Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01140/16
Data do Acordão:06/27/2018
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
NORMA JURÍDICA
Sumário:I - Atento o disposto no art. 27.º, alínea b) do ETAF, no art. 284.º do CPPT e no art. 152.º do CPTA, o recurso por oposição de acórdãos interposto em processo judicial tributário instaurado após 1 de Janeiro de 2004 (data da entrada em vigor do ETAF de 2002) depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos legais: que se verifique contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
II - Não pode falar-se em oposição de acórdãos se, tendo em ambos sido decidido a mesma questão jurídica (a caducidade do direito de impugnar) com base na mesma norma (o art. 102.º do CPPT), esta foi aplicada em diferentes redacções (a inicial, que previa que o prazo era de noventa dias e a introduzida pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, que fixou o prazo em 3 meses), as quais, por si só, explicam a diferença na solução jurídica [que na contagem do prazo se apliquem diferentes regras do art. 279.º do CC na contagem do prazo: as da alínea b) quando o prazo era fixado em dias e as da alínea d) agora que o prazo é de 3 meses].
III - Assim sendo, deve o recurso por oposição de julgados interposto ao abrigo do disposto no art. 284.º do CPPT ser julgado findo, por falta de um dos respectivos pressupostos, nos termos do disposto no n.º 5 do mesmo artigo.
Nº Convencional:JSTA000P23463
Nº do Documento:SAP2018062701140
Data de Entrada:03/07/2016
Recorrente:B..................
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo por oposição de acórdãos

1. RELATÓRIO

1.1 B……………………. (adiante Recorrente) veio, ao abrigo do art. 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo do acórdão proferido nestes autos (a fls. 113 a 118) em 25 de Outubro de 2017 por aquela Secção, invocando oposição com o acórdão da mesma Secção e Supremo Tribunal de 27 de Fevereiro de 2013, proferido no processo n.º 1213/12 (Acórdão disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/63ccf0afcf2b42ef80257b2d003951fd.).

1.2 Admitido o recurso, o Conselheiro que foi o relator no recurso jurisdicional da sentença para o Supremo Tribunal Administrativo, em face das alegações produzidas ao abrigo do disposto no art. 284.º, n.º 3, do CPPT, entendeu poder verificar-se a invocada oposição de acórdãos e ordenou a notificação das partes para alegarem nos termos do n.º 5 do mesmo artigo.

1.3 A Recorrente apresentou, então, alegações sobre o mérito do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«A- Foi a ora recorrente notificada da decisão que recaiu sobre o recurso hierárquico em 13 de Dezembro de 2013.

B- Dispondo de 3 meses para efeitos da apresentação de impugnação judicial, inicia-se o prazo, nos termos do que dispõe a alínea b) do artigo 279.º do Código Civil no dia seguinte àquele em que ocorre a notificação, ou seja dia 14 de Dezembro de 2013.

C- O prazo fixado em meses, nos termos da alínea c) do artigo 279.º do Código Civil termina às 24 horas do dia que corresponda a essa data, dentro do último mês.

D- Apresentada impugnação Judicial via postal registado dia 14 de Março de 2014 é a mesma perfeitamente tempestiva.

E- No sentido acabado de expender, não contando o dia em que ocorre o evento – notificação efectuada a 13 de Dezembro de 2013 – visto o que dispõe a alínea b) do artigo 279.º do Código Civil, decidiu o Acórdão fundamento do STA n.º 01213/12 de 27 de Fevereiro de 2013 da 2.ª Secção.

F- Nesse sentido iniciando-se o prazo a 14 de Dezembro de 2013 ocorre o termo dos 3 meses dia 14 de Março de 2014 sendo tempestiva a apresentação da petição de impugnação judicial e por isso dever a douta decisão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA decidir em conformidade determinando a sua apreciação».

1.4 A Recorrida não contra alegou.

1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo foi dada vista ao Ministério Público e a Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no qual, depois de relatar a situação sub judice e de enunciar os requisitos da oposição de acórdãos, se pronunciou no sentido de que o recurso seja julgado findo, nos seguintes termos:

«[…] 1.3 Ora, examinados, de um lado, o aresto recorrido e, do outro, o citado acórdão fundamento, proferido por este Colendo STA, em 27/02/2013, no Processo n.º 01213/12, o Ministério Público considera que não ocorre divergência, muito menos inconciliável, entre ambos os arestos.
Efectivamente, as situações de facto subjacentes aos dois mencionados acórdãos não se regem pelas mesmas disposições legais, e daí que sejam merecedoras de um diverso tratamento jurídico.
Na verdade, o acórdão em crise, proferido no âmbito dos presentes autos, estribou-se na seguinte argumentação jurídica: “A questão central que no presente recurso se coloca é a de saber se na contagem do prazo de impugnação fixado em meses – art. 102.º, n.º 1 do CPPT – se inclui o dia em que ocorreu o evento, no caso a notificação, considerando o disposto nas alíneas b) e c) do art. 279.º do CCivil.
Antes do mais importa sublinhar que o prazo de impugnação aplicável no caso vertente, por estar em causa impugnação de decisão proferida em recurso hierárquico, é efectivamente, o previsto na alínea e) do n.º 1 do art. 102.º do CPPT.
Decorre daquele normativo, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro que o prazo de impugnação contenciosa de actos que podem ser objecto de impugnação autónoma é de três meses contados a partir da sua notificação e não o prazo de 90 dias que constava no mesmo preceito na redacção anterior.
Embora o prazo fixado em meses corresponda sensivelmente a 90 dias, a diferença entre os prazos reside na sua forma de contagem. De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 20.º do CPPT, à contagem dos prazos de impugnação contenciosa aplica-se o disposto no artigo 279.º do Código Civil, o qual por sua vez estipula que o prazo fixado em meses, a contar de certa data, termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro do último mês, a essa data. Já no prazo fixado em dias os mesmos são contados de forma contínua.
Ora, estando em causa um prazo fixado em meses, a regra de cálculo do prazo fixado em semanas, meses ou anos, estabelecido na alínea c) do art. 279.º do C. Civil, tem ínsita a que se estabelece na alínea b) do mesmo preceito, não havendo, por isso, que fazer preceder o seu funcionamento da prévia aplicação desta alínea b)” (o negrito e o sublinhado são nossos).
Por sua vez, o já aludido acórdão fundamento, deste Colendo STA, firmou o seu entendimento no pressuposto de que “a situação subsume-se na alínea a) do n.º 1 do art. 102.º do CPPT, preceito que estabelece que “A impugnação judicial será apresentada no prazo de 90 dias contados a partir do” “Termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte” (anota-se que o destaque não consta do original, consultável em www.dgsi.pt).
Destarte, face aos contornos assumidos pelos casos subjacentes aos acórdãos alegadamente em oposição, cujo desenho nos dão expressiva nota, quer os respectivos sumários, quer a fundamentação fáctico-jurídica que lhes deu corpo, impõe-se concluir que estamos perante duas situações de facto ocorridas em momentos temporais distintos e, como decorrência, na presença de dois enquadramentos jurídicos também diversos.
Na verdade, trata-se aqui de dois casos que, embora aparentemente semelhantes, por configurarem duas impugnações judiciais deduzidas ao abrigo do mesmo preceito do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT, todavia, são reguladas por normas distintas, decorrentes de duas sucessivas redacções do mesmo normativo.
Efectivamente, enquanto a redacção aplicável ao caso em presença foi conferida pela aludida Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, e estabeleceu um prazo de caducidade de três meses, já o caso contemplado no acórdão fundamento rege-se pela redacção anterior, que previa um prazo de 90 dias.
Atento o acima exposto, mais não nos resta do que enfatizar que falha, de todo, in casu, um dos pressupostos necessários à admissibilidade do presente recurso, materializado na indispensável identidade das questões que foram suscitadas e decididas nos dois acórdãos em confronto, ditada pela substancial identidade das situações fácticas versadas e, ainda, pela respectiva subsunção e subsequente aplicação de normas legais substancialmente idênticas.
A ser assim, afigura-se ao Ministério Público que não se encontram reunidos, no presente caso, todos os pressupostos exigidos pelo já citado artigo 280.º, n.º 5, do CPPT, para a admissão do presente recurso por oposição de acórdãos».

1.6 Colheram-se os vistos dos Conselheiros adjuntos.

1.7 Cumpre apreciar e decidir.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

2.2.1 O acórdão recorrido efectuou o julgamento com base na seguinte matéria de facto:

«1. A Impugnante apresentou junto da AT pedido de revisão oficiosa da liquidação de IRS referente ao ano de 2004;

2. Do indeferimento do pedido de revisão oficiosa a Impugnante recorreu hierarquicamente;

3. Por despacho de 4 de Novembro de 2013 da Directora de Serviços do IRS, o recurso hierárquico foi indeferido;

4. A decisão do recurso hierárquico foi comunicado à Impugnante por carta registada com aviso de recepção, que foi por esta assinado em 13 de Dezembro de 2013;

5. A petição inicial da presente impugnação foi enviada para o tribunal sob registo postal datado de 14 de Março de 2014».

2.1.2 No acórdão fundamento, a factualidade considerada (tal com foi fixada em 1.ª instância) foi a seguinte:

«1.º) A sociedade A……………, Ld.ª, deduziu em 16 de Março de 2005 a presente impugnação judicial da liquidação oficiosa n.º 200 40000 1071502 referente a IRC respeitante ao exercício de 2000 no valor de 156.461,90 euros.

2.º) O termo do prazo para pagamento voluntário do imposto decorreu em 15 de Dezembro de 2004 - cfr. doc. de fls. 15 do P.A. apenso aos autos».

2.2 DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

A Recorrente, notificada do acórdão por que este Supremo Tribunal, negando provimento ao recurso por ela interposto, manteve a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente, por caducidade do direito de impugnar, a impugnação judicial deduzida pela ora Recorrente, dele vem recorrer para o Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto no art. 284.º do CPPT.
Pretende a Recorrente a uniformização da jurisprudência relativamente a uma alegada questão fundamental de direito que, se bem interpretamos as alegações de recurso e respectivas conclusões, será a do modo de contagem do prazo para deduzir impugnação judicial.
Na verdade, ambos os acórdãos, o recorrido e o fundamento, se pronunciaram sobre a tempestividade da impugnação judicial, sendo que em ambos se concluiu pela caducidade do direito de acção.
Apesar de o Conselheiro que foi o relator no recurso jurisdicional interposto da sentença para este Supremo Tribunal ter admitido a possibilidade da existência de oposição (cfr. 1.2), porque essa decisão não faz caso julgado a esse propósito [cfr. art. 641.º, n.º 5 («A decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie e determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior nem pode ser impugnada pelas partes, salvo na situação prevista no n.º 3 do artigo 306.º».) do Código de Processo Civil (CPC)], há que verificar se estão verificados os requisitos da admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos. Só se concluirmos pela verificação desses requisitos, passaremos a conhecer do mérito do recurso, ou seja, das infracções imputadas ao acórdão recorrido [cfr. art. 152.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA)].

2.2.2 DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS

2.2.2.1 O presente processo iniciou-se no ano de 2014 (cfr. n.º 5 dos factos provados, em 2.1.1), pelo que lhe é aplicável o regime legal resultante do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) de 2002, nos termos dos arts. 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, da Lei n.º 13/2002 de 19 de Fevereiro, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 107-D/2003 de 31 de Dezembro, dos quais decorre que a data da entrada em vigor do novo Estatuto ocorreu em 1 de Janeiro de 2004.
Assim, a admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos arts. 27.º, alínea b) do ETAF, 284.º do CPPT e 152.º do CPTA, depende de (i) existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e (ii) a decisão impugnada não estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido inúmeras vezes dito pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da Lei de Processo dos Tribunais Administrativos, para detectar a existência de uma contradição, quais sejam:
i. identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, o que pressupõe uma identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais;
ii. que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica, a qual se verifica sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica;
iii. que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta e esta oposição decorra de decisões expressas, não bastando a simples oposição entre razões ou argumentos enformadores das decisões finais ou a invocação de decisões implícitas ou a pronúncia implícita ou consideração colateral tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.

2.2.2.2 Começaremos por apreciar se estão verificados os requisitos da alegada contradição de julgados à luz dos supra referidos princípios, já que a sua inexistência obstará, lógica e necessariamente, ao conhecimento do mérito do recurso.
Como deixámos já dito, ambos os acórdãos se pronunciaram sobre recursos interpostos de sentenças que apreciaram e decidiram a questão da caducidade do direito de impugnar, sendo, aliás, que ambos concluíram pela intempestividade da apresentação da petição inicial.
É inequívoco que as situações fácticas sub judice nos acórdãos recorrido e fundamento apresentam algumas semelhanças; mas será que a factualidade considerada em cada um deles foi subsumida à mesma norma legal e sem que se tenham interposto alterações legislativas que possam determinar a diversidade das soluções jurídicas? Em ordem a indagar da contradição pertinente à admissibilidade do recurso, vejamos o que os dois acórdãos em confronto decidiram.

2.2.2.2.1 O acórdão recorrido, negando provimento ao recurso interposto pela ora Recorrente da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou intempestiva a impugnação judicial deduzida na sequência do indeferimento do recurso hierárquico, confirmou o julgamento da 1.ª instância, no sentido da caducidade do direito de acção.
Para tanto, o acórdão começou por salientar que não há controvérsia quanto às datas em que a Recorrente se deve considerar notificada da decisão do indeferimento do recurso hierárquico nem quanto à data de entrada da petição inicial em juízo, nem sequer quanto ao prazo aplicável para o exercício do direito de impugnar, que é o de três meses, previsto no art. 102.º, n.º 1, alínea e), do CPPT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro. A controvérsia existe apenas em torno do modo como deve efectuar-se a contagem desse prazo.
Assim, enunciou a questão decidenda como sendo a de «saber se incorreu em erro de julgamento a sentença impugnada ao julgar intempestiva a impugnação deduzida pela recorrente, no entendimento de que, face ao disposto nas alíneas b) e c) do art. 279.º do CCivil, na contagem do prazo fixado em meses não se inclui o dia em que ocorreu a notificação».
Apreciando essa questão, depois de salientar a diferença na contagem dos prazos fixados em dias ou em horas em face daqueles que são fixados em semanas, meses ou anos, concluiu: «De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 20.º do CPPT, à contagem dos prazos de impugnação contenciosa aplica-se o disposto no artigo 279.º do Código Civil, o qual por sua vez estipula que o prazo fixado em meses, a contar de certa data, termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro do último mês, a essa data. Já no prazo fixado em dias os mesmos são contados de forma contínua.// Ora, estando em causa um prazo fixado em meses, a regra de cálculo do prazo fixado em semanas, meses ou anos, estabelecido na alínea c) do art. 279.º do C. Civil, tem ínsita a que se estabelece na alínea b) do mesmo preceito, não havendo, por isso, que fazer preceder o seu funcionamento da prévia aplicação desta alínea b)» ( Citou ainda, em abono da sua tese, o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo de 4 de Maio de 2006, proferido no processo 46/04, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/ea0f80dfd479d02c802571700046a871.).
Em resumo, o acórdão considerou que o prazo de três meses fixado na alínea e) do n.º 1 do art. 102.º do CPPT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2014), se conta desde o dia da notificação do acto impugnando e, por força do estabelecido na alínea c) do art. 279.º do CC, tem o seu termo no dia correspondente do terceiro mês seguinte, não sendo de utilizar na contagem desse prazo a regra estabelecida na alínea b) do mesmo preceito.

2.2.2.2.2 No acórdão fundamento, esta Secção do Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo apreciou e decidiu o recurso interposto pela impugnante da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, julgando verificada a caducidade do direito de impugnar, julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de um imposto.
A aí recorrente, aceitando que o termo do prazo para pagamento voluntário ocorreu em 15 de Dezembro de 2004 e que a petição inicial foi apresentada em 16 de Março de 2005 – ou seja, no 91.º dia após o termo do prazo para pagamento voluntário – e aceitando igualmente que o prazo para impugnar é de 90 dias, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 102.º do CPPT [na redacção em vigor à data, que era a inicial] e se conta nos temos do disposto no art. 279.º do CC, por força do estatuído no artigo 20.º, n.º 1 do CPPT, entende, no entanto que na contagem do prazo se não pode considerar o dia 16 de Dezembro de 2004, por força do disposto no art. 279.º, alínea b), do Código Civil, que dispõe que «[n]a contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr».
O acórdão explicou o modo como se deve fazer a contagem do referido prazo de 90 dias, nos termos da alínea b) do art. 279.º do CC: «aplicando tal normativo, não se conta o dia 15 de Dezembro de 2004, data a partir da qual começam a correr os 90 dias.//
Assim temos que o referido prazo de 90 dias terminou em 15 de Março de 2005.//
De facto, 16 dias de Dezembro de 2004+31 dias de Janeiro de 2005 + 28 dias de Fevereiro+15 dias de Março = 90 dias
».
Por isso, concluiu que a sentença recorrida tinha feito correcto julgamento.

2.2.2.2.3 Tendo presente o que decidiram os acórdãos em confronto, vejamos agora se entre eles existe a contradição susceptível de determinar a admissão do recurso.
Desde logo, os acórdãos, apesar de terem decidido ambos a questão da caducidade do direito de impugnar e com base no mesmo artigo do CPPT – o 102.º – aplicaram-no, de acordo com as regras da aplicação da lei no tempo, em diferentes redacções: o acórdão fundamento na redacção inicial e o acórdão recorrido na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro. O que significa que, enquanto neste o prazo para impugnar estava fixado em meses (3 meses), naqueloutro estava fixado em dias (30 dias).
Ora, sendo certo que, nos termos do art. 20.º do CPPT, «[o]s prazos […] de impugnação judicial contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil», as regras deste último artigo aplicáveis num e noutro caso são diversas: enquanto na contagem dos prazos fixados em dias se aplica a regra da alínea b), aos prazos fixados em meses a regra aplicável é a da alínea c). Assim, enquanto na contagem dos primeiros «anão se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr», já quanto aos segundos, o prazo «termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data; mas, se no último mês não existir dia correspondente, o prazo finda no último dia desse mês».
Assim sendo, como é, no caso não se verifica oposição de acórdãos pois, sendo que em ambos foi decidido a mesma questão jurídica (a caducidade do direito de impugnar) com base na mesma norma (o art. 102.º do CPPT), esta foi aplicada em diferentes redacções (a inicial, que previa que o prazo era de noventa dias e a introduzida pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, que fixou o prazo em 3 meses), as quais, por si só, explicam que na contagem do prazo se apliquem diferentes regras do art. 279.º do CC na contagem do prazo: as da alínea b) quando o prazo era fixado em dias e as da alínea d) agora que o prazo é de 3 meses.
Ora, como dissemos em 2.2.2.1, quando enunciámos os requisitos para que se considere existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito, essa contradição exige que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica, a qual se verifica sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica.
Concluímos, pois, que entre os acórdãos ora em confronto não se verifica a divergência que justifique e possa fundamentar recurso por oposição de acórdãos, a impor a actuação deste Supremo Tribunal Administrativo que, nesta sede, reiteramos, visa essencialmente garantir a uniformidade da interpretação e da aplicação do direito e não permitir mais um grau de recurso.
Em conclusão, o recurso será julgado findo por falta dos pressupostos de admissibilidade do recurso de oposição de julgados, atento o disposto no n.º 5 do art. 284.º do CPPT.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - Atento o disposto no art. 27.º, alínea b) do ETAF, no art. 284.º do CPPT e no art. 152.º do CPTA, o recurso por oposição de acórdãos interposto em processo judicial tributário instaurado após 1 de Janeiro de 2004 (data da entrada em vigor do ETAF de 2002) depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos legais: que se verifique contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

II - Não pode falar-se em oposição de acórdãos se, tendo em ambos sido decidido a mesma questão jurídica (a caducidade do direito de impugnar) com base na mesma norma (o art. 102.º do CPPT), esta foi aplicada em diferentes redacções (a inicial, que previa que o prazo era de noventa dias e a introduzida pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, que fixou o prazo em 3 meses), as quais, por si só, explicam a diferença na solução jurídica [que na contagem do prazo se apliquem diferentes regras do art. 279.º do CC na contagem do prazo: as da alínea b) quando o prazo era fixado em dias e as da alínea d) agora que o prazo é de 3 meses].

III - Assim sendo, deve o recurso por oposição de julgados interposto ao abrigo do disposto no art. 284.º do CPPT ser julgado findo, por falta de um dos respectivos pressupostos, nos termos do disposto no n.º 5 do mesmo artigo.


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3. DECISÃO

Em face do exposto, decide-se julgar findo o recurso.

Custas pela Recorrente.

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Lisboa, 27 de Junho de 2018. - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) - Pedro Manuel Dias Delgado - Ana Paula da Fonseca Lobo – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – António José Pimpão – Dulce Manuel da Conceição Neto – José da Ascensão Nunes Lopes.