Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | 4ª. SECÇÃO | ||
Relator: | ANA LUÍSA GERALDES | ||
Descritores: | IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO ÓNUS A CARGO DO RECORRENTE CONTEÚDO DAS CONCLUSÕES | ||
Data do Acordão: | 05/12/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | CONCEDIDA | ||
Área Temática: | DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / RECURSO DE REVISTA / IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO. | ||
Doutrina: | - Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil” Anotado”, Vol. V, 143. - José Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, “Código de Processo Civil” Anotado”, Vol. 2º, Coimbra Editora, 645 e ss.. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (NCPC): - ARTIGO 640.º, N.ºS 1, ALS. A), B) E C) E 2, AL. A). | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: -DE 26/9/2012, PROC. N.º 174/08.2TTVFX.L1.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT ; -DE 19/2/2015, PROC. Nº 299/05, 2.ª SECÇÃO; -DE 09/07/2015, PROC. 284040/11.OYIPRT.G1.S1, 7.ª SECÇÃO; -DE 22/09/2015, PROC. N.º 29/12.6TBFAF.G1.S1, 6.ª SECÇÃO; -DE 29/09/2015, PROC. N.º 233/09; -DE 01/10/2015, PROC. N.º 824/11.3TTLRS.L1.S1, SECÇÃO SOCIAL; -DE 11/02/2016, PROC. N.º 157/12.8 TUGMR.G1.S1, SECÇÃO SOCIAL . | ||
Sumário : | I – No recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao Recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa, relativamente a esses factos, e enuncie a decisão alternativa que propõe. II – Servindo as conclusões para delimitar o objecto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação; quanto aos demais requisitos, basta que constem de forma explícita na motivação do recurso. III – O ónus a cargo do Recorrente consagrado no art. 640º, do Novo CPC, não pode ser exponenciado a um nível tal que praticamente determine a reprodução, ainda que sintética, nas conclusões do recurso, de tudo quanto a esse respeito já tenha sido alegado. | ||
Decisão Texto Integral: | ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 5. Inconformada, a Autora reclamou para a Conferência, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por Acórdão datado de 17 de Junho de 2015, desatendido a reclamação e confirmado, na íntegra, a decisão anterior, no sentido da improcedência do recurso. “2. No recurso de revista a Autora insurgiu-se contra o Acórdão da Relação com base nos seguintes fundamentos: - Em primeiro lugar, porque a Relação não admitiu a junção de documentos que foram apresentados com as alegações de recurso e determinou o seu desentranhamento, de tal modo que o teor desses documentos não foi considerado pela Relação no juízo confirmatório da sentença da 1ª instância. Alega a Autora que tais documentos apenas foram conhecidos depois de realizada a audiência de julgamento, estando justificada a sua junção posterior, a qual alegadamente também encontraria justificação pelo facto de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento da 1ª instância. (…) - Em terceiro lugar, a A. argumenta que, embora não caiba recurso de revista do Acórdão da Relação que se pronuncia sobre a decisão da matéria de facto, nos termos do nº 4 do art. 662º do CPC, o certo é que, no caso concreto, a Relação não reapreciou a decisão da matéria de facto, pelo que deve ser admitido o recurso. (…) É verdade que estabelecida a comparação entre o resultado final que foi declarado na sentença da 1ª instância com aquele que foi exarado no Acórdão da Relação, existe uma total identidade entre as decisões. Porém, face à reclamação aduzida para a conferência, há que avaliar novamente as questões suscitadas. (…) 4. Quanto aos fundamentos invocados em primeiro e em terceiro lugar – sobre a questão de não admissão da junção de documentos que foram apresentados com as alegações de recurso e que a Relação determinou o seu desentranhamento, bem como o facto de a Relação não ter reapreciado a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, está em causa a alegada violação de lei adjectiva, com o incumprimento por parte da Relação do preceituado, nomeadamente, nos art. 674º, nº 1, alínea b) e 640º, ambos do Novo CPC. Cotejados os autos constata-se que, no caso concreto, para além da não admissão dos referidos documentos, passível de integração no art. 674º, nº 1, alínea b), do NCPC, foi rejeitado pela Relação o conhecimento de uma parte da impugnação da decisão da matéria de facto, por alegado incumprimento do ónus previsto no art. 640º, com o argumento de que a Recorrente, relativamente a alguns pontos da impugnação, não enunciou nas conclusões os meios de prova justificativos da alteração pretendida, tal como não indicou no mesmo local das alegações as passagens da gravação desses meios de prova (fls. 114, Vº). Refere, ainda, o Tribunal da Relação, que a Recorrente tão pouco fez nas conclusões qualquer remissão para o corpo das alegações que pudesse levar a afirmar que aqueles requisitos se encontravam implicitamente cumpridos. E com esses argumentos, em exclusivo, foi rejeitado parcialmente o recurso de apelação na parte em que o mesmo tem como efeito a impugnação da decisão da matéria de facto. Ora, tendo sido alegado, em sede de recurso de revista, que a Relação não aplicou devidamente normas de direito adjectivo e de direito material relativamente à delimitação dos factos provados e não provados, a decisão a proferir sobre tal matéria repercute-se na decisão da causa. Pelo que, reflectindo sobre a problemática suscitada, verifica-se que a interposição do recurso de revista constitui a única possibilidade de fazer reverter a situação a favor do Recorrente nos casos em que o Acórdão da Relação esteja porventura eivado de erro de aplicação da lei processual a respeito da prova produzida, nomeadamente quanto à alegada decisão da matéria de facto. Em tais circunstâncias, não existe verdadeiramente uma situação de dupla conformidade, já que a Relação decidiu com base numa determinada interpretação do preceituado no art. 640º do CPC, matéria relativamente à qual não houve anteriormente qualquer pronúncia por parte do Tribunal de 1ª instância. III – Decisão: 8. Admitido o recurso, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, datado de 10/03/2016, pronunciando-se no sentido de ser concedida a revista e, por consequência, determinar-se à Relação que proceda à reapreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto nos termos do recurso de apelação interposto pela Autora. 9. Do seu conteúdo foram notificadas as partes, nada tendo sido aduzido. 10. Preparada a deliberação, cumpre conhecer e decidir as questões suscitadas nas conclusões da alegação da Recorrente, exceptuadas aquelas cuja decisão se mostre prejudicada pela solução entretanto dada a outras, nos termos preceituados nos arts. 608.º, n.º 2 e 679º, ambos do CPC. Salienta-se, contudo, que não se confundem com tais questões todos os argumentos invocados pelas partes, aos quais o Tribunal não está obrigado a responder.[1] II – QUESTÕES A DECIDIR: 2. O Tribunal da Relação devia ter conhecido do recurso de apelação interposto quanto à impugnação da matéria de facto. Analisando e Decidindo.
III – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICO-JURÍDICA:
1. Consigna-se que para a decisão do presente pleito são convocadas as normas do Novo CPC, na versão conferida pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, porquanto o Acórdão recorrido mostra-se datado de 17/06/2015.
2. Verifica-se, in casu, que, conforme se decidiu na reclamação apensa aos autos, a Autora Recorrente suscitou “a questão de não admissão da junção de documentos” que foram apresentados com as alegações de recurso e que a Relação determinou o seu desentranhamento. Para além da não admissão dos referidos documentos, passível de integração no art. 674º, nº 1, alínea b), do NCPC, foi também rejeitado pela Relação o conhecimento de uma parte da impugnação da decisão da matéria de facto, por alegado incumprimento do ónus previsto no art. 640º, com o argumento de que a Recorrente, relativamente a alguns pontos da impugnação, não enunciou nas conclusões os meios de prova justificativos da alteração pretendida, tal como não indicou no mesmo local das alegações as passagens da gravação desses meios de prova.
3. Reportando-nos à questão da não admissão dos documentos, constatamos que a sentença da 1ª instância foi proferida em 31 de Outubro de 2014, e que os documentos aqui em causa, juntos com as alegações da Autora, de 30 de Novembro de 2014, só chegaram ao conhecimento desta nessa data – facto que a Recorrente expressamente invoca no art. 30º das alegações da apelação. E porque tais documentos, conforme a Autora alega e o MP corrobora no seu parecer, relevam para a prova de vários dos factos alegados na p.i. e para contextualizar o seu despedimento, deveriam os mesmos ter sido admitidos e apreciados pela Relação, em sede de reexame da matéria de facto impugnada. Neste sentido cf., entre outros, o Acórdão do STJ, desta Secção, datado de 26/9/2012, proferido no âmbito do processo nº 174/08.2TTVFX.L1.S1, Relatado por Gonçalves Rocha, disponível em www.dgsi.pt, e igualmente referido nos autos a fls. 1152.
4. Quanto à impugnação da matéria de facto, o Acórdão recorrido fundamentou a rejeição parcial do recurso nesta matéria com base no que considerou ser omissão, nas conclusões do recurso, da indicação dos meios de prova que justificavam a alteração da decisão, bem como na não indicação pela Recorrente das passagens da gravação desses meios de prova, a que se reportam, concretamente, as conclusões 2) a 12), 15) e 16) do recurso.
Ora, sobre a presente matéria este Supremo Tribunal, e Secção, já se pronunciaram diversas vezes, concluindo, em situações similares, no sentido de não ser de rejeitar o recurso, sempre que a Recorrente já tenha identificado no corpo alegatório os concretos meios de prova que impunham uma decisão sobre a matéria de facto em sentido diverso, não tendo que fazê-lo de novo nas conclusões do recurso, conquanto identifique os concretos pontos de matéria de facto que impugna. Sendo a jurisprudência uniforme nesse sentido, conforme se pode extrair, nomeadamente dos Acórdãos cujos sumários se transcrevem, pela sua importância para a decisão dos presentes autos:
- Ac. STJ de 01.10.2015, Proc. 824/11.3TTLRS.L1.S1, desta Secção Social [2]:
- Ac. STJ de 11.02.2016, P. n.º 157/12.8 TUGMR.G1.S1, desta Secção Social (Relator: Mário Belo Morgado):
- Ac. STJ, datado de 19/2/2015, P. nº 299/05, 2ª Secção (Relator: Tomé Gomes): - Ac. STJ de 09/07/2015, P. 284040/11.OYIPRT.G1.S1, 7ª Secção (Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza[3]): (…) - Ac. STJ de 22.09.2015, P. 29/12.6TBFAF.G1.S1, 6ª Secção (Relator: Pinto de Almeida): 5. Posto isto, e porque não se suscitam dúvidas sobre o entendimento do Supremo Tribunal de Justiça sobre a presente matéria, concluímos, em face do exposto, que a Recorrente cumpriu o ónus de impugnação previsto no art. 640.º, n.ºs 1, als. a), b) e c) e 2, al. a), do NCPC. Assim sendo, a rejeição pelo Tribunal da Relação de Lisboa do recurso interposto pela Ré quanto à reapreciação do julgamento da matéria de facto não pode ser sufragada.
6. Nesta medida se concede a presente revista.
IV – DECISÃO:
- Termos em que se acorda em conceder a revista, revogando-se o Acórdão recorrido na parte em que não admitiu a junção dos documentos apresentados com as alegações de recurso e determinou o seu desentranhamento, bem como no segmento em que não reapreciou a impugnação da decisão relativa à matéria de facto. E, por consequência, determina-se a remessa dos autos ao Tribunal da Relação de Lisboa, a fim de se conhecer do recurso de apelação, na parte relativa à admissão dos documentos juntos pela Autora com as alegações, e proceder à reapreciação da decisão sobre a matéria de facto oportunamente impugnada, com o posterior conhecimento das questões jurídicas suscitadas no âmbito desse recurso.
- Custas da revista a cargo da parte vencida a final. - Anexa-se o sumário do acórdão.
Lisboa, 12 de Maio e 2016. Ana Luísa (Relatora)
Ribeiro Cardoso
Pinto Hespanhol
_______________________________________________________ |