Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
93148/23.0YIPRT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FALCÃO DE MAGALHÃES
Descritores: INJUNÇÃO
DOMICÍLIO CONVENCIONADO
NOTIFICAÇÃO DO REQUERIDO POR CARTA REGISTADA COM AVISO DE RECEPÇÃO
AVISO ASSINADO POR TERCEIRO
Data do Acordão: 04/09/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE CINFÃES
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 4.º; 12.º, 1 E 2 E 16.º, 2 DO DL 269/98, DE 1/9
ARTIGOS 139.º, 5; 195.º, 1; 231.º, 1 E 2; 233.º E 245.º, A), DO CPC
Sumário:
Compete ao requerido em processo de injunção, a alegação e prova de que a notificação não lhe foi entregue pela pessoa a quem foi entregue a carta de notificação para dedução de oposição à injunção
Decisão Texto Integral:
*
Relator: Falcão de Magalhães
1.º Adjunto: Des. Sílvia Pires
2.º Adjunto: Des. Luís Ricardo

Apelação nº 93148/23.0YIPRT.C1
 
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra1:
 
I - Relatório:
A) – 1) – A “H... Stc, S.A.”, com sede em ..., apresentou, em 18-08-
2023, requerimento de injunção, no Balcão Nacional de Injunções (BNI), contra
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AA, peticionando o pagamento da quantia global de 10 734,34 €, a esta respeitando, € 6 909,89 de capital, € 3 671,45 de juros de mora e 153,00 € referentes a taxa de Justiça paga.
Nesse requerimento, à frente da expressão “Domicílio Convencionado?”, escreveu-se “Não”.
Alegou-se, em síntese, que o capital peticionado respeitava a dívida resultante de contrato de mútuo definitivamente incumprido pela Requerida, enquanto mutuária.

2) - Procedeu-se à notificação da Requerida mediante carta registada com aviso de recepção, dirigida para a morada “Lugar ... ... ... - ...”, A requerida foi notificada por carta registada com aviso de recepção, que foi assinado por terceiro, devidamente identificado como «BB», em 14-09-2023.

3) - Dessa notificação constava, entre o mais, que “…os 15 dias para reagir ao pedido de injunção apresentado contra si começam a contar no dia a seguir à assinatura do aviso de receção desta notificação.”;

4) - Uma vez que o aviso de recepção foi assinado por terceiro, a Secretaria do BNI, embora que no dia 28/9/2023, enviou carta registada à Requerente, nos
 
termos do artº 233º do NCPC, constando desta, entre o mais:
«[…] - comunica-se que, por carta registada com aviso de recepção recebida em * 14-09-2023 *, pela pessoa cuja assinatura consta do mesmo, conforme imagem reproduzida no final deste documento, foi o(a) destinatário(a) notificado para, a partir daquela data, no âmbito da injunção acima identificada, para o seguinte: 
O requerente acima identificado apresentou no Balcão Nacional de Injunções um requerimento de injunção, onde Vª. Ex.ª figura como requerido (devedor), solicitando que lhe seja pago o montante de € 10734.34, correspondente à quantia pedida, acrescida da taxa de justiça por ele paga (…) (…)

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Fica, pois, por este meio notificado de que tem o prazo de 15 dias* para: a) Pagar** ao requerente o montante por este solicitado; ou b) Deduzir oposição a essa pretensão, caso em que o Balcão Nacional de Injunções remeterá os autos à distribuição no tribunal competente.
Faz-se notar, no entanto, que a dedução de oposição cuja falta de fundamento não deva ser ignorada por si determina a condenação – na sentença que vier a ser proferida na acção declarativa que se lhe seguir – em multa de valor igual ao dobro da taxa de justiça devida nessa acção.
Para apresentar oposição será obrigatória a constituição de mandatário judicial, nos termos do disposto no n.º 1, alínea a), do artigo 40.º e artigo 629.º, ambos do Código de Processo Civil, e artigo 44.º, n.º 1, da Lei 62/2013, de 26 de Agosto. […]».

5) - Nessa carta, que a Requerida recebeu, fez-se constar, entre outras, uma nota com o seguinte teor: “*- O prazo acima indicado corre continuadamente a partir de 14-09-2023, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, que decorrem de 22 de Dezembro a 3 de Janeiro, do domingo de Ramos à segunda -feira de Páscoa e de 16 de Julho a 31 de Agosto . Se o prazo terminar
 
em dia em que os tribunais estiverem encerrados, o seu termo transfere-se para o primeiro dia útil seguinte.” (o sublinhado é nosso).

6) – A Requerida, por intermédio de Ilustre Advogado, ofereceu Oposição em 12/10/2023, invocando insuficiência da alegação de factos no requerimento de injunção e a prescrição do crédito, referindo, quanto à sua notificação, tão-só, o seguinte: “(…) notificada, em 28/09/2023, da injunção instaurada contra si no processo à margem identificado, para reagir ao pedido de injunção, vem opor-se à mesma, dizendo o seguinte:
1 .Só teve conhecimento da injunção pela notificação de 28/09/2023, dado que a pessoa que assinou o aviso de receção da primeira tentativa de notificação nada lhe comunicou, tendo sido, assim, frustrada a notificação. (…).

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Não ofereceu qualquer prova.

7) – Em 16/10/2023, a Sra. Escrivã da Secretaria do Balcão Nacional de Injunções, consignou o seguinte:
“Atenta a questão suscitada no documento/oposição apresentado pela requerida em 12-10-2023 (a qual poderá configurar um alegado justo impedimento), ato para o qual não tem esta secretaria competência legal para decidir, vai o procedimento de injunção ser enviado para distribuição nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro. “.

8) - Com data de 18/10/2023, a Secretaria do BNI enviou notificação ao Ilustre Advogado da Requerida, com o seguinte teor:
“Assunto: Notificação do envio à distribuição por outros motivos (16º, nº. 2).
Fica por este meio notificado de que o procedimento de injunção acima identificado vai ser enviado à secretaria de Tribunal Judicial da Comarca de Viseu - Unidade Central de ... para distribuição, cujo resultado será publicado no sítio da Internet com o endereço http://www.citius.mj.pt, onde também poderá consultar a legislação aqui invocada.”.

*
 
B) - O procedimento veio a ser distribuído no Juízo de Competência Genérica ..., onde, em 12/1/2024, a Mma. Juiz  proferiu a seguinte decisão:
«[…] Tendo, então, a requerida sido notificada, em 14-09-2023, a oposição deduzida em 12-10-2023 é extemporânea, justificando que se confira força executiva à petição inicial conforme será oportunamente cuidado.
Custas do incidente a cargo da requerida, fixando-se em 2UC a respetiva taxa de justiça. […]».
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II – A) -1) - Desta decisão recorreu a Requerida, tendo o respectivo recurso sido admitido como Apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
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2) - Notificadas, na sequência do despacho de 24/11/2023, Requerente e Requerida vieram oferecer requerimentos onde nada referem quanto à notificação efectuada à Requerida pelo BNI e por esta abordada na Oposição. *
B) Na alegação de recurso a Requerida/Recorrente ofereceu as seguintes conclusões:
«1ª - A requerida/recorrente foi advertida mediante notificação, de 04/10/2023, de ter sido notificada da injunção em terceira pessoa, no dia 14/09/2023.
2ª-No dia 12/10/2023, deduziu oposição à injunção.
3ª-Após a distribuição, os autos deviam prosseguir os seus posteriores termos em conformidade com o disposto nos artigos 3° e 4° do Regime dos Procedimentos a que refere o artigo 1° do Decreto-Lei 269/98, de 1 de setembro, ex vi do disposto no artigo 17° do mesmo Regime.
4ª-O Tribunal a quo não deu cumprimento ao disposto no referidos preceitos, tendo indeferido, em vez disso, a oposição à injunção, por a ter julgado extemporânea.
 
5ª- Por lapso manifesto, que se prova, a requerida, na sua primeira intervenção nos presentes autos, no seu requerimento de 12/10/2023, alegou ter sido notificada da presente injunção em terceira pessoa, em 28/09/2023.
6ª Porém, na realidade foi notificada somente no dia 04/10/2023, pelas
13h01, como se pode verificar, introduzindo o código de envio RG ...PT, em ctt.pt/particulares/index - seguir objeto.
7ª-No seu referido requerimento de oposição, que deduziu no dia 12/10/220, alegou que somente, nessa data, tomou conhecimento da injunção, em virtude da pessoa que recebeu a primeira notificação nada lhe ter comunicado.
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8ª-Não foi acordado domicílio convencionado entre as partes, como resulta do requerimento de injunção.
9ª-A advertência à requerida da notificação efetuada em terceira pessoa, em 04/10/2023, verificou-se após terem decorrido já 20 dias, e não no prazo de 2 dias úteis, nos termos do artigo 233° do Código de Processo Civil. 10ª-A requerida deduziu, tempestivamente, oposição no prazo de 8 dias, no referido dia 12/10/2023, após ter sido notificada de que tinha o prazo de 15 dias para praticar o ato.
11ª-A notificação via postal não foi endereçada nem para a morada da requerida, onde reside há mais de uma década, na Rua ..., Casa ...0, ... ..., ..., que consta da procuração forense junta aos autos pela requerida com o seu requerimento de oposição à injunção, nem para o seu local de trabalho.
12ª-Assim, no caso vertente, não ocorre a presunção legal, iuris tantum, contemplada nos artigos 225°, n° 4 e 228°, n°s 1 e 2 do Código de Processo Civil, como é o entendimento sufragado na nossa doutrina e jurisprudência. 13ª-Houve, assim, falta de notificação da requerida, a qual na primeira
 
intervenção que pôde ter nos autos, a invocou legitima e eficazmente. 14ª-Na mera hipótese de se considerar assim não ser -mas é -,importa referir, ainda, que o Tribunal teria de conhecer da nulidade da notificação levada a efeito em terceira pessoa, por não constar dessa notificação que ao prazo de 15 dias acrescia a dilação de 5 dias, dado ter sido a notificação realizada em pessoa diversa da requerida, nos termos estabelecidos no artigo 245°, n° 1, al. a) do Código de Processo Civil.
15ª-E assim é, por força do disposto no n° 1 do artigo 200° do Código de Processo Civil, tendo em conta, quanto ao prazo, a nulidade contemplada na 2ª parte do n° 2 do artigo 191°, com a interpretação que lhe deve ser dada, em conjugação com o n° 3 do mesmo diploma.
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16ª- Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 17°, 3° e 4° do Regime dos Procedimentos a que se refere o artigo 1° do Decreto-Lei 269/98, de 1 de setembro; 233°; 225°, n° 4; 228°, n°s 1 e 2; 245°, n° 1, al a); 200°, n° 1; 191°, 2a parte do n° 2 e n° 3 do Código de Processo Civil. […]».
Terminou assim: «[…] deve o presente recurso obter provimento, e, consequentemente, revogar-se a douta sentença recorrida, e ordenar-se que os autos prossigam os ulteriores trâmites legalmente previstos. […]». *
C) - Em face do disposto nos art.ºs 635º, nºs 3 e 4, 639º, nº 1, ambos do novo Código de Processo Civil2, o objecto dos recursos delimita-se, em princípio, pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do conhecimento das questões que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 608º, n.º 2, “ex vi” do art.º 663º, nº 2, do mesmo diploma legal.
Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja prejudicada pela solução que tiver sido dada a outra que antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que, com as “questões” a resolver se não confundem
 
os argumentos que as partes esgrimam nas respectivas alegações e que o Tribunal pode ou não abordar, consoante a utilidade que veja nisso (Cfr., entre outros, Ac. do STJ de 13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º 07B3586 3).
Assim, a questão que importa resolver é a de saber se foi acertado tomar a de considerar extemporânea a Oposição à injunção, deduzida pela Requerida em 12-10-2023.
* III - Fundamentação:

A) – O circunstancialismo processual e a factualidade a considerar, pertinente à sindicância da decisão recorrida, estão consignados em I “supra”;

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B) – A justificação da decisão recorrida encontra-se espelhada, na sua essência, nos trechos da sentença que ora se transcrevem:
«[…] A requerida alegou que só foi notificada em 28/09/2023 «dado que a pessoa que assinou o aviso de receção da primeira tentativa de notificação nada lhe comunicou».
(...)
A situação em apreço diz respeito a um procedimento de injunção instaurado para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15.000,00, destinado em concreto ao pagamento de umas prestações no âmbito de um contrato de mútuo, sendo a requerida uma pessoa singular.
Por consequência, aplicam-se as regras e formalidades previstas no artigo 12° n° 1 e n° 2.
A requerida foi notificada por carta registada com aviso de receção, que foi assinado por terceiro, devidamente identificado como «BB», em 1409-2023.
 
Nessa medida, a secretaria deu cumprimento ao disposto no artigo 233.° do Código de Processo Civil, que sob a epígrafe «Advertência ao citando, quando a citação não haja sido na própria pessoa deste», determina que, nestes casos, é enviada carta registada ao citando, no prazo de dois dias úteis, comunicandolhe: (a) A data e o modo por que o ato se considera realizado; (b) O prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta; (c) O destino dado ao duplicado; e (d) A identidade da pessoa em quem a citação foi realizada. *
No caso, a notificação do requerimento de injunção não foi efetuado na pessoa da requerida, o que se configura enquadrável no artigo 12.°, n.°2, do mencionado decreto lei, por via da remissão para os artigos 231.° e 232.°,
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ambos do Código de Processo Civil, em que se prevê a citação com hora certa em pessoa diversa, com as cautelas aí estabelecidas.
Nesta medida, haverá igualmente que dar cumprimento ao disposto no artigo 233.°, tal como foi feito pela secretaria.
Conforme decorre da lei, o prazo de defesa não deixa de começar a contar desde a data da assinatura do aviso de receção por terceiro, não relevando para o inicio e contagem do prazo a receção da carta registada de advertência, dado que esta não consubstancia uma segunda ou dupla citação, mas antes uma “diligência complementar e cautelar” (Alberto dos Reis in Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 2°, 648.) de “prever uma espécie de confirmação da citação oportuna e validamente realizada, em casos de presumível menor segurança e certeza na consumação do efetivo conhecimento pelo réu dos elementos essenciais do ato” (Lopes do Rego in Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, 2a ed., Almedina, Coimbra, 2004, 231).
Contanto haja sido cumprida esta última formalidade, a verdade é que a advertência referida neste preceito não foi remetida no prazo de dois dias úteis, como é exigido, mas com uma dilação superior: a notificação para dedução de
 
oposição ocorreu em 14-09-2023 (data da assinatura do aviso de receção por parte do terceiro) e a data do envio da advertência a que alude o artigo 233.°, do Código de Processo Civil é de 28-09-2023.
Contudo, não podemos esquecer que, nessa última advertência, expressamente é referido que o prazo para dedução de oposição se iniciou na data da assinatura daquele aviso de receção, ou seja, em 14-9-2023.
Face a esta situação a requerida apresenta oposição, em 12-10-2023, alegando apenas que «só teve conhecimento da injunção pela notificação de 28-09-2023, dado que a pessoa que assinou o aviso de receção da primeira tentativa de notificação nada lhe comunicou». Entendimento que é contrariado pela simples carta de advertência que lhe foi
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comunicada no dia 28-09-2023, onde expressamente, lhe é referido que o prazo de 15 dias «continuadamente a partir de 14-09-2023, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, que decorrem de 22 de Dezembro a 3 de Janeiro, do domingo de Ramos à segunda -feira de Páscoa e de 16 de Julho a 31 de Agosto. Se o prazo terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, o seu termo transfere-se para o primeiro dia útil seguinte».
(…)
verifica-se que a falta de citação dependia da demonstração pela requerida, em concreto, de (i) não ter chegado a carta para citação postal ao conhecimento da destinatária/citanda e de (ii) tal situação não lhe ser imputável.
Cabia, então, à requerida demonstrar o que alegou no sentido de a notificação não lhe ter sido entregue pelo recetor (pessoa que assinou o AR) - o que não se verificou in casu, pois apenas alegou e não juntou qualquer prova.
Donde que, indemonstrada a omissão de entrega da notificação, não pode concluir-se pela falta de citação, antes havendo de presumir-se a oportuna entrega à destinatária e, em conformidade, consumada a citação.
 
Tendo, então, a requerida sido notificada, em 14-09-2023, a oposição deduzida em 12-10-2023 é extemporânea, justificando que se confira força executiva à petição inicial conforme será oportunamente cuidado. […]»
Ora, em nosso entender, bem concluiu o Tribunal, que a Oposição era extemporânea, carecendo a Recorrente de razão quanto à argumentação que tece para contrariar tal conclusão, assim, como, em particular, quanto à “questão prévia” que coloca, e quanto à dilação de cinco dias que invoca.
Vejamos.
Considerando o BNI ser extemporânea a Oposição da Requerida que foi apresentada em 12-10-2023, ainda que esta apenas tenha alegado, que “…só teve conhecimento da injunção pela notificação de 28/09/2023, dado que a

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pessoa que assinou o aviso de receção da primeira tentativa de notificação nada lhe comunicou, tendo sido, assim, frustrada a notificação…”, não tendo, propriamente, invocado a nulidade da sua citação/notificação, poderia perspectivar-se, segundo o BNI, a invocação de um justo impedimento. Uma vez que a apreciação de um eventual justo impedimento não cabe à entidade administrativa, o BNI enviou os autos para distribuição, nos termos  do.º 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1/9, com vista  à apreciação judicial.
Sendo os autos distribuídos ao Juízo de Competência Genérica ..., cabia à Requerida, aí arguir tudo aquilo que, só agora, em sede de recurso, vem alegar, e cujo sucesso, como veremos, carecia que, na 1ª instância provasse que a notificação não lhe tinha sido entregue pelo recetor, só dela sabendo quando da recepção da carta a que alude o artº 233º e que arguisse a nulidade - que cai na previsão do artº 195º, nº 1, do NCPC - consubstanciada no envio, pela secretaria do BNI,  dessa carta, muito para além do prazo de dois dias estabelecido nesse artigo, sendo que tal nulidade não é do conhecimento oficioso.
 
É como se diz na síntese conclusiva da decisão sumária proferida em 13/10/2015 por esta Relação de Coimbra (Apelação nº 211/13.9TBVZL.C1 – Cons. Manuel Capelo)4:
«[…] - Nos casos de citação realizada em pessoa diversa do citando, nos termos do art. 228 nº2 do CPC, a circunstância de a lei determinar que esta citação se considera efectuada no dia em que se mostra assinado o aviso de recepção e na própria pessoa do citado, determina que o prazo da contestação se inicie nesse momento;
- Para poder evitar que o prazo da contestação se inicie nesse momento terá o réu/citado de elidir a presunção fixada no art. 230 nº1 parte final e, com esta elisão, obter a certificação de que não houve citação por não ter tomado conhecimento de tal acto (da citação) por facto que não lhe é imputável, nos termos do art. 188 nº1 al.e) do

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CPC;
- Pode ainda, eventualmente, o réu evitar que o prazo de contestação se inicie com a assinatura do aviso de recepção pelo terceiro que recebeu a carta, quando argua a nulidade (nos termos do art. 195) do envio da carta a que alude o art. 233, por remessa pela secretaria fora do prazo de dois dias fixado nesse preceito ou por falta de indicação dos elementos aí prescritos;
- Esta nulidade, por não ser de conhecimento oficioso, não pode ser conhecida pelo Tribunal da Relação se não tiver sido antes arguida perante o Tribunal de primeira instância e aí decidida […]».
A Recorrente também não tem razão quando invoca que na notificação se omitiu indevidamente que ao prazo de 15 dias acrescia a dilação de  5 dias, dado ter sido a notificação realizada em pessoa diversa da requerida, nos termos estabelecidos no artigo 245º, nº 1, al. a) do Código de Processo Civil, já que essa dilação não é aplicável, pois estipula no artº  4º do DL n.º 269/98, de 01 de Setembro, que “À contagem dos prazos constantes das disposições do regime aprovado pelo presente diploma são aplicáveis as regras do Código de Processo Civil, sem qualquer dilação.”. 
 
O Tribunal Constitucional - ACÓRDÃO N.º 20/2010 (Processo n.º 638/2008, da 3.ª Secção)5 -, em 13/1/2010, pronunciando-se quanto a esta norma, expressou o seguinte entendimento: 
«[…] Ao determinar que, no regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias de pequeno montante emergentes de contratos, os prazos se contassem de acordo com as regras fixadas pelo Código Civil mas sem qualquer dilação, o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 269/98 procurou ainda cumprir, em equilíbrio com o sistema geral que o legislador aqui havia instituído, finalidades de simplificação e celeridade processual que se entenderam ser justificadas face ao tipo de litigiosidade em causa. À luz do disposto pelo artigo 20.º da CRP, tais finalidades correspondem à prossecução de interesses e valores constitucionais que vinculam o

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legislador tanto quanto o vincula a obrigação de respeitar, na modelação das normas de processo, a “proibição da indefesa”.
(…)
não é, evidentemente, arbitrária ou não fundada a diferença de regime que o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 269/98 institui, quanto ao modo de contagem do prazo para a contestação do réu, caso este tenha sido citado através de terceira pessoa. Tal diferença ou especialidade de regime, pelo contrário, tem a fundamentá-la uma razão material bastante (claramente decorrente da exposição de motivos contida no preâmbulo do Decreto-Lei), razão essa congruente com a prossecução, por parte do legislador ordinário, de interesses e valores constitucionais dotados, como já vimos, de particular relevância. Tanto basta para que se conclua que, também face ao parâmetro contido no artigo 13.º da CRP, não merece a norma sob juízo qualquer censura por parte do Tribunal. […]».
Ora, a Requerida foi notificada da injunção em terceira pessoa, no dia 14/09/2023, iniciando-se em 15/09/2023, o prazo de 15 dias para deduzir Oposição, prazo esse que terminou em 29/9/2023, ou, com multa, caso se
 
admita a aplicação do artº 139º, nº 5, do NCPC, no dia 4/10/2023, pelo que não é de admitir, por extemporaneidade, a Oposição apresentada em 12/10/2023. Assim, na sentença recorrida, sem infracção das disposições legais que a Apelante diz terem sido violadas, decidiu-se correctamente.
A Apelação improcede, pois, sendo de confirmar a decisão recorrida.
* IV - Decisão:
Em face de tudo o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a Apelação improcedente e confirmar a decisão recorrida. 
 
Custas pela Recorrente (artºs 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº 6, 663º, nº 2, todos do

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NCPC).
 
9 de Abril de 20246
 
(Luiz José Falcão de Magalhães) (Sílvia Maria Pereira Pires)
(Luís Manuel Carvalho Ricardo)
 
                                                 
1 Segue-se a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, respeitando-se, em caso de transcrição, a grafia do texto original.
2 Aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26/6, doravante NCPC, pois que só se utilizará a sigla “CPC” para referir o código pretérito, ou, excepcionalmente, nos casos em que transcrevemos texto onde essa sigla foi já utilizada para identificar o novo Código de Processo Civil.
3 Consultáveis no endereço http://www.dgsi.pt/jstj.nsf?OpenDatabase, endereço este através do qual poderão ser acedidos todos os Acórdãos do STJ que adiante forem citados sem referência de publicação.
4 Consultável em http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf?OpenDatabase. 
5 Consultável em https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20100020.html.  6 Processado e revisto pelo Relator.