pelo normativo do art.º 340.º do Código de Processo Penal, o tribunal podia e devia ter ido mais longe; não o tendo feito, ficaram por investigar factos essenciais, cujo apuramento permitiria alcançar a solução legal e justa. Os factos que ficaram por apurar têm, portanto, de ser factos que, num juízo de prognose, se admita virem a ser averiguados pelo tribunal a quo através dos meios de prova disponíveis e que, vindo a ser provados, determinarão ou a alteração da qualificação jurídica da matéria de facto ou da medida da pena ou de ambas”([3]).

Em suma, verifica-se este vício quando resulta evidente da leitura da sentença que a matéria de facto provada é insuficiente para fundamentar a correcta solução de direito porque faltam elementos que podiam e deviam ter sido indagados.

 Ora, mais uma vez, estamos perante um erro na qualificação jurídica que fundamenta a discordância, como também resulta claro das conclusões.

O que efectivamente está em causa é uma discordância quanto à apreciação da prova produzida em audiência, que é coisa diferente, como abaixo se explicará.


******


Entende o recorrente que não devia ter ficado provado que:

“4. Os factos imputados pelo arguido ao deputado PA, através das afirmações contidas no referido artigo, são objectivamente ofensivos da sua honra e consideração, pois ligam-no à prática de um favorecimento ilegal à professora ali referenciada – contrário às normas da colocação dos professores – e à violação dos deveres inerentes ao exercício do cargo público que o mesmo desempenhava.
5. Ao escrever e fazer publicar o referido texto, o arguido representou e conformou-se com a possibilidade de, com a sua actuação, vir a atingir o ofendido PA na sua honra e consideração, sobretudo enquanto deputado da Assembleia da República e por causa dessas funções, perante o próprio e o universo indefinido dos leitores da publicação em causa, o que efectivamente veio a acontecer.

9. Da leitura do todo conteúdo da noticia em causa poderia retirar-se a ilação de que a cunhada do deputado do P…X, PA foi ilegalmente colocada num estabelecimento de ensino graças a um favor pessoal do referido deputado, cometendo ele também, assim, uma ilegalidade.

14. O arguido ao escrever tais expressões, contextualizando-as da forma que o fez, ofendeu a honra e o bom-nome do queixoso, pondo em causa, publicamente a sua honestidade, seriedade e dignidade pessoais.

Vejamos:

Como se pode concluir da leitura do recurso, o arguido entende que resulta claro do seu escrito que não imputou ao queixoso qualquer facto susceptível de ofender a sua honra e consideração

Começaremos por dizer que a impugnação da matéria de facto, tal como resulta claro do disposto no artº 412.º n° 3 al. b), só pode proceder quando o recorrente, tendo como base o raciocínio lógico e racional feito pelo tribunal na decisão recorrida, indica provas que imponham decisão diversa, pois que, como é entendimento dominante na nossa jurisprudência, a convicção do julgador só pode ser modificada, pelo tribunal de recurso, quando a mesma violar os seus momentos estritamente vinculados, designadamente quando obtida através de provas ilegais ou proibidas, ou contra a força probatória plena de certos meios de prova, ou então quando afronte, de forma manifesta, as regras da experiência comum[[4]]([5]).

Quer isto dizer que sempre que a convicção seja uma convicção possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve acolher-se a opção do julgador, até porque é o tribunal a entidade competente para julgar e os recursos, como é jurisprudência uniforme[[6]], constituem, tão só, um remédio jurídico que visa despistar e corrigir os erros in judicando ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente[[7]].

Ora, lendo e relendo as motivações, temos necessariamente de concluir que o recorrente se esquece de apontar o erro na fundamentação do tribunal e passando por ela como se a mesma não existisse, o quer equivale a dizer que se limita a fazer o seu próprio julgamento, ou seja, o recorrente não aponta qualquer erro à fundamentação do tribunal e faz o seu próprio julgamento esquecendo que é o julgamento do tribunal que releva e que o mesmo só pode ser posto em causa e aceite pelo tribunal superior se a convicção do julgador tiver violado os seus momentos estritamente vinculados, designadamente quando adquirida através de provas ilegais ou proibidas, ou contra a força probatória plena de certos meios de prova, ou então quando afronte, de forma manifesta, as regras da experiência comum.

Só isto bastava para que a sua pretensão naufragasse.

No entanto, sempre diremos o seguinte:

A tese do recorrente assenta essencialmente na alegação que se segue:
“3 - Ora, quer na "noticia", quer na "opinião critica" que fazem parte do artigo transcrito, em qualquer momento se afirma estar o deputado PA ligado à prática de qualquer acto de "favorecimento ilegal" da professora ali referenciada. Pelo contrário, na "noticia" afirma-se que estariam presumivelmente envolvidos o secretário de estado da Administração Educativa AM e o director adjunto da DREC, AF
Quando o arguido no artigo emite "opinião critica" sobre a situação relatada na notícia, também em momento algum se refere especificamente ao deputado PA. Pois, no seguimento do artigo é perceptível que quando o arguido se refere a "peões locais", os mesmos estão identificados na notícia como sendo o secretário de estado da administração educativa e o director adjunto da DREC.
Por outro lado, quando o arguido afirma: "Senhores( as ) Professores( as), mal estarão aqueles que não tiverem cunhados deputados, não forem filhas de ministro, ou amigos de directores adjuntos", está a emitir uma opinião critica sobre a situação que se vivia no ensino - colocação de professores -, e que jamais pode ser vista ou interpretada como dirigida ao deputado PA, e muito menos que dessa afirmação possa resultar que a irregularidade da colocação da professora em causa, se deveu a interferência do referido deputado. Aliás, esta posição foi manifestada pelo arguido e transcrita na motivação do Tribunal a quo, quando aí se refere que: " O arguido apenas pretendeu chamar a atenção para a polémica situação de colocação de professores de forma ilegal".
4- Em suma, o artigo em causa, não imputa qualquer facto, mesmo sob forma de suspeita ao deputado PA ou formula sobre o mesmo qualquer juízo ofensivo da sua honra e consideração, pelo que, jamais poderiam ser dados como provados, face à prova existente os pontos de facto 4., 5., 9. e 14 da decisão aqui em crise. Impondo-se claramente a decisão contrária.”

Ora, esta alegação olvidou que o tribunal a quo fundamentou a sua decisão do seguinte modo:
“Porém, nas suas declarações [o arguido] pretendeu fazer crer que, apesar do referido teor, a notícia em causa não é ofensiva para o Ofendido PA, pois apenas pretende chamar a atenção para a polémica situação de colocação de professores de forma irregular. Afirmou, ainda, que a sua notícia vinha na sequência de outras notícias, de outros órgãos de comunicação social, de carácter nacional.
Ora, quanto ao primeiro aspecto, o Tribunal não conseguiu vislumbrar a bondade de tal interpretação da referida noticia.
Com efeito, sendo o arguido licenciado em Filologia Românica, tendo o mestrado em Literaturas Românicas e estando a concluir o doutoramento em Literatura, melhor do que ninguém consegue perceber o alcance das palavras que escreve, as interpretações legitimas que delas e do seu contexto podem ser retiradas pelos diferentes leitores de um jornal.
Não podendo deixar de saber que a forma como escreveu o seu artigo seria passível de ser interpretada como aludindo, sob a forma de suspeita, a uma irregular intervenção por parte do deputado em causa para obter um favor ilegítimo para a colocação de uma sua cunhada como professora num determinado estabelecimento de ensino.
(…)
O arguido notoriamente quis ir mais longe, associando a irregularidade da colocação da referida professora ao facto de ser cunhada de um deputado, daí ter utilizado a expressão: “Senhores (as) Professores (as), mal estarão aqueles que não tiverem cunhados deputados, não forem filhas de ministro, ou amigos de directores adjuntos da DREC. Para esses o processo é penoso, improfícuo, moroso e complicado… muito complicado mesmo!”
Daqui sabia o arguido, claramente, que poderia dar azo à interpretação de que para a professora em causa, por ser cunhada do deputado referido na noticia, o ofendido PA, o processo da sua colocação não foi penoso, nem improfícuo, nem moroso e nem complicado. Tendo mesmo sido irregular. Ora, daqui também poderiam resultar interpretações no sentido de imputar tal irregularidade à interferência do referido deputado, embora a noticia não o afirmasse expressamente, permitia uma tal interpretação. Facto que o arguido, tendo as habilitações literárias que tem, não podia deixar de saber.
“(…)
A convicção do Tribunal assentou, também, no depoimento da testemunha LA que fazia parte do corpo redactorial do Jornal onde a notícia foi publicada, a qual prestou um depoimento coerente e objectivo, merecendo credibilidade do Tribunal.
Referiu que a notícia em causa foi publicada no interior do jornal, sem grande destaque, com pequena dimensão. Confirmou que o jornal em causa não tinha capacidade para fazer investigação e, por isso, baseavam-se em notícias de outros jornais nacionais. Contudo, foi sincero ao dizer não ter lido as noticias que sobre o assunto saíram noutros jornais e daí não poder afirmar se eram ou não iguais a que está em causa nestes autos.
Sendo uma testemunha de defesa e amigo do arguido, foi objectivo e sincero quando afirmou que na referida noticia há claramente uma insinuação entre a irregularidade e a posição do deputado PA. Acrescentando, há uma insinuação, uma dúvida por detrás da notícia que pudesse ter existido uma cunha do deputado para a colocação da professora em causa.”

Ora, porque passou pela fundamentação do tribunal como se a mesma não existisse, a sua tese não a rebate e muito menos a põe em causa porque a mesma se estriba nas regras da experiência comum e que têm a sua pedra de toque no facto de o arguido ser licenciado em Filologia Românica, ter o mestrado em Literaturas Românicas e estar a concluir o doutoramento em Literatura, ou seja, como diz o tribunal, “melhor do que ninguém consegue perceber o alcance das palavras que escreve, [e] as interpretações legitimas que delas e do seu contexto podem ser retiradas pelos diferentes leitores de um jornal”.

Por tudo isto, seria quase impossível que a conclusão do tribunal fosse a que pretende o recorrente.

Aliás, talvez por reconhecer esta “impossibilidade” é que o recorrente fez o seu próprio julgamento e se demitiu de apontar o erro do tribunal.

Acrescentaremos ainda um ponto à sustentabilidade da posição do tribunal:

Se, como diz o recorrente, nunca esteve no seu espírito apontar qualquer “irregularidade” à conduta do queixoso, porque razão identifica a professora S como cunhada do deputado PA num artigo em que pretende demonstrar que a colocação da mesma foi ilegal e que fora apenas fruto de influências políticas?

É certo que não diz, preto no branco, que tais influências tiveram a mão do deputado, mas é evidente que deixa no ar a insinuação de que os “peões locais” actuavam de acordo com instruções ou pedidos vindos de quem os podia influenciar.

De qualquer modo, uma coisa é certa: se, como diz, estava longe das suas cogitações imputar ao queixoso qualquer intervenção no caso em análise, não faz qualquer sentido que tenha feito referência ao deputado PA visto que, como muito bem sabe, quanto mais não seja pelos conhecimentos que lhe advêm da sua formação académica, qualquer leitor de imediato o associaria a pressões para colocação da cunhada.

Aliás, é sintomático que em sede de recurso, o recorrente nunca explique a razão que o levou a identificar a professora  S como cunhada do deputado PA e não apenas, como seria normal para quem nem sequer estaria a pensar nele quando escreveu o artigo, como a professora S.

Diremos ainda o seguinte: ao contrário do quer afirma o recorrente, a insinuação de que o deputado PA teria contribuído para a colocação ilegal da S é demasiado negativa para que possa ser considerada como meramente capaz de atingir a sua susceptibilidade pessoal e por isso insuficiente para integrar o conceito do artº180º, nº1 do Código Penal: é que um deputado da nação, como qualquer outro membro de órgão de soberania, tem, em relação aos demais cidadãos, uma suplementar obrigação de honestidade, integridade e probidade, que é incompatível com comportamentos de compadrio e de promiscuidade que necessariamente põem em causa as exigências do lugar que ocupa e o tornam imerecedor de representar o povo que o elegeu.

Acresce que é incompreensível a afirmação de que “a opinião do arguido, expressa no artigo em causa, enquadra-se no âmbito da crítica objectiva, o que desde logo, cai fora da tipicidade de incriminações como a difamação”.

Com efeito, defendendo no recurso que no seu artigo nada é imputado ao queixoso, não faz qualquer sentido defender que lhe fez uma crítica objectiva e que por isso não deve ser punido.

São argumentos incompatíveis, como se compreende!.

Por isso, uma vez que não vislumbramos a mínima afronta às regras da experiência comum e que se mostra perfeitamente lógico e razoável o raciocínio que levou a que o tribunal a quo tenha dado como provada a factualidade constante da sentença, teremos que concluir que nenhuma censura merece a fundamentação fáctica da sentença e consequentemente nada há nela a alterar.

Assim sendo e uma vez que o enquadramento jurídico nela efectuado não é posto em causa e o mesmo acontece com a medida da pena — a pretendida absolvição baseia-se na alteração fáctica pretendida —, passaremos a apreciar o recurso na vertente respeitante ao quantum indemnizatório.

Começaremos por dizer que também aqui o recorrente pretende a absolvição com base na supra referida alteração factual.

Uma vez que decaiu nesta pretensão, está prejudicado o conhecimento do recurso nesta parte.

No entanto, admitindo que o seu entendimento não merecesse a concordância desta Relação, o arguido vem dizer que o montante fixado se mostra “exorbitante e excessivo, violando os artºs 494º e 496º do Código Civil”.

Aqui concordamos com o recorrente.

Explicando:

O tribunal decidiu “condenar o arguido P e a demandada civil, Sociedade “O Z… Lda.”, a pagarem solidariamente ao demandante civil PA a quantia de € 10 000,00 (dez mil euros), a título de indemnização civil [danos não patrimoniais], acrescida de juros de mora à taxa legal, contados desde a notificação da sentença até integral e efectivo pagamento.”

Ora, este montante mostra-se claramente desajustado perante a factualidade dada por provada.

Vejamos:

Os danos não patrimoniais são determinados, por força do disposto no art.º 129º, n.º 1 do Código de Processo Penal, de acordo com o nº 3 do art.º 496.º do C. Civil e o seu quantum é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção as circunstâncias referidas no art.º 494.º do mesmo diploma (o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso) devendo ter-se ainda em conta também as regras de boa prudência, a justa medida das coisas e a ponderação das realidades da vida.

Também devem ser tomadas em consideração as soluções jurisprudenciais para casos semelhantes.

Uma vez que não são avaliáveis em dinheiro visto incidirem em bens como a vida, a saúde, a liberdade, a honra, o bom nome, a beleza, etc., o seu ressarcimento assume uma função essencialmente compensatória, embora sob a envolvência de uma certa vertente sancionatória[[8]].

Determina ainda a lei que na fixação da indemnização por danos não patrimoniais se deve atender aos danos que pela sua gravidade, aferida em termos objectivos, mereçam a tutela do direito (artigo 496º, n.º 1, do Código Civil).

A apreciação da gravidade do referido dano, embora tenha de assentar, como é natural, no circunstancialismo concreto envolvente, deve operar sob um critério objectivo, num quadro de exclusão, tanto quanto possível, da subjectividade inerente à particular sensibilidade humana[[9]].

No caso dos autos o tribunal “a quo” atribuiu por este tipo de danos uma compensação de € 10.000.

Como se diz no AcSTJ de 27 de Novembro de 2007[[10]], “a forma de medir a gravidade do dano não patrimonial fica sempre, por conseguinte, dependente do prudente arbítrio do julgador, a quem se pede que avalie o quantum necessário para proporcionar ao lesado meios económicos que, de algum modo, o compensem da lesão sofrida”.

Ora, sendo indubitável que o padecimento resultante da ofensa provocada pelo arguido ao demandante merece a tutela do direito, é também manifesto que a matéria de facto apurada não permite fundamentar uma compensação de € 10000,00 para os danos morais.

Com efeito, com relevância para o apuramento da indemnização por danos morais, ficou provado, para além da prática do crime, o seguinte:
“11. O ofendido é uma pessoa bem considerada entre os seus pares, não existindo conhecimento que se tenha deixado influenciar ou tivesse influenciado fosse quem fosse para obter para si ou para a referida cunhada favores pessoais ou profissionais.
12. Ao tempo, o ofendido PA exercia as funções de deputado da Assembleia da República.    
13. As referidas expressões no contexto que resulta de todo o referido artigo escrito pelo arguido ofenderam o demandante PA.
15. O ofendido sentiu-se triste e revoltado ao ler o artigo em causa e saber que outras pessoas também o leram.
16. A edição do jornal em causa, naquele dia, teve uma tiragem de 4 000 exemplares.
17. Nos bastidores da Assembleia da República, entre os deputados de todas as forças politicas, circulou uma fotocópia com o conteúdo do artigo em causa.
18. O ofendido foi confrontado por diversas pessoas com o conteúdo da noticia, precisando de defender a sua honra junto das mesmas.
19. O ofendido evitou frequentar determinados lugares, para não ser confrontado com o teor da notícia.
23. O salário do arguido é de 2 000 euros líquidos.
24. A esposa do arguido é jurista do Ministério d…, auferindo um salário mensal de 1 500 euros.
25. Vive em casa própria, pagando uma prestação mensal ao Banco no valor de 1 200 euros.
26. O arguido é uma pessoa respeitada e considerada no seu meio social e académico.”

Perante esta factualidade colhe-se que o demandante teve sofrimento importante com a ofensa (visto ter-lhe sido imputado um comportamento violador dos mais elementares deveres de um deputado) mas que esta não lhe trouxe contratempos ou problemas para além do que seria de esperar, resultando até que os mesmos se mostram algo esbatidos nos seus efeitos.

Por isso, afigura-se-nos adequada uma indemnização de € 5000,00.

Será assim reduzido para este montante o quantum indemnizatório (aplicável também à demandada civil por força do disposto no artº 402º, nº 2, alínea b.).

***

Em face do exposto, acorda-se em:

1) Julgar improcedente o recurso na parte crime

2) Julgar parcialmente procedente o recurso na parte cível, fixando-se em € 5000,00 o montante da indemnização a pagar

*

Fixa-se em 5 UC a taxa de justiça a pagar pelo recorrente.

Custas cíveis, em ambas as instâncias, na proporção do vencido.

*

Coimbra,


[1] Diploma a que pertencerão, doravante, todos os normativos sem indicação da sua origem
([2]) Neste sentido, cita-se ainda o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 97-07-09, processo n.º 562/97), cujo sumário é o seguinte 1 – O erro notório na apreciação da prova, previsto no art.º 410.°, n.º 2, a!. c), do C.P.P., não reside na desconformidade entre a decisão de facto do julgador e aquela que teria sido a do próprio recorrente. 2 – Tal erro só existe quando, do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, resulte por demais evidente a conclusão contrária àquela a que chegou o tribunal. (cfr. Código de Processo Penal Anotado de Simas Santos e Leal-Henriques, II Volume, 2ª edição, pág. 778) 
([3]) Em complemento e por serem linearmente claros, reproduzimos os sumários dos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Maio de 1998 e de 18 de Novembro de 1998 (processos n.º 310/98 e 855/98), dizendo-nos o primeiro que “ só existe insuficiência da matéria de facto provada para a decisão quando o tribunal deixa de investigar, podendo fazê-lo, toda a matéria de facto relevante, de tal forma que os factos declarados provados não permitam, por insuficiência, a aplicação do direito ao caso que foi submetido à apreciação do julgador” e o segundo que “a insuficiência da matéria de facto para a decisão, como vício previsto pela al. a) do n.º 2 do art.º 410.°. do C.P.P. verifica-se quando a matéria de facto provada é insuficiente para fundamentar a decisão de direito. E só existe se o tribunal deixar de investigar o que devia e podia, tornando a matéria de facto insusceptível de adequada subsunção jurídico-criminal, pressupondo a existência de factos constantes dos autos ou derivados da causa que ainda seja possível apurar, sendo este apuramento necessário para a decisão a proferir”.
([4]) Como se pode ler no Acórdão da Relação do Porto de 17-9-2003 “(…) o recurso da matéria de facto não se destina a postergar o princípio da livre apreciação da prova, que tem consagração expressa no art. 127.º do C.P.P. A decisão do Tribunal há-de ser sempre uma “convicção pessoal até porque nela desempenham um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v.g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais” (cfr. Prof. Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, vol. I, de. 1974, pág. 204). .

([5]) Como se diz no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Julho de 2006, www.stj.pt, com este normativo “visou-se, manifestamente, evitar que o recorrente se limitasse a indicar vagamente a sua discordância no plano factual e a estribar-se probatoriamente em referências não situadas, porquanto, de outro modo, os recursos sobre a matéria de facto constituiriam um encargo tremendo sobre o tribunal de recurso, que teria praticamente em todos os casos de proceder a novo julgamento na sua totalidade. Terá, pois, de se ir para uma exigência rigorosa na aplicação destes preceitos”.
[6] Entre outros, v. Acs STJ de 20 de Novembro de 2008, de 29 de Outubro de 2008, de 15 de Outubro de 2008 e de 14 de Maio de 2008 (todos em www.dgsi.pt]
[7] «(…) O julgamento em 2.ª instância não é o da causa, mas sim do recurso e tão-só quanto às questões concretamente suscitadas e não quanto a todo o objecto da causa, em que estão presentes, face ao Código actual, alguns apontamentos de imediação (somente na renovação da prova, quando pedida e admitida) e da oralidade (através de alegações orais, se não forem pedidas e admitidas alegações escritas.» (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 59/06, de 18/01/2006 – ACS. Do Tribunal Constitucional, 64.º Vol., p. 399)
[8] À indemnização por danos não patrimoniais tem sido atribuída uma natureza acentuadamente mista, explicando o Professor Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, 10ª Edição, pág. 608, que “por um lado, visa reparar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada; por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente”
[9] Como dizem Pires de Lima e Antunes Varela in “Código Civil Anotado”, Vol. I, 3ª Edição, pág. 473, “a gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada”, podendo “citar-se como possivelmente relevantes a dor física, a dor psíquica resultante de deformações sofridas (...), a ofensa à honra ou reputação do indivíduo ou à sua liberdade pessoal, o desgosto pelo atraso na conclusão dum curso ou duma carreira”, mas já não justificam a indemnização por danos não patrimoniais “os simples incómodos ou contrariedades”
[10]http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/626166b7045ca48e802573d1003bec2b?OpenDocument