Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:1227/10.2BEPRT-S1
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/17/2020
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Luís Migueis Garcia
Descritores:JUNÇÃO DE DOCUMENTOS. ALTERAÇÃO OU ADITAMENTO DE ROL DE TESTEMUNHAS.
Sumário:I) – O legislador visou “evitar o protelamento ou a inoportunidade da apresentação de documentos e de alteração / aditamento do rol de testemunhas e a consequente perturbação que lhe é inerente ou, pela positiva, estabilizar estes meios de prova com certa antecedência em relação à realização da audiência final” (Ac. do STJ, de 12-09-2019, proc. n.º 587/17.9T8CHV-A.G1-A.S1); até 20 dias antes, e supondo um efectivo início de produção de prova; termo que aí se esgota, não renovando a cada sessão de continuação. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:CMPH – (...), E. M.
Recorrido 1:C., S. A.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de o recurso merecer provimento.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo:

CMPH – (...), E. M., interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF do Porto, que em acção contra si intentada por C., S. A., não admitiu “o requerimento de fls. 1126 e seguintes, nem os documentos juntos com o mesmo, nem o aditamento das testemunhas”.

A recorrente censura o decidido, oferecendo em recurso seguintes conclusões:

1 – A R. recorrente requereu a junção de 20 (vinte) documentos, assim como o aditamento de duas testemunhas, através de requerimento apresentado no dia 05/06/19, devidamente justificado, com retificação em 11/06/19, de mero lapso material, ou seja, até 20 (vinte) dias antes da realização da audiência de julgamento (continuação), que estava marcada para o dia 01/07/19;
2 – Razão pela qual, tanto os requerimentos apresentados como os 20 (vinte) documentos juntos, como ainda as duas testemunhas aditadas, deveria tudo ter sido admitido nos termos dos arts. 423º, n.ºs 2 e 3 e 598º, n.º 2, do CPC;
3 – Isto porque, o prazo limite para apresentação de documentos, bem como para o aditamento do rol de testemunhas, tem por referência não a data inicialmente designada para a audiência final, mas a data da efetiva realização da audiência, quer haja adiamento ou continuação da audiência, conforme, entre muitos outros, sendo Jurisprudência quase unânime, o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 15/11/18, Proc. 11465/17.1T8PRT-B.P1, in http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/b3f28d026686185b8025837b0057d8b9?OpenDocument, sendo que poucos acórdãos existem em sentido contrário, como se retira do citado acórdão, para cuja fundamentação, com a devida vénia, se remete;
4 – Ainda neste mesmo sentido, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC Anotado, Vol. II, 3ª edição, págs. 241 e 675/676;
5 – Violou, assim, o douto despacho recorrido, a Lei e o Direito aplicável, designadamente os arts. 423º, n.ºs 2 e 3 e 598º, n.º 2, do CPC;
6 – O Chamado Novo CPC apenas veio impedir, sem justificação, a junção de documentos em plena audiência de julgamento, para evitar adiamentos e expedientes dilatórios;
7 – O que, desde logo, não se verifica, quando o julgamento decorre em várias sessões;
8 - O Novo CPC veio, isso sim, reforçar o princípio da busca da verdade material;
9 – Sendo, inclusive, a interpretação de tais normas (arts. 423º, n.ºs 2 e 598º, n.º 2, do CPC), com referência à primeira audiência designada, manifestamente inconstitucional, uma vez que contende com os princípios do Estado de Direito Democrático, da Proporcionalidade e das Garantias de Processo Justo e Equitativo, conforme os arts. 2º, 18º, n.º 2 e 20º, n.º 4, da CRP-Constituição da República Portuguesa e art. 6º, n.º 1, da CEDH-Convenção Europeia dos Direitos do Homem;
10 – Pelo que, os requerimentos em causa, os 20 (vinte) documentos, assim como as duas testemunhas aditadas, deveriam ter sido admitidos nos autos.

Contra-alegou a recorrida, concluindo:

1. O recurso apresentado pela Recorrente sobre o douto despacho proferido, carece, com todo e ponderado respeito, de total e absoluto fundamento fáctico e legal.
2. A douta decisão colocada em crise encontra-se cuidadosamente elaborada e fundamentada pelo Mº Juiz “a quo”, pelo que, nenhuma censura ou reparo haverá a recair sobre a mesma que assim, deverá ser mantida na íntegra e na sua plenitude e eficácia.
3. O requerimento apresentado pela Ré a fls 1126 e seguintes dos autos é manifestamente extemporâneo,
4. Há regras e prazos processuais para a prática dos atos referenciados estando os mesmos já decorridos quando a Ré, aqui Recorrente, decidiu se apresentar aos autos.
5. A fase de produção de prova estava decorrida, o julgamento iniciado com duas sessões já concretizada, com audição de testemunhas e depoimentos prestados.
6. A suspensão da instância surgiu no seguimento da audiência de julgamento para análise concreta, real e efetiva, das faturas em aberto e das notas de débito respeitantes aos juros de mora.
7. O requerimento de fls 1126 e seguintes não devia – como não foi – ser admitido nos autos.
9. O douto despacho que não admitiu o requerimento de fls 1126 e seguintes dos autos, faz uma correta interpretação dos factos e adequada aplicação do direito, 10. O douto despacho em análise não violou qualquer normativo, nomeadamente os invocados pela Recorrente nas suas alegações de recurso.
11. Pelo que deve ser mantido nos precisos termos em que se encontra.
*
O Mº Pº, na pessoa do Exmº Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art.º 146º, nº 1, do CTA, e sufragando mesma jurisprudência indicada pela recorrente, emitiu parecer no sentido do provimento do recurso; respondido.
*
Dispensando vistos, cumpre decidir.
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As circunstâncias, que os autos documentam:
1º) - Em 6/05/2019, após produção de prova, foi dado despacho em que “defere-se o pedido de suspensão da instância” e em que “foi designado o dia 01 de julho de 2019, às 10:00 horas, para a continuação da audiência final” [cfr. Acta de audiência final (sessão II)], continuação que veio a acontecer na data designada, com produção de prova e alegações orais dos mandatários” [cfr. Acta de audiência final (sessão III)]
2º) - De permeio, através de requerimento apresentado no dia 05/06/19, (rectificado em 11/06/19) a ré discorreu em termos que aqui se têm presentes e requereu a junção de 20 (vinte) documentos e o aditamento de duas testemunhas [cfr. req.].
3º) - Ao que foi dado o despacho recorrido, com o seguinte teor:
«(…)
Na sequência da suspensão da instância, tendo em vista um eventual entendimento sobre os valores das faturas pagos ou não, vem a Ré apresentar um requerimento (a fis. 1126 e seguintes do suporte físico do processo), com o qual junta uma série de documentos e arrola duas testemunhas.
A Autora responde que a exposição da Ré é extemporânea, tal como a junção de documentos. Para o caso de ser admitida, requer nova audição de testemunhas. Requer, ainda, prestação de declarações de parte.
Cumpre apreciar.
Conforme é sabido a pronúncia das partes tem momentos processuais próprios, não se encontrando no Código de Processo Civil a previsão de pronúncia de uma parte sobre a «produção de prova até ao momento».
Por sua vez, no que concerne à junção de documentos, também o Código de Processo Civil prevê no artigo 423.° o momento em que deve ser efetuada a junção dessa prova. Ao caso apenas se poderia aplicar o regime previsto no n.º 3 do referido preceito, caso não fosse possível apresentar os documentos com os respetivos articulados ou até 20 dias antes da audiência de julgamento; ou em virtude de ocorrência posterior. Ora, todos os documentos agora juntos, já podiam ter sido apresentados com os articulados ou até 20 dias antes do início da audiência de julgamento. Inclusive os relativos às decisões judiciais, que preencheriam o pressuposto de «ocorrência posterior», mas como são todas anteriores ao ano de 2019, verifica-se que não cumpre o prazo dos 20 dias anteriores ao julgamento.
Face ao exposto, não se admite o requerimento de fls. 1126 e seguintes, nem os documentos juntos com o mesmo, nem o aditamento de testemunhas, procedendo-se ao seu desentranharnento e devolvendo-se ao apresentante.
Custas do Incidente pela Ré, que se fixam em 1 UC.
Ante o decidido, fica sem efeito a nova audição de testemunhas da Autora.
(…)»
*
A apelação
Segundo a recorrente “tanto os requerimentos apresentados como os 20 (vinte) documentos juntos, como ainda as duas testemunhas aditadas, deveria tudo ter sido admitido nos termos dos arts. 423º, n.ºs 2 e 3 e 598º, n.º 2, do CPC”.
Mas nada oferece de consubstanciada crítica quanto ao indeferimento a que o despacho recorrido se referiu como uma “pronúncia de uma parte sobre a «produção de prova até ao momento»”, bem como se aparta de qualquer esforço argumentativo que sustente admissão nos termos do art.º 423º, n.º 3, do CPC.
Mas, no que já tem lastro, vejamos a censura.
Reflectindo a questão aqui a decidir, a recorrente convoca que na requerida junção de documentos e aditamento de testemunhas se deve seguir como decidido em Ac. da RP, de 18-11-2018, proc. nº 11465/17.1T8PRT-B.P1, assim sumariado: “O prazo limite para a apresentação de documentos (bem como o da alteração do rol de testemunhas) tem por referência não a data inicialmente designada para a audiência final mas a data da efetiva realização da audiência, quer haja adiamento ou continuação da audiência.”.
Na tese da recorrente prevalece esta última afirmação, em que o prazo como que se renovará relativamente a cada uma das novas marcações de audiência de julgamento que ocorra.
As circunstâncias proporcionam a discussão, pois, efectivamente, e em respeito de uma antecedência de 20 dias, foi de permeio entre sucessivas sessões do julgamento que o requerimento de prova foi feito.
Sem crédito na afirmação da recorrida de que a “fase de produção de prova estava decorrida”!
Não se percebe tão díspar leitura.
Mas, depurada essa influência, vejamos.
Dentro das balizas do caso, sem outra equação que não a da aferição da tempestiva oportunidade pela enunciada problemática colocada a recurso.
Como “princípio geral”, o artigo 423º do CPC, sob a epígrafe “Momento da Apresentação), preceitua:
1 - Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.
2 - Se não forem juntos com o articulado respectivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, excepto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.
3 - Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.
Também de acordo com o disposto no art.º 598º, n.º 2, do CPC, “O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de cinco dias”.
Não obstante o processo ser anterior ao NCPC, as partes alavancam posições na base desta (actual) disciplina; e bem (cfr. art.º 5º da Lei n.º 41/2013, de 26/06).
O termo de 20 dias “antes da data em que se realize a audiência final” é comum, seja para apresentação de documentos, seja para o aditamento ou alteração do rol de testemunhas.
A história e “ratio legis” normativa inclinam à confirmação do julgado.
O legislador visou “evitar o protelamento ou a inoportunidade da apresentação de documentos e de alteração / aditamento do rol de testemunhas e a consequente perturbação que lhe é inerente ou, pela positiva, estabilizar estes meios de prova com certa antecedência em relação à realização da audiência final” (Ac. do STJ, de 12-09-2019, proc. n.º 587/17.9T8CHV-A.G1-A.S1).
É de pensada opção por uma tramitação fluida e previsível para todos que a lei consagrou positivada solução (PROPOSTA DE LEI N.º 113/XII (2.ª) – DAR II série A N.º41/XII/2 3º Supl. 2012.11.30 pág. 2-334).
Se bem que se encontrem exemplos no sentido sustentado pela recorrente, antes nos revemos em jurisprudência como a que se segue.
Cfr. Ac. do STJ, de 23-06-2018, proc. n.º 359/07.9TBOPR.P1.S1:

“Do cotejo entre a anterior e a atual versão dos referidos normativos do CPC extrai-se que se manteve a regra de base do ónus de apresentação da prova documental com os articulados em que as partes aleguem os factos que com aquele meio de prova se visa demonstrar.

Já quanto a apresentação em momento posterior com a penalização de multa ou justificação bastante do retardamento, a nova lei veio antecipar o limite temporal dessa apresentação, mantendo, no entanto, a faculdade de oferecimento, depois desse limite, dos documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento ou se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.

Em suma, significa isto que, afora estas últimas situações, a apresentação de prova documental posterior aos articulados com penalização ou justificação bastante, que dantes podia ser feita até ao encerramento da discussão em 1.ª instância, ou seja, até ao termo das então alegações de facto, passou a agora a ter como termo final o vigésimo dia anterior à data em que se realize a audiência final.

Tal antecipação encontra-se justificada na “exposição de motivos” da Lei n.º 41/2013, nos seguintes termos:

«Em consonância com o princípio da inadiabilidade da audiência final, visando disciplinar a produção de prova documental, é estabelecido que os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realiza a audiência final, assim se assegurando o oportuno contraditório e obviando a intuitos exclusivamente dilatórios.»”.
Cfr. Ac. da RL, de 06-06-2019, proc. n.º 18561/17.3T8LSB-A.L1-2:
«I - Após apresentação das alegações de recurso, não é admissível a junção aos autos pelas partes de cópia de acórdão, pois um acórdão não pode ser considerado um parecer (cf. art. 426.º do CPC).
II - Tendo em conta a letra da lei e a sua ratio no art. 423.º, n.º 2, do CPC, a expressão “até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final” significa “até à data em que efetivamente se inicie a audiência final”. Atenta a possibilidade de a data inicialmente designada para audiência final ser dada sem efeito ou de adiamento propriamente dito da audiência, releva apenas a data concreta em que a audiência final se venha a iniciar/realizar.
III - Mas uma vez iniciada, se tiver várias sessões, ainda que entre as mesmas decorram mais de 20 dias, não é admissível a junção documental ao abrigo do referido preceito.
IV - O Código de Processo Civil contém diversos preceitos legais que permitem “equilibrar” o regime consagrado no art. 423.º do CPC, em que assume preponderância a consagração do princípio do inquisitório, no art. 411.º do CPC, assim ficando assegurado o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva e a um processo equitativo (artigos 20.º da CRP e 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem).
V - Mas o referido princípio não pode servir para colmatar toda e qualquer “falta” das partes a respeito da apresentação dos meios de prova, pois se assim fosse estaria a fazer-se do mesmo uma interpretação normativa e aplicação prática em colisão com outros importantes princípios, do processo civil e até constitucionais, mormente o dispositivo, a igualdade das partes, a independência do tribunal e a imparcialidade do juiz (20.º e 62.º da CRP).»
Pode ler-se neste aresto:
«(…)
Importa ter presente o disposto no art. 423.º do CPC:
“1 - Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.
2 - Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.
3 - Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior”.
A propósito deste preceito legal, veja-se a Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 113/XII (PL 521/2012, de 22-11-2012), que esteve na génese da referida Lei n.º 41/2013: “Em consonância com o princípio da inadiabilidade da audiência final, visando disciplinar a produção de prova documental, é estabelecido que os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, assim se assegurando o oportuno contraditório e obviando a intuitos exclusivamente dilatórios”.
Como afirmam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, in “Código de Processo Civil Anotado”, Volume I, Almedina, pág. 499, o CPC de 2013 introduziu alterações relevantes em sede de apresentação de prova documental, visando contrariar uma certa tendência (…) traduzida em protelar a junção de documentos para o decurso da audiência final. Os efeitos negativos que isso determinava, com o arrastamento das audiências e a perturbação do decurso dos depoimentos, levou o legislador a adotar uma solução mais rígida, sem que daí resulte, todavia, prejuízo para a descoberta da verdade.
Assim, tendo em conta a letra da lei e a sua ratio, como emerge da passagem citada, o sentido da expressão “até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final” é, em nosso entender, até à data em que efetivamente se inicie a audiência final. Ante a possibilidade de a data inicialmente designada para audiência final ser dada sem efeito (como sucedeu no presente processo) ou de adiamento propriamente dito da audiência (cf. art. 603.º do CPC), a data a considerar é a data concreta em que a audiência final se venha a iniciar/realizar.
A nosso ver, o sentido da norma
não é o de permitir a “livre junção documental” (ainda que com eventual condenação em multa) até 20 dias antes da data em que se encerre a audiência final ou até 20 dias antes da data em que se conclua uma sessão da mesma.
Este entendimento, que nos parece ser maioritário, na doutrina e na jurisprudência, encontra, aliás, paralelismo com o que foi defendido na vigência do anterior Código de Processo Civil relativamente ao art. 512.º-A, que previa a possibilidade de aditamento ou alteração do rol de testemunhas até 20 dias antes da data em que se realizasse a audiência de julgamento.
Reconhecendo este paralelismo, Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, referem a respeito do regime do n.º 2 do art. 423.º do CPC tratar-se de densificação de “uma regra de estabilização dos meios de instrução a partir do vigésimo dia que antecede a audiência final” - in “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil”, 2014, 2.ª edição, Almedina, pág. 370.
Em sentido em parte coincidente com o que defendemos pronunciam-se Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, obra citada, pág. 499 (sublinhado nosso): “A teleologia do preceito, que visa evitar a perturbação resultante da apresentação extemporânea de documentos, leva-nos a considerar que o limite para a sua apresentação (e também para a alteração do rol de testemunhas, ao abrigo do art. 598º, nº 2, com semelhante redação) tem como referência a data designada para a audiência final ou para a primeira sessão, independentemente de qualquer adiamento ou continuação (neste sentido, reportando-se à alteração do rol de testemunhas admitida pela norma do art. 598º, nº 2, cf. Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo", 2ª ed., p. 327, e RP 12-5-15, 7724/10).”
Discordamos destes autores apenas na desconsideração que fazem do adiamento da audiência final (embora irrelevante para o caso em apreço). E nesta discordância estamos acompanhados por Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in “Código de Processo Civil Anotado”, Volume 2.º, 3.ª edição, Almedina, pág. 241:
O cômputo do prazo do n.º 2, idêntico ao estabelecido para o aditamento ou alteração do rol de testemunhas (art. 598-2), está sujeito às regras gerais dos arts. 138 a 140, (…). A razão de ser do prazo estipulado (a preparação, nas melhores condições, da audiência final) conduz a esta interpretação.
Não se realizando a audiência na data designada, o prazo conta em função da nova data, pois o que importa é a data em que a audiência se realiza e não aquela em que era suposto realizar-se.”
E mais adiante, na pág. 675, em anotação ao art. 598.º: “O n.º 2 permite o adiamento ou a alteração (…) do rol de testemunhas até 20 dias antes da data em que efetivamente se realize a audiência final. A fixação duma primeira data, havendo depois adiamento da audiência, ainda que depois de aberta, nos termos do art. 151-4 ou do art. 603-1, ou a suspensão da instância, nos termos do art. 269, não releva para o efeito, uma vez verificado o adiamento ou a suspensão”.
Referem-se, pois, estes autores, se bem interpretamos a sua posição, apenas aos casos de adiamento, em que não chegou, pelas razões previstas nos citados normativos ou em virtude da suspensão da instância, a iniciar a prática de atos previstos no n.º 3 do art. 604.º do CPC.
Admitimos que possam também ser abrangidas pelo preceito (sendo, pois, de admitir a junção documental) certos casos de anulação da audiência final: se a audiência final tiver sido anulada, porque não foi adiada quando o devia ter sido; se houver uma anulação parcial do julgamento para ampliação da matéria de facto (tendo sido impugnado com êxito o despacho que inferiu uma reclamação apresentada relativamente ao despacho de enunciação dos temas da prova, com o aditamento de novo tema da prova – cf. art. 596.º, n.º 3, do CPC).
Não falta, é certo, quem defenda a possibilidade de junção documental até 20 dias antes do início de uma das sessões da audiência final. Neste sentido, veja-se o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15-11-2018, no processo n.º 11465/17.1T8PRT-B.P1, disponível em www.dgsi.pt, em cujo sumário se afirma: O prazo limite para a apresentação de documentos (bem como o da alteração do rol de testemunhas) tem por referência não a data inicialmente designada para a audiência final mas a data da efetiva realização da audiência, quer haja adiamento ou continuação da audiência).
Pensamos, todavia, tratar-se de posição minoritária, que não se coaduna com o espírito da norma, nem com o princípio da continuidade da audiência (cf. art. 606.º do CPC), potenciando o risco de manobras dilatórias para atrasar a conclusão da audiência final e até a necessidade de reinquirição das partes/testemunhas já ouvidas em anteriores sessões a fim de serem confrontadas com os novos documentos, sendo certo que, com o novo regime de junção documental consagrado no CPC de 2013 se pretendeu, precisamente, contrariar o risco de tal acontecer, limitando-se, pois, a possibilidade de apresentação de documentos no decurso da audiência final (até ao encerramento da discussão) às situações previstas no n.º 3 do art. 423.º do CPC (…).
(…)».
Cfr. Ac. da RL, de 26-09-2019, proc. n.º 939/16.1T8LSB-G.L1-2:
«I - Tendo em conta a letra da lei e a ratio do artigo 598.º, n.º 2, do CPC, a expressão «até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final» significa «até à data em que efetivamente se inicie a audiência final».
II - Mas uma vez iniciada, se tiver várias sessões, ainda que entre as mesmas decorram mais de 20 dias, não é admissível o aditamento ou a alteração do rol de testemunhas ao abrigo do referido preceito.
III - O Código de Processo Civil contém diversos preceitos legais que permitem contrabalançar o regime do artigo 598.º, n.º 2, obviando a eventuais iniquidades decorrentes dos mecanismos de preclusão, designadamente o artigo 526.º, n.º 1, que prevê a iniciativa probatória do juiz quando, no decurso da ação, haja razões para presumir que determinada pessoa, não oferecida como testemunha, tem conhecimento de factos importantes para a boa decisão da causa.
IV - De igual modo, pode suceder que alguma testemunha não compareça na audiência final e seja justificada a inquirição de novas testemunhas, prevendo-se o regime de substituição de testemunhas, nos termos do n.º 3 do artigo 508.º do CPC.
V - O direito à prova não pode ser esgrimido contra toda e qualquer falta das partes a respeito da apresentação dos meios de prova, em rota de colisão com princípios estruturantes do processo civil, como o dispositivo, a igualdade das partes, a independência do tribunal e a imparcialidade do juiz (artigos 20.º e 62.º da CRP).»
Pode ler-se neste aresto:
«(…)
Dispõe o citado artigo 598.º, n.º 2, do CPC, sob a epígrafe «Alteração do requerimento probatório e aditamento ou alteração ao rol de testemunhas», que «O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de cinco dias».
A redação do preceito corresponde ao texto do anterior artigo.º 512.º-A do CPC de 1961, na versão que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 180/96 de 25.9, verificando-se uma clara intenção do legislador de flexibilizar o regime do artigo 619.º do CPC, o qual só permitia a alteração do rol dentro do prazo para a sua apresentação (salvo casos excecionais).
Em jeito de comentário, Lopes do Rego aplaudiu tal normativo por afastar um regime que se configurava como excessivamente restritivo, amarrando as partes, sem justificação plausível, a provas que foram indicadas com enorme antecedência (cf. Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, 2.ª ed., Coimbra: Almedina, p. 448). Apenas alertou para os limites decorrentes de dois parâmetros fundamentais: a necessidade de atuação da regra do contraditório; e a necessidade de evitar que o exercício de tal direito colida com a realização da audiência, não devendo constituir em nenhum caso, nova causa de adiamento.
Tem sido entendido que o prazo de 20 dias previsto no artigo 598.º, n.º 2, do CPC, para aditamento ou alteração do rol de testemunhas, deve ser contado tendo como referência a realização efetiva da audiência e não a simples abertura desta.
Esta tese, que nos parece maioritária na doutrina e na jurisprudência, encontra, aliás, afinidade com o que foi defendido na vigência do anterior Código de Processo Civil relativamente ao artigo 512.º-A.
A propósito do n.º 2 do artigo 423.º do CPC de 2013, relativo à junção da prova documental «até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final», Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro dão-nos conta do paralelismo com aquele preceito, afirmando tratar-se da densificação de «uma regra de estabilização dos meios de instrução a partir do vigésimo dia que antecede a audiência final» - in “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil”, 2014, 2.ª edição, Coimbra Almedina, p. 370.
Neste particular, veja-se ainda a nota de Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa ao citado artigo 423.º, n.º 2, do CPC: «A teleologia do preceito, que visa evitar a perturbação resultante da apresentação extemporânea de documentos, leva-nos a considerar que o limite para a sua apresentação (e também para a alteração do rol de testemunhas, ao abrigo do art. 598º, nº 2, com semelhante redação) tem como referência a data designada para a audiência final ou para a primeira sessão, independentemente de qualquer adiamento ou continuação (neste sentido, reportando-se à alteração do rol de testemunhas admitida pela norma do art. 598º, nº 2, cf. Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo", 2ª ed., p. 327, e RP 12-5-15, 7724/10)» (in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Coimbra: Almedina, 2018, p. 499; negrito nosso). Divergimos deste entendimento apenas no que concerne à desconsideração do adiamento da audiência final (embora irrelevante para o caso em apreço), adotando antes a posição de Lebre de Freitas e Isabel Alexandre que, em anotação ao artigo 598.º, escreveram que «O n.º 2 permite o adiamento ou a alteração (…) do rol de testemunhas até 20 dias antes da data em que efetivamente se realize a audiência final. A fixação duma primeira data, havendo depois adiamento da audiência, ainda que depois de aberta, nos termos do art. 151-4 ou do art. 603-1, ou a suspensão da instância, nos termos do art. 269, não releva para o efeito, uma vez verificado o adiamento ou a suspensão» (in Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3.ª edição, Coimbra Almedina, p. 675).
Seguindo de perto o acórdão do TRL de 6.6.2019 (p. 18561/17.3T8LSB-A.L1-2, in www.dgsi.pt, subscrito pela aqui relatora como 1.ª adjunta), devem considerar-se ainda compreendidos no preceito alguns casos de anulação da audiência final, como aquele em que a audiência final é anulada por não ter sido adiada quando o devia ter sido ou quando ocorre uma anulação parcial do julgamento para ampliação da matéria de facto.
Em defesa da admissibilidade da junção documental e da alteração do rol de testemunhas até 20 dias antes do início de cada uma das sessões da audiência final, pode ler-se no sumário do acórdão do TRP de 15.11.2018 (p. 11465/17.1T8PRT-B.P1, disponível em www.dgsi.pt) que «O prazo limite para a apresentação de documentos (bem como o da alteração do rol de testemunhas) tem por referência não a data inicialmente designada para a audiência final mas a data da efetiva realização da audiência, quer haja adiamento ou continuação da audiência)».
Esta posição minoritária não se incorpora no espírito da norma e conflitua com os princípios da continuidade da audiência e da concentração dos seus atos (cf. artigo 606.º do CPC), potenciando o risco de perturbação do desfecho da audiência final.
Como se escreveu no acórdão do TRL de 15.11.2012 (p. processo n.º 76/11.5TBCSC-A.L1-2, consultável em
www.dgsi.pt), o «pretendido alargamento do prazo para indicação de novos meios de prova, supostamente até vinte dias antes da última sessão da audiência de julgamento, seria um factor de perturbação do processo, numa fase muito sensível como se julga ser a do julgamento, designadamente no que respeita ao respectivo agendamento, numa única ou em várias sessões, separadas, ou não por mais de vinte dias, ou ainda ao agendamento da continuação não prevista de uma audiência que, com mais ou menos fundamento, não seja concluída na data prevista. Poderiam ser suscitadas muitas questões, tendo por referência o decurso do referido prazo de vinte dias, como condição da admissão de um novo meio de prova. E, como já se referiu, sem evidente vantagem, uma vez que um depoimento importante para a boa decisão da causa é sempre admissível nos termos já referidos do art. 645.º do CPC.
Ou seja – conclui o douto aresto –, julga-se que a possibilidade de o rol de testemunhas ser aditado até vinte dias antes de qualquer sessão da audiência de julgamento seria uma causa de instabilidade e de perturbação processual, que o interesse tutelado não justifica».
No sentido da jurisprudência maioritária podem consultar-se, entre outros, os acórdãos do TRP de 5.3.2007 (p. 0656916), do TRC de 8.9.2015 (p. 2035/09.9TBPMS-A.C1), do TRG de 17.12.2015 (p. 3070/09.2TJVNF-B.G1), do TRE de 28.6.2018 (p. 922/15.4T8PTM-A.E1) e do TRL de 20.2.2019 (p.7535/15.9T8VIS-B.C1), todos disponíveis em
www.dgsi.pt.
Transpondo estas considerações para a situação em espécie, é de concluir que a data da 1.ª sessão da audiência final - dia 21 de janeiro de 2019 – é a que releva para efeitos da contagem do referido limite temporal de 20 dias.
Ora, atendendo a que o requerimento de aditamento ao rol foi apresentado muito posteriormente à data da 1.ª sessão da audiência final, na qual houve produção de prova, é claramente intempestivo, como se entendeu, e bem, no despacho recorrido.
Poder-se-á objetar que, deste modo, está coartado o direito da Autora à prova, à luz do disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.
Porém, o direito à prova não pode ser esgrimido contra toda e qualquer falta das partes a respeito da apresentação dos meios de prova, em rota de colisão com princípios estruturantes do processo civil, como o dispositivo, a igualdade das partes, a independência do tribunal e a imparcialidade do juiz (artigos 20.º e 62.º da CRP) (cf. citado acórdão do TRL de 6.6.2019).
Acresce que o Código de Processo Civil contém diversos preceitos legais que permitem contrabalançar o regime do artigo 598.º, n.º 2, obviando a eventuais iniquidades decorrentes dos mecanismos de preclusão.
Assim, nos casos excecionais em que se detete a existência de uma testemunha desconhecida, conhecedora de factos relevantes para a decisão da causa mas cuja identidade só venha a ser conhecida durante a audiência final, o artigo 526.º, n.º 1, do CPC prevê a iniciativa probatória do juiz, consignando que «Quando, no decurso da ação, haja razões para presumir que determinada pessoa, não oferecida como testemunha, tem conhecimento de factos importantes para a boa decisão da causa, deve o juiz ordenar que seja notificada para depor».
De igual modo, pode suceder que alguma testemunha não compareça na audiência final e seja justificada a inquirição de novas testemunhas, prevendo-se o regime de substituição de testemunhas, nos termos do n.º 3 do artigo 508.º do CPC.
Em face do exposto, entendemos que a decisão recorrida não desrespeitou os princípios estruturantes do direito processual civil nem as regras de direito aplicáveis (…).
(…)».
Cfr. Ac. RC, de 20-09-2019, proc. n.º 7535/15.9T8VIS-B.C1:
«A norma do n.º 2 do artigo 598.º (Alteração do requerimento probatório e aditamento ou alteração ao rol de testemunhas) do Código de Processo Civil, onde se determina que «O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final» deve ser interpretada no sentido de que esses 20 dias se contam impreterivelmente até à audiência que dá efetivamente início à discussão da causa, não se aplicando aos casos em que a audiência designada para um certo dia acaba por ser adiada, como ocorre quando existe impedimento do tribunal ou falta algum advogado (n.º 1 do artigo 603.º do CPC) ou a instância é suspensa.»
Pode ler-se neste aresto:
«(…)

A norma do Código de Processo Civil que disciplina a questão colocada consta do n.º 2 do artigo 598.º (Alteração do requerimento probatório e aditamento ou alteração ao rol de testemunhas), onde se determina que «O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de cinco dias».

A questão a resolver, como se disse, consiste em saber se estes 20 dias se contam tendo como referência qualquer uma das sessões em que a audiência se possa desdobrar ou se tem como referência a sessão da audiência que dá efetivamente início à discussão da causa, ficando de fora casos como aqueles que ocorrem quando a audiência designada para um certo dia acaba por ser adiada, como ocorre quando existe impedimento do tribunal ou falta algum advogado nos casos em que a data da audiência foi designada sem prévio acordo com esse advogado (n.º 1 do artigo 603.º do CPC).

A resposta à questão consiste em afirmar que o rol de testemunhas só pode ser aditado ou alterado impreterivelmente até 20 dias antes da data em que se realiza a sessão da audiência que dá efetivamente início à discussão da causa, salvo se nesta data a audiência vier a ser adiada, caso em que o prazo de 20 dias se referirá à nova data designada, pelas seguintes razões:

(I) Quando o advogado prepara os fundamentos factuais da ação ou da contestação e articulados complementares, têm acesso através da parte ou por investigações que sejam feitas, à identidade das testemunhas que poderão ser indicadas para inquirição em audiência de julgamento.

Existirão casos em que só mais tarde se vem a constatar que existiu uma testemunha dos factos, cuja identidade era desconhecida até então, mas estes casos são excecionais.

E mais excecionais se tornam quando esse conhecimento só vem a ocorrer nos 20 dias anteriores à data da audiência de julgamento.

Quando esse conhecimento vem a ocorrer durante a audiência de julgamento, a lei processual permite que a testemunha possa ser inquirida, nestas circunstâncias:

«Quando, no decurso da ação, haja razões para presumir que determinada pessoa, não oferecida como testemunha, tem conhecimento de factos importantes para a boa decisão da causa, deve o juiz ordenar que seja notificada para depor» - n.º 1 do artigo 526.º (Inquirição por iniciativa do tribunal) do Código de Processo Civil.

Por conseguinte, os casos em que possa existir uma testemunha desconhecida, sabedora de factos importantes para a decisão da causa e cuja identidade só venha a ser conhecida no período compreendido nos 20 dias anteriores à audiência, são excecionais e mesmo assim alguns ainda poderão ser remediados através do mecanismo processual do referido n.º 1 do artigo 526.º do Código de Processo Civil.

(II) Sendo o número de testemunhas limitado, poderá ocorrer que alguma testemunha não compareça na audiência e neste caso justificar-se-ia a inquirição de novas testemunhas.

Assim é.

Para estes casos a lei processual prevê a substituição de testemunhas no artigo 508.º do Código de Processo Civil, onde no seu n.º 3 se dispõe:

«3. No caso de a parte não prescindir de alguma testemunha faltosa, observa-se o seguinte:

a) Se ocorrer impossibilidade definitiva para depor, posterior à sua indicação, a parte tem a faculdade de a substituir;

b) Se a impossibilidade for meramente temporária ou a testemunha tiver mudado de residência depois de oferecida, bem como se não tiver sido notificada, devendo tê-lo sido, ou se deixar de comparecer por outro impedimento legítimo, a parte pode substituí-la ou requerer o adiamento da inquirição pelo prazo que se afigure indispensável, nunca excedente a 30 dias;

c) Se faltar sem motivo justificado e não for encontrada para vir depor nos termos do número seguinte, pode ser substituída».

Por conseguinte, estas situações estão acauteladas.

(III) A possibilidade de acrescentar testemunhas ao rol depois de iniciada a audiência, ainda que interrompida para continuar após período superior a 20 dias, criaria perturbação indesejável no andamento do processo em questão e no conjunto dos restantes processos pendentes no tribunal, pois implicaria despender mais tempo com aquele processo sem que previamente o tribunal estivesse a contar com isso, o que poderia implicar o adiamento de diligência já marcadas noutros processos, inclusive, já há alguns meses.

Neste sentido, referiu-se no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15 de novembro de 2012, no processo n.º 76/11.5TBCSC-A.L1-2 (Farinha Alves) ([1]) que o «pretendido alargamento do prazo para indicação de novos meios de prova, supostamente até vinte dias antes da última sessão da audiência de julgamento, seria um factor de perturbação do processo, numa fase muito sensível como se julga ser a do julgamento, designadamente no que respeita ao respectivo agendamento, numa única ou em várias sessões, separadas, ou não por mais de vinte dias, ou ainda ao agendamento da continuação não prevista de uma audiência que, com mais ou menos fundamento, não seja concluída na data prevista. Poderiam ser suscitadas muitas questões, tendo por referência o decurso do referido prazo de vinte dias, como condição da admissão de um novo meio de prova. E, como já se referiu, sem evidente vantagem, uma vez que um depoimento importante para a boa decisão da causa é sempre admissível nos termos já referidos do art. 645.º do CPC.

Ou seja, julga-se que a possibilidade de o rol de testemunhas ser aditado até vinte dias antes de qualquer sessão da audiência de julgamento seria uma causa de instabilidade e de perturbação processual, que o interesse tutelado não justifica».

(IV) O sentido da interpretação do referido preceito (n.º 2 do artigo 598.º do CPC) acima indicado será quase consensual na jurisprudência.

Assim:

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12 de maio de 2015, no processo n.º 7724/10.2TBMTS-B.P1 (Henrique Araújo) O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final sendo a data a considerar a que designa dia para julgamento, independentemente de este se realizar ou não e de terem sido agendadas mais sessões em função do volume de prova a produzir

Acórdão da Relação de Lisboa de 15.11.2012, no processo n.º 76/11.5TBCSC-A.L1-2.

Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 28 de junho de 2018, no processo nº 922/15.4T8PTM-A.E1 (Manuel Bargado), «I - O prazo de 20 dias previsto no nº 2 do artigo 598º do CPC, para aditamento ou alteração do rolde testemunhas, deve ser contado tendo como referência a realização efetiva da audiência final e não a simples abertura desta.

II – Tendo os réus requerido o aditamento ao rol de testemunha no próprio dia em que se iniciou a audiência final, não sofre a mínima discussão que o fizeram fora de prazo, não relevando aqui o facto da audiência se ter prolongado por mais sessões, nem podendo invocar-se a este propósito, como fazem os recorridos, o princípio da adequação formal para permitir um aditamento ao rol de testemunhas apresentado claramente fora do prazo legal».

Acórdão do TRC de 14-12-2016 (Vitor Amaral), no processo 3669/14.5T8VIS.C1, «O prazo de vinte dias, previsto no art.º 598.º, n.º 2, do NCPCiv., para aditamento ao rol de testemunhas tem como referência a efetiva realização do julgamento, ainda que, anteriormente, tenha ocorrido abertura da audiência final, com tentativa de conciliação, seguida de suspensão, sem produção de quaisquer provas, para conclusão das negociações entre as partes e designação de nova data para realização da audiência».

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 08 de Setembro de 2015, no processo nº 2035/09.9TBPMS-A.C1 (Isabel Silva), «O prazo de 20 dias a que alude o art. 598º, nº 2 do CPC refere-se à data da efetiva realização da audiência de discussão e julgamento, pelo que a possibilidade de alteração ou aditamento do rol de testemunhas como que se “renova” relativamente a cada uma das novas marcações que venham a ter lugar» ([2]).

(V) Também tem apoio na doutrina.

O Prof. Lebre de Freitas, sustentou, face ao preceito semelhante constante do artigo 512.º-A, do CPC anterior, que «A art. 512.º-A permite a alteração e o aditamento do rol de testemunhas até 20 dias antes em que efectivamente se realize a audiência de discussão e julgamento. A fixação duma primeira data, havendo depois adiamento da audiência, ainda que depois de aberta, nos termos do art. 155-4 ou do art. 651-1, ou a suspensão da instância, nos termos do art. 276 não releva para o efeito, uma vez verificado o adiamento ou a suspensão» ([3])
(…)».
Não esgotando, julga-se que é neste sentido que se há-de decidir, em solução proporcional, ficando “perfeitamente asseguradas garantias suficientes para apresentação superveniente ou tardia da prova, em consonância com o princípio do Estado de direito democrático e das garantias do processo equitativo, constantes, respetivamente, dos artigos 2.º e 20.º, n.º 1, 4 e 5, da Constituição da República” (Ac. do STJ, de 23-06-2018, proc. n.º 359/07.9TBOPR.P1.S1), “ficando assegurado o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva e a um processo equitativo (artigos 20.º da CRP e 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem” (Ac. da RL, de 06-06-2019, proc. n.º 18561/17.3T8LSB-A.L1-2); nesse respeito, “a busca da verdade há de fazer-se nos termos da lei processual e não contra ela; buscando concretizar os princípios jurídicos que visam garantir um fair process e não torpedeando-os” (Ac. RL, de 05-12-2018, proc. n.º 2867/16.1T8LSB-A.L1-4), “não relevando aqui o facto da audiência se ter prolongado por mais sessões” (Ac. do STJ, de 28-06-2018, proc. n.º 922/15.4T8PTM-A.E1).

*
Pelo exposto, acordam em conferência os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
Custas: pela recorrente.

Porto, 17 de Janeiro de 2020.

Luís Migueis Garcia
Frederico Branco
Nuno Coutinho