Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01445/11.6BESNT
Data do Acordão:10/09/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:TAXA DE CONSERVAÇÃO DE ESGOTOS
TAXA
IMPOSTO
INCONSTITUCIONALIDADE
REGIME TRANSITÓRIO
Sumário:I - O tributo denominado taxa de conservação de esgotos, fixada por deliberação da Assembleia Municipal de Oeiras de 22 de Abril de 1977 e melhor plasmada no Regulamento de Drenagem de Águas Residuais dos SMAS de Oeiras e Amadora, cujos princípios reguladores melhor vertidos se encontram no Decreto Regulamentar n° 93/95 de 23 de agosto, tem natureza de taxa e não de imposto.
II - A fundamentação imposta na Lei n° 53-E/2006, de 29 de Dezembro, que aprovou o regime geral das taxas das autarquias locais exige, no artigo 8º, nº 2, alínea c), que o regulamento que crie taxas municipais contenha, obrigatoriamente, sob pena de nulidade, a fundamentação económico-financeira relativa ao valor das mesmas taxas.
III - A mencionada Lei, que entrou em vigor, em 1 de Janeiro de 2007, consagrou um regime transitório, que permitia aos municípios a adequação dos regulamentos até ao início do segundo ano financeiro subsequente à sua entrada em vigor, versão original, ou até início do 3º ano financeiro subsequente à entrada em vigor da presente lei, versão da Lei nº 64-A/2008, de 31-12, OE para 2009, artigo 53º, ou, finalmente, até ao dia 30 de Abril de 2010, versão da Lei nº 117/2009, de 29/12.
Nº Convencional:JSTA000P25002
Nº do Documento:SA22019100901445/11
Data de Entrada:03/21/2019
Recorrente:A............, SA
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE OEIRAS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO


I- RELATÓRIO

A…………, SA, com os sinais dos autos, inconformada, vem recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra prolatada em 22 de Novembro de 2018, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação da tarifa de ligação de esgotos emitida pelos SMAS, titulada pela factura nº1100063, de 18/02/2011, no valor de €1.229.420,95, relacionada com o imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o nº3264, da freguesia da ………, de que é proprietária em 72%, o que fez na sequência do indeferimento de reclamação graciosa que apresentou.

Nas alegações que expostas formulou as seguintes conclusões:

“A. Ao contrário do que foi decidido pelo Tribunal recorrido, a TLE não cabe, de todo, na noção de taxa, uma vez que viola o princípio da equivalência. Na verdade, não lhe está subjacente qualquer vantagem específica directa para os sujeitos passivos, de modo a poder concluir-se pela existência de uma relação de correspectividade ou sinalagmaticidade entre o pagamento do tributo e o serviço público prestado.
B. Esta ausência de bilateralidade é observada, em primeiro lugar, pelo facto de a finalidade da TLE ser totalmente imperceptível, e de não se encontrar de todo provada nos autos a razão pela qual ela deve ser paga pelos proprietários ou usufrutuários dos prédios, ou por quem proceder à inscrição dos mesmos na matriz. Isto é, não é possível dizer que a TLE constitui a contrapartida de qualquer prestação pública específica e individualizável, ou identificar qual o serviço prestado, qual o seu custo e qual o valor do benefício retirado pelo particular.
C. A TLE é uma espécie de tributo adicional residual, indiferenciado, que não serve para pagamento de nenhum serviço específico e que, pelo contrário, utiliza a justificação formal da contraprestação da instalação do sistema de tratamento de águas residuais como subterfúgio para arrecadar uma receita extra para as despesas gerais do Município de Oeiras.
D. Em segundo lugar, a ausência de bilateralidade é comprovada pela circunstância de a TLE assentar numa base ad valorem - o valor patrimonial tributário dos imóveis - que é absolutamente inidónea para cumprir o princípio da equivalência. A base tributável em causa foi escolhida como manifestação de capacidade contributiva (e não de equivalência). O que interessou foi atingir a robustez económica dos sujeitos passivos, ou seja, tributá-los de acordo, não com o valor ou a utilidade de qualquer prestação pública, mas com a sua capacidade contributiva.
E. A TLE é, pois, um imposto.
F. Sendo um imposto, a TLE é organicamente inconstitucional (e, nessa medida, inexigível), por violação do princípio da legalidade fiscal, uma vez que foi criada por regulamento municipal e não por lei da Assembleia da República ou por decreto-lei do Governo autorizado por lei parlamentar, com a consequência da anulação do acto impugnado nos autos.
G. Para além disso, a TLE é também materialmente inconstitucional, por determinar uma restrição ao direito de propriedade em violação do princípio da proporcionalidade, em todas as suas dimensões - adequação, exigibilidade e equilíbrio. Com efeito, trata-se de uma medida de extraordinária violência, que sacrifica o direito de propriedade dos particulares, de modo incompreensivelmente exagerado - excessivo -, em nome de um interesse geral cujos custos já são financiados, por uma variedade de outras vias, pelos próprios particulares que a àquela estão sujeitos.
H. Sendo uma “taxa” que desrespeita o princípio da equivalência, a TLE é também ilegal, por violação do n.° 1 do artigo 4º do RGTAL, segundo o qual o valor das taxas das autarquias locais é fixado de acordo com o princípio da proporcionalidade e não deve ultrapassar o custo da actividade pública local ou o benefício auferido pelo particular.
I. Por fim, a TLE cobrada à Recorrente é ainda ilegal por falta de fundamentação, na medida em que a notificação da liquidação impugnada não foi acompanhada da justificação económico-financeira do tributo (seja de modo expresso seja por remissão para qualquer documento ou diploma que a pudesse conter), justificação essa que constitui um elemento essencial para aferir a natureza equitativa do tributo e, portanto, a sua validade material.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, por provado, com todas as consequências legais.”

A recorrida apresentou contra-alegações pugnando, no fundamental, pelo bem julgado da decisão recorrida, como se capta claramente das seguintes conclusões que expressou:

“i. Através de Sentença proferida pelo douto Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, a qual julgou totalmente procedente a Impugnação Judicial deduzida pela ora Recorrida contra a Tarifa de Ligação de Esgotos, no valor total de € 1.229.420,95;
ii. Inconformada com aquela douta Sentença, a Recorrente interpôs o presente Recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, invocando, em síntese, que a Tarifa de Ligação de Esgotos viola a CRP, em especial, os princípios da Reserva de Lei e o princípio da proporcionalidade; que o ato de liquidação da Tarifa de Ligação de Esgotos padece de falta de fundamentação económico-financeira e, por último, que a tendo impugnado judicialmente a segunda avaliação dos prédios aqui em causa, para efeito de IMI, e tendo sido emitida a liquidação antes do trânsito em julgado, houve violação da tutela judicial efetiva;
iii. Desde logo, e quanto à violação da CRP importa frisar que a Tarifa de Ligação de Esgotos não constitui um imposto, mas antes uma taxa porque “constitui contrapartida do acesso e evacuação das águas residuais até a rede pública”;
iv. Contrariamente ao refere o Recorrente nas suas alegações de recurso o sinalagma inerente ao tributo resulta evidente do próprio nº 1 do art.° 65º do Regulamento, segundo o qual a taxa de ligação corresponde à contraprestação do serviço da instalação do sistema de drenagem de águas residuais a cargo da entidade gestora;
v. Sendo que, a coberto do disposto no n.° 2 do artigo 12.° do Decreto-Lei n.° 158/70 de 13 de Abril - disposição legal que estabelece que a Tarifa de Ligação de Esgotos não poderia exceder os 10% do rendimento coletável -, e em resultado de reunião ordinária de 19 de Dezembro de 1990 foi aprovada a percentagem referente a esta tarifa em 0,7%, ou seja, em menos de 10% do que o valor percentual que, nos termos legais, poderia ser fixado;
vi. Importa, pois, mais uma vez, trazer à colação as doutas conclusões do acórdão proferido em 25 de maio de 2004, no processo n.° 01115/03 já proferida sobre esta matéria, segundo a qual “importa ainda considerar que quando qualquer prédio se liga à rede pública de esgotos, já está, necessariamente, construída e, por inerência, a ser objecto de conservação e manutenção, pelo que, a nosso ver, bem se compreenderá que a taxa de ligação tenha por objectivo não só a contrapartida decorrente de o prédio passar a utilizar aquela rede , mas , ainda e também , e minimizar os custos , necessariamente previsíveis, com a sua manutenção futura; Tão previsível que, depois da ligação é devida uma anual de conservação. (...)- (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul no processo n.° 01115/03, de 25 de maio de 2004);
vii. Esta conclusão não resulta, apenas, e contrariamente ao que sustenta a Recorrente do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul no processo n.° 01115/03, de 25 de maio de 2004, citado pela Sentença recorrida, mas de vasta jurisprudência dos Tribunais Superiores, a qual conclui que a referida Tarifa de Ligação de Esgotos A tarifa de ligação de esgotos representa a contrapartida pelo bem utilizado da ligação do prédio a uma rede de esgotos instalada. 2. As tarifas apenas estão sujeitas ao princípio da legalidade administrativa e não também ao da legalidade tributária. Não se verifica ilegalidade na liquidação da tarifa de ligação de esgotos, fixada, ao abrigo da alteração o art. 76°do RGCECL, na redacção que lhe introduziu o Edital n° 60/90, de 7/8/90, em 0.7% do valor patrimonial do prédio, pois que, pese embora o anteriormente disposto no art. 11º do DL n° 31.674, tal alteração cai no âmbito das competências da Assembleia Municipal, nos termos dos arts. 4º n° 1 al. h) e 12° da Lei das Finanças Locais e 39° do DL n° 100/84, de 29/3 e que a definição do preço ou tarifa da taxa é da competência da CML, «ex vi» do art. 51°, nº 1, al. p) do mesmo DL n° 100/84 e já que a fixação da mesma em 0.7% do valor patrimonial do prédio a cuja ligação se refere não é constitucionalmente desproporcionada (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido, em 9 de maio de 2000, no processo n.º 900/98);
viii. Sendo que esta mesma jurisprudência é acompanhada pelo Supremo Tribunal Administrativo “II - A tarifa de ligação de esgotos representa a contrapartida pelo bem utilizado da ligação do prédio a uma rede de esgotos instalada. III - A tarifa fixada em 0,7% do valor patrimonial do prédio a cuja ligação se refere não é constitucionalmente desproporcionada. IV - As tarifas apenas estão sujeitas ao princípio de legalidade administrativa e não também ao da legalidade tributária.” (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido, em 4 de fevereiro de 1998, no processo n.° 021513);
ix. Aliás, no que respeita à alegada violação do princípio da proporcionalidade é evidente que não se afigura desproporcional liquidar uma Tarifa de Ligação de Esgotos correspondente a 0,7 % do VPT quando o edifício em causa é um centro comercial composto por cinco pisos de estacionamento ao quando afluem todos os dias milhares de pessoas e que possui um VPT que ascende a € 175.631.565,60 (cfr. fls. 1 a 15 do PAT, em confronto com fls. 223 a 318 dos autos);
x. No que respeita à alegada desconformidade e, consequente, falta de fundamentação de da Tarifa de Ligação de Esgotos consagrada no Regulamento de Drenagem de Águas Residuais dos SMAS de Oeiras e Amadora ficou demonstrado em primeira instância e, agora, em sede de recurso, que o facto tributário da Tarifa de Ligação de Esgotos ocorreu em 2009, pelo que o Regulamento que consagrava a Tarifa de Ligação de Esgotos não estava, por força do regime transitório previsto no artigo 17°, alínea a), do RGTAL, obrigado a conter a fundamentação económico-financeira relativa ao valor da Tarifa de Ligação de Esgotos;
xi. Acresce que a Tarifa de Ligação de Esgotos está devidamente consagrada na Lei das Finanças Locais, constituindo receita do Município, fixada por deliberação da Assembleia Municipal de Oeiras de 22 de abril de 1977 e melhor plasmada no Regulamento de Drenagem de Águas Residuais dos SMAS de Oeiras e Amadora, cujos princípios reguladores melhor vertidos se encontram no Decreto Regulamentar n° 93/95 de 23 de agosto bastará o simples fato da liquidação com o efetiva notificação da fundamentação de facto e de direito melhor expressa pela leitura da cópia da fatura junto ao processo administrativo e para cujo texto se remete, para se constatar a efetiva fundamentação de facto e de direito da liquidação do ato tributário em crise;
xii. Sendo que a Recorrida, na sequência de pedido do Recorrente, emitiu ofício através do qual fundamentou, de facto e de direito, a liquidação da Tarifa de Ligação de Esgotos (cfr. alínea g), da matéria de facto dada como provada pela Sentença recorrida);
xiii. A fundamentação resulta também do Regulamento publicado, a fls. 109 e seguintes do Diário da República – 2ª Série - n.º 156 - Apêndice n.° 56, de 9 de julho de 1997, pelo Aviso n.° 891/97, foi aprovado pela Assembleia Municipal de Oeiras, por deliberação de 22 de abril de 1997, indicando no seu preâmbulo as leis que definem a competência objetiva e subjetiva para a emissão da Tarifa de Ligação de Esgotos, tendo, como aí também se evidencia, sido feita a sua apreciação pública nos precisos termos definidos no artigo 118° do Código do Procedimento Administrativo;
xiv. Conforme se deixou já referido também em primeira instância, nos termos do artigo 292° do Regulamento Geral de Sistemas Públicos e Prediais de Distribuição de Água e de Drenagem de Águas Residuais, aprovado pelo Decreto Regulamentar, n.° 23/95, de 23 de agosto, compete à entidade gestora do sistema público de drenagem de águas residuais a definição do valor das tarifas médias a pagar pelos utilizadores do sistema, as quais deverão ser fixadas considerando o equilíbrio económico e financeiro do serviço, com o nível de atendimento adequado;
xv. Através das presentes contra-alegações ficou ainda demonstrado que o ato de liquidação de Tarifa de Ligação de Esgotos não violou os direitos da Recorrente de acesso à justiça tributária e à tutela jurisdicional efetiva, pois, sendo aquele ato de liquidação um ato acessório do ato de fixação do valor patrimonial do imóvel e completamente dependente daquele, não poderia haver lugar, por impossibilidade legal, à apresentação da reclamação graciosa;
xvi. Com efeito a decisão proferida, na impugnação judicial do ato principal, ainda que já em sede de recurso, a ser favorável à Recorrente retroagirá à data da inscrição no prédio da matriz, com a consequente e necessária retificação da liquidação do tributo acessório e devolução dos eventuais valores pagos pelo sujeito passivo.
TERMOS EM QUE NÃO DEVE SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA DEVE A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA SER MANTIDA, DEVENDO SER PROFERIDO ACÓRDÃO QUE JULGUE TOTALMENTE IMPROCEDENTE O RECURSO INTERPOSTO.”

O EPGA junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido do improvimento do recurso.

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2. FUNDAMENTAÇÃO

2. 1 DOS FACTOS

A decisão recorrida deu como assente, com interesse para a decisão, a seguinte factualidade resultante da prova documental, junta aos autos, incluindo os processos administrativos tributários (PAT), com a motivação dela constante:
a) A impugnante inscreveu entre Março e Abril de 2009, na matriz predial urbana da freguesia da ………, Concelho da Amadora, 72% do prédio urbano, constituído no regime de propriedade horizontal e sito na Praça ………, n° 1 a 3, Avenida ………, números 1 a 11, Avenida ………, n.° 1, 3, 5 e 7, Avenida ………, n.° 1, 2, 3, 4, 6, 8, 10, 12, 14, 16, 18, 20, 22, 24, 26, 28, 30, 32, 33 e 34, e Avenida ………, n°1, 2, 3, 4, 5, 7, 9, 11, 13, 15, 17, 19, 21, 23, 25, 27, 29, 31, 33, 35, 37, 39, 41, 43, 45 e 47, a Avenida ………, n.°1 a 6, ao qual foi atribuído a inscrição na matriz predial urbana com o art.° 3624.°, daquela freguesia e concelho (cfr. documento de fls. 1 a 11 do PAT);
b) Em 2010, foi atribuído o valor patrimonial de 191.958.561,68 euros aos prédios a que se refere a alínea anterior (cfr. documento de fls. 223 a 237 dos autos);
c) A impugnante fez pedido de segunda avaliação daqueles prédios (cfr. fls. 223 a 318 dos autos);
d) Foi atribuído o valor de 175.631.565,60 euros (cfr. fls. 1 a 15 do PAT, em confronto com fls. 223 a 318 dos autos);
e) A 18/02/2011 foi emitida a factura/recibo n° 1100063, onde se lê (cfr. documento de fls. 74 dos autos):



f) A 1/04/2011 a impugnante requereu ao SMAS, nos “termos do artigo 37° do CPPT” a “proceder à notificação dos elementos omitidos na primeira notificação” a que se refere a alínea anterior (cfr. documento de fls. 122 e ss. dos autos);

g) A 04/05/2011, os SMAS Oeiras e Amadora remeteu à impugnante ofício onde lê (cfr. documento de fls. 124 dos autos):




h) Com o ofício a que se refere a alínea anterior, foi remetida a informação n.° 447/DAAJ/2011, onde se lê (cfr. documento de fls. 125 dos autos):


i) A 22/05/2011, a impugnante deduziu reclamação graciosa contra a liquidação de tarifa de ligação de Esgotos, no valor de 1.229.420,95 euros (cfr. documento de fls. 23 do PAT)
j) A reclamação graciosa foi indeferida (cfr. documento de fls. 118 dos autos);
k) O imóvel a que respeita a taxa de ligação, corresponde a um centro comercial, com sete pisos (cfr alegacão da impugnante, não controvertido);
l) Dos sete pisos, cinco são destinados a estacionamento e armazenamento (cfr. alegação da impugnante, não controvertido);


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Não há factos alegados e não provados com interesse para a decisão da causa.
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Os factos provados assentam na análise crítica dos documentos juntos aos autos e não impugnados, conforme se indica em cada alínea do probatório.

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2.2.- Motivação de Direito

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho) ex vi do artigo 2º, al. e) do CPPT.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida na sentença a qual julgou totalmente improcedente a acção, padece de erro de julgamento ao considerar que:
(i) - a T.L.E. ("tarifa de ligação de esgotos") é uma taxa e não um imposto ou outra espécie de tributo residual;
(ii) - a T.L.E., sendo um imposto, é organicamente inconstitucional por violação do princípio de reserva de lei;
(iii) - a T.L.E. é materialmente inconstitucional, por determinar uma restrição do direito de propriedade em violação do princípio da proporcionalidade;
(iv) - a T.L.E., desrespeitando o princípio da equivalência, é ilegal por violação do art. 4.° do R.G.T.A.L.;
(v) - a T.L.E. é ilegal por falta de fundamentação económico-financeira.
Vejamos cada um dos vícios pela ordem exposta, sendo certo que a questão nuclear objecto do presente recurso se conecta com a legalidade da liquidação “Tarifa de Ligação de Esgotos” operada pelos SMAS de Oeiras e Amadora do Município de Oeiras, titulada pela factura nº 1100063, de 18/02/2011, no valor de €1.229.420,95, relacionada com o imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o nº3264, da freguesia da ………, de que é proprietária em 72%.
Assim:
Alega a Recorrente que a T.L.E. ("tarifa de ligação de esgotos") é uma taxa e não um imposto ou outra espécie de tributo residual.
Entende-se ser relevante para uma rigorosa definição da natureza do tributo controvertido e uma decisão conscienciosa da demanda, a fixação do quadro legal a que está submetido desde há muito tempo, no que seguiremos de perto a recensão da legislação que foi sendo aplicável nesta matéria empreendida no acórdão deste Supremo Tribunal 10 de Abril de 2013, do Pleno da Secção, proferido no processo n.º 15/12, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/2e3543370a405cd080257b5900343163.
A Lei nº 1/87, de 6 de Janeiro, estabelecia no seu artº 4º, nº 1, alínea h) que constituíam receitas do município: o produto da cobrança de taxas ou tarifas resultantes da prestação de serviços pelo município.
O artº 11º do mesmo diploma indicava depois as taxas que os municípios podiam cobrar, regulando o artº 12º as tarifas, indicando o seu nº 1 que estas respeitavam às seguintes actividades:
a) Abastecimento de água;
b) Recolha, depósito e tratamento de lixos, bem como ligação, conservação e tratamento de esgotos;
c) Transportes urbanos colectivos de pessoas e mercadorias.
O nº 2 do mesmo artigo estabelecia que as tarifas a fixar pelos municípios não deviam ser inferiores aos respectivos encargos previsionais de exploração e de administração, acrescidos do montante necessário à reintegração do equipamento, sob pena de ter de inscrever obrigatoriamente como despesa o montante correspondente à indemnização compensatória (nº 3).
O artº 23º, nº 5 do mesmo diploma estabelecia ainda que competia aos tribunais tributários de 1ª instância a cobrança coerciva de dívidas às autarquias locais provenientes de impostos, derramas, taxas e encargos de mais-valias, aplicando-se com as necessárias adaptações, os termos estabelecidos no CPCI. (É de notar que não estão aqui incluídas as tarifas e preços atrás referidos pelo que, à primeira vista, seríamos levados a concluir pela não cobrança desses em execução fiscal; adiante veremos que não era esta a conclusão retirada pela jurisprudência deste STA).
O artº 16º da Lei nº 42/98, de 6 de agosto, veio determinar na sua alínea d) que constituíam receitas dos municípios: o produto da cobrança de taxas, tarifas e preços resultantes da prestação de serviços pelo município.
O artº 19º indicava depois e também como a anterior Lei, as taxas que os municípios podiam cobrar, dizendo o artº 20º quanto a tarifas e preços o seguinte:
“1- As tarifas e preços a cobrar pelos municípios respeitam, designadamente, às actividades de exploração de sistemas públicos de:
a) Distribuição de água;
b) Drenagem de águas residuais;
c) Recolha, depósito e tratamento de resíduos sólidos;
d) Transportes colectivos de pessoas e mercadorias;
e) Distribuição de energia eléctrica em baixa tensão.
2 - Os municípios podem ainda cobrar tarifas por instalação, substituição ou renovação dos ramais domiciliários de ligação aos sistemas públicos de distribuição de água e de drenagem de águas residuais.
3 - As tarifas e os preços, a fixar pelos municípios, relativos aos serviços prestados e aos bens fornecidos pelas unidades orgânicas municipais e serviços municipalizados, não devem, em princípio, ser inferiores aos custos directa e indirectamente suportados com o fornecimento dos bens e com a prestação dos serviços”.
Relativamente à cobrança coerciva o nº 4 do artº 30º veio manter a execução fiscal nos seguintes termos:
“4- Compete aos órgãos executivos, à excepção dos municípios de Lisboa e do Porto, em que a competência coerciva das dívidas às autarquias locais provenientes de taxas, encargos de mais-valias e demais receitas de natureza tributária que aquelas devam cobrar, aplicando-se o Código de Processo Tributário, com as necessárias adaptações”. (É de notar que também neste diploma se faz apenas referência às taxas e não às tarifas e preços).
O artº 10º, nº 1 da Lei nº 2/2007 de 15 de janeiro, veio determinar na sua alínea c) que constituíam receitas dos municípios: o produto da cobrança de taxas e preços resultantes da concessão de licenças e da prestação de serviços pelo município, de acordo com o disposto nos artigos 15º. e 16º.
Assim, os municípios podiam criar taxas nos termos do regime geral das taxas das autarquias locais, ficando esta criação subordinada aos princípios da equivalência jurídica, da justa repartição dos encargos públicos e da publicidade, incidindo sobre utilidades prestadas aos particulares, geradas pela actividade dos municípios ou resultantes da realização de investimentos municipais (artº 15º).
Relativamente a preços, o artº 16º estabelecia no seu nº 3 que os mesmos poderiam incidir sobre actividades de exploração de sistemas municipais ou intermunicipais de:
a) Abastecimento público de água;
b) Saneamento de águas residuais;
c) Gestão de resíduos sólidos;
d) Transportes colectivos de pessoas e mercadorias;
e) Distribuição de energia eléctrica em baixa tensão.
Quanto à fixação dos preços os nºs 1 e 2 do mesmo artigo estabeleciam o seguinte:
″1- Os preços e demais instrumentos de remuneração a fixar pelos municípios relativos aos serviços prestados e aos bens fornecidos em gestão directa pelas unidades orgânicas municipais ou pelos serviços municipalizados não devem ser inferiores aos custos directa e indirectamente suportados com a prestação desses serviços e com o fornecimento desses bens.
2 - Para efeitos do número anterior, os custos suportados são medidos em situação de eficiência produtiva e, quando aplicável, de acordo com as normas do regulamento tarifário em vigor”.
O nº 4 do mesmo artigo estabelecia ainda que, relativamente às actividades mencionadas no número anterior, os municípios deviam cobrar preços nos termos de regulamento tarifário a aprovar.
Relativamente à cobrança coerciva das dívidas, esta Lei continha no seu artº 56º, nº 3, norma semelhante às anteriores leis e do seguinte teor:
“3- Compete aos órgãos executivos a cobrança coerciva das dívidas às autarquias locais provenientes de taxas, encargos de mais-valias e outras receitas de natureza tributária que aquelas devam cobrar, aplicando-se o Código de Procedimento e de Processo Tributário, com as necessárias adaptações”.
Cabe ainda aqui referir que, anteriormente à publicação da Lei nº 2/2007, de 15 de Janeiro (mas para entrar em vigor na mesma data daquela), tinha sido publicada a Lei nº 53-E/2006, de 29 de dezembro que aprovou o regime geral das taxas das autarquias locais.
Deste diploma e para a questão que nos ocupa, relevam as seguintes normas:
“As taxas das autarquias locais são tributos que assentam na prestação concreta de um serviço público local, na utilização privada de bens do domínio público e privado das autarquias locais ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares, quando tal seja atribuição das autarquias locais, nos termos da lei (artº 3º).
“1- As taxas municipais incidem sobre utilidades prestadas aos particulares ou geradas pela actividade dos municípios, designadamente:
a) Pela realização, manutenção e reforço de infra-estruturas urbanísticas primárias e secundárias;
b) Pela concessão de licenças, prática de actos administrativos e satisfação administrativa de outras pretensões de carácter particular;
c) Pela utilização e aproveitamento de bens do domínio público e privado municipal;
d) Pela gestão de tráfego e de áreas de estacionamento;
e) Pela gestão de equipamentos públicos de utilização colectiva;
f) Pela prestação de serviços no domínio da prevenção de riscos e da protecção civil;
g) Pelas actividades de promoção de finalidades sociais e de qualificação urbanística, territorial e ambiental;
h) Pelas actividades de promoção do desenvolvimento e competitividade local e regional.
2- As taxas municipais podem também incidir sobre a realização de actividades dos particulares geradoras de impacto ambiental negativo. (artigo 6º).
“2- As dívidas (resultantes de taxas) que não forem pagas voluntariamente são objecto de cobrança coerciva através de processo de execução fiscal, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário (artº 12º).
O certo é que a ajuizada T.L.E. se encontra prevista no artº.65.° n.º 1 do Regulamento de Drenagem e Águas Residuais dos SMAS de Oeiras e da Amadora, o qual se encontra publicado pelo aviso n.º 891/97, no D. R. IIª Série, de 9/7/97, e foi aplicada pela ligação do prédio ao sistema de drenagem pública.
E, como vimos, de acordo com o disposto nos arts. 4.º, n.º 1, alínea h), e 12.º, n.º 1, alínea b), da Lei das Finanças Locais em vigor em 1996 (Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro) são receitas dos municípios «o produto da cobrança de taxas ou tarifas resultantes da prestação de serviços pelo município» respeitando estas tarifas, entre outras, às actividades de «ligação, conservação e tratamento de esgotos».
A tarifa de ligação de esgotos vem correctamente consagrada no disposto na alínea c) do art.° 10 da Lei n.°2/2007, de 15 de Janeiro (Lei das Finanças Locais), constituindo receita do município, tendo sido criada por deliberação da Assembleia Municipal de Oeiras, de 22 de Abril de 1997 e devidamente consagrada no Regulamento de Drenagem de Águas Residuais dos SMAS de Oeiras e Amadora, com entrada em vigor no dia seguinte à sua publicação no Diário da Republica, através do Aviso n.º 891/97 (II série), apêndice n.º 56, II série, n.°156 de 9 de Julho de 1997.
A criação desta tarifa prende-se com encargos de instalação das redes de saneamento, sendo liquidada e cobrada uma só vez, aquando da ligação do prédio ao sistema de drenagem residual e da responsabilidade de quem procede à inscrição do prédio na matriz, pessoa que deverá ser notificada para o seu pagamento (Cfr. art.° 64.° a 69.° do N/Regulamento de Drenagem de Águas Residuais).
No que tange à fórmula de cálculo da percentagem da tarifa de ligação, institui a Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, no seu art.º 64.º, n.º 1 al. j), que é competência do Município, fixar as tarifas e os preços da prestação de serviços ao público pelos serviços municipais ou municipalizados, já anteriormente consagrada na Lei n.º 100/84, de 29 de Março.
E a percentagem fixada resulta da Lei e vem consagrada nos termos do n.º 2 do art.° 12.° do Decreto-Lei n.º 158/70 de 13 de Abril, que referencia que "a taxa de ligação não poderá exceder 10% do rendimento colectável do prédio", tendo a Câmara Municipal de Oeiras, em reunião ordinária de 19 de Dezembro de 1990, aprovado a percentagem referente a esta tarifa em 0,7% do valor patrimonial do imóvel, hoje designado valor tributável por força da entrada em vigor do CIMI.
Neste desiderato e como bem enfatizam o Recorrido e o Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal, as designadas tarifas de conservação dos esgotos e tarifas de ligação de impostos devem considerar-se verdadeiras taxas, como reiteradamente tem vindo a afirmar a jurisprudência desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, citando-se, por todos, os acórdãos de 10 de Abril de 2013, do Pleno da Secção, proferido no processo n.º 15/12, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/2e3543370a405cd080257b5900343163 e de 31 de Março de 2016, proferido no processo n.º 244/16, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/7a443bff8ff2c41f80257f8d005203d6.) e do Tribunal Constitucional.
Cfr. no mesmo sentido a jurisprudência citada por JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, I volume, anotação 18 ao art. 16.º, págs. 235/236.).
Sustenta a recorrente que a taxa em causa tem por base o valor patrimonial dos prédios, aferindo-se, em função da capacidade contributiva do sujeito passivo, sendo totalmente alheia ao custo ou ao benefício do serviço prestado, por isso não se tratando de uma taxa, mas de um efectivo e genuíno imposto.
A sentença recorrida considera que a taxa de conservação de esgotos impugnada é uma verdadeira taxa e não um imposto e que os diplomas legais e regulamentares que a regulamentam não sofrem de qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade, nomeadamente por violação dos princípios da proporcionalidade.
A questão sub judice tem sido objecto de jurisprudência consolidada desta secção do Supremo Tribunal Administrativo a qual vem decidindo, de forma unânime, que a tarifa de conservação de esgotos, por ter natureza sinalagmática, é de qualificar como uma verdadeira taxa, e não como um imposto – vide, neste sentido, Acórdãos de 29-3-1995, recurso n.º 18725, AP-DR de 31-7-97, página 942 de 11-3-1998, recurso n.º 20485, AP-DR de 8-11-2001, página 773, de 25-11-1998, recurso n.º 22593, AP-DR de 21-1-2002, página 3276, de 22-5-2002, recurso n.º 26472, AP-DR de 8-3-2004, página 1626, de 31-3-2004, recurso n.º 1921/03, de 28-9-2006, recurso n.º 605/06 de 15-11-2006, recurso n.º 566/0, de 22-11-2006, recurso n.º 803/06 e de 27.06.2007, recurso 236/07, os cinco últimos in www.dgsi.pt.
Tal questão foi igualmente apreciada pelo Tribunal Constitucional que, nos seus Acórdãos de 652/2005, de 2-11-2005, Diário da República, II Série, de 5-1-2006, 52/2006, de 17-1-2006, e 68/07, de 30.01.2007, doutrinou que a prestação devida às Câmaras Municipais pela conservação da rede de esgotos configura um tributo com a natureza de taxa vincando, em abono da qualificação jurídica desse tributo como, que não se pode considerar que o critério da determinação do montante do tributo, ou seja, o valor patrimonial do prédio, seja completamente alheio à utilidade que o particular retira dele, justamente por evitar a depreciação do valor desse mesmo prédio (Acórdão 68/07).
A questão levantada pela recorrente implica que se esclareça explicite o conceito de taxa na vertente do seu carácter bilateral e sinalagmático.
Nesse sentido, expende Nuno Sá Gomes in Manual de Direito Fiscal, vol. I, pag. 76, que «a única característica distintiva das taxas em face ao imposto não está na utilidade, nem na voluntariedade nem na solicitação dos serviços pelos particulares, mas apenas no carácter sinalagmático das primeiras em termos de equivalência jurídica mas não também económica da prestação devida. Por isso na taxa não basta existir uma contrapartida jurídica de carácter genérico, como sucede nas contribuições especiais, sendo necessário que seja satisfeita uma contraprestação individual exigível pelo devedor, como tem sido jurisprudência do STA».
A relação sinalagmática, como se salienta no Acórdão Tribunal Constitucional 365/03 «há-de ter um carácter substancial ou material, e não meramente formal; isso não implica, porém, que se exija uma equivalência económica rigorosa entre ambos, não sendo incompatível com a natureza sinalagmática da taxa o facto de o seu montante ser “superior (e, porventura, até consideravelmente superior) ao custo do serviço prestado»”.
O que não pode é ocorrer uma «desproporção intolerável» (Acórdão do Tribunal Constitucional nº 1140/96, in DR II Série, de 10/2/97)”, ou seja, “manifesta” e comprometedora, “de modo inequívoco, da correspectividade pressuposta na relação sinalagmática”, sendo certo que a sua aferição há-de tomar em conta, não apenas o valor da quantia a pagar, mas também a utilidade do serviço prestado».
Flui dessa linha de entendimento que é pela natureza da contraprestação da entidade pública que terá de ser aferida a correspectividade distintiva da taxa.
In casu, é indubitável que existe equivalência jurídica das contraprestações, pois são os proprietários dos prédios quem retira vantagem directa do facto dos seus prédios disporem de rede geral de esgotos em bom estado de conservação e manutenção, independentemente do grau, maior ou menor de utilização que dêem ao prédio em causa.
Doutra banda, no que respeita ao cálculo do montante do tributo ser baseado no valor patrimonial dos imóveis, releva que se trata de uma forma de determinação desse montante que não se demonstra ser desajustada para repartir os encargos da conservação da rede de esgotos pela generalidade dos munícipes, pois tendencialmente os valores patrimoniais mais elevados corresponderão a imóveis de maior dimensão, habitados por maior número de utentes – cf. neste sentido, o já referido Acórdão 605/06.
Igualmente o Tribunal Constitucional (Acórdão 60/07 de 30.01.2007 in http://www.tribunalconstitucional.pt) enfatiza a respeito da correspectividade entre a taxa e o benefício da utilização do bem, que «influindo na determinação do valor patrimonial circunstâncias como o tipo, dimensão e localização do imóvel, então, quanto maior for o seu valor patrimonial, maior será, tendencialmente, a sobrecarga por ele aduzida ao colector geral de esgotos (desde logo, porque um imóvel de menor valor patrimonial, por contraposição com um outro de maior valor, terá, presumivelmente, menor capacidade de suporte de pessoas ou estará inserido em zona menos densamente povoada; e se maior é a sobrecarga, maior serão, consequentemente, os encargos com a manutenção e conservação, quando não, mesmo, com o reforço das infra-estruturas).».
Aderindo de pleno a essa jurisprudência, impõe-se a conclusão de que a tarifa de conservação de esgotos, por ter natureza sinalagmática, é de qualificar como uma verdadeira taxa, e não como um imposto.
Improcedem, pois, nesta parte as alegações de recurso.

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A recorrente sustenta ainda que a T.L.E., sendo um imposto, é organicamente inconstitucional por violação do princípio de reserva de lei.

Do que ficou dito, já resultaria implicitamente a improcedência desse fundamento.
De todo o modo, sempre se aditará que a T.L.E., estando abrangida na previsão normativa do art. 65.° n.º 1 do dito Regulamento, não sendo de qualificar como imposto, nem outra espécie de tributo residual, antes devendo acolher a sua qualificação como uma taxa nos termos previstos no art. 3.° n.° 2 da L.G.T. e como tem sido reiteradamente decidido pelo S.T.A. nos citados arestos, não ocorre a invocada inconstitucionalidade por violação da reserva de lei.
Improcedem por isso, as atintes conclusões recursórias.
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Já quanto a saber se a T.L.E. é materialmente inconstitucional, por determinar uma restrição do direito de propriedade em violação do princípio da proporcionalidade, por determinar uma restrição do direito de propriedade em violação do princípio da proporcionalidade, desrespeitando, outrossim, o princípio da equivalência, e, ainda à ilegalidade por violação do art. 4.° do R.G.T.A.L., entende-se que a sentença recorrida não é passível das censuras que lhe são deferidas nas atinentes conclusões.
No ponto e na senda da jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo fixada, além de outros, no Acórdão 236/07 de 27.06.2007, a determinação do montante do tributo com base no valor patrimonial dos imóveis não se mostra desajustada para repartir os encargos da conservação da rede de esgotos pela generalidade dos munícipes, pois tendencialmente os valores patrimoniais mais elevados corresponderão a imóveis de maior dimensão, habitados por maior número de utentes.
Com efeito, já antes se deslindava na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo que “I - A tarifa de ligação de esgotos representa a contrapartida pelo bem utilizado da ligação do prédio a uma rede de esgotos instalada. II - A tarifa fixada em 0,7% do valor patrimonial do prédio a cuja ligação se refere não é constitucionalmente desproporcionada. IV - As tarifas apenas estão sujeitas ao princípio de legalidade administrativa e não também ao da legalidade tributária." (cfr. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido, em 4 de Fevereiro de 1998, no processo n.º 021513).
Estamos em presença do fornecimento de bens por parte dos municípios que visam satisfazer essencialmente necessidades privadas, mas porque, segundo a concepção política dominante na sociedade se entende que esses bens deverão ser propiciados segundo uma lógica independente da do mercado, "fundando-se em razões distintas, como a justa distribuição dos encargos públicos, ou em considerações de ordem política, como a de facilitar ou dificultar o acesso a certos bens ou serviços”, o legislador confere a possibilidade aos municípios de subtraírem a fixação das contraprestações pela utilização desses serviços ou bens à lógica ou às regras do mercado e submeterem-nas a critérios diferentes, fixando-as autoritariamente, se bem que, - e aqui apela-se a um elemento comum na formação do preço na lógica do mercado -, não “devam, em princípio, ser inferiores aos custos directa e indirectamente suportados com o fornecimento dos bens e com a prestação dos serviços”, de acordo com o comando normativo ínsito no nº 3 do artº 20º da Lei nº 42/98.
Como consagrou o Tribunal Constitucional nos seus acórdãos nºs 1139/96 (D.R., II Série, de 10/02/1997) e 76/88 (DR, II Série, de 21/04/1988), “uma tarifa, no campo das finanças locais, se não delineia como uma figura em absoluto nova, ou seja, como uma espécie de tertium genus entre taxa e imposto”, apresentando-se «de facto, e sob todos os aspectos», como uma simples taxa, embora taxa sui generis «cuja especial configuração lhe advém apenas da particular natureza dos serviços a que se encontra ligada”, sendo que a «tarifa, se ao nível da lei ordinária pode ter significação própria, não releva, porém, numa perspectiva constitucional, pelo que, nesta óptica, ela constitui apenas uma modalidade especial de taxa e nada mais».
Também este Supremo Tribunal, quer anteriormente àquele acórdão do TC (v., entre muitos, os acórdãos de 15.06.2000 – Processo nº 024153 e de 09.10.1996- Processo nº 019322- Apêndice ao DR, de 28.12.1998, págs. 2759 e segs.), quer posteriormente (v., entre outros, os acórdãos de 22.05.2002 -Processo nº 026472 e de 31.03.2004- Processo nº 01921/03), repetiu o mesmo entendimento de que a tarifa não constitui um tertium genus entre o imposto e a taxa, não tendo verdadeira autonomia conceitual, caracterizando-se, afinal, por não dever ser inferior ao preço do serviço prestado.
Na Doutrina, o Professor Casalta Nabais, por referência ao conceito de tarifas, expendeu o seguinte (Cadernos de Justiça Administrativa, nº 6, 1997, págs. 48 e segs.):
“…no concernente às tarifas, é de referir que elas integram um conceito polissémico, relativamente ao qual é possível detectar, pelo menos, quatro sentidos, que podemos designar por sentido normativo, sentido financeiro, sentido tributário e sentido fiscal (ou melhor, aduaneiro).
…Em sentido financeiro, por seu turno, as tarifas significam, ou podem significar, duas coisas. Umas vezes, referem-se elas aos quadros donde constam, de um lado, as unidades de consumo e, de outro, os respectivos preços: se em tais quadros figura apenas uma unidade de consumo por cada quadro, temos tarifas unitárias; se neles figuram mais do que uma unidade de consumo, então temos tarifas múltiplas. Nesta versão, as tarifas constituem quadros de unidades de consumo dos serviços públicos e dos correspondentes preços, ou seja, tabelas ou listas de preços (s). A maioria das vezes, porém, as tarifas em sentido financeiro referem-se, não aos mencionados quadros, listas ou tabelas, mas aos preços dos serviços públicos prestados pelas administrações públicas ou pelos concessionários, sejam os mesmos preços públicos ou privados, ou seja, trate-se de tarifas públicas ou privadas.
Neste caso, as tarifas reconduzem-se aos preços dos serviços públicos, relativamente aos quais se põe o problema de saber qual o exacto âmbito dessa figura financeira, ou seja, se abarcam todos e quaisquer preços dos serviços públicos, sejam estes voluntariamente estabelecidos ou autoritariamente fixados, se dizem respeito apenas aos preços voluntariamente estabelecidos, ou se integram somente os preços autoritariamente fixados. Enquanto na primeira hipótese as tarifas constituem uma figura complexa, pois integram, de um lado, um especial tipo de taxas ou preços públicos e, de outro, os preços, na segunda temos unicamente preços, e, na terceira, deparamo-nos com uma figura tributária em sentido estrito, ou seja, com um tributo bilateral ou uma taxa.
E aqui temos as tarifas em sentido tributário, constituídas assim pelos preços dos serviços públicos autoritariamente fixados. Em nossa opinião, este devia ser o sentido reservado para as tarifas, um sentido que, como vamos ver, de algum modo está subjacente à Lei das Finanças Locais (arts. 11º e 12º). Neste último sentido as tarifas, como dissemos, constituem um especial tipo de taxas ou preços públicos. Um especial tipo de taxas que tem de específico o facto de não dizerem respeito a serviços públicos que sejam por essência da titularidade do Estado, uma vez que não correspondem às funções institucionais fundamentais próprias da Administração Pública nem visam, por conseguinte, a realização dos fins estaduais primários. Por isso, podem tais serviços ser objecto de oferta e procura e susceptíveis, assim, de uma avaliação em termos de mercado. Por outras palavras, trata-se de taxas equivalentes, de taxas cujo montante não deve, assim, ser inferior ao efectivo custo do correspondente serviço. Um sentido que, acentue-se, está patente no mencionado artº. 12º da Lei das Finanças Locais, ao dispor, no nº 1, que as tarifas respeitam às actividades de abastecimento de água, de recolha, tratamento e depósito de lixos, de ligação, conservação e tratamento de esgotos e de transportes urbanos colectivos de pessoas e de mercadorias, e ao estabelecer, no n° 2, o princípio de que os montantes das tarifas não devem ser inferiores aos respectivos encargos provisionais de exploração e de administração, acrescidos do montante necessário à reintegração do equipamento. Assim as tarifas equiparam-se, de algum modo, às redevances do direito francês, aos precios publicos do direito espanhol, etc".
Como enfatiza Sérgio Vasques - Manual de Direito Fiscal, Almedina, Coimbra, 2011, págs. 208 e segs., ainda que as taxas sejam exigidas em virtude da prestação de bens ou serviços, dando corpo a uma relação de troca com os contribuintes, elas não deixam de possuir natureza coativa, característica de todos os tributos públicos.
E acrescenta o mesmo autor que dois critérios materiais relevantes para a distinção entre preços e taxas são o do regime económico em que é realizada a prestação administrativa e o da indispensabilidade que essa prestação administrativa reveste para o particular.
Assim, estaremos perante uma taxa (como no caso concreto) quando, por razões de direito ou de facto, não se encontrem no mercado prestações sucedâneas daquelas que a administração realize e o particular se veja por isso verdadeiramente coagido ao seu consumo (ou, por outras palavras, quando o aproveitamento da prestação administrativa se revela imprescindível para a sobrevivência condigna do particular, atentos os padrões sociais de cada momento e de cada lugar).
Como é manifesto, no caso em análise é inquestionável a indispensabilidade do serviço de abastecimento de água e saneamento básico, tanto mais que a própria Assembleia Geral da ONU reconheceu como direito fundamental do cidadão o abastecimento de água potável e o saneamento básico, enquanto realização do direito à saúde e a um nível de vida adequado.
Em face do que ficou dito concluímos então no sentido de que não ocorre a compressão do direito de propriedade nos termos configurados pela recorrente, até porque tal direito não é absoluto estando legitimada a sua limitação.
Com efeito e como se enfatizou no Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 23.11.2006, proferido no recurso 803/06 (publicado em www.dgsi.pt.), a quantificação da dita tarifa, em “0,25% do valor patrimonial do prédio”, «não pretende expressar a capacidade contributiva do proprietário mas apenas estabelecer um critério de remuneração que traduza monetariamente o serviço prestado. (…) «O legislador, no uso da sua ampla liberdade de conformação legislativa, e dentro dos parâmetros constitucionais, entendeu que a utilização (ou a possibilidade de utilização) da rede de esgotos devia ser “tarifada”, em vista do respectivo dever de conservação, por um quantitativo pecuniário correspondente àqueles 0,25%. Como poderia ter utilizado qualquer outro critério que não ferisse o princípio da proporcionalidade».
Trata-se, é certo, de um critério discutível, e bem poderia ter sido utilizado outro, v.g. indexação aos consumos de água de abastecimento público, porventura menos controverso.
Mas o certo é que não é a capacidade contributiva do proprietário que é taxada mas sim o serviço prestado pela Administração.
Outrossim, a determinação do montante do tributo com base no valor patrimonial dos imóveis, não se mostra arbitrária, desrazoável, ou desajustada para repartir os encargos da conservação da rede de esgotos pela generalidade dos munícipes, antes contempla uma correcta ponderação de interesses relevantes, pois tendencialmente, e por regra, os valores patrimoniais mais elevados corresponderão a imóveis de maior dimensão, habitados por maior número de utentes.
Quanto à proporcionalidade da Tarifa de Ligação de Esgotos, alega a Recorrente que “O imóvel sobre o qual incide é um centro comercial, no qual a intensidade da utilização de saneamento não é, de todo, coincidente ou proporcional à dimensão do imóvel. Ao utilizar-se o valor patrimonial como base de incidência, está a tratar-se um centro comercial, para efeitos de ligação de esgotos, como se fosse um prédio de habitação ou um imóvel afecto a uma indústria (cimenteira têxtil, etc.), em que a utilização do saneamento é bastante mais intensa” (cfr. pág. 12/36 das alegações de recurso).
Como bem nota a entidade recorrida, é certo que a comparação entre a intensidade de utilização de saneamento entre um prédio de habitação e um centro comercial não é comparável, mas em desfavor deste último uma vez que, contrariamente ao sucede num prédio que, no máximo, será utilizado por centenas de pessoas, o centro comercial é utilizado diariamente por milhares de pessoas, entre funcionários, clientes, fornecedores, entre outros. Conclui-se, pois, que evidentemente a intensidade de utilização do saneamento em centros comerciais — no caso concreto com cinco pisos de estacionamento e armazenamento -, como sucede no caso vertente, é muito superior a uma edificação habitacional e comparável a uma instalação industrial de grandes dimensões. Esta é aliás uma evidência que é esclarecida pela douta Sentença recorrida que sublinha, ao pronunciar-se sobre a proporcionalidade da Tarifa de Ligação de Esgotos, que “E quanto ao desrespeito do princípio da proporcionalidade, importa afastar, no caso, também a existência de um desproporção intolerável, visto que no caso que nos ocupa, em concreto, o prédio é utilizado como Superfície Comercial e visitado por milhares de pessoas, todas as semanas, o que é fácil depreender dos cinco pisos, destinados de estacionamento e armazenamento, pelo que não se oferece aquela taxa como de montante intolerável, visto que, como refere o relator do acórdão, também aqui o elevado VPT corresponde a um maior nível de ocupação, com sobrecarga para o sistema público de esgotos." (cfr. págs. 18 e 19 da Sentença recorrida).”
Na mesma senda se pronunciou o EPGA no seu douto Parecer que, com a devida vénia, se excerta:
“A recorrente parte de violação do princípio da proporcionalidade ou da equivalência para considerar estar-se face a imposto e não taxa.
No entanto, mesmo para quem defenda que o montante da taxa tem de ser de montante próximo do custo ou das prestações a compensar, não resulta a transformação noutra categoria tributária, mas apenas inconstitucionalidade (por violação do princípio da igualdade tributária acolhido no art. 13.° da C.R.P. como expressão no referido princípio da equivalência) - assim, Sérgio Vasques em Manual de Direito Fiscal, 2.ª ed. p. 315. 
A T.L.E. em causa encontra-se prevista no Regulamento de Drenagem e Águas Residuais dos SMAS de Oeiras e da Amadora, o qual se encontra publicado através do aviso n.° 891/97, no D. R. II s. de 9/7/97.
E a T.L.E. foi aplicada pela ligação do prédio ao sistema de drenagem pública.
Tal é suscetível de indiciar uma compensação pelos respetivos custos, conforme decidido no acórdão n.° 68/2007 do Tribunal Constitucional que se pronunciou quanto àquela tarifa, ainda que tenha decidido apenas no sentido da não inconstitucionalidade da taxa de conservação de esgotos.

Por outro lado, e quanto à violação da restrição do direito de propriedade por violação do princípio da proporcionalidade:
Conforme decidido no referido ac. 68/07 do TC não ocorre inconstitucionalidade quanto a tarifa resultante da consideração do V.P.T.
Com efeito, conforme se fundamenta nesse acórdão, a utilização do V.P.T. não é um critério totalmente alheio ao custo ou à utilidade extraída pelo contribuinte do serviço em questão.
Contudo, no caso a taxa aplicada foi apenas de 0,25%, e para efeitos de uma tarifa de conservação de esgotos, diferente do que no presente caso ocorre.
A inconstitucionalidade por violação do princípio da proporcionalidade depende, segundo o T.C., da existência de uma manifesta desproporção.
Na sentença recorrida considerou-se que tratando-se de um Centro Comercial de 7 pisos, sendo visitado por milhares de pessoas todas as semanas, não ocorre tal desproporção.
A referida jurisprudência do S.T.A. há muito considerou razoável a aplicação de uma taxa de 0,7% quanto à T.L.C, bem como ser de considerar o referido princípio de equivalência como mínimo atendível.”
Termos em que improcedem os fundamentos de recurso sob análise.
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Vejamos, por fim, se a T.L.E. é ilegal por falta de fundamentação económico-financeira.
Nesta vertente, esgrime a recorrente que ao contrário do que eventualmente possa parecer, a exigência de que os regulamentos de taxas contenham a justificação económico-financeira de cada uma delas não equivale sequer à imposição de um esforço exagerado dos municípios, pois que lhes é bastante fácil apurar todos os custos incorridos com a construção ou criação de infra-estruturas subjacentes às prestações públicas que reclamam o pagamento de taxas, uma vez que esse apuramento pode e deve assentar em larga medida nos princípios, métodos e conceitos de que faz parte a contabilidade local.
Mais aduz que na situação em apreço, a justificação económico financeira da TLE não consta do Regulamento, como não consta da notificação da taxa, nem da posterior notificação da fundamentação do ato.
Ainda sustenta que a justificação económico-financeira das taxas não é uma obrigação que tenha nascido com o RGTAL. Ao invés, o que este fez foi simplesmente codificar, dar expressão escrita, a uma obrigação unanimemente se reconhece existir desde antes daquele regime geral, na mesma medida em que o princípio da equivalência - do qual a justificação económico financeira das taxas é uma concretização - também existe há muito, independentemente do RGTAL, como critério essencial de validade da figura das taxas.
Quid juris?
No que tange a este segmento recursivo, não subsistem dúvidas de que o facto tributário da Taxa de Ligação de Esgotos referente ao ano de 2009 ocorreu nesse mesmo ano.
E é inquestionável que o artigo 8.°, n.° 2, alínea c), do RGTAL, impõe que “2 - O regulamento que crie taxas municipais ou taxas das freguesias contém obrigatoriamente, sob pena de nulidade: c) A fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, designadamente os custos directos e indirectos, os encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia local;".
Há ainda que atentar no determinado no artigo 17.°, alínea a), do RGTAL que estabelece o regime transitório estabelece que “As taxas para as autarquias locais actualmente existentes são revogadas no dia 30 de Abril de 2010, salvo se, até esta data: a) Os regulamentos vigentes forem conformes ao regime jurídico aqui disposto;”.
Do que vem dito decorre com inteira clareza que uma vez que o facto tributário da Tarifa de Ligação de Esgotos ocorreu em 2009, o Regulamento que consagrava a Tarifa de Ligação de Esgotos não estava, por força do regime transitório previsto no artigo 17.°, alínea a), do RGTAL, obrigado a conter a fundamentação económico-financeira relativa ao valor da Tarifa de Ligação de Esgotos.
Vale isto por dizer que estando em causa uma Tarifa cujo facto gerador ocorreu em 2009, ou seja, durante o período transitório previsto no artigo 17.°, alínea a), do RGTAL, o Regulamento de Drenagem de Águas Residuais da Câmara Municipal de Oeiras, de 22 de Abril de 1997, ainda era aplicável à situação em apreço, independentemente da data em que ocorreu a data limite de pagamento.
Ao lavrar nesse entendimento, a sentença recorrida é assertiva ao expender que “Como decorre das normas transcritas, a publicação do RGTAL, em 29/12/2006, com entrada em vigor 1/01/2007, implicou que, sob pena de nulidade, os regulamentos de aprovação de regulamentos prevendo taxas das AL passassem a conter um conjunto de elementos, entre os quais, a fundamentação económico financeira relativa ao valor das taxas. Por sua vez, o artigo 17.° do mesmo corpo de normas, dava até 30/04/2010 para que os regulamentos já aprovados viessem a pôr-se conforme as novas exigências contidas no RGTAL, sob pena de serem revogados. Assim sendo, para determinar se o regulamento que criou a tarifa de ligação de esgotos que aqui nos ocupa, o Regulamento de Drenagem de Águas Residuais da Câmara Municipal de Oeiras, de 22/04/1997 podia ser aplicado à situação sub judice, há que verificar se o facto tributário data de momento anterior a 30/04/2010, independentemente da data em que se procedeu à liquidação.” (cfr. pág. 9 da Sentença recorrida).
Não obstante, sufraga-se a tese da entidade recorrida no sentido de que foram acatados os ditames da fundamentação do acto porquanto “…a Tarifa de Ligação de Esgotos está devidamente consagrada na Lei das Finanças Locais, constituindo receita do Município, fixada por deliberação da Assembleia Municipal de Oeiras de 22 de abril de 1977 e melhor plasmada no Regulamento de Drenagem de Águas Residuais dos SMAS de Oeiras e Amadora, cujos princípios reguladores melhor vertidos se encontram no Decreto Regulamentar n° 93/95 de 23 de agosto bastará o simples facto da liquidação com a efectiva notificação da fundamentação de facto e de direito melhor expressa pela leitura da cópia da factura junto ao processo administrativo e para cujo texto se remete, para se constatar a efectiva fundamentação de facto e de direito da liquidação do ato tributário em crise.
Sem prejuízo de, e no caso em concreto, a pedido da Recorrente, lhe ter sido remetido ofício que fundamentou de facto e de direito a liquidação da Tarifa de Ligação de Esgotos conforme melhor se afere pela cópia junto ao processo administrativo para cujo texto se remete e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (cfr. alínea g), da matéria de facto dada como provada pela Sentença recorrida).
Acresce que, aquela fundamentação resulta também do Regulamento publicado, a fls. 109 e seguintes do Diário da República – 2ª Série - n.º 156 - Apêndice n.° 56, de 9 de julho de 1997, pelo Aviso n.º 891/97, foi aprovado pela Assembleia Municipal de Oeiras, por deliberação de 22 de Abril de 1997, indicando no seu preâmbulo as leis que definem a competência objectiva e subjectiva para a emissão da Tarifa de Ligação de Esgotos, tendo, como aí também se evidencia, sido feita a sua apreciação pública nos precisos termos definidos no artigo 118.º do Código do Procedimento Administrativo.
Conforme se deixou já referido também em primeira instância, nos termos do artigo 292° do Regulamento Geral de Sistemas Públicos e Prediais de Distribuição de Água e de Drenagem de Águas Residuais, aprovado pelo Decreto Regulamentar, n.º 23/95, de 23 de agosto, compete à entidade gestora do sistema público de drenagem de águas residuais a definição do valor das tarifas médias a pagar pelos utilizadores do sistema, as quais deverão ser fixadas considerando o equilíbrio económico e financeiro do serviço, com o nível de atendimento adequado.
Assim sendo, a douta Sentença recorrida não merece qualquer reparo ao ter concluído que “Invoca ainda a impugnante a falta de fundamentação, mas é certo que solicitou a sua notificação relativamente àquela, e relativamente a outros elementos, pelo que claramente o que está em causa não será a falta de fundamentação do acto impugnado, que recebeu, está aprovado, mas a sua falta de notificação, que foi entretanto suprida. De qualquer forma, sempre se dirá, que a factura detalhada, remetida à impugnante, contém os elementos suficientes para que este apreendesse os respetivos fundamentos, e tanto assim, que se defendeu, ponto por ponto, de cada uma das componentes daquela, sendo certo que têm origem em diferentes realidades.” (cfr. pág. 19 da Sentença recorrida).
Entendemos, pois e na esteira do acórdão do S.T.A. de 27-9-2017, proferido no processo 479/16, citado no douto Parecer do Ministério Público, que não será por a tarifa ter sido liquidada em 2011 que ocorre ilegalidade por falta de fundamentação económico-financeira já que em 2009, ano a que se reporta, ainda não tinha cessado o regime transitório previsto no R.G.T.A.L.
A sentença recorrida, que assim decidiu, não merece censura e deve ser confirmada.
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3.- DECISÃO

Nesta conformidade, acordam, em conferência, os Juízes da 2ª Secção do Supremo Tribunal em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

Custas pela recorrente.

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Lisboa, 9 de Outubro de 2019. – José Gomes Correia (relator) – Aragão Seia – Francisco Rothes.