Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 363/20.1BEALM |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 07/13/2023 |
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Relator: | PATRÍCIA MANUEL PIRES |
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Descritores: | REJEIÇÃO LIMINAR ILEGALIDADE EM CONCRETO SUBSÍDIOS DE DESEMPREGO E DOENÇA AUTOLIQUIDAÇÕES SEGURANÇA SOCIAL FALTA DE NOTIFICAÇÃO DO ATO |
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Sumário: | I-A ilegalidade em concreto das dívidas respeitantes a subsídios de desemprego e doença, não pode ser discutida em sede de oposição. II-Nas dívidas evidenciadas anteriormente, o ato sindicado e cuja ilegalidade é assacada pelo Oponente, seja na dimensão de vícios formais, seja na materialização de vícios de violação de lei, por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, consubstancia uma decisão direta e imediatamente impugnável e lesiva, na medida em que determina a reposição dos montantes pagos, produzindo, desde logo, efeitos na sua esfera jurídica, donde, poderia/deveria o Oponente ter reagido contra este, mediante a dedução da competente ação administrativa. III-O facto de a Oponente não ter sido, alegadamente, notificada de qualquer ato de liquidação não legitima a possibilidade de discussão e sindicância da ilegalidade em concreto das dívidas, porquanto poderia/deveria discutir o ato na sequência da citação, interpondo a competente ação administrativa. IV-Nas situações de autoliquidação de Segurança Social, o ato de extração da certidão confirmativa da existência da dívida configura-se como ato de liquidação, donde, não podendo o contribuinte reclamar graciosamente, nem impugnar judicialmente, pode questionar a legalidade do ato tributário em sede de oposição à execução fiscal, subsumindo-se a questão no artigo 204.º, nº1, alínea h), do CPPT. V-A falta de notificação do ato que corporiza a dívida que dará origem à dívida exequenda é fundamento de oposição à execução fiscal. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO
I-RELATÓRIO M. C., (doravante Recorrente), veio interpor recurso dirigido a este Tribunal tendo por objeto decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, através do qual rejeitou liminarmente a petição de oposição deduzida na sequência da citação no âmbito do processo de execução fiscal nº …701 e apensos instaurado pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP-Secção de Processo Executivo de Setúbal, visando a cobrança coerciva de dívidas no valor total de €30.443,60. A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso concluindo da seguinte forma: “23º. A Executada foi confrontada com uma execução cuja origem e fundamento desconhece e que talvez possa ter origem numa suspeita que tanto quanto conhece não teve qualquer seguimento na parte em que lhe pudesse de algum modo afetar. 24º. Com essa motivação alegou que desconhecia qualquer ato que tivesse concluído com a determinação ou consequência de restituição de qualquer valor a qualquer autoridade administrativa. 25º. Como ato desconhecido, enquadrou-o como ato a existir viciado por falta de transparência, nomeadamente, falta de comunicação da fundamentação, falta de audiência prévia, ou como ato inexistente. 26º. Entendendo que a execução deveria seguir o mesmo caminho do ato que a fundamenta, designadamente, a anulação porque viciado ou porque inexistente. 27º. A causa de pedir é clara e manifestamente na Oposição a anulação da quantia exequenda por inexistente, bem como porque nenhum ato administrativo ou tributário anterior tivesse de forma válida e eficaz determinado a situação da restituição em causa. 28º. Essa causa de pedir é fundamento legal de Oposição, cfr. ao art. 204.º do CPPT. 29º. A Recorrente, indica na Oposição que apresentava a mesma com fundamento no art. 204.º, n.º 1, al. f) do CPPT e pede a absolvição da quantia exequenda por verificação da inexistência da dívida. 30º. É violação da tutela jurisdicional efetiva, a decisão recorrida. 31º. É inequívoco direito da Recorrente o exame e julgamento da Oposição apresentada de anulação de execução fiscal cujo fundamento é inexistente ou que a existir é viciado de ilegalidade que deve culminar na respetiva anulação. Nestes termos e nos demais de Direito com o douto suprimento de V. Exas. Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Sul, ao presente Recurso deve ser concedido provimento, porque provado e em consequência, a rejeição liminar da Oposição nos autos deve ser revogada e os mesmos devem seguir os ulteriores termos até à sentença. SÓ ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA!” *** A Recorrida não apresentou contra-alegações. *** O Digno Magistrado do Ministério Público proferiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso. *** Com dispensa de vistos legais, vêm os autos à conferência para decisão. *** II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Visando a decisão do presente recurso, este Tribunal dá como provada a seguinte matéria de facto: 1. Em data não concretamente apurada foram instaurados no Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP-Secção de Processo Executivo de Setúbal, os processos de execução fiscal n.º ….701 e respetivos apensos, constando como executada M. C., visando a cobrança coerciva das dívidas melhor identificadas infra, e que perfazem o valor de €30.116,69 a título de quantia exequenda, de €16,30 de juros de mora e €310,61 a título de custas, tudo perfazendo a quantia global de €30.443,60: Imagem: original nos autos
Imagens: originais nos autos
Imagem: original nos autos
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Imagem: original nos autos (cfr. fls. 57 a 85 da plataforma SITAF, referência 005800578); 2. Na sequência da citação dos processos de execução fiscal elencados no ponto antecedente, a Oponente deduziu a presente oposição (cfr. fls. 1 dos autos); *** A convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto estruturada supra, fundou-se no teor dos documentos, na posição das partes e no processo de execução fiscal apenso, conforme referido em cada um dos números do probatório. *** III) FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO In casu, a Recorrente não se conforma com a rejeição liminar proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, a qual se fundou na circunstância das causas de pedir aduzidas para suportar o pedido formulado não serem enquadráveis no artigo 204.º do CPPT, fundando-se as suas pretensões em ilegalidade, em concreto, da dívida exequenda. Cumpre, desde já, relevar que em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso. Atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto importa, assim, decidir se a decisão de rejeição liminar prolatada pelo Tribunal a quo, deve manter-se na ordem jurídica analisando, para o efeito, o pedido e as concretas causas de pedir e, consequentemente, se a pretensão da Recorrente é insuscetível de apreciação neste meio processual ou em qualquer outro que se repute legalmente aplicável para o efeito. Vejamos, então. A Recorrente defende, desde logo, que foi confrontada com uma execução cuja origem e fundamento desconhece, sendo que alegou, expressamente, na sua p.i. que não teve conhecimento de qualquer ato que tivesse concluído com a determinação ou consequência de restituição de qualquer valor a qualquer autoridade administrativa. Mais aduzindo que, como ato desconhecido, o mesmo se encontra, desde logo, viciado por falta de transparência, nomeadamente, falta de comunicação da fundamentação, falta de audiência prévia, ou mesmo como ato inexistente. Advogando, in fine, que a causa de pedir é clara e manifestamente de oposição porquanto desconhece qualquer ato administrativo ou tributário anterior que tivesse de forma válida e eficaz determinado a situação da restituição em causa, subsumindo-se, desde logo, no artigo 204.º, n.º 1, al. f) do CPPT, razão pela qual peticiona a absolvição da quantia exequenda por verificação da inexistência da dívida. Apreciando. Comecemos por atentar na fundamentação jurídica em que se suportou a rejeição liminar da petição em apreço. O Tribunal a quo começa por evidenciar que a oposição à execução fiscal, visa a extinção de um determinado processo de execução fiscal, de acordo com os fundamentos taxativos elencados no artigo 204.º do CPPT. Concretizando, no caso vertente, que “Nos presentes autos, pese embora a menção genérica da alínea f) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT enquanto fundamento da Oposição, no seu proémio, nada na mesma constitui ou configura qualquer tipo de alegação consubstanciada dos fundamentos a que se reconduz a referida alínea.” Densifica, neste particular, que “[a] referida Oposição limita-se a sindicar os fundamentos da decisão que determinou a restituição dos subsídios alegadamente indevidos, sem enquadrar a aduzida causa de pedir em qualquer dos fundamentos elencados no n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.” Até porque, enfatiza, “[a] sindicância da legalidade da liquidação da dívida exequenda só pode ocorrer nas circunstâncias muito estritas da alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, isto é, apenas quando não esteja legalmente previsto qualquer meio judicial de impugnação da decisão de liquidação, o que no caso concreto não é alegado, nem se descortina.” Concluindo, assim, que “[a]tenta a falta de alegação e consubstanciação de algum dos fundamentos admitidos no n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, deve a presente Oposição ser liminarmente rejeitada, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 209.º do CPPT.” Vejamos, então. A oposição à execução fiscal funciona como contestação à pretensão do exequente e respeita aos fundamentos supervenientes que podem tornar ilegítima ou injusta a execução, devido a falta de correspondência com a situação material subjacente no momento em que se adotam as providências executivas, tendo por efeito paralisar a eficácia do ato tributário corporizado no processo executivo.(1) Compulsado o teor da p.i., verifica-se que a Recorrente aduz, desde logo, que desconhece o ato que legitima as dívidas em causa e a sua cobrança coerciva, porquanto o mesmo nunca lhe foi dado a conhecer, donde comunicado que não tinha direito às quantias reputadas em falta, desconhecendo, inteiramente, se existe ato e qual a fundamentação que lhe subjaz. Mais sustenta que recebeu tais valores, e que a eles tem direito, porquanto, por um lado, sempre efetuou os descontos devidos por lei, e por outro lado, a Entidade Exequente deferiu o seu pedido e concedeu os competentes subsídios. Ora, atentando nas aludidas alegações só, em parte, se concorda com o despacho recorrido, não só porque, conforme veremos, não foi tida em consideração a globalidade das dívidas em cobrança coerciva, mormente, a sua natureza, bem como todas as causas de pedir, na medida em que existem fundamentos que são subsumíveis no elenco taxativo do artigo 204.º do CPPT. Mas, expliquemos, então, porque assim o entendemos, começando por fazer o elenco das dívidas em cobrança coerciva nos presentes autos, e a competente análise casuística. In casu, encontramo-nos perante dívidas de contribuições e cotizações da Segurança Social, e bem assim dívidas provenientes de subsídio de doença, subsídio de doença profissional e subsídio de desemprego, sendo certo que, conforme veremos, no âmbito das cotizações e contribuições a questão atinente à discussão da ilegalidade em concreto, não pode, sem mais, ser afastada. Atentemos, ab initio, nas dívidas dimanantes de subsídio de doença, subsídio de doença profissional e subsídio de desemprego. Neste concreto particular, cumpre relevar que se secunda o entendimento do Tribunal a quo, relativamente à questão atinente à ilegalidade da dívida exequenda, fundada na inexistência do facto tributário, porquanto a mesma não pode, de facto, ser discutida em sede de oposição ao processo executivo. Concretizando. Com efeito, a alínea h), do n.º 1 do artigo 204.º, do CPPT permite que a oposição tenha por fundamento a ilegalidade da liquidação da dívida exequenda sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação. “Casos em que a lei não assegura meios de impugnação dos actos de liquidação são aqueles em que se permite a extracção de certidões de dívida perante a mera constatação de omissão de um pagamento sem que haja um acto administrativo ou tributário prévio, definidor da obrigação”. São, portanto, as situações em que o título é uma mera nota informal que não integra nenhum ato administrativo ou em que não há propriamente um ato de liquidação anterior à execução. Ora, in casu, encontrando-nos perante dívidas dimanantes de recebimento, alegadamente, indevido de subsídios de doença e de desemprego, a extração das certidões de dívida tem na sua génese o respetivo ato tributário de liquidação. De relevar, neste âmbito que o facto de a Oponente não ter sido, alegadamente, notificada do ato de liquidação -o que se analisará, de seguida, enquanto causa de pedir autónoma- não poderá legitimar a possibilidade de discussão e sindicância da ilegalidade em concreto das dívidas, porquanto poderia/deveria discutir o ato na sequência da citação, interpondo a competente ação administrativa, conforme doutrinado, designadamente, no Acórdão do STA, proferido no processo nº 0383/14, de 25 de fevereiro de 2015. Podendo, é certo, e conforme veremos ulteriormente, acarretar uma subsunção normativa no artigo 204.º, nº1, alínea i), do CPPT, mas não a possibilidade de discussão da legalidade em concreto da dívida exequenda. O mesmo sucedendo quanto à concreta alegação de vícios formais atinentes ao ato administrativo, mormente, falta de fundamentação e audição prévia, os quais têm de ser discutidos na ação administrativa em que seja objeto e controvertido o próprio ato e a sua legalidade e não na oposição na qual se disputa a exigibilidade dimanante desse ato administrativo. Neste particular, vide o Aresto do STA, proferido no processo nº 0539/13, datado de 28 de outubro de 2020, do qual se extrata na parte que para os autos releva, designadamente, o seguinte: “[a] Recorrente começa por retomar a sua linha de defesa nesta sede, insistindo (conclusões a) a v)) na questão da falta de fundamentação do acto administrativo, sustentando que não pode considerar-se fundamentada a referida revogação, colocando em crise a ideia (apontada na decisão recorrida) de que tal matéria não podia ser objecto de tutela no âmbito de acção de oposição judicial, mas sim no processo de acção administrativa especial, hoje acção administrativa. A oposição à execução fiscal assume a natureza de contestação à pretensão do exequente de cobrança coerciva da dívida tributária, apenas podendo ser deduzida com invocação dos fundamentos legais taxativos (art. 204º nº 1 do CPPT), sendo que nos termos da alínea h) do nº 1 do art. 204º do CPPT é fundamento de oposição à execução fiscal a “ilegalidade da liquidação da dívida exequenda”, mas logo aí se ressalva que a discussão da legalidade da liquidação só é possível quando “a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação”. Pois bem, é jurisprudência uniforme dos tribunais tributários, designadamente do Supremo Tribunal Administrativo, que não é possível discutir em sede de oposição à execução fiscal a legalidade da liquidação que deu origem ao tributo, nem a legalidade do acto administrativo que esteja na origem da dívida exequenda, uma vez que a lei assegura meio judicial de impugnação desses actos. Salienta ainda a jurisprudência que não se equipara à ausência de meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto aquela em que o executado não foi oportunamente notificado para exercer o direito de impugnar; nesta situação, a falta de notificação apenas determinará a não abertura do prazo para exercer o direito de impugnação e já não a possibilidade de transferir a discussão da legalidade da liquidação do meio próprio para a oposição à execução fiscal - Ac. do S.T.A. de 16-01-2019, Proc. nº 011/16.4BEAVR 0654/16, www.dgsi.pt. Assim, como se refere no aresto agora apontado, as únicas situações que se acolhem à fatti species da referida alínea são aquelas em que a dívida exequenda não tenha origem em acto tributário ou acto administrativo prévio. Nesta sequência, podemos concluir, (…) que a oposição não é o meio processual adequado à discussão da legalidade da decisão de revogação no que diz respeito à aprovação da candidatura do projecto POPH, uma vez que a lei garante meio de impugnação desse acto, qual seja a então acção administrativa especial, hoje acção administrativa, impondo-se ainda sublinhar que a Recorrente aponta (art. 8º da petição inicial) que foi notificada em 16-11-2011 da tal decisão de revogação.” De sublinhar, outrossim, que os aludidos fundamentos quanto às dívidas dimanantes de prestações de desemprego e subsídio de doença, não se subsumem em qualquer outra das alíneas contempladas no citado artigo 204.º do CPPT, e convocadas pela Recorrente, mormente, a alínea a), e bem assim a alínea f). É certo que a alínea a), do citado artigo 204.º, do CPPT, estatui que é fundamento de oposição a “Inexistência do imposto, taxa ou contribuição nas leis em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação ou, se for o caso, não estar autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respetiva liquidação”, e é, igualmente, certo que a Recorrente sustenta que a dívida é inexistente, mas a verdade é que atentando na causa de pedir da inexistência do facto tributário, verifica-se que a mesma mais não se reconduz que a uma errada apreciação dos pressupostos de direito que levou, ilegalmente, à reposição das quantias objeto de cobrança coerciva nestes autos. Quanto à convocada subsunção na alínea f), do nº1, do artigo 204.º, do CPPT não se aquiesce –nem a Recorrente substancia, com propriedade, porque assim o entende- quais as razões que poderiam levar ao enquadramento na aludida alínea. Mas se é certo que, como visto, no âmbito das aludidas dívidas é perentória a insusceptibilidade de discussão da legalidade, em concreto, dessas dívidas, o mesmo não se poderá concluir, com igual certeza e segurança, no atinente às dívidas de contribuições e cotizações. E isto porque, contemplando o elenco constante em 1) supra, a existência de dívidas concatenadas com contribuições e cotizações para a Segurança Social, e não contemplando os autos elementos atinentes à natureza das mesmas, -o que se afigura vital, não se encontrando, tão-pouco, junto aos autos o aludido PEF,-desconhecendo-se, portanto, se nos encontrarmos no domínio de autoliquidações de Segurança Social, é prematuro recusar-se a sua suscetibilidade de discussão, e inerente subsunção na alínea h), do citado normativo, porquanto, confirmando-se essa natureza-instrução que cumpre ao Tribunal a quo acautelar- é suscetível de enquadramento nessa alínea, independentemente do mérito da pretensão. Como expendido no Aresto do STA, proferido no processo nº 0443/12, de 14 de junho de 2012: “Nessas situações, com carácter de autoliquidação, apenas poderá configurar-se o acto de extracção da certidão confirmativa da existência da dívida como «acto de liquidação» para os efeitos previstos na alínea h) do art. 204.º, n.º 1, do CPPT (Nos termos do art. 204.º, n.º 1, alínea h), do CPPT, é fundamento de oposição à execução fiscal «Ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação».). Na verdade, nesses casos, não pode o contribuinte reclamar graciosamente nem impugnar judicialmente, sendo que apenas poderá questionar a legalidade do acto tributário em sede de oposição à execução fiscal (Neste sentido, o seguinte acórdão da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:)de 7 de Dezembro de 2004, proferido no processo com o n.º 749/04, publicado no Apêndice ao Diário da República de 6 de Julho de 2005 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2004/32240.pdf), págs. 1808 a 1812, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d14b5ab43579fc9780256f70005b8d00?OpenDocument.” (destaques e sublinhados nossos). Logo, competirá ao Tribunal a quo, mediante casuística aferição da natureza das dívidas, aquilatar se as mesmas configuram ou não autoliquidações, daí retirando, conforme supra expendido, a consequente subsunção na alínea h), e inerente possibilidade de discussão da legalidade em concreto da dívida exequenda. Mas, conforme já deixámos antever, entendemos, outrossim, que o Tribunal a quo não terá realizado a melhor interpretação quanto ao âmbito e alcance da falta de conhecimento do ato legitimador, porquanto se ajuíza que a Recorrente ao alegar que nunca lhe foi dado a conhecer, e comunicado qualquer ato que determinasse a reposição dos subsídios subjacentes e reembolso das quantias reputadas em dívida, está a convocar a falta de notificação do ato de liquidação. É certo que, não convoca a concreta subsunção normativa na alínea atinente ao efeito e poderia ser mais clara a sua asserção, no entanto, ainda assim, e devendo o julgador pautar e nortear a sua conduta pela plena tutela jurisdicional, deverá atender-se ao articulado em toda a sua extensão, e do mesmo infere-se que foi essa a sua pretensão e alegação. Com efeito, e independentemente de a argumentação expendida pela Recorrente poder conduzir ou não à procedência da oposição, a verdade é que é fundamento de oposição a falta de notificação do ato de liquidação da dívida exequenda, inferindo-se que foi nessa perspetiva que tal foi alegado. Com efeito, a alínea e) do mencionado artigo 204.º, n.º 1, prevê como fundamento de oposição a “[f]alta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade”. Trata-se, pois, de um direito e garantia do administrado. A falta ou irregularidade de notificação de um ato administrativo, em geral, não contendendo com a legalidade do ato notificado, tem implicações na sua eficácia, ou seja, comporta a ineficácia, relativamente aos seus destinatários. É, pois, reconhecida à notificação uma função garantística, particularmente ponderosa no caso de atos administrativos impositivos de deveres ou encargos, porquanto, apenas com a certeza de que o administrado foi notificado, nos termos legalmente prescritos, do ato administrativo que o afeta, há a segurança de que o mesmo pode usar dos expedientes que tem à sua disposição para reagir relativamente a esse mesmo ato (cfr. a este propósito os art.ºs 66.º e ss. do CPA então em vigor). Assim, a eficácia de um ato administrativo depende da sua notificação. Logo, a falta de notificação desse mesmo ato comporta inexigibilidade de dívida, enquanto consequência da ineficácia do ato, suscetível de enquadramento na referida alínea i).” Assim, face ao exposto, e transpondo os ensinamentos supra expendidos para o caso vertente, entende-se que, contrariamente ao ajuizado pelo Tribunal a quo, o fundamento da falta de notificação do ato que legitimou a instauração das execuções fiscais em contenda, subsume-se no artigo 204.º, nº1, alínea i), do CPPT. Mais se sublinhando que, aquilatando-se que as dívidas de contribuições e cotizações para a Segurança Social, assumem a natureza de autoliquidações -o que, conforme densificado anteriormente, compete ao Tribunal a quo apurar- a questão concatenada com a ilegalidade da dívida pode, igualmente, ser discutida nesta sede. Destarte, estando o pedido em consonância com o meio processual deduzido pela Oponente, o Tribunal a quo, deve -sendo caso disso e não obstando quaisquer outras questões ao seu recebimento liminar- proceder à admissão liminar da presente petição inicial de oposição e subsequente tramitação. *** IV. DISPOSITIVO Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul acordam, em conferência, em conceder provimento ao recurso, revogar o despacho recorrido e ordenar a baixa dos autos à 1.ª instância, a fim de aí de se proceder, e se a tal nada mais obstar, à admissão da petição de oposição, seguindo-se os ulteriores termos processuais. Sem custas. Registe. Notifique. Lisboa, 13 de julho de 2023 (Patrícia Manuel Pires) (Jorge Cortês) (Luísa Soares) 1) Ac. do STA de 04/06/2008, processo n.º 179/08, disponível para consulta em www.dgsi.pt 2) Vide, designadamente, o doutrinado no Aresto proferido no processo n.º 076/14, com data de 09.04.2014. 3) Vide entre outros Acórdão do STA, de 23.06.2010, proferido no processo nº 0317/10 e Acórdão do STA de 06.10.2005, processo n.º 500/05, ambos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt. 4) Sobre a diferenciação da falta de notificação da liquidação do tributo no prazo da caducidade e a falta de notificação da liquidação, tout court, vide, designadamente, os Arestos do STA, proferidos nos processos nº 0181/10, de 20.06.2010, e processo nº 0473/11, de 2809.2011. |